Educação em Revista - Edição 138

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P.20 / PEDAGÓGICO Aprendizagem: lacunas a preencher

P.24 / GESTÃO UMA PUBLICAÇÃO DO SINEPE/RS ›› Nº 138 ›› ANO XXIII ›› JULHO/AGOSTO/SETEMBRO 2020

NO RITMO DA EAD Mudança de hábitos deve favorecer a educação a distância, modalidade em crescimento antes mesmo da pandemia

Digitalização: um caminho sem volta


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››› Sumário

13 ENTRE ASPAS Atividades domiciliares na educação básica

14 INSPIRE-SE Case de EAD de uma IES de Santa Rosa

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FOTOS DEPOSITPHOTOS

‹‹‹ 8 Reportagem de capa

24 ›››

COM A PALAVRA

GESTÃO

Tecnologias digitais: a visão de Lucia Giraffa

Atividades escolares realizadas on-line representam um incentivo à digitalização

28 INOVAÇÃO Como foi o retorno presencial no Exterior

33 INTERNACIONAL Internacionalização, agora direto de casa

35 RADAR As possibilidades abertas pela LDB

38 DIVERSIDADE A escola na redução do preconceito racial

20 ››› PEDAGÓGICO O desafio da reabertura das escolas passa pelo preenchimento efetivo das lacunas de aprendizagem

Educação em Revista | Nº 138 | Julho\Agosto\Setembro 2020

Contexto de valorização das atividades remotas pode representar espaço de crescimento para a EAD


Editorial ›››

DIRETORIA: Presidente: Bruno Eizerik, 1º Vice-

Presidente: Osvino Toillier, 2º Vice-Presidente: Oswaldo Dalpiaz, 1ª Secretária: Marícia da Silva Ferri, 2º Secretário: Iron Augusto Müller, 1º Tesoureiro: João Olide Costenaro, 2º Tesoureiro: Hilário Bassotto. Suplentes: Maria Helena Rodrigues Lobato, Ruben Werner Goldmeyer, Nestor Raschen, Carlos Roberto Milioli, Antônio Roberto Lausmann Ternes, Celassi Bernardete Dalpiaz, Bárbara Perlin Nissola. CONSELHO FISCAL: Titulares: Ademar Joenck, Inacir Pederiva, Guilherme Kühne. Suplentes: Isaura Paviani, Maria Angelina Enzweiler, Elenar Luisa Berghahn. DELEGADOS REPRESENTANTES: Bruno Eizerik e Osvino Toillier. Suplentes: Hilário Bassotto e Oswaldo Dalpiaz.

EQUIPE: Direção: Milton Léo Gehrke. Assessoria pedagógica: Naime Pigatto e Claudete Chiarello. Centro de Desenvolvimento em Gestão (CDG): Vera Lúcia Corrêa. Assessoria de Comunicação e Marketing: Luciana Moriguchi Jeckel Lampugnani, Carine Fernandes, Eduardo Oliveira, Tamara Stucky, Hermes Moura, Bruno Pinheiro e Alana Schneider. Financeiro: Matheus Philippi. Atendimento: Jaqueline Maria Rodrigues da Rosa e Suelen Schroeder Ferreira, Emília Pires e Joana Reni Vielhuber. Serviços Gerais: Ereni Souza da Silva e Naira Elizabetti Real. REVISTA: Supervisão: Carine Fernandes

(MTB 15.449) e Bianca Garrido (MTB 11.778). Edição: Carlos Guilherme Ferreira (MTB 11.161). Reportagens: Pedro Henrique Pereira, Igor Morandi, Tatiana Bandeira e Tatiana Py Dutra. Capa: Deposit Photos. Diagramação: Padrinho Agência de Conteúdo. Revisão: Milton Gehrke. Gestão em produção gráfica: BTWOB Soluções em Comunicação. Impressão: Gráfica Comunicação Impressa. Conselho Editorial: Prof. Osvino Toillier, Prof. Hilário Bassotto, Prof. Flávio D’Almeida Reis, Profª Mônica Timm de Carvalho, Profª Naime Pigatto, Profª Raquel Boechat, Prof. Ruy Carlos Ostermann, Profª Ângela Ravazzolo, Profª Rosângela Florczak e Prof. Gustavo Borba. Antenas: Adriana Gandin, Alfredo Fedrizzi, Caio Dibi, Crismeri Corrêa, Fernando Becker, José Moran, Laura Dalla Zen, Márcia Beck Terres, Mauro Mitio Yuki e Rodrigo Capelato. FALE CONOSCO – Redação: Cartas, comentários, sugestões, matérias – educacaoemrevista@sinepe-rs.org.br Comercial: Anúncios e assinaturas – comercial@sinepe-rs.org.br. Informações: Telefone (51) 3213.9090 e www.educacaoemrevista.com.br. A Educação em Revista não se responsabiliza por ideias e conceitos emitidos em artigos ou matérias assinadas, que expressam o pensamento dos respectivos autores.

MÚLTIPLAS SOLUÇÕES PARA UM NOVO CENÁRIO CARLOS GUILHERME FERREIRA Editor da Educação em Revista

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onvenhamos: esse 2020 que se encaminha para os meses finais desenrolou-se de uma maneira completamente imprevisível. A pandemia do coronavírus e seus efeitos avassaladores sobre saúde, economia e vida em sociedade não pouparam, também, o cenário educacional – obrigado a uma reinvenção às pressas, tanto na forma quanto no conteúdo. Depois do impacto inicial e do período de adaptação, a situação começa a ficar (um pouco) mais clara. As atividades pedagógicas não presenciais parecem se enquadrar nessa premissa, visto que os protocolos de prevenção ao coronavírus estimulam o distanciamento social, com a realização de atividades diversas direto de casa, sempre que possível. Esse é o tema principal desta edição da nossa revista: debater as possibilidades não presenciais sob os pontos de vista de mercado, pedagógico e de gestão. Trazemos o case de uma instituição do interior gaúcho que já vinha investindo nesse formato e, também, uma palavra sobre metodologias no contexto das instituições, combinadas com as ferramentas tecnológicas. Aliás, estas são uma realidade também no processo educacional. Antes restritos ao mundo corporativo, aplicativos como o Zoom entraram no vocabulário de gestores, professores, alunos e suas famílias. O contato com a escola tornou-se digital, o que leva a uma necessidade de reavaliação de processos.

Mas os efeitos da pandemia na educação não se encerram nos aspectos práticos. O olhar para a frente exige construir uma retomada, recuperar o tempo perdido. Significa preencher as lacunas de aprendizagem abertas pelo período sem aulas presenciais ou mesmo de adaptação, e não basta apenas abordar os objetos de conhecimento e os componentes curriculares. Os aspectos emocionais dos estudantes merecem um acolhimento pelas instituições, com uma avaliação capaz de diagnosticar o que ficou para trás e focar nos conhecimentos prioritários. Para esta reportagem, à página 20, entrevistamos Thomas R. Guskey, que é professor emérito da Universidade de Kentucky, nos Estados Unidos. Pesquisador da avaliação educacional e autor de 25 livros, diz ele: “é preciso focar no que é mais importante, no que os estudantes realmente precisam saber”. Nesse contexto, experiências de retorno às aulas ganham peso. No Amazonas, as escolas particulares voltaram ao presencial em julho, enquanto no Exterior isso aconteceu mais cedo. Nossa reportagem buscou detalhes das experiências estrangeiras, inclusive dentro de sala de aula, e consultou a Organização Mundial da Saúde (OMS) sobre as orientações específicas para a realidade da educação. As dicas podem ser conferidas nas páginas 28 e 29. Por fim, mas não menos importante, a seção Diversidade traz um olhar sobre um tema urgente, a discriminação racial. O ambiente escolar pode fazer toda a diferença na construção de uma sociedade mais igualitária. Mãos à obra? 

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››› Sinepe em ação ANA CRISTINA DOS SANTOS, DIVULGAÇÃO

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››› Iniciativa foi promovida pelo Colégio Mauá, de Santa Cruz do Sul, em junho, e beneficiou diversas entidades locais

CARREATA DA SAUDADE ARRECADA 1,2 TONELADA DE ALIMENTOS

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Colégio Mauá, de Santa Cruz do Sul, realizou no dia 20 de junho a Carreata da Saudade. O evento buscou aproximar os 150 professores e monitores da instituição e os 1,8 mil alunos afastados pela pandemia do coronavírus, arrecadando 1.223 quilos de alimentos. Conforme a assistente social da instituição, Sandra Halmenschlager, as

doações beneficiaram a Associação Comunitária Pró Amparo do Menor (Copame), Comunidade Terapêutica Recomeçar, Liga Feminina de Combate ao Câncer, Hospital Ana Nery, Hospital Santa Cruz, Associação de Auxílio aos Necessitados (Asan), Projeto Alegria Esperança e Projeto Movida, mantido pela escola. “Foi um evento lindo, marcado pela

ESCOLAS APROVAM CONVENÇÃO COLETIVA DE TRABALHO PARA 2020 O Sinepe/RS realizou assembleia com os dirigentes da categoria dos estabelecimentos privados da Educação Básica para avaliar as propostas negociadas com os professores e técnicos, com o objetivo de renovar as Convenções Coletivas de Trabalho de 2020. O encontro foi realizado no final de julho, de forma on-line, pela

plataforma Zoom, e contou com a presença de 127 instituições de ensino. A proposta negociada com os técnicos foi aprovada por 94% dos participantes e a acertada com os professores teve a concordância de 97% dos presentes. As cláusulas aprovadas se referem ao reajuste salarial. Com a assinatura

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emoção e solidariedade, que permitiu que professores e famílias matassem um pouquinho da saudade e ainda ajudassem na arrecadação de alimentos para os mais necessitados”, enfatiza Sandra. Entre as doações, destaques para açúcar, massa, leite, feijão, farinha e azeite, além de itens como bolachas, pipoca, lentilha, canjica, café, achocolatado e sardinha. 

das Convenções Coletivas de Trabalho, todas as cláusulas acordadas na íntegra serão disponibilizadas e podem ser acompanhadas pelo site do Sinepe/RS. O salário dos professores foi reajustado em 1º de março de 2020 pelo percentual de 3,92%, incidente sobre o salário devido em março de 2019. Para os técnicos, ficou acordado reajuste de 3,92% a partir de 1º de março de 2020 sobre o salário de março de 2019 e sobre as cláusulas econômicas. 


Sinepe em ação ›››

PESQUISA REGISTRA 23% DE INADIMPLÊNCIA A inadimplência das instituições de Educação Superior do Rio Grande do Sul, no mês de maio, foi de 23%, um aumento médio de 34,6% com relação ao ano passado. É o que mostra uma pesquisa realizada pelo Sinepe/RS, entre os dias 29 de junho e 3 de julho, sobre as consequências da pandemia do coronavírus para as instituições associadas. Participaram do estudo 11 representantes da educação superior. A pesquisa também traz dados da área sobre cancelamentos de matrículas: a taxa média ficou em 13,8%, três vezes maior do que a registrada em abril. Entre as instituições de Educação

Superior, quase metade (45,45%) registraram demissões – todas elas demitiram funcionários e pelo menos 20% tiveram que desligar professores. Para o presidente do Sinepe/RS, Bruno Eizerik, a situação na Educação Superior é muito preocupante: “O setor já está com dificuldades há algum tempo, em função da crise econômica e do fim do crédito educacional público (FIES). Havia uma boa expectativa para este ano, em função da retomada na economia, mas com a pandemia a situação se agravou. Corremos um sério risco de muitas demissões no setor, bem como de fechamento de IES.” 

AUTORIZAÇÃO DE USO DE IMAGEM E DE VOZ PELOS PROFESSORES Na Convenção Coletiva de Trabalho da Educação Básica 2020, o Sinepe/RS negociou com o Sindicato dos Professores a Cláusula nº 12, que se refere ao uso de imagem e voz do professor. Essa cláusula exige uma autori-

zação do professor, e o Sinepe /RS informa que esta deverá ser formalizada com os docentes, de forma individual, em 15 dias a contar do retorno às aulas presenciais. A assessoria jurídica está à disposição para esclarecimentos adicionais.

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ESCLARECIMENTOS SOBRE O ENSINO MÉDIO Em virtude dos desdobramentos na reorganização das atividades letivas e do calendário escolar gerados pela pandemia provocada pelo coronavírus, foram suspensas as orientações que o Sinepe/ RS estava elaborando para a implementação das alterações previstas na Lei nº 13.415/2017, bem como o trabalho que estava sendo realizado pelo Sindicato na construção do Referencial Curricular Gaúcho com professores de escolas associadas. Assim que a entidade tiver nova manifestação das autoridades que normatizam o assunto, haverá atividades para auxiliar as associadas na construção da nova configuração do Ensino Médio. A sugestão é que nesse período sejam estudadas possibilidades de realização de projetos com os alunos, com a ênfase nos seus planejamentos de vida enquanto são aguardadas novas orientações. 

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››› Reportagem de capa

Mais do q u nunca, E e AD

Em cres c atividad imento antes d a e ainda m s remotas pode pandemia, a m econom is durante a ret avançar om ia superio . Alunos da ed ada da uc re que pod profissionais p ação e e do lar, o m se adaptar a rceberam o que fav orece a conforto modalid ade.

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Reportagem de capa ›››

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››› Reportagem de capa PEDRO PEREIRA

pedro@padrinhoconteudo.com

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nquanto parte da população se esforça para ver aspectos positivos durante a pandemia, a educação a distância (EAD) na Educação Superior tem certeza de que é uma oportunidade para consolidar o crescimento observado nos últimos anos. A modalidade é cada vez mais procurada, a ponto de estar a caminho de ultrapassar o número de matrículas do ensino presencial em 2022 – a estimativa é da consultoria Educa Insights e pode ser antecipada em função da crise causada pelo coronavírus. “Durante a pandemia aconteceu um fato novo, que ainda não conseguimos avaliar. O ensino presencial virou remoto, e os alunos estão gostando”, observa o diretor-executivo da Associação Brasileira de Mantenedores do Ensino Superior (ABMES), Sólon Caldas. Em parceria com a empresa de estudos de mercado Educa Insights, a ABMES chegou à projeção de virada dentro de dois anos. Pode haver uma aceleração nesse processo, ressalta Caldas. Os motivos são claros. Primeiro, os alunos perceberam que é possível aprender com qualidade em casa. Passado o momento de adequação às aulas remotas, a aceitação foi satisfatória: outro estudo conduzido pela ABMES e pela Educa Insights mostra que mais de 80% dos alunos desse nível de ensino migraram para aulas a distância e, destes, quase 70% aprovaram o novo modelo. A segunda razão pela qual mais alunos podem preferir a EAD é financeira. Segundo Caldas, é preciso uma política adequada de financiamento estudantil para quem não pode ingressar no Ensino Superior. Acontece que, além de não abranger a educação a distância, esse recurso tem caído drasticamente a cada ano no modelo presencial. Com isso, a EAD segue avançando. Geralmente, os alunos da educação a distância fazem parte do grande núme-

ro de pessoas que concluem o Ensino Médio e partem direto para o mercado de trabalho. “Quando tem necessidade de ascensão profissional é que busca a graduação e, aí, procura o ensino a distância para compatibilizar a formação com o trabalho”, explica o diretor-executivo da ABMES. Para a diretora de graduação EAD da Unicesumar, Kátia Coelho, essa procura ocorre cada vez mais cedo. “O perfil que era de cerca de 35 anos, foi para 30 e hoje é um aluno de 25 anos. Vem caindo porque, para o jovem, é muito fácil o manuseio da tecnologia, ele está cada vez mais adepto a isto. Falar de realidade aumentada e 3D é natural para eles”, acredita. O sociólogo Simon Schwartzman, ex-presidente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e pesquisador da área de educação, acredita que a ideia de frequentar um campus e encontrar professores e colegas vai continuar importante entre quem tem condições de fazê-lo. “Em geral, o jovem que não precisa trabalhar”, pontua. Ele vai além e observa que grande parte das Instituições de Educação Superior (IES) tem cursos noturnos, “o que é muito ruim, não melhor do que a distância”, sustenta. O ideal, para Schwartzman, é uma rotina semipresencial, com aulas a distância e encontros para atividades em grupo e utilização de equipamentos.

Metodologia e reconhecimento Ao longo dos anos, a metodologia dos cursos a distância foi aprimorada e, ao mesmo tempo, foi conquistando alunos e professores. Entre os grandes receios estavam, por exemplo, cursos em que a parte prática é muito importante – como nas áreas de engenharia, saúde, comunicação, chegando a gastronomia e moda. Com o ensino híbrido esse processo foi superado, e as instituições oferecem aos estudantes a utilização de simuladores, objetos de aprendizagem, atividades de

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realidade aumentada e construções pedagógicas que possibilitam ter uma experiência de imersão. A criação de espaços que replicam o mercado é outra forma de aprimorar a formação a distância. Na Unicesumar, o curso de moda promove exposições com coleções desenvolvidas pelos alunos. Eles criam os croquis, modelagem, definem tecidos e confeccionam as peças. “O aluno coloca a mão na massa”, garante Kátia Coelho. O reconhecimento dos cursos EAD, outra preocupação dos alunos, também vem sendo desmistificado. À medida que o mercado absorve os egressos dessa modalidade e o desempenho é satisfatório, cai a desconfiança. A razão, segundo Kátia, é que o modelo de aprendizagem carrega nuances importantes para a carreira. “O curso EAD desenvolve nos alunos uma coisa fundamental, que é a autonomia do aprender. O mercado hoje reconhece. O preconceito ainda existe, mas já foi rompido”, afirma. As instituições precisam agir rápido para quando a pandemia acabar e a economia der os primeiros sinais de retomada. “Quem ainda não se credenciou está perdendo tempo. E quem já tem precisa ficar atento ao movimento do mercado, para não dar oportunidade ao aluno de desistir ou trocar de instituição”, analisa Sólon Caldas. De fato, a tendência é que, com maior demanda, a concorrência aumente, requisitando investimento em planejamento e formação. Para Kátia, da Unicesumar, uma estratégia de montagem de EAD inclui conhecer as instituições de sucesso na área e investir em especialistas para pensar nos processos. Um dos pilares desse investimento deve ser no corpo docente. Segundo ela, é comum que professores de cursos presenciais simplesmente travem quando o microfone e a câmera são ligados. Como saída, é preciso promover formação diferenciada, que inclua recursos tecnológicos para participar de lives, criar links e compartilhar arquivos, por exemplo.


››› Experiência

on-line: adaptar o conteúdo presencial não é o suficiente para proporcionar imersão DEPOSITPHOTOS

Os materiais também precisam de uma formatação específica. Adaptar o que já é distribuído em aulas presenciais pode não ser suficiente, pois não aciona recursos essenciais para a experiência de imersão que, no caso da EAD, dependem da tecnologia. É o caso de demonstrações virtuais, por exemplo: muito se fala que a educação a distância pode levar os alunos a lugares de todo o mundo ou a grandes empresas sem sair de casa, mas isso depende fundamentalmente da tecnologia e da linguagem aplicadas. Para as instituições, a grande vantagem é a chance de ganhar escala no número de alunos com o mesmo investimento na elaboração das aulas. Essa preparação, no entanto, exige um aporte inicial, mas que compensa à medida em que as turmas aumentam. Nos modelos semipresenciais a presença de tutores garante a orientação necessária, enquanto os responsáveis pelo conteúdo podem ser nomes consagrados. Outro fator é o espaço físico, já que os alunos não ocupam nenhum prédio. E esta é a primeira vantagem também para eles: sem perda de tempo com deslocamento, economia de recursos e

comodidade de estudar em casa, onde quiserem.

Planejamento e capacitação A Factum, de Porto Alegre, lançou mão da expertise com cursos semipresenciais para se adaptar ao período de pandemia. A receita seguiu alguns dos passos já mencionados por Kátia, da Unicesumar: o planejamento ficou por conta de um comitê instituído com a finalidade de implementar aulas remotas por meio de um ambiente virtual com atividades síncronas (ao vivo) e assíncronas (materiais como slides e artigos). Com a metodologia definida, a instituição apostou na capacitação e no acompanhamento dos docentes. Com o prazo apertado, optou pelo desenvolvimento permanente e aplicado à nova realidade: eles receberam capacitação técnica formal para acesso e interação nas plataformas. Já no decorrer das atividades, contaram com a oferta de minicursos, momentos de aprendizagem denominados pela instituição de

Pílulas de Conhecimento. “Sabíamos da importância de capacitar os professores, mas não tínhamos tempo para planejar e executar todos os treinamentos necessários. Então optamos por ministrá-los de forma prática e na medida em que a necessidade aparecesse”, explica a diretora administrativa da Factum, Barbara Nissola. No campo da gestão, a Factum aplicou instrumentos de avaliação para verificar o grau de satisfação dos alunos. Nos primeiros 30 dias, 65% consideraram a experiência positiva e 93% reconheceram o esforço dos professores em função da pandemia. Por outro lado, quase 20% não conseguiram acessar as aulas remotas e, destes, quase 70% relataram problemas de infraestrutura (com internet ou equipamentos). Ao término do semestre, no entanto, a aprovação das soluções encontradas superou os 80% e o reconhecimento aos docentes chegou a mais de 94%. “Aprendemos que não importa se é presencial ou virtual: em qualquer modelo, é preciso que os estudantes tenham a experiência do aprendizado”, conclui Barbara. 

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››› Reportagem de capa Pontos fundamentais O bom funcionamento da EAD depende de algumas premissas:

Formação de professores É preciso estar ambientado a novas formas de preparar aulas e acompanhar o desenvolvimento dos alunos.

Emprego de linguagem apropriada Não basta adaptar materiais off-line. É preciso desenvolver mecanismos que dialoguem dentro da lógica EAD.

Apoio para acesso à tecnologia Muitos alunos têm dificuldade de infraestrutura. Oferecer locais de acesso ou subsídio para aquisição/ locação de equipamentos pode ser uma boa alternativa.

Sistemas que funcionem bem O atendimento e o desenvolvimento das atividades exigem respostas rápidas. Este é um dos principais valores percebidos na EAD.

Uso de tecnologia Aplicação de recursos como realidade aumentada é cada vez mais comum e proporciona a experiência de imersão que conquista os alunos.

Planejamento Estruturar a gestão e as metodologias é a chave para uma implantação segura do modelo.

Adaptação a diferentes públicos Considere entregar material impresso em casa e versões síncronas e assíncronas. Ajuda a driblar dificuldades de infraestrutura ou capacitação dos alunos.

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Entre Aspas ›››

Luciano Sathler Doutor em Administração pela FEA/USP, é membro do Comitê de Educação Básica da Associação Brasileira de Educação a Distância (ABED). Reitor do Centro Universitário Metodista Izabela Hendrix (MG). Foi o primeiro pró-reitor de educação a distância do Brasil, na Universidade Metodista de São Paulo.

As aulas remotas na Educação Básica Se falharmos em dar a devida atenção à origem de nossos problemas, o próprio pensamento, que tem por objetivo resolvê-los, será da mesma natureza fragmentária e confusa que aquela que os produz, de modo que tenderemos a tornar as coisas piores (David Bohm).

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crise da escola sem a presença física dos alunos imposta pela pandemia do coronavírus traz preocupações imediatas quanto à sustentabilidade econômico-financeira de milhares de escolas em todo o Brasil. Diariamente, as equipes gestoras se deparam com fatos graves tais como o aumento da inadimplência, da evasão, maiores custos para ofertar o ensino remoto emergencial, investimentos necessários para o retorno das atividades presenciais, além da ameaça por parte de alguns políticos e órgãos públicos que tentam estabelecer descontos lineares nas mensalidades. A urgência é sobreviver. A inédita interdição ao espaço físico de instituições educacionais levou gestores e professores a adotarem soluções variadas, especialmente por meios digitais, para tentar substituir a sala de aula tradicional. Porém, fica claro que as aulas síncronas de boa qualidade não é

possível com a simples emulação dos processos praticados no presencial. O trabalho com as atividades domicialiares requer um planejamento meticuloso, capacitação de todos os envolvidos, o trabalho cooperativo e a formação de equipes multidisciplinares. A pandemia tornou-se um processo de aceleração do futuro, com impactos profundos nas escolas. É necessário conceber uma nova arquitetura pedagógica para evitar voltar ao modelo que ainda se baseia nas aulas padronizadas, unidirecionais, centradas no professor e no silêncio dos alunos. Sair de um currículo que se caracteriza pela fragmentação do saber em unidades especializadas do conhecimento que dialogam pouco ou nada entre si. A maioria das práticas tradicionais em salas de aula, ora aplicadas no campo digital, não incorporam a experiência de aprendizagem da chamada Geração Internet, que usa as redes digitais para criar seu próprio conteúdo, de forma colaborativa em comunidades on-line de aprendizagem, no que se torna uma poderosa ferramenta de engajamento e auto-organização. Trata-se de um perfil de estudante que tem ficado cada dia mais insatisfeito com o desalinhamento encontrado entre a escola e o universo digital povoado por telas que abrem infinitas possibilidades de acesso a informação. As novas Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio preveem

que até 20% da carga horária do Ensino Médio diurno possa ser oferecida em EAD, chegando a 30% no período noturno. Para a Educação de Jovens e Adultos (EJA) o texto permite até 80% na modalidade a distância. As diretrizes permitem ainda que atividades extraclasse variadas possam ser consideradas parte da carga horária cumprida. Para a oferta de itinerários formativos diversos podem ser estabelecidas parcerias entre diferentes instituições de ensino. Haverá possibilidade de participar de vários cursos técnicos de áreas correlatas, de curta duração. Somadas às mudanças trazidas pela Base Nacional Curricular Comum (BNCC), essas inovações exigem que as escolas definam uma estratégia original, de boa qualidade e sustentabilidade que incorpore os fundamentos da EAD. Isso abrange o ensino híbrido e as metodologias ativas como prioridades para todas as etapas da Educação Básica, inclusive a Educação Infantil e o Ensino Fundamental. Aproveitar as possibilidades de flexibilidade de tempo, de espaço e de ritmo nos estudos que as aulas remotas trazem, para permitir a definição de trilhas personalizadas de aprendizagem. A nova arquitetura pedagógica tem impactos na estrutura organizacional da escola e no modelo de atuação. É tempo de sobreviver e planejar para se manter relevante no pós-pandemia. 

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››› Inspire-se

GRACIELA BORGES, FEMA

››› Instituição de Santa Rosa envolveu 12 profissionais no desenvolvimento de vídeos e da plataforma para utilizá-los

Primeiro, a lição de casa FEMA, de Santa Rosa, inicia cursos EAD no segundo semestre com foco na comunidade que já se relaciona com a instituição – mas os planos vão mais além

PEDRO PEREIRA

pedro@padrinhoconteudo.com

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om mais de dois mil alunos em suas turmas, que vão do maternal até a Educação Superior, a Fundação Educacional Machado de Assis (FEMA), de Santa Rosa, está em plena gravação dos cursos a distância que pretende oferecer já no

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segundo semestre de 2020. O objetivo é começar com opções de extensão para profissionais da região. Depois, levar para os cursos técnicos e parte dos de nível superior. A instituição se viu em meio à pandemia justamente no momento em que mais se voltava ao uso de tecnologia: concluíra no fim do ano passado a implantação de um sistema para atividades remotas na educação superior.


Inspire-se ››› Em poucos dias já estava trabalhando na familiarização de professores, alunos e familiares com a ferramenta. Este contexto tornou menos árdua a missão repentina de levar as aulas até os alunos por meios digitais. “A faculdade e o profissionalizante já estavam preparando alunos e professores desde janeiro. Quando surgiu tudo isso, eles já estavam tendo aula on-line, com atividades bem dinâmicas. Como deu certo, começamos com o Ensino Médio também. Já no Fundamental continuamos com aulas ao vivo pelo Google Meeting. E agora começamos também na Educação Infantil: uma vez por semana os pais acessam e os professores interagem”, detalha a diretora pedagógica da FEMA, Mônica Gasparetto.

EAD entra de vez na pauta Essa experiência foi o estopim para tirar do papel algo que a instituição planejava há pelo menos três anos: a oferta de cursos a distância. E é aí que entra a figura de Rogério Magrão, especialista em marketing, que foi chamado para coordenar o processo de implantação da modalidade. Ele conta que o convite se deu por sua atuação baseada em levar sempre em consideração o ser humano e suas dificuldades particulares, para a partir daí aprimorar a atuação profissional. Com essa expertise, Magrão lidera o projeto que, neste segundo semestre de 2020, já deve colocar os primeiros cursos de extensão no mercado. O planejamento começou pela definição da persona que pretendem atender neste primeiro momento. Chegaram à definição de figuras próximas à FEMA, que estudam, passaram por lá ou acompanham os estudos dos filhos – é marcante na instituição a presença de estudantes que permanecem do maternal até a conclusão da faculdade.

MÔNICA GASPARETTO, Diretora pedagógica da FEMA

“A faculdade e o profissionalizante já estavam preparando alunos e professores desde janeiro. Quando surgiu tudo isso, eles já estavam tendo aulas on-line, com atividades bem dinâmicas”

Campanha Eleitoral no foco do EAD l Um curso dedicado a futuros vereadores está entre os que a FEMA tem prontos para o mercado. Uma abordagem sobre a percepção pública da imagem é feita com foco na construção das campanhas eleitorais. “Uma coisa é o que você pensa que é, outra é o que as outras pessoas pensam que você é, e outra, ainda, o que você realmente é”, provoca o coordenador dos cursos EAD da FEMA, Rogério Magrão. O lançamento, no entanto, deve ficar para a próxima campanha, já que a plataforma não deve estar integralmente à disposição para preparar as equipes antes da corrida eleitoral de 2020.

