Revista Reni 04

Page 1

vol. 2, n. 4 semestre2

2017 ISSN 2448-3664

EDITORIAL..........................................................................................................3 ARTIGOS LAS POLÍTICAS DE CIENCIA Y TECNOLOGÍA Y SU RELACIÓN CON LA DINÁMICA INNOVATIVA LOCAL (ARGENTINA, 1960-2005)......................................................4 HERNÁN THOMAS

TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE COMO MECANISMOS PROPULSORES DE NEGÓCIOS E COMPETITIVIDADE: UM ESTUDO EM EMPRESAS DA REGIÃO DO GRANDE ABC.........30 ANAPATRÍCIA MORALES VILHA, DARLENE RAMOS DIAS

A IMPORTÂNCIA DA GESTÃO ESTRATÉGICA COMO FATOR DE SOBREVIVÊNCIA DE UMA IES – INSTITUIÇÃO DE ENSINO SUPERIOR............................................................49 SÉRGIO F. CRISPIM, HAMILTON POZO EDSON H. TAKATA, FLÁVIO CORRÊA RANGEL

PANORAMA DA EDUCAÇÃO FORMAL EM LOGÍSTICA E DO MERCADO DE TRABALHO NA REGIÃO METROPOLITANA DE CAMPINAS............................................................64 MARCOS RICARDO ROSA GEORGES, MARIA RACHEL RUSSO SEYDELL

INOVAÇÃO EM LOGÍSTICA PARA PEQUENOS PRODUTORES AGRÍCOLAS: AS CENTRAIS DE ABASTECIMENTO – CEASA.................................................................................76 MARCIA C. DE AZEVEDO, JOSÉ H. BASSI SOUZA SPERANCINI, LUIS HERNAN C. PINOCHET, INÊS A. M. MANDELLI

MENTORIA PARA EMPREENDEDORES: ANÁLISE DA ESSÊNCIA DO NEGÓCIO...........92 ANTERO PAULO DOS SANTOS MATIAS

http://publicacoes.ufabc.edu.br/reni/


Equipe Editorial Editor Chefe

José Henrique Bassi Souza Sperancini - Doutor em Política Científica e Tecnológica pela UNICAMP. Tem experiência em ensino e pesquisa nas áreas de economia da saúde, evolucionismo, economia do turismo e avaliação de políticas públicas com ênfase nos temas da inovação tecnológica e do desenvolvimento econômico.

Editor Convidado

Marcos Ricardo Rosa Georges - Professor e pesquisador em regime de dedicação integral na Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas). Líder do grupo de pesquisa em Gestão de Operações e Serviços junto ao CEA (Centro de Economia e Administração). Docente permanente do programa de mestrado em Sustentabilidade e docente nos cursos de graduação em Administração e Engenharia de Produção. Doutor (2005) e Mestre (2001) em Engenharia Mecânica (UNICAMP), bacharel em Matemática Aplicada e Computacional modalidade Produção (UNICAMP/1998) e quase Estatístico (graduação incompleta, UNICAMP 2003-2005). Tem experiência acadêmica em diversas instituições de ensino, atuando como docente em cursos de graduação e pós-graduação e como coordenador de curso de especialização. Em âmbito empresarial, possui experiência atuando como executivo e consultor em âmbito nacional e internacional. Já foi gerente de manufatura em indústria de auto-adesivo, gestor do Sistemas de Gestão da Qualidade (incluindo o papel de RD) em empresa do setor de engenharia e logística, locação de equipamentos e de software. As áreas de interesse são: Gestão da Produção, Logística e Cadeia de Suprimentos, Qualidade, Pesquisa Operacional e Sustentabilidade.

Conselho Editorial

Alberto Sanyuan Suen - Doutor em Administração pela FEA-USP. Tem experiência nas áreas de Economia, Administração e Direito, com ênfase em Economia Financeira, Administração de Empresas e Direito Comercial Alexandre Ottoni Teatini Salles - Doutor em Economia pela University of Hertfordshire. Tem experiência na área de Economia, com ênfase em Economia Institucional, Economia Pós-Keynesiana, economia monetária e financeira, história econômica e desenvolvimento econômico. Ana Claudia Polato e Fava - PhD pela Universidade de Illinois em Urbana-Champaign, mestrado e graduação pela Universidade de São Paulo. Tem experiência em Microeconomia, Econometria, Desenvolvimento Econômico, Economia da Família e Finanças Pessoais. Anapatrícia de Oliveira Morales Vilha - Doutora em Política Científica e Tecnológica pela UNICAMP. Tem experiência na área de Estratégia competitiva e de inovação; Gestão de tecnologia e inovação; Gestão de inovação em economias emergentes; Tecnologia, inovação e desenvolvimento sustentável; Economia da inovação tecnológica; Estratégias empresariais; Políticas de ciência, tecnologia e inovação e Empreendedorismo. Hernàn Thomas (UNQ) - Doutor em Ciência e Tecnologia Política pela UNICAMP. Pós-doutorado no Departamento de Política Científica e Tecnológica do Instituto de Geociências (UNICAMP). Pesquisador do CONICET (Consejo Nacional de Investigaciones Científicas y Técnicas) e professor da Universidade Nacional de Quilmes. Pesquisador (categoria 1) do programa de incentivo do Ministério da Educação. Ivan Filipe de Almeida Lopes Fernandes. Ivan Fernandes é Bacharel em Relações Internacionais (2007) e Mestre e Doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo (2010). Foi Pesquisador Visitante com Bolsa de Doutorado Sanduíche na Universidade de Illinois em Urbana Champaign (2012). Tem experiência nas seguintes áreas de Ciência Política: tomada de decisão, política comercial, política burocrática, mudança institucional, voto econômico e a relação entre democracia e desigualdade social. http://lattes.cnpq.br/9951591696185495. Josmar Cappa - Doutor em Ciências Econômicas pela Universidade Estadual de Campinas. Tem experiência na área de Economia, atuando principalmente nos seguintes temas: economia urbana e regional, políticas públicas contemporâneas, políticas públicas, transporte aéreo e aeroportos e economia do bem-estar social. Marta Cristina Marjotta - Mestrado e Doutorado em Economia Aplicada pela Universidade de São Paulo. Tem experiência na área de Economia, com ênfase em Economia Agrária, atuando principalmente nos seguintes temas: agronegócio, logística, marketing e setor sucroenergético. Mônica Yukie Kuwahara - Mestre e doutora em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo. Tem experiência na área de microeconomia e economia do meio ambiente. Realiza pesquisas sobre qualidade de vida, desigualdade, desenvolvimento econômico e sustentabilidade ambiental, com ênfase maior em seus indicadores e análises de políticas públicas. Octavio Augusto Camargo Conceição - Doutor em Economia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Tem experiência na área de Economia, com ênfase em Flutuações Cíclicas e Projeções Econômicas, atuando principalmente nos seguintes temas: instituições, abordagens institucionalistas, economia brasileira, desenvolvimento econômico e crescimento econômico. Ricardo Luiz Silveira da Costa - Doutor em História Social pela Universidade Federal Fluminense. Tem experiência na área de Filosofia Medieval e História Medieval.

Pareceristas

Alberto Sanyuan Suen (UFABC) Alexandre Ottoni Teatini Salles (UFF) Ana Claudia Polato e Fava (UFABC) Anapatrícia Morales Vilha (UFABC) José Henrique B. Souza Sperancini (UFABC) Josmar Cappa (PUC-Campinas) Marta Cristina Marjotta-Maistro (UFSCar) Márcia Carvalho de Azevedo (Unifesp) Mônica Yukie Kuwahara (UFABC) Octavio Augusto Camargo Conceição (UFRGS) Ricardo Luiz Silveira da Costa (UFES) Amilcar Davyt Garcia (UR) Caroline Rodrigues Vaz (UFSC) Prof. Dr. Raul Otto Laux (UNIFEBE) Marcos Ricardo Rosa Georges (PUC -Campinas) Takeshy Tachizawa (FACCAMP) Hamilton Pozo (FACCAMP)

Editoração

Ma. Kelly Cristina Silva Firmino Sandra Felix Santos Bruna de Paula Gomes


EDITORIAL O quarto número da “Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação” (RENI) novamente tem o orgulho de contar com a colaboração do Professor Dr. Marcos Ricardo Rosa Georges da Puc-Campinas na qualidade de Editor Convidado. Os artigos selecionados procuram registrar e difundir conhecimento acadêmico e profissional sobretudo no campo do empreendedorismo e da inovação tecnológica. Neste sentido, o primeiro artigo Hernán Thomas realiza uma revisão de quatro décadas de políticas de ciência e tecnologia na Argentina. Relacionando tais políticas o Diretor do Instituto de Estudos sobre Ciência e Tecnologia (IESCT) da Universidade Nacional de Quilmes (UNQ) e Investigador Principal do Conselho Nacional de Investigações Científicas e Tecnológicas-CONICET avança no entendimento da relação entre o plano político normativo e a dinâmica inovativa da Argentina entre 1960 e 2005. O segundo artigo, de Anapatrícia Vilha e Darlene Dias, procura explicar as implicações e consequências do uso de tecnologias ambientais por empresas da região do ABC nos setores automotivo, moveleiro, petroquímico, plástico, cosmético e metalmecânico. Com base em entrevistas com profissionais responsáveis pela área de inovação das empresas, as pesquisadoras da UFABC concluem que as empresas têm lidado com práticas ambientais mais sustentáveis, entretanto, as mesmas não estão vinculadas a processos internos de inovação em produtos e processos. Os pesquisadores Sérgio Crispim, Edson Takata e Flávio Rangel da USP, PUC-SP e Uninove, respectivamente, demonstram que mudanças recentes exigem dos gestores de Instituições de Ensino Superior capacitações técnica e estratégica para operar o negócio e torná-las mais competitivas. Para tanto, o conhecimento e a aplicação de conceitos de estratégias e planejamento podem melhorar a competitividade das Instituições de Ensino Superior em um período de recursos escassos e a competição intensa. Também no tema da educação, os pesquisadores da PUC de Campinas, Marcos Georges e Maria Seydell avaliam o panorama do ensino em Logística nos cursos de graduação em Engenharia Civil e Administração de Empresas, na Região Metropolitana de Campinas. O artigo identifica as habilidades necessárias para exercer a função, o perfil dos alunos, a grade curricular dos cursos e as características do mercado de trabalho em Logística. A análise do estudo aponta para uma maior especificidade dos cursos e uma padronização com um conteúdo curricular mínimo a ser cumprido. O quinto artigo que uniu pesquisadores da Escola Paulista de Política, Economia e Negócios e do Mestrado Profissional em Gestão de Políticas e Organizações Públicas da UNIFESP, do Mestrado em Administração de Empresas da UFABC e da PUC de Campinas apresentam o sistema Ceasa como uma inovação de apoio às pequenas empresas do segmento de hortifrutigranjeiros. O estudo de caso na Ceasa de Campinas/SP procura entender como as centrais auxiliam a expansão das microempresas produtoras de alimentos. Por fim, o sexto artigo da Universidade Metodista de São Paulo apresenta um instrumento criado para identificar as falhas ou gaps existentes na formulação da ideia empreendedora. A ferramenta permite ao empreendedor melhorar o desempenho da concepção inicial do negócio auxiliando os agentes que apoiam o desenvolvimento da nova empresa e a alavancagem financeira da mesma. Aproveitamos para, mais uma vez, agradecer o trabalho do Professor Dr. Marcos Ricardo Rosa Georges do Centro de Economia e Administração e do programa de mestrado em Sustentabilidade da Puc-Campinas. Editor Científico José Henrique Bassi Souza Sperancini. Editores executivos Anapatrícia Morales Vilha. Direção da Agência de Inovação da UFABC. Alberto Sanyuan Suen. Chefe da Divisão de Empreendedorismo Tecnológico da Agência de Inovação da UFABC Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

3


Las políticas de ciencia y tecnología y su relación con la dinámica innovativa local (argentina, 1960-2005)

REVISTA DE EMPREENDEDORISMO, NEGÓCIOS E INOVAÇÃO ISSN 2448-3664

LAS POLÍTICAS DE CIENCIA Y TECNOLOGÍA Y SU RELACIÓN CON LA DINÁMICA INNOVATIVA LOCAL (ARGENTINA, 19602005)1 THE SCIENCE AND TECHNOLOGY POLICY AND ITS RELATIONSHIP WITH LOCAL INNOVATIVE DYNAMICS (ARGENTINA, 1960-2005)

Hernán Thomas Director del Instituto de Estudios sobre la Ciencia y la Tecnología (IESCT) de la Universidad Nacional de Quilmes (UNQ). Investigador Principal del Consejo Nacional de Investigaciones Científicas y Tecnológicas-CONICET.

RESUMEN El objetivo de este artículo es realizar una revisión crítica de las políticas explícitas de ciencia, tecnología en la Argentina y su incidencia efectiva sobre la dinámica innovativa local a lo largo de cuatro décadas (1960-2005). A partir de la construcción de una cronología en la que se relacionan iniciativas de la política explícita de Ciencia y Tecnología (PCT) en la Argentina (procesos de toma de decisión, propuestas, medidas y resultados) con elementos heterogéneos (por ejemplo: estrategias empresariales, desempeños sectoriales, otras políticas públicas) vinculados con su concepción e implementación, es posible avanzar en la comprensión de la compleja relación entre el plano político normativo y la dinámica innovativa local, sus alcances y restricciones. Palabras-clave: Política de la Ciencia y la Tecnología, Innovación, Argentina.

ABSTRACT UNIVERSIDADE FEDERAL DO ABC AVENIDA DOS ESTADOS, 5001 BAIRRO BANGU, SANTO ANDRÉ - SP. CEP 09210-580 E-MAIL:RENI@UFABC.EDU.BR COORDENAÇÃO AGÊNCIA DE INOVAÇÃO INOVAUFABC

The aim of this paper is to undertake a critical examination of the explicit policies of science, technology in Argentina and their impact on local innovative dynamics over four decades (1960-2005). From the construction of a chronology that relate to the initiatives of the explicit policy of Science and Technology (PCT) in Argentina (decision-making process, proposals, actions and results) with heterogeneous elements (eg, business strategies , sectorial performances, other public policies) associated with its design and implementation, it is possible to advance the understanding of the complex relationship between political policy and the dynamic innovative local, their scope and limitations. Keywords:Scientific and Technological politics of, Innovation, Argentina.

1  La producción de este trabajo ha sido posible gracias al apoyo de Agencia Nacional de Promoción Científica y Tecnológica y el Consejo Nacional de Investigaciones Científicas y Tecnológicas (Argentina).

Classificação JEL: O38 4

Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Hernán Thomas

1.

INTRODUCCIÓN

A pesar del período analizado -1960-2005este no es un artículo histórico. Puede leerse, en realidad, como un ejercicio sistémico sobre un futuro posible. No porque la historia se reitere, sino porque los mecanismos y estilos de construcción de instrumentos de política y de relaciones causales del actual proceso de restauración conservadora –regido por una concepción neoclásica de las dinámicas socio-tecnoproductivas- resultan isomórficos. En este caso, analizar el pasado constituye un insumo para la prospectiva de escenarios posibles. En particular, cuando el foco es colocado en la trayectoria que media entre las políticas “tecno-nacionalistas” y “antidependentistas” desplegadas entre 1960 y 1976, y las acciones orientadas centralmente por criterios de laissez faire entre 1976 y 2002. ¿Qué ocurre con la dinámica local cuando un sistema nacional de innovación y producción sale de un período proteccionista con una significativa presencia estatal en la regulación y la orientación de las acciones tecno-productivas y se reorienta hacia la apertura comercial, la apertura comercial y la acumulación financiera? ¿Cuál es la relación entre las políticas de Ciencia, Tecnología, Innovación y Producción –implicitas y explícitas- y las concretas acciones de los actores tecno-productivos locales? Para comprender el grado de incidencia de las políticas de Ciencia y Tecnología sobre la dinámica innovativa local es conveniente adoptar una perspectiva analítica que contextualice estas actividades, otorgándoles situación, dimensión, alcance, viabilidad y racionalidad. De no realizar esta operación, se corre el riesgo de considerar estas iniciativas de política como meras acumulaciones de instrumentos de promoción, simples enumeraciones de dispositivos socioinstitucionales, mecánicas cuantificaciones de recursos (humanos, materiales, financieros) puestos en circulación. El concepto “sistema nacional de innovación” (SNI) fue generado precisamente Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

para dar cuenta de esas relaciones explicativas causales que exceden el rango de acciones intra-muros, intra-institucionales. En particular, si la intención del análisis es superar el nivel descriptivo para internarse en la exploración de las relaciones explicativas, en la comprensión de las causalidades. Obviamente, semejante ejercicio, realizado con medios y espacio restringidos, implica riesgos de simplificación y estilización forzada de hechos complejos, diferenciados, específicos. Pero, al mismo tiempo, permite accionar una visión de conjunto sobre masas de información, posibilita observar qué es lo que hay de común en lo diverso, o, en otros términos, apunta a superar la dimensión de los árboles para comprender el funcionamiento del bosque. Una serie acotada de conceptos ha sido seleccionada para la realización de este ejercicio. En primera instancia, dentro de la diversidad de conceptualizaciones de sistemas nacionales de innovación (Nelson, Freeman, Niosi et alli, Barré, etc.) se optó por la propuesta por Bengt Ake Lundvall (1988, 1992). Complementariamente, se utilizaron los conceptos “dinámica y trayectoria sociotécnica” y “estilos socio-técnicos” (Thomas, 1995, 1999, 2001, 2005). Una dinámica socio-técnica es un conjunto de patrones de interacción de tecnologías, instituciones, políticas, racionalidades y formas de constitución ideológica de los actores. Este concepto sistémico sincrónico permite insertar una forma determinada de cambio socio-técnico (una serie de artefactos, una trayectoria socio-técnica, una forma de relaciones problema-solución, por ejemplo) en un mapa de interacciones, por ejemplo, de un sistema nacional de innovación. El concepto estilo socio-técnico de innovación y cambio tecnológico deriva del estilo tecnológico de Hughes (1983). Puede definirse como una forma relativamente estabilizada de producir tecnología y de construir su “funcionamiento” y “utilidad”. Una trayectoria socio-técnica es un proceso de co-evolución de productos, procesos productivos y organizacionales, e instituciones, relaciones usuario-productor, 5


Las políticas de ciencia y tecnología y su relación con la dinámica innovativa local (argentina, 1960-2005)

procesos de learning, relaciones problemasolución, procesos de construcción de “funcionamiento” de una tecnología, racionalidades, políticas y estrategias de un actor (firma, institución de I+D, universidades, etc.), o, asimismo, de un technological frame (Wiebe Bijker, 1995) determinado (tecnología nuclear, siderurgia, etc.). de una sociotechnical constituency (Molina, 1989) o de un sistema nacional de innovación. Obviamente, ha resultado ineludible acudir a otros conceptos: diversos tipos de aprendizajes, trayectorias socioinstitucionales, dinámicas sectoriales, relaciones usuario-productor, redes tecnoeconómicas (convergencia y alineación). Pero, dado el espacio limitado, es conveniente restringir la enunciación del abordaje teórico-analítico a aquellos conceptos que constituyen la estructura básica del ejercicio analítico. Para la realización de este trabajo se relevó, sistematizó y analizó un amplio conjunto de fuentes primarias y secundarias (consignadas en el apartado “referencias bibliográficas”)1. El análisis operacionalizado se focalizó en la percepción de elementos estables a lo largo del periodo, isomorfismos, reorientaciones de la trayectoria, cuellos de botella y disfuncionalidades sistémicas.

la creación de las grandes instituciones de C&T argentinas (Consejo Nacional de Investigaciones Científicas y TecnológicasCONICET, Instituto Nacional de Tecnología Agropecuaria-INTA, Instituto Nacional de Tecnología Industrial-INTI, Comisión Nacional de Energía Atómica-CNEA), a fines de los ’50, momento en que se presenta la primer discontinuidad significativa en la racionalidad de la PCT argentina desde lo que puede plantearse como sus inicios, a principios del siglo XX3, y se prolonga hasta fines de los ’604. En la segunda fase -siguiendo parcialmente la periodización del lapso 1969-1982 planteada por E. Adler (1987)- se distinguen dos subperíodos: 1969-1972 y 1973-19765. La tercera fase abarca los años 1976 a 1983, coincidiendo con el período de dictadura militar. La cuarta prácticamente coincide con la gestión del gobierno de la Unión Cívica Radical, entre los años 1984 (diciembre de 1983) y 1989. La quinta, finalmente, transcurre entre 1989 y 2000, y cubre la totalidad de las gestiones presidenciales de Carlos Menem, Fernando de la Rúa, Eduardo Duhalde y los inicios de la gestión de Nestor Kirchner. Dentro de esta última fase, se distinguen tres subperíodos: 1989-1994, 1994-2001 y 20012005. a) 1958-1968: laissez faire y creación de las grandes instituciones

2. TRAYECTORIA DE LA POLÍTICA CIENTÍFICA Y TECNOLÓGICA ARGENTINA La periodización adoptada para la construcción de la cronología de la trayectoria político-institucional distingue así 5 fases en la evolución de la PCT local entre fines de los ’50 e inicios de los años 20002. La primera fase toma como punto de inicio

3  Albornoz (1990a y b) advierte, frente a posibles enfoques reduccionistas, que la PCT latinoamericana, y, en particular, la argentina, no comenzó con la creación de los grandes institutos a fines de la década del ‘50, sino que es posible registrar evidentes concepciones de PCT ya en las dos primeras décadas del presente siglo. Albornoz caracteriza al período que transcurre entre principios y mediados de siglo XX como ‘etapa de institucionalización de la ciencia’. Si bien muchas de las racionalidades generadas durante esta fase permanecen vigentes en las siguientes -en particular en las racionalidades de las comunidades científica y universitaria- su tratamiento excede el alcance del presente texto. Por este motivo, la cronología se inicia a fines de los ‘50, primer momento de cambio de la PCT.

1  Si bien sería imprudente caracterizar este relevamiento realizado como exhaustivo, la muestra de fuentes secundarias integra algunos de los principales análisis del SNI argentino.

4  Si bien durante estos años sería posible realizar mayores distinciones en la orientación de la PCT, se ha preferido omitirlas en virtud de tratarse de un punto que cumple, en el texto, una función simplemente introductoria.

2  Se han incluido en este análisis medidas de regulación de importación de tecnología (incorporada y desincorporada), por entender que éstas guardan una relación directa y complementaria con la política tecnológica explícita.

5  En rigor, sería necesario distinguir la PCT desarrollada durante los años 1973-1974 del confuso período comprendido entre mediados del ’74 e inicios del ’76. Pero tal precisión atentaría contra el objetivo sintético de este apartado.

6

Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Hernán Thomas

b) 1969-1976: tecno-nacionalismo antidependentista y tentativas de coordinación b.1) 1969-1972: planificación tecnonacionalista y control de transferencia b.2) 1973-1976: regulación y promoción antidependentistas c) 1976-1983: restauración del laissez faire d) 1984-1989: autonomismo sin recursos e) 1989-2003: del laissez faire al SNI como política sectorial e.1) 1989-1994: laissez faire y una ley e.2) 1994-2001: el Sistema Nacional de Innovación como política sectorial e.3) 2001-2005: crisis y políticas inerciales A) 1958-1968: LAISSEZ FAIRE Y CREACIÓN DE LAS GRANDES INSTITUCIONES A fines de los años ’50 se fundan la mayoría de las instituciones de gran envergadura del complejo de C&T argentino. Esto no implicó ni la creación de una instancia política que centralizara la toma de decisiones sobre la actividad pública de C&T, ni la gestación paralela de una política orientada al autoabastecimiento tecnológico. De hecho, si bien la misión fundacional de los grandes institutos tecnológicos, el Instituto Nacional de Tecnología Agropecuaria (INTA) y el Instituto Nacional de Tecnología Industrial (INTI), era complementar el desarrollo de la producción agrícola e industrial local, se adoptó una estrategia tecnológica que facilitó y viabilizó la importación de tecnología como forma de aceleración del proceso de modernización de la base tecnológica local. Se estableció así una racionalidad que E. Adler denomina laissez faire tecnológico.

“La importación de tecnología fue considerada la mejor, e inclusive ‘natural’, opción dada la escasez de personal calificado, de incentivos para I+D, y de controles de transferencia de tecnología. El laissez faire tecnológico fue adoptado por los tomadores de decisión en el alto nivel de gobierno y la industria, no por razones ideológicas, sino porque los vínculos entre desarrollo económico y tecnológico simplemente no eran reconocidos. En síntesis, ellos no veían opción entre tecnología nacional

Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

e importada o entre laissez faire tecnológico y autoabastecimiento” (Adler, 1987: 107-8).

Durante la presidencia de Arturo Frondizi -de neto carácter desarrollistala adquisición de bienes de capital pasó a ser regulada por un régimen especial. Este régimen promovía la libre importación de líneas de producción completas y de piezas de maquinaria y equipamiento. Durante el año 1966, se registra una represión militar a las universidades que implicó el exilio de científicos y la desarticulación de cátedras y unidades de investigación. En la misma época se establece un sistema de planificación nacional, creándose el Consejo Nacional de Desarrollo (CONADE) y el Consejo Nacional de Seguridad (CONASE). En 1968 se creó el Consejo Nacional de Ciencia y Técnica (CONACYT)6, concebido como la tercera pata del sistema nacional de planificación para formular, promover y coordinar la política estatal de C&T7. Hasta 1968, el estado argentino no había formulado objetivos explícitos para el desarrollo científico y tecnológico. En tanto el principal objetivo fue alcanzar el desarrollo económico a través de la industrialización y la posterior exportación de bienes manufacturados, el desarrollo tecnológico no fue percibido explícitamente vinculado a este fin. De hecho, las inversiones extranjeras directas se intensificaron, contribuyendo a prácticas de transferencia tecnológica intraempresa prácticamente irrestrictas. En el contexto del laissez faire tecnológico del período, la formación universitaria presentaba escasos vínculos 6  La creación de los consejos nacionales de C&T es definida por algunos autores (por ejemplo, Amadeo, 1978) como un fenómeno encuadrable dentro de una “moda” de la planificación, extendida por América Latina. La creación del CONACYT se sumaría así a los consejos de Uruguay (1961), Chile y Venezuela (1967), Perú y Colombia (1968) y México (1970). 7  La creación de esta instancia guarda relación con una reunión de jefes de estado americanos, en Punta del Este, Uruguay en abril de 1967. Allí se resolvió promover las actividades de C&T para el desarrollo regional. Su organización e implementación en cada país no podría realizarse, afirmaban, sin una apropiada planificación de la política científica y tecnológica, dentro del marco general del desarrollo.

