Cumarim

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CumaRim, a pimenta do reino

ilustrações Willian Santiago RoSane almeida

Cumarim, a pimenta do reino

Cumarim, a

Santiago roSane almeida
ilustrações Willian
pimenta
reino
edição São Paulo – 2021
do
1ª.

Copyright © Rosane Almeida, 2021

Todos os direitos reservados à EMPRESA BRASILEIRA DE SISTEMAS DE ENSINO LTDA.

Rua Rui Barbosa, 156, 2º andar

São Paulo – SP – CEP 01326-010

Tel. (0-XX-11) 3598-6000

Editora assistente Camila Saraiva

Revisoras Lívia Perran e Marina Nogueira

Rosane Almeida nasceu em Curitiba (PR), em 1964. É formada em Artes Circenses pela Escola Picadeiro de São Paulo e pela Accademia Teatro Dimitri da Suíça.

Willian Santiago nasceu em Cornélio Procópio (PR), em 1990, e faleceu em 2021. Era formado em Design Gráfico pela Universidade Estadual de Londrina.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Almeida, Rosane Cumarim, a pimenta do reino/Rosane Almeida; ilustrações Willian Santiago. – 1. ed. – São Paulo: BR Educação, 2021.

ISBN 978-85-66811-39-1 (aluno)

ISBN 978-85-66811-40-7 (professor)

1. Literatura infantojuvenil I. Santiago, Willian. II. Título.

21-85486

Índices para catálogo sistemático:

1. Literatura infantil 028.5

2. Literatura infantojuvenil 028.5

Maria Alice Ferreira — Bibliotecária — CRB-8/7964

CDD-028.5

SUmÁRio

6 Cumarim, a pimenta do reino

42 O QUE É UM BRINCANTE?, por Maria Amália Camargo

46 Informações paratextuaIs

Cumarim é uma menina que já nasceu com a boca e os olhos bem abertos. Parecia tão travessa que logo ganhou o nome de uma pimenta.

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Ainda na barriga da mãe, Cumarim dançava ao som de qualquer barulhinho: rodopiava com o motor da batedeira de bolo, pulava quando ouvia o apito da chaleira no fogo, farfalhava ao ouvir o chacoalhar das ferramentas na caixa de metal, embalava-se com os acordes do violão…

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Cumarim tinha uma família especial. Sua casa despertava a curiosidade e a admiração de todos que moravam por perto — ou dos que vinham de longe só para ter a mesma sensação que todo mundo dizia experimentar. Quem passava em frente à casa de Cumarim ouvia e sentia uma mistura de sons, gostos, cheiros, texturas, cores e formas que não conseguia perceber em nenhum outro lugar. Algumas pessoas ficavam tão maravilhadas que murmuravam: “Estou sem palavras”.

Quando o pai da menina preparava o almoço, os aromas se espalhavam pelos arredores e o paladar da vizinhança se assanhava. Quando a mãe descobria o defeito de um carro só pelo barulho de uma peça ou pelo cheiro do motor, era um buzinaço.

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Cumarim acompanhava atenta o vaivém de gente e de sensações. Era dona de uma curiosidade que só aumentou depois que ela aprendeu a falar. E como Cumarim falava. Falava com estranhos, falava sozinha, falava dormindo, falava até pelos cotovelos. Diz a lenda que Cumarim ficou ainda mais tagarela porque, logo depois de começar a engatinhar, foi parar embaixo de um pé de pimenta. Os frutos eram tão redondos, pequeninos e vermelhos que ela se deixou levar pela beleza deles. Encheu as mãozinhas com todos que ali cabiam, colocou tudo de uma vez na boca e, pasmem, algo incrível aconteceu: ela gostou da ardência! Então, sempre que podia, Cumarim voltava para apanhar um punhado daqueles frutinhos ardidos.

Muitas vezes Cumarim parecia só ter língua. Dizem que ela nunca usou chupeta porque não conseguia ficar de boca fechada. Era danada de boa em perguntar e em responder. Se não soubesse alguma resposta, inventava. Soltava-se em palavras e, se deixassem, ia longe com os seus “mas como?” e “por quê?”:

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— Pai, se tudo morre, porquenasce?