“São pessoas que buscam certos tipos de cursos que a região não oferece. Já temos algumas respostas e estamos começando a escrever os módulos, trabalhando as pessoas que vão passar a doutrina e construindo os estúdios onde vamos captar áudio, imagem e fazer a edição”, conta Magrão. Ele explica que o primeiro esforço será pela difusão orgânica da novidade, ou seja, conquistar a própria comunidade. Depois de consolidar a estrutura, levar a outras regiões.

O primeiro curso é de Comunicação de Impacto, voltado a profissionais do Direito, que é um curso importante da FEMA, e áreas afins. “A pessoa tem a primeira audiência com um juiz, o que faz agora? A parte didática do Direito é uma, mas como agir quando precisa relatar algo, persuadir uma pessoa? Vamos dar a possibilidade de as pessoas irem além do que se tem na sala de aula no dia a dia”, exemplifica o coordenador.

Dificuldade para treinar professores Depois de definir a persona, o primeiro desafio é a gravação das aulas. “Nem sempre a pessoa consegue passar a graduação pelo vídeo”, reconhece Magrão. Por isso a rotina tem se baseado em gravar, analisar, corrigir, treinar e gravar novamente. “Temos de ser meio atores agora. Vai um tempo até as pessoas começarem a fazer por conta própria”, analisa. A interação com os alunos também sofre impacto. A intenção da FEMA é permitir que os docentes estejam disponíveis por canais digitais para atendimento individualizado e, quando houver necessidade, promover encontros virtuais em grupo. Este ponto é importante porque a instituição pretende fazer uma abordagem que leve em conta as competências e habilidades de cada um para proporcionar evolução acadêmica e profissional. Até agora são 12 profissionais envolvidos no desenvolvimento da plataforma e dos vídeos. Além da Comunicação de Impacto já estão sendo criados os módulos de assuntos como contabilidade, administração e tecnologia, que são relevantes no contexto da região e, por isso, devem ter alta procura. A estimativa é que entre 10% e 15% dos cursos de educação superior tenham atividades on-line. Ainda é cedo, mas se desenha como o início de uma caminhada ampla da FEMA no ensino a distância. 

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››› Por dentro da lei

Jorge Lutz Müller Coordenador da assessoria jurídica do SINEPE/RS. OAB-RS 7.563.

Responsabilidade da escola no contexto da pandemia

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s eventos decorrentes do estado de calamidade trazem à tona novas peculiaridades acerca da responsabilidade da escola. O tema é espinhoso. No Direito Civil clássico, entendia-se que as coisas deviam ser compreendidas à luz das circunstâncias que as ensejaram. Ao contrário, quando mudavam as circunstâncias e, decorrentemente, o seu contexto, haveria que mudar a solução jurídica. Ocorrendo, pois, casos fortuitos ou eventos de força maior, modificavam-se os critérios de atribuição de responsabilidade. O Código Civil Brasileiro, na cabeça de seu artigo 393, estipula que “O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado”. Com base nisso, seria possível argumentar que a pandemia configura situação de força maior, conforme já o reconheceu a Advocacia-Geral da União (Parecer 261/2020/CONJUR-MINFRA/CGUY/AGU). Em consequência, as escolas não poderiam ser responsabilizadas por eventuais efeitos manifestados em seus recintos e/ou atividades presenciais. No entanto, o Código de Defesa do Consumidor/CDC (Lei nº 8.0078/90) não contempla a força maior como excludente da responsabilidade atribuível ao fornecedor. Para o CDC, a responsabilidade da

escola é objetiva, em função do risco por ela assumido, ou seja, sua configuração independe da existência de culpa; basta o nexo de causalidade. Havendo infectação em situação escolar, seria possível, então responsabilizar a escola, mesmo que não tenha havido negligência de sua parte. Qual a capitulação aplicável: a do Código Civil ou a do Código do Consumidor? A Covid-19, sabidamente, tem alto potencial de disseminação. Não constitui fenômeno circunstrito e isolável, mas, antes, fenômeno amplo e avassalador, que se irradiou para o mundo inteiro. Vale dizer: são múltiplas as suas vias de contaminação, sendo difícil atribuí-la, com razoável grau de evidência, a atividades presenciais ocorridas numa determinada escola. É preciso, contudo, alertar os gestores de escola para o viés consumerista, frequentemente adotado para enquadrar a atividade educacional na esfera dos fornecimentos tipicamente mercantis. Trata-se de um viés que facilita encontrar um pagador, mesmo quando o perfil do serviço e as suas circunstâncias sejam distintas. Além disso, haverá quem possa cogitar de responsabilidade culposa por parte da escola, não exatamente por ofertar ensino presencial em situação de recomendável distanciamento e/ou isolamento, mas por fazê-lo sem a devida observância dos protocolos instituídos

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pelas autoridades sanitárias. A par disso, convém registrar que a força maior resulta configurada, como situação discrepante em relação àquilo que se verifica ao seu derredor; vale dizer, ela se caracteriza por sua excepcionalidade, em contraste com a “normalidade” dos demais acontecimentos. Entretanto, a pandemia da Covid-19 se configurou como uma situação de excepcionalidade abrangente, que a todos atingiu. Daí porque o Judiciário tem evitado conferir-lhe tratamento peculiar, para não ter de estendê-lo aos demais acontecimentos similares. Com efeito, se uma determinada escola obtém tratamento diferenciado em função da pandemia, todas as demais, em princípio, deveriam obtê-lo, porque todas, a bem dizer, foram por ela atingidas. E assim também as outras categorias patronais e/ou profissionais. Na realidade, se a força maior atinge a todos – ou quase todos – exsurge uma certa “isonomia”, que acaba por esmaecer-lhe a excepcionalidade. Em consequência, pode resultar enfraquecido o argumento de que pandemia exclua responsabilidade indenizatória. Resta o consolo (relativo!) de que o STF, em decisão já antiga, corroborou o entendimento de que a força maior (e/ ou caso fortuito) pode, sim, revelar-se como excludente de responsabilidade indenizatória, até mesmo em se tratando de escola pública (como foi o caso). 


Com a palavra ›››

CRISTIANE PARNAÍBA, COLEGIO FARROUPILHA

››› Para Lucia Giraffa (na foto, em evento no Colégio Farroupilha), tecnologias são mais efetivas se usadas em contexto

“Precisamos criar soluções personalizadas” Pesquisadora Lucia Giraffa analisa as metodologias e tecnologias da EAD e defende que soluções sejam pensadas levando em consideração o contexto de cada comunidade escolar PEDRO PEREIRA

pedro@padrinhoconteudo.com

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rofessora titular da Escola Politécnica da PUCRS, Lucia Giraffa é especialista em tecnologias digitais aplicadas na educação a distância. Nesta conversa, ela projeta as metodologias e tecnologias que devem ser tendência nos próximos anos

(como modelos híbridos e plataformas integradoras) e faz um alerta: a formação de professores precisa ser repensada em um contexto contemporâneo. Educação em Revista – Quais são as principais tecnologias digitais utilizadas em EAD? Lucia Giraffa – EAD abrange muitos formatos e recursos, pois é uma

modalidade bem antiga, que começou com correio, material impresso, depois veio rádio, televisão, satélite e agora internet. Quando se fala em ofertas que utilizam plataformas integradoras de recursos (assíncronos e síncronos) associados às tecnologias digitais, como Moodle, Blackboard e outros, fazemos um recorte na abrangência e passa a se chamar, simplificadamente, de Educação On-line. Nas ofertas de Educação On-line se usam muitos recursos, e os mais frequentes são plataformas integradoras, realidade aumentada, videoconferências, quizzes, jogos, animações, vídeos criados por docentes e uma série de softwares educacionais – programas especialmente criados para fins pedagógicos e associados a determinados conteúdos. Afora o uso integrado, muitas escolas e universidades podem usar estes mesmos recursos de forma independente da associação a uma plataforma. Existem muitas opções e tudo depende do projeto pedagógico e das estratégias . Segue ›››

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››› Com a palavra O que será tendência nos próximos anos? A mistura/composição de recursos conforme o contexto e público que se está trabalhando. O fazer docente deverá ser alicerçado em Práticas Pedagógicas Remixadas, termo cunhado na tese que orientei da doutora em Educação Cristina Martins, onde diferentes aspectos oriundos da Cultura Maker, Gamificação, Pensamento Computacional, habilidades e competências, associadas a Inteligência Emocional, Inteligência Digital e Inteligência Espiritual devem compor o mosaico tanto de formação docente, bem como orientar o fazer docente. A sociedade está multifacetada e complexa. Precisamos criar soluções personalizadas e, nisto, o arcabouço tecnológico nos auxiliará. O hibridismo de procedimentos/processos pedagógicos será a tônica. Colocar no presencial práticas e recursos normalmente associados ao virtual será consolidado, especialmente no pós-pandemia. Quais os erros mais frequentes das instituições ao aplicar a educação a distância? Desconsiderar o perfil de aluno, acreditar que estudar no virtual é similar ao presencial, que vai sair mais barato. Existe o custo da equipe para desenvolver o design do curso, materiais específicos, infraestrutura física/lógica, técnicos especialistas em design instrucional, web designer, roteirista, artistas gráficos, professores conteudistas, professores tutores e por aí segue. É outra lógica de organização dos cursos a ser considerada quando se fala em qualidade. Como as tecnologias podem ter um resultado mais efetivo? Se forem devidamente contextualizadas no fazer docente e proporcionarem oportunidades de aprendizagem aos alunos. Para isto precisamos ajustar a formação docente. Tecnologia por si só não faz diferença. O que realmente faz diferença são as propostas metodológi-

cas e práticas pedagógicas que auxiliem a promover o protagonismo dos alunos como agentes de sua aprendizagem. Para que isto ocorra precisamos ajustar o processo formativo dos docentes. Com a quarentena, as instituições foram obrigadas a uma rápida adaptação. As soluções foram satisfatórias? Não fizemos EAD ou Educação On-line. O que foi feito foi Ensino Síncrono Remoto Emergencial. Importante destacar esta diferença. Foi realizado o melhor nas possibilidades que tínhamos. Lembrar que iniciamos o semestre em estabelecimentos presenciais, com alunos que escolheram estudar no presencial e professores com formação para atuar no presencial. Subitamente o cenário se modificou! No início não sabíamos o quanto duraria. Foram 15 dias que se tornaram 30, 45, 60 e chegamos a mais de três meses com sinalização de possível manutenção disto até o final do ano. Evidentemente, depende do comportamento da epidemia e dos decretos governamentais. As escolas estão atreladas a todos estes condicionantes.

LUCIA GIRAFFA Professora titular da Escola Politécnica da PUCRS

“O hibridismo tende a se consolidar nas ações pedagógicas que eram apenas de EAD e agora permeiam o presencial. Uma boa e saudável mistura de elementos em função do contexto.” “Não se trata de modalidade de oferta tão somente, e sim da relação das pessoas com as tecnologias digitais. E, quando se trata de docentes, o desafio é maior”

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Quais os modelos pedagógicos mais consolidados e quais devem ser protagonistas nos próximos anos? O cenário aponta para consolidação da oferta híbrida: ações presenciais e virtuais no mesmo curso. Pode acontecer de haver um conjunto de disciplinas presenciais, outras virtuais e outras parte presencial e parte virtual. O hibridismo tende a se consolidar também nas escolhas de recursos, metodologias e ações pedagógicas que antes eram apenas de EAD e agora permeiam o presencial. Uma boa e saudável mistura de elementos em função do contexto. Como capacitar os professores para trabalhar nesse contexto? Os cursos de formação de professores necessitam rever seus currículos e repensar a formação docente considerando o contexto contemporâneo. Vivemos num mundo digital, imerso numa cultura digital e precisamos desenvolver a nossa inteligência digital para melhor compreender a cibercultura. Não se trata de modalidade de oferta tão somente, e sim da relação das pessoas com as tecnologias digitais. E, quando se trata de docentes, o desafio é maior. Porque hoje recebemos nas escolas e universidades jovens nascidos neste contexto digital, familiarizados com abundância de informação disponível e que precisam ser educados para poder viver, escolher, estudar e trabalhar de forma saudável. Uma coisa é jogar e participar de redes sociais, fazer compras e usar o ambiente digital da internet para obter informações e estabelecer amizades. Outra é estudar e se constituir um profissional para atuar neste contexto da cibercultura. 

CONTEÚDO ON-LINE DISPONÍVEL Confira a entrevista completa.


Educação em Revista pergunta ›››

Ruben Werner Goldmeyer MBA em Administração Escolar Acadêmica e Universitária, Faculdades Pedro Leopoldo CONSAE EDITAU Belo Horizonte (MG). É diretor-executivo da Rede Sinodal de Educação, integrante da diretoria do Sinepe/RS e conselheiro em 3º mandato do Conselho Estadual de Educação do Rio Grande do Sul

Como será a retomada das atividades presenciais nas escolas? Orienta-se no Parecer 2 do CEEd a necessidade de um “Plano de Ação Pedagógica Complementar” que sublinha a necessidade da definição de aprendizagens essenciais para cada nível, etapa e modalidade.

