Revista Comuna 93

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GUERRA, HOJE? Tenho 27 anos. Não vivenciei uma guerra mundial, a ditadura, nem mesmo uma guerra civil. Todas as “guerras” que consegui compreender com a maturidade foram distantes, afastadas da minha realidade. Apesar disso, vivo numa sociedade que sofre, ainda hoje, as consequências desses conflitos. E isso acontece com uma grande parte da população, talvez a maioria dos usuários das redes sociais, por exemplo. Quando lemos, então, as palavras de Jesus no Sermão do Monte, onde Ele diz que são “bem-aventurados os pacificadores”, logo pensamos que isso não faz muito sentido, que é algo muito longe do nosso tempo – ou da nossa posição geográfica. Alguns podem dizer até que falta praticidade na aplicação e na compreensão dessas palavras. As batalhas hoje não são travadas apenas por demarcação de fronteiras, mas por liberdade de pensamento. A guerra que vivenciamos – todos nós, independentemente do país em que vivemos – acontece em uma terra de ninguém, chamada internet. As armas letais que usamos são as nossas palavras. No campo de batalha, as opiniões são expressas sem nenhum controle, não importa de quem partam ou a quem atinjam. É “legal” e “politicamente correto” ter um discurso pacifista em nossos dias. Fica bonito na timeline. Mas o que Jesus propõe em uma das mensagens mais desafiadoras do Seu ministério é que ser pacificador é ter uma identidade diferente. Não é comum ou natural. Não tem a ver com opinião. Para sermos pacificadores temos que ser filhos de Deus – temos que assumir o ministério da reconciliação que nos foi dado. A reconciliação está disponível para todos, mas para alcançá-la precisamos ter a nova identidade de filhos. Pacificadores. “Abençoados são vocês, que conseguem mostrar que cooperar é melhor que brigar ou competir. Desse modo, irão descobrir quem vocês são e o lugar que ocupam na família de Deus” (Mt. 5.9 MSG). É assim que encaramos a tarefa dos pacificadores do século 21: é custoso, mas dá a glória a Deus e aponta Jesus como um caminho melhor para a paz e a reconciliação, afinal de contas, Ele é o Príncipe da Paz. Boa leitura, Gustavo Rosaneli Pela equipe editorial

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#93 | NOVEMBRO | 2017

DIREÇÃO GERAL:

Carlos Alberto de Quadros Bezerra CONSELHO GESTOR:

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Gustavo Rosaneli JORNALISTA RESPONSÁVEL:

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Gráfica MaisType DISTRIBUIÇÃO:

11.500 exemplares


PACIFICADORES Agentes de reconciliação no século 21

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DISCIPULADOS PELA CRUZ

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VIVEMOS A MAIOR CRISE HUMANITÁRIA DA HISTÓRIA MODERNA

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À PROCURA DA FELICIDADE

O AMOR QUE MUDA O MUNDO

O segredo do Sermão do Monte

Vivendo uma vida de impacto e transformação

RECOMENDO

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JUCA

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PACIFICADORES: A MARCA DOS FILHOS DE DEUS O custo de promover a paz em nossos dias

EXEGESE, SIM. EXEJEGUE, NÃO Transbordar de compaixão para ensinar

QUE TIPO DE EXTREMISTAS SEREMOS? 5


PALAVRA DO PRESIDENTE

À PROCURA DA FELICIDADE O SEGREDO DO SERMÃO DO MONTE

ma parte da história é já bem conhecida: aos 28 anos, Chris Gardner se encontrou sem emprego, pai solteiro e morando na rua. Mas nem tudo o que foi retratado no filme “À procura da felicidade” ocorreu exatamente daquela maneira na vida real. Na época em que tudo aconteceu, a criança não tinha cinco anos de idade, como mostra o longa protagonizado por Will e Jaden Smith, mas apenas 14 meses. A história de vida deste homem está atrelada a um contexto social em que o status de felicidade está relacionado com o esforço pelo trabalho e a recompensa através do acúmulo - nenhuma novidade dentro dos moldes do mundo globalizado. Mas, a tão perseguida felicidade, já disse alguém, não é um lugar aonde se chega, mas um caminho por onde se vai. Em outras palavras, o modo como vivemos é mais importante do que a conquista em si de um objetivo. Jesus deixou claramente essa mensagem para Seus discípulos no famoso Sermão do Monte (Mt. 5.1-12). O Mestre nos oferece um ensino sobre a felicidade que se contrapõe ao definido pelos padrões sociais. Ele afirma que alcançar a alegria em sua expressão máxima e duradoura depende muito mais do que está dentro de nós do que do ambiente onde estamos; é uma escolha que fazemos, conscientemente, e não simplesmente o resultado do que fazem conosco. A verdadeira felicidade, disse Jesus, não depende do reconhecimento dos outros ou do prestígio popular, mas do meu relacionamento com Deus, da comunhão com meus irmãos, do fato de sermos cientes de que a mais satisfatória forma de bem-estar próprio, encontra-se em trabalhar para buscar a felicidade do meu próximo. 6

Quando Cristo utilizou diante daquela multidão a palavra grega “makarios” - bem-aventurados -, Ele estava afirmando que a verdadeira felicidade não oscila ao sabor das circunstâncias da vida, mas é um estado da alma, que mediante a fé, a esperança e o amor, transforma a realidade circunstancial conforme a verdade da Palavra de Deus. Olha para além desta vida, para a eternidade. Olha para os relacionamentos e não para as conquistas. Os pobres de espírito, aqueles que carecem de orgulho, de presunção ou de arrogância. Os que choram, sensíveis ao próprio pecado e às fraquezas do próximo. Os mansos, que, dominados pelo Espírito Santo, servem sem esperar algo em troca. Os que têm fome e sede de justiça e clamam para que “corra a retidão como um rio, a justiça como um ribeiro perene” (Am. 5.24). Os misericordiosos, dispostos a serem os primeiros a perdoar e restaurar relacionamentos. Os puros, coerentes. Os pacificadores que batalham para promover a paz e a reconciliação. Os que sofrem injustamente por amarem a Jesus e obedecerem Seus mandamentos. Deles, disse Jesus, é o Reino. Serão consolados, satisfeitos, obterão misericórdia, verão a Deus e serão chamados de filhos! Há muito egoísmo no amor humano. Na grande maioria das vezes, a gente pensa primeiro na própria felicidade.