— Como criamos a fome se não lhe damos de comer?

— Chove na terra porque no céu os rios fcam de ponta-cabeça?

— Mãe, o fm da picada é quando o mosquito vai embora?

— Se a gente chama laranja de laranja, por que não chamamos de verde o limão?

—Ospeixes têm sede?

—Mãe,por que se chama “meia” se eu calço duas inteiras?

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Cumarim foi crescendo e, quando aprendeu a andar, seus primeiros passos foram em direção aos sons: as batidas de bombo na casa do vizinho, o violão no quarto do irmão, a cantoria da mãe no chuveiro, a batedeira de bolo, a buzina do carro, a panela no fogo. Não demorou muito para Cumarim começar a fazer sua própria música, e, assim, a danadinha encontrava novas maneiras de se fazer ouvir: a colher batendo no prato, os pés no chão molhado do chuveiro. As palmas saíam tão engraçadas no encontro das mãos, bem diferentes de quando suas mãozinhas batiam nas pernas ou no peito. E, quando a mão batia, a boca cantava, os pés pulavam, o coraçãozinho de Cumarim batia junto com tudo.

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Tum-tum

Tá tum-tum

Tá tum-tum

Quero ver queimar carvão, quero ver carvão queimar. Quero ver levantar poeira, quero ver poeira voar.

Menina, se queres, vamos, não se ponha a imaginar. Quem imagina cria medo, quem tem medo não vai lá.

A folha do lírio vira, eu também quero virar. Não precisa ficar triste, basta mudar de lugar.

Clap-clap (palmas)

Toc-toc (peito)

Clap-clap

Toc-toc

Clap-clap

Tum-tum-tum-tum (pés)

Clap-clap

Batuque balanceado lá em casa também tem. Quando chega a madrugada é que o povo canta bem.

As rosas é que são belas.

São os espinhos que picam.

Mas são as rosas que caem.

São os espinhos que ficam.

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Com o passar do tempo, os ritmos, as canções e as toadas acompanhavam Cumarim pra lá e pra cá. Quando suas pernas espicharam, Cumarim correu para a rua: brincava de pega-pega, no mesmo quarteirão ao qual sua mãe a levava para passear nos carros que consertava, ou de esconde-esconde, atrás do muro da casa das vizinhas, as mesmas que suspiravam pelos bolos do seu pai, e ainda pulava corda, elástico, amarelinha.

Mas, entre tantas brincadeiras, Cumarim gostava mais das rodas de versos. A roda girava lentamente no ritmo da canção, todos de mãos dadas cantando o refrão, e, a cada verso, a roda parava e depois girava de novo.

Girava a roda, que girava o tempo, em que giravam todos!

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Coqueiro verde tomba, mas não cai, a moça que se casa não namora mais. Se ela namorar, o coqueiro tomba e cai.

Um coqueiro de tão alto que dá coco na raiz. Uma moça bonitinha pôs o dedo no nariz.

Rema na canoa, tiririri.

Rema na canoa, tararará.

Rema na canoa, tiririri, para o meu bem passear.

Um coqueiro de tão alto que dá coco amarelinho. Embaixo desse coqueiro tem menino bonitinho.

Minha mãe pediu um beijo, fui correndo e dei dois. Sua alegria foi tanta, ganhei tantos mais depois!

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Nas rodas de escolha, todos batiam as palmas das mãos, sapateavam e, no centro do círculo, um amigo recitava um versinho conhecido ou inventado na hora.

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Dam-dam, esquindim, dam-dam!

Dam-dam, esquindim, dam-dam!

Esquindim, dam-dam, esquindim, esquindim, esquindim, dam!

Essa nossa cantoria é como um barco no mar.

Vai de um lugar para o outro com risco de naufragar.

Quem canta seu mal espanta. Quem chora seu mal aumenta. Eu canto para espalhar qualquer dor que me atormenta.