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m meados de março, após algumas semanas de aula, inicia um “novo ano”: desafios, frustrações, esperança, avanços, dúvidas. Num espaço de tempo extremamente restrito, alunos tiveram que se acostumar a aulas diferentes, professores foram desafiados a trabalhar com tecnologias da informação como poucos colegas o faziam e famílias incorporaram aos seus costumes do dia a dia sentar-se em frente às telas e à mesa de trabalhos com filhos. Foram parceiros destes estudantes nas atividades domiciliares nos termos da normativa emanada do Conselho Estadual de Educação (CEEd). Após algumas semanas, surgiu a necessidade premente de adequar as normativas educacionais a este novo tempo de excepcionalidade que se mantinha. Escolas, equipes diretivas, professores, enfim, comunidades escolares tinham mais perguntas do que respostas. Leis federais, estaduais e normas de âmbito federal foram publicadas. Algumas orientações cabiam ser trazidas. Ao mesmo tempo e na mesma proporção que se referia a retomada do ano letivo, infelizmente, em nosso Esta-

do avança a pandemia. No CEEd, como era esperado, decidiu-se, apesar de todas as limitações quanto a pessoal no que se refere a colaboradores na assessoria e número de conselheiros acrescida pela necessidade de reuniões virtuais, por construir uma manifestação de orientação às comunidades escolares do Sistema Estadual de Ensino que abrange, entre outras, todas as escolas de educação básica do RS. Trabalhou-se numa metodologia de construção coletiva – neste contexto, arrisco-me de referir que o Parecer tem participação de dezenas de pedagogos(as), de profissionais de educação, entre outros. Sonha-se com uma linguagem simples, clara, objetiva e direta, priorizando muito especialmente aspectos pedagógicos em detrimento de outros. Nasce o Parecer 2, apresentado num primeiro momento às entidades representativas da sociedade gaúcha para, num segundo momento, ser aprovado por unanimidade na Plenária do CEEd, dia 8 de julho. Tendo muito presente a excepcionalidade em função da pandemia admitem-se, através do Parecer, também, “excepcionalidades”. Na linha de uma flexibilidade responsável, aposta-se na autonomia das escolas ao lado de suas respectivas mantenedoras. Referenda-se que todas as atividades pedagógicas não presenciais no âmbito deste Sistema serão nominadas como atividades domiciliares e a necessidade de pautar o planejamento pedagógico neste período do Plano de Ação Pedagógica de cada

escola, já exigido pelo Parecer 1. Orienta-se no Parecer 2 a necessidade de um “Plano de Ação Pedagógica Complementar” que sublinha a necessidade da definição de aprendizagens essenciais para cada nível, etapa e modalidade. Este Plano de Ação Pedagógica Complementar substituirá o Plano Pedagógico, orientando os formatos de validação das atividades domiciliares planejadas e realizadas neste período, antes do retorno às aulas, referido por alguns como o “novo normal”. Estão estendidos, também, pelo referido plano a diversificação de formatos de atividades letivas neste período de excepcionalidade, dinamizando as metodologias de aferição e controle da participação do estudante, esclarecendo sobre a necessidade da realização de uma Avaliação Diagnóstica nos termos da exigência do Parecer 05 do CNE. Reitera-se a impossibilidade de alteração do Regimento Escolar no corrente ano letivo. A elaboração do referido Plano de Ação Pedagógica Complementar não subentende alteração no Regimento Escolar pois este Plano, elaborado pelas escolas, tem validade no período da excepcionalidade (da pandemia). Recomenda-se uma leitura atenta do Parecer 2, que orienta sobre tópicos a serem referidos no Plano de Ação Pedagógica Complementar, sobre a necessidade de acolhimento da comunidade escolar, sobre a importância da formação continuada e sobre todos níveis, etapas, cursos e modalidades. 

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››› Pedagógico

Construção da retomada Acolhida socioemocional dos estudantes e recuperação das lacunas na aprendizagem são focos do trabalho pedagógico no retorno às aulas presenciais

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lém da preocupação com os protocolos de segurança, o retorno das aulas presenciais impõe uma série de desafios pedagógicos às escolas. Afinal, depois de tanto tempo com as remotas, como recuperar as lacunas na aprendizagem e garantir que os estudantes consigam avançar? Educadores apontam que o caminho da retomada passa pelo acolhimento socioemocional dos alunos e de suas famílias e pela realização de uma avaliação que permita diagnosticar o que ficou para trás e focar nos conhecimentos mais importantes. Para o professor emérito Thomas R. Guskey, da Universidade de Kentucky, nos Estados Unidos, não há certeza de que os professores conseguirão recuperar em pouco tempo todos os conteúdos perdidos no período. Pesquisador da avaliação educacional e autor de diversos livros na área, ele cita três problemas enfrentados por alunos e educadores durante o período de suspensão das aulas. Todos trazem reflexos para a aprendizagem, a saber: Primeiro, o acesso desigual dos alunos à tecnologia, sendo que alguns não têm sequer internet e outros precisam compartilhar equipamentos com familiares.

Segundo, as condições dos pais em dar suporte aos filhos durante as aulas remotas, já que muitos precisaram sair de casa para trabalhar e outros tiveram de administrar longas jornadas em casa, o que dificulta o apoio nas tarefas; E, terceiro, os professores: além das dificuldades com as ferramentas digitais, precisaram dar conta de uma rotina diferente, conciliando as aulas remotas com o cuidado e a educação dos filhos, somadas às tarefas da casa. Um primeiro passo neste sentido é utilizar as avaliações como aliadas – partindo do diagnóstico do que os alunos conseguiram aprender durante as atividades remotas e planejando o trabalho com foco nas lacunas mais importantes a serem recuperadas. Segundo Guskey, o objetivo deve ser sempre o aprendizado dos alunos e, para isso, o primeiro passo é realizar atividades que os motivem a aprender cada vez mais. O pesquisador conversou por videoconferência com a Educação em Revista.

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Parecer projeta a avaliação diagnóstica Em julho, o Conselho Estadual de Educação (CEED/RS) publicou um parecer que orienta o sistema de ensino sobre a construção de um planejamento pedagógico para a retomada das aulas. O documento prevê a realização de uma avaliação diagnóstica para apontar as lacunas na aprendizagem e ações de recuperação que evitem o abandono escolar e garantam a todos os estudantes o desenvolvimento das habilidades e competências esperadas ao fim do ano letivo. Segundo o Parecer nº 002/2020, isso envolve, entre outros pontos, adequações nas avaliações e na expressão dos resultados dos alunos. Para a pedagoga e consultora educacional Priscila Boy, as avaliações do final de trimestre e do final do ano devem dialogar com a prática durante o período de atividades domiciliares, com o que foi possível garantir em termos de aprendizagem. “Não faz sentido uma avaliação só com prova escrita ou de marcar se o trabalho do professor envolveu uma metodologia dialógica, com estímulo à escuta, à participação dos alunos. O objetivo não pode estar em atribuir uma nota, em aprovar ou reprovar, e sim em promover o aprendizado”, diz.

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Pedagógico ›››

Além do foco na retomada das lacunas de aprendizagem, outro importante aspecto que precisa ser trabalhado pelas escolas é a acolhida socioemocional. Segundo o CEED/RS, esse planejamento envolve “a promoção de diálogos com trocas de experiências sobre o período vivido (considerando as diferentes percepções das diferentes faixas etárias), bem como a organização de apoio pedagógico, de diferentes atividades físicas e de ações de educação alimentar e nutricional”. De acordo com Priscila Boy, a escola tem o desafio de equacionar as questões emocionais e manter a motivação dos estudantes, pontos prejudicados durante um longo período de afastamento. “É preciso promover atividades de escuta e de acolhida desses alunos e de suas famílias. Manter um diálogo aberto com foco no otimismo, na esperança, reforçando a preocupação com a questão da segurança sanitária para banir o medo”. 

CONTEÚDO ON-LINE DISPONÍVEL Confira a entrevista completa.

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››› Pedagógico DEPOSITPHOTOS

Mãos à obra Exemplo de como fazer o trabalho pedagógico no retorno às aulas: l As primeiras ações da escola devem estar centradas no acolhimento socioemocional dos estudantes, das famílias e dos educadores: pensar dinâmicas que permitam a escuta, o diálogo.

l O trabalho do professor deve centrar-se nos conhecimentos mais importantes, procurando estimular os alunos em suas habilidades e, a partir disso, trabalhar com as defasagens na aprendizagem.

l A escola precisa deixar claro o seu comprometimento com os protocolos sanitários e ter um posicionamento de otimismo, de esperança. l O planejamento também deve envolver uma avaliação diagnóstica, para verificar as lacunas de aprendizagem no retorno às aulas. lAs provas de final de trimestre e do ano letivo devem dialogar com a prática no período de ensino remoto e de retorno das aulas.

“É um grande erro pensar que vamos conseguir recuperar tudo” Professor emérito da Universidade de Kentucky, nos EUA, Thomas R. Guskey conversou com a Educação em Revista por videoconferência. Confira a seguir os principais trechos. Educação em Revista – De que forma é possível trabalhar para minimizar os impactos na aprendizagem no retorno às aulas? Thomas R. Guskey – Eu entendo que é um grande erro pensar que vamos conseguir recuperar tudo o que foi perdido nesse período. Não temos condições de pegar todo o conteúdo que ficou para trás e trabalhar em cima dele no retorno. Isso é muita coisa! É preciso focar no que é mais impor-

tante, no que os estudantes realmente precisam saber. Como a avaliação pode ser aliada nesse retorno? Existem duas abordagens para a avaliação. Uma delas é no sentido da accountability (uma espécie de prestação de contas, em tradução livre) e da classificação, de fornecer informações para a escola ou para os governos sobre o desempenho dos alunos. Já a segunda abordagem refere-se a fornecer aos estudantes feedbacks e ajudá-los a aprender. E eu penso que os professores precisam focar nessa abordagem da avaliação como ferramenta de feedback e de aprendizagem – isso é

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o mais importante para os estudantes neste momento. A avaliação neste sentido é usada para descobrir o que os estudantes sabem e o que eles não sabem e focar naquilo que eles precisam para obter o sucesso. Que dicas que você dá aos educadores na preparação para esse retorno presencial? São três coisas: primeiro, focar no que é mais crítico, mais fundamental para o aprendizado. Jamais pensar que vai conseguir dar conta de todo o conteúdo que ficou para trás. Segundo, usar as avaliações para dar aos estudantes informações sobre como promover o sucesso. Se fizer a avaliação e o aluno não for bem, é importante dizer para ele: “Ok, eu vou mostrar para você como podemos avançar”. E terceiro, reforçar aos estudantes que eles podem, que eles conseguem. Quando eles sentem que são capazes, se motivam para aprender mais. 


Pedagógico na prática ›››

››› À esquerda, aulas no Centro de

As primeiras escolas a reabrirem no país

FOTOS CENTRO DE ENSINO LITERATUS, DIVULGAÇÃO

Ensino Literatus; abaixo, higienização no Centro Educacional Meu Caminho

Retomada das escolas privadas de Manaus (AM) envolveu protocolo rígido de segurança, avaliação socioemocional dos alunos e ensino híbrido

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áscaras, marcadores de distanciamento social nas salas e rodízio de alunos nas aulas. Essas são algumas das medidas adotadas pelas escolas de Manaus para garantir a segurança de estudantes e educadores no retorno das atividades presenciais, após mais de três meses fechadas. A rede privada da capital do Amazonas foi a primeira do Brasil a reabrir as instituições de ensino, em 6 de julho, após a redução do número de mortes e de casos de coronavírus. Mas a preparação para o retorno não envolveu apenas um rígido protocolo sanitário: foi necessário um planejamento minucioso de como fazer a acolhida dos alunos e recuperar as lacunas de aprendizagem. “A primeira coisa que prestamos atenção foi na questão socioemocional dos alunos. Alguns perderam familiares pela doença, outros enfrentaram uma série de problemas em casa, como a redução

da renda. Essa escuta inicial é fundamental”, afirma a presidente do Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino Privado do Estado do Amazonas (Sinepe/ AM), Elaine Saldanha. O planejamento também levou em conta a importância da escola como espaço de socialização, mesmo diante do distanciamento social. Ela faz um alerta: “é preciso muito cuidado para evitar ficar apenas no não: não pode fazer isso, não pode aquilo, o que estimula o medo.” O segundo momento do retorno envolveu a avaliação diagnóstica para mapear as lacunas de aprendizagem e minimizar as perdas durante os três meses e meio de atividades remotas. Elaine afirma que os desafios são grandes. “Não temos 100% de alunos nas turmas, trabalhamos com o ensino híbrido. Isso exige que o professor atue como mediador da aprendizagem, identificando as necessidades de cada um e trabalhando em cima delas”. 

Os detalhes do retorno presencial em Manaus l As escolas privadas tiveram autorização para reabrir em 6 de julho. A rede pública retornou em agosto. l As famílias puderam optar em enviar os alunos para a escola ou seguir com as atividades a distância. l Foi organizado rodízio nas turmas: metade vai à escola num dia, metade em outro. Quem fica em casa, acompanha as atividades a distância. Entrada e saída dos alunos escal lonada em diferentes horários para evitar aglomeração. l Os protocolos sanitários envolvem ainda: distanciamento social de 1,5 metro, aferição de temperatura, limpeza constante, proibição de compartilhamento de materiais. l O planejamento pedagógico inclui diálogo com os pais e acolhida socioemocional dos alunos.

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››› Gestão

Digitalização acelerada Da educação dos alunos à relação com as famílias, quase todas as atividades escolares são hoje mediadas por ferramentas on-line – um efeito da pandemia do coronavírus

TATIANA PY DUTRA

tatianapydutra@gmail.com

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pandemia de Covid-19 forçou até o mais resistente dos professores a entrar na era da educação digital. Mas o trabalho exige mais do que boa vontade. É preciso dominar o novo universo para conquistar a atenção de estudantes, disputada

agora com os confortos do lar. Professor de Filosofia em três escolas privadas de Santa Maria, Andrei Cerentini adaptou suas aulas embasado nas reações dos alunos. Após notar que as lives expositivas com uso de PowerPoint deixavam os alunos “cansados”, ele adotou atividades mais dinâmicas e interativas. “Comecei a mesclar tempo de fala, exercícios e vídeos, com tirar dúvidas

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no chat, mostrar fotos e indicar livros e links. A linguagem da aula também mudou porque o desempenho deles não é o mesmo”, diz o professor. Para as atividades assíncronas, Andrei se dedicou a explorar ferramentas do Google Meet e do Zoom para gravar podcasts com dúvidas da turma. Os deveres de casa foram reduzidos. “Eles se estressam, estão muito cansados”, diz.


Gestão ››› DEPOSITPHOTOS

zinhos sem as trocas com os colegas. Nessa situação, assistir a lives como se estivessem em sala de aula as deixam pressionadas”, explica. O desafio é ainda maior na Educação Infantil, em que, para evitar a dispersão, o plano de atividades precisa contemplar elementos que despertem a curiosidade e a afetividade da criança. “Será um bom planejamento, por exemplo, propor jogos ou histórias que lhe agreguem valor afetivo, como as que envolvem personagens que elas gostem ou, ainda, que sejam construídos contendo elementos que lhe remetem a boas vivências e memórias, como fotos dos colegas”, sugere a coordenadora do Colégio Arquidiocesano, de São Paulo, Rosana Marin.

Reforço na gestão via ferramentas digitais

Coordenadora de pós-graduação em Educação da Universidade de Brasília (UnB), Claudia Pato afirma que o contexto da pandemia é um componente extra na queda da concentração de crianças e adolescentes. “É diferente estar em uma aula remota em ambiente adequado, sem o contexto de incerteza, confinamento e outras restrições. Crianças e adolescentes, que são muito sociáveis, se veem so-

Além da manutenção de aulas e simulados, as ferramentas digitais também permitem o funcionamento de setores como tesouraria e secretaria do Colégio Dom Feliciano, de Gravataí. Até mesmo a biblioteca está à disposição dos 1,9 mil alunos da instituição, para leituras on-line. A comunicação com as famílias é feita via telefone ou redes sociais, enquanto os serviços de psicologia e coordenação pedagógica seguem por videoconferência. Reuniões entre as equipes, realizadas em plataformas como Zoom e Google Meet, têm mais frequência. “A gestão, mais do que nunca, está sendo testada. Temos de planejar diariamente, criar soluções estratégicas para diferentes cenários, fazer investimentos da área tecnológica à sanitária. É uma gestão malabarista, mas com segurança total”, comenta a diretora, Irmã Jane Segaspini. Doutora em Psicologia Clínica pela Universidade de São Paulo (USP), Fabiana Gauy recomenda que os gestores usem as plataformas disponíveis

para aumentar a comunicação com a comunidade escolar. “Emocionalmente, é importante uma comunicação clara. Pior que dar informação ruim é não dar informação nenhuma. É importante criar grupos de apoio, conversas com mediador, no qual a instituição tenha um contato mais direto com pais e alunos”, sugere.