Cena do filme “À procura da felicidade”, de 2006

Nossos relacionamentos têm se tornado quase um contrato de prestação de serviços. “Se você me ama assim, bonitinho, sem questionamentos e problemas, receberá como prêmio o meu amor. E, como sou maravilhoso demais, você deve fazer por merecer-me!” Essa fala é muito estranha ou é bem parecida com a experiência de amor e a compreensão de felicidade que o mundo tenta ensinar? A felicidade verdadeira envolve o próximo. Nossa vida expressará o amor de Cristo e, portanto, a verdadeira felicidade, na maneira como nos relacionamos com as pessoas. Assim como expressamos amor pelo Senhor quando obedecemos aos Seus mandamentos, expressamos amor pelas pessoas quando as tratamos conforme Jesus nos ensinou. O verdadeiro amor pensa primeiro no outro. Bem-aventurados aqueles que ouvem uma mensagem tão poderosa e a colocam em prática, deixando que o Espírito Santo os use para serem verdadeiros agentes de transformação num mundo que vive à procura da felicidade. Deixe que o Senhor use sua vida para espalhar a verdadeira felicidade!

Nossa vida expressará o amor de Cristo e, portanto, a verdadeira felicidade, na maneira como nos relacionamos com as pessoas

CARLOS ALBERTO BEZERRA Carlos Alberto Bezerra é fundador da Comunidade da Graça. Um homem apaixonado por pessoas. Pastor há 51 anos e casado com Suely pelo mesmo tempo. Tem seis filhos e 16 netos. O amor, o serviço e a valorização da família são suas ênfases ministeriais. Pregador apaixonado, escritor inspirador.

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TRANS FORMAÇÃO

O amor que muda o mundo VIVENDO UMA VIDA DE IMPACTO E TRANSFORMAÇÃO

que você faria com as pessoas que assassinaram o seu marido? Talvez essa seja uma pergunta difícil de se responder. Na teoria, até sabemos o que fazer, mas na prática as coisas podem ser um pouco diferentes. Elisabeth Elliot teve que responder, com sua própria vida, a essa pergunta. Na década de 1950, ela e seu marido, Jim Elliot, viajaram com seu bebê de 10 meses de idade e mais quatro famílias para o Equador. Eles queriam levar a boas novas de Cristo a tribos indígenas que ainda não haviam sido alcançadas pelo Evangelho. Algumas delas nem sequer tinham contato com o mundo exterior. Depois de muito tempo enviando presentes e sinais de paz aos índios, Jim Elliot e os quatro outros missionários entenderam que era hora de um contato pessoal. Suas esposas e filhos ficaram na base missionária enquanto eles foram ao encontro dos Auca, uma tribo conhecida por assassinar todos aqueles que tentaram se aproximar. Com aqueles homens não foi diferente. O exército equatoriano encontrou seus corpos no rio Curray, brutalmente perfurados por lanças e machados. A resposta de Elisabeth ao assassinato de seu marido foi a graça. Mesmo viúva e com uma filha recém-nascida, ela continuou investindo na vida daqueles índios. Conseguiu o contato com eles e viveu por dois anos na tribo. Elisabeth Elliot levou a Palavra de Deus e a salvação àqueles que assassinaram o seu marido. Seu amor a Deus gerou um impacto extremamente profundo em homens e mulheres que nunca tinham sequer ouvido falar do Evangelho. 8

Assim como fez com Elisabeth, usando-a mesmo no momento de maior dor em sua vida, o Senhor quer fazer conosco nos dias em que vivemos. Hoje, as mulheres atuam em praticamente todos os setores da sociedade. E é no lugar onde estamos que Ele quer nos usar, que Ele quer que sejamos sal, luz, pacificadoras, reconciliadoras. Temos visto, diariamente, o aumento da violência em nossas cidades. Pais abandonando seus filhos, matando seus filhos. Filhos se voltando contra seus pais. Famílias inteiras chorando por seus entes queridos, que acabaram mortos por balas perdidas. O mundo precisa de Deus, precisa da esperança que só encontramos em Jesus. Muitas vezes, temos nos anulado dentro das nossas casas. Vivemos nossa vida, cuidamos da nossa família e dos nossos assuntos, ficamos no nosso reduto, vendo apenas o que acontece ali, mas não estamos dando conta das coisas que estão acontecendo do lado de fora. Não temos a consciência de que temos uma responsabilidade muito grande e uma influência para exercer no mundo ao nosso redor. A visão da Comunidade da Graça é ser “uma igreja-família, vivendo o amor de Cristo, alcançando o próximo e formando discípulos”. Que responsabilidades e objetivos temos que alcançar de acordo com essa visão? Estamos nos equipando com a leitura da Palavra e com intimidade com Deus para podermos trabalhar e investir


na vida das pessoas necessitadas deste mundo? Temos que trabalhar para alcançar o nosso próximo. Em sua primeira carta aos coríntios, o apóstolo Paulo fala que somos “cooperadores de Deus; (...) lavoura de Deus e edifício de Deus” (3.9). O Senhor quer nos usar e está nos chamando para causar um grande impacto na nossa geração. Assim como Elisabeth Elliot impactou aqueles índios. Não podemos estar conformadas em apenas ir à igreja, cantar, ouvir sermões e viver a vida de sempre. Não! Nós temos uma missão muito importante e precisamos cumpri-la. Precisamos estar sempre preparadas para dizer às pessoas qual é a razão da nossa esperança (1Pe. 3.15). Para ter a sensibilidade de ajudá-las a encontrarem o caminho certo, Jesus (Jo. 14.6). Imaginem se cada uma de nós estivesse envolvida no projeto de ganhar uma vida para Jesus. Se cada leitor desta revista se propusesse a isso. O milagre que Deus tem feito em nós tem que afetar positivamente as outras pessoas. Temos que desejar que cada um tenha uma experiência com o Deus verdadeiro. Com o Deus que ouve, fala e responde as nossas orações. O Senhor quer nos usar. Ele tem um propósito e quer que sejamos parte ativa dele. Em seu livro “Uma Vida com Propósitos”, Rick Warren diz que “enquanto esperamos que Deus trabalhe por nós, Ele espera trabalhar por meio de nós”. Por isso, precisamos estar preparadas para cumprir justamente a função que Ele tem para nós. Temos que buscar uma intimidade profunda com o Senhor e entender o que Ele quer fazer em nós e principalmente através de nós. E, então, você está pronta para impactar este mundo?

SUELY BEZERRA Fundadora e líder do Ministério Mulheres Intercessoras, Suely Bezerra tem uma vida marcada pela oração e intercessão. Tem mentoreado líderes e pastoras ao redor do país durante toda sua vida. É esposa do Pr. Carlos Alberto Bezerra. Eles estão juntos há 51 anos, têm seis filhos e 16 netos.

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INSPIRAÇÃO

PACIFICADORES: A MARCA DOS FILHOS DE DEUS O CUSTO DE PROMOVER A PAZ EM NOSSOS DIAS

arece fácil perceber que o mundo precisa de pacificadores. Tanta discórdia, tanta guerra, tanta gente disposta a brigar por coisas sem importância. “Bem-aventurados os pacificadores, pois serão chamados filhos de Deus” (Mt. 5.9). A Bíblia tem muitas maneiras de descrever a pessoa que está sempre disposta a quebrar a paz. “O coração dos homens está cheio de maldade e de loucura durante toda a vida” (Ec. 9.3). O Novo Testamento também tem sua porção sobre pessoas ruins. “São nuvens sem água, impelidas pelos ventos; ondas bravias do mar, espumando seus próprios atos vergonhosos” (Jd. 1.12-13). E de onde vêm as maldades, as torpezas, as guerras? “Vocês cobiçam coisas e não as têm; matam e invejam” (Tg. 4.2). É exatamente porque o ser humano é propenso a viver em desavenças que os pacificadores são tão necessários. Parece fácil perceber que nós somos os pacificadores, nós que nos chamamos de cristãos, aqueles que agem como Cristo agiria. Afinal, Jesus é o “Príncipe da Paz” (Is. 9.6). A pessoa que não vive em paz consigo também não consegue ter paz com outras pessoas. A pessoa que vive com medo de ser atacada, muitas vezes, prefere atacar antes. Mas a pessoa que tem a Cristo é modificada por dentro. Como disse Paulo: “Deus em Cristo estava reconciliando consigo o mundo” (2Co. 5.19). E completou: “E nos confiou a mensagem da reconciliação”. Fomos reconciliados com Deus. E a coisa mais natural no texto bíblico é concluir que a paz deve se estender de nós para as pessoas. Quem está em paz com Deus não pode estar em guerra com as pessoas. 10

O que Jesus diz dos bem-aventurados pacificadores? Que serão chamados filhos de Deus. Ser pacificador não é um luxo que às vezes a gente se dá. Ser pacificador é marca de quem é filho de Deus. E ser pacificador tem um preço, assim como teve um preço para o Cristo que chamamos de Senhor. Ele suportou vergonha e agressão para que pudesse nos encaixar na reconciliação que estava promovendo. E nós também pagamos um preço alto pela paz. Em tempos de uso disseminado das redes sociais, é muito fácil agredir, pois a agressão está a um clique de distância. Basta categorizar uma pessoa, diminuí-la a um rótulo, e depois xingá-la. Basta alguém categorizar você, diminuí-lo a um rótulo, para criar discórdia. A falta de paz vai e volta. Afeta o agressor e o agredido. A paz é uma interrupção na guerra dos egos e dos medos. Ela se impõe pela agressão que é recebida,


mas que não é distribuída. Ela se impõe pelo não revide, e por isso é tão difícil e tão necessária. O medo pode ser agressivo, mas também pode ser indiferente. O que é pior? Quando somos agredidos ou quando somos invisíveis? Quando você é alguma coisa que ainda merece a atenção do agressor, ou quando você simplesmente é tão insignificante que sequer é notado? A falta de paz é cheia de nuances perversas. Mas se o medo está por trás da falta de paz, o que pode ser o remédio para o medo? “No amor não há medo; o perfeito amor expulsa o medo, porque o medo supõe castigo. Quem tem medo não está aperfeiçoado no amor” (1Jo. 4.18). Quem é o filho amado? Quem não tem medo de ser condenado porque já foi absolvido pelo amor insondável de Cristo. E filhos amados nunca vão para a guerra. Eles baixam as armas, e viram pacificadores. “Vocês não receberam um espírito que os escravize para novamente temerem, mas o Espírito os adota como filhos, por meio do qual clamamos: ‘Aba, Pai’” (Rm. 8.15). Então, em paz, seremos chamados filhos de Deus.

A paz é uma interrupção na guerra dos egos e dos medos

CARLOS BEZERRA JR. Pastor, médico, deputado estadual e presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de São Paulo. Casado com Patrícia Bezerra, e pai de Giovanna e Giulianna

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LIDERANÇA

Exegese, sim. Exejegue, não RESGATANDO OS VALORES DO REINO

uando eu era criança, um dos maiores elogios que um pai podia receber sobre os seus filhos – ou ele mesmo oferecer – era: “que obedientes eles são”. A palavra obediência não possui boa reputação nos nossos dias. As pessoas não obedecem às leis, não obedecem às autoridades, muito menos aos pais. Mas será que para um pai é melhor ouvir que seu filho é bonito, inteligente ou obediente? Antigamente, os reis eram anunciados com pompa, festa, brilho, ostentação. Qualquer coisa longe daquilo, nem mereceria ser considerado monarca. Mas, Jesus foi um Rei diferente. Foi anunciado no deserto por um cara bastante excêntrico, que se vestia com pele de camelo e comia gafanhotos. Batizou-se nas águas sujas do Jordão (Mt. 3.13), onde Naamã recusava-se a mergulhar sete vezes (2Rs. 5). Jesus era um Rei diferente, obediente. Por obediência investiu Sua vida em doze judeus casca grossa. Levou-lhe três anos para mudar o paradigma desses discípulos, tirar o judaísmo de dentro deles, tirar mais de mil anos de tradição judaica da lei de Moisés. Aqueles homens mudaram da água para o vinho. Durante os três anos do Seu ministério, Jesus foi introduzindo o novo odre, que contém o vinho novo. Você sabe como funcionava o odre? Naquela época, os homens espremiam a uva, a peneiravam e a colocavam numa espécie de saco feito com pele de cabra, que era fechado com uma rolha e cera de abelha, para que não entrasse ar. Aquilo era pendurado num lugar escuro e fresco. Após o processo de fermentação, o vinho estaria pronto. A fermentação é um processo químico que produz liberação de gases. Então, se o odre não for flexível, novo, e tiver a capacidade de se expandir, ele explode e, como Jesus disse: “perde-se o vinho e o odre” (Mc. 2.22). Todo homem em Jerusalém sabia como fazer vinho e entendeu o que Cristo estava tentando explicar. O odre velho da lei de Moisés não tinha capacidade para conter o vinho novo da salvação pela graça mediante a fé, do perdão dos pecados, da misericórdia. Não dá para colocar vinho novo debaixo de uma estrutura legalista. Tinha que ter um odre novo. Qual? A igreja nas casas, a teologia da mesa (At. 2.42). 12