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Cumarim também gostava das rodas de brincadeiras! Ora uns corriam por fora, ora outros fugiam por dentro. Às vezes o anel passava de mão em mão. Sempre tinha aquele momento em que alguém conhecia uma canção engraçada para cantar na roda:

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Uma velha bem velhinha fez xixi na canequinha, foi dizer para a vizinha que era caldo de galinha.

A vizinha, pobrezinha, preparou toda a comida, e o banheiro foi pequeno pra tanta dor de barriga.

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Até que um dia, no meio de uma tarde que parecia ser como outra qualquer, Cumarim acabou se distanciando de casa. Distraída com suas curiosidades, andou cantando, correu falando e, quando percebeu, estava longe, muito longe da sua rua.

De repente, viu-se diante de um lugar diferente de todos que ela conhecia. Nem em sonhos, nem em conversas imaginárias, ela tinha visto algo parecido. Os olhos de Cumarim se estenderam de cima a baixo, para a direita e para a esquerda, com movimentos tão rápidos que sua cabeça mal conseguia acompanhar. Cumarim teve a sensação de que o mundo cabia ali!

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Havia uma porta muito alta, uma sala enorme com paredes que lembravam escadas, e um cheiro estranho. Toda aquela grandeza, aquele palacete... Parecia uma cidade construída com livros! Grandes e pequenos, novos e velhos, com desenhos ou só escritos, grossos e fininhos, molengas e duros, coloridos ou em branco e preto. Cumarim gostou muito daquele lugar. Por isso entrou no território desconhecido com a mesma ousadia de quando engatinhava em direção aos frutinhos vermelhos.

Sem compreender como, ela foi delicadamente engolida por todo aquele espaço. Cumarim não sabia explicar, mas gostava da cor, do cheiro e da sensação que tudo aquilo lhe causava.

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E então, pela primeira vez, Cumarim se calou — tal qual as pessoas maravilhadas quando ficam “sem palavras”. Dentro dela se fez um silêncio tão grande que ela pôde ouvir onde estava: chegara ao Reino da Palavra! E que lugar mais inusitado e estrambólico era aquele!

Ao entrar no Reino, todas as palavras vieram recebê-la. Foi um burburinho que virou falatório, que virou gritaria, que virou algazarra e terminou num alarido só!

As palavras fizeram então várias brincadeiras com a visitante. As boas-vindas se fantasiaram de trava-línguas:

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num nInho de mafagafos tem seIs mafagafInhos.

Quem os desmafagafar bom desmafagafador será.

eu tagarelarIa, tu tagarelarIas, ele tagarelarIa, nós tagarelaríamos, vós tagarelaríeIs, eles tagarelarIam.

a sabIá não sabIa Que o sábIo sabIa Que o sabIá sabIa

Que o sábIo não sabIa Que o sabIá não sabIa

Que a sábIa não sabIa Que o sabIá sabIa assobIar.

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Depois vieram as quadras de versos.

O jogo agora é rimar, fazer rima de montão. Seja qual for a palavra, ela vai rimar com “ão”.

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Cumarim não se apertou e saiu logo com esta quadrinha:

Quem quiser tirar versinhos diga o que vem no juízo.

Não precisa exatidão, fale agora de improviso.

Uma coisaqueadmira, e a t é faz confusão, é ver o tempopassar sem asa, sempé,semmão.

Todosnóstemosdefei tos , digoissocomsorriso . Unssãoloucosd o seu cor p o , outrosmancosd o juí zo .

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Então começaram as adivinhas:

Qual é a coIsa maIs veloz do mundo?

Quem é aQuele Que num Instante se Quebra se alguém dIz o nome dele?

o Que é, o Que é? Que vaI e Que vem e não saI do lugar?

Qual é a palavra Que abre uma porta?

tem orelha, corpo e braço, tem cIntura, não é mulher. chora sendo de pau, me responda se puder!

essa pergunta é dIfícIl mas é só uma armação. a resposta para Isso é muIto bem um vIolão.

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A pequena Cumarim, claro, também soltava as suas perguntas:

— Por que a palavra “separado” se escreve tudo junto e “tudo junto” se escreve separado?