Caminho sem volta: 2020 será um marco Professores, diretores e especialistas são unânimes em um ponto: o mergulho tecnológico provocado pela pandemia não tem volta. Muitas das práticas adotadas sob pressão, no primeiro trimestre deste ano, se tornarão permanentes e continuarão sendo aprimoradas após o fim do isolamento. Painelista do 3º Congresso Nacional da Federação Nacional das Escolas Particulares (Fenep), o doutor em Educação Paulo Tomazinho orienta que as escolas construam um modelo de aprendizagem híbrida flexível, com atividades síncronas e assíncronas – inclusive para alunos que não vão voltar à sala de aula após o isolamento. “É a família que vai decidir se leva ou não. Teremos de pensar numa subdivisão de turmas. O que fazer com a criança que está presente em sala e com a que está em casa? Isso complica substancialmente o planejamento pedagógico para que, presencial ou remoto, tenha os mesmos objetivos”, afirmou, durante o evento. Diante dos imensos desafios que apontam no horizonte, Irmã Jane Segaspini prevê um novo ambiente escolar no futuro: “para mim, 2020 vai ser um marco decisivo para a educação no Brasil e no mundo. É um processo difícil, mas se sairão bem os criativos, os que planejam e os que têm estratégias de sobrevivência”. Segue ›››

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››› Gestão REPRODUÇÃO

››› Colégio Dom Feliciano, de Gravataí, está entre as instituições que adotaram as reuniões via plataformas digitais Algumas ferramentas populares Aulas síncronas e reuniões Para os encontros virtuais: Google Meet Zoom.Us Loom Skype

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Integrar sistema acadêmico Para treinar professores: Microsoft for Education G Suíte for Education Black Board Canvas LMS

Interação assíncrona Para quiz, gamificação, revisão etc: Kahoot Socrative Mentimeter


Gestão na prática›››

Das aulas ao aniversário, tudo virtual Dom Bosco, de Santa Rosa, implementou avaliação e até mesmo comemoração remota

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equipe do Colégio Salesiano Dom Bosco, de Santa Rosa, levou menos de 20 dias para implementar uma rotina de trabalho on-line com a chegada da pandemia. Definidos os Google Meet e Google Classrom como ferramentas principais para o retorno, professores, funcionários, alunos e pais superaram as expectativas. Houve avaliações on-line, recesso e, até, ações de comemoração pelos 60 anos da escola. “Nos reinventamos. Pensamos muito além dos muros da escola, fora da caixa”, diz a diretora-executiva, Ieda Maria Zalamena Gruber.

O aniversário, em maio, contou com bolos de aniversário, vídeos, músicas e poemas produzidos pelos alunos, além de uma ação presencial que sensibilizou a comunidade escolar: “a professora Bruna Horn, de Teatro, se inspirou na fitinha do Senhor do Bom Fim para criar a Fita da Gratidão. Convidamos cada família, cada aluno, a fazer sua fita e amarrar na grade em frente da escola. Cada uma foi no melhor momento para si, com segurança”, relata a diretora. A trajetória exigiu ajustes constantes. No início, foi feito o mapeamento das necessidades dos docentes com relação a hardware, software e velocidade da internet. O tempo de aulas síncronas foi reavaliado, após discussão virtual com as famílias, levando em consideração a efetividade do aprendizado. Com o mesmo fim, o plano de contingência da escola previu um recesso entre 1º e 14 de ju-

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lho, para descanso de alunos e famílias. A pausa abriu um pequeno hiato na recente experiência de avaliação semestral. Os alunos do 6º ano do Ensino Fundamental até o Médio vão demonstrar conhecimentos por provas e testes via Google Forms ou por trabalhos. “A confiança é um valor com o qual precisamos contar nessa pandemia. Conversamos com os alunos e explicamos que não achávamos que era a melhor forma, mas que iríamos confiar na integridade e na honestidade de cada um”, comenta Ieda. A diretora acrescenta que os estudantes também foram convidados a autoavaliar suas atividades com critérios como presença, participação e estratégia de estudos: “valorizamos muito o protagonismo do aluno, e esse será um dos legados dessa experiência: a autonomia dos estudantes”.

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››› Inovação

As orientações da OMS Recomendações para as escolas: O que considerar para reabrir l Compreensão sobre a transmissão da Covid-19 e severidade em crianças. l Situação da epidemia onde as escolas estão localizadas. l Possibilidade de manutenção, pelas escolas, de medidas de prevenção e controle da Covid-19.

››› Medir a temperatura está entre as iniciativas, como nessa escola na Malásia

Retorno controlado Escolas de todo o mundo tiveram que se adaptar aos novos tempos para retomar as aulas presenciais. Confira as ações em outros países

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nquanto o Brasil ainda enfrenta um período delicado com a pandemia da Covid-19 e espera pelo momento da volta à normalidade nas escolas, com o retorno das aulas presenciais, em outros países isso já ocorreu. São locais onde o coronavírus chegou mais cedo ou foi controlado com maior eficiência. Fato é que servem como exemplos de quais protocolos – e de que forma – foram aplicados para que alunos, professores e funcionários voltassem a frequentar, diariamente, as instituições de ensino. O tema é importante e mereceu, inclusive, atenção da Organização Mundial da Saúde (OMS). A reportagem da Educação em Revista entrou em con-

tato com a entidade, sediada em Genebra, na Suíça, para questionar sobre as orientações. Como resposta, a OMS encaminhou documentos (que podem ser acessados via QR code, em destaque nesta página) e comentou sobre a realidade escolar. “A transmissão em escolas precisa ser compreendida em um contexto mais amplo de transmissão na comunidade. Decisões quanto à reabertura de escolas devem ser parte de uma estratégia ampla, de longo prazo e baseada em dados”, informou a OMS. Confira nestas páginas algumas orientações gerais da entidade, bem como o que outros países fizeram para a volta às aulas presenciais.

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Alguns cuidados sugeridos l Ensinar a todos na escola sobre prevenção: lavar as mãos, uso de máscara, informar sintomas da Covid-19 e cumprimento sem contato. l Criar um cronograma para lavar as mãos, especialmente para os pequenos, e garantir o abastecimento de álcool em gel, sabão e água, com pontos para o uso. l Limpeza e desinfecção frequente de superfícies de contato, como maçanetas, brinquedos, mesas, interruptores de luz e capas de livros. l Protocolo de higiene no transporte escolar, incluindo uma criança por assento, com ao menos um metro de distanciamento, e janelas abertas (se possível). l Providenciar máscaras para quem precisar e afastar alunos ou funcionários doentes. l Reforçar a política do “fique em casa” para quem tiver algum sintoma, criando um checklist de fatores. l Manter distância de um metro, com distanciamento entre classes.

MIKE RYAN Diretor Executivo do Programa de Emergências da OMS

“Existem questões reais sobre como as escolas podem reabrir com segurança, mas a melhor e mais segura maneira é no contexto de baixa transmissão comunitária”


Inovação ›››

China

Inglaterra Leidisiane Marcon é tecnóloga em radiologia e mora em Derby, na Inglaterra, há 11 meses. Ela tem um filho, Gabriel, de 11 anos, que está no quinto ano do Ensino Fundamental (equivalente ao Brasil) em uma escola pública, e conta como foi a experiência do retorno às aulas em meio à pandemia. “Recebemos uma enorme lista de exercícios que seriam ensinados até o final do período escolar. Fizemos nossa própria organização, sem ter recebido nenhuma orientação. Soubemos que algumas escolas privadas tiveram maior suporte aos alunos, com aulas on-line, e maior acompanhamento dos professores, mas não foi o nosso caso”, conta. Gabriel ficou sem aulas presenciais entre 20 de março e 15 de junho. No retorno, a escola enviou e-mails mostrando as mudanças na rotina, até para que os pais instruíssem os filhos a seguir as novas regras de distanciamento social. O exemplo britânico: l Em 15 de junho, as aulas retornaram para os primeiros e os últimos anos do ensino primário (devido à preparação para o secundário). l Nenhum pai foi obrigado a enviar os filhos para a escola, cabendo a eles avaliar se havia segurança para tanto. Em tempos normais, faltas não justificadas podem valer uma multa de até 100 libras esterlinas. Agora, não há mais essa cobrança. l As escolas receberam marcações no piso. Indicavam sentidos únicos para os corredores e, também, distâncias de dois metros entre as pessoas para as filas. l Bibliotecas escolares foram fechadas. l As escolas públicas inglesas forneciam materiais como lápis, caneta e cadernos, que eram compartilhados. Agora tudo é individual. l Com turno reduzido, as crianças chegam mais tarde, sempre higienizando as mãos com álcool em gel, e saem mais cedo. Às sextas, a escola passa por uma higienização mais ampla. l Houve separação das crianças em “bolhas” com oito delas, cada uma.

CONTEÚDO ON-LINE DISPONÍVEL Confira as orientações da OMS para as escolas (em inglês).

Portugal Glauco Menegheti é brasileiro, 50 anos, e atua como consultor de marketing em Coimbra, há um ano e meio. Ele é pai de Domenico Evaristo Menegheti, 4 anos, que está no infantário, o equivalente ao jardim de infância no Brasil. O garoto ficou fora do Jardim Escola João de Deus, instituição privada, entre março e meados de junho. No retorno em meio à Covid-19, Menegheti só consegue buscar o filho em horários reduzidos. “Agora só é possível pegá-lo até 17h30min, 17h45min. Antes, era até as 19h. Toda a logística foi repensada para evitar o contato entre alunos de diferentes séries”, explica. O pai de Domenico ficou ressabiado quanto à volta presencial, mas se tranquilizou ao conhecer os protocolos da escola, considerados por ele como bem rígidos. Domenico almoça e lancha na escola, em refeições coletivas, mas só entre a turma. Não é permitido levar comida ou roupas para a escola. Como exemplo, o pai cita cuidados sanitários. “Sapatos, agora são dois. Um que ele chega e é deixado na entrada, e outro que ele calça quando entra. Antes de entrar na sala, ainda na rua, a auxiliar já mede a temperatura. Se estiver com febre, não entra”, conta Meneghetti. Ele ainda afirma que o número de coleguinhas diminuiu. Por dois motivos: alguns pais e mães mantiveram os filhos em casa, por preocupação. Outros perderam o emprego e não conseguem mais pagar o infantário. O isolamento, para Menegheti, é difícil na infância. “As crianças se tocam, se abraçam e não têm muita noção do perigo real da doença. Nos recreios, que agora são em horários diferentes, os brinquedos são desinfectados”, explica.

País em que surgiu a doença, foi um dos primeiros a retomar as atividades, em abril. Os principais cuidados são: lUso obrigatório de máscaras, substituídas várias vezes durante o turno. lOs alunos receberam pulseiras eletrônicas para monitorar casos suspeitos de infecção. A medição da temperatura ocorre ainda antes de sair de casa, enviada via QR Code para os professores. Na escola, passam por um scanner de temperatura. lOs estudantes levam um kit com materiais individuais, como toalha de rosto, lenço de papel e lenço umedecido, álcool em gel, saco de lixo, talheres para o almoço e máscaras. lParte dos colégios fechou seus refeitórios. Os alunos comem nas salas de aula. Os que mantiveram cantinas abertas evitam que as crianças se alimentem na mesma mesa. lAlgumas escolas instalaram tendas de desinfecção.

Alemanha Começou o processo gradual de retorno no fim de abril: l As escolas implementaram alternância das classes para diminuir o número de alunos no mesmo período. Os estudantes foram separados em grupos. l As classes foram afastadas e as turmas, divididas em 10 alunos para haver distância de pelo menos 1,5 metro. lOs estudantes passam o intervalo com os colegas de classe mas não podem interagir com os de outras turmas. lPara os alunos mais velhos, foi instituído o uso obrigatório de máscaras. lCada criança tem de levar seu lanche. lOs intervalos foram escalonados. lLocais de uso comum, como corredores, viraram espaços de mão única. lProfessores e alunos foram orientados a usar agasalho para que as janelas e portas fiquem abertas e o ar circule. lAs salas são desinfectadas.

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››› Pesquisa

Elton Fischer Doutorando em Educação - Estudos Culturais na ULBRA/RS, Mestre em Letras pela Universidade de Passo Fundo (UPF). Professor Assistente da Ulbra, campus Carazinho/RS. E-mail: elton.fischer@yahoo.com.br

Intolerância religiosa: identidade e diferença Palavras-chave: intolerância religiosa; identidade; cultura; diferença.

Resumo:

A

questão da crise de identidade é extensamente discutida nos mais diversos campos do conhecimento, em especial, nos estudos culturais. De acordo com Hall (2006), as velhas identidades, que por tanto tempo estabilizaram o mundo social, estão em declínio, fazendo surgir novas identidades e fragmentando o indivíduo moderno, até aqui visto como um sujeito unificado. Essa crise é tida como parte de um processo mais amplo de mudança, que está demovendo as bases da sociedade moderna e influenciando diretamente os pontos cardeais que permitiam aos indivíduos uma âncora estável no mundo. Sob certo viés, essa estabilidade é confrontada a partir da análise dos discursos de um grupo de discentes de uma universidade privada do Norte do Rio Grande do Sul acerca das práticas religiosas do outro. O artigo procura analisar essa disjunção na medida em que a intolerância religiosa se manifesta, seja por exclusão ou desconhecimento. Em meio ao rito de passagem – modernidade para pós-modernidade –, a afirmação de que as identidades modernas estão sendo “descentradas”, deslocadas ou fragmentadas nos parece extremamente atual.