Aqueles doze foram enviados – assim como nós – para fazerem discípulos (Mt. 28.19-20). Como? Indo, batizando-os e ensinando-os a obedecer. Um Rei obediente pode exigir que os Seus também sejam obedientes. Deus queria ter comunhão com o homem. Ele utilizou diversos profetas e formas, mas nada chegou a tocar profundamente o coração do homem. Apenas Cristo reestabeleceu a comunicação. E para isso, precisou de um corpo humano. Jesus recebeu três tarefas para cumprir: trazer o Reino de Deus até nós, morrer na cruz pelos nossos pecados e levar as boas notícias do Reino aos quatro cantos da terra. Mas, para cumprir a última, Ele precisava de um outro corpo, Sua igreja. Ele disse que voltaria e habitaria nesse corpo. E assim o fez. É esse o segredo do qual Paulo fala que foi revelado a nós: “Cristo em vós, esperança da glória” (Cl. 1.27). Nossa esperança não está numa técnica específica ou num método. Não estamos vendendo um produto chamado Evangelho. É o Espírito Santo que convence as pessoas do pecado, não nosso papo. Muitos querem um segredo para que sua célula funcione. É fácil: Cristo no centro e a nossa obediência no coração. Sem isso, não tem nada. O odre novo é a igreja em movimento. Os discípulos foram para a rua, se reuniram nas casas. A igreja precisa resgatar os valores do Reino e dos relacionamentos. O Sermão do Monte é a versão curta da constituição do Reino de Deus. É um Reino diferente, de justiça, de amor, de paz, de misericórdia, de graça. Precisamos deixar de fazer exejegue, querendo colocar o velho no novo. Vinho novo precisa de um odre novo. Precisamos mudar o paradigma, aprender com Jesus. As igrejas são saleiros. Nós somos o tempero de um mundo sem sabor. As pessoas precisam ver Jesus em nós. Como? Serviço, bacia e toalha. Essas eram as ferramentas do nosso Rei, e são as mesmas que precisamos usar para fazer discípulos.

O odre velho da lei de Moisés não tinha capacidade para conter o vinho novo da salvação pela graça mediante a fé, do perdão dos pecados, da misericórdia

ROBERT LAY Robert Lay é pastor titular da Igreja Evangélica Irmãos Menonitas de Curitiba, local onde, há mais de 18 anos, realiza com êxito um trabalho baseado em células e evangelismo por amizade. 13


DISCIPULADO

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Discipulados pela cruz SEM UM NOVO CORAÇÃO NINGUÉM CONSEGUE SEGUIR A JESUS uvimos falar muito, hoje em dia, sobre discipulado, muitas pessoas falando sobre “meus discípulos”, “meu discipulador”. Porém, a pergunta que fica é: será que realmente temos feito discípulos de Jesus? Que tipo de discípulos existem por aí? Temos visto muitos métodos, ensinamentos e estratégias para se fazer discípulos. Mas, como pessoas que creem nos ensinamentos de Jesus Cristo e na Sua obra, precisamos nos atentar, acima de todas as coisas, a tudo o que Ele fez e ensinou. Jesus formou doze homens simples que, do ponto de vista de muitos, não tinham condições de chegar aonde chegaram. Eles foram Seus sucessores. E como Ele fez isso? Através de discipulado intenso. Jesus acreditou naqueles homens, Ele investiu tempo e os amou. A melhor maneira de formar Cristo em uma pessoa é investindo tempo, acreditando nela, amando e, principalmente, apontando-a sempre para a cruz. O profeta Ezequiel nos diz algo muito importante em seu livro: “Darei a vocês um coração novo e porei um espírito novo em vocês; tirarei de vocês o coração de pedra e lhes darei um coração de carne. Porei o meu Espírito em vocês e os levarei a agirem segundo os meus decretos e a obedecerem fielmente às minhas leis” (Ez. 36.26-27). Esse texto nos faz entender que discípulo não nasce pronto, ele precisa passar pela experiência do novo nascimento, receber um novo coração e ser cheio do Espírito Santo. Como posso tornar uma pessoa discípulo de algo se ela nem mesmo crê naquilo? A experiência do novo nascimento é vital na vida do discípulo. Pode parecer bobagem, mas muitos não enxergam isso. Por acharem que uma pessoa tem poten-

cial, é um líder nato e tem influência, se esquecem do principal: a nova vida em Cristo. Sem um novo coração, ninguém consegue absorver os ensinamentos do Senhor Jesus. Sem um novo coração, ninguém consegue dar a outra face (Mt. 5.39). Sem um novo coração, ninguém consegue amar o seu inimigo e orar por quem lhe persegue (Mt. 5.44). Sem um novo coração, ninguém consegue perdoar setenta vezes sete (Mt. 18.22). Ser discipulo de Cristo é agir como Ele agia, é ser como Ele era, é ter a imagem dele formada em nós. Tentar discipular um não-regenerado é como domesticar uma cobra, é impossível. Uma hora ou outra, ela irá picá-lo. Agora, uma ovelha é diferente. Por mais difícil que seja, ela irá pelo caminho que você aponta. Vivemos em uma geração egoísta, uma geração que acha que sabe de tudo e que tem razão sobre tudo. Somente um novo coração para fazer com que os valores desta geração sejam anulados e os valores do discipulado pela cruz venham à tona. Qual o discipulado perfeito? Qual o melhor método? Qual a melhor estratégia? O discipulado perfeito, o melhor método e a melhor estratégia são aqueles que apontam para a cruz de Cristo. Ela é o principal caminho para um discipulado sadio. Nunca podemos nos esquecer de que, para o discipulador apontar para a cruz, ele tem que estar ligado a ela. E a experiência com a cruz é uma experiência diária. É viver como disse o apóstolo Paulo em Gálatas 2.20: “Fui crucificado com Cristo. Assim, já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim. A vida que agora vivo no corpo, vivo-a pela fé no filho de Deus, que me amou e se entregou por mim”.

Ser discípulo de Cristo é agir como Ele agia, é ser como Ele era, é ter a imagem dele formada em nós

LEANDRO MENEZES Leandro Menezes é pastor e líder de jovens da CG Itaquera. É casado com a Fabiana, com quem tem dois filhos, Debora e Rafael

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CAPA

AGENTES DE TRANSFORMAÇÃO NO SÉCULO 21 GUSTAVO ROSANELI E CÉSAR STAGNO

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Paz - do latim, Pax - é geralmente definida como um estado de calma ou tranquilidade, uma ausência de perturbações e agitação. Derivada do latim Pacem, pode referir-se à ausência de violência ou guerra. De fato, o filósofo alemão Immanuel Kant, inspirado nos ideais da Revolução Francesa, definiu que um estado de paz mundial poderia ser alcançado através de uma república única, capaz de representar as aspirações naturalmente pacíficas de todos os povos e indivíduos. Apoiados nesse critério, governos de diferentes países deram origem à Organização das Nações Unidas (ONU) ou à Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), as que sugerem que a paz deva ser obtida através de legislação em assuntos internacionais, ou, num caso extremo, pela força - em inglês: peace through strength. Existem muitas diferentes teorias de paz que envolvem o estudo da transformação dos conflitos, desarmamento e cessação de violência. Mas a paz não deve ser entendida apenas como um estado de ausência de guerras, ela é um estado de equilíbrio e entendimento em si mesmo e entre outros, onde o respeito é adquirido pela aceitação das diferenças, tolerância, os conflitos são resolvidos através do diálogo, os direitos das pessoas são respeitados e suas vozes são ouvidas, e todos estão em seu ponto mais alto de serenidade sem tensão social. No plano pessoal, paz designa um estado de espírito isento de ira, de desconfiança e - de um modo geral - de todos os sentimentos negativos. Assim, ela é desejada por cada pessoa para si próprio e, eventualmente, para os outros, ao ponto de ter-se tornado uma frequente saudação - “que a paz esteja contigo” - e um objetivo de vida.

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Para que haja paz, é necessário que cada indivíduo se reconcilie com Seu Criador, por meio da fé no sacrifício de Cristo É necessário, então, estabelecer uma diferença importante. As mencionadas organizações, de grande reconhecimento internacional, e até o respeitado prêmio Nobel da Paz - ironicamente, criado pelo inventor da dinamite -, nasceram da filosofia pacifista de Kant. Mas há uma grande diferença entre pacifistas e pacificadores. Já parou para pensar em qual é a guerra que vivemos hoje?

PACIFISTAS X PACIFICADORES

Em Seu Sermão do Monte, Jesus falou sobre os pacificadores (Mt. 5.9), não sobre os pacifistas, e isto não foi casual. A diferença entre os dois termos é gritante, embora não seja óbvia. Um pacifista é aquele que prega a paz e anseia por ela, mas ele próprio não a traz. O pacificador, além de buscar a paz, age para efetivamente promovê-la. Cristo foi o pacificador por excelência. Isaías o chamou de Príncipe da Paz e o apóstolo Paulo disse que foi do agrado do Pai que “havendo por ele feito a paz pelo sangue da sua cruz, por meio dele reconciliasse consigo mesmo todas as coisas, tanto as que estão na terra, como as que estão nos céus” (Cl. 1.20). Enquanto houver inimizade entre o homem e Deus, não haverá paz verdadeira e duradoura sobre a Terra. Por isso, para que haja paz, é necessário que cada indivíduo se reconcilie com seu Criador, por meio da fé no sacrifício justificador de Cristo: “Portanto, uma vez que pela fé fomos declarados justos, temos paz com Deus por causa daquilo que Jesus Cristo, nosso Senhor, fez por nós” (Rm. 5.1). O caminho para a paz passa primeiramente pela reconciliação de cada indivíduo com Deus. Sem isso, a procura pela paz social, nos lares, nas instituições ou em qualquer lugar será absolutamente em vão e não passará de um belo discurso. Não será eterna, duradoura, e nem será, de fato, paz. 18


As quatro atitudes dos pacificadores Martyn Lloyd-Jones, pastor britânico do século 20, foi um dos que muito dedicou-se a estudar o Sermão do Monte. O trabalho desenvolvido na célebre Capela de Westminster permitiu que apresentasse quatro atitudes básicas que, incorporadas às nossas ações diárias, tornam-nos agentes da paz: Não falarmos o que não devemos: “Acredito ser consenso entre nós que se pudéssemos controlar a nossa língua haveria menos discórdia no mundo. Tiago, um dos mais práticos escritores do Novo Testamento, expressou essa questão de uma maneira conclusiva: “Toda pessoa esteja pronta para ouvir, mas demore para falar e ficar com raiva” (1.19).” Não repetirmos ideias grosseiras e indignas: “O pacificador é um indivíduo que não fica dizendo bobagens. Pelo contrário, muitas vezes, prefere calar em nome da paz. Muitas pessoas vivem dando desculpas para um falar desenfreado, afirmando que precisavam desabafar. Esse não é o caminho e nem a atitude certa para um cristão preocupado com a edificação do próximo.” Encararmos toda e qualquer situação à luz do Evangelho: “Quando você estiver enfrentando alguma situação conflitiva não fale, pense. Pergunte: Por que esta situação está acontecendo comigo? Que relação esta situação tem com este momento da minha vida e com a minha experiência com Deus? Quem são as pessoas que estão envolvidas nesta situação? São tementes a Deus? Levam a Palavra de Deus a sério?” No momento em que a gente decide agir assim, a paz já começa a reinar.” Considerarmos a batalha espiritual: “Se você é uma pessoa que está buscando viver de modo digno o Evangelho, vai enfrentar oposição espiritual. Em Efésios 6 há um precioso conselho do apóstolo Paulo: “Revesti-vos de toda a armadura de Deus”. Satanás vai usar pessoas e situações para minar a nossa paz. Não ignoremos os seus desígnios (2Co. 2.11).”

O pacificador é um indivíduo que não fica dizendo bobagens. Pelo contrário, muitas vezes, prefere calar em nome da paz.” Martyn Lloyd-Jones 19


Precisamos fazer a paz acontecer e não sermos meros espectadores dos acontecimentos, esperando que alguém faça algo PRÍNCIPES DA PAZ Através da reconciliação, Deus nos torna embaixadores em Cristo para anunciar o Evangelho do Seu Reino em toda a terra: “E tudo isso vem de Deus, aquele que nos trouxe de volta para si por meio de Cristo e nos encarregou de reconciliar outros com ele. Pois, em Cristo, Deus estava reconciliando consigo o mundo, não levando mais em conta os pecados das pessoas. E ele nos deu esta mensagem maravilhosa de reconciliação. Agora, portanto, somos embaixadores de Cristo; Deus faz seu apelo por nosso intermédio. Falamos em nome de Cristo quando dizemos: “Reconciliem-se com Deus”” (2 Co. 5.18-20). Mesmo estando em paz com Deus, entretanto, não é possível viver em completa paz enquanto vivermos fisicamente no mundo. O mal se alastrou de tal forma sobre a terra, que apenas uma restauração profunda pode restabelecer a plena paz e o equilíbrio originais da criação. No texto grego, “pacificadores” significa literalmente “fazedores da paz”, “aqueles que a promovem”, os que “trabalham por ela”. Assim, Jesus nos impele a tomarmos atitudes. Não há espaço para expressões passivas. Precisamos fazer a paz acontecer e não sermos meros espectadores dos acontecimentos, esperando que alguém faça algo. Nós, filhos de Deus, precisamos agir. Não tem como sermos cristãos se agirmos apenas como pacifistas, procurando manter uma falsa sensação de paz. Precisamos trabalhar para que a paz aconteça em nosso lar, bairro, cidade, estado e nação. E isso só será possível quando testemunharmos dele às pessoas, mostrando que só existe paz real quando deixamos Cristo transformar nosso ser e habitar em nós. Os pacificadores manifestam forte compromisso e real prazer em promover a paz na relação do homem consigo mesmo, com o próximo e com Deus. A origem desse amor pela harmonia está na comovente e transformadora experiência do arrependimento acompanhado de lágrimas (Mt. 5.3-4) e do abraço divino. 20


O compromisso com a paz prova que ele tem a essência do seu Criador. O pacificador tem como certo que o comportamento amável desarma os espíritos, que a resposta branda desvia o furor e que transformar inimigos em amigos é arte a ser aprendida pelos filhos de Deus. O pacificador não quer voltar a praticar os mesmos atos de desamor que o levaram a chorar de arrependimento na presença de Deus. O pacificador, por conhecer a Deus, ama ao próximo como a si mesmo. Nisso reside o motivo maior do seu compromisso com a paz. Ele sabe que, se promove a paz nos seus relacionamentos, contagiará e provocará uma revolução muito profunda e diferente da proposta pelo pacifismo kantiano. “Vocês, porém, são povo escolhido, reino de sacerdotes, nação santa, propriedade exclusiva de Deus. Assim, vocês podem mostrar às pessoas como é admirável aquele que os chamou das trevas para sua maravilhosa luz. (...) É da vontade de Deus que, pela prática do bem, vocês calem os ignorantes que os acusam falsamente. Pois vocês são livres e, no entanto, são escravos de Deus; não usem sua liberdade como desculpa para fazer o mal. Tratem todos com respeito e amem seus irmãos em Cristo. Temam a Deus e respeitem o rei.” (1 Pe. 2.9 e 2.15-17).

O pacificador, por conhecer a Deus, ama ao próximo como a si mesmo

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FATO

VIVEMOS A MAIOR

CRISE HUMANITÁRIA DA HISTÓRIA MODERNA

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o começo deste ano, o diretor de operações humanitárias da ONU, Stephen O’Brien, disse que o mundo vive sua maior crise humanitária desde a criação da organização, em 1945. Segundo dados da própria ONU, mais de 20 milhões de pessoas em quatro países estão passando fome. E se não houver uma intervenção global de esforços coletivos e coordenados, muitos morrerão por desnutrição ou vítimas de doenças. A situação de fome é definida quando um país tem mais de 30% de suas crianças menores de cinco anos sofrendo com a desnutrição aguda e as taxas de mortalidade são de pelo menos duas mortes a cada 10 mil pessoas por dia, entre outros critérios. A pior crise está no Iêmen, a nação mais pobre do mundo árabe: dois terços da população precisam de ajuda e mais de sete milhões de iemenitas passam fome e não sabem de onde virá sua próxima refeição. O país está envolvido em conflitos já há quase três anos e as forças rebeldes impedem a chegada de ajuda à população. A mesma coisa acontece no Sudão do Sul, onde mais de um milhão de crianças sofrem com a desnutrição aguda. Na Somália, mais da metade da população precisa de ajuda humanitária e proteção. E no nordeste da Nigéria, um conflito de sete anos promovido pelo grupo extremista Boko Haram matou mais de 20 mil pessoas. Segundo a ONU, a desnutrição na região atingiu níveis tão altos que alguns adultos não conseguem mais andar e há comunidades que perderam todos os seus bebês. Além da questão da fome e da falta de recursos, vivemos também uma crise de refugiados. Nunca antes houve tantas pessoas obrigadas a abandonarem suas casas e seus países por conta de conflitos internos e desastres naturais. Estima-se que, hoje, existam mais de 65 milhões de refugiados espalhados pelo mundo, sendo que uma parte considerável deste número é de crianças. Ter que abandonar o conforto do lar não tem sido a maior dificuldade enfrentada por essas pessoas. Elas ainda lidam com a xenofobia e o preconceito nos países onde são recebidas, e com a falta de condições mínimas de sobrevivência em muitos campos de refugiados. No Brasil, a fome e as guerras civis não são um problema de grandes proporções, mas o nosso país é responsável por 10% das mortes por assassinato no

No Brasil, a fome e as guerras não são um problema de grandes proporções, mas o nosso país é responsável por 10% das mortes por assassinato no mundo mundo. Todos os atentados terroristas que aconteceram ao redor do globo nos primeiros cinco meses de 2017, com 3.314 mortes, não superam a quantidade de homicídios registrada no Brasil em três semanas de 2015. Entre as vítimas, os jovens e negros lideram. Essas são só algumas das evidências da crise que a humanidade tem enfrentado, da vida perdendo o seu valor, sendo levada por tão pouco. Jesus deu a Sua vida por nós para que pudéssemos viver livres e abundantemente. Talvez, não possamos ir até o Iêmen alimentar cada uma daquelas pessoas, mas podemos apoiar organizações que têm feito esse trabalho. Talvez, não possamos receber todos os refugiados do mundo, mas podemos tratar com gentileza e cuidado aqueles que estão perto de nós. Talvez, não possamos acabar com toda a violência em nosso país, mas podemos orar e fazer a nossa parte para sermos pacificadores em nossa geração. Sempre existe alguma coisa que podemos fazer. 23


RECOMENDO

LIVRO

Estudos no Sermão do Monte MARTYN LLOYD-JONES | EDITORA FIEL

Na ocasião do lançamento deste livro, foi comentado a seu respeito tratar-se de a mais profunda sondagem do coração de todas as exposições do Sermão do Monte já publicadas no século 20. Agora, mais de 25 anos após o seu lançamento em português, esta obra, que já se tornou um clássico, continua cativando o coração do leitor, levando-o a considerar a beleza e a profundidade das palavras do Senhor Jesus Cristo registradas em Mateus 5, 6 e 7. O Sermão do Monte, conforme diz Martyn Lloyd-Jones, não é um código de ética ou moral; é, antes, uma descrição do que o cristão deve ser. A análise cuidadosa bem como suas ricas aplicações, permitem-nos refletir com muita seriedade acerca das elevadas exigências da vida cristã. São muitos os livros escritos sobre o Sermão do Monte, mas esta obra de Martyn Lloyd-Jones merece ser classificada entre as melhores que já foram escritas. O volume apresenta sessenta sermões que foram pregados, em sua maioria, em sucessivos domingos, pela manhã, no decurso do ministério do autor na famosa Capela de Westminster. Neles, Lloyd-Jones expõe rigorosas análises da corrupção humana, da fraqueza e da inconsistência do cristão, demandando uma vida cristã mais vigorosa e bíblica.

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LIVRO

LIVRO

O Racionalista Romântico

Oração

JOHN PIPER E DAVID MATHIS - MONERGISMO

TIM KELLER – VIDA NOVA

C.S.Lewis permanece um dos cristãos mais influentes do século 20. Seu compromisso com o vigor da mente e do coração é evidente em clássicos como “As crônicas de Nárnia” e “Cristianismo puro e simples” – livros que ilustram a conexão indissolúvel entre o pensamento rigoroso e a afeição profunda. Com contribuições de Randy Alcorn, John Piper, Philip Ryken, Kevin Vanhoozer, David Mathis e Douglas Wilson, este livro explora o homem, sua obra e seu legado – festejando a verdade do gênio espiritual de Lewis: Deus é a única resposta para nossos anseios mais profundos e a única fonte da alegria sem fim.

Igrejas e escolas ensinam os cristãos que a oração é o modo mais poderoso de vivenciar Deus. No entanto, poucos recebem instrução ou orientação para torná-la significativa de verdade. Neste livro, Timothy Keller investiga as muitas facetas dessa prática cotidiana, apresenta orientação bíblica sobre o assunto e oferece orações específicas para lidar com determinadas situações relacionadas à dor, à perda, ao amor e ao perdão.

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Além disso, o autor reflete sobre como tornar as orações mais pessoais e poderosas e como estabelecer uma prática de oração que funcione para cada leitor. Use o leitor de QR Code em seu celular e saiba mais sobre o livro

APP

Hand Talk HAND TALK

Uma solução brasileira para a inclusão social de deficientes auditivos está chamando a atenção de todo o planeta. O “Hand Talk” - mãos que falam - é um aplicativo para dispositivos móveis que converte textos, imagens e áudio para a Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS). Desenvolvida em Alagoas, a proposta é tão inovadora que ganhou World Summit Award Mobile, uma competição bianual promovida pela ONU, que reconhece aplicativos de relevância para toda a humanidade. Use o leitor de QR Code em seu celular e baixe o aplicativo 25


AMOR QUE TRANSFORMA

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o começo de 2013, Juca começou a se sentir mal. Tinha dores abdominais, sentia muito cansaço e falta de ar. Acabou procurando um médico e fazendo vários exames. Descobriu um derrame pleural, água nos pulmões. Foi mandado para fazer uma tomografia. Um pulmão já havia sido tomado por inteiro, e o outro pela metade. Naquele mesmo dia, foi internado. Segundo a médica, as notícias não eram as melhores, ele estava com um linfoma. Quando perguntou o que aquilo queria dizer, recebeu a temida resposta: câncer. “Naquela hora foi como se abrisse um buraco no chão”, lembra. Por conta da grande quantidade de água em seu pulmão, precisou de um dreno, por onde saiam 2,5 litros de líquido por dia. Começou, então, as sessões de quimioterapia. Enquanto estava no hospital, Juca recebeu uma visita diferente. Começou a ouvir a voz de Deus claramente. Era audível. “Ouvi uma voz como ouço a de qualquer pessoa, tomei um susto tremendo”. Juca começou a clamar por misericórdia, a declarar a Palavra. E então, uma situação veio à luz em seu coração: alguns anos atrás, por conta de algo que havia acontecido, ele deixou que uma raiz de amargura tomasse conta do seu coração. Ele quis, inclusive, acabar com a vida da pessoa que o havia ofendido. No final da conversa, Deus perguntou: “E, então? Você é capaz de perdoar essa pessoa?” A partir desse dia, Juca lutou consigo mesmo. Não parecia justo perdoar alguém que havia feito tão mal à sua família. Foram dias orando, chorando e clamando. Até que, finalmente, ele decidiu rasgar a sentença que tinha contra aquela pessoa em seu coração. E, desde então, a quimioterapia começou a fazer efeito. Juca saiu do hospital e passou o restante do tratamento em casa. Foram mais sete meses de quimioterapia.

A vida é do jeito que Ele quer, não do jeito que queremos viver

Acabaram as sessões e novos exames foram realizados. Os médicos não encontravam mais nada em seu organismo. Juca estava curado. Com essa boa notícia veio outra: ele e sua esposa passaram a receber um GCEM em sua casa, se tornaram anfitriões. Ganharam novos amigos e viviam uma vida em família. Um mês depois, com o acompanhamento médico, as coisas já não se mostravam tão bem. O câncer havia voltado e, dessa vez, ainda pior. As células se encontravam debaixo da sua língua, na nuca, no tórax, no abdômen e na virilha. A médica queria começar o tratamento todo de novo. Orando com seus amigos da célula, Juca sentiu que era hora de procurar outro especialista. Foi quando conheceu o doutor José Ulysses Amigo Filho. “Me lembro de que quando entrei no consultório daquele médico, o meu coração pulou”, conta. Fez questão de dizer ao médico que ele era resposta de oração. O doutor José disse que tinha um tratamento diferente para Juca, um transplante de medula. Ele foi internado mais uma vez e começou outras sessões de quimioterapia. Depois de seis dias, foi feita uma coleta da sua própria medula, para ser tratada e depois transplantada de volta. Os médicos explicaram que, quando faziam esse processo, o máximo que conseguiam de células saudáveis eram 10. Juca tinha 132. Eram suficientes não só para ele, como para doar para outras pessoas. Com as células tratadas, ele voltou para fazer o transplante. Depois de 10 dias, Juca recebeu outra visita especial, toda a equipe médica e de enfermeiros entrou em seu quarto com um bolo, cantando “Parabéns a você”. Naquele dia, sua medula havia voltado a funcionar. Juca tinha nascido de novo. Em todo esse processo, a transformação não aconteceu só em Juca. Sua família também teve encontros profundos com Deus. Seu casamento, que passava por dias difíceis, foi completamente restaurado. Ele também começou a usar a sua história para testemunhar às pessoas e ajudá-las a se livrarem de toda a amargura e falta de perdão que há em seu coração. Juca se emociona ao contar a sua história, mas nada supera o seu sorriso alegre e seus olhos esperançosos. “A vida é do jeito que Ele quer, não do jeito que nós queremos viver. Não somos donos de nada. E Ele me presenteou novamente com o perdão”.

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REFLEXÃO

Que tipo de extremistas seremos? urante minha adolescência, me diziam que as pessoas boas vão à igreja. E então eu olhei ao redor, vi os noticiários, e achei uma igreja repleta de pessoas doentes e um mundo que tinha alguns pagãos decentes. Estudei sociologia. Meus estudos me ensinaram que quanto maior o porcentual de frequência de uma pessoa à igreja, maior a probabilidade de ela se tornar sexista, racista, antigay, pró-militar e comprometida com a sua igreja local. E pensei que se era isso que significava ser cristão, eu não estava certo de querer ser um, nem se Jesus iria querer ser um, para dizer a verdade. Uma vez, um amigo e eu preparamos um vídeo para um culto de adoração. Nosso objetivo era captar as reações das pessoas em relação à palavra cristão, então pegamos uma câmera e fomos para as ruas. Pedimos às pessoas para dizerem a primeira palavra que lhes viesse à mente como reação a cada palavra que disséssemos: “neve”, “águia”, “adolescentes” e, finalmente, “cristão”. Quando as pessoas ouviam a palavra “cristão”, elas paravam. Nunca me esquecerei das reações: “falso”, “hipócrita”, “igreja”, “chato”. Um rapaz até disse: “costumava ser um”. Também nunca me esquecerei o que eles não disseram. Nenhuma das pessoas que entrevistamos disse “amor”. Ninguém disse “graça”. Ninguém disse “comunhão”. Vivemos em uma era em que a pessoas, ao ouvirem a palavra “cristão”, estão muito mais propensas a pensar naqueles que odeiam os gays do que nas pessoas que amam os marginalizados, e isso é uma coisa perigosa. 28


Sempre vejo pessoas rejeitando a Deus por causa da confusão que veem na igreja. Como diz o escritor contemporâneo Brennan Manning: “A maior causa do ateísmo são as pessoas que confessam Jesus com seus lábios e, quando saem porta a fora, o negam com seu estilo de vida. É isso que um mundo descrente simplesmente acha inacreditável.” Mas tenho uma tremenda esperança de que um novo tipo de cristianismo está emergindo. Eu apenas gostaria que ele chegasse até nós mais cedo do que tarde. Vivemos em um mundo de extremos perigosos. “Estes são tempos extremos”, disse Martin Luther King. A questão não é saber se nós seremos extremistas, mas que tipo de extremistas seremos. Seremos extremistas para o ódio ou para o amor? O mundo viu cristãos extremistas que são capazes de explodir clínicas de aborto e dançar nos túmulos dos médicos. Vimos cristãos extremistas que seguram faixas que dizem: “Deus odeia bichas”. O mundo viu extremistas cristãos que declaram guerra em nome do cordeiro. Mas onde estão os cristãos extremistas do amor e da graça? Sem dúvida, há muito barulho no cristianismo evangélico. Há muitas coisas embaraçosas sendo realizadas em nome de Deus. Mas há outros movimentos se espalhando, uma pequena revolução. Há aqueles de nós que querem espalhar outro tipo de cristianismo, uma fé que tem muito a dizer, tanto a respeito desse mundo quanto a respeito do mundo vindouro. Novos profetas se levantam para tentar mudar - e não apenas prever - o futuro. Há um movimento borbulhando que ultrapassa o cinismo e celebra um novo modo de vida, uma geração que para de se lamentar sobre a igreja e passa a enxergar e ser a igreja com a qual sonha. E essa pequena revolução é irresistível. É uma revolução contagiante que dança, ri e ama. *Trecho do livro “A Revolução Irresistível”, lançado no Brasil pela editora Garimpo.

SHANE CLAIBORNE Shane Claiborne é um ativista cristão, preletor e escritor. Fundou a comunidade The Simple Way na Filadélfia, um vilarejo onde os moradores vivem como uma grande família e abençoam aqueles que mais precisam. Ele é casado com a Katie. 29


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