— Por que a palavra grande é pequena e a palavra pequena é grande?

— Por que o porquê existe?

— Por que existe o porquê?

— Por que dizem que a vida é triste quando não tem um porquê?

o pensamento o silêncio a porta puxe ou empurre 29

Quando Cumarim estava exausta de tanto brincar, foi convidada enfim a conhecer a Rainha Palavra. Cumarim não conseguia nem imaginar como ela era. A expectativa fez seu coraçãozinho bater como um tambor. Vindo lá de dentro, ela ouvia tum-tum-tum batendo. E batendo forte.

Soaram as trombetas: tatarara taratarara tata!

Rufaram os tambores: trurrrrrrrrrrrrr plaft!

Os sinos soaram como campainhas: blém-blém-blém…

E, então, a filha Anunciação iniciou a cerimônia:

Atenção, muita atenção!
Ela está se aproximando. Inventou mais um brinquedo. O boa-noite vem dando. Um, dois, três... é a sua vez!
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Eis que a Rainha Palavra surgiu toda poderosa. Andava cheia de graça como quem vai para o samba, sacolejando aqui e ali, por qualquer motivo. Batia o pé quando era contrariada, torcia o nariz quando mal interpretada, espichava-se e encolhia-se para estar em diversos lugares.

E foi assim, com toda a graça e flexibilidade, que ela veio ao salão e se aproximou de Cumarim para contar a história do Reino da Palavra.

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“No início era a palavra. E eu, como rainha, vivia em harmonia com as pessoas. Sempre que elas precisavam de uma nova palavra, eu enviava uma de minhas filhas para o mundo. Assim, homens e mulheres seguiam conhecendo as coisas e dando nomes a tudo.

As pessoas e as novas palavras se tornaram grandes companheiras, e muitas descobertas nasceram desse encontro. Porém, à medida que o tempo foi passando, homens e mulheres, com uma pressa que só cabia a eles, acharam mais fácil, conveniente, oportuno, propício e adequado dominar as palavras para poder usá-las em qualquer situação, em vez de aguardar até que uma nova palavra fosse enviada do Reino. Agindo dessa maneira, as pessoas declararam guerra às palavras! Chegamos a ser usadas para justificar até o que não se justifica!

Essa peleja durou muito tempo. Não dá para falar de vitórias ou derrotas. O que se sabe é que nós, as palavras, passamos a ser usadas de qualquer maneira, por qualquer um e, o que é pior, para representar coisas muito diferentes.

O patrão fala: ‘Paciência, não posso pagar mais’.

Os padres e os pastores dizem: ‘Tenha paciência, meu filho, seu dia vai chegar’.

O apressado grita: ‘Quanta paciência eu tenho que ter?’.

E, a princípio, eu enviei a palavra paciência só para descrever o sentimento de quem tem muita calma com as falhas dos outros. Para outras situações, eu poderia ter enviado palavras como submissão, resistência, humildade, leniência, amorosidade, brandura, tolerância… Mas o povo se atrapalhou! Por isso cá estamos, minha menina, vivendo essa história de pessoas e de palavras que nunca chega ao fim.”

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Cumarim, esperta que era, ouvindo sobre essa guerra que se arrastava desde tempos imemoriais, entendeu que as palavras gostavam de mudar de forma, de se transformar em outras palavras. As palavras só não gostavam de ser machucadas por pessoas que não eram inteligentes, eram apenas oportunistas.

Ela começou a compreender que o seu corpinho também falava, mesmo sem pronunciar palavras. Os ombros se erguiam, os braços se abriam, as mãos se agitavam, o susto ou a surpresa paralisavam seu corpo. Fora o vaivém das sobrancelhas, que, ao subir e descer, traduziam um tantão de sentimentos.

Cumarim também reparou que as mesmas palavras, de acordo com o som, a música ou a entonação com que eram ditas, ganhavam novo significado. Lembrou-se de diversas vezes ter escutado sua mãe dizer:

— Bonito, hem?

Se a frase fosse dita quando seu pai chegava tarde em casa, vinha acompanhada de uma melodia cantada com voz brava. Aquilo não soava coisa boa.

Se fosse porque o irmão tinha composto uma música bonita, aí a melodia trazia orgulho, satisfação.

Se fosse diante do espelho, ao experimentar um vestido novo, então soava outra melodia, em tom de contentamento.

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Aos poucos, Cumarim descobriu que as palavras moravam, principalmente, naquilo que os olhos veem e o coração sente. Ali, no Reino da Palavra, ela aprendeu o bem falar e o bom de se calar. Aprendeu a ouvir até mesmo as palavras não ditas. E por estar a cada dia mais íntima da rainha…

Cumarim então sabia muito bem como agir. Se a rainha tinha fome, só raiz queria ingerir.

Se ficava agitada, Cumarim lhe dava água, pra matar a sua sede e lavar a sua alma. Nos dias de muita tristeza, o silêncio é um alento. Toda dor é passageira, vai embora como o vento.

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Já a rainha sabia muito bem que Cumarim era uma pimenta — ardida e das brabas! —, por isso a escolheu para trazer novas palavras ao mundo.

— Roda mundo, roda pião!

— Roda mundo, roda pião! Cumarim é uma pimenta com fogo no coração. Quem arde pelo saber separa a casca do grão.

As palavras quando voam viram caixa de presente. Dadas de bom coração, nos deixam sempre contentes.

Mas mesmo sendo um presente, lançado com força e sem jeito, fere, maltrata, entristece, machuca bem dentro do peito.

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Agora que Cumarim conhecera o Reino, descobriu que, assim como o mundo precisava de novas palavras, as palavras também precisavam de novas pessoas. Afinal, “para quem só sabe usar martelo, todo problema é um prego”. Então, para as pessoas se renovarem, cada palavra precisaria ser colocada em um lugarzinho exato.

Onde o coração escuta, onde nosso corpo sente, onde nossos olhos choram e onde o riso não mente.

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Cumarim sentia saudade de casa, mas decidiu ficar mais um tempo no Reino. Falando bastante, claro, porque isso era da sua natureza. E também tentando descobrir as palavras que poderia trazer ao mundo e o lugar em que colocaria cada uma delas. Além disso, Cumarim sabia que precisaria de paciência, de coragem e, como dizem por aí, de muita brabeza! Porque quem fala e não pratica o que diz é como quem prepara a terra mas não planta nenhuma semente nela. No fim das contas, Cumarim tiraria tudo de letra! Foi por causa dessa tal brabeza que ela se tornou uma pessoa importante no Reino. Brincadeira boa é viver sempre buscando aprender. Não se deixar devorar pelo monstro do não saber.

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Qual é a palavra Que só tem três letras e acaba com tudo?

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o QUe É Um BRinC anTe?

Brincante é como alguns artistas populares se autodenominam. São artistas que cantam, dançam, tocam diversos instrumentos musicais, encenam peças de teatro… E fazem tudo isso junto e misturado. A autora deste livro, a Rosane Almeida, é uma brincante!

Por meio dos seus espetáculos, ou das suas “brincadeiras”, que é a maneira como as apresentações são chamadas, os brincantes levam elementos da cultura brasileira para todos os cantos do país e do planeta.

Vamos brincar?

Quem brinca, sem nem perceber, alimenta o corpo e a cabeça. Estimula o cérebro, os músculos e o esqueleto. Quem brinca acumula um tantão de experiências muito úteis para a sua formação como indivíduo. Isso mesmo, porque, além de estarmos em constante movimento, estamos sempre em constante aprendizado.

Quando brincamos com outras crianças, aprendemos a compartilhar, cooperar, cumprir regras, ceder a vez, ouvir, esperar, respeitar opiniões diferentes… Aprendemos a ganhar e, sobretudo, a perder. Desenvolvemos a coordenação motora, apuramos a percepção do espaço que ocupamos, a consciência dos nossos limites e da nossa força. Brincando, exercemos o poder de imaginar, criamos laços e, assim, descobrimos que somos um, fazemos parte de um mundo de bilhões de pessoas com hábitos e costumes diferentes dos nossos.

Mil e uma brincadeiras

Elástico, amarelinha, esconde-esconde, pega-pega, gato mia, cabra-cega, passa anel, corre cotia, ciranda cirandinha… Quantos amigos você já fez participando de uma dessas brincadeiras? Atividades como essas são fórmulas mágicas para a aproximação de pessoas e o estabelecimento de relações. Estão presentes em todas as classes sociais e passam de ge-

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ração a geração. Brincamos das mesmas brincadeiras de que brincavam nossos avós e nossos pais. As cantigas são uma herança deixada para nós, resultado do casamento entre as diversas culturas que fizeram do Brasil esse país tão rico. São letras e ritmos que têm nas suas raízes elementos das culturas indígena, europeia e africana — as grandes responsáveis pela formação da identidade nacional.

E o que dizer dos trava-línguas, das parlendas e das adivinhas? As brincadeiras com as palavras aumentam o vocabulário, desembaralham a língua e treinam o raciocínio.

Tudo isso para dizer que brincar é tão saudável quanto um prato de arroz com feijão; produz tanto conhecimento quanto uma boa enciclopédia; propicia o movimento, a flexibilidade e o equilíbrio tanto quanto uma aula de musculação ou de ioga.

E é por todos esses motivos que muitos adultos levam a brincadeira a sério e gostam de ensiná-las para as crianças.

Trava-línguas, adivinhas, parlendas, sextilhas e acrósticos

E, mesmo quando o corpo precisa de descanso, a cabeça continua funcionando. Sabe aquele estoque imenso de palavras? Pois bem, chega a hora de ele ser usado até a última letra dizer: “Chega!”.

“Pia pinga, pinto pia. Quanto mais o pinto pia, mais a pia pinga.” Quem consegue falar essa frase rápido, sem engasgar? Os trava-línguas são uma das brincadeiras preferidas dos alunos do Brincantinho e também da Cumarim. Ela, que tanto gosta de tagarelar, usa esse recurso como exercício para pronunciar bem as palavras.

“Um, dois, feijão com arroz. Três, quatro, feijão no prato...” Todo mundo sabe recitar uma parlenda, mas poucos conhecem o verdadeiro nome dessas composições rimadas, bem fáceis de memorizar. As parlendas fazem parte da tradição oral, assim como as sextilhas.

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Admiro um pica-pau

trepado num pé de angico. Pulando de galho em galho toco-toco, tico-tico.

Não machuca a cabeça, nem quebra a ponta do bico.

Você consegue matutar por que essa composição é chamada de sextilha?

Conte o número de linhas. Além de ser uma estrofe com seis versos, a última palavra da segunda, da quarta e da sexta linha sempre rimam.

E aí, quando a lista de rimas acabar, será a hora de dar espaço ao acróstico. Esse é um nome que não é trava-língua, mas que também faz embaralhar. A diferença é que o embaralhamento se dá com as letras iniciais da horizontal, que formam outro nome ou ideia na vertical. Você consegue descobrir o segredo do acróstico abaixo?

Com profunda emoção

Uma história eu vou contar

Muita gente vai sorrir

Algumas vão até chorar

Rima, verso e anedota

Inventando os caminhos

Mar adentro vou chegar

Toda história tem começo, meio e fim. Abram alas para a Cumarim!

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a pimenta do rEinO

a peça Que InspIrou este lIvro

A pimenta do reino estreou no dia 14 de julho de 2012. A peça infantil foi inspirada na Clara, neta da Rosane Almeida e do Antonio Nóbrega.

Quando era pequena, a Clara tagarelava tanto quanto a Cumarim. Ninguém dava conta de acompanhar suas ideias. Ela era dona de um vocabulário enorme, mas ainda não sabia muito bem o que fazer com todas aquelas coisas que saíam desembestadas da sua boca.

O espetáculo contava com a direção de Charles Raszl; direção musical e arranjos de Mariana Fagundes; cenário e figurinos de Marisa Rebollo; e, no elenco, Alisson Lopes, Fernando Fagundes, Henrique Rímoli, Mariana Fagundes, Monique Franco, Michelle Rodrigues e Paula Sanches.

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Olá, leitor e leitora! Vocês gostaram da história deste livro? Sabiam que ela foi escrita pela Rosane Almeida?

INFORMAÇÕES PARATEXTUAIS

Eu sabia! Vi o nome dela lá na capa do livro.

Isso mesmo. A Rosane nasceu em Curitiba, no Paraná, em 1964, e passou toda a infância lá. Depois, mudou-se para São Paulo, onde estudou Artes Circenses na Escola Picadeiro. Em seguida, foi para a França, estudar na Escola Superior das Artes do Circo, e para a Suíça, onde estudou na Accademia Teatro Dimitri. De volta ao Brasil, continuou estudando dança, teatro e música. Em 1992, ao lado do músico Antonio Nóbrega, criou o Instituto Brincante, na capital paulista, com o objetivo de ministrar cursos e divulgar a cultura popular do Brasil.

Nossa, que legal! E o que a Rosane Almeida fazia quando era criança?

Ah, ela me contou que treinava muito a imaginação, por isso virou escritora! Brincava de casinha, de escolinha, jogava pião e soltava pipa. Nas férias, adorava brincar de roda, amarelinha e queimada. Ela me contou também que, quando ficava sozinha em casa, fazia de conta que as canetinhas eram suas amigas. E, um dia, disse que chorou muito porque a boneca dela falou que, quando crescessem, não iam mais tagarelar juntas.

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Que triste! E por que elas não iam mais tagarelar?

Hum… talvez porque os brinquedos só gostem de conversar com crianças ou porque gente grande tenha vergonha de conversar com eles.

E o que você achou dos desenhos do livro?

Ah, pode ser isso…

Ah, e de cantigas infantis, você gosta?

Achei lindos e coloridos! Eu já tinha visto bandeirinhas parecidas com essas em uma festa junina!

Verdade! É que as ilustrações foram inspiradas nas festas populares brasileiras, como as festas juninas e o Carnaval! Elas foram feitas pelo Willian Santiago, que, assim como a Rosane, nasceu no Paraná, mas na cidade de Cornélio Procópio, em 1990, e faleceu em 2021. O Willian era formado em Design Gráfico pela Universidade Estadual de Londrina.

Eu adoro as comidas típicas das festas juninas e as músicas de Carnaval.

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Pois a história de Cumarim está cheia de adivinhas, cantigas, parlendas e trava-línguas! Com a musicalidade dos versos, a leitura em voz alta da história é uma alegria só, parece uma festa junina!

Nossa! Então vamos ler cantando?

Pode ser, mas as adivinhas, cantigas, parlendas e trava-línguas só aparecem em alguns trechos do livro, porque o gênero textual principal dele é o conto. Descobri que é um conto porque é um texto em prosa curto, com poucas personagens e centrado nas ações de uma delas, Cumarim, uma menina que conhece o mundo mágico das palavras e que faz uma descoberta importante no fim da história!

É o livro Cumarim, a pimenta do reino!

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Cumarim é uma menina curiosa que, quando começa a falar, não para mais de fazer perguntas, inventar respostas para tudo, rimar versos, cantarolar e produzir sons batucando em tudo o que encontra pela frente. Certo dia, ela vai parar no Reino da Palavra, onde conhece uma rainha e descobre que não chegou àquele lugar por acaso.

A história de Cumarim é narrada em um conto entremeado de brincadeiras tradicionais brasileiras. São brincadeiras de rua, de roda e de palavras, passadas de geração em geração. As cantigas, as sextilhas, os trava-línguas e as adivinhas possibilitam uma leitura lúdica da história. O estudante ainda é levado a pensar sobre o uso responsável das palavras e seus significados. Por toda essa riqueza temática e de linguagem, a obra contribui para a formação leitora dos estudantes, incentivando o respeito ao próximo e a valorização da diversidade.

9540302000026 9 788566 811391 ISBN 978-85-66811-39-1
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