Quais identidades? O colapso das identidades modernas é objeto de pesquisa de vários teóricos, inclusive do campo dos estudos culturais. A ideia é que há uma mudança estrutural em curso que está transformando as sociedades modernas do final do século XX e início do século XXI. As paisagens culturais de gênero, sexualidade, etnia, raça e nacionalidade estão em processo de metanoia (mudança essencial de pensamento ou caráter) e que, no passado, nos serviam como bússola. Ocorre o que Hall (2006) denomina como um duplo deslocamento à descentração do sujeito: questionam sua própria identidade e o seu lugar no mundo social. Ao longo da Idade Média – séculos V ao XV –, a humanidade foi regrada pelos princípios da religião/igreja, das crenças, costumes e tradições vigentes na época. Com o advento da modernidade e o deslocamento do teocentrismo, atribui-se à razão, à verdade (seja ela qual for e em que contexto estiver inserida) e ao conhecimento o papel central na condução da história do homem. Esses processos de mudança, tomados em conjunto, representam uma transformação tão fundamental e abrangente que somos compelidos a perguntar se não é a própria modernidade que está sendo transformada. O outro aspecto a avaliar é a afirmação de que aquilo que é descrito, algumas vezes, como nosso mundo pós-moderno, nos inclui e que, desde o Iluminismo, se propõe a definir a essência de nosso ser

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e fundamentar nossa existência como sujeitos humanos. Segundo Hall, existem [...]três concepções de identidade: o sujeito do Iluminismo, o sujeito sociológico e o sujeito pós-moderno. O sujeito do Iluminismo estava baseado numa concepção da pessoa humana como um indivíduo totalmente centrado, unificado, dotado das capacidades de razão, de consciência e de ação, cujo “centro” consistia num núcleo interior, que emergia pela primeira vez quando o sujeito nascia e com ele se desenvolvia, ainda que permanecendo essencialmente o mesmo – contínuo ou “idêntico” a ele – ao longo da existência do indivíduo. O centro essencial do eu era a identidade de uma pessoa. A noção de sujeito sociológico refletia a crescente complexidade do mundo moderno e a consciência de que este núcleo interior do sujeito não era autônomo e autossuficiente, mas era formado na relação com “outras pessoas importantes para ele”, que mediavam para o sujeito os valores, sentidos e símbolos – a cultura dos mundos que ele/ela habitava. No sujeito pós-moderno a identidade torna-se móvel: formada e transformada continuamente em relação às formas pelas quais somos representados ou interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam (HALL, 1987). E definida historicamente, e não biologicamente. O sujeito assume identidades diferentes em diferentes momentos, identidades que não são unificadas ao redor de um ‘’eu” coerente. (HALL, 2006, p.10)

Essas identidades fluídas e contraditórias são tensionadas em diferentes direções, de tal modo que nossas próprias identidades estão sendo continuamente descentradas e postas à prova a fim de que


Pesquisa ››› o “eu coerente” se mantenha. As representações do “eu” que estão sendo veiculadas, instituídas e valorizadas na questão de identidades, em sua maioria, não são de pessoas da raça negra ou das minorias e, em razão disso, são aqueles que historicamente enfrentam restrições, discriminação e preconceito por suas características sociais, econômicas e culturais.

A pesquisa-ação sobre a intolerância religiosa Em meio às discussões e debates relacionados às diferentes práticas dos sujeitos, adveio o problema de pesquisa que resultou neste artigo. Que fatores contribuem para a crescente tensão relacionada aos princípios religiosos, cultura e práticas do outro? Quais condutas podem ser consideradas como intolerantes? A intolerância religiosa no país estaria relacionada a elementos históricos, étnicos ou culturais? Tais interrogações estão ligadas ao intuito de conhecer mais sobre o tema com o propósito de preparar os acadêmicos e a sociedade no sentido de respeitar a diversidade de opiniões e posicionamentos frente aos mais diversos assuntos, especialmente os de cunho identitário. Inicialmente, buscamos apoio teórico – por meio de pesquisa bibliográfica sobre o tema – e, num segundo momento, desenvolvemos um trabalho aplicado, em forma de uma pesquisa-ação, junto a uma turma de discentes do Ensino Superior, alunos da disciplina de Cultura Religiosa, componente curricular ministrado por este docente, na Universidade Luterana do Brasil (ULBRA), campus Carazinho/RS, no ano de 2018. Com base nos discursos observados nas aulas da disciplina aplicadas em semestres anteriores, desenvolvemos a hipótese de que os discentes matriculados na disciplina demonstrassem, em algum grau, preconceitos acerca de religiões e/ ou práticas religiosas diferentes das suas. Para confirmar ou refutar essa hipótese, aplicamos aos sujeitos um questionário inicial, de 10 questões, com intuito de

observar, a partir da análise do discurso constitutivo das respostas, se nelas se evidenciava teor de preconceito contra alguma prática religiosa. O estudo teve dois objetivos principais: a) investigar a concepção dos alunos sobre outras tradições religiosas, observando se manifestavam preconceitos em relação a elas e de que forma esse elemento seria um “marcador” de sua identidade; b) desenvolver um trabalho em sala de aula com vistas à desconstrução de discursos preconceituosos acerca das 1tradições religiosas de diversas ordens. A análise inicial do questionário evidenciou certos preconceitos por parte dos alunos. Com base nos dados, buscamos identificar as práticas apontadas negativamente e propomos desenvolver um trabalho de pesquisa e socialização sobre a diversidade cultural religiosa, tentando demonstrar que, nesse cenário tão diversificado, cada tradição religiosa tem importância social e faz parte de uma tradição cultural relacionada à formação de identidades. A proposta didática desenvolvida com os alunos ao longo do semestre foi realizada contemplando pesquisa acerca das religiões (ritos, crenças, objetos cultuados, origem cultural) e socialização dos resultados em forma de seminários nos quais os alunos foram protagonistas. O ápice da pesquisa se deu com a realização de um fórum sobre diversidade religiosa, para o qual foram convidados representantes de algumas tradições religiosas. As atividades de pesquisa e as apresentações ocorreram nas aulas, acompanhadas e mediadas pelo professor. A linha matriz do trabalho prático desenvolvido foi construir conhecimentos sobre o tema e tecer reflexões que ajudassem a desconstruir concepções preconceituosas. Imaginou-se que, ao pesquisarem e debaterem, os alunos fossem, ao mesmo tempo, construindo conhecimentos sobre outras religiões (que não a apenas por eles praticada) e, assim, desmitificando concepções equivocadas e/ ou preconceituosas que podem ter cons-

truído em relação a alguma das muitas práticas religiosas que coexistem na nossa sociedade em virtude da diversidade cultural que a constitui. O intuito foi tentar promover o conhecimento, mesmo que básico, acerca de algumas tradições religiosas e, com ele, o respeito às diferenças. A pesquisa se configurou como de natureza qualitativa que, por meio da pesquisa-ação, propõe mediar a lacuna entre teoria e prática e intervir no decorrer do próprio processo. Acreditamos que a partir dessas reflexões, podemos, além de apresentar alguns pressupostos para o problema norteador, potencializar a experiência de formação dos sujeitos, revelando as suas singularidades. Cabe destacar que o atual conceito de tolerância, como mobilizador de consciências, conforme o seu desenvolvimento histórico, não pode ser confundido com seu uso trivial. Como evidencia a Constituição Federal de 1988, a liberdade de religião engloba três tipos distintos, porém intrinsecamente relacionados, de liberdades: a liberdade de crença; a liberdade de culto; e a liberdade de organização religiosa; e estes têm o intuito de promover uma atitude de respeito e apreço ou, ainda, atitude ativa fundada no reconhecimento dos direitos universais da pessoa humana, conforme declaração da UNESCO2 . Tolerância é, antes, uma atitude de engajamento no combate à intolerância e, no escopo de nossa pesquisa, seria melhor compreendida sob o viés da alteridade. 1 O convite foi enviado a algumas tradições religiosas representadas na região de Carazinho/RS. Participaram representantes da IELB (Igreja Evangélica Luterana do Brasil); IECLB (Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil); Igreja Católica Apostólica Romana; IPC (Igreja Presbiteriana de Carazinho) e uma Ialorixá do Candomblé. 2 “[...] o respeito, a aceitação e o apreço da riqueza e da diversidade [...] não é concessão [...] é uma atitude ativa fundada no reconhecimento dos direitos universais da pessoa humana e das liberdades fundamentais do outro [...] Praticar a tolerância não significa [...] renunciar as próprias convicções, nem fazer concessões a respeito. A prática da tolerância significa que toda pessoa tem a livre escolha de suas convicções e aceita que o outro desfrute da mesma liberdade. Significa que ninguém deve impor suas opiniões a outrem.” (UNESCO, 1995, p. 11)

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››› Pesquisa

Como mudar o cenário? Os conceitos de discriminação e de desigualdade no Brasil não dizem respeito apenas às questões socioeconômicas, mas passam essencialmente pelas dimensões culturais, religiosas e étnico-raciais. Infelizmente, a discriminação e suas distintas dimensões são marcas da nossa sociedade, muitas vezes postas em prática pelo próprio Estado. Como exemplo, citamos as etnias pretas, pardas, indígenas e outras minorias e tradições religiosas, em que pese a laicidade do Estado, que, lamentavelmente, são invisíveis para grande parte das políticas públicas. De acordo com dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), os indicadores sociais apontam que 76% da população mais pobre é negra; 79,4% de pessoas analfabetas são negras; 62% das crianças que estão fora da escola são negras; em média, a renda de negros é 40% menor do que a de brancos. Esse desencontro, histórico e socialmente constituído, marca as identidades de ambos os lados e ocorre em meio ao sincretismo e multiculturalismo do século XXI. Aliás, para Hall (2000), o hibridismo, o sincretismo e a fusão entre tradições culturais diferentes “produzem novas formas de cultura apropriadas à modernidade tardia, mas possui custos e implica no relativismo, na perda de tradições locais e no aumento dos fundamentalismos” (FERRETTI, 2014, p.22). Assim o sujeito que fala e é ouvido é aquele que detém o discurso e o poder (salvo exceções, é o fundamentalista, o radical ou o “xiita”). Em suma, estamos cotidianamente imersos em uma cultura do sentido, na qual assumimos a posição de sujeito diante de coisas do mundo que colocamos a nossa frente como objetos: interpretamos, avaliamos, usamos, organizamos, ou seja, construímos discursos que façam com que tais coisas sejam inteligíveis para nós. Assim fazemos com as nossas diferenças e criamos grupos identitários. Tais sentidos, exatamente por serem construídos,

estão sujeitos a flutuações, transformações, não sendo nunca permanentes. (CASTRO, 2015, p.34)

A determinação do discurso, especialmente o intolerante, é extremamente complexa, pois há um campo da manipulação consciente e um da determinação inconsciente. O campo da manipulação consciente é aquele no qual o enunciador lança mão de estratégias argumentativas e de outros procedimentos para criar efeitos de verdade e de realidade, com a finalidade de convencer seu interlocutor. Sob certo ponto de vista é o que justamente ocorre nos discursos de ódio dos intolerantes. O enunciador organiza sua estratégia discursiva em função de um jogo de imagens: a imagem que ele tem do interlocutor, a que ele pensa que o interlocutor tem dele, a que ele deseja transmitir para o interlocutor no sentido de, num primeiro momento convencê-lo ou, se não tiver êxito, confrontá-lo ou subjugá-lo. Nesse campo do discurso se inserem e se constituem os sujeitos que agem/ falam e (re)definem sua identidade no encontro ou desencontro com o outro. [...] as identidades podem funcionar, ao longo de toda sua história, como pontos de identificação e apego apenas por causa de sua capacidade de excluir, para deixar de fora, para transformar o diferente em ‘exterior’, em abjeto [...] A unidade, a homogeneidade interna, que o termo ‘identidade’ assume como fundacional não é uma forma natural, mas uma forma construída de fechamento: toda identidade tem necessidade daquilo que lhe ‘falta’ – mesmo que esse outro que lhe falta seja um outro silenciado e inarticulado. (HALL, 2000, p. 110)

A eficácia simbólica das palavras não está nas formas de argumentação, de retórica e de estilística. A palavra precisa ser apresentada e reconhecida como legítima, o que depende de condições institucionais para que o discurso seja reconhecido. A escolha das palavras possui também importância decisiva. As palavras possuem um significado

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simbólico, incluem carga ideológica, relações sociais de comunicação e dominação e estão associadas a preconceitos que geram a discriminação e culminam com a intolerância. O conceito daquilo que é moral está em crise. Há no mundo todo tipo de atritos, de turbulências, de descompasso, onde a vida em sociedade beira o caos. Em nosso país são discussões e disputas políticas, econômicas, religiosas, de gênero, raça e de toda sorte de manifestação humana. É um meio fértil onde prosperam os discursos de ódio e a intolerância e ficam evidenciadas, no discurso, as identidades e diferenças dos sujeitos. Cabe a cada um pensar e pesar as palavras no sentido de olhar para outro, que é diferente de mim, como a parte que me falta, a semelhança ou a diferença que irá me constituir em um sujeito mais “tolerante”, evoluído e que tenha a alteridade como mediadora do discurso. REFERÊNCIAS CASTRO, Daniele. Corpo à deriva: pensando diferença e identidade sob a perspectiva da cultura da presença. Vozes e Diálogos. Itajaí, v. 14, n. 01, jan./jun. 2015. Disponível em: https:// siaiap32.univali.br/seer/index.php/vd/article/ view/7363. Acesso em: 22 de jun/2020. FERRETTI, Sérgio F. Sincretismo e Hibridismo na Cultura Popular. Revista Pós Ciências Sociais. v.11, n.21, jan/jun. 2014. Disponível em: http://www.periodicoseletronicos.ufma. br/index.php/rpcsoc/article/view/2867/2686. Acesso em: 14 dejul/2020. HALL, Stuart. Quem precisa da identidade? In: SILVA, Tomas Tadeu da (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos estudos culturais. Petrópolis: Vozes, 2000. A identidade cultural na pós-modernidade; tradução Tomaz Tadeu da Silva, Guaracira Lopes Louro -11ª. ed. -Rio de Janeiro: DP&A, 2006. IPEA – Disponível em: https://www.ipea.gov. br/portal/. Acesso em: 17de jun.2020. PERALVA, Angelina. O jovem como modelo cultural. In: FAVERO, Osmar; SPÓSITO, Marília Pontes; CARRANO, Paulo. NOVAES, Regina Reys. Juventude e Contemporaneidade. – Brasília: UNESCO, MEC, ANPEd, 2007. P. 13-27. Disponível em: https://unesdoc.unesco. org/ark:/48223/pf0000154569. Acesso em: 25 de mai/2020.


Internacional ›››

No Exterior, sem sair de casa Pandemia evidencia uma nova forma de internacionalização da Educação Superior: a experiência direto do lar

A

pandemia do coronavírus impôs uma nova realidade para a educação: aulas presenciais foram suspensas, professores passaram a usar aplicativos de videoconferência para ensinar e os estudantes trocaram o campus pela tela do computador para aprender. Mas os efeitos da Covid-19 vão além das mudanças no ensino e na aprendizagem: o processo crescente de internacionalização das Instituições de Educação Superior (IES) foi um dos mais afetados com o cancelamento de

voos, fechamento de fronteiras e impossibilidade de realização de viagens de intercâmbio acadêmico. Diante desse contexto, a consultora do Departamento de Relações Internacionais (DRI) do Sinepe/RS, Dra. Liane Hentschke, afirma que as ações de mobilidade acadêmica são as mais afetadas: “As universidades, em vários países, estão reticentes em voltar ao ensino presencial. Alternativas como o modelo híbrido de ensino e aprendizagem (presencial e virtual) serão utilizadas”. Segundo ela, o caminho para manter o trabalho de internacionalização, é olhar para além da mobilidade acadêmica. “O conceito de internacionalização vai muito além do envio e recebimento de alunos e professores. O foco é institucionalizar a internacionalização para que as IES estejam cientes do que acontece em universidades ao redor do

mundo e preparadas para lidar com os desafios desse contexto globalizado”, afirma, ao reforçar que a pandemia nos mostrou a importância desse olhar global, de compreender que os acontecimentos em outras regiões do planeta vão impactar no modo como vivemos. Gestores, assim como professores e alunos, que tinham viagens de estudos e pesquisa programadas para este ano, podem estar apreensivos diante da necessidade de suspensão temporária de programas no Exterior. Mas a consultora do Sinepe/RS destaca que o momento exige adaptações e, sobretudo, muita calma, sem jamais interromper o caminho já trilhado pelas IES no processo de internacionalização. Segundo Liane, rumores de que a pandemia pode significar o final da internacionalização, devem ser vistos com cautela. Segue ›››

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››› Internacional A coordenadora-executiva do Escritório de Cooperação Internacional da PUCRS, Carla Cassol, aponta três estágios de mudanças no processo de internacionalização decorrentes da pandemia. O primeiro, no início da proliferação global do vírus, consistiu em gerir a crise provocada pela interrupção das aulas e das viagens internacionais, dando suporte a professores e alunos que tinham intercâmbios programados no Exterior e a estrangeiros que estavam no Brasil e precisavam retornar aos seus países de origem. Um segundo momento, em desenvolvimento, envolve a adaptação dos programas para uma mobilidade virtual – em que não é necessário sair de casa para participar de aulas e atividades de pesquisa com colegas estrangeiros. O terceiro estágio se dará, segundo ela, com a retomada da possibilidade das viagens. E aí que vem a novidade: o “novo normal” em termos de internacionalização envolverá a junção de atividades presenciais e a distância. “Com a necessidade de fazer essa adaptação para uma mobilidade virtual, nós percebemos que esse modelo garante a participação de pessoas que não teriam condições financeiras ou de tempo para uma viagem ao Exterior, mas

que agora podem contar com uma experiência virtual de internacionalização sem sair de casa. Claro que precisamos considerar todos os benefícios de uma mobilidade presencial, como a imersão cultural, então tenho convicção de que o futuro será híbrido”, afirma Carla.

O futuro exige uma educação híbrida Na mobilidade virtual, ferramentas tecnológicas – como aplicativos de videoconferência – são usados para que alunos estrangeiros acompanhem as aulas de suas casas. Eles também podem participar de eventos culturais online, acessar acervos digitais de bibliotecas e desenvolver trabalhos em grupo. Liane Hentschke diz que inúmeras novas possibilidades surgiram no contexto emergencial da pandemia. Agora é preciso aprimorar os processos para promover uma experiência qualificada, sem deixar de lado as perspectivas de retomada das atividades presenciais. “O mais importante para as instituições neste momento é continuar com a abordagem de criar uma instituição internacionalizada. Precisamos desen-

volver alternativas, e as tecnologias de informação e comunicação aparecem como importantes aliadas, mas é fundamental compreender que a mobilidade acadêmica presencial é importante e será retomada. Não sabemos ainda quando, mas precisamos estar preparados para esse retorno”, afirma a consultora de internacionalização do Sinepe/RS. Carla concorda que as ações desenvolvidas antes da pandemia precisam ser mantidas, com adaptações, para que a instituição não perca o que já foi conquistado no âmbito da internacionalização e tenha de recomeçar quando a situação estiver controlada. “É preciso entender que a internacionalização pode ser feita dentro do currículo acadêmico, em casa, sem precisar viajar. Mesmo que o processo seja incipiente em algumas instituições, elas já possuem parceiros estratégicos e precisam manter a interlocução com esses parceiros, além de trabalhar em cima das possibilidades”, afirma a especialista. Ela ainda acrescenta uma dica: “Neste momento, não vale a pena investir em novos parceiros, mas focar em ações já existentes que têm relação com o trabalho da instituição e que agregam valor para a comunidade”.

Quatro passos para manter o foco Medidas úteis para o processo de internacionalização:

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O caminho até a retomada das atividades presenciais está na mobilidade virtual. Instituições devem focar nesta opção, permitindo que seus alunos e professores participem de programas de universidades do Exterior a distância e disponibilizando alguns dos seus cursos a estrangeiros.

1

Compreender que a internacionalização vai além da mobilidade acadêmica, envolve a construção de um currículo com olhar global. Isto pode ser pensado independentemente da pandemia.

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É preciso manter o contato com os parceiros estratégicos que a instituição já possui e focar em ações que podem ser desenvolvidas a distância. Educação em Revista | Nº 138 | Julho\Agosto\Setembro 2020

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Compreender que o futuro da internacionalização é híbrido: com atividades desenvolvidas presencialmente e a distância, por meio de múltiplas ferramentas tecnológicas.


Radar ›››

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LDB das possibilidades Considerada aberta e simples, ao contrário da maioria da legislação, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional pode representar um conjunto de oportunidades para capacitar e modernizar o ensino DEPOSITPHOTOS

Segue ›››

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››› Radar PEDRO PEREIRA

pedro@padrinhoconteudo.com

O

movimento acelerado para que as aulas fossem mantidas, mesmo diante de uma pandemia, fez com que as instituições de ensino agissem rapidamente, sempre de olho na legislação. E esse ponto não foi problema. Enquanto o Congresso se movimentava para adequar a questão da carga horária, outros fatores já encontravam respaldo legal – e podem significar uma mudança de paradigma. Uma das questões que precisava ser revista era a quantidade mínima de dias letivos a serem cumpridos nas salas de aula. Pensando nisso, o Governo Federal editou a Medida Provisória 934/2020, promovendo ajustes no calendário escolar. O texto deu origem à Lei nº 14.040, de 18 de agosto de 2020, que desobrigou escolas e universidades de cumprirem a carga horária prevista, em caráter extraordinário, em função da pandemia do coronavírus. Mas esta deve ser uma das únicas mudanças necessárias na legislação. Para a educadora e membro do Conselho Estadual de Educação de São Paulo Guiomar Namo de Mello, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) pode até conter alguma limitação (especialmente no Artigo 80, sobre o Ensino a Distância), mas não considera grave. A LDB está em vigor desde 1996. Segundo ela, a EAD não é mais um conceito tão corrente, pois os fatos já superaram a ideia tal como surgiu. “Hoje a diferença entre o que é a distância ou presencial é de outra natureza. Essa parte da LDB pode representar algum impedimento, mas não é tão sério porque nada impede que você ressignifique a EAD para incorporar mais do que vinha sendo até então”, entende. A questão é muito mais de enxergar as oportunidades oferecidas do que pensar em revisão dessa legislação. “A LDB é muito flexível. Com a reforma do

GUIOMAR NAMO DE MELLO Educadora e membro do Conselho Estadual de Educação de São Paulo

“Mesmo nas boas escolas particulares ainda não se vê o domínio pedagógico dos recursos tecnológicos” Ensino Médio, que mudou uma série de artigos, abrem-se possibilidades interessantes que não estão sendo devidamente exploradas, e podem ser. Tem boas janelas para dar um salto para um novo tipo de educação, um novo tempo”, sustenta Guiomar. A despeito da lei, a educadora acredita que haja outro limitador mais importante para que o potencial da educação brasileira dê um salto: a capacitação técnica e pedagógica dos docentes. Isso porque adotar novas ferramentas nem sempre significa estar pedagogicamente apropriado delas, principalmente quando às pressas. “É difícil superar a ideia de que a educação on-line é passar um vídeo e mandar quatro ou cinco perguntas para os alunos”, lamenta. Para explorar todo o potencial das novas possibilidades, é preciso contar com professores que atuem como promotores de conteúdos digitais pedagógicos. Com exceção do que chama de “algumas ilhas de excelência no ensino privado”, Guiomar lamenta que não exista hoje uma capacidade pedagógica e intelectual instalada na educação brasileira. “Você vê uma inovação muito forte nos cursos de medicina, que usam o ensino por projetos, baseado em problemas, aplicam tecnologias digitais para dinamizar esse tipo de trabalho, mas é muito específico. Devia estar acontecendo muito mais nos cursos de formação de professores, pois eles vão precisar se apropriar desses meios”, observa. A educação dos novos tempos não exige apenas o domínio da tecnologia em si: é preciso aplicá-la pedagogicamente, a fim de que seja um recurso

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dinamizador do ponto de vista da aprendizagem. “Trabalho com escolas particulares que estão retirando da BNCC o melhor que tem de organização do conteúdo, mas mesmo nas boas escolas particulares ainda não se vê o domínio pedagógico dos recursos tecnológicos”, alerta Guiomar.

Nova educação não depende apenas de leis “De modo geral o problema (para se adequar à pandemia) não foi de legislação. Logo o Governo abriu e disse ‘salve-se quem puder’. Era o que podia e devia fazer naquele momento”, lembra o PhD em Economia e pesquisador em Educação Claudio de Moura Castro. Ele acredita que os modelos de ensino sejam demandados por mudanças daqui para a frente. “Todo mundo descobriu que você não precisa pegar um automóvel ou avião para conversar com uma pessoa”, constata. Castro vê uma grande vitória do ensino híbrido neste contexto. “Ninguém vai querer continuar 100% a distância e, por outro lado, descobriu-se que há muita coisa feita presencialmente e que é melhor a distância. Isso sugere que no Ensino Superior haverá uma migração progressiva para o modelo híbrido”, projeta. Para Guiomar, essa mudança passa muito mais pela organização das instituições de ensino do que pelo regramento do Estado, uma vez que a LDB, a BNCC e as diretrizes curriculares já definem um conjunto de regras suficiente para nortear as práticas pedagógicas. “É preciso que se avalie o quadro docente, entenda e potencialize. A relação com o mundo do trabalho é importante porque é subjacente ao ensino por competências, que tem abertura para metodologia ativa, para cultivar o protagonismo do aluno, a resolução de problemas e o empreendedorismo. A LDB é completamente compatível com as competências essenciais do século XXI”, conclui.


Em destaque››› FOTOS DEPOSITPHOTOS

Sistema Positivo de Ensino investe em inovação e parcerias

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Sistema Positivo de Ensino, maior sistema voltado ao ensino particular no Brasil, trabalha para garantir às escolas conveniadas as melhores práticas pedagógicas, além de assessoria nas áreas jurídica, de marketing e finanças. Neste período de suspensão das aulas presenciais, investiu em videoaulas e lives com especialistas de diversas áreas, além de parcerias importantes, como a Árvore Livros, que disponibiliza, gratuitamente, mais de 500 livros digitais para professores e estudantes pelo Positivo On, e o Google For Education, que está facilitando o cotidiano dos professores na realização de aulas remotas. Para a irmã Isaura Paviane, diretora do Colégio Scalabriniano Medianeira, em Bento Gonçalves (RS), o Positivo ofereceu, neste período de pandemia,

vários recursos que estão auxiliando no aprendizado remoto dos alunos e no trabalho dos professores. “O Sistema Positivo de Ensino nos ajudou no fortalecimento e reconhecimento da nossa escola como uma instituição de qualidade na região. Se pudéssemos dar uma nota ao Sistema Positivo de Ensino, sem dúvida, daríamos 10”, afirma a diretora. A escola é parceira do Sistema Positivo de Ensino há 25 anos. 

Saber, Agir, Evoluir – Conheça a solução para a sua escola

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Sistema Etapa oferece o Painel da Educação

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Painel de Educação é uma plataforma, oferecida pelo Sistema Etapa, de conteúdos desenvolvidos por profissionais do Grupo Educacional ETAPA e por especialistas em diversos setores, que abordam temas de interesse do universo educacional. O material didático e a metodologia do Sistema ETAPA reúnem a experiência e a qualidade de quem é 100% dedicado à educação de excelência, da Educação Infantil ao Ensino Médio. Saiba mais visitando o site paineldeeducacao.com.br. 

conjunto de materiais didáticos SAE Digital constitui uma solução inovadora para o ensino de qualidade. Da gestão escolar ao complexo processo de ensino e aprendizagem, nossos produtos promovem o desenvolvimento educacional de gestores, professores e estudantes, da Educação Infantil ao Pré-Vestibular. Somos pioneiros em produtos de tecnologia relevantes para o aprendizado do nosso aluno, como o livro digital, a realidade aumentada e a plataforma de aprendizagem. Com Arrase no Enem, Ambiente Virtual de Aprendizagem e Avaliações, somamos mais de 40 simulados, 10 mil vídeos e 100 mil questões disponíveis para alunos e professores. Nossos parceiros podem contar com a Assessoria Pedagógica Efetiva, uma equipe de educadores que oferece atendimento personalizado e contínuo, buscando fortalecer e criar diferenciais para apoiar as escolas conveniadas. O SAE Digital é muito mais que um sistema de ensino, é a solução que a sua escola precisa! Acesse: sae.digital. 

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››› Diversidade

Na trincheira contra o racismo Especialistas discutem o papel da escola na redução do preconceito racial e estratégias para a sala de aula

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iante da plateia atenta, o escritor Jéferson Tenório, patrono da 26ª Feira do Livro do Rosariense - que teve como lema Vozes da África - dividiu com os alunos detalhes de sua premiada produção literária e fatos da própria vida. Uma humilhação sofrida comoveu os estudantes: em uma batida policial, foi obrigado a descer do ônibus em que viajava para averiguação. “Eles ficaram chocados porque não conheciam essa realidade. Mas puderam entender a situação, ser empáticos com o que o outro viveu e sentiu”, relembra a professora Vivian Monteiro, coordena-

dora dos Anos Finais do Ensino Fundamental do Colégio Marista Rosário. A aproximação dos estudantes com a literatura afrocentrada e autores negros é apenas uma das estratégias da instituição para abordar questões étnico-raciais em sala de aula. O desafio é “descolonizar” o conteúdo, evitando apresentar a África como um continente selvagem, ou de restringir à escravidão a contribuição da raça negra na construção do Brasil. Oficinas de percussão, capoeira e de abayomi (bonecas de pano da tradição iorubá), servem de ponto de partida para o ensino de cultura e história africanas, que estão entre os temas transversais do currículo. No ano passado, professores da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) contextualizaram uma exposição sobre o tráfico transatlântico de negros escravizados. Esse conjunto de ações acaba por desenvolver reflexão nos alunos, estimulados a se aprofundar

no assunto, afirma Vivian: “Uma aluna do 9º ano desenvolveu um projeto de iniciação científica sobre a influência do preconceito e da representatividade na formação da autoestima e da identidade de alunos negros e negras. E ela fez a pesquisa com alunos da própria escola.”

O papel do professor como transformador O racismo e as questões étnico-raciais são temas incontornáveis ante o papel da escola como agente transformador da sociedade. Mas se por um lado a Lei 10.639/2003, que tornou obrigatório o ensino de cultura e história africanas, estimula as instituições a explorar o assunto, muitas ainda o fazem de forma pontual, em datas como o 20 de novembro, Dia da Consciência Negra.

COLÉGIO MARISTA ROSÁRIO, DIVULGAÇÃO

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Atividade do Grupo Cesmar, do Colégio Marista Rosário, ajuda no conhecimento sobre cultura e valores

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Diversidade ››› Doutora em Educação pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Maria Rita Py Dutra afirma que, apesar do protagonismo no combate e eliminação do discurso racista, é no espaço escolar que as crianças negras mais sofrem com apelidos relacionados a sua cor, cabelo e corpo. “Os professores dos anos iniciais devem estar atentos às brincadeiras de roda. Tem criança que troca de lugar para não dar a mão para o colega preto ou pardo. São momentos que devem ser problematizados, perguntando para a criança por que fez aquilo e ao que sofreu a discriminação, como está se sentindo. É bom, desde cedo, aprender a falar de seus sentimentos”, diz. Conforme a pesquisadora, a ação antirracista deve ser diária, o que é impossível sem o engajamento dos professores. “No Brasil, a ideia de racismo pressupõe que brancos sejam superiores aos negros (e demais grupos étnicos). É quando se estabelece uma hierarquia: são mais bonitos, mais inteligentes, mais capazes. Se a professora acredita nisso, terá muita dificuldade em trabalhar com os estudantes uma educação antirracista. O professor precisa desejar contribuir com a construção de uma sociedade mais humana, equânime e com justiça social”, salienta Maria Rita.

Capacitação para não minimizar as ofensas São nas reuniões pedagógicas semanais que os docentes do Colégio Marista Rosário planejam as ações educativas e recebem a formação necessária para lidar com questões étnico-raciais – nem sempre oferecida nas licenciaturas. Conforme Vivian, a equipe é orientada a não minimizar ofensas raciais, por exemplo, e usar a situação para esclarecimento. Assessora Pedagógica da Secretaria de Educação de São Leo-

POR UM FUTURO SEM PRECONCEITO Caminhos para abordagem de questões raciais em sala de aula: Educação Infantil

Ensinos Fundamental e Médio

l A escola precisa investir em materiais que permitam a familiarização das crianças com a diversidade étnica. Para cada livro infantil com um protagonista branco, deve haver um com o personagem negro para garantir a equidade. l Os brinquedos que ficam ao alcance das crianças também devem contemplar a diversidade. Especialmente as bonecas, que desenvolvem mais a questão da afetividade. Para cada boneca não negra, uma negra. O item precisa ser bonito, de qualidade e apresentado aos alunos de forma carinhosa. l Já são fabricados lápis de cor, giz de cera e canetinhas nos tons de pele escuros. Eles precisam estar à disposição dos alunos.

l Trabalhar apenas o viés da escravidão na contribuição do negro para a construção do Brasil é uma visão limitada e que perpetua a ideia de “raça inferior”. É interessante abordar as causas do tráfico de pessoas, o trauma da escravidão e as graves consequências que se perpetuam até hoje. l Valorizar a cultura afro, da dança a gastronomia, é uma abordagem positiva do tema. Mapas, romances, filmes, roupas, alimentos também são úteis na introdução de conteúdos. l Encontros de estudantes com personalidades negras de áreas variadas ajudam a desconstruir o estereótipo da subalternidade e a debater relações étnico-raciais de forma potente. DEPOSITPHOTOS

poldo, Roselaine Domingos de Castro Diaz provoca os professores para buscar esses conhecimentos que os instrumentalizem também fora da escola. “Nas reuniões pedagógicas, geralmente, o tempo é curto. O professor precisa se qualificar, entender seu lugar de fala e ter uma perspectiva da diversidade que nós temos”, diz Roselaine. Outra recomendação é que a escola invista em materiais que permitam a abordagem étnico-racial desde a pré-escola. Entre eles, bonecas negras, livrinhos com personagens afro-brasileiros (em número equivalente ao de protagonistas brancos), além de giz, lápis de cor e canetinhas com matizes dos tons da pele negra. Por fim, Roselaine incentiva as escolas a contratarem professores negros, também como parte do processo educacional. “Um professor, diretor, supervisor negro, têm importância não só pela representatividade, mas pela represen-

tação. Já houve escolas em que os alunos me procuravam para pedir pano de chão. Não há demérito nisso, mas os alunos não podem identificar os negros apenas como funcionários da limpeza. E quando uma criança negra enxerga uma professora, um escritor de sua cor, percebe que há uma nova opção para o futuro”, afirma. No Instituto Ivoti, a temática recente do Black Lives Matter (Vidas Negras Importam, na tradução para o português) motivou atividades. Conforme a professora e coordenadora pedagógica do Curso Normal em Nível Médio, Débora Nunes, além de videochamada com um ex-colega que vive em Brasília e que comentou sobre preconceito, alunos foram desafiados a criar uma narrativa e editá-la em um programa, dentro de uma prática de contação de histórias que seria, mais adiante, disseminada com outras crianças. “É a ideia de que o respeito é que importa”, reforça Débora. 

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LA SALLE MEDIANEIRA, DIVULGAÇÃO

COLÉGIO MAUÁ COMPLETA 150 ANOS  Com uma forte identidade co-

munitária, o Colégio Mauá completa 150 anos em 2020 com 2.025 alunos da Educação Infantil ao Ensino Médio. A escola foi criada em 27 de julho de 1870, como a Sociedade Escolar - Schulgemeinde (hoje, Sociedade Escolar de Santa Cruz), que tinha como objetivo oferecer educação de qualidade aos filhos dos imigrantes alemães que colonizaram o município. Um grupo de imigrantes foi responsável pela fundação da instituição,que surgiu como a Deutsche Schule (Escola Alemã), primeiro nome do educandário. Em 1949, passou a se chamar Colégio Mauá. O espaço que contempla a instituição, com 50 mil metros quadrados, é resultado da área de 22 mil metros quadra-

dos doada por Augusto Hennig e de outros 21 mil metros quadrados recebidos da Sociedade de Tiro ao Alvo, além das aquisições e contribuições efetivadas pela comunidade e pela prefeitura. Em 7 de março de 2019 houve a inauguração do novo prédio do Ensino Fundamental da escola, com 4,6 mil metros quadrados de área construída. O espaço contempla salas de música, idiomas, artes, atendimento, coordenação e psicologia, biblioteca, laboratório de informática, cozinha, elevador, sanitários e cantina. E, a partir de 2020, o Mauá assumiu a gestão administrativa e pedagógica da Escola de Educação Infantil Criança & Cia e passou a usar a denominação Colégio Mauá - Educação Infantil – Unidade II.  COLÉGIO MAUÁ, DIVULGAÇÃO

O ALFABETO MÁGICO DO LA SALLE MEDIANEIRA  O projeto Alfabeto Mágico, pro-

posto aos estudantes do Pré II do La Salle Medianeira, estimula uma vivência intensa com as letras, na descoberta de objetos e de histórias relacionadas a elas. Por meio de vídeo, as professoras fizeram a mágica do sumiço das letras, e cada uma apareceu na casa de uma criança. Na verdade, elas receberam, pelo correio, um kit com sua letra sorteada e apetrechos de mágico. Além de brincar de fazer magia, os estudantes tiveram como tarefas a escolha de um livro cujo nome começasse com a letra recebida. Depois, foi a hora de confeccionar, com materiais existentes em casa, um personagem ou objeto presente na história lida. O mágico da vez contou aos colegas em vídeo a história em forma de teatro de objetos e ensinou a todos a fazer o personagem/objeto escolhido. 

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DIRETOR DO ALBERTO TORRES CONTA HISTÓRIAS AOS ALUNOS  O diretor geral do Colégio

Evangélico Alberto Torres (CEAT), Rodrigo Ulrich, encontrou tempo para contar histórias aos alunos da instituição, localizada em Lajeado e em Roca Sales. A ação especial, destinada às crianças da Educação Infantil e das Séries Iniciais tem o intuito de aproximar em meio ao distanciamento social, trazendo uma mensagem de leveza e sensibilidade, além de reforçar o hábito da leitura. “Ruben Alves, no prefácio do livro A Menina e o Pássaro Encantado, responde a pergunta: Por que contar his-

NOTRE DAME MENINO JESUS PROMOVE FORMAÇÃO DE PAIS

tórias? Segundo ele, as angústias ganham nome e os medos se tornam canções numa nova configuração da realidade e, com isso, angústias e medos se tornam mais mansos”, conta o diretor. Em junho, as primeiras histórias foram gravadas e publicadas nas salas de aula virtuais. As contações de história estão sendo gravadas nas sedes de ambas as unidades do CEAT e, ao que tudo indica, seguirão acontecendo. “Muito provavelmente, no retorno às atividades presenciais também”, projeta o diretor.

A Escola Notre Dame Menino Jesus,

localizada em Passo Fundo, oportuniza espaços para dialogar com profissionais especializados, capazes de ouvir, acolher e orientar os responsáveis pelos estudantes. Há quatro anos, o Projeto de Formação de Pais busca estreitar laços com as famílias. Com o distanciamento social, os encontros passaram a ser quinzenais, via plataformas digitais – antes, eram mensais. Os assuntos permeiam temas como a saúde psíquica, a importância da família, atenção especial ao universo infantil, entre tantos outros. A idealizadora do projeto, a psicopedagoga Eleandra Alievi da Rosa comenta que, nesta modalidade, houve um aumento significativo de 50% na participação.

COLÉGIO APARECIDA, DE NOVA PRATA, FAZ CORRENTE DO BEM  O Colégio Nossa Senhora Apa-

COLÉGIO EVANGÉLICO ALBERTO TORRES, DIVULGAÇÃO

recida, de Nova Prata, desenvolve desde abril de 2020 a ação Corrente do Bem, cujo objetivo é divulgar o lado bom do isolamento social, que acarretou a suspensão das aulas presenciais. Entre as atividades, foram realizadas duas Mostras Virtuais de Trabalhos, que contaram com uma série de atividades desenvolvidas pelos alunos de todos os níveis da instituição, desde o Maternal até o Ensino Médio. As mostras reuniram fotos e vídeos dos trabalhos realizados pelos alunos juntamente com familiares e foi compartilhada via redes sociais. A campanha pode ser vista em instagram.com/colegio.aparecida.

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COLÉGIO MARISTA ROSÁRIO COMPARTILHA CONHECIMENTO  Ter estudantes envolvidos no

COLÉGIO MEDIANEIRA FAZ INTERAÇÕES FORMATIVAS COM PROFESSORES  O Colégio Medianeira, em San-

tiago, idealizou a “Sexta-feira de Interação Formativa”, com duração de 2h e, de forma periódica. Para isso, é oportunizado ao corpo docente um espaço de Interação, de trocas de experiências, de escuta e, também, de capacitação com profissionais das mais diversas esferas pedagógicas. Eles se reúnem por série e áreas de conhecimentos, abordando assuntos específicos, dentro de cada

modalidade de ensino. Neste ambiente de união de esforços são discutidos temas da atualidade contemplando tanto as competências cognitivas como as socioemocionais. Os resultados desta experiência vêm sendo percebidos e fortalecidos a cada encontro, pois o enfrentamento de um período de transformação e ressignificação de práticas e saberes acontece na troca entre pares no âmbito da ação pedagógica.

processo de construção do conhecimento é fundamental para a aprendizagem. O novo formato de interação virtual permitiu que Rodrigo Cubal, do 8º ano do Ensino Fundamental do Colégio Marista Rosário, de Porto Alegre, mostrasse aos seus colegas o laboratório que possui em casa. Microrretífica, parafusadeira e ferro de solda estão entre os materiais que o jovem utiliza. Foi pensando em maneiras de despertar o interesse dos alunos para o conteúdo de eletrostática e eletricidade, que a professora do Laboratório de Ciências, Valéria Ferreira, convidou Rodrigo para participar das aulas sobre o assunto. Juntos, professora e estudante estão criando roteiros e gravando vídeos com explicações de conteúdos como condutividade elétrica que serão disponibilizados às turmas no Marista Virtual 3.0, ambiente pedagógico on-line. 

ESCOLA NOSSA SENHORA DO HORTO FAZ EVENTO SOLIDÁRIO  A Escola Nossa Senhora do Horto,

ESCOLA NOSSA SENHORA DO HORTO, DIVULGAÇÃO

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de Uruguaiana, realizou no dia 17 de julho o evento “Horto Solidário”. Um drive trhu em que a comunidade escolar, especialmente as famílias, realizaram doação de alimentos e roupas, que foram destinadas a funcionários de serviços gerais dispensados no período de pandemia, assim como à Pastoral Escolar coordenada pelas Irmãs do Horto, ligadas às comunidades carentes de bairros no entorno da escola. Foi uma oportunidade de os alunos visualizarem seus professores, abanarem, sorrirem, fortalecendo os vínculos afetivos.


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FARROUPILHA CRIA PROJETO: AS CRIANÇAS NO MUNDO  E a sala de aula foi parar na

sala de estar. As brincadeiras no pátio e o esconde-esconde foram interrompidos. As rodas de conversa passaram a ser vivenciadas através das telas do computador. Nesse novo formato de educação, foi preciso reinventar as práticas cotidianas. Então, como desenvolver projetos e atividades com crianças de quatro e cinco anos? As aulas on-line passaram a fazer parte desse novo cenário. Por meio de um formulário, enviado pelo aplicativo do

Colégio Farroupilha de Porto Alegre, as crianças realizam uma votação para a escolha do projeto de estudos. Como resultado da preferência da maioria dos pequenos, surgiu o projeto As crianças no mundo. Nesse viés, as crianças puderam realizar questionamentos a respeito do que gostariam de aprender: “Eu quero saber como são as crianças no Japão, na Austrália, e saber como elas falam?”; “Conhecer coisas do mundo e ver o que outras crianças estão fazendo?”. Iniciamos uma aventura pelo mundo. A exploração do globo terrestre, as descobertas sobre lugares e crianças de outros países e culturas permearam nossas manhãs de aulas on-line.

A DISPUTA DE PÊNALTIS DO NOSSA SENHORA DE LOURDES  No Colégio Nossa Senhora de

Lourdes, de Farroupilha, a gamificação tem sido presente nas aulas remotas da disciplina de matemática. Para rever todas as operações, os alunos do 5° ano do Ensino Fundamental foram convidados a vestirem a camiseta do seu time e participarem de uma disputa de pênaltis. Cada pênalti representava uma situação problema com os conteúdos estudados nas aulas remotas: o estudante que respondia corretamente marcava gol e caso a resposta estivesse errada refazia o cálculo com o auxílio da professora e colegas.

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