7


Las políticas de ciencia y tecnología y su relación con la dinámica innovativa local (argentina, 1960-2005)

con la producción industrial. El resultado fue un sistema de ciencia y tecnología caracterizado por un entrenamiento universitario inadecuado, que impedía a los graduados percibir la importancia y peculiaridades de la ciencia y la tecnología; insuficiente entrenamiento e información de dirigentes, tanto industriales como universitarios; falta de regímenes de evaluación de investigadores tecnológicos, adecuados para cada tipo de actividad; escasa comunicación entre sectores; poco interés de los investigadores en los problemas de la industria; inexistencia de una política industrial para orientar el desarrollo de actividades de C&T; escasísima investigación realizada por empresas productivas, las cuales ignoraban las capacidades nacionales, y no percibían las potencialidades de los desarrollos de C&T; anomalías en el campo de las normas industriales; y falta de incentivos para la innovación tecnológica nacional (Adler, 1987). B)1969-1976: TECNO-NACIONALISMO ANTIDEPENDENTISTA Y TENTATIVAS DE COORDINACIÓN En el año 1969 se produce un cambio fundamental en la concepción de la PCT argentina. Al tiempo que se profundiza la estrategia sustitutiva, se avanza en la regulación de los flujos tecnológicos. Este es, hasta hoy, el único período durante el cual el predominio del laissez faire en materia tecnológica fue abandonado -aunque sin que hayan podido exhibirse resultados concretos en términos de la creación de una base tecnológica endógena (Chudnovsky; López, 1996). B.1) 1969-1972: PLANIFICACIÓN TECNO-NACIONALISTA Y CONTROL DE TRANSFERENCIA Con la activación del CONACYT aparece por primera vez una tentativa de generar una instancia de coordinación de las actividades de C&T a escala nacional. En 1969 el 8

CONACYT realiza un censo de actividades de C&T en Argentina. La creación del CONACYT podría ser interpretada como la iniciación de la preocupación gubernamental acerca del desarrollo científico y tecnológico. De hecho, fue explicitado el objetivo de acrecentar el control del estado sobre la adaptación y la innovación tecnológica. Pero, en la práctica, este objetivo no alcanzó a conectarse con la política industrial, ni contó con la participación de sectores industriales específicos. Tal fue la carencia de apoyo político real, que ninguno de los tres planes de desarrollo de C&T elaborados por el Consejo en sus nueve años de existencia llegó siquiera al Gabinete Nacional para su discusión (Amadeo, 1978). Una de las explicaciones para la falta de implementación de los planes parece deberse al hecho de que tales iniciativas respondían a inquietudes personales aisladas, tanto en el plano político-económico como en el institucional. Durante el período 1969-1972, se formularon políticas explícitas de desarrollo científico y tecnológico local, y se plantearon medidas normativas, institucionales y administrativas para proveer de fondos a esta política, siguiendo una estrategia denominada por Adler (1978) como ‘pragmatismo anti-dependentista’. Pero esto no implica que tales políticas hayan sido implementadas exitosamente. La rigidez burocrática, el hecho de que el proceso de implementación envolviera a grupos opuestos al ‘pragmatismo anti-dependentista’, y la escasa vinculación con las políticas económicas previas retardaron el proceso de cambio. La estrategia ‘anti-dependentista’ fue aplicada sólo parcialmente. Así, entre 1969 y 1972 es posible observar una superposición del pragmatismo anti-dependentista con el laissez faire tecnológico. De todos modos, sí es posible registrar cambios en el discurso. El CONADE preparó un Plan Nacional de Desarrollo 1970-1974 (no implementado posteriormente) y un Plan Nacional para el Desarrollo y la Seguridad 1971-1975, en los que se planteaba el desarrollo autónomo del desarrollo científico y tecnológico para reducir lo que era visto Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Hernán Thomas

como “una fuerte dependencia cultural y económica”. Los objetivos explícitos de la PCT enunciaban un compromiso del gobierno con la innovación local para beneficio de las empresas nacionales: • subordinar los inversores extranjeros y locales a los objetivos del desarrollo económico nacional • adquirir autodeterminación o libertad de decisión en cuestiones científicas y tecnológicas • ofrecer a la industria nacional una oferta tecnológica alternativa plausible • reforzar la infraestructura de C&T • desarrollar poder de negociación del estado y de los empresarios privados frente al capital extranjero Los policymakers de la PCT de los regímenes de facto (presididos por los generales Roberto M. Levingston y Alejandro A. Lanusse) creían en una estrategia de desarrollo nacional crecientemente autónomo. Ideas propuestas por intelectuales acerca de la necesidad de una fuerte infraestructura científica y tecnológica y un control de transferencia tecnológica fueron adoptadas por segmentos militares y otros actores políticos. En 1970, el Estado replantea su política de compras, requiriendo que sus propias empresas usen bienes o servicios que puedan proveer o desarrollar empresas nacionales (Ley N°. 18.875, conocida como ‘Ley de Compre Nacional’). Se establece, además, que los servicios de consulta e ingeniería sean contratados con firmas y profesionales locales, y se prohíbe la recepción de créditos por parte de consultoras extranjeras. Mediante un decreto (del 16 de junio de 1970, llamado de ‘Política Nacional’) se explicita el compromiso del estado en la promoción de actividades de I+D, el desarrollo de nuevas tecnologías, y la adaptación de complejos tecnológicos. Dicho decreto también urgía a focalizar la actividad en la adaptación de procesos y equipos importados a las condiciones locales en el área nuclear, y establecía sectores de prioridad con el objetivo de incrementar la autonomía nacional: metales no ferrosos, bienes de capital, productos químicos industriales, Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

celulosa y papel, y actividades vinculadas con las necesidades de las fuerzas armadas. En 1971, se dictó el primer régimen de control y registro de transferencia de tecnología (Ley N° 19.231). En virtud del mismo se crea el Registro Nacional de Contrataciones, Licencias y Transferencia Tecnológica, que es colocado bajo la jurisdicción del INTI. El registro de los contratos podía ser denegado en caso de que no implicara transferencia real de tecnología o cuando: • incluyera importación de tecnología disponible localmente • la preservación de derechos influyese la producción, distribución o inversión nacionales • obligara a la adquisición de equipamiento y materias primas de un proveedor extranjero específico • estableciera la prohibición de exportación de productos nacionales • se estableciera la obligatoriedad de apelar a cortes internacionales en caso de conflicto La creación del Registro implicó un cambio fundamental en la vinculación de los productores industriales y la provisión de tecnología incorporada y desincorporada. La relativa autonomía del INTI en el control del flujo tecnológico abrió espacio para la intervención de agentes street level, inexistente hasta ese momento. Se multiplicaron, por otra parte, las instancias burocráticas para la importación de tecnología Pocos meses después, la Ley N° 19.135, de ‘Reconversión del Sector Automovilístico’, estableció regulaciones similares para la producción automotriz. También entró en vigencia un régimen de licenciamiento de importación de bienes de capital: las importaciones podían ser denegadas si los bienes eran disponibles localmente. En 1971, finalmente, mediante la Ley N°. 19.276, se combinaron CONADE, CONASE, y CONACYT dentro de un sistema de planificación nacional. El CONACYT devino subsecretaría nacional (SUBCYT). La repercusión de este viraje político sobre el sector industrial fue diversa. En líneas generales, la Unión Industrial Argentina 9


Las políticas de ciencia y tecnología y su relación con la dinámica innovativa local (argentina, 1960-2005)

(UIA) -que nucleaba a las mayores firmasno dio apoyo a la nueva política tecnológica, respaldando en cambio la política de laissez faire tecnológico. La Confederación General Económica (CGE) -que nucleaba principalmente a PyMEs nacionales- aprobó las medidas nacionalistas. La SUBCYT tuvo escasa influencia, tanto sobre las decisiones económicas como sobre las instituciones del complejo local de C&T que, en teoría, coordinaba. El proceso de creación de estas instituciones explica, al menos parcialmente, esta última dificultad. Por una parte, dependían de diferentes instancias dentro del aparato del estado (Ministerio de Educación, Presidencia de la Nación, Secretarías de Industria o Agricultura). Por otra, algunas instituciones gozaban de un presupuesto funcional autónomo (por ejemplo el INTI, gracias a un impuesto del 0,25% aplicable sobre todos los créditos bancarios adjudicados a la industria). Los conflictos entre la SUBCYT y el CONICET y sus científicos continuaron. B.2) 1973-1976: REGULACIÓN Y PROMOCIÓN ANTIDEPENDENTISTAS8 Los objetivos explicitados en la PCT iniciada en 1973 se orientaban a asegurar el ejercicio de la soberanía nacional mediante el desarrollo de una capacidad de decisión local basada en un sólido sistema nacional de ciencia y tecnología. Para ello era considerado necesario hacer más eficiente el sistema mediante la optimización del uso de los recursos humanos y materiales y la promoción de una eficaz vinculación entre el sistema científico y tecnológico y el sistema productivo. En líneas generales, la PCT fue similar a la del período anterior, con una clara orientación económica nacionalista, una tendencia a la industrialización por sustitución de importaciones, promoción de exportaciones industriales, y reducción de la 8  En rigor este período se extiende hasta fines del año 1974 cuando muere el presidente Perón, momento en el cual se inicia una fase signada por una desordenada sucesión de medidas políticas, muchas veces contradictorias. El año 1975 fue tan caótico, política y económicamente, que el policy-making en C&T puede ser considerado inexistente.

10

inversión extranjera directa (IED). Desde comienzos de 1973, se adoptaron medidas contra las inversiones extranjeras y la transferencia tecnológica operada por las empresas transnacionales, que eran conceptualizadas como elementos contrarios al desarrollo de la industria local. Ese mismo año se reorganizó el Ministerio de Economía, creándose nueve secretarías, entre ellas dos directamente relacionadas con temas científicos y tecnológicos: Coordinación e Industria y Planificación Económica. A través de esta modificación, el ministerio ganó el control directo y centralizado sobre la política económica e industrial, y adquirió jurisdicción sobre funciones de promoción, coordinación, orientación y evaluación de la investigación científica y tecnológica en los sectores de industria, minería, forestación y pesca y sobre el control de la tecnología de origen externo. Por otra parte, se crearon centros para el estudio de la transferencia y la administración tecnológica en la mayoría de las secretarías ministeriales, con el propósito de ajustar las políticas tecnológicas a las necesidades sectoriales. La Confederación General Económica (CGE)9, durante estos años, fue la principal fuente ideológica para la formulación de la política tecnológica. De hecho, había colocado a su Presidente, José Ber Gelbard, como ministro de economía. Durante los 18 meses que duró esta gestión se desarrolló una cercana cooperación entre decision makers e intelectuales10. La concepción de la PCT fue iniciada así por J. Gelbard y su gabinete, quien era responsable por la formulación de nuevas leyes de Inversiones Extranjeras y Transferencia Tecnológica. También estuvieron involucrados en el proceso de decision making el INTI, liderado por Jorge Luis Albertoni, y su dependencia, el Registro de Transferencia, liderado por Valeiras. 9  Nucleamiento sindical de empresarios –en general medianos y pequeños- de firmas de capital nacional. 10  E. Adler (1987) enumera algunos de los nombres de intelectuales próximos a la gestión: Alberto Aráoz, Daniel Chudnovsky, Mario Kamenetzky, Jorge Katz, Jorge Sábato y Carlos Martínez Vidal. Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Hernán Thomas

Se trata de un período particularmente activo, en el que se adoptaron múltiples iniciativas: • prioridades específicas y programas orientadores para las actividades de I+D • financiaciones para la promoción de sectores y tecnologías considerados de interés nacional. • línea especial de créditos del Banco Nacional de Desarrollo (BANADE) para promover la fabricación de bienes de capital con tecnología local • líneas de créditos u otros incentivos para la adquisición, estudio, y perfeccionamiento de prototipos (siderurgia, minería y petroquímica). También en 1973 se definen Programas Nacionales, creados con el propósito explícito de indicar prioridades para la actividad científico-tecnológica y servir de marco de coordinación a las actividades de investigación, orientándolas hacia una temática más aplicada y vinculada a las necesidades del desarrollo económico y regional: Programa Nacional de Electrónica (que permitió el desarrollo del sector); Programa Nacional de Petroquímica. El alcance efectivo de los Programas Nacionales fue restringido, resultando, a pesar de su intención racionalizadora, una medida incremental más. El estado promovió las exportaciones de tecnología con beneficios de reembolso del 40% para la exportación de productos industriales y la transformación de plantas (planta completa o llave en mano). Se duplicó la participación del INTI en el impuesto de origen de sus recursos y se promovió la participación de las instituciones locales de I+D como consultores en la planificación de obras públicas. En noviembre de 1973, fue aprobado un nuevo régimen de promoción industrial (Ley N° 20.560) otorgando beneficios directos en forma de exención impositiva, créditos y garantías para créditos externos, exclusivamente para empresas de capital 100% nacional. La Ley No. 20.852, promulgada en setiembre de 1974, estipuló que la industria nacional debía tener preferencia y beneficios Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

impositivos en licitaciones internacionales de proyectos financiados por el Banco Interamericano de Desarrollo. Por otra parte, en 1973, el Consejo (CONACYT) obtuvo la aprobación de una ley que permitía deducciones impositivas a aquellas empresas que efectuasen tareas de I+D, hasta por un 100% de su gasto en tales actividades. Esta experiencia fue un completo fracaso, pues el cuerpo técnico del Consejo no había elaborado previamente una definición adecuada de las actividades que podían ser beneficiadas por la ley; por lo tanto se hizo casi imposible manejar las peticiones (Amadeo, 1978). Se profundizaron los controles y barreras para la importación de tecnología. Hacia fines de 1973, las importaciones de bienes de capital fueron restringidas aún más por la imposición de cuotas y la eliminación total de reducciones y exenciones impositivas. En 1974 se aprobó una nueva Ley de Transferencia de Tecnología (N° 20.794), que estableció el requisito de aprobación oficial para todo acuerdo que implicase transferencia de tecnología extranjera como objetivo principal o accesorio. Los acuerdos no podrían ser aprobados en caso de que la tecnología fuese opuesta a la orientación de las políticas nacionales. Esta ley era aún más específica que la 19.231 en cuanto a las acciones reguladas. Adicionalmente, el Registro podría fijar topes máximos o montos y términos para los pagos de la transferencia para cada sector, actividad, o bien específico. Los pagos al exterior por transferencia de tecnología de las multinacionales eran considerados inversiones; para ser remitidos al exterior, los pagos requerían de autorización11. La SUBCYT fue retirada de la órbita de la Secretaría de Planeamiento y convertida en secretaría (SECYT) y, en conjunto con el Consejo Nacional de Investigaciones Científicas y Técnicas (CONICET), colocada bajo jurisdicción del Ministerio de Educación. 11  Los efectos de las dos leyes de transferencia tuvieron un impacto directo sobre los flujos al exterior: “Los pagos por transferencia de tecnología crecieron a una tasa anual del 26,9% entre 1965 y 1970, pero sólo al 9% entre 1970 y 1978” (Adler, 1987: 115)

11


Las políticas de ciencia y tecnología y su relación con la dinámica innovativa local (argentina, 1960-2005)

Continuaron los enfrentamientos entre el órgano de coordinación nacional y la agencia de investigación. En enero de 1974, fue creado un ‘sistema nacional de institutos y centros de investigación’ para coordinar la investigación científica, pero el sistema nunca funcionó realmente. C) 1976-1983: RESTAURACIÓN DEL LAISSEZ FAIRE Este período se inicia con el golpe militar de marzo de 1976, que implicó una ruptura de modelo que se extendió al campo de la PCT. La implementación de la nueva política económica del gobierno militar supuso un progresivo regreso al laissez faire. Primero en el nivel del discurso y luego en el de los hechos, con la primera experiencia aperturista post-ISI (Industrialización por Sustitución de Importaciones) comienza a enfatizarse la necesidad de que la industria doméstica se acerque a los niveles de eficiencia internacionales. El foco de la política económica -relacionada a la dinámica socio-técnica- se colocó en prevenir abusos e inducir cierto grado de subordinación en los inversores extranjeros y nacionales a los objetivos del desarrollo económico nacional, especialmente hacia los de modernización e incremento de la eficiencia industrial. La modernización fue preferida a la expansión y el crecimiento; y como la modernización era realizable a través de tecnología extranjera, ésta fue priorizada en desmedro de los desarrollos tecnológicos locales. José Alfredo Martínez de Hoz, el Ministro de Economía, sumarizó la política: el Estado debe tener la menor participación posible en los contratos y, en lugar de restringir la transferencia tecnológica en lo que puede denominarse un complejo de inferioridad, el Estado usará todos sus recursos en asistir al sector empresario para actualizar sus actividades, incluyendo las tecnológicas (Adler, 1987: 114-5)

La PCT, en particular, se caracterizó por una fuerte intención de contrarrestar las políticas nacionalistas ‘anti-dependentistas’ y restaurar el laissez faire tecnológico. De todos modos, si bien, la estrategia restauradora avanzó progresivamente, esto fue conseguido 12

parcialmente. El resultado, una vez más, fue el solapamiento de políticas contradictorias. La persistencia de algunos controles de transferencia de tecnología y una política de registro de contratos reflejan tanto la inercia burocrática frente a la adopción de una nueva estrategia como, fundamentalmente, la imposibilidad de retrotraer al sistema hacia una unívoca estrategia de laissez faire tecnológico, como la de los ’50 y ’60. En 1976 se creó el Ministerio de Planeamiento, algo particularmente contradictorio con el rumbo desregulador del laissez faire económico. En el plano de la PCT, este Ministerio generó el ‘Plan de Medidas Iniciales de 1976’, que incluía el desarrollo de centros regionales de investigación. Pero, en la práctica, la acción de este Ministerio no tuvo incidencia sobre las actividades concretas. No fue implementado ningún plan de desarrollo de la ciencia y la tecnología, y, además, el ministerio fue reducido a secretaría en 1977. Las ideas de una sólida política científica y tecnológica, de autodeterminación, de desarrollo autónomo -sostenidas durante el período anterior- fueron dejadas de lado, y las instituciones científicas y tecnológicas -con excepción de la CNEA- languidecieron. En tres aspectos, el carácter restaurador del laissez faire resulta notable durante este período: LEGISLACIÓN DE TRANSFERENCIA DE TECNOLOGÍA Durante la primera parte de este período la importación de bienes de capital aún requería declaración de prioridad y licencia de importación, aunque se facilitaron las condiciones de pagos y financiamiento. En agosto de 1977 se sanciona una nueva Ley de Transferencia de Tecnología (N° 21.617) que eliminó muchas de las restricciones previas, pero mantuvo el control de los acuerdos de licenciamiento y pagos. En líneas generales, tendió a flexibilizar la operatoria de importación, y reconocía en su texto la necesidad argentina de tecnología extranjera. Dados los hechos ulteriores, aparentemente la legislación resultó más Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Hernán Thomas

restringida que lo que esperaban los policymakers del Ministerio de Economía -lo que revelaría cierto carácter ideológico inercial en el régimen militar. En marzo de 1981, se promulgó una nueva Ley de Transferencia (N° 22.426), caracterizada como “entre las más liberales de América Latina”. La ley desreguló casi totalmente el régimen de importación de tecnología. Eliminó los topes máximos en los porcentajes de royalties. No requería aprobación para contratos entre firmas no relacionadas, en tanto, entre firmas relacionadas, los royalties se mantuvieron en el nivel de las tasas de mercado para tecnologías similares. Si bien se estipulaba el registro de los contratos, esto sólo era a fines de registro informativo, lo que implicó una eliminación -de hecho- del Registro de Tranferencias12. REFORMULACIÓN DEL PAPEL DE LA SECRETARÍA DE CIENCIA Y TÉCNICA En 1978, una subsecretaría técnica fue puesta a cargo de la política de C&T, convirtiéndose en la autoridad para la aplicación de la nueva Ley de Transferencia Tecnológica de 1977, y siendo también responsable de diseñar la Ley de Transferencia Tecnológica de 1981. En diciembre de 1979, la junta militar hizo público un documento titulado ‘Bases políticas de las Fuerzas Armadas para el Proceso de Reorganización Nacional’ en el que se afirmaba un activo papel del estado en ciencia y tecnología. Los sectores productivos debían desarrollarse en términos de eficiencia y ventajas comparativas. Como una secuela de este documento, la SECYT - mediante su resolución 341 del año 1980- estableció el Programa de Desarrollo del CONICET para 1982-1985. El documento planteaba la descentralización, el desarrollo equilibrado 12  Es posible agregar más datos sobre las consecuencias de la desregulación de las importaciones de tecnología: “Hacia mediados de 1978 la mayor parte de las restricciones a la importación de bienes de capital fueron eliminadas para facilitar la modernización. Las importaciones de maquinaria y equipamiento totalizaron 1.020 millones de dólares en 1978, y en 1979 se estiman en 1.737 millones. Entre 1976 y 1980 se importaron cerca de 6.584 millones de dólares en bienes de capital, tres veces más que entre 1971 y 1975.” (Adler, 1987:115). Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

de las diferentes disciplinas científicas y tecnológicas, la mejora de la educación superior y los recursos humanos, y el establecimiento de sistemas de relevamiento de información. La SECYT se convirtió en un elemento pasivo del sistema de policy-making científico y tecnológico y fue relegada paulatinamente a un papel secundario. Si bien mantenía el poder de asignar el presupuesto, esto no era políticamente significativo, dada la autonomía relativa de las instituciones de C&T, anteriormente enunciada. En abril de 1981, continuando con su histórica inestabilidad, la SECYT fue convertida en subsecretaría (SUBCYT), dentro del Ministerio de Educación. En enero de 1982, la SUBCYT fue transferida a la Secretaría de Planeamiento de la Presidencia. REDUCCIÓN DE LA IMPORTANCIA Y AUTONOMÍA RELATIVA DEL INSTITUTO NACIONAL DE TECNOLOGÍA INDUSTRIAL En 1980 se eliminó de la tasa de 0,25% de los créditos bancarios, que constituía el soporte financiero del INTI y el eje de su autonomía relativa. La Ley de Transferencia Tecnológica de 1981 eliminó el Registro, relegando al INTI al papel de ente con “autoridad” para registrar contratos, con una función primordialmente estadística. La represión de la dictadura militar tuvo como uno de sus objetivos principales a la comunidad académica. Esta acción fue ejercida, por una parte, en la forma de persecución de profesores universitarios e investigadores científicos (Oteiza, 199213, Kreimer, 1996). Argentina ‘perdió’ centenares de científicos y profesores, que, perseguidos, debieron abandonar el país o fueron asesinados por sus ideas o simplemente por integrar un sistema educativo universitario 13  En Babini et alli (1992: 304) se calcula que el éxodo de científicos y técnicos argentinos de nivel universitario, generado por las difíciles circunstancias locales a lo largo de las tres últimas oscila entre 30 y 50.000. En el mismo trabajo se calculaba, por otra parte, en alrededor de 15.000 la cantidad de investigadores residentes en el país hacia 1990. Más allá de posibles exageraciones en los cálculos, el éxodo fue significativo.

13


Las políticas de ciencia y tecnología y su relación con la dinámica innovativa local (argentina, 1960-2005)

considerado parte de una “red subversiva” (Adler, 1987). Por otra, interviniendo a las universidades, limitando el ingreso y reprimiendo todo accionar gremial estudiantil. El número total de estudiantes por 100.000 habitantes declinó de 2.352 en 1975 a 1.811 en 1978, y a 1.867 en 1979. El número de estudiantes universitarios decreció el 27% en 1979 respecto de los niveles de 1976. El total de gastos para educación superior decreció de 2,6% del PBI en 1975 a 2,4% en 1977. En tanto disminuyó drásticamente el presupuesto universitario para investigación, se facilitó la proliferación de institutos dependientes del CONICET, apartando así a las universidades de la actividad de investigación y desintegrando la red institucional en micro-unidades aisladas entre sí. Durante el período quedaron en pie, aunque en las mismas condiciones de aislamiento, los emprendimientos productivos vinculados a estrategias de largo plazo de las fuerzas armadas, llevados a cabo por Fabricaciones Militares, CITEFA (Instituto de Investigaciones Científicas y Técnicas de las Fuerzas Armadas) y CNEA (Comisión Nacional de Energía Atómica). Las fuerzas armadas continuaron expandiendo el gasto tecnológico iniciado en el período sustitutivo anterior. Sin embargo es perceptible un cambio de perspectiva que se acentúa a lo largo del período: tendencialmente es menor la preocupación por el autoabastecimiento. La aspiración autárquica de los ’30 y ’40 es dejada paulatinamente de lado a partir de mediados de los ’60, al mismo tiempo que se altera el orden de prioridad de las hipótesis de conflicto (sobre todo a partir de la extensión de la ‘doctrina de seguridad nacional’). La orientación de la logística pasa de general a específica. Los desarrollos tecnológicos se hacen más especializados. La hipótesis de conflicto del “enemigo interno” demanda un escaso desarrollo tecnológico. Disminuye, sin ser abandonada, la aspiración de realizar desarrollos completos. Se continúa con el recurso de la compra de rezagos militares, pero se acentúa, al mismo tiempo, la 14

tendencia a la adquisición de armamento liviano de producción reciente. La relación del complejo productivo militar con la industria local es restringida, y presenta un aspecto llamativo: a diferencia de lo que ocurre en los países desarrollados, donde la producción civil provee a la militar de partes e insumos (y, por lo tanto, la demanda promueve la generación de tecnología, mecanismo que, hasta los ’80 determinó la principal vía de avance de la tecnología norteamericana) (Alic et al, 1992), en Argentina una fracción de la producción de Fabricaciones Militares es dedicada a la producción de insumos para la industria (y su ‘spin off’ es nulo). En abril de 1982 se inicia la Guerra de las Malvinas. El episodio puso en evidencia, en el plano tecnológico en particular, la precaria situación de la tecnología bélica local. Excepto la tentativa aislada -y finalmente abortada- de desarrollo de un misil de combustible sólido (Proyecto Condor II), nada parece reflejar un cambio de percepción de la ciencia y la tecnología. Pero la derrota de Malvinas inicia el proceso que llevó a la restauración democrática, y, en este sentido, plantea consecuencias indirectas sobre la PCT. D) 1984-1989: AUTONOMISMO SIN RECURSOS Antes de ingresar a la PCT concebida y realizada por el Gobierno a partir de diciembre de 1983, resulta de interés citar un hecho, prácticamente sin antecedentes en la historia de la PCT argentina. Entre los días 12 al 16 de octubre de 1983, el partido Unión Cívica Radical (UCR), triunfador en las elecciones del 30 de ese mismo mes, promovió un Encuentro Nacional para discutir temas de ‘Ciencia, Tecnología y Desarrollo’ con el fin de incorporar las propuestas allí planteadas en su programa de gobierno14. El encuentro, de carácter abierto, contó con la participación Por otra parte, es de destacar que no se trató de una iniciativa puntual. Un taller sobre Ciencia y Tecnología venía desarrollándose desde fines de 1982, en el Centro de Participación Política de la UCR. 14

Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Hernán Thomas

de alrededor de 600 científicos, tecnólogos, empresarios y políticos. En diciembre de 1984, la SECyT publica un documento denominado ‘Lineamientos de Política Científica y Tecnológica’, en el que es posible reconocer algunos de los ideologemas presentes en las conclusiones del Encuentro. Redactado como una suerte de manifiesto liminar de una gestión racional, enuncia objetivos generales y específicos y líneas de acción para el período 1984-1989. Los objetivos generales eran: 1) Consolidar y fortalecer el desarrollo de la ciencia básica y aplicada y orientarlo a satisfacer las necesidades sociales y productivas del país 2) Promover el desarrollo tecnológico autónomo, de modo de garantizar independencia de decisiones en cuanto a generar y producir tecnología 3) Impulsar la incorporación de las variables científico-tecnológicas a las políticas económicas, en la planificación social y en los mecanismos de toma de decisiones [...] (SECyT, 1984: 1) Pese a estos antecedentes -que reflejarían un proceso de decision making ‘racional’-, la restauración de las instituciones democráticas a fines de 1983 implicó, en el plano de la PCT, cambios relativamente menores, incrementales. El acento en las gestiones de las diferentes unidades públicas de C&T (Universidades, institutos de I+D estatales) y de la Secretaría de Ciencia y Técnica (SECyT) estuvo puesto en la regularización del funcionamiento de las unidades, en un intento de devolverlas a la normativa previa al golpe de estado de 1976. Durante los primeros años, las gestiones se desarrollaron bajo la forma de intervenciones institucionales, frente a las cuales se colocó, en líneas generales, a miembros de la comunidad científica y/o académica de trayectoria reconocida15. En algunos casos en particular, cuyo paradigma tal vez sea el CONICET, gran parte del trabajo 15  La mayor parte de los funcionarios no tenía relación orgánica con el partido gobernante, como derivación de la explícita decisión de la gestión política de no realizar discriminaciones por afiliación partidaria (SECyT, 1989; Polcuch, 1993). Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

inicial se concentró en deshacer algunas de las arbitrarias construcciones institucionales realizadas durante la dictadura, en particular, de aliviar a la institución del peso de los numerosos institutos dependientes creados. La situación crítica de las finanzas del estado se constituyó en un fuerte argumento inhibidor para la realización de mayores transformaciones16. Esta ‘inhibición’ parece haber funcionado en dos sentidos. En el plano estrictamente económico, al restringir financieramente la viabilidad de cambios estructurales profundos, tornó, en cambio, racionales y posibles sólo las alteraciones incrementales o las iniciativas de bajo costo17. En el plano de la PCT, las gestiones administrativas que se encontraban al frente de las instituciones tuvieron una actitud “comprensiva” respecto de las limitaciones presupuestarias del estado; a pesar de las restricciones -que contradecían los acuerdos planteados durante el Encuentro de octubre de 1983 y los anuncios posteriores- no aparecen serios conflictos entre las administraciones de las instituciones públicas de C&T y el resto del aparato del estado. De este modo, la asunción del gobierno democrático no alteró sustancialmente las líneas generales de la PCT. La mayor contribución fue la supresión de la persecución ideológico-política implantada por el régimen militar y la tentativa de reparar alguna de sus consecuencias, facilitando la repatriación de investigadores y su reinserción institucional18. En la configuración del nuevo gabinete, la SUBCYT recupera su rango de Secretaría 16  Es necesario hacer mención aquí de una particular experiencia financiera denominada ARGENTEC. Se trató de un acuerdo entre cinco bancos estatales para el otorgamiento de créditos a largo plazo y tasa diferencial a PyMEs innovadoras. La experiencia se desarrolló entre los años 1986 y 1990 (aunque de hecho, dejó de funcionar en 1988, al desaparecer la línea de redescuento que alimentaba la iniciativa). 17  Con el fin de obtener fondos para la realización de algunas iniciativas, se solicitaron créditos al Banco Interamericano de Desarrollo (constituyéndose así los llamados Programas BID-CONICET I y II). 18  En junio de 1984 se creó, en el ámbito de la Presidencia de la Nación, la Comisión Nacional para el Retorno de los Argentinos en el Exterior.

15


Las políticas de ciencia y tecnología y su relación con la dinámica innovativa local (argentina, 1960-2005)

de Ciencia y Técnica (SECyT), y vuelve a depender del Ministerio de Cultura y Educación. El papel de la SECyT en el proceso de policy making fue marginal. En mayo de 1984 se puso en funcionamiento el Consejo Interinstitucional de Ciencia y Técnica (CICYT), cuyo objetivo era constituirse en el ente coordinador e indicador de la PCT. Presidido por el Secretario de C&T, estaba integrado por representantes de las principales instituciones vinculadas al área, incluyendo CONICET, INTI, INTA, CNEA y Universidades Nacionales. La experiencia duró aproximadamente un año y medio. En el terreno estrictamente tecnológico, la gestión se orientaba por principios cercanos al ‘anti-dependentismo’ en su versión más pragmática, denominada por M. Sadosky como ‘autonomismo’: “Hay que comprar afuera lo que sea necesario, pero sabiendo lo que se compra; hay que aprender a manejar la tecnología y no hay otro modo de aprender que hacerla por cuenta propia; learning by doing” (SECyT, 1989:61). En los planes iniciales, la orientación de la política tecnológica, en particular, sería objeto de un Consejo Interministerial de Ciencia y Técnica, presidido por el Secretario de C&T. La idea central era implementar la idea de ‘régimen de tecnología’ de Sábato19 (incorporada en la propuesta generada durante el Encuentro de 1983). Para ello, cada ministerio generaría un ente cuya función sería “funcionalizar” (sic) en su área de competencia el ‘régimen de tecnología’. El consejo coordinaría las actividades de estos entes y, por otra parte, las de las provincias, a través de un Consejo Federal de C&T. La iniciativa nunca llegó a ponerse en práctica. La coordinación de las iniciativas tecnológicas de las instituciones estatales quedó limitada a algunos mecanismos institucionales y a los Programas Nacionales -generados en 1973 y revitalizados en la gestión democrática (aunque con escasos recursos financieros20). 19  Una explicación de ‘régimen de tecnología’ puede encontrarse en Sábato y Mackenzie (1982). 20  En la distribución de recursos se priorizaron los programas de biotecnología e informática.

16

Durante la primera etapa de este período se elaboraron dos proyectos de ley: uno de Ley de Innovación Tecnológica y otro de Ley de Transferencia de Tecnología (Chudnovsky, 1985). El primero apuntaba a dos objetivos explícitos: adelantar las inversiones de los sectores productivos en actividades de desarrollo y mejoramiento de tecnologías y apoyar a los centros especializados del sistema científico-tecnológico. El segundo, respondía a un criterio relativamente proteccionista. Estos proyectos de ley nunca fueron aprobados por el congreso. Los planes, explicitados durante la campaña electoral, y, aún, durante el primer año de gestión, fueron dejados de lado. El único mecanismo implementado que podría calificarse de novedoso en el campo de la PCT fue la creación de una Comisión Nacional de Informática (Decreto Presidencial N° 621, de abril de 1984), encargada de concebir e implementar un plan tendiente a consolidar un ‘polo electrónico’, a desarrollarse en la vecindad de la ciudad de La Plata (Chudnovsky y López, 1996). Esta iniciativa se apoyaría en el desarrollo de empresas de capital nacional mayoritario, y en el subsecuente dictado de un régimen informático (Resolución 44, del año 1985), que preveía incentivos para un grupo de firmas nacionales a cambio del cumplimiento de obligaciones referidas principalmente a metas de integración nacional de la producción y de generación de conocimientos tecnológicos (Aspiazu et alli, 1988). Paralelamente, se generaría una estructura universitaria –que tomaba como modelo de referencia al instituto Balseiro21orientada a la formación de mano de obra calificada y de investigadores. Estas políticas, que contaron con una fuerte oposición por parte de las grandes firmas (Adler, 1987; SECyT, 1989), no alcanzaron los objetivos propuestos y fueron discontinuadas pocos años más tarde. En el plano institucional, es posible registrar algunas iniciativas puntuales, especialmente en el INTI y el CONICET, orientadas a fomentar los vínculos entre las unidades de 21  Instituto dependiente de la CNEA, destinado a la formación de físicos e ingenieros nucleares. Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Hernán Thomas

investigación y las de producción22. Frente a las limitaciones no sólo económicas sino también políticas, los objetivos racionales de la etapa inicial de esta gestión se restringieron, finalmente, a un conjunto de iniciativas sectoriales -incrementales en su mayoría- de corto alcance y escasa efectividad. E) 1989-2003: DEL LAISSEZ FAIRE AL SNI COMO POLÍTICA SECTORIAL Esta fase se inicia con el recambio de gobierno -dentro del marco institucional democrático- a mediados de 1989. Es posible distinguir internamente dos sub-períodos. El primero, en rigor, se diferencia relativamente poco de la gestión anterior en el estricto plano de la PCT. Las diferencias, en todo caso, aparecen más en los planos meso y micro político que en el de las políticas públicas. De todos modos, el cambio en las regulaciones macroeconómicas alcanzó tal escala que implicó un cambio de contexto para las instituciones ya existentes. Aunque éstas no fueron alteradas en sí, los cambios en el contexto implicaron un profundo proceso de resignificación, tal que las racionalidades que las sustentaban fueron colocadas en jaque. De allí que se haya optado por hacer coincidir en esta periodización el corte cronológico con el inicio de los cambios macroeconómicos de los ’90, y no con los cambios más explícitos en la PCT. Las mayores diferencias respecto de la fase anterior comienzan a aparecer a partir de 1994, cuando algunas de las regulaciones de PCT concebidas durante el sub-período 1989-1994 comienzan a implementarse, y son complementadas por la creación de nuevas estructuras institucionales. E.1) 1989-1994: LAISSEZ FAIRE Y UNA LEY En el inicio de la gestión presidencial de En el caso del CONICET se financian proyectos de investigación y desarrollo (PID), y se instrumentan el Programa de Apoyo a los Núcleos de Investigación Universitaria (PROANUI) y el Sistema de Apoyo para investigadores universitarios (SAPIU). 22

Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

Carlos Saúl Menem, la SECyT fue re-colocada, en el año 1989, bajo la dependencia directa de la Presidencia de la Nación. El Secretario en funciones hacia 1992, Dr. Raúl Matera, definía a la SECyT como el organismo encargado de la formulación de las políticas nacionales del sector y de la realización de las actividades de orientación, coordinación y promoción que resultaran necesarias para el mejor desarrollo de las mismas, asegurando la adecuada cobertura de las demandas de la sociedad, del Estado y de los sectores productivos y de servicios (Matera, 1992). Sin embargo, poco fue lo realizado en este sentido durante este sub-período. La acción más importante en materia de PCT fue la sanción, en 1990, de la Ley N° 23.877, de Promoción y Fomento a la Innovación Tecnológica. En ella se crea un Fondo para la Promoción y Fomento de la Innovación, con una asignación mensual de 20 millones de dólares. La aparición de esta ley en un contexto desregulador -caracterizado, entre otras cosas, por la eliminación de los regímenes promocionales- constituye un hecho particularmente llamativo. Pero resulta menos contradictorio si se tiene en cuenta que esta ley no fue una iniciativa del Poder Ejecutivo, sino del Parlamento, y que, en virtud de su no integración en los planes del Ministerio de Economía, sólo fue reglamentada en 1992. La ley preveía cuatro mecanismos de promoción: préstamos, créditos fiscales, subvenciones reembolsables sin intereses y mecanismos especiales. En la reglamentación posterior, sin embargo, no se contempló la forma concreta de asignación de los créditos fiscales, ni se especificó en qué consistirían los llamados mecanismos especiales de fomento. Por otro lado, en la práctica los mecanismos de subvención casi no han funcionado, con lo cual el único de los instrumentos de promoción previstos por la ley que se encontraba operativo hacia 1995 era los préstamos. La ley creó la figura de Unidad de Vinculación Tecnológica (UVT). Estas UVT se definen como entes no estatales constituidos para la identificación, selección y formulación de 17


Las políticas de ciencia y tecnología y su relación con la dinámica innovativa local (argentina, 1960-2005)

proyectos de I+D, transmisión de tecnología y asistencia técnica. Según la ley, constituirían el núcleo fundamental del sistema, aportando su estructura jurídica para facilitar la gestión, organización y gerenciamiento de los proyectos. La concepción de la figura de UVT apuntó a la superación de problemas del funcionamiento del sistema de C&T local: • flexibilizar el manejo de los fondos que podían recibir las instituciones del complejo de C&T, usualmente sujetas a restricciones derivadas, por ejemplo, de la aplicación de la Ley de Contabilidad o de reglamentos internos estrictos • superar las dificultades introducidas por la asignación de responsabilidad legal ante probables dificultades o riesgos asociados a la ejecución del proyecto • facilitar el contacto entre firmas privadas y organismos públicos de C&T, funcionando como interfase entre la demanda y la oferta tecnológica • dar solución a las quejas -provenientes del sector privado- sobre la competencia desleal que realizaban las instituciones de C&T en la prestación de servicios técnicos o de consultoría a terceros - reducir la posibilidad de conflictos intra-institucionales (por ejemplo, choque entre exigencias académicas y obligaciones contractuales para investigadores que intervienen en la vinculación, problemas éticos, etc.). Hacia 2000, se encontraban habilitadas 31 UVT. La implementación de las UVT parece estar lejos de los objetivos planteados en el momento de su concepción. Hay consenso en señalar factores externos a ellas como causales de esta situación: a) el carácter engorroso de los mecanismos previstos tanto para autorizar el funcionamiento de las UVT como para la gestión de préstamos para innovación tecnológica; b) el tradicional desencuentro entre el sector productivo y el complejo de C&T (Chudnovsky y López, 1996). Es de interés destacar que hasta la sanción de la ley 23.877, en el año 1990, no existieron 18

en Argentina líneas de crédito dirigidas a financiar proyectos de innovación tecnológica en el sector productivo23. La política de apertura económica desplegada durante la Gestión presidencial de Carlos Menem se llevó adelante sin que se previeran iniciativas que tuviesen en consideración una activación de la dinámica innovativa local. En la racionalidad del Plan de Convertibilidad, el mercado abierto sería una condición necesaria y suficiente para alcanzar la mayor competitividad internacional de la producción industrial, enunciada en los planes oficiales durante este período. La política económica no incluyó -ni en su implementación ni en su concepción- una instancia política vinculada a la dinámica innovativa, más allá de la propia apertura comercial. No se introdujeron modificaciones en la legislación de transferencia de tecnología. De hecho, en este caso no era necesario para hacerlo compatible con la política económica vigente, ya que el régimen de transferencia tecnológica había sido ya casi totalmente liberalizado en 1981. Sí se tomaron algunas medias para complementarlo, desregulando las operaciones entre la casa matriz y filiales locales de empresas transnacionales. Para Chudnovsky y López (1996), esto implicó un cambio dentro de la concepción de laissez faire: la convergencia entre la política económica neoliberal y el histórico laissez faire tecnológico24. E.2) 1994-2001: EL SISTEMA NACIONAL DE INNOVACIÓN COMO POLÍTICA SECTORIAL A partir de 1994, comienza a observarse una intensificación en la actividad del área de 23  Con la puntual excepción de un conjunto de líneas -por montos relativamente pequeños- creadas a mediados de los años ochenta por el Banco de la Provincia de Buenos Aires, y de ARGENTEC, ya mencionadas. 24  Como una vuelta de rosca en este interjuego, hacia fines de 1990 llegó a plantearse la posibilidad de privatizar el CONICET, en el marco del espíritu privatizador de empresas públicas deficitarias. El proyecto de convertirlo en una sociedad anónima con el propósito de atraer capital privado fue resistido por la comunidad científica (Polcuch, 1993). Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Hernán Thomas

PCT, que se acentúa paulatinamente en los años siguientes, motorizada por la afluencia de fondos del Banco Interamericano de Desarrollo y el Banco Mundial. • Programa de Incentivos a la Investigación Docente en las universidades. Desde su inicio, ocasionó múltiples polémicas en la comunidad universitaria. La implementación del programa tuvo un fuerte impacto sobre los indicadores de C&T. • Sistema Nacional de Normas, Calidad y Certificación: instancia de coordinación -inexistente hasta este momento- entre los distintos entes vinculados con la cuestión de la calidad y de promoción del concepto y las técnicas de calidad -por ejemplo, de certificaciones ISO 9000. • Sistema de fortalecimiento de las estructuras de apoyo a las PyMEs, que proveería servicios de extensionismo industrial a partir de las estructuras del INTI -a través del Centro de Información y Estadística Industrial (CIEI)- y del INTA -vía su programa de Cambio Rural. • Programa de desarrollo de proveedores, cuyo objetivo es desarrollar -en el sector de las PyMEs industriales- proveedores confiables y eficientes, trabajando para las grandes empresas, en una estrategia de promoción de la modernización integral de cadenas productivas. • Programa trienal de apoyo y fomento a las PyMEs, se orientaba a mejorar las condiciones de acceso al crédito, mediante un régimen de equiparación de tasas de interés para el capital de trabajo, adquisición de bienes de capital y modernización tecnológica. • Programa de generación y fomento de Polos Productivos, destinado a identificar regiones, zonas o sectores donde existan posibilidades de implementar acciones de reconversión productiva, en busca de mejorar la performance exportadora a través de reequipamiento productivo, capacitación laboral, gerencial y comercial, mejoras en diseño, calidad y Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

productividad, etc. Hacia 1996, en un análisis sobre el estado de implementación de la Ley No.23.877 Chudnovsky y López (1996:54-6) resaltaban estos puntos críticos: • los recursos asignados al Fondo de Promoción y Fomento de la Innovación Tecnológica han venido siendo entregados con demoras y grandes quitas. • estas irregularidades en la emisión de los recursos debilitan las posibilidades de éxito de los proyectos y de la ley en su conjunto. • la opinión generalizada de los expertos consultados es que el manejo de los fondos correspondientes a las provincias es, en el mejor de los casos, heterogéneo. En varias jurisdicciones los fondos se destinan a fines distintos de los previstos expresamente en la ley. • la escasez de fondos lleva a que cada provincia cuente, consecuentemente, con recursos insuficientes. En este caso se arriba a “el peor de los mundos”, ya que la firma no resuelve su problema tecnológico y, además, queda endeudada por una suma que, probablemente, no pueda devolver. Ya ha habido casos de firmas que, luego de obtener los fondos, debieron declararse en quiebra. Al analizar los 140 proyectos aprobados en el marco de la ley en ese momento concluían: • no hay un perfil sectorial claro. • desde el punto de vista del tamaño, predominan claramente las PyMEs. • el número de proyectos presentados anualmente para solicitar fondos es bajo, lo que dificulta la introducción de criterios de selectividad. • los proyectos generalmente se encontraban mal presentados. • se trataba de proyectos de bajo riesgo tecnológico, en general consistentes en mejoras sobre procesos y productos ya existentes. Finalmente, al intentar explicar el bajo interés de las empresas, y en particular de las PyMEs por acceder a los créditos, planteaban: 19


Las políticas de ciencia y tecnología y su relación con la dinámica innovativa local (argentina, 1960-2005)

• el mecanismo de obtención de los fondos es engorroso, como consecuencia de un diseño legal destinado a introducir la máxima seguridad jurídica y económica en la evaluación de los proyectos. • el sistema de información es inadecuado; en la ley no están previstos fondos para tareas de difusión, lo cual le resta eficacia. • los beneficios obtenibles son magros y las condiciones de financiamiento no tan atractivas como para compensar los exigentes requisitos de acceso al préstamo. Por otra parte, se activó un Programa de Modernización Tecnológica. Contaba inicialmente con 190 millones de dólares, financiados con un crédito del BID (95 millones de dólares) y una contrapartida local aportada por el estado y el sector privado (76 y 19 millones de dólares respectivamente); y comprendía los siguientes subprogramas: • El Fondo Tecnológico Argentino (FONTAR) -dependiente en ese entonces de la Secretaría de Programación Económica- orientado a promover la modernización tecnológica de las empresas locales y a apoyar proyectos de instituciones públicas que presten servicios tecnológicos al sector productivo. • El Subprograma Innovación Tecnológica SECyT-CONICET, orientado a vincular los centros de investigación con las empresas productivas y financiar proyectos de desarrollo científico y tecnológico presentados por instituciones públicas del sector. Comprendía dos formas de adjudicación de fondos: • a) proyectos de vinculación tecnológica (PVT) subvención, con retorno en caso de éxito, a proyectos de innovación tecnológica efectuados por Unidades de Vinculación Tecnológica con aval empresario; • b) subsidio a proyectos de I+D (PID) a cargo de institutos del CONICET, con transferencia inmediata de resultados al sector productivo y evaluación 20

económica positiva. El contraste en la primera implementación de ambas líneas no pudo ser más notable: mientras que para los PID se registraron alrededor de 500 presentaciones -muestra de la notable avidez de fondos que existe en las instituciones de C&T-, para los PVT sólo se anotaron 7 proyectos. El Fondo de riesgo compartido era un programa orientado a brindar apoyo financiero a las actividades de I+D, transferencia de tecnología y asistencia técnica requeridas por empresas, preferentemente PyMEs, realizadas por institutos o grupos de investigación del CONICET -o jurídicamente relacionados con él-. Tales actividades deberían ser administradas por las Unidades de Vinculación Tecnológica. Una vez más, su primera convocatoria, realizada en 1994, parece un indicador del nivel alcanzado por la vinculación entre unidades de investigación y unidades productivas: no se presentó ningún proyecto. En el año 1995, la Secretaría de Ciencia y Tecnología cambió una vez más de ámbito de dependencia, regresando a la órbita del Ministerio de Cultura y Educación. En el marco de una transformación denominada “Segunda Reforma del Estado”, y como parte de la reestructuración del Ministerio de Cultura y Educación (por Decreto 1274 del 12 de noviembre de 1996) fue aprobada una nueva estructura de la SECyT. También en 1995, entró en vigencia un nuevo régimen de patentes, a través de la aprobación de la ley N° 23.481, del 20 de setiembre y su correctiva, Ley N° 24.572. Hasta ese momento, la tramitación del patentamiento se había regido según la Ley N° 111 del año 1864. El cambio de legislación respondió, fundamentalmente, a la intención gubernamental de alinear el marco jurídico argentino con las exigencias planteadas en los acuerdos de la ronda Uruguay del GATT. Esta alteración fue resultado de un largo proceso de debate25, 25  Al momento de aprobarse la nueva legislación se encontraban acumulados cerca de 50 diferentes proyectos de ley, que respondían a un amplio espectro de orientaciones. Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Hernán Thomas

con una intensa actividad de lobbying por parte de las asociaciones que nucleaban, en el nivel local, a laboratorios farmacéuticos nacionales y extranjeros. Para los críticos, esta modificación tendió a privilegiar los derechos de las patentes extranjeras sobre las nacionales26. A fines del año 1996, a instancias de la SECyT, el gobierno creó el Gabinete Científico Tecnológico (GACTEC), en el ámbito de la Jefatura de Gabinete de Ministros, presidido por el Jefe de Gabinete e integrado por los Ministros de Cultura y Educación; de Economía y Obras y Servicios Públicos; de Salud y Acción Social; de Relaciones Exteriores, Comercio Internacional y Culto y de Defensa, y por las Secretarías de Recursos Naturales y Ambiente Humano; de Control Estratégico de la Jefatura de Gabinete de Ministros y de Ciencia y Tecnología del Ministerio de Cultura y Educación. Su misión explícita era definir las prioridades nacionales para el sector y la distribución de recursos asignados a los distintos organismos del sector en el orden nacional. En diciembre de 1996, se creó la Agencia Nacional de Promoción Científica y Tecnológica (ANPCYT) (Decreto N° 1660/96), dependiente de la Secretaría de Ciencia y Tecnología, argumentándose para ello la necesidad de generar un ámbito institucional exclusivamente dedicado a la promoción en las actividades científicas y tecnológicas, considerado inexistente hasta ese momento, ya que el resto de los organismos incluía tareas de ejecución de investigaciones. La agencia pasó a coordinar las actividades del FONTAR y el FONCyT27. 26  La versión finalmente aprobada fue una de las más liberales, aunque aún así, se plantearon objeciones por parte de los laboratorios norteamericanos y se corrió el riesgo de veto presidencial. 27  En el nuevo organigrama se especifican y coordinan las funciones de estas dos iniciativas preexistentes. El FONCyT subvenciona proyectos de investigación y actividades cuyos resultados son de dominio público y/o dan lugar a tecnologías precompetitivas. El FONTAR financia proyectos de innovación y modernización tecnológica cuyos resultados son apropiables y que apuntan a mejorar la competitividad de las empresas productoras de bienes y servicios. Asimismo, el FONTAR promueve la capacitación tecnológica de las PyMEs Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

En octubre de 1997, acompañando al proyecto de Ley de Presupuesto Nacional para 1998, el GACTEC presentó un proyecto de Plan Nacional Plurianual de Ciencia y Tecnología. El Plan Plurianual fue concebido, según se declara en su presentación (GACTEC, 1997), por la Secretaría de Ciencia y Tecnología, y recibió aportes de otros Ministerios y Secretarías de Estado, de los gobiernos provinciales, de diversas instituciones públicas y privadas y de expertos en la materia. El objetivo explícito del Plan era el desarrollo y fortalecimiento del Sistema Nacional de Ciencia, Tecnología e Innovación (GACTEC, 1997:sección1, p.2) Tres cuestiones resultan particularmente significativas en esta iniciativa política. Por primera vez en la historia de la PCT argentina se explicitó un plan de C&T basado en el concepto de Sistema Nacional de Innovación. Por primera vez, también, se hizo explícito un objetivo vinculado a los recursos financieros destinados a C&T: alcanzar el 1% del PBI en el año 2000. Y también es de notar que -en el marco conceptual de la política económica neoliberal vigente- era utilizado el término ‘desarrollo socioeconómico sustentable’, lo que sería indicativo, en principio, de una cierta distancia teórica entre el Ministerio de Economía y el grupo que concibió el Plan. Pero, tal vez, lo que resulta más significativo, es que una gestión que a partir de 1989 modificó desde la moneda a la estructura del estado no haya planteado sino hasta fines de 1997 ningún plan de C&T. Si existen prioridades de cambios estructurales a realizar por parte de un gobierno democrático, difícilmente la PCT se encontrara dentro de ellas durante este período. Recién en el presupuesto del año 1998 se introdujo un sistema de incentivo fiscal a la innovación tecnológica. A tal fin, se reglamentó el crédito fiscal (que ya se encontraba en el artículo 9 inciso b de la Ley N° 23.877) -con una demora de 6 añosfijándose un cupo de 20 millones de pesos en el Presupuesto Nacional de 1998. Hasta ese momento, nunca se había implementado en Argentina un régimen impositivo y el FONCyT contribuye a la formación de recursos humanos para la investigación.

21


Las políticas de ciencia y tecnología y su relación con la dinámica innovativa local (argentina, 1960-2005)

explícitamente orientado a activar la dinámica innovativa local28. El régimen incluyó tanto a las grandes y pequeñas empresas nacionales como a las filiales de firmas transnacionales que operaban en Argentina para la realización de actividades innovativas con su propio personal calificado o en contrato con instituciones de investigación. Resulta al menos problemático definir el grado de vinculación de la PCT implementada a partir de 1994 con la política económica vigente. Más allá de la apariencia dinámica -fruto de la multiplicación de iniciativas, el aumento de los recursos destinados a actividades de I+D y la reorganización del aparato institucional- la PCT fue planteada como una política sectorial acotada, atendida por un grupo de policy makers relativamente aislado y, en particular, desvinculado del proceso de toma de decisiones de la política económica nacional29. A fines de 1999 se produce el recambio gubernamental, en el marco de las instituciones democráticas. Es de destacar que, por segunda vez, en el marco de un programa de actividades preparatorias previas a las elecciones de 1999, la Alianza (una integración de partidos y agrupaciones de centro-izquierda, integrante de la coalición triunfadora, junto con la UCR) organizó comisiones de planificación sobre diferentes ejes de política, entre ellos, de CyT. Algunos de los participantes de estas comisiones se integraron posteriormente a la gestión gubernamental. La secretaría de Ciencia y Tecnología pasó una vez más a depender de la presidencia de la nación, bajo el nombre de Secretaría de Tecnología, Ciencia e Innovación Productiva 28  A excepción del fracasado intento de 1973, previamente mencionado.

Significativamente, tanto la iniciativa del Programa de Incentivos como las reformas de la Secretaría de C&T y, posteriormente, el Plan Nacional Plurianual de Ciencia y Tecnología fueron concebidos prácticamente por el mismo grupo. Si bien es posible registrar una ampliación de la red de interacciones desde el grupo inicial (en la Secretaría de Asuntos Universitarios del Ministerio de Educación) hasta la gestión de la SECyT, no parece visible una mayor interacción con los grupos clave del policy making económico. 29

22

(SETCIP). Más allá de este cambio de dependencia y denominación, poco es posible agregar. La nueva gestión se caracterizó por una escasa iniciativa política, un llamativo déficit operativo, y una crónica discontinuación de las iniciativas generadas durante la gestión anterior. En particular, no se implementó ninguna de las iniciativas generadas en las reuniones preparatorias de la Alianza. En el contexto de una dinámica gubernamental restringida prácticamente a responder al escenario económico, signado por el fuerte endeudamiento externo, la recesión, el aumento del desempleo y las crecientes presiones externas e internas, la PCT ocupó un lugar completamente periférico. La única iniciativa estructural del periodo, una tentativa de cambiar la estructura del CONICET, concebida por el secretario de estado, Dante Caputo, fue rápidamente abortada por presión de la comunidad científica. E.3) 2001-2005: CRISIS, POST-CRISIS Y POLÍTICAS INERCIALES La crisis desencadenada a fines del año 2001, la traumática salida del régimen de convertibilidad, la declaración de default, la devaluación monetaria y la inestabilidad política y económica subsecuente, problematizaron o imposibilitaron toda iniciativa en el ámbito de la ciencia y la tecnología. La orientación política del complejo de C&T se restringió a la supervivencia de las instituciones de I+D frente a la abrumadora crisis estructural y la discontinuación de los subsidios. La secuencia de micro gestiones presidenciales a fines de 2001, y la posterior instauración de un gobierno de emergencia durante 2002 condicionaron toda concepción de política que excediera la agenda de crisis económica y política. El área de CyT no participó, obviamente, de esa lista de prioridades. Recién a mediados de 2003, tras las últimas elecciones que llevaron a la presidencia a Nestor Kirchner, comenzó a regularizarse Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Hernán Thomas

la situación con la actualización de algunas líneas de subsidios, la reestructuración del presupuesto del área para el 2004, y la reactivación de algunas de las herramientas de política generadas al inicio de este subperiodo. La Secretaría de Ciencia, Tecnología e Innovación Productiva (SECTIP) pasó a depender, una vez más, del Ministerio -redenominado- de “Educación, Ciencia y Tecnología”. Una de las señales características de la gestión Kirchner –en consonancia con la orientación gubernamental generales un mayor acento en el discurso hacia la utilización de los recursos de C&T en desarrollo productivo y resolución de problemas sociales y ambientales locales, y la orientación de al menos una parte de la producción al desarrollo tecno-productivo local y la sustitución de importaciones. Pero, pese al despliegue de un ritmo sostenido de reactivación industrial, durante los años 2004 y 2005, no es posible registrar políticas industriales activas ni nuevas iniciativas de política de Ciencia, Tecnología e Innovación que vayan al encuentro de esta dinámica. Una vez más, divergen los discursos de las políticas efectivamente implementadas. En líneas generales, tanto los instrumentos de política (programas, subsidios) como la estructura organizacional-institucional del complejo local de CyT (secretarías, agencias, instituciones de I+D, universidades) mantuvieron la configuración planteada en 1994-1995. Sí es posible registrar una importante recuperación de los presupuestos de ciencia y tecnología. No se generaron –salvo contadas excepciones, escasamente significativas en términos de la dinámica generalnuevos programas e instituciones, pero se aumentaron los montos adjudicados a cada uno de los preexistentes. No se aprovechó, sino hasta más adelante –período que escapa al presente análisis- la oportunidad para generar nuevas señales orientadas a redireccionar las actividades locales de I+D. Así, la adjudicación de nuevos Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

recursos continuó, inercial, incremental y linealmente, reproduciendo las proporciones de gasto/inversión del periodo anterior.

3.

A MODO DE CONCLUSIONES

CAMBIOS EN LA POLÍTICA DE LAISSEZ FAIRE La política de laissez faire es una de las características recurrentes de la PCT argentina, tal como se desprende de la cronología. En este sentido, puede plantearse como una constante. Sin embargo, los cambios acumulados hacen que, en la práctica, no exista una posibilidad de regreso a la situación anterior. Antes bien, cada nueva fase de laissez faire resignifica los contenidos y usos previos, fruto de la acción de las regulaciones generadas durante la fase anterior, y de estas, a su vez, sobre el escenario resultante del laissez faire pretérito. Por otra parte, la propia concepción de laissez faire fue alterándose y sofisticándose en el tiempo, en parte, a través de un “diálogo” con los enfoques reguladores, en parte, a partir de la evolución teórica neoclásica y de la percepción de sus propias auto-contradicciones y potencialidades. El laissez faire correspondiente al período 19891995 resulta, a lo lejos, más regulacionista y dirigista que el correspondiente a la fase 1976-1983. Además, es necesario tener en cuenta que tanto la diversidad de actores implicados como el hecho de la discontinuidad institucional como elemento constante hacen que, en la práctica, existan solapamientos de iniciativas correspondientes a distintas fases, o, aún, iniciativas aisladas, provenientes de intervenciones episódicas de actores no hegemónicos en un momento dado del proceso de concepción de la PCT (como es el caso de la Ley de Promoción y Fomento a la Innovación de 1990). En general, las aparentes paradojas suelen ser explicables mediante este tipo de simultaneidades (o fragmentaciones de una supuesta unidad institucional monolítica del estado). 23


Las políticas de ciencia y tecnología y su relación con la dinámica innovativa local (argentina, 1960-2005)

Por momentos, de todos modos, resulta dificultoso definir el carácter dominante de la PCT a partir de un criterio de corte centrado en la contradicción ‘laissez faire/ regulacionismo’. El recurso metodológico, en este caso, es intentar identificar situaciones clave -que condicionan el funcionamiento del SNI- en las que la iniciativa de las acciones es dejada (laissez faire) o no (regulacionismo) a criterio de los actores tecnológicos (sean estos empresarios, científicos o tecnólogos). COMPLEJIDAD Y AUTOORGANIZACIÓN EN EL POLICY MAKING PROCESS LOCAL La debilidad del estado argentino como policy maker de la PCT no debe ser confundida con la falta de iniciativas en la concepción de políticas. De hecho, Argentina debe ser uno de los países de la región (junto con Brasil) donde más planes para PCT han sido concebidos. Al mismo tiempo, en proporción, debe ser uno de los que presentan la tasa de implementación más baja de los mismos30. Las pocas instancias en que el estado podría haber ejercido cierto poder de coordinación y control, la adjudicación de recursos financieros, han sido históricamente desaprovechadas (Fernández y Muñoz, 1992). El proceso de policy making -durante el periodo 1960-2005- ha sido claramente incremental, más allá de débiles y esporádicas iniciativas racionalizadoras. En la práctica, el proceso de implementación de la PCT no fue controlado ni evaluado, ni en un plano macro ni en un plano micro-institucional. La lógica de los actores directos primó sobre una orientación racional global. Lógicamente, una de las derivaciones de ese déficit en la implementación de la PCT fue la falta de articulación entre las diferentes unidades del complejo local de C&T, hecho explicado en diferentes análisis sobre la cuestión por dos factores: a) la acumulación Tal vez, precisamente ese déficit de implementación explique, al menos parcialmente, la proliferación de concepciones alternativas. En otras palabras, el déficit de implementación tiende a ocultar la proliferación de planes fallidos. 30

24

histórica de instituciones generadas en virtud de diferentes intereses micro-sectoriales y b) la debilidad -también histórica- de las instancias de coordinación. La principal instancia gubernamental, a través de la cual se intentó coordinar al conjunto de las instituciones de C&T fue la Secretaría de Ciencia y Técnica. La SECyT fue creada en 1969, más de una década después de la creación de las principales instituciones de I+D del complejo de C&T: el INTI, el INTA la CNEA y el CONICET. Este hecho ya le otorga un origen conflictivo que marca su evolución posterior: la SECyT se encuentra constantemente desafiada por la necesidad de legitimar su existencia y mandato sobre estas instituciones previamente existentes. Más allá de la inestabilidad de su dependencia funcional, la capacidad de coordinación de la SECyT quedó acotada -según Bisang et al (1995)- por dos motivos: • su ámbito de acción se redujo a las entidades públicas dependientes del gobierno nacional (dejando fuera de su alcance a los organismos provinciales y a las organizaciones no gubernamentales) • el mecanismo presupuestario de soporte a las instituciones públicas de C&T le restó base material para incidir sobre la toma de decisiones en el nivel micro-institucional Desde la perspectiva de la dinámica innovativa, surge nítidamente de este panorama la inexistencia de un marco legal y normativo que actúe como una pauta de coordinación global tendiente a cohesionar el accionar de las instituciones y a integrarlas en un plan de actividad de largo plazo. En el contexto de un estado fragmentado, parece claro que la SECyT no alcanzó, a lo largo del período analizado, incidencia efectiva -tanto sobre el proceso de policy making gubernamental como el de toma de decisiones micro-institucional- tal que le permitiera constituirse en un mecanismo de coordinación y generación de consensos. La desarticulación inter-institucional no puede ser explicada, entonces, por simples problemas de implementación de políticas; por el contrario, la debilidad política del Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Hernán Thomas

ente de planificación y coordinación es lo que permite explicar los problemas de coordinación del complejo de C&T. La desarticulación, por otra parte, no es un fenómeno estático, sino que evoluciona en el tiempo, retroalimentándose. En una causación recíproca, en la misma medida en que el ente organizador no coordina, las instituciones se encuentran, más y más, libradas a su propia discrecionalidad. Observado a la distancia, el proceso de toma de decisiones del complejo argentino de instituciones de C&T en su conjunto es absolutamente incremental. Pero, por otra parte, es necesario tener en cuenta que dentro de las grandes instituciones, a su vez, el proceso de toma de decisiones se ha atomizado en un conjunto de unidades de I+D, no necesariamente coordinadas entre sí. Así, el proceso de toma de decisiones -en su aspecto más estructurante- es definido por un mecanismo social auto-organizado (aunque, precisamente por esto, para nada “socializado”, ni “democrático”), liberado a la discrecionalidad de actores relativamente aislados. Si el alcance de las tentativas de orientación y coordinación del complejo de C&T resultó restringido, las acciones sobre el sector privado resultan prácticamente insignificantes. En momento alguno de la historia de la SECyT es posible registrar la implementación de una iniciativa consistente, estable y provista de medios materiales orientada a coordinar, direccionar o cooptar la actividad innovativa privada. A diferencia de otros países de industrialización tardía que encararon estrategias agresivas de desarrollo, el estado argentino no encaró políticas proactivas de innovación en el sector privado. La falta de iniciativas en este sentido es tal que parece posible decir que en la Argentina se ha implementado durante las últimas dos décadas una política innovativa de ‘no acciones’. La existencia de algunas tentativas aisladas, de carácter sectorial, y/o realizadas durante breves períodos, con escasos recursos no parecen suficientes para contradecir las afirmaciones anteriores. La implementación de la Ley 23.877 de Fomento a la Innovación Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

Tecnológica no parece constituir evidencia suficiente como para hablar de una reversión de las políticas pasivas anteriores. Los magros resultados alcanzados hasta el momento resultan insuficientes, por otra parte, como para postular un cambio en el comportamiento de los actores privados inducido por estos incentivos. La PCT posterior a 1994 (a pesar de un cierto nivel de contradicción respecto del laissez faire económico) tampoco parece tender a integrar a la iniciativa privada en estrategias conjuntas (estado-empresas) de desarrollo tecnológico. PROTECCIONISMO, APERTURA ECONÓMICA E INNOVACIÓN EN EL CASO ARGENTINO En tanto la apertura económica parece participar, en el caso argentino en diversos interjuegos de auto-organización negativa que explican la dinámica de downgrading, prácticamente no aparece en los interjuegos que explican dinámicas de upgrading, durante todo el período 1976-2003. Por su parte, las políticas proteccionistas aparecen tanto en interjuegos de upgrading como de downgrading. Si la dinámica innovativa del SNI argentino era limitada, baja y poco intensa durante el periodo de industrialización por sustitución de importaciones, la apertura conmercial se correlaciona directamente con procesos de downgrading de la dinámica innovativa. Por otro lado, si bien parece cierto que durante períodos de apertura tiende a mejorar la capacidad productiva -y la competitividadde algunos sectores, al mismo tiempo, parece disminuir la capacidad innnovativa local (a pesar de la presencia verificable de procesos de learning by doing y by using). Así, parece insustentable plantear una causalidad lineal positiva entre apertura económica y upgrading innovativo o entre proteccionismo y downgrading. De hecho, el caso argentino permite observar que tales relaciones causales lineales no son ni necesarias ni, mucho menos, suficientes para explicar las trayectorias de la dinámica innovativa de este SNI. 25


Las políticas de ciencia y tecnología y su relación con la dinámica innovativa local (argentina, 1960-2005)

Por otro lado, si se persiste, a pesar de lo anterior, con la perspectiva lineal -que plantea, a priori, los supuestos efectos benéficos de la apertura y la desregulación y los efectos negativos de las estrategias sustitutivas y el regulacionismo- es necesario notar que del análisis del proceso de conformación, consolidación, crisis y rearticulación del SNI argentino se desprende, simplemente, la existencia de diversas formas de no aparición de un SNI dinámico, de alto sinergismo.. En la literatura neoclásica, la apertura comercial es considerada positivamente. Tiende a mejorar la retribución de los factores abundantes de un país, a costa de aquellos previamente favorecidos por la protección. Dado que las ganancias generadas por los primeros serán mayores que las pérdidas de los segundos se afirma que -en caso de mediar las políticas redistributivas correspondientes- la apertura comercial tenderá a incrementar el bienestar general. Por otra parte, tendrá un efecto positivo sobre los patrones de especialización, debido a dos razones principales: a) en el nivel estático, porque mejorará la asignación de los recursos y eliminará las ineficiencias derivadas de los mercados protegidos; b) en el nivel dinámico, porque incentivará el desarrollo de los procesos de aprendizaje y cambio tecnológico. El último punto, en particular, es extendido por algunos autores hasta el fomento de la innovación. Otra forma de plantear el carácter positivo de la apertura sobre la actividad innovativa se basa en el argumento del aumento de competitividad. Ante el escenario de mayor competencia en el mercado doméstico, las firmas se ven forzadas a mejorar la productividad y calidad de procesos y productos, lo cual supone la necesidad de adoptar innovaciones tecnológicas. En general, la cuestión del efecto positivo de la apertura económica sobre la dinámica innovativa es planteada como una causalidad lineal. Sin embargo, a partir del análisis del caso argentino, y, en particular, de la aplicación del framework, parece posible afirmar que es tan incorrecto plantear que la apertura inhibió la innovación local como 26

plantear que la apertura es un motor de innovación. Del mismo modo, también es incorrecto plantear que la industrialización por sustitución de innovaciones inhibió la innovación local. En el nivel de análisis de un SNI, la implementación de políticas de apertura comercial o proteccionismo es una causa insuficiente para explicar las dinámicas innovativas. La explicación de los procesos de innovación está, por una parte, en un plano de causalidad compleja -no lineal-, en el interjuego entre exo-causalidades (dentro de las cuales se encuentran integradas las medidas de política de apertura, o de estrategias de sustitución de importaciones, o políticas de ajuste, etc.) y endo-causalidades (del sistema de ciencia, tecnología, innovación y producción local, en su conjunto); por otra parte, la explicación debe dar cuenta, necesariamente, del plano de los actores tecnológicos, donde las políticas de apertura o proteccionismo son simplemente causas mediatas que, también en este nivel, aparecen integradas en un conjunto de interpelaciones ideológicas -de construcciones de lo deseable, viable y lo posible- que los actores reciben. Por último, es necesario tener en cuenta que, dado que las relaciones causales del SNI son complejas, las políticas aperturistas o proteccionistas no son monolíticas ni monosémicas: se difunden fragmentariamente -en medidas singulares o impactos diferenciados, según cada actor afectado- por diversos interjuegos del SNI, adquiriendo diferentes sentidos para cada uno de ellos, al activar algunos fenómenos de auto-organización positiva, y otros, de autoorganización negativa. LA CONSTRUCCIÓN DE UNA CONDICIÓN PERIFÉRICA Tal vez una de las mayores contribuciones de la reflexión crítica local (Sábato, 1971; 1972; 1973; 1975; 1982; 1983; Oscar Varsavsky, 1974 a; 1974 b; 1975; Amílcar Herrera 1971), durante las décadas del ’60 y del ’70, haya sido la configuración de una serie de conceptualizaciones generadas con Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Hernán Thomas

el propósito de comprender y superar las limitaciones al desarrollo social, económico y tecnológico local. En estas conceptualizaciones, la ‘condición periférica’ aparecía normalmente como ‘causa’ estructural del subdesarrollo, y, en particular, como ‘explicación’ de la inexistencia o debilidad de dinámicas innovativas locales en los países subdesarrollados. En algunas versiones, esta argumentación se historizó, remitiendo la cuestión a la forma de integración al sistema económico internacional o la integración en la estructura de comercialización y producción dominada por un país central. La condición periférica de los países subdesarrollados aparecía, en estas argumentaciones, como un punto de partida, como un hecho inexorable, dado, determinado por una causalidad externa. Sin embargo, es posible plantear otra vía de comprensión de “la condición periférica”. • la tentativa de emular modelos institucionales de países centrales tiende a generar la ‘condición periférica’. • la trayectoria socio-técnica local de alineamiento y coordinación en technological frames fronteras afuera genera condición periférica. • la exploración de la dinámica “universal” de la frontera científico-tecnológica genera condición periférica. • la adopción de un criterio de calidad exogenerado genera condición periférica. Lejos de constituir un punto de partida, un hecho consumado, es posible plantear la existencia de un proceso -unidireccional, asimétrico y sub-ordinado- de construcción y consolidación de la ‘condición periférica’. Ser periférico no es un hecho, inexorable, “natural”, sino el resultado de una construcción social que incluye no sólo una ego-ideología de un centro (innovador y difusor, generador de teoría, creador de instituciones), sino una alter-ideología (alineada y coordinada, ortodoxamente aplicada, emuladora) de una periferia. Lejos de ser una causa exo-generada, la condición periférica es, desde esta perspectiva, un efecto que responde a las endo-causalidades de la dinámica local. Lejos Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

de ser una condición previa, es una situación re-generada y re-producida constantemente. Así, la construcción de la condición periférica no debe entenderse como un proceso necesariamente organizado, si bien algunas políticas -locales e internacionalesresultan particularmente funcionales para ello. El proceso de construcción de la condición periférica es un fenómeno fundamentalmente auto-organizado, al que contribuyen tanto la política económica como la percepción de aceleración del cambio tecnológico, la intensificación de la IED, o las múltiples interpelaciones ideológicas acerca de la globalización, la integración “competitiva” al mercado internacional como productor de commodities o las normas universales de calidad. Precisamente, este carácter auto-organizado parece otorgar al proceso de “periferización” ese aspecto de fenómeno “natural” e “inexorable”, “ajeno” al accionar y a la racionalidad de los actores locales. A partir de la revisión de la trayectoria de la reflexión crítica latinoamericana sobre temas de ciencia, tecnología e innovación parece posible plantear nuevos desafíos para el desarrollo local de las disciplinas economía del cambio tecnológico y sociología de la ciencia y la tecnología. Si la trayectoria del análisis aquí presentado es aceptada -al menos parcialmente- parece necesario realizar una profunda renovación del aparato conceptual explicativo-normativo utilizado en el país, lo que implica, entre otras cosas, la posibilidad de enriquecerlo con aportes genuinos. Desde la perspectiva de la necesidad de una adecuación de los conceptos teóricos a la dinámica socio-técnica local, la ortodoxia teórica no implica seguridad analítica ni garantía epistemológica alguna. En el plano normativo, esto tal vez permita evitar caer en la ilusión de que por usar los mismos significantes se puede reconstruir la realidad a la medida del concepto utilizado (como, por ejemplo, en la implementación local de “incubadoras de empresas”, la dinamización de “clusters”, la generación de “distritos industriales”). Lejos de tal seguridad, la “ortodoxia” supone el riesgo de generar 27


Las políticas de ciencia y tecnología y su relación con la dinámica innovativa local (argentina, 1960-2005)

fenómenos de inadecuación socio-técnica. Parece conveniente vigilar los procesos de resignificación de los conceptos, recuperando su sentido antes que sujetándose a su enunciado. El desafío es aún mayor, si se incorpora la dimensión política. Con todo lo valiosos que han sido para la comprensión de la dinámica socio-técnica latinoamericana, los estudios microeconómicos -sobre aprendizaje tecnológico en firmas locales, por ejemploresultan insuficientes como insumo para la elaboración de políticas de innovación. En el estadio en que se encuentra la elaboración local de políticas, los resultados de este tipo de investigaciones no alcanzan a abarcar la complejidad del problema que se enfrenta en la actual situación, (integración global, apertura comercial, integración regional, desregulación, etc.). Si bien pueden aportar criterios acerca de “lo que no hay que hacer”, resultan inadecuados como insumos para proponer, priorizar y definir medidas de política concretas. La última lección de Sábato, Varsavsky y Herrera: reflexión crítica más generación de conceptos localmente adecuados más intervención en procesos de policy making, parece, en este sentido, hoy tan vigente como en los ’60. De la renovación explicativanormativa de la Política de Ciencia, Tecnología, Innovación y Producción puede depender -al menos parcialmente- la posibilidad de realización de un escenario de democratización política y desarrollo económico y social en la Argentina. Hoy, Houston, estamos nuevamente en problemas.

4.

REFERENCIAS

ADLER, E. The Power of Ideology. The Quest for Technological Autonomy in Argentina and Brazil, University of California Press, Los Angeles, 1987. ALBORNOZ, M. La ciencia y la tecnología como problema político, en ALBORNOZ y KREIMER. (Comps.). Ciencia y tecnología: estrategias y políticas de largo plazo. Buenos Aires: EUDEBA, 1990a. ALBORNOZ, M. (1990b), Consideraciones históricas sobre la política científica y tecnológica en la Argentina, en ALBORNOZ. y KREIMER. (Comps.). 28

Ciencia y tecnología: estrategias y políticas de largo plazo. Buenos Aires: EUDEBA, 1990b. ALIC, J.; BRANSCOMB, L.; BROOKS, H.; CARTER, A. y EPSTEIN G. Beyond Spin Off: Military and Comercial Techonologies in a Changing World. Boston: Harvard Business School Press, 1992. AMADEO, E. Los consejos nacionales de ciencia y tecnología en América Latina. Exitos y fracasos del primer decenio, Comercio Exterior, 28, 12. 1978, pp. 1439-1447. AZPIAZU, D.; BASUALDO, E. M.; NOCHTEFF, H. La revolución tecnológica y las políticas hegemónicas. El complejo electrónico en la Argentina. Buenos Aires: Legasa, 1988. BABINI, D.; CASALET, M. y OTEIZA, E. (), Recursos humanos en Ciencia y Tecnología. Formación de investigadores, en Oteiza, E. et alli, La política de investigación científica y tecnológica argentina – Historia y perspectivas. Buenos Aires: Centro Editor de América Latina, 1992. BISANG, R.; BERCOVICH, N.; CHPRINTZER, A. y RAMOS, A. Las actividades de investigación en las Universidades Nacionales, CENIT, Proyecto PNUD ARG/93/026, mimeo, Buenos Aires1995. CHUDNOVSKY, D. La transferencia internacional de tecnología y las empresas transnacionales, CET/ IPAL, D/85/e, Buenos Aires, 1985. CHUDNOVSKY, D.; LÓPEZ, A. Política tecnológica en la Argentina: ¿hay algo más que laissez faire?, REDES, 3, 6, 1996, pp. 33-75. DAVYT, A. A construção de excelência nos processos de avaliação da pesquisa, Disertación de maestría, DPCT/IGE/UNICAMP, Brasil, 1997. Elzinga, A. y Jamison, A. (1996), El cambio de las agendas políticas en ciencia y tecnología, Zona Abierta, 75/76, pp.91-132. FERNÁNDEZ POLCUCH, E. (Coord.) Las políticas en Ciencia y Tecnología en Argentina en el marco de los planes de ajuste económico 1980-1991. Quilmes: Editorial Universidad Nacional de Quilmes, Bernal, 1993. FERNÁNDEZ, E.; MUÑOZ, I. Aspectos estratégicos de gestión, in Oteiza, E. et alli, La política de investigación científica y tecnológica argentina – Historia y perspectivas. Buenos Aires: Centro Editor de América Latina, 1992. GABINETE CIENTÍFICO TECNOLÓGICO. Proyecto de Plan Plurianual de Ciencia y Tecnología 1998-2000. Poder Ejecutivo Nacional, Buenos Aires, GACTEC, 1997. HERRERA, A. Los determinantes sociales de la política científica en América Latina. Política científica explícita y política científica implícita. REDES, vol. 2, n. 5, 1995 [1971], pp. 117-131. HUGHES, Thomas P. Networks of Power: Electrification in Western Society, 1880-1930. Baltimore: Johns Hopkins University Press, 1983. KREIMER, P. Science and Politics in Latin America: The old and New Context in Argentina, Science, Technology and Society, Vo. 1, N. 2, 1996, pp. 267-89. Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Hernán Thomas

LUNDVALL, B-Å. Product Innovation and UserProducer Interaction. Aalborg: Aalborg University Press, 1985. LUNDVALL, B-Å. National Systems of Innovation: Towards a Theory of Innovation and Interactive Learning. Londres: Pinter, 1992. MATERA, R. Argentina, in Oro, L. y Sebastián, J. (Eds.). Los sistemas de ciencia y tecnología en Iberoamérica, Buenos Aires: EUDEBA, 1992. MOLINA, Alfonso H. The Transputer Constituency - Building up UK/European Capabilities in Information Technology. Edinburgh: Edinburgh University, 1989. OTEIZA, E. El complejo científico y tecnológico argentino en la segunda mitad del siglo XX: la transferencia de modelos institucionales, in Oteiza, E. et alli. La política de investigación científica y tecnológica argentina – Historia y perspectivas. Buenos Aires: Centro Editor de América Latina, 1992. RED DE INDICADORES DE CIENCIA Y TECNOLOGÍA IBEROAMERICANA / INTERAMERICANA: El estado de la ciencia. Principales indicadores de ciencia v tecnología, Buenos Aires, RICYT, 2006. SÁBATO, J. A. (Comp.) El pensamiento Latinoamericano en la problemática CienciaTecnología-Desarrollo-Dependencia. Buenos Aires : Paidós, 1975. SÁBATO, J. A. ¿Laboratorios de investigación o fábricas de tecnología? Buenos Aires: Editorial Ciencia Nueva, 1972. SÁBATO, J. A. Bases para un régimen de tecnología. Comercio Exterior, vol. 23, n. 12, 1973. SÁBATO, J. A. Ciencia, tecnología, desarrollo y dependencia. Universidad Nacional de Tucumán, Tucumán, 1971. SÁBATO, J. A. Propuesta de política y organización en Ciencia y Tecnología, en Unión Cívica Radical: Ciencia,Tecnología y Desarrollo - Encuentro Nacional, Unión Cívica Radical - Centro de Participación Política, Buenos Aires, 1983. SÁBATO, J. A; MACKENZIE, M. La producción de tecnología - autónoma o transnacional. México: Nueva Imagen, 1982. SECRETARÍA DE CIENCIA Y TÉCNICA. Lineamientos de Política Científica y Tecnológica, Secretaría de Ciencia y Técnica, Buenos Aires, SECyT, 1984. SECRETARÍA DE CIENCIA Y TÉCNICA. Memoria crítica de una gestión 1983-1989, Secretaría de Ciencia y Técnica, Buenos Aires, SECyT, 1989. THOMAS, Hernán. Dinâmicas de inovação na Argentina (1970-1995): Abertura comercial, crise sistêmica e rearticulação. Tese de Doutorado, Universidade Estadual de Campinas, 1999. THOMAS, Hernán. Estilos socio-técnicos de innovación periférica. La dinámica del SNI argentino, 1970-2000, en ALTEC: IX Seminario LatinoIberoamericano de Gestión Tecnológica: Innovación Tecnológica en la Economía del Conocimiento, CD, Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

San José de Costa Rica, 2001. THOMAS, Hernán. Sur-Desarrollo, acerca de la producción de tecnología en países subdesarrollados. Centro Editor de América Latina, Buenos Aires, 1995. THOMAS, Hernán; Dagnino, Renato. Efectos de transducción: una nueva crítica a la transferencia acrítica de conceptos y modelos institucionales, Ciencia, Docencia y Tecnología, UNER, Nº 30, 2005, pp. 9-46. VARSAVSKY, O. (1974a), Proyectos nacionales. Planteo y estudios de viabilidad, Periferia, Buenos Aires. VARSAVSKY, O. Ciencia, política y cientificismo. Buenos Aires: Centro Editor de América Latina, 1975. VARSAVSKY, O. Estilos tecnológicos. Propuestas para la selección de tecnologías bajo racionalidad socialista. Buenos Aires: Periferia, 1974b.

29


Tecnologia e meio ambiente como mecanismos propulsores de negócios e competitividade: um estudo em empresas da região do grande abc

REVISTA DE EMPREENDEDORISMO, NEGÓCIOS E INOVAÇÃO ISSN 2448-3664

Anapatrícia Morales Vilha Graduada em Administração Empresarial e Negócios, Mestre em Administração e Doutora em Política Científica e Tecnológica pela UNICAMP. É professora dos Programas de Pós Graduação de Economia e de Ciências Humanas e Sociais da Universidade Federal do ABC (UFABC). Atualmente é Diretora da Agência de Inovação da UFABC, Líder do GEACTI/ UFABC e do LabEI/UFABC e Coordenadora da região Sudeste do Fortec.

Darlene Ramos Dias Possui graduação em Economia pela Universidade Federal de Uberlândia (1988), mestrado em Economia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1997) e doutorado em Economia Aplicada pela Universidade Estadual de Campinas (2004). Atualmente é professor adjunto-II da Universidade Federal do ABC. UNIVERSIDADE FEDERAL DO ABC AVENIDA DOS ESTADOS, 5001 BAIRRO BANGU, SANTO ANDRÉ - SP. CEP 09210-580 E-MAIL:RENI@UFABC.EDU.BR COORDENAÇÃO AGÊNCIA DE INOVAÇÃO INOVAUFABC

TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE COMO MECANISMOS PROPULSORES DE NEGÓCIOS E COMPETITIVIDADE: UM ESTUDO EM EMPRESAS DA REGIÃO DO GRANDE ABC TECHNOLOGY AND THE ENVIRONMENT AS BUSINESS AND COMPETITIVENESS MECHANISMS: A STUDY IN GREAT ABC REGION COMPANIES RESUMO Diante dos crescentes desafios impostos a práticas mais sustentáveis de gestão de resíduos sólidos e controle da poluição, empresas têm modificado suas formas de atuação e privilegiado o uso de novas tecnologias que mitiguem os impactos negativos de seus processos produtivos sobre o meio-ambiente. Essa orientação tem provocado uma reformulação das etapas do processo de inovação da empresa com a inclusão de novos arranjos institucionais, como as redes de conhecimento e parcerias que possam funcionar como um processo co-criativo. A combinação entre inovações e a questão ambiental abre uma ampla frente de oportunidades de negócios e em melhorias nos padrões competitivos empresariais. Assim, o presente artigo procura decifrar a natureza, as implicações e as consequências do uso de tecnologias ambientais por parte de empresas da região do ABC nos setores de automotiva, moveleira, petroquímica, plástico, cosmético e metalmecânico. Com base nos dados coletados através da aplicação de entrevistas com profissionais responsáveis pela área de inovação das empresas, conclui-se que muito embora as empresas têm lidado com práticas ambientais mais sustentáveis, elas não estão vinculadas a processos internos de inovação, de produtos e processos. As empresas, portanto, não têm aproveitado as oprtunidades de negócios que se abrem a partir da inclusão da questão ambiental como prática empresarial. Palavras-chaves: tecnologia, meio-ambiente.

ABSTRACT Due to growing challenges posed to more sustainable practices of solid waste management and pollution control, companies have modified their ways of acting and privileged the use of new technologies that mitigate the negative impacts of their productive processes on the environment. This orientation has led to a rethinking of the steps of the company’s innovation process with the inclusion of new institutional arrangements such as knowledge networks and partnerships that can function as a co-creative process. The combination of innovations and the environmental issue opens up a broad front of business opportunities and improvements in competitive business standards. Thus, the present article seeks to discuss the nature, implications and consequences of the use of environmental technologies by companies in the ABC region in the automotive, furniture, petrochemical, plastic, cosmetic and metalmechanic sectors. Based on the data collected through the application of interviews with professionals responsible for the area of business innovation, it is concluded that although companies have dealt with more sustainable environmental practices, they are not linked to internal processes of innovation, products and processes . Companies, therefore, have not taken advantage of the business opportunities that open from the inclusion of the environmental issue as a business practice. Palavras-chaves: envirommental, technology.

JEL Classification: O33. 30

Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Anapatrícia Morales Vilha, Darlene Ramos Dias

1.

INTRODUÇÃO

A preocupação com a questão ambiental tem levado o setor produtivo a buscar oportunidades de negócios e de competitividade a partir de tecnologias ambientais. Entretanto, as empresas estão percorrendo um período de transição da história industrial, ao experimentar novos modelos de posicionamento e competitividade, incluindo a internalização das questões ambientais nos negócios. Não obstante, é sabido que o movimento das empresas nessa direção é decorrente de exigências oriundas de duas forças combinadas. De um lado, da intervenção do poder público, qual seja, na perspectiva do controle ou na taxação oriunda de processos regulatórios. De outro lado, da possibilidade de agregar valor e melhorar a performance e competitividade da empresa, por conta da possibilidade de reduzir custos, melhorar processos produtivos e aumentar a credibilidade e reputação junto ao mercado (Corazza, 1996 e Faria, 2000). Entretanto, segundo Lombardi & Brito (2013) , no âmbito empresarial, fatores como posição competitiva, estrutura da cadeia produtiva, interface com governo e sociedade, capacidades estratégica, tecnológica e inovativa, entre outros, impactam diretamente sobre as formas de internalização das questões ambientais, bem como dos resultados alcançados pelas empresas sob o ponto de vista de sua competitividade. Diante deste contexto, a questão ambiental contemporânea sinaliza para as empresas a necessidade de entendimento sobre a sociedade, o mercado, a estrutura regulatória e política, a dinâmica tecnológica e inovativa e a difusão das tecnologias ambientais. Sob a perspectiva do debate sobre o potencial da tecnologia e sua relação com as questões ambientais, a literatura científica apresenta uma pluralidade de definições (Jabbour, 2010). Considera-se, neste artigo, que tecnologias ambientais estão associadas ao desenvolvimento de produtos, processos e serviços que possam promover uma Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

melhoria de performance ambiental, por meio da utilização de matérias-primas, fontes de energia ou processos produtivos que privilegiem a redução de impactos ambientais. É importante ressaltar que a internalização das questões ambientais como mecanismo propulsor de negócios e competitividade pelas empresas ainda é relativamente recente. Observa-se, no Brasil, um movimento por parte de empresas, de diferentes setores industriais, em direção a novas formas de tratamento das questões ambientais, substituindo a postura reativa por uma abordagem onde as questões ambientais são vistas como novas oportunidades de negócios nas esferas tecnológicas e inovativas. Destacase, pois, empresas dos setores de higiene pessoal, perfumaria e cosméticos, moveleiro, fármaco, alimentício, vestuário e acessórios, calçadista entre outros. Em pesquisa realizada junto a empresas de pequeno e médio porte na região do Grande ABC (Fregonezi e Itani 2008), ficou evidenciado que modelos de gestão ambiental vêm ganhando destaque em suas práticas, por favorecerem a redução de desperdícios e de custos, bem como por facilitarem o alinhamento às exigências regulatórias e a conformidade legal determinadas pelo governo e instituições correlatas. Essa região, uma importante área de produção industrial do estado de São Paulo, estabeleceu uma trajetória de desenvolvimento econômico e tecnológico revestida de fragilidades, marcada pela construção de um parque industrial primordialmente composto por empresas multinacionais que se instalavam sem que fossem definidas linhas de ações estratégicas para a região. Utilizou-se, em especial, de mecanismos de transferência tecnológica para a indústria local, além de contado com alta proteção tarifária (Klink, 2000). Como ressonância desta trajetória, nos anos 90, a produção industrial local desacelerou significativamente e o Grande ABC perdeu várias indústrias, preponderantemente por conta de incentivos fiscais mais atraentes ofertados por outras áreas de São Paulo e de 31


Tecnologia e meio ambiente como mecanismos propulsores de negócios e competitividade: um estudo em empresas da região do grande abc

outros Estados, além do aumento dos custos de trabalho na região (Xavier e et al., 2007). Atualmente, a região do Grande ABC enfrenta o desafio de criar novas alternativas de atratividade empresarial e de competitividade que não estejam atreladas a esforços redundantes e potencialmente flutuantes, como os incentivos fiscais ou as isenções de impostos. Uma saída para o médio e longo prazo poderia ser dada pelo desenvolvimento e fortalecimento tecnológico como mecanismo de diferenciação e competitividade das empresas locais. Ações que privilegiem a geração de competências tecnológicas associadas às questões ambientais tendem ofertar à região um ambiente propulsor de inovações tecnológicas e negócios que podem ampliar a performance ambiental e fortalecer a competitividade regional. Este artigo busca apresentar a natureza, as características, as implicações e o resultado do uso de tecnologias voltadas às questões ambientais, bem como as tendências e oportunidades de negócios e de competitividade no uso dessas mesmas tecnologias, por parte de empresas da região do ABC. A problemática que permeia nossa análise consiste em compreender os motivos que conduzem tais empresas a adotarem tecnologias ambientais e de como o emprego e uso destas tecnologias traduzem em novos negócios e no aumento da competitividade setorial das empresas da região. O artigo está estruturado da seguinte forma: a primeira seção aborda os principais aspectos relacionados ao processo de inovação bem como as estratégias adotadas por empresas que implemetaram novas tecnologias buscando mitigar problemas ambientais decorrentes de seus processos produtivos. Em especial, nesta seção destaca-se, de um lado, as relações calcadas no tripé empresas, meio ambiente e ambiente de negócios; de outro, as relações entre tecnologias e meio ambiente bem como as formas, a natureza e as características destas tecnologias. A última seção apresenta a análise dos resultados da pesquisa. Procura-se traçar um quadro mais geral das estratégias de inovação das empresas entrevistadas e ressaltar como o 32

uso e aplicação das tecnologias ambientais tem conseguido modificar os parâmetros de atuação das empresas no setor, tendo como referência suas espeficidades estrutural e setorial.

2. TECNOLOGIAS, MEIO AMBIENTE E O CONTEXTO COMPETITIVO EMPRESARIAL O setor produtivo tem crescentemente considerado a temática do meio-ambiente como uma nova frente de oportunidades de negócios baseadas em inovações de produtos e processos que incorporem os problemas ambientais (Corazza, 1996 e Faria, 2000). Não obstante, é importante ressaltar que o desenvolvimento sustentável e suas formas de internalização pelas empresas são relativamente recentes, o que as tornam ainda inexperientes no processo de criação e gerenciamento de tecnologias ambientais. Na literatura científica do campo da Administração, alguns autores têm sugerido a necessidade de a responsabilidade social/ ambiental corporativa evoluir de elemento adicional às operações do negócio (em áreas como manufatura, marketing, RH), para uma dimensão estratégica da empresa (Boechat & Paro, 2007). Assim, a política de desenvolvimento sustentável pode induzir a resultados diferenciados, por estar associada a fatores endógenos à empresa (como a possibilidade de transformar os valores da sustentabilidade em oportunidades de inovação) e exógenos (relacionados à intensidade de aceitação dessa inovação pelo mercado). Não obstante, a decisão industrial em desenvolver tecnologias ambientais está diretamente relacionada aos seguintes fatores: a ponderação de elementos associados à capacidade de apropriabilidade das soluções geradas; oportunidades de mercado; nível de conhecimento científico e técnico disponível; e intensidade das adaptações que se façam necessárias em âmbito intra-organizacional e na cadeia produtiva industrial. Caso a empresa esteja diante de oportunidades de mercado escassas e de Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Anapatrícia Morales Vilha, Darlene Ramos Dias

desenvolvimento de soluções de difícil apropriabilidade, certamente as decisões de desenvolvimento e adoção de tecnologias direcionadas às questões ambientais terão menor contingência (Faber & Frenken, 2009). Assim, a taxa e a direção das mudanças tecnológicas são diretamente influenciadas pela demanda de mercado, por um número substantivo e diversificado de agentes e instituições atuando na direção de tais mudanças, pelos avanços tecnológicos e por incentivos regulatórios e econômicos, de modo a estabelecer a existência de fortes retornos crescentes de aprovação e escala dessas tecnologias (Herman et al., 2005). Freeman & Soete (2008) mostram que políticas de desenvolvimento tecnológico para o meio ambiente podem auxiliar o aumento da competitividade do setor produtivo, por orientar inovações tecnológicas (de produto, processo e serviços), que: i) diminuem a quantidade de recursos naturais e energia utilizada na ação produtiva, incorrendo em consequente redução de custos; ii) atuem junto às fontes produtivas geradoras das emissões ambientais para prevenir a geração de poluição; iii) promovam tratamento de resíduos e reciclagem; iv) elevem os níveis padrões de desempenho e segurança ambiental, podendo aumentar a paridade técnica com países onde tais padrões possam ser requisitados e; v) assegurem a geração e difusão de conhecimentos e tecnologias totalmente novos nessa direção, ampliando a possibilidade de explorar novas oportunidades de mercado. Neste contexto, Fukasaku (2000) mostra que as empresas, em face aos atuais problemas ambientais, têm redefinido suas estratégias e formas de pensar sobre as questões ambientais, inclusive nos sistemas de inteligência e em atuação mais colaborativas. As atividades de P&D e de gestão de tecnologias e inovação estão, desta forma, mais alinhadas ao planejamento estratégico da empresa na criação de valor, passando por ferramentas de responsabilidade social corporativa e na ampliação de benefícios entregues pelas inovações ambientais de produto ou processo. Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

Para discutir a natureza e os tipos de estratégias assumidas pelas empresas frente às questões ambientais, é importante ressaltar que o movimento nesta direção é resultado da combinação de duas forças: de um lado, da intervenção do poder público (por meio do controle, taxação e regulação); e de outro, da oportunidade de agregar valor aos produtos e melhorar a performance e competitividade, por conta da possibilidade de reduzir custos, melhorar processos produtivos e aumentar a credibilidade e reputação junto ao mercado (Corazza, 1996 e Faria, 2000). Contudo, o aproveitamento das oportunidades oriundas da internalização da variável ambiental para a competitividade de uma empresa dependerá de como ela pode lidar com tais questões, de maneira distintiva em relação aos seus concorrentes. Isto nos remete ao pressuposto de que as respostas estratégicas que as empresas estabelecem não são triviais e tampouco uniformes. Nesse sentido, as estratégias empresariais relacionadas às questões ambientais são resultados das escolhas que elas fazem sobre como pretendem responder e/ou se antecipar às pressões de seu ambiente de negócios, bem como de características intrínsecas a cada setor, qual sejam, as regulatórias e de mercado, as competitivas e relacionadas à cadeia produtiva, entre outras (Souza, 2002). De uma forma geral, a atuação das empresas frente aos problemas ambientais podem ser agrupadas segundo a tipologia proposta por Meredith (1994): • Estratégia reativa: Nessa estratégia, as ações empresariais são resultado de imposições institucionais e regulatórias, portanto, não vão além da conformidade legal. Diante desse ponto de vista, há um baixo ritmo de inovação promovido pela empresa, dada a ausência da percepção sobre as demandas ambientais duráveis que compensem investimentos para tal internalização. • Essa estratégia está estreitamente associada com a atuação empresarial sob a perspectiva dos procedimentos endof-pipe (ou fim-de-tubo), que têm como solução o controle da poluição após a 33


Tecnologia e meio ambiente como mecanismos propulsores de negócios e competitividade: um estudo em empresas da região do grande abc

geração de emissões e dos problemas ambientais por meio de sua diluição, ou seja, pela dispersão dos poluentes que assegurem uma diluição até os chamados níveis “seguros” (chaminés, emissários). A avaliação da eficiência do controle da poluição é realizada depois do desenvolvimento de produtos e processos (portanto, de forma ad hoc) e, nesse sentido, não há implicações diretas desse procedimento sobre os produtos e processos de produção das empresas. • Estratégia proativa: Nesse tipo de estratégia, a empresa visualiza oportunidades de mercado com a internalização da variável ambiental, por meio de mudanças incrementais em seus produtos, processos e serviços existentes (Nascimento, 2000; Meredith, 1994). Quando se trata de produtos, a empresa pode buscar diferenciálos com algumas características ecologicamente melhoradas. No que tange aos processos produtivos, a empresa pode buscar introduzir alguns elementos de prevenção da poluição e/ ou reduzir o uso de recursos naturais. Ao mesmo tempo, essa estratégia conduz ao gerenciamento das pressões impostas pelo Governo, sociedade e entidades ambientalistas, por meio do monitoramento para o cumprimento das Leis, bem como na construção de credibilidade pelo uso de divulgação de informações quanto aos benefícios ambientais de seus produtos e/ou processos. O fato de a internalização da variável ambiental ocorrer de maneira incremental, sob o ponto de vista tecnológico, e, a busca por diferenciação não estar pautada em estratégias e ações distintivas e/ou em investimentos muito significativos, tornam essa estratégia de fácil imitabilidade pelos concorrentes e limitada para a obtenção de competitividade no longo prazo pela empresa. • Estratégia inovativa: Nessa estratégia, há uma intensificação do ritmo de 34

inovação, ao envolver o desenvolvimento, produção e comercialização de novos produtos que promovem mudanças substanciais de performance ambiental. A questão ambiental é antecipada na empresa e vista como uma meta de ação legítima em seu negócio (Nascimento, 2000; Miles & Covin, 2000; Sharma, 2000). Nesse sentido, a associação da reputação e imagem da empresa com inovações tecnológicas pautadas em mudanças significativas no contexto ambiental pode ser entendida como um ativo estratégico valioso na busca de vantagens competitivas, desde que seja articulado e apresentado de maneira diferenciada ou complexa a todas as partes interessadas (Hart, 1995; Dierickx & Cool, 1989). Como os recursos e as capacidades de inovação em torno das questões ambientais não estão disponíveis como uma “mercadoria” a ser adquirida, eles devem ser criados pela empresa. É a partir dessa perspectiva de criação que a empresa pode se diferenciar da concorrência (Vinha, 2002). Qualquer que seja a orientação dada aos problemas ambientais, torna-se necessário que as empresas levem em conta os desafios ambientais globais criados pelos padrões de produção vigentes, pois existe um trade-off que se expressa na necessidade simultânea de manter as tecnologias e negócios atuais e na criação de tecnologias e mercados inovadores que são revestidos, por sua vez, de alto grau de incerteza – tecnológica, econômica e inovativa (Hart, 1995; OECD, 2009). Por essa razão, a internalização de princípios do desenvolvimento sustentável deve ser encarada como um processo de mudança. Nidumolu & Prahalad & Rangaswami (2009) chamam atenção para o fato de que a efetiva internalização de princípios de desenvolvimento sustentável nas estratégias e condutas das empresas perpassa cinco estágios até que se concretize a mudança sob o signo dos desafios, competências e oportunidades as empresas. São eles: • Entendimento de que a adequação aos Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Anapatrícia Morales Vilha, Darlene Ramos Dias

parâmentos ambientais pode se tornar uma oportunidade para inovar uma vez ela representar um estímulo às empresas a experimentarem tecnologias e processos sustentáveis. • A construção de uma cadeia de valor sustentável de forma a aumentar a eficiência ao longo desta, traduzida na possibilidade de desenvolver fontes sustentáveis de matérias-primas e componentes. • Desenvolvimento de produtos e serviços sustentáveis, tendo como oportunidade a incorporação de novas técnicas e características nos produtos e serviços. • Desenvolvimento de novos modelos de negócios, que permitam gerar novas plataformas de valor para o contexto competitivo nos mercados, cuja oportunidade se caracteriza pela possibilidade de gerar novas relações na cadeia de valor do negócio. • Criação de plataformas de atuação futuras, desenvolvendo novas plataformas de negócio e inovações radicais na direção da sustentabilidade. A geração de tecnologias distintivas não é uma tarefa trivial a ser empreendida pelas empresas, estando condicionada a uma série de fatores que influenciam esse processo e que passam pelas questões orçamentárias às competências para detecção de oportunidades tecnológicas, de desenvolvimento, de gestão e de introdução de inovações tecnológicas nos mercados. Se adicionarmos a esse cenário as implicações ambientais das soluções tecnológicas, essa tarefa se torna ainda mais desafiadora. Há uma extensa variedade de conceitos que caracterizam as tecnologias que levem em conta os aspectos ambientais. De acordo com Jabbour (2010), há correntes que definem as tecnologias ambientais como sendo tecnologias novas que promovem a resolução de problemas ambientais por meio da redução dos efeitos poluentes, portanto, controlando o efeito da poluição já produzida. Já em outras, segundo ainda o mesmo autor, as tecnologias ambientais são caracterizadas por um conjunto sistemático Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

de critérios ambientais no desenvolvimento de novas tecnologias, o que não garante que ao final do desenvolvimento tecnológico seja gerada uma tecnologia ambiental. Para Kuehr (2007), as tecnologias ambientais buscam a melhoria contínua de processos, produtos e serviços, por meio da adequada conservação de matériasprimas e energia, reduzindo o consumo de substâncias tóxicas, desperdícios de recursos naturais e geração de poluição durante o ciclo produtivo. Segundo Vachon & Klassen (2007), tecnologias ambientais podem se caracterizar pela adoção de equipamentos e procedimentos operacionais que limitam ou reduzem os impactos ambientais de produtos e serviços no ambiente natural. Finalmente, para Chen & Lai & Wen (2006), as tecnologias ambientais podem ser entendidas como hardware ou software que se relacionam com o desenvolvimento de produtos e processos verdes, envolvendo tecnologias que reduzem o consumo de energia, previnem a poluição e reciclam os resíduos. Para OECD (2009), as tecnologias ambientais (definidas como eco-inovações) consistem na produção, assimilação e exploração de uma novidade em produtos, processos de produção, serviços ou na gestão e métodos de um negócio, que visam, ao longo do seu ciclo de vida, prevenir ou reduzir substancialmente o risco ambiental, a poluição e outros impactos negativos da utilização de recursos naturais. Embora as eco-inovações tenham como foco o desenvolvimento e aplicação de tecnologias ambientais, há uma crescente compreensão sobre os aspectos não tecnológicos de inovação, como a inovação organizacional (dada pela introdução de novos métodos, sistemas de gestão e estratégias ambientais corporativas, incluindo mudanças na forma como as empresas se relacionam com outras empresas e instituições públicas); a inovação mercadológica (que inclui novas formas de integração de aspectos ambientais com estratégias de comunicação e vendas); e a inovação na vida social e nas estruturas institucionais (oferecendo mudanças nas normas sociais, valores culturais e 35


Tecnologia e meio ambiente como mecanismos propulsores de negócios e competitividade: um estudo em empresas da região do grande abc

composições institucionais formais e não formais) (OECD, 2009). Com o intuito de realizar construções tipológicas das tecnologias ambientais, Chen et al. (2006), as classificam de acordo com a natureza da mudança que elas promovem, isto é, define-as como tecnologias ambientais de produto e tecnologias ambientais de processo. Segundo os autores, tecnologias ambientais de produto e processo estão relacionadas à economia de energia, prevenção da poluição, reciclagem de resíduos e ausência de toxicidade. Exemplos incluem chips de computadores que são mais rápidos, mas consomem menos energia; automóveis que são econômicos em consumo de combustível; métodos de produção que utilizam menos matérias-primas, entre outras soluções (OECD, 2009). No que tange ao desenvolvimento de tecnologias ambientais de produto, Smith (2001) mostra que o eco-design pode se caracterizar como um importante recurso para orientar os projetos de desenvolvimento para melhoria, redesenho e função de produtos e processos, com vistas à reduzir impactos ambientais durante todo o seu ciclo de vida. Segundo o autor, a aferição do desempenho das tecnologias ambientais de produto é definida pela presença dos seguintes elementos: • A empresa escolhe os materiais do produto de modo a lançar a menor quantidade possível de poluição; • A empresa escolhe os materiais do produto de modo utilizar a menor quantidade de energia e recursos; • A empresa desenvolve o projeto do produto de modo que o mesmo facilite sua reciclagem, reutilização e decomposição. Em se tratando de aferição do desempenho das tecnologias ambientais de processo, o mesmo autor ainda as define pela presença dos seguintes elementos: • O processo de fabricação da empresa efetivamente reduz a emissão de resíduos perigosos ou substâncias nocivas ao meio ambiente; 36

• O processo de fabricação da empresa recicla, trata e reutiliza resíduos e emissões; • O processo de fabricação da empresa reduz o consumo de água, eletricidade, carvão ou óleo; • O processo de fabricação da empresa reduz a utilização de matérias-primas. É também admissível classificar as tecnologias ambientais de acordo com o grau da mudança que elas promovem, isto é, definindo-as por tecnologias ambientais radicais e tecnologias ambientais incrementais. As tecnologias ambientais incrementais para as questões ambientais se baseiam em tecnologias já existentes. Podemos indicar como exemplo a adaptação técnica dos motores de aviões a jato com vistas a aumentar a eficiência do uso de combustível e reduzir as emissões de óxidos de nitrogênio. No caso das tecnologias ambientais radicais (totalmente novas) é possível citar o uso de energia solar que fora capaz de assumir um papel central numa economia (Freeman & Soete, 2008). Para Kerr (2003), a tecnologia ambiental radical apresenta um desafio de difícil conciliação, já que oferece um maior grau de risco percebido do que as abordagens incrementais. Para muitos pesquisadores, no entanto, a tecnologia ambiental incremental oferece um efeito demasiadamente pequeno para ‘curar’ os atuais problemas ambientais. Outra tipologia sobre tecnologias ambientais listadas na literatura é aquela proposta por Kuehr (2007) apud Jabbour (2010) que as classifica em: • Tecnologias de mensuração ambiental: como ferramentas, instrumentos, equipamentos e sistemas de gestão da informação para mensuração e controle ambientais, com o objetivo de oferecer elementos para a tomada de decisões relacionadas ao meio ambiente. Seu objetivo não reside em reduzir impactos ambientais, mas municiar o tomador de decisões de informações sobre alternativas para minimizar tais impactos. • Tecnologias de controle da poluição: Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Anapatrícia Morales Vilha, Darlene Ramos Dias

como processos, equipamentos e materiais para neutralizar os impactos gerados durante o ciclo produtivo, sem, necessariamente, implicar modificações nos processos originais. • Tecnologias de prevenção da poluição: como modificações nas matériasprimas, no seu processamento, no reaproveitamento e no mínimo desperdício com vistas à redução de impactos ambientais de um processo produtivo ou de um produto. • Tecnologias de impacto nulo: não geram impacto algum durante o seu processo de desenvolvimento e utilização. Essas tecnologias são empreendidas na biotecnologia e sua existência é considerada utópica atualmente. Considerando ainda a reflexão sobre tecnologias ambientais, Jabbour (2010) destaca a idéia de Klassen & Whybark (1999) de que a dimensão tecnológica em sistemas de gestão ambiental se caracteriza como sendo uma tecnologia organizacional atraente a investimentos que melhoram a forma com que as questões ambientais são incorporadas na manufatura e na gestão organizacional como um todo.

3. PRÁTICAS, ESTRATÉGIAS E TECNOLOGIAS VOLTADAS ÀS QUESTÕES AMBIENTAIS EM EMPRESAS LOCALIZADAS NA REGIÃO DO GRANDE ABC 1. PERFIL DA AMOSTRA E EIXOS DE INVESTIGAÇÃO DO SURVEY O recurso metodológico adotado consistiu em utilizar para a coleta de dados, um survey exploratório junto a uma amostra não representativa de empresas que compõem algumas das cadeias produtivas presentes na região do Grande ABC. O objetivo foi o de realizar um mapeamento qualificado sobre como essas empresas estão se valendo de tecnologias voltadas às questões ambientais e quais são as tendências e oportunidades Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

de negócios e competitividade nesse campo de atuação. As cadeias produtivas são: a automotiva, moveleira, petroquímica, plástico, cosmético e metalmecânico. A seleção da amostra foi de caráter intencional e considerou-se os seguintes requisitos: i) atuação ao longo da cadeia produtiva dos respectivos ramos industriais; e ii) origem do capital. Consideramos, preferencialmente, empresas controladas por capital nacional, de modo a analisarmos as especificidades das empresas brasileiras, cuja lógica se apresenta distinta das corporações multinacionais com atuação local operada por suas matrizes. Elaborou-se um conjunto de questões semi-estruturadas (tanto abertas quanto fechadas) que foram aplicadas, sob a forma de entrevistas, com gerentes ou diretores da área de P&D ou de áreas correlatas das empresas da amostra. Participaram da pesquisa 12 empresas, duas representantes de cada setor, englobando as seis cadeias produtivas escolhidas para análise. As entrevistas tiveram duração média de 1 horas e 30 e a maior parte delas foi gravada, com a devida autorização dos entrevistados. O survey está estruturado em torno de quatro grandes eixos de investigação os quais procuram mapear as ações tecnológicas das empresas com relação às questões ambientais a partir das seguintes dimensões: a) rotinas e características das tecnologias voltadas às questões ambientais; b) Arranjos estratégicos; c) Estrutura e esforços em inovação; d) Avaliação das práticas e dos resultados relacionados à adoção de tecnologias ambientais. Para a apresentação dos resultados da pesquisa de campo, cumpre aqui realizar algumas considerações. A maioria das empresas investigadas nesta pesquisa solicitou sigilo na identificação de seus nomes para a divulgação dos resultados. Nesse contexto, com o objetivo de atender às referidas solicitações, os resultados serão aqui analisados identificando as empresas à luz do seu setor industrial, sem especificidades nominais, conforme o quadro a seguir: 37


Tecnologia e meio ambiente como mecanismos propulsores de negócios e competitividade: um estudo em empresas da região do grande abc

Quadro 1. Perfil das empresas

Empresa

Ramo industrial

Origem do capital

Porte

Atuação na cadeia produtiva

Auto A

automotivo

Nacional

grande

Auto B

automotivo

Internacional

grande

Cosmético C

cosmético

Nacional

médio

Cosmético D

cosmético

Nacional

médio

Metalmecânica E

metalúrgico

Nacional

pequeno

Metalmecânica F

metalúrgico

Nacional

pequeno

Produtora veículos automotores Produtora rodas, discos e tambores de freios, cubos de roda Produtos de higiene pessoal, perfumaria e cosmético Produtos de higiene pessoal, perfumaria e cosmético Produtora de peças tecnicas em alumínio Produtora de peças fixação e estamparia de metais Produtora de móveis

Moveleiro G

moveleiro

Nacional

pequeno

Moveleiro H

moveleiro

Nacional

pequeno

Produtora de móveis

Petroquímica I

petroquímica

Nacional

pequeno

Produtos químicos e petroquímicos

Petroquímica J

petroquímica

Nacional

grande

Produtos de especialidades químicas

Plastico L Plastico M

plástico plástico

Nacional Nacional

pequeno pequeno

Produtora de displays e expositores Produtora de fitas e componentes plásticos

Fonte: elaboração própria

2. ROTINAS E CARACTERÍSTICAS DAS TECNOLOGIAS VOLTADAS ÀS QUESTÕES AMBIENTAIS No que tange os tipos de tecnologias ambientais utilizadas e/ou desenvolvidas pelas empresas entrevistadas do ramo automotivo, a empresa Auto-A sinalizou deter sistema de gestão ambiental ISO 14001, além de tecnologias de controle da poluição, especialmente no campo da reciclagem dos resíduos gerados e de depósito em aterro sanitário. Já a empresa Auto-B indicou deter em suas operações tecnologias ambientais em todas as posições de atuação indicadas no instrumento de pesquisa, ou seja, utiliza tecnologias de mensuração ambiental atuando no controle de emissões atmosféricas, consumo de água, geração de resíduos; tecnologias de sistemas de gestão ambiental ISO 14001; tecnologias de controle da poluição por meio de lavadora de gases, pós-queimadores e estação de tratamento de efluentes; além de tecnologias de prevenção da poluição, como a detenção de caldeira à gás natural no processo produtivo, pintura à base de agua, reuso de água e materiais passíveis de reciclagem nos produtos. Por sua vez, as empresas do setor de cosméticos, Cosméticos-C e Cosméticos-D, indicaram possuir tecnologias de controle da poluição na forma de conteção do uso 38

de água no processo produtivo. O mesmo padrão se verifica nas empresas do setor Metalmecânico–E e Metalmecânico–F. Elas portam tecnologias de controle da poluição geradas em seus processos produtivos, por meio da utilização de serragem para conter vazamentos, contêineres e tambores em área reservada para o armazenamento de borras do processo de esmaltação, percloroetileno sujo, óleo lubrificante e madeira. Possuem também reservatórios para contenção de efluentes de resíduos domésticos como o esgoto de sanitários e caixa de gordura do restaurante, a partir do que preconiza a regulamentação da CETESB. No caso do setor Moveleiro, as empresas Moveleiro-G e Moveleiro-H indicaram que realizam a contratação de uma empresa recicladora de resíduos de madeira, serragem e pó-de-serra, transformandoos em biomassa, de modo a atender a regulamentação prescrita pela CETESB. Contudo, a empresa Moveleiro-G informou que vem, gradativamente, implementando em seus produtos insumos como a madeira maciça, cujo fornecimento decorre também por empresas detentoras de certificação florestal, além de utilizar vernizes à base de água, porque os seus clientes (preponderantemente corporativos e sob encomenda) estão começando a exigir um Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Anapatrícia Morales Vilha, Darlene Ramos Dias

mobiliário idealizado com matérias primas e composição que levem em conta as questões ambientais. As empresas Petroquímica-I e Petroquímica-J desenvolvem e aplicam tecnologias ambientais em todas as dimensões indicadas no instrumento de pesquisa e compreendem, de maneira geral, em tecnologias de mensuração ambiental (aferição do impacto ambiental dos produtos; tecnologias de sistemas de gestão ambiental ISO 14001 e ISO 18001); em tecnologias de controle da poluição que permitem reduzir a emissão de gases de efeito estufa e de geração de efluentes; em, por último, em tecnologias de prevenção da poluição, com vistas a redução no uso de materias primas, insumos e energia, bem como de utilização de materia primas alternativas, como a cana-de-açucar. No cadeia de plásticos, ambas empresas, Plástico-L e Plástico-M, não fazem o uso de tecnologias ambientais, contudo, as duas empresas em questão contribuem com a coleta setetiva da Prefeitura de São Caetano do Sul dos resíduos gerados em seus processos produtivos. Quanto aos principais avanços em competências tecnológicas adquiridas considerando a adoção (desenvolvimento e/ ou uso) de tecnologias voltadas às questões ambientais sinalizadas acima, as empresas Auto-A e Auto-B indicaram que os maiores desafios estão relacionados à necessidade de adequação ao disposto nas políticas nacionais de resíduos sólidos. No caso das empresas do setor de Metalmecânica, a empresa E e a empresa F, estão buscando informações sobre as exigências acerca da certificação ISO 14001. Por outro lado, nas empresas Moveleira-G e Moveleira-H, o uso de matérias primas que levem em conta as questões ambientais não requereu uma ampliação em suas competências tecnológicas, até porque esses insumos são pouco representativos no conjunto dos produtos produzidos por elas. Porém, tais empresas sinalizaram que precisaram se adequar às exigências prescritas pela CETESB no que tange as matérias primas utilizadas, bem como na Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

disposição de seus resíduos sólidos. Nas empresas Petroquímico-I e Petroquímico-J o investimento na ampliação de competências tecnológicas para atuar na direção das questões ambientais foi intensivo, tendo em vista que a ação dessas empresas é fortemente regulada por instâncias de controle ambiental. Particularmente no caso das duas empresas do setor petroquímico entrevistadas, há uma base de produtos em suas carteiras que se valem de matérias renováveis. Finalmente, nas empresas Cosmético-C, Cosmético-D, Plástico-L e Plástico-M não avançaram em competências tecnológicas voltadas as práticas ambientais, até porque não há um posicionamento dessas empresas em seus mercados como promotoras das questões ambientais por meio de seus produtos ou processos produtivos. 3. ARRANJOS ESTRATÉGICOS PARA AS AÇÕES TECNOLÓGICAS VOLTADAS ÀS QUESTÕES AMBIENTAIS A trajerória seguida pela empresa Auto B, sob o ponto de vista de suas estratégias e objetivos de negócios, sugere que a mesma se mobilizou para inserir a questão ambiental em seus esforços de pesquisa e desenvolvimento (P&D). Seja para atender as legislações de seus mercados externos, facilitando sua inserção internacional seja por entender que a busca por tecnologias ambientais no setor se colocará como uma questão relevante em seu negócio, especialmente em motorização, gazes e escapamentos. A empresa Auto-A, por sua vez, baseou sua trajetória na estratégia apenas de contemplar as questões ambientais como um elemento de adequação à legislação vigente. Nas empresas Cosmético-C, Cosmético-D, Metalmecânico-E, Metalmecânico-F, Moveleiro-G, Moveleiro-H, Plástico-L e Plástico-M, a trajetória das estratégias e o objetivos de negócios estiveram voltados para a alavancagem de mecanismos que permitissem reduzir custos com vistas a geração de produtos com preços menores para o mercado. Nesse sentido, há uma 39


Tecnologia e meio ambiente como mecanismos propulsores de negócios e competitividade: um estudo em empresas da região do grande abc

variabilidade de movimentos nessa direção e que vão desde modernização dos processos produtivos até à redução de custos unitários das unidades produzidas via economias de escala. Nas empresas Petroquímico-I e Petroquímico-J as estratégias de negócios claramente legitimaram esforços de pesquisa, desenvolvimento e inovação (P&D+I). No caso da empresa Petroquímico-I, a plataforma de P&D+I contemplou, nesse período, projetos de desenvolvimento de tecnologias de origem renovável obtidos a partir da cana-deaçucar, além de novas propriedades de resinas, geomembranas e PVC. A empresa Petroquímico-J sinalizou em entrevistas que também priorizou esforços de P&D+I, notadamente em projetos de espessantes líquidos de alta performance e solventes para agroquímicos obtidos a partir do óleo de soja e da cana-de-açúcar. Os objetivos de negócios futuros das empresas estudadas sinalizam que poucas estão interessadas no desenvolvimento de tecnologias que caminhem na direção das questões ambientais. A empresa Auto-B indicou na entrevista que tem pretensões de atender aos requisitos das Normas Euro 61 presentes na União Européia. A Auto-A tem a expectativa de ampliar sua atuação em território nacional. As empresas Cosmético-C e Cosmético-D pretendem intensificar atividades de pesquisa tecnológica em cooperação e ampliar a linha de produtos em segmentos de mercado que ainda não atuam. Para as empresas Metalmecânico-E e Metalmecânico-F, a expectativa é de ampliar a capacidade de produção, por meio de aquisição e sofisticação de maquinário. Eles igualmente sinalizaram que as questões ambientais não estão entre as suas metas de atuação. A mesma percepção pôde ser identificada nas empresas Moveleiro-G, 1  Regulamento (CE) n.º 715/2007 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de Junho de 2007, relativo à homologação dos veículos a motor no que respeita às emissões dos veículos ligeiros de passageiros e comerciais (Euro 5 e Euro 6) e ao acesso à informação relativa à reparação e manutenção de veículos.

40

Moveleiro-H, Plástico-L e Plástico-M que indicaram estabelecer esforços para ampliação de competências em seus processos produtivos, com vistas a uma ampliação de qualidade e eficiência produtiva. Finalmente, as empresas Petroquímico-I e Petroquímico-J indicaram a necessidade de qualificar seus processos e ferramentas em gestão de tecnologia e inovação, especialmente no que tange prospecção de tendências de fronteira tecnológica em seus campos de atuação, incluindo as de natureza ambiental. Com base na taxonomia das estratégias ambientais apresentadas na seção anterior do presente artigo, verifica-se a natureza e os tipos de estratégias que as empresas pesquisadas podem assumir frente aos princípios do desenvolvimento. As empresas que possuem uma postura estratégia inovativa foram a Automotivo-B, Petroquímico-I e Petroquímico-J. Neste tipo de estratégia, o ritmo e intensidade da inovação depende da integração dos processos de desenvolvimento, produção e comercialização de novos produtos tendendo a gerar mudanças substanciais de performance ambiental (Nascimento, 2000; Miles & Covin, 2000; Sharma, 2000), foram a Automotivo-B, Petroquímico-I e Petroquímico-J. Por outro lado, observa-se que as empresas de Auto-A; de Cosméticos C e D; de Metalmecânico E e F; de Movéis G e H e de Plástico L e M adotam estratégias do tipo reativas. Estas resultam tanto de imposições institucionais e regulatórias quanto da ausência de percepção sobre as demandas que estimulem investimentos ambientais. Finalmente, as empresas, Auto-A, Auto-B, Petroquímico-I e Petroquímico-J, declararam que também se posicionam ante a uma estratégia proativa, uma vez que conseguem visualizar oportunidades de mercado com a internalização da variável ambiental, por meio de mudanças incrementais em seus produtos e processos (Nascimento, 2000; Meredith, 1994), como dectectado nas entrevitas. Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Anapatrícia Morales Vilha, Darlene Ramos Dias

4. ESTRUTURA E ESFORÇOS PARA AÇÕES TECNOLÓGICAS VOLTADAS ÀS QUESTÕES AMBIENTAIS.

de outras especialidades químicas. Portanto, empresas que indicaram possuirem atividades de P&D formalmente constituídas em seus negócios, apresentamNo que tange âs ações tecnológicas, se um padrão de utilização de fontes externas refletidas nos esforços e resultados de de incentivo e financiamento para inovação, atividades de P&D praticados pelas empresas especialmente decorrentes da FAPESP, entrevistadas, verificou-se que a maioria BNDES, FINEP, Lei da inovação e Lei do bem. das empresas (Cosmético-C, Cosmético-D, AVALIAÇÃO DAS PRÁTICAS E Metalmecânico-E, Metalmecânico-F, 5. Moveleira G, Moveleira-H, Plástico-L e DOS RESULTADOS RELACIONADOS À Plástico-M) não desempenham atividades ADOÇÃO DE TECNOLOGIAS VOLTADAS de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D). Elas ÀS QUESTÕES AMBIENTAIS apenas têm realizado ações pontuais de Quanto as limitações e os aspectos críticos desenvolvimento de produtos, muito embora mostraram interesse em realizar ações das ações tecnológicas voltadas às questões ambientais, as empresas Auto-A e Auto-B colaborativas relacionadas à P&D+I. Nessa direção, as entrevistas mostraram indicaram que o marco regulatório brasileiro que as empresas Plástico-L e Plástico-M ainda é considerado pouco ordenado na apresentam uma relação mais estreita aplicação das políticas ambientais. Elas com o seus fornecedores e clientes, igualmente sinalizaram a necessidade de desempenhando, por vezes, elementos maior articulação dos atores públicos e dos projetos de desenvolvimento de privados no desenvolvimento de tecnologias produtos de forma cooperada com esses ambientais que sejam viáveis ao setor atores. Por outro lado, as empresas de produtivo, especialmente no que tange a maior porte presentes no estudo - Auto-A, viabilidade operacional e de custo, o que Auto-B, Petroquímico-I e Petroquímico-J exige um movimento do país como um todo - constituem formalmente laboratórios e e que envolve a cadeia produtiva, os serviços relacionados, a aderência pelo mercado e mandatos de P&D em seus negócios. A empresa Auto-B informou que seus a infraestrutura para uso). Por outro lado, projetos de pesquisa tecnológica tanto as mesmas empresas informaram que internos quanto externos (estes em associação transcorrido o momento atual de transição com atores externos, como universidades e do mercado, maiores benefícios podem surgir institutos de pesquisa) têm sido desenvolvidos em decorrência das questões ambientais. As empresas Cosmético-C, Cosmético-D, nas áreas de nível de ruído, segurança, design e biocombustíveis. A empresa Auto-A Plastico-L e Plástico-M informaram que, de não informou em que áreas seus projetos maneira geral, o uso de insumos ou matérias de P&D estão direcionados. A empresa primas que levem em conta as questões Petroquímico-I direciona esforços de P&D ambientais em seus produtos é ínfimo, internos e em parceria com universidades, não tendo dificuldades em lidar com essa empresas e institutos de pesquisa nas áreas perspectiva em seus negócios. Na percepção das empresas de matérias primas de origem renovável, bem como resinas, produtos químicos e Metalmecânico-E e Metalmecânico-F, a suas possíveis conversões, como processo gestão ambiental eleva os custos dos serviços biológico, enzimas e modificação genética. e, por este motivo, não há grandes vantagens Finalmente, a empresa Petroquímico-J competitivas e mercadológicas. Ademais, também é orientada por esforços de P&D as empresas entendem como limitação a internos e em parceria para avanços no ausência de apoio sistêmico para aprender e desenvolvimento de tensoativos voltados aos validar a perspectiva da sustentabilidade em produtos de higiene pessoal e limpeza, além seus negócios. Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

41


Tecnologia e meio ambiente como mecanismos propulsores de negócios e competitividade: um estudo em empresas da região do grande abc

Para as empresas Moveleiro-G e Moveleiro-H, o setor moveleiro só alavancará ações de natureza ambiental quando houver suporte por parte do poder público, com ações coletivas e de apoio que viabilizem o descarte dos resíduos de forma sustentável. Finalmente, para as empresas Petroquímico-I e Petroquímico-J a rota da sustentabilidade é um vetor de transformações tecnológicas e inovativas em seu setor industrial. Nesse sentido, ambas as empresas indicaram a necessidade de intensificar as atividades de P&D para elevar a densidade científica e tecnológica das suas soluções, de maneira a viabilizá-las no mercado.

4. DIAGNÓSTICO SOBRE O USO DE TECNOLOGIAS AMBIENTAIS EM EMPRESAS DA REGIÃO DO GRANDE ABC Pesquisas sobre gerenciamento estratégico descritas ao longo deste trabalho mostraram que os temas ambientais influenciam cada vez mais a definição de estratégias tecnológicas e de mercado, como resultado de um aumento da conscientização e expectativa dos consumidores quanto aos produtos que respeitem o meio ambiente. Para alguns estudiosos (Vinha 2002; Boechat e Paro 2007), uma atuação empresarial sob os princípios do desenvolvimento sustentável pode induzir a resultados diferenciados, por estar associada a fatores endógenos à empresa (como a possibilidade de transformar os valores da sustentabilidade em oportunidades de inovação) e exógenos (relacionados à intensidade de aceitação dessa inovação pelo mercado). O ABC paulista, por ser um espaço regional privilegiado e também por deter um dos principais pólos industriais da América Latina (Moraes, 2003) nitidamente vem exibindo esforços e iniciativas de desenvolvimento de competências tecnológicas locais, com destaque à implantação de seus parques tecnológicos. Assim, esta seção procura identificar e mapear se as práticas de inovação das empresas de alguns setores produtivos da região têm incluido a questão ambiental no 42

tocante ao desenvolvimento, emprego e uso de tecnologias ambientais. No que tange aos tipos de tecnologias ambientais utilizadas e/ou desenvolvidas pelas empresas entrevistadas, chama a atenção o fato de todas elas indicarem a utilização de tecnologias ambientais de controle da poluição, que se caracterizam por processos, equipamentos e materiais para neutralizar os impactos gerados durante o ciclo produtivo, sem, necessariamente, implicar em modificações nos processos originais (Kuehr, 2007). Por outro lado, o uso de tecnologias que modifica a qualidade e o processamento das matérias-primas, que reduz significativamente o seu desperdício por meio da elevação de seu aproveitamento e cujo objetivo seja o de reduzir impactos ambientais, de processos ou de produto (Kuehr, 2007), foi sinalizada por todas as empresas de grande porte, Automotivo-B, Petroquímico-I, Petroquímico-J, e, também, pela empresa de pequeno porte Moveleira-G. Esta vem, gradativamente, implementando em seus produtos insumos como a madeira maciça, cujo fornecimento decorre também por empresas detentoras de certificação florestal. As empresas de grande porte entrevistadas - Auto-A, Auto-B, Petroquímico-I e Petroquímico-J – sinalizaram, de um lado, o uso de tecnologias de mensuração e de gestão ambiental, estas sendo definidas como ferramentas, instrumentos, equipamentos e sistemas de gestão da informação para mensuração e controle ambientais, cujo objetivo tem sido o de oferecer elementos para a tomada de decisões relacionadas ao meio ambiente (Kuehr, 2007) e; de outro, por tecnologias organizacionais, que oferecem investimentos que melhoram a forma com que as questões ambientais são incorporadas na manufatura e na gestão organizacional como um todo (Klassen e Whybark, 1999). Dentre as empresas que indicaram utilizar todos os tipos de tecnologias ambientais mapeadas pela revisão da literatura correspondente, as empresas Auto-A e Auto-B apontaram que, dentre as diversas Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Anapatrícia Morales Vilha, Darlene Ramos Dias

competências tecnológicas adquiridas em função das questões ambientais, destacase a necessidade de adequação ao disposto nas políticas nacionais de resíduos sólidos. No caso das duas empresas do setor petroquímico, a ampliação de competências tecnológicas para atuar na direção das questões ambientais foi grande, tendo em vista que a atuação desse setor industrial fora fortemente regulada por instâncias de controle ambiental. Nas demais empresas entrevistadas, não houve necessidade de avançar em competências tecnológicas em torno das questões ambientais. Esse achado está em linha com alguns estudos (Quadros, 2008), que mostram que, em geral, empresas menores inovam em menor frequência e possuem processos inovativos menos estruturados, por conta de limitações financeiras e de competências da função de P&D. As entrevistas com as empresas Automotivo-A e Automotivo-B deixaram evidente que, sob o ponto de vista de algumas estratégias e objetivos de negócios, as questões ambientais exigiram um processo de adequação nessas organizações e foram orientadas ora para atender legislação vigente, ora para estabelecer sua inserção em mercados internacionais. Por sua vez, as empresas Petroquímico-I e Petroquímico-J promoveram certos esforços em direção ao desenvolvimento de projetos de P&D+I que envolviam as questões ambientais. Não obstante, nas demais empresas investigadas, as estratégias organizacionais não estabeleceram nenhuma conexão com a dimensão ambiental, concentrando-se, em grande medida, na alavancagem de suas posições competitivas de mercado, por meio de novos produtos e processos produtivos de menor custo. Como mostra a literatura, a capacidade inovadora das pequenas e médias empresas depende de vários fatores que se relacionam com a organização do setor industrial em que elas atuam e com o sistema de inovação onde elas se encontram (Rovere, 1999). O comportamento estratégico pregresso das empresas entrevistadas é semelhante quando Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

se discute os objetivos de negócio futuros das mesmas: as empresas Automotivo-A e Automotivo-B têm pretensões de ampliar atuação e, nessa direção, as condições de adequação às legislações ambientais dos mercados de destino parece ser uma meta de seus negócios. As empresas Petroquímico-I e Petroquímico-J indicaram a necessidade de qualificar seus processos e ferramentas em gestão de tecnologia e inovação para desenvolvimento de soluções relacionadas às questões ambientais. Nas demais empresas entrevistadas, as questões ambientais não estão no centro de suas metas de atuação futuras. Quanto à natureza e os tipos de estratégias assumidas frente aos princípios do desenvolvimento sustentável, as empresas deste estudo que prescidem de uma estratégia inovativa, tal qual caracterizada na seção anterior, foram a Auto-B, a Petroquímica-I e Petroquímica-J. Estas empresas, juntamente com a empresa Auto-A, se posicionam também ante a uma estratégia proativa, uma vez que percebem novas oportunidades de mercado quando internalizam a variável ambiental, por meio de mudanças incrementais em seus produtos e processos Quando a internalização da variável ambiental ocorre desta maneira, sem volume de recursos de investimentos e sem transformações significativas do ponto de vista tecnológico, abre a possibilidade de seus concorrentes em adotar práticas de imitação, compromentendo a aquisição de competitividade no longo prazo (Nascimento, 2000 e Meredith, 1994). Por outro lado, as demais empresas do estudo (com a adição, neste caso, da Automotivo-A) sinalizaram uma atuação por meio de estratégias reativas, cujas ações são resultado de imposições institucionais e regulatórias, dada a ausência da percepção sobre as demandas ambientais que compensem investimentos para tal (Meredith, 1994). A análise da estrutura e dos esforços para as ações tecnológicas das empresas entrevistadas reafirmou um padrão discutido acima que relaciona o porte das empresas e a intensidade de suas ações 43


Tecnologia e meio ambiente como mecanismos propulsores de negócios e competitividade: um estudo em empresas da região do grande abc

de pesquisa, desenvolvimento e inovação (P&D+I). Nesse sentido, nas empresas de grande porte Automotivo-A, Automotivo-B, Petroquímico-I e Petroquímico-J há uma formalização clara das atividades de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) em seu negócio, em quase todas sinalizando a existência de projetos na direção da sustentabilidade. Mover-se na direção da sustentabilidade não é tarefa trivial pelas empresas, tendo em vista os desafios ambientais globais criados pelos padrões de produção estabelecidos desde a revolução industrial, cujo resultado se coloca como um trade-off que se expressa na necessidade simultânea das empresas de manter as tecnologias e negócios atuais, considerando que o atual padrão de desenvolvimento tecnológico e econômico limita a criação de produtos integralmente sustentáveis; bem como de criar a tecnologia e os mercados de amanhã que são revestidos, por sua vez, de alto grau de incerteza – tecnológica, econômica e inovativa (Hart, 1995 e OECD, 2009). Contudo, as demais empresas entrevistadas não desempenham atividades de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), realizando ações pontuais de desenvolvimento de produtos. A limitação de esforços tecnológicos presentes nessas empresas de menor porte na pesquisa está em consonância a estudos que apontam as limitações financeiras e de competências das empresas menores, fazendo com que nelas o P&D seja menos formalizado e que, no conjunto, inovem em menor freqüência do que as grandes empresas (Quadros, 2008). Finalmente, a análise sobre a avaliação das práticas e dos resultados relacionados à adoção de tecnologias voltadas às questões ambientais pelas empresas entrevistadas nos auxiliou a responder à questão que orientou este trabalho, que é investigar a morfologia, os aspectos críticos, os resultados e as implicações do uso de tecnologias voltadas às questões ambientais em empresas da região do grande ABC. Nessa direção, chama a atenção nos casos empresariais investigados de que os mesmos estão posicionados sob um processo – ora alheio às questões ambientais – ora de construção e maturação das tecnologias 44

e práticas nessa direção. Esse pressuposto dialoga com os trabalhos de Porter e van der Linder (1999), mostrando que estamos percorrendo um período de transição da história industrial, em que as empresas são inexperientes no gerenciamento criativo das questões ambientais. Para as empresas Automotivo-A e Automotivo-B o marco regulatório brasileiro em políticas ambientais é considerado pouco ordenado, revelando a necessidade de uma maior articulação entre os setores público e privado para desenvolvimento de tecnologias ambientais. As empresas Petroquímico-J e Petroquímico-J sinalizaram que é preciso intensificar as atividades de P&D, de maneira a viabilizar o uso de soluções ambientais de maneira expressiva no mercado. Na percepção das empresas Moveleiro-H e Moveleiro-I o setor de móveis só alavancará ações de natureza ambiental quando houver suporte por parte do poder público. Para as empresas Cosmético-C, Cosmético-D, Plástico-L e Plástico-M o uso de insumos ou matérias primas que levem em conta as questões ambientais em seus produtos é ínfimo. Nas empresas Metalmêcânico-E e Metalmecânico-F a gestão ambiental eleva os custos dos serviços e, nesse momento, esse posicionamento não oferece grandes vantagens competitivas e mercadológicas.

5.

CONCLUSÕES

Ressaltamos, ao longo deste artigo, que a inovação, especialmente a inovação tecnológica, é tida atualmente como essencial nas estratégias de diferenciação, competitividade e crescimento em um número cada vez maior de negócios. Nesse sentido, a adoção de estratégias e práticas inovativas nas empresas estão estreitamente associadas à busca de diferenciações capazes de produzir produtos e serviços para o mercado que gerem vantagens competitivas sustentáveis em relação a seus competidores (Vilha, 2009). Frente ao atual estágio da economia contemporânea, os processos de inovação estão ocorrendo sob um contexto de mudança Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Anapatrícia Morales Vilha, Darlene Ramos Dias

dos valores sociais e as crescentes pressões ambientais. Assim, o tom do processo inovativo nas empresas está diretamente relacionado com a capacidade de explorar e gerenciar o conhecimento necessário para gerar inovações e atuar nos mercados. Trata-se de um aspecto crítico particularmente para pequenas e médias empresas, que apresentam limitações de gestão inerentemente relacionadas ao seu porte. Nesse sentido, verificou-se que muito embora as empresas entrevistadas na região do grande ABC têm se posicionado – ora alheias às questões ambientais, ora em processo de construção e maturação das tecnologias e práticas nessa direção - há uma janela de oportunidades inovativas e de negócio que pode ser aproveitada por elas no que tange a rota tecnológica baseada na sustentabilidade. Considerações finais: O fato de uma parte expressiva das empresas estudadas da região do grande ABC ser de pequeno e médio porte não significa que as mesmas não tenham condições de estruturar práticas de gestão de inovação. Contudo, o gerenciamento da inovação pressupõe legitimidade por parte dos dirigentes da empresa e a presença de determinadas características na condução de estratégias competitivas e de inovação bem-sucedidas, como experiência no setor; capacidade de aprender com erros e acertos; motivação; relacionamento interpessoal facilitado; e a percepção de oportunidades para impulsionar a geração de inovações e o crescimento constante da empresa (Vilha, 2010). Ainda que o atual padrão de desenvolvimento tecnológico e econômico limite a criação de produtos integralmente sustentáveis, a internalização dos princípios do desenvolvimento sustentável nos processos inovativos das empresas deve ser encarada como um processo de mudança sob o ponto de vista dos desafios, competências requeridas e oportunidades das empresas. Nesse contexto, as atividades de P&D e de gestão de tecnologia e inovação devem estar mais intensamente alinhadas com o planejamento estratégico da empresa, além de buscar mecanismos de criação de valor que necessariamente passam por princípios Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

de transparência e uso de ferramentas de responsabilidade social corporativa com o objetivo de ampliar os benefícios entregues pelas inovações de produto ou processo. Portanto, para que as empresas instaladas na região do grande ABC se movam na direção de inovações tecnológicas direcionadas à temática ambiental, seria preciso: Alinhar as estratégias competitiva e de inovação sob a perspectiva dos princípios do desenvolvimento sustentável. As diretivas das empresas como visão, missão e valores e funções corporativas críticas precisam legitimar tais princípios. Intensificar nas empresas atividades de mapeamento e prospecção de oportunidades a ser exploradas como também detectar e neutralizar possíveis ameaças a sustentabilidade. Na gestão de portfolio dos projetos de inovação, especialmente quando se tratar de inovações ambientalmente sustentáveis, as empresas devem levar em conta, além dos critérios tradicionais de avaliação e priorização de projetos (no âmbito competitivo, tecnológico e financeiro), outros critérios igualmente importantes sob o ponto de vista ambiental e social: i) o alinhamento de projetos que já contemplem os princípios do desenvolvimento sustentável; nível de impacto ambiental; relevância para a estratégia de sustentabilidade da empresa; e benefícios à credibilidade e reputação da empresa. Cosntruir uma cultura organizacional e inovativa que valorize as questões ambientais e sociais. Para tanto: i) a liderança das empresas é considerada um vetor importante na disseminação de uma cultura que valorize o desenvolvimento sustentável; ii) é preciso envolver funcionários e áreas corporativas em práticas de responsabilidade social e ambiental, como programas de educação ambiental, ações socialmente responsáves; iii) desenvolver uma plataforma de gestão do conhecimento que contemple estudos, experiências e práticas na direção da sustentabilidade. Inovações de caráter sustentáveis exigem uma base de conhecimento tecnológico que induz à intensificação das atividades 45


Tecnologia e meio ambiente como mecanismos propulsores de negócios e competitividade: um estudo em empresas da região do grande abc

de P&D. Para tanto, as empresas precisam mobilizar fontes internas e, sobretudo, ações de cooperação tecnológica e inovativa, para ampliar e/ou complementar o domínio tecnológico na perspectiva do desenvolvimento sustentável. Acrescentase, nesse contexto, a necessidade de buscar incentivos financeiros e instrumentos de financiamento à pesquisa, inovação e expansão, para superar as limitações das empresas (especialmente as menores) do setor no que tange a formalização das suas atividades de P&D e de construção de competências de gestão dos seus processos de inovação. Para o processo de geração de ideias que iniciarão os projetos de inovação, as empresas precisam ‘fugir’ da tendência de reproduzir soluções usadas com sucesso no passado (é preciso pensar ‘fora do quadrado’). Nesse sentido, para orientar os insights de iniciação de projetos de inovação sob a perspectiva do desenvolvimento sustentável, é preciso mudar as perguntas, e não as respostas. Por exemplo: “Ao invés de nos perguntarmos como fazer para nos transportarmos com energias mais limpas, devemos questionar por que estamos nos transportando tanto?”. Nos gestão de projetos de inovação na direção da sustentabilidade, sugerese às empresas estabelecer critérios de desenvolvimento e avaliação dos projetos que extrapolam o aspecto econômico e que envolvem também a análise de aspectos sociais e ambientais, como: i) um melhor posicionamento da reputação e credibilidade da organização; ii) o envolvimento dos fornecedores em processos socialmente responsáveis; iii) o engajamento da empresa em ações políticas e de pesquisa junto ao o governo; iv) o envolvimento dos funcionários em ações socialmente responsáveis; v) a melhoria das condições de comunidades do entorno; vi) promover ações e campanhas socialmente responsáveis junto à sociedade; vii) possuir características ecologicamente corretas; viii) ter processos produtivos que vão além de reduzir impactos ambientais e/ou de melhorar a eficiência produtiva; ix) sofrer eventuais pressões impostas por 46

órgãos reguladores, entidades ambientalistas e sociedade; e x) melhorar a credibilidade da organização quanto aos benefícios ambientais de seus produtos/processos. Na estratégia de construção de marcas e de posicionamento de produtos que associem valores sociais e ambientais, não basta que os consumidores saibam o que um produto ou serviço faz, ou que imagens ele transmite ao comprador. Eles precisam saber “em quê” as empresas produtoras dos produtos “acreditam” e que ações elas “promovem” em torno dessas causas. Finalmente, encerramos este estudo com a sinalização de alguns desafios que merecem ser explicitados para contribuir com a ampliação da reflexão acerca da internalização das questões ambientais pelas empresas, bem como para auxiliar o entendimento e a construção de políticas públicas ambientais e de CT&I nessa direção. Para a maioria dos países emergentes, como o Brasil, o crescimento empresarial sustentado através da inovação tecnológica ainda é considerado um grande desafio. Em parte, isso pode ser explicado pela falta de comprometimento e de experiência de parte das empresas e instituições de CT&I com atividades de pesquisa, desenvolvimento e de gestão dos seus processos inovativos. Nesse contexto, é fundamental para que as empresas que desejem ser competitivas e rentáveis economicamente por meio de ações sob a perspectiva sustentável, tenham clareza na formulação de suas estratégias competitivas e inovativas associadas às competências de gestão de inovação capazes de oferecer também resultados adicionados para a sociedade e para o meio ambiente. Em paralelo, o governo precisa oferecer uma combinação eficiente dos instrumentos políticos de natureza ambiental e de CT&I, no intuito de contribuir de sobremaneira com os objetivos ambientais. Por se revestir de objetivos de longo prazo, sob o ponto de vista político, as questões ambientais endereçam a necessidade de uma mudança latente e precisam ocupar um espaço privilegiado nas agendas do ministério de ciência, tecnologia e inovação e das agências governamentais. Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Anapatrícia Morales Vilha, Darlene Ramos Dias

Para tanto, é preciso requerer uma gradativa mudança e qualificação das instituições, das políticas e do Estado, de forma a reorientar tecnologias de produção e consumo existentes, bem como para articular e desenvolver novas soluções tecnológicas voltadas às questões ambientais. Desse modo, as políticas de CT&I dirigidas às questões ambientais exigem uma abordagem sistêmica, integrando diferentes atores como empresas, institutos de pesquisa, universidades, organizações não governamentais em programas de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) para gerar tecnologias e inovações tecnológicas em diferentes campos de domínio, diluindo o risco de direcionar investimentos em tecnologias que possam vir a tornar-se inviáveis sob o ponto de vista técnico, de custo ou de mercado. A competitividade das empresas é um pré-requisito indispensável para o ingresso em atividades de desenvolvimento de tecnologias ambientais. Isto posto, políticas públicas de CT&I nessa direção devem, necessariamente, privilegiar a competitividade do setor produtivo.

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BOECHAT, C. B & PARO, R. M. (2007) Desafios para a sustentabilidade e o planejamento estratégico das empresas no Brasil. Relatório de pesquisa – RP 0702, Fundação Dom Cabral, Ano 7, n. 2, set. CHEN, Y.; LAI, S. & WEN, C. (2006). The influence of green innovation performance on corporate advantage in Taiwan. Journal of Business Ethics, 67: 331-339. CORAZZA, R. I. (1996) Inovação tecnológica e demandas ambientais: notas sobre o caso da indústria brasileira de papel e celulose. Dissertação de Mestrado não publicada, Instituto de Geociências da UNICAMP, Campinas, São Paulo. DIERICKX, I., COOL, K. “Asset stock accumulation and sustainability of competitive advantage.”Management Science, [S.l.], v. 35, p. 15041513, Dezembro. 1989 in VINHA, V. Stakeholder approach: novo paradigma operacional?. Instituto de Economia da UFRJ, 2002. Disponível em http// www. latec.uff.br/anais/Artigos/142.pdf. [20 out 2003]. FABER, A. A. & FRENKEN, K. B. (2009) Models in evolutionary economics and environmental policy: Towards an evolutionary environmental economics. In: Technological Forecasting & Social Change, 76: 462– Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

470. FARIA, H. M. (2000) Benefícios econômicos da gestão ambiental: uma discussão. Dissertação de Mestrado não publicada, Escola Federal de Engenharia de Itajubá (Efei), Itajubá, Minas Gerais. FREEMAN, C. & SOETE, L. (2008) A economia da inovação industrial, Campinas: Editora da Unicamp. FREGONEZI, A. & ITANI, A. (2008) Demandas de formação em gestão em saúde, segurança do trabalho e meio ambiente: expectativa e respostas. Revista de Gestão Integrada em Saúde do Trabalho e Meio Ambiente, 3: (3), ago./ dez. FUKASAKU, Y. (2000) Innovation for Environmental Sustainability: A Background in Innovation and the Environment France, OECD. HART, Stuart. (1995) A natural-resource-based view of the firm”. Academy of Management Review, 4: 986-1014. HERMAN, R. J., VOLLBERGHA, T. & KEMFERTB, C. (2005) The role of technological change for a sustainable development. Ecological Economics, 54: 133– 147. JABBOUR, C. J. C. (2010) Tecnologias ambientais: em busca de um significado. RAP, Rio de Janeiro 44(3):591-611. KERR, J. H. (2003) Innovation dynamics and environmental technologies: the emergence of fuel cell technology. Journal of Cleaner Production, 11: 459–471. KLASSEN, R. D. & WHYBARK, D. C. (1999) The impact of environmental technologies on manufacturing performance. Academy of Management Journal, 42 (6): 599-615. KLINK, J. (2000) O novo regionalismo à maneira do ABC: em busca de uma economia regional de aprendizagem. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n 8. KUEHR, R. (2007) Environmental technologies: from a misleading interpretations to an operational categorization and definition. Journal of Cleaner Production, v. 15, n. 13-14, p. 1316-1320. LOMBARDI, M. S. & BRITO, E. P. Z. (20013) Desenvolvimento sustentável como fator de competitividade. Artigo apresentado no XXXI Encontro da ENANPAD 2013, Rio de Janeiro, Brasil. MEREDITH, S. (1994) Environment and competition: development of environmental strategies in the UK paint and coatings industry. Disssertação de Mestrado não publicada, The University of Brighton, Brighton, UK. MILES, M. P. & COVIN, J. G. (2000) Environmental marketing: a source of reputational, competitive and financial advantage. Journal of Business Ethics, 23: 299311. MORAES, J. C. (2003) Gestão regional compartilhada no Grande ABC Paulista: o papel da agência de desenvolvimento econômico. Tese de Doutorado não publicada, Pós-graduação em Ciências Sociais, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, São Paulo. NASCIMENTO, L. F. (2000) Gerenciamento Ambiental Estratégico. Paper não publicado, Pós47


Tecnologia e meio ambiente como mecanismos propulsores de negócios e competitividade: um estudo em empresas da região do grande abc

Graduação em Administração, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS. NIDUMOLU, R., PRAHALAD, C. K. & RANGASWAMI, M.R. (2009) Why Sustainability Is Now the Key Driver of Innovation. Harvard Business Review, :1-11. OECD. (2009) Organization for Economic Cooperation and Development. Eco-Innovation in Industry – Enabling green growth. PORTER, M. E. & VAN DER LINDE, C. (1999) Verde e competitivo: acabando com o impasse. In: PORTER, M. E. Competição: estratégias competitivas essenciais. Rio de Janeiro: Editora Campus. QUADROS, R. (2008) Padrões de Gestão Estratégica da Inovação Tecnológica em Empresas: a influência do tamanho, controle de capital e do setor. Paper não publicado, Seminários de Doutorado do DPCT, Campinas, São Paulo. ROVERE, R L. La. (1999) As Pequenas e Médias Empresas na Economia do Conhecimento: Implicações para Políticas de Inovação. In: Lastres H. M. M. & Albagli, S. (Org.). Informação e Globalização na Era do Conhecimento. pp. 145-163. Rio de Janeiro: Editora Campus. SHARMA, S. (2000) Managerial interpretations and organizational context as predictors of corporate choice of environmental strategy. Academy of Management Journal, 43:681-697. SMITH, M. T. (2001) Eco-innovation and market transformation. The Journal of Sustainable Product Design, 1: 19–26. SOUZA, Renato S. (2002) Evolução e Condicionantes da Gestão Ambiental nas Empresas. Revista Eletrônica de Administração. Porto Alegre : EA/ UFRGS, 8(6): nov/dez. VACHON, S. & KLASSEN, R.D. (2007). Supply chain management and environmental technologies: the role of integration. International Journal of Production Research, (in press) in JABBOUR, C. J. C. Resgatando o conceito de tecnologia ambiental. Anais do XXXI Encontro da ENANPAD, Rio de Janeiro, setembro, 2007. VILHA, A. M. (2009) Gestão da Inovação na Indústria Brasileira de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos: Uma Análise sob a Perspectiva do Desenvolvimento Sustentável. Tese de Doutorado não publicada, Instituto de Geociências da UNICAMP, Campinas, São Paulo. VILHA, Anapatrícia Morales. (2010) Gestão de Inovação nas Empresas. Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial, SINDIPLAST / SINDIBOR. VINHA, V. (2002) Stakeholder approach: novo paradigma operacional?. Instituto de Economia da 2002. Disponível em http// www.latec.uff.br/anais/ Artigos/142.pdf. [20 out 2003]. XAVIER, M. L. P., et al. (2007) O novo perfil econômico do Grande ABC. Revista Organizações em contexto-on-line, 3( 6 ): 103-122 .

48

Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Sérgio F. Crispim, Hamilton Pozo Edson H. Takata, Flávio Corrêa Rangel

REVISTA DE EMPREENDEDORISMO, NEGÓCIOS E INOVAÇÃO ISSN 2448-3664

Sérgio F. Crispim Livre Docente em Gestão de Marketing pela Universidade de São Paulo (2008); Pós doutorado em Administração pela USP (2007); Doutor em Administração pela FEA-USP (1994) http://lattes.cnpq. br/7178921936558146

A IMPORTÂNCIA DA GESTÃO ESTRATÉGICA COMO FATOR DE SOBREVIVÊNCIA DE UMA IES – INSTITUIÇÃO DE ENSINO SUPERIOR THE IMPORTANCE OF THE STRATEGIC MANAGEMENT AS FACTOR OF SURVIVAL OF AN IES - INSTITUTION OF HIGHER EDUCATION

Edson H. Takata Graduação em administração de empresas pela PUC-SP (1985), pós graduado em Planejamento empresarial pela USJT (1989). Professor no curso de Projeto de Sistemas e Análise Estruturada da (ESAN-SBC).

Flávio Corrêa Rangel Professor da instituição Uninove, Mestrando em Administração no IMES (2007) Pós Graduação em Comércio Internacional pela Getulio Vargas de São Paulo (2006), Pós Graduação em Comunicação e Marketing pelo IMES (2001) http://lattes. cnpq.br/8129298994368187 UNIVERSIDADE FEDERAL DO ABC AVENIDA DOS ESTADOS, 5001 BAIRRO BANGU, SANTO ANDRÉ - SP. CEP 09210-580 E-MAIL: RENI@UFABC.EDU.BR COORDENAÇÃO AGÊNCIA DE INOVAÇÃO INOVAUFABC

RESUMO O setor educacional tem passado por mudanças que exigem dos gestores de Instituições de Ensino Superior (IES) capacitações técnica e estratégica para operar o negócio e torná-las cada vez mais competitivas face aos novos desafios. Num contexto onde há evidências do excesso de oferta de IES’s, a capacidade de monitorar o ambiente, identificar oportunidades de compra, articular a engenharia financeira para as aquisições e consolidar negócios alinhados a uma estratégia central tornam-se pré-condições para manutenção da competitividade. Dados estes desafios, foi realizada uma pesquisa exploratória, que utilizou como delineamento um estudo de caso por meio da qual se buscou identificar numa IES, localizada na região de Campinas, as motivações para adquirir outra IES no final de 2007. Neste sentido avaliaram-se as formas de monitoramento ambiental que eram adotadas, se a compra inseriu-se em uma estratégia deliberada ou resultou de uma estratégia emergente e se houve impactos sobre a estrutura organizacional e processos. Os resultados mostram que a aquisição foi realizada com base no monitoramento do ambiente organizacional e com critérios suportados pelas teorias sobre estratégia, sendo observados sinais de que o funcionamento da estrutura organizacional está prejudicado principalmente pela falta de mão de obra qualificada para suas necessidades. Palavras-chave: Estratégia. Estrutura organizacional. Instituição de Ensino Superior.

ABSTRACT The education sector has gone through changes that require the managers of Higher Education Institutions (HEI’s) strategic and technical capabilities to operate the business and make them increasingly competitive in the face of new challenges. In a context where there is evidence of over-supply of HEI’s, the ability to monitor the environment, identify opportunities to purchase, joint financial engineering for purchases and consolidate business strategy aligned to a central become preconditions for maintenance competitiveness. Given these challenges, was made an exploratory research, which used design as a case study through which to identify a HEI, located in the region of Campinas, the motivations to purchase at the end of 2007 another HEI. In this sense it was evaluated the forms of environmental monitoring that were adopted, if the purchase is entered into a deliberate strategy or resulted from an emerging strategy and whether there were impacts on the organizational structure and processes. The results show that the acquisition was based on monitoring of the environment and organizational criteria supported by the theories on strategy, and observed signs that the functioning of the organizational structure is mainly hampered by the lack of qualified workforce to their needs. Keywords: Strategy. Organizational Structure, Institution of structure, Higher Education, Institutions.

JEL Classification: L10. Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

49


A importância da gestão estratégica como fator de sobrevivência de uma ies – instituição de ensino superior

1.

INTRODUÇÃO

Nos últimos anos as Instituições de Ensino Superior - IES’s brasileiras têm enfrentado grandes mudanças nos ambientes onde estão atuando, influenciadas fortemente por fatores como: políticas pedagógicas e governamentais, condições econômicas, alterações demográficas, mercado de trabalho, ações da concorrência, qualidade do ensino, condições estruturais e de suporte oferecidos para os alunos (laboratórios, bibliotecas, equipamentos de informática e de apresentação de aulas, serviços de tesouraria, atendimento, secretaria, etc.), faturamento incompatível com suas despesas, entre outras. Dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (BRASIL/MEC, 2008) mostram um crescimento de cerca de 133% na quantidade de IES’s de 1998 até 2006, ao passo que a quantidade de concluintes do ensino médio teve um crescimento de cerca de 40%. Os sinais do desequilíbrio entre a oferta de vagas e a demanda de alunos já influenciam o setor, e algumas organizações já estão reduzindo o valor das mensalidades para não ter sua situação financeira comprometida (Folha UOL, 2008). Adicionalmente, algumas IES’s já manifestaram sua intenção de adquirir outras organizações por conhecerem as deficiências na sua forma de gestão e a situação financeira em que se encontram (Gazeta Mercantil, 2008). Como a maioria das organizações, as IES’s (públicas ou particulares) estão inseridas em ambientes cada vez mais competitivos, exigindo de seus gestores o conhecimento e a utilização de técnicas que permitam administrá-las e conduzilas estrategicamente, ou seja, eles precisam estar atentos e qualificados para poder, de forma contínua, manter a organização como um conjunto apropriadamente integrado ao seu ambiente (CERTO et al, 2005). Para tanto, um dos requisitos é que a organização tenha líderes estratégicos, que, segundo Hitt et al (2008), são pessoas situadas em vários setores da empresa que utilizam o processo de administração estratégica para ajudá-las a 50

viabilizar sua visão e missão; tais pessoas não precisam ser necessariamente os diretores ou o CEO’s; são aquelas que ajudam a selecionar a estratégia e depois estipulam ações a serem tomadas para implantálas com êxito. Conforme Meyer Jr (2006), “aprender a pensar e a agir estrategicamente constitui-se num dos maiores desafios para gestores de universidades privadas, para vencerem os obstáculos que desafiam essas instituições”. Somente dessa forma é que, talvez, isso se traduza fundamentalmente na sua sobrevivência. O objeto desse estudo foi uma IES privada e com fins lucrativos, com seis campi localizados na região de Campinas e um localizado fora da região de Campinas. Dado que esta IES adquiriu, no final de 2007, outra IES, o presente trabalho buscou responder as seguintes questões: • As motivações e os fatores que levaram a IES decidir pela aquisição de outra estavam baseadas em uma estratégia de negocio previamente definida, caracterizada como estratégia deliberada, ou derivaram de uma estratégia emergente? • A aquisição trouxe alterações na estrutura organizacional da IES e na sua dinâmica intena? • Existia a prática da análise e do monitoramento ambiental organizacional nas IES’s compradora e adquirida antes da aquisição

2.

REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

O ambiente de uma organização é caracterizado por todas as condições e influências tecnológicas, econômicas, físicas, sociais e políticas que afetam sua vida e desenvolvimento. As mudanças no ambiente empresarial precisam de monitoramento contínuo por parte da companhia para que a definição de seus negócios não se torne distinta ou obsoleta. A prática da administração estratégia requer que o gestor observe etapas essenciais e imprescindíveis na sua forma de trabalho, Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Sérgio F. Crispim, Hamilton Pozo Edson H. Takata, Flávio Corrêa Rangel

dentre as quais o monitoramento do ambiente organizacional para identificar as oportunidades e os riscos atuais e futuros que podem vir a influenciar a capacidade da empresa de atingir suas metas (CERTO; PETER, 1993). A formulação da estratégia é feita com o futuro em perspectiva; os executivos que participam do processo de planejamento estratégico devem estar cientes daqueles aspectos do ambiente que são especialmente suscetíveis ao tipo de mudança que vai afetar o futuro da empresa (ANDREWS,1980 apud MINTZBERG, 2006). Portanto, a estratégica é um conjunto integrado e coordenado de compromissos e ações definido para explorar competências essenciais e obter vantagem competitiva (HITT, 2008), e deve representar uma resposta

da Organização às necessidades de adaptação ao ambiente externo e às mudanças críticas que ocorrem nesse ambiente, permitindo-se assim concorrer com outras empresas que estão tentando-se adaptar (RUMELT,1980 apud MINTZBERG, 2006). A estratégia de uma organização pode ser estabelecida por meio da análise de quatro atividades: a) análise dos aspectos internos; b) análise do ambiente organizacional; c) comparação da orientação com o campo de atuação; e d) estabelecimento da estratégia vigente. A análise, o monitoramento e a interpretação do ambiente organizacional, que é aquilo que influencia o desempenho de uma organização, podem ser realizadas por meio de quatro segmentações, conforme proposto por Almeida (2007) no Quadro 1

Quadro 1 – Segmentação Ambiental

Segmento Ambiental

Variáveis Ambientais

Características

Método de Análise

Macroambiente Clima

São as variáveis decorrentes do poder político: inflação, crescimento do PIB, legislação.

É difícil ser previsto a curto prazo, mas é possível projetar uma tendência longo prazo.

Deve-se ouvir a opinião de experts e apostar em uma tendência política a longo prazo. Na análise, tem-se que traduzir fatos políticos como eleição e aprovação de leis.

Macroambiente Solo

São variáveis do futuro da população e suas características: crescimento por região, por faixa de renda, por sexo.

As previsões são precisas e disponíveis em organismos como o IBGE.

Deve-se usar estudos estatísticos, que normalmente estão disponíveis.

Ambiente Operacional

São variáveis decorrentes das operações: concorrentes, fornecedores, clientes diretos.

As previsões procuram identificar como serão as relações operacionais no futuro, levando-se em conta a evolução tecnológica.

O método de análise é o estudo de cenários que se utiliza das tendências atuais pra identificar o relacionamento operacional futuro

Ambiente Interno

São os valores e as aspirações das pessoas relevantes. No caso de empresas, pode-se segmentar entre proprietários e funcionários.

Os valores e aspirações das pessoas são difíceis de serem mudados. As empresas ou suas áreas normalmente agrupam pessoas com valores semelhantes;

Para identificação dos valores de empresas ou de suas áreas, é utilizado o sistema de análise da cultura organizacional.

Fonte: Almeida (2007, p.23)

Certo & Peter (2004) sugerem um modelo - Quadro 2 – mas que necessariamente para análise ambiental com algumas reforça a necessidade da realização da análise variações em relação ao de Almeida (2007) monitoramento do ambiente organizacional. Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

51


A importância da gestão estratégica como fator de sobrevivência de uma ies – instituição de ensino superior

Quadro 2 – Ambientes da Organização

Segmento Ambiental

Componentes

Características

* Econômico * Social Ambiente Geral

* Político

Nível externo às organizações, e que não se têm controle sobre os componentes.

* Legal * Tecnológico * Cliente * Concorrência Ambiente Operacional

* Mão de obra * Fornecedor

Nível externo às organizações, composto de setores que normalmente tem implicações específicas e relativamente mais imediatas com a empresa.

* Internacional (influência) * Aspectos organizacionais * Aspectos de marketing Ambiente Interno

* Aspectos financeiros * Aspectos de pessoal

Tem implicação imediata e específica em sua administração, e cujos componentes estão mais facilmente perceptíveis e controláveis.

* Aspectos de produção Fonte: Adaptado de Certo & Peter (2007)

Além de relacionar e identificar as oportunidades e as ameaças do ambiente da Organização, também é preciso identificar os recursos e as competências diferenciadas disponíveis nela. Na visão de Andrews (1980 apud Mintzberg, 2006), a estratégia corporativa é um processo organizacional inseparável da estrutura, do comportamento e da cultura da empresa onde ocorre, e que envolve elementos como sistemas de informação, estrutura organizacional, remunerações, desenvolvimento gerencial e liderança pessoal. Barney (1995) corrobora com essa opinião, afirmando que além da análise de oportunidades e ameaças ambientais, uma empresa somente poderá criar vantagem competitiva sustentada se seus executivos olharem para dentro dela, buscando recursos valiosos, raros, cuja imitação seja cara, para depois explorar esses recursos em toda a organização. Hamel e Prahalad (1995) possuem uma visão semelhante, chamando a atenção para as competências essenciais, que são aquelas capacidades que se desenvolvem 52

profundamente dentro da organização ao longo de sua história, e que explicam suas vantagens comparativas e competitivas. Esta abordagem insere-se na visão da empresa baseada em recursos, ou resource based view. Whittington (2002) entende que conseguir as estruturas organizacionais certas para determinadas estratégias é fundamental para o sucesso da sua implementação. A mesma linha de raciocínio adota Hitt (2008) que, além disso, considera que a análise e o conhecimento do ambiente interno de uma empresa podem permitir que ela desenvolva competências essenciais que atendam ou superem aos padrões exigentes da concorrência, e assim, proporcionará a criação de valor para seus clientes. Sendo assim, o que a empresa planeja em relação à criação de valor implica numa escolha estratégica no nível de seus negócios e na sua estrutura organizacional. Essa relação, quando mal combinada, acarreta numa diminuição do desempenho da empresa. Entretanto, é difícil desenvolver uma Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Sérgio F. Crispim, Hamilton Pozo Edson H. Takata, Flávio Corrêa Rangel

estrutura organizacional que apóie efetivamente a estratégia da empresa, especialmente pela incerteza sobre a rápida mudança dos ambientes competitivos. A princípio, esta estrutura deve proporcionar estabilidade para implementar com sucesso suas estratégias, gerenciar de forma consistente e previsível suas rotinas de trabalho e manter suas vantagens competitivas normais. Simultaneamente, essas estruturas também devem propiciar flexibilidade para explorar e desenvolver vantagens competitivas que serão necessárias para suas estratégias futuras (HITT, 2008). Segundo observa Mintzberg (2006), embora estratégia seja uma palavra habitualmente associada ao futuro, é preciso entender o passado (que serve de modelo e referência) para poder praticá-la no futuro; falta de estabilidade na estrutura organizacional significa falta de estratégia, e o grande desafio do estrategista é saber conciliar forças para a estabilidade e para as mudanças. Quinn e Voyer (1994) retratam a formação de estratégia como um processo de aprendizado gerenciado e interativo no qual o principal estrategista desenvolve gradualmente a estratégia em sua mente e orquestra a aceitação da organização. Eles afirmam que para alcançar o sucesso na implementação de estratégias, estas devem ser feitas incrementalmente e não bruscamente, e principalmente amparadas sob uma lógica poderosa não mostrada durante a fase do planejamento. Dentre essa lógica, são relacionadas algumas orientações: • Utilizar fontes internas e externas informais para formulação de uma posição ou opinião que sejam determinantes na definição da estratégia; • Construir consciência organizacional, formando opiniões positivas ou de apoio junto aos participantes do processo, e evitando aquelas de oposição; • Construir credibilidade / símbolos de mudança que possam ajudar os gerentes na obtenção do comprometimento das pessoas envolvidas; • Legitimar novos pontos de vista, mesmo Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

que seja gasto um tempo maior do que previsto; • Implementar mudanças táticas e soluções parciais; • Ampliar e consolidar uma posição política necessária ao desenvolvimento das ações estratégicas; • Manter as pessoas dinâmicas e mudar o consenso quando necessário; • Fazer balões de ensaio e esperar sua reação de forma sistemática e programada; • Criar bolsões de comprometimento e formalizá-lo. Uma das estratégias importantes que podem ser adotadas por uma organização para aumentar sua competitividade são as aquisições. Hitt (2008) considera que a estratégia da aquisição pode ser adotada quando: • Vislumbra-se uma ameaça da concorrência ou incertezas do ambiente; • Deseja-se aumentar seu poder de mercado; • Deseja-se aproveitar uma nova oportunidade; • Deseja-se ter facilitada sua entrada num mercado novo onde existam barreiras; • Deseja-se pulverizar o risco devido ao ambiente incerto; • Deseja-se mudar seu principal negócio, para diferentes mercados, à medida que a volatilidade traz mudanças indesejáveis a seus principais mercados; • Deseja-se permitir o exercício de uma competência essencial para obter vantagem competitiva no mercado principal da empresa compradora. No entanto, as aquisições apresentam riscos, dentre as quais está a dificuldade de integração entre as empresas face exigir a combinação de culturas corporativas distintas, união de sistemas financeiros e de controles diferentes, desenvolvimento de relações de trabalho eficazes e resolução do problema quanto à situação dos executivos da empresa recém-adquirida. Apesar da dificuldade e complexidade, a importância de uma integração bem-sucedida não deve ser 53


A importância da gestão estratégica como fator de sobrevivência de uma ies – instituição de ensino superior

subestimada, pois é, provavelmente, o único valor para o acionista. O Quadro 3 mostra os determinante mais importante da criação de fatores que podem auxiliar a integração: Quadro 3 – Atributos de Aquisições Bem-sucedidas

Atributos

Resultados

As empresas adquiridas possuem ativos ou recursos que complementam o negócio principal da empresa compradora.

Alta probabilidade de sinergia e vantagem competitiva ao se manterem os pontos fortes.

A aquisição é amigável.

Integração mais rápida e eficaz e, provavelmente, ágios mais baixos.

A empresa compradora conduz due diligence eficaz para escolher as empresas-alvo e avalia a saúde da empresa-alvo (financeira, cultural e recursos humanos).

Empresas com as complementaridades mais fortes são adquiridas e o pagamento excessivo é evitado.

A empresa compradora tem folga financeira (caixa ou uma posição de dívida favorável).

Financiamento (dívida ou capital) é mais fácil de ser obtido.

A empresa compradora tem ênfase constante e consiste em P&D e Inovação.

Mantém vantagem competitiva de longo prazo nos mercados.

A empresa compradora administra bem as mudanças e é flexível e adaptável (capacidades que os executivos das empresas compradora e adquirida tem em gerenciar mudanças e se adaptar à aquisição).

Integração mais rápida e eficaz facilita a obtenção da sinergia.

Fonte: Adaptado Hitt (2008)

3.

METODOLOGIA

Esta pesquisa exploratória adotou como delineamento um estudo de caso único realizado com base em duas entrevistas: A 1ª entrevista foi feita com os Diretores Geral e Acadêmico da IES compradora, onde foram levantados os procedimentos da análise e monitoramento do ambiente organizacional adotados antes e depois da aquisição, utilizando o modelo de Almeida (2007) e um questionário semi-estruturado. A 2ª entrevista foi feita de forma aberta junto com o representante do mantenedor (e que doravante será chamado simplesmente de mantenedor para facilitar o entendimento desse texto) visando identificar as motivações da aquisição, as modificações realizadas na estrutura organizacional após a aquisição e a verificação quanto

à prática da análise e monitoramento do ambiente organizacional feita pela IES. As duas entrevistas foram feitas em locais e datas diferentes, o que permitiu confrontar e questionar algumas declarações contraditórias ou incompletas. Não foi feita a tentativa de realizar entrevista com os ex-proprietários da IES adquirida.

4.

ANÁLISE DOS RESULTADOS

4.1. PERFIL DAS IES’S COMPRADORA E ADQUIRIDA ANTES DA AQUISIÇÃO Antes da finalização do processo de aquisição, as IES’s compradora e adquirida possuíam as características descritas no Quadro 4, conforme descrito a seguir:

Quadro 4 – Características Básicas das IES’s Compradora e Adquirida Antes da Aquisição

Tempo de funcionamento Qtde.de Campi

Localização dos Campis

54

IES Compradora

IES Adquirida

10 anos

11 anos

04

03 Duas unidades estão localizadas na região de Campinas, porém em municípios diferentes onde se encontram as Unidades da IES compradora; 01 unidade está localizada longe da região de Campinas.

As quatro unidades estão localizadas na região de Campinas.

Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Sérgio F. Crispim, Hamilton Pozo Edson H. Takata, Flávio Corrêa Rangel

09 cursos de graduação

15 cursos de graduação Cursos oferecidos

03 cursos superiores de curta duração 35 cursos de pós-graduação

Qtde. de alunos Qtde. de docentes

Aproximadamente 6.500 Aproximadamente 700.

04 cursos superiores de curta duração 05 cursos de pós-graduação Cursos de ensino à distância Aproximadamente 1.500 Aproximadamente 150.

Fonte: Elaborado pelos autores

4.2. CARACTERÍSTICAS DA IES COMPRADORA ANTES DA AQUISIÇÃO A) ESTRUTURA ORGANIZACIONAL E FUNCIONAMENTO DA ORGANIZAÇÃO

A representação gráfica da estrutura organizacional da IES compradora antes da finalização do processo de aquisição está descrita na Fig. 1, conforme mostrado a seguir:

Fig. 1: Representação gráfica da estrutura organizacional da IES compradora antes da aquisição

Fonte: Elaborado pelos autores

Desde sua fundação até o ano de 2003, a estrutura organizacional praticamente não sofreu alterações, não obstante o crescimento da quantidade de alunos da IES (de aproximadamente 100 alunos matriculados no 1º ano para 3.000 alunos matriculados em 2003). As principais atribuições e responsabilidades do Diretor Geral eram direcionadas ao desenvolvimento e contato com entidades externas à organização; ao Diretor Acadêmico cabia a função de desenvolver as relações entre a Organização e seu público interno (docentes e discentes), zelando principalmente pela qualidade do ensino da IES e; ao Diretor Administrativofinanceiro cabia a execução de atividades ligadas ao suporte e back-office da Organização. As Unidades eram compostas basicamente pelos coordenadores de curso e Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

por assistentes administrativos que cuidavam da parte administrativa, estando os diretores à disposição de todas as Unidades caso houvesse necessidade. O relacionamento entre os Diretores e a estrutura era muito informal, com as decisões sendo tomadas de forma muito rápida e direta. Ocasionalmente ocorriam conflitos na execução de atividades decorrente de decisões tomadas por dois diretores, porém isso era sanado muito rapidamente dado o tamanho da estrutura vigente na época. Em 2003, contando com três Unidades em funcionamento, ocorre uma mudança importante na IES. Com base em dados obtidos do ambiente externo à Organização e principalmente de especialistas quanto à forte perspectiva de concentração do setor face à previsão do aumento da oferta de IES 55


A importância da gestão estratégica como fator de sobrevivência de uma ies – instituição de ensino superior

em relação à quantidade de concluintes do 2º grau, seus Diretores concluem que seria preciso juntar-se a um mantenedor para apoiá-los na intenção de expansão de sua Organização. Obtido esse apoio, no ano de 2004 é implantada sua 4ª Unidade em uma cidade diferente das outras 3 Unidades (as quais estavam instaladas em uma mesma cidade). Ao final do ano de 2005, percebendo mudanças rápidas no ambiente e principalmente nas visíveis diferenças de características dos alunos e de gestão da 4ª Unidade em relação às demais (as atividades internas estavam sendo decididas e executadas de forma descompassada e demorada), a Diretoria decidiu institucionalizar o processo de planejamento estratégico. Até então, essa atividade era feita informalmente, sem metodologia, e envolvia percepções e informações a respeito do ambiente interno e externo da Organização, ganhando aspectos formais somente quando os assuntos assumiam contornos graves, urgentes ou “inevitáveis” (conforme a expressão de um dos entrevistados). A IES adquirida tem uma atuação de

destaque junto à comunidade local, pois ela desenvolve vários projetos sociais. Esse cunho social foi adquirido de forma despretensiosa, pois a intenção inicial foi a de atender as expectativas dos alunos, visto que a Organização enfoca que os cursos oferecidos são práticos e capazes de preparar pessoas para enfrentar o mercado de trabalho. Como exemplo, foi montado um time de futebol com crianças carentes, para a prática dos cursos de educação física. Além de atender crianças carentes, a IES concede uma bolsa de estudo para dois integrantes do time de futebol. Apesar das despesas incorridas para manutenção desses projetos, seus gestores acreditam que o retorno para a IES é muito positivo sob vários aspectos, não obstante não ser possível mensurar esse retorno de forma financeira. A) ANÁLISE E MONITORAMENTO AMBIENTAL ORGANIZACIONAL Utilizando o modelo de Almeida (2007), as variáveis analisadas pela IES para análise e monitoramento do ambiente organizacional estão descritas no Quadro 5, a seguir mostrado:

Quadro 5 – Análise das Variáveis Ambientais

Segmento Ambiental

Variáveis Ambientais Regulamentações do governo (MEC, Ministério do Trabalho, Secretaria Estadual e Municipal de Educação) e de órgãos relacionados aos cursos oferecidos; Contatos com especialistas do setor, do MEC, delegados de ensino e elementos dos poderes executivo e legislativo das cidades onde as Unidades estão instaladas;

Macroambiente Clima

Políticas monetária e fiscal; Evolução econômica setorial pertinente à região de atuação; Projetos sociais e educacionais dos municípios onde estão localizadas as Unidades. Quantidade de concluintes do 2º grau da região; Crescimento populacional nas cidades da região;

Macroambiente Solo

Renda percapta da região; Perfil das empresas instaladas na região; Atividades econômicas da região.

56

Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Sérgio F. Crispim, Hamilton Pozo Edson H. Takata, Flávio Corrêa Rangel

Condição das instalações prediais; Qualidade dos processos operacionais e dos serviços de utilidade; Qualidade dos materiais utilizados nos cursos; Qualidade de ensino: docentes, grades curriculares Ambiente Operacional

Análise de possibilidade de desenvolvimento de parcerias (FGV, University of Zurich e Texas A&M University)); Análise de concorrência (oportunidades e ameaças); Acordos sindicais (como forma de gerenciamento da Folha de Pagamento); Satisfação e necessidade dos alunos (qualidade de ensino, relação custo / benefício, instalações e pragmatismo);

Ambiente Interno

Desenvolvimento de um projeto que está levantando as aspirações dos funcionários.

Fonte: Elaborado pelos autores a partir de adaptação de Almeida (2007)

A) O PROCEDIMENTO DO PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO NA IES

“insights” a respeito do planejamento a fim de eliminar esse sentimento.

O procedimento de planejamento estratégico foi institucionalizado na IES há dois anos, e a cada seis meses é realizado um evento para tratar sobre esses assuntos. Esse evento é dividido em duas etapas: na 1ª etapa participam os Diretores Geral, Acadêmico e Administrativo-financeiro, e o mantenedor. Os assuntos giram em torno da definição de projetos a serem desenvolvidos na Organização bem como de temas considerados de “estratégia”. Na 2ª etapa participam, além dos Diretores, as pessoas do nível tático (coordenadores dos cursos e as chefias dos setores administrativofinanceiros), com o objetivo de comunicar os projetos definidos na 1ª etapa (e pertinentes ao nível tático e operacional) e ouvir as sugestões dos participantes. Nessa etapa eram gerados cronogramas com a definição dos responsáveis pela execução dos projetos assim como os respectivos prazos para sua conclusão, onde bimestralmente eram realizadas reuniões para acompanhamento e avaliação dos mesmos. Um aspecto que chamou a atenção é a ausência das pessoas do nível operacional nessas reuniões. A justificativa disso é que a Diretoria tem a impressão que as pessoas se sentem “assustadas” com esse assunto, e que gradativamente estão sendo implementados

B) PERFIL DOS GESTORES DA IES COMPRADORA (INFORMAÇÕES FORNECIDAS PELO MANTENEDOR)

Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

Diretor Geral: Formado em medicina veterinária, com dedicação integral na IES, sem experiência empresarial anterior. Tem como principal característica pessoal a facilidade e a desenvoltura no contato com pessoas e entidades pertencentes ao ambiente externo à organização Diretor Acadêmico: Formado em Administração de Empresas, mestre em educação, atua há 24 anos na área acadêmica, trabalhou durante 15 anos em empresas multinacionais e nacionais de grande expressão, com foco e ênfase à assuntos relativos à sistemas de informação, estruturas organizacionais, métodos e processos e planejamento estratégico. Tem como principal característica pessoal a habilidade na condução e coordenação de projetos e administração de conflitos. Diretor Administrativo-Financeiro: Formado em tecnologia de informação, mestre em tecnologia da informação, não possui experiência empresarial anterior, sua atuação é discreta e intensa, bastante focado nas suas atividades e busca de forma incansável o atingimento de suas metas. 57


A importância da gestão estratégica como fator de sobrevivência de uma ies – instituição de ensino superior

4.3. CARACTERÍSTICAS DA IES ADQUIRIDA ANTES DA AQUISIÇÃO a) Estrutura Funcionamento

Organizacional

A representação gráfica da estrutura organizacional da IES adquirida antes da finalização do processo de aquisição está e descrita na Fig. 2, conforme mostrado a seguir:

Fig. 2: Representação Gráfica da Estrutura Organizacional da IES Adquirida Antes da Aquisição

Fonte: Elaborado pelos autores

O início das atividades da IES se deu numa cidade do interior do estado de São Paulo, na região de Campinas, e foi favorecido pela atratividade do setor para abertura desse tipo de estabelecimento. Outro fator que favoreceu a abertura da IES foi que o exproprietário, dono de uma escola de 2º grau de reconhecida qualidade de ensino, vislumbrou a oportunidade de direcionar os alunos concluintes do 2º grau como ingressante da Faculdade. Os principais argumentos utilizados para atrair esses alunos estavam baseados no tradicionalismo, ou seja: a) a Faculdade funcionaria sob os mesmos critérios e padrões de qualidade do colégio; b) o desejo de manter o relacionamento obtido entre os pais dos alunos com a escola e; c) apoio dos pais dos alunos e dos alunos à 1ª IES inaugurada na cidade. Praticamente dois anos após a abertura da 1ª Unidade da IES, é inaugurada a 2ª Unidade em uma cidade longe da região de Campinas e a 3ª Unidade localizada na região de Campinas. Apesar das três Unidades utilizarem o mesmo nome, cada uma praticava sua forma de gestão, e possuíam sistemas de controle, procedimentos e grades disciplinares diferentes (não obstante o curso ser o mesmo) entre si. Essa situação foi formatada quando o ex-proprietário permitiu que um parente seu gerisse as 58

Unidades localizadas na região de Campinas de forma totalmente independente em relação à Unidade localizada longe da região de Campinas, inclusive no que refere a participação de lucros. Durante o período em que estiverem à frente da Organização, os gestores dessas Unidades não se preocuparam em investir na IES. As estruturas organizacionais, os sistemas de controle, gestão e acompanhamento eram muito simples, a tal ponto dos pagamentos das mensalidades serem controlados de forma praticamente manual. Com isso, os desembolsos estavam restritos ao pagamento dos professores, ao funcionamento operacional da IES e a eventuais investimentos de extrema necessidade. À medida que transcorria o tempo, IES’s concorrentes foram se instalando próximas ao local onde estavam funcionando, porém isso não preocupava os gestores dessas Unidades principalmente o gestor das Unidades localizadas na região de Campinas, que se mantinha firme e convicto quanto à força da sua tradição. Porém, quando esse gestor se deu conta do desequilíbrio financeiro, foram adotadas algumas atitudes de contenção de despesas, dentre as quais o de não entregar os diplomas para os concluintes dos cursos. Em represália ao questionamento do poder executivo municipal sobre esse Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Sérgio F. Crispim, Hamilton Pozo Edson H. Takata, Flávio Corrêa Rangel

fato, a IES corta as bolsas de estudos que eram dadas aos munícipes em função de projetos sociais desenvolvidos pela Prefeitura. Esse fato arranhou a imagem e a relação que a IES mantinha com a comunidade (e que pode ter sido determinante na redução da quantidade de alunos inscritos), culminando com o comprometimento de sua condição financeira. Com a condição creditícia comprometida perante o mercado, a Unidade localizada longe da região de Campinas é automaticamente envolvida nessas questões, pois elas estavam

vinculadas a um único CNPJ. Porém, independente disso, essa Unidade também já se ressentia dos sinais do mercado, com a queda nas receitas e aumento de seus custos. A) ANÁLISE E MONITORAMENTO AMBIENTAL ORGANIZACIONAL O processo de análise e monitoramento do ambiente organizacional na IES adquirida praticamente inexistia, conforme observado no Quadro 6 a seguir:

Quadro 6 – Análise Variáveis Ambientais

Segmento Ambiental

Variáveis Ambientais

Macroambiente Clima

Regulamentações do governo (MEC, Ministério do Trabalho, Secretaria Estadual e Municipal de Educação) e de órgãos relacionados aos cursos oferecidos (para permitir se adaptar mais rapidamente às eventuais novos regulamentos);

Macroambiente Solo

Não desenvolviam qualquer atividade; acreditavam na fidelidade dos concluintes do 2º grau do colégio.

Ambiente Operacional

Era realizada apenas sobre questões mínimas e necessárias ao andamento normal das rotinas da instituição.

Ambiente Interno Fonte: Elaborado pelos autores a partir de adaptação de Almeida (2007)

B) PERFIL DOS GESTORES DA IES COMPRADORA (INFORMAÇÕES FORNECIDAS PELO MANTENEDOR) UNIDADE LOCALIZADA LONGE DA REGIÃO DE CAMPINAS • Ex-Diretor Geral: Formado em Direto, era um servidor público aposentado cuja atividade, enquanto na ativa, não tinha vínculo com a área educacional. • Ex-Diretor Acadêmico: Formado em Enfermagem, ajudava no atendimento às exigências legais. • Ex-Diretor Administrativo-Financeiro: Formado em Direto, sem exercício da profissão. UNIDADES LOCALIZADAS NA REGIÃO DE CAMPINAS • Ex-Diretor Geral: Desconhecida. Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

4.4. O PROCESSO DE AQUISIÇÃO A) MOTIVAÇÕES DA AQUISIÇÃO DA IES As principais motivações dos compradores em adquirir a IES foram: a. Alinhamento da oportunidade surgida com a estratégia corporativa de aquisição definida pela IES e o mantenedor; b. Necessidade de fortalecimento de sua posição e imagem no setor educacional da região, como uma das principais IES em qualidade de ensino e preparadora de bons profissionais para enfrentar o mercado trabalho; c. Receio da ação dos concorrentes, evitando que esses pudessem entrar na região para dividir a preferência e a opinião de futuros entrantes da IES; d. Proposta financeira de compra atraente e com perspectiva de retorno a médio prazo; e. As características das Unidades 59


A importância da gestão estratégica como fator de sobrevivência de uma ies – instituição de ensino superior

adquiridas e localizadas na região de Campinas são similares às suas Unidades (segundo um dos entrevistados, “o nosso jeito de trabalhar dá certo com o jeito da faculdade”), o que a permitirá adotar estratégias de atuação semelhantes. B) PROVIDÊNCIAS TOMADAS SOBRE A ESTRUTURA ORGANIZACIONAL Com a aquisição, as mudanças ocorridas visaram tornar a estrutura organizacional (vide Fig. 3) mais forte e ágil para a prática de procedimentos gerenciais e operacionais, dotando as Unidades de autonomia dentro de seu nível de alçada para obter a rentabilidade necessária à sua própria sobrevivência. Para

tanto, foram feitas as seguintes alterações: - O mantenedor, com o mesmo poder do Diretor Geral, passa a fazer parte integrante da estrutura organizacional da IES compradora, participando na definição e implantação das estratégias e normas. Essa providência pretende dar uma maior sustentação técnica e política às decisões estratégicas a serem tomadas na Organização; - As diretorias Acadêmica e Administrativofinanceira passam a ser órgãos corporativos, responsáveis pelas estratégias de todas as Unidades da IES. São criados os Departamentos Acadêmico e Administrativo-financeiro corporativo para ajudar as respectivas Diretorias na condução tática e operacional das Unidades, relativos aos seus assuntos;

Fig. 3: Representação gráfica da estrutura organizacional da IES Após a aquisição

Fonte: Elaborado pelos autores

- As Unidades passam a ter o mesmo formato de sua estrutura organizacional. Criam-se as Diretorias das Unidades sendo que uma das suas principais atribuições é coletar dados do ambiente organizacional, com o objetivo de colaborar com o planejamento estratégico da IES. Criam-se também os Departamentos Acadêmico e Administrativofinanceiro das Unidades que além de 60

responderem funcionalmente ao Diretor da Unidade, são orientadas tecnicamente pelas diretrizes estabelecidas pelos respectivos departamentos corporativos. - Todas as Unidades passaram a ser consideradas Centro de Custos e ter “vida própria” (palavras do mantenedor), com a necessidade de trazer resultados com base em seu desempenho, devendo ser ágil e estar Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Sérgio F. Crispim, Hamilton Pozo Edson H. Takata, Flávio Corrêa Rangel

em condição de tomar decisões dentro do seu decisões estratégicas e táticas em situações nível de alçada e atribuição. de tensão e ansiedade; 4.5. PROBLEMAS DA AQUISIÇÃO Os principais problemas enfrentados são: a. A Unidade localizada longe da região de Campinas está sendo conduzida de forma diferente das demais por possuir características mercadológicas diferentes das demais Unidades. A distância que a separa das demais Unidades e do órgão diretivo corporativo é um fator restritivo à uma atuação mais intensa; b. O funcionamento das Unidades como Centros de Custo independente ainda requer esforços de montagem de infra-estrutura operacional e implantação de conceitos e instrumentos corporativos de controle. Além do mais, o grande desafio para isso está em encontrar profissionais experientes e com conhecimentos técnicos adequados ao desenvolvimento dessa atividade. Os Diretores das Unidades são profissionais que vieram do corpo docente da IES, porém existe a ciência de que ainda é necessário tempo para conhecê-los de forma mais profunda; c. A montagem dessa infra-estrutura operacional caminha a uma velocidade aquém da desejada dada a necessidade de inúmeras decisões corporativas que precisam ser tomadas. Além disso, a própria estrutura organizacional (principalmente das Unidades adquiridas) não dispunha de recursos humanos em condições de conduzir as atividades operacionais com a desenvoltura desejada, o que está sendo conseguido gradualmente com o aperfeiçoamento dessa mão de obra; d. Os Diretores Corporativos estão sentindo a necessidade de dispor de uma estrutura organizacional que esteja envolvida com os problemas, situações e fatos corporativos (“respirando o ar de outras Unidades”), e não somente com os da própria Unidade; e. A exigência de se gerar resultados financeiros a curto prazo é forte, o que tem produzido um volume de trabalho que por vezes leva aos elementos envolvidos nas Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

4.6. O PROCEDIMENTO DO PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO DA IES APÓS A AQUISIÇÃO Após a aquisição, a IES compradora continuou realizando a análise e o monitoramento ambiental, cujo procedimento foi estendido para a IES adquirida e utilizando as mesmas variáveis. A diferença ocorrida foi o aumento do volume de dados analisados, acarretando numa maior quantidade de alternativas surgidas sobre tais variáveis, o que fez com que a tomada de decisão ganhasse maior complexidade e dimensão. Outra alteração observada após a aquisição foi que a 1ª etapa do processo de planejamento estratégico conta com a participação adicional do Diretor da Unidade, e na 2ª etapa conta com a participação adicional dos responsáveis pelos Departamentos Acadêmico e Administrativo-financeiro Corporativo e das Unidades.

5.

CONCLUSÃO

A busca pelo apoio de um mantenedor mostrou que, como resultado de um processo de análise e monitoramento do ambiente organizacional, a IES agiu de forma estratégica quando percebeu que alguns fatores ambientais poderiam comprometer e influenciar sua capacidade de atingir suas metas, o que veio ao encontro às afirmações de. A utilização do modelo de Almeida (2007) para análise do ambiente organizacional ressalta não apenas a diferença entre a quantidade de variáveis analisadas pelas IES’s compradora e adquirida, mas ressalta a condição dos gestores da IES compradora que, mesmo quando não dispunham de uma forma sistemática e organizada de elaborar um planejamento estratégico, tiveram a capacidade de perceber nas informações oriundas do ambiente organizacional o risco para sua empresa e transformá-la numa ação estratégica. Provavelmente autores como Andrews, Barney, Prahalad e Hamel 61


A importância da gestão estratégica como fator de sobrevivência de uma ies – instituição de ensino superior

(apud Mintzberg, 2006) pretenderam se referir a esses tipos de recursos internos da organização como sendo os principais fatores para criação de competências diferenciadas ou essenciais. Entretanto, essa competência diferenciada ou competitiva deve-se estender a todos os níveis hierárquicos de uma organização. A falta de participação do nível operacional da IES no planejamento estratégico é prejudicial à criação de um ambiente integrado e homogêneo, e que propicie um processo de aprendizado, o que talvez justifique as palavras de um dos entrevistados que alega que a organização “não respira o ar de outras Unidades”. Porém, os gestores da IES pretendem envolver essas pessoas gradualmente, conscientizando-as a respeito da importância do assunto, método este que tem amparo à teoria do incrementalismo lógico sugerida por Quinn e Voyer (1994 apud Mintzberg, 2006). Apesar da IES compradora ter instituído o planejamento estratégico somente há dois anos, não se pode afirmar que ela estaria mais preparada para enfrentar os problemas caso isso esse processo tivesse ocorrido há mais tempo, entretanto, é possível fazer ilações no sentido de que a ampliação desse processo para o nível operacional a auxiliará a na prática da Administração Estratégica. Os motivos alegados pela IES para aquisição das Unidades localizadas na região de Campinas seguiram os preceitos citados por Hitt (2008), onde ela buscou se proteger da ação da concorrência, aumentar seu poder, aproveitar uma oportunidade e desenvolver uma competência essencial. Entretanto, no que se refere à Unidade localizada longe da região de Campinas, talvez o único motivo que possa ser alegado para sua aquisição seja quanto ao aproveitamento de oportunidade financeira, o que não necessariamente possa se constituir numa diferencial competitivo no futuro. Não obstante a estrutura organizacional ter sido redefinida com o intuito de alinhála às estratégias da Organização, o principal problema enfrentado tem sido a necessidade de produzir resultados financeiros a 62

curto prazo utilizando uma mão de obra inexperiente, o que implica em intuir que os resultados ocorrerão, provavelmente, em prazos incompatíveis aos desejados. Essa situação conflituosa em nada se alinha à necessidade de ter uma estrutura estável e flexível, que é segundo Hitt (2008), a adequada para proporcionar a implantação de uma estratégia. Portanto, segundo Mintzberg (2006), o grande desafio do estrategista é saber conciliar forças para a estabilidade e para as mudanças. Os resultados deste estudo de caso demonstram que o conhecimento e a aplicação de conceitos de estratégias e planejamento podem ser muito importantes para melhorar a competitividade das IESs, o que é corroborado inclusive por Meyer Jr. (2004), aumentando a probabilidade de sobreviverem em um período no qual os recursos são escassos e a competição é intensa.

6.

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, M.I.R. de. Manual de planejamento estratégico: desenvolvimento de um plano estratégico com a utilização de planilhas Excel. São Paulo: Atlas, 2007. ANDREWS, K.R. Directors responsibility for corporate strategy. Harvard Business Review, v.58,6, november-december 1980 apud MINTZBERG, H. et al. O processo da estratégia: conceitos, contextos e casos selecionados. Porto Alegre: Bookman, 2006. BARNEY, J.B. Looking inside for competitive advantage. The Academy of management Executive, v9, 4, nov 1995. BRASIL. Ministério da Educação. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Anísio Teixeira. Sinopses estatísticas. Disponível em http://www.inep. gov.br/basica/censo/Escolar/Sinopse/sinopse.asp. Acesso em 19/06/2008. CERTO, Samuel C. et. al. Administração estratégica: planejamento e implantação da estratégia. 2ª Edição, São Paulo: Pearson Education do Brasil, 2005. CERTO, Samuel; PETER, J.Paul. Administração Estratégica. São Paulo: Makron Books, 1993. Em 2 ANOS, número de alunos em universidades cresceu 34%. Disponível em <http://www1.folha. uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u367420.shtml>. Acesso em 19/06/2008. GRUPO admite interesse em comprar universidades. Disponível em http://www. gazetamercantil.com.br/integraNoticia. Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Sérgio F. Crispim, Hamilton Pozo Edson H. Takata, Flávio Corrêa Rangel

aspx?Param=537%2C0%2C+%2C1 78 1682%2CUIOU>. Acesso em 19/06/2008. HAMEL, G.; PRAHALAD, C.K. Competindo pelo Futuro. 12ª ed. Rio de Janeiro: Campus, 1995. HITT, Michael A.; IRELAND, R. Duane; HOSKISSON, Robert E. Administração Estratégica: competitividade e globalização. 2ª Edição, São Paulo: Editora Thomsom: 2008. MEYER JR., V. Estratégia em Universidades Privadas: Estudo de Caso. XXX Encontro ANPAD. Salvador: ANPAD 2006. MEYER JR., V. Planejamento universitário: ato racional, político ou simbólico: um estudo de universidades brasileiras. XXVIII Encontro ANPAD. Curitiba: ANPAD 2004. MINTZBERG, H. et al. O processo da estratégia: conceitos, contextos e casos selecionados. Porto Alegre: Bookman, 2006. QUINN, J. B. e VOYER, J. Administrando a formação da estratégia. In: MINTZBERG, H. et al. O processo da estratégia: conceitos, contextos e casos selecionados. Porto Alegre: Bookman, 2006. RUMELT, R. The Evaluation of Business Strategy in GLUEK, William F., 3rd ed., Business Policy and Strategic Management. 3rd ed., New York: McGraw Hill, 1980 apud MINTZBERG, H. et al. O processo da estratégia: conceitos, contextos e casos selecionados. Porto Alegre: Bookman, 2006. WHITTINGTON, Richard. O que é estratégia – e ela realmente importa? In: O que é estratégia. 1ª edição, São Paulo: Editora Thomson: 2002.

Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

63


Panorama da educação formal em logística e do mercado de trabalho na região metropolitana de campinas

REVISTA DE EMPREENDEDORISMO, NEGÓCIOS E INOVAÇÃO ISSN 2448-3664

Marcos Ricardo Rosa Georges Professor e pesquisador da PUC-Campinas. Líder do grupo de pesquisa em Gestão de Operações e Serviços junto ao CEA (Centro de Economia e Administração). Docente do programa de mestrado em Sustentabilidade e nos cursos de graduação em Administração e Engenharia de Produção. Doutor e Mestre em Engenharia Mecânica (UNICAMP) Lattes: http://lattes.cnpq. br/3209476953629191.

Maria Rachel Russo Seydell Engenheira Civil, Mestre e Doutora em Transportes pela Escola de Engenharia de São Carlos (USP). Professora e pesquisadora participante do Grupo de Pesquisa Sustentabilidade Ambiental das Cidades, da PUC-Campinas. http://lattes.cnpq. br/1482831130853207 UNIVERSIDADE FEDERAL DO ABC AVENIDA DOS ESTADOS, 5001 BAIRRO BANGU, SANTO ANDRÉ - SP. CEP 09210-580 E-MAIL:RENI@UFABC.EDU.BR COORDENAÇÃO AGÊNCIA DE INOVAÇÃO INOVAUFABC

PANORAMA DA EDUCAÇÃO FORMAL EM LOGÍSTICA E DO MERCADO DE TRABALHO NA REGIÃO METROPOLITANA DE CAMPINAS OVERVIEW OF FORMAL EDUCATION IN LOGISTICS AND LABOUR MARKET IN THE METROPOLITAN REGION OF CAMPINAS RESUMO Esta pesquisa faz uma avaliação do atual panorama da educação formal em Logística nos cursos de graduação, tanto na Engenharia Civil quanto na Administração de Empresas, na Região Metropolitana de Campinas. Tem por objetivos principais analisar a crescente demanda pelo profissional de Logística, o conseqüente aumento do oferecimento dos cursos que preparam o profissional para atuar nesta área do conhecimento e propor diretrizes que possam auxiliar na elaboração de um projeto pedagógico condizente com as reais necessidades do mercado de trabalho. Esta é uma pesquisa de levantamento de dados, bem como um estudo de caso considerando a Região Metropolitana de Campinas. O método de pesquisa identifica as habilidades necessárias para exercer a função, o perfil dos alunos, a grade curricular dos cursos e as características do mercado de trabalho em Logística. São apresentados aspectos sócio-econômicos da região, a infra-estrutura de transportes, indústria, comércio e serviços, configurando um cenário para a atuação do profissional de Logística diante de um mercado exigente e altamente concorrido. A análise do contexto geral, através desta pesquisa, permite concluir que se tornará inevitável uma maior especificidade dos cursos, acompanhados por entidades reguladoras vinculadas a iniciativa privada e entidades educacionais que promovam uma padronização com um conteúdo curricular mínimo a ser cumprido. Palavras-chave: Logística, habilidades, aspectos sociais, aspectos econômicos, projeto pedagógico

ABSTRACT This research evaluates the current context of formal education in Logistics in undergraduate courses, in Civil Engineering as in Business Administration, in the Campinas Metropolitan Region. Its main objectives are the analysis of the increasing demand for Logistics professionals, the following increase in the number of courses to prepare adequately to work in this area and to propose directives that may help in the elaboration of pedagogical projects that are more appropriate to the real working needs. This is a data collection research, as well as a case study considering the Campinas Metropolitan Region. Research method deals with the necessary skills to the function, the student profile, curricular grades of the courses and characteristics of the job market. Regional social economic aspects are presented along with the transport infrastructure, industry, commerce and services, configuring the scenario for acting in Logistics in a highly competitive market. A general context analysis, through this study, leads to the conclusion that courses should be more specific, followed by regulation authorities connected with private organizations and educational entities to promote standards with a minimal curricular program to be accomplished. Keywords: Logistics, skills, social aspects, economic aspects, pedagogical project.

Classificação JEL / JEL Classification: A23 64

Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Marcos Ricardo Rosa Georges, Maria Rachel Russo Seydell

1.

INTRODUÇÃO

Esta pesquisa faz uma avaliação do atual panorama da educação formal em Logística nos cursos de graduação, tanto na Engenharia Civil quanto na Administração de Empresas, na Região Metropolitana de Campinas. Tem por objetivos principais analisar a crescente demanda pelo profissional de Logística, o conseqüente aumento do oferecimento dos cursos que preparam o profissional para atuar nesta área do conhecimento e propor diretrizes que possam auxiliar na elaboração de um projeto pedagógico condizente com as reais necessidades do mercado de trabalho. Esta é uma pesquisa de levantamento de dados, bem como um estudo de caso considerando a Região Metropolitana de Campinas. O método de pesquisa identifica as habilidades necessárias para exercer a função, o perfil dos alunos, a grade curricular dos cursos e as características do mercado de trabalho em Logística. São apresentados aspectos sócioeconômicos da região, a infra-estrutura de transportes, indústria, comércio e serviços, configurando um cenário para a atuação do profissional de Logística diante de um mercado exigente e altamente concorrido. A análise do contexto geral, através desta pesquisa, permite concluir que se tornará inevitável uma maior especificidade dos cursos, acompanhados por entidades reguladoras vinculadas a iniciativa privada e entidades educacionais que promovam uma padronização com um conteúdo curricular mínimo a ser cumprido.

2. A CRESCENTE NECESSIDADE PELO PROFISSIONAL DE LOGÍSTICA Inicialmente, são apresentados alguns fatores que levaram ao crescimento da necessidade pelo profissional de Logística, tanto a nível mundial como a nível nacional e regional. É interessante constatar que o profissional de Logística existe há muito tempo, pois esta é uma atividade milenar extensivamente Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

utilizada nas forças armadas (local onde se desenvolveu) e até descrita na Bíblia (Ballou, 2001). No entanto, sua utilização pelas empresas é recente e nos últimos anos houve uma espécie de reinvenção da Logística, de modo que esta passou a ser uma atividade de cunho estratégico importante para a competitividade das empresas. É justamente por este processo que a Logística passou de uma atividade quase despercebida a uma atividade de fundamental importância estratégica, em um intervalo de menos de um século, conforme apresentado de modo estratificado, a seguir, do nível mundial ao nível regional passando pelo nível nacional. 2.1. CRESCIMENTO GLOBAL, NACIONAL E REGIONAL DA LOGÍSTICA A Logística evoluiu e cresceu demasiadamente, em especial nas duas últimas décadas. Segundo GEORGES (2004), pode-se citar como fatores propulsores deste crescimento, a oferta mundial de produtos, a existência de inúmeros fornecedores espalhados pelo globo terrestre, a crescente competitividade entre as empresas e o crescente nível de exigência dos clientes. Como conseqüência do crescimento global, a Logística passou a desempenhar importância estratégica para as empresas, deixando de ser atividade meramente operacional, o que fez crescer a busca pelo profissional especializado e o conseqüente valor desta disciplina. No Brasil, a Logística ganhou importância a partir do início dos anos 90, sendo que alguns motivos podem ser citados: a abertura da economia nacional, a oferta crescente de produtos estrangeiros, a necessidade das empresas nacionais de se adequarem ao novo padrão de competitividade, o código do consumidor e a necessidade de exportar. Como conseqüência do crescimento nacional, a Logística passou a desempenhar importância estratégica para as empresas 65


Panorama da educação formal em logística e do mercado de trabalho na região metropolitana de campinas

no Brasil. Houve um reposicionamento de suas funções nas empresas instaladas no país, abrindo espaço para os operadores logísticos e novos investimentos em armazéns e centros de distribuição. O profissional de Logística passou a ser bastante requisitado no cenário brasileiro (GEORGES, 2004). O crescimento da Logística na Região Metropolitana de Campinas (RMC) se deve a alguns fatores: a extensa malha rodoviária, a instalação de novas indústrias que se deslocam das grandes metrópoles, a estratégica localização e atuação do Aeroporto de Viracopos, que movimenta um terço da carga nacional. A região é um grande centro consumidor apresentando a segunda maior arrecadação do Estado. Possui, também, mão de obra altamente especializada, advinda das universidades, dentre elas a Unicamp, Puc-Campinas e outros centros de pesquisa.

3. O PERFIL DO MERCADO NA REGIÃO METROPOLITANA DE CAMPINAS A Região Metropolitana de Campinas foi criada pela Lei Complementar n° 870, de 19/06/2000. É composta por 19 municípios que ocupam uma área de 3.467 km², o que corresponde a 0,04% da superfície brasileira e a 1,3% do território paulista. A sua população é de 2,63 milhões de habitantes, correspondendo a 1,5% da população nacional e a 6,5% da estadual. Campinas abriga 57,3% desta população, e Sumaré, Americana e Santa Bárbara D’Oeste têm, cada uma, mais de 170 mil habitantes (IBGE, 2002). A RMC comporta um parque industrial moderno, diversificado e composto por segmentos de natureza complementar. Possui uma estrutura agrícola e agroindustrial bastante significativa e desempenha atividades terciárias de expressiva especialização. A presença de centros inovadores no campo das pesquisas científica e tecnológica, a destacar Puc-Campinas, Unicamp, Instituto de 66

Tecnologia de Alimentos (Ital), Instituto Agronômico de Campinas (IAC) e Centro de Pesquisas e Desenvolvimento Tecnológico (CPqD), tornam a RMC uma referência nacional no campo tecnológico. Economicamente, a RMC possui um Produto Interno Bruto (PIB) de 51 bilhões de reais, que corresponde a 9,38% do PIB do Estado de São Paulo e 2,84% do PIB nacional. Sua renda per capita é de 19.477 reais, contra 13.515 reais do Estado e a estimativa de 9.951 reais do Brasil (IBGE, 2004). 3.1. INFRA-ESTRUTURA DE TRANSPORTE A Região Metropolitana de Campinas conta com amplo sistema viário, ramificado e de boa qualidade, tendo como eixos principais: Rodovia dos Bandeirantes (SP348) e Anhangüera (SP-330), ambas rumo ao interior do Estado; Rodovia D. Pedro I (SP-65), que faz ligação com o Vale do Paraíba e Rodovia dos Tamoios, rumo ao Porto de São Sebastião; Rodovia Luís de Queiroz (SP-304) rumo a Piracicaba; Rodovia Santos Dumond (SP-75) rumo a Sorocaba e a Rodovia Ademar de Barros (SP-340) rumo a Região Mogiana e divisa com o sul de Minas, além de outras rodovias secundárias e um recém inaugurado anel viário de contorno ao longo do município de Campinas. Devem ser citadas as ferrovias que atravessam a região e o ferroanel de contorno, além da existência de dutos que transportam petróleo (dos Portos de Santos e São Sebastião a Paulínia) e o gasoduto construído recentemente. Por fim, o Aeroporto de Viracopos, destinado quase exclusivamente ao transporte de carga, sendo responsável por um terço de toda a carga importada e exportada pelