O UNIVERSO DA LINGUAGEM
O Chico Bento, na realidade, sabe – e muito bem – falar português, tanto é que a professora compreendeu as perguntas que ele fez. E que língua ele usou? A língua portuguesa, é claro. Como todo falante de um idioma, o Chico se comunicou com a professora empregando a maneira de falar que ele está acostumado a usar no seu dia a dia. E quanto à “gramática”? O Chico sabe ou não sabe “gramática”? Na fala dele aparece este trecho: “Quar são minhas nota?”
Linguagem, língua e fala
• Linguagem – qualquer código (sistema de sinais convencionais) por meio do qual os seres humanos podem realizar atos de comunicação. Pode ser verbal (palavras faladas/escritas) ou não verbal (ex.: sinais de trânsito, desenho, foto, filme, música). • Língua ou idioma – forma particular de linguagem utilizada por um determinado povo para se comunicar por meio da palavra falada ou escrita. Ex.: língua portuguesa, língua espanhola etc. • Fala – maneira individual de acordo com a qual cada pessoa utiliza concretamente sua língua.
É claro que o menino, usando essas mesmas palavras, poderia ter escolhido outras maneiras de falar. Assim, por exemplo: • Minhas nota são quar?
• São quar minhas nota?
Mas, com certeza, ele nunca usaria as palavras numa ordem como esta: *Nota são minhas quar? E por que o Chico jamais falaria assim? Ele não ordenaria as palavras dessa maneira porque, desde que nasceu e começou a ouvir e, depois, a falar, ele foi internalizando, isto é, foi aprendendo, na prática, que sequências como essa não são válidas no português; não respeitam o sistema de regras de funcionamento da língua portuguesa. É esse sistema de funcionamento que recebe o nome de gramática da língua e é pela prática diária, como falantes e ouvintes, que todos nós – você, eu, o Chico Bento... – assimilamos, internalizamos o conjunto de regras de funcionamento de nossa língua. A respeito dessa nossa capacidade de aprender as regras do idioma e utilizá-las adequadamente, leia estes dois pequenos textos: 1. Tecer teias e falar A linguagem é uma habilidade complexa e especializada [...]. As pessoas sabem falar mais ou menos da mesma maneira como as aranhas sabem tecer teias. A atividade de tecer teias não foi inventada por nenhum gênio-aranha desconhecido e não depende de uma educação adequada nem de aptidão para a arquitetura ou para a construção civil. As aranhas tecem teias de aranha porque têm cérebros de aranha, que lhes dão o impulso e a competência para tecê-las.
Steven Pinker. In: Gennaro Chierchia. Semântica. Campinas: Editora da Unicamp; Londrina: Eduel, 2003. p. 28-29. 2. As regras do idioma [...] os falantes e ouvintes de uma mesma língua observam um número não pequeno de regras – mil a mil e quinhentas é uma estimativa já admitida –, ao falarem e ouvirem. Tais regras constituem um sistema [...]. É a esse sistema que se dá o nome de gramática de uma língua [...]. O normal é que um indivíduo normal internalize praticamente todas as regras de sua língua já ao atingir doze-treze anos.
Antônio Houaiss. O que é língua. São Paulo: Brasiliense, 1990. p. 19. (Primeiros Passos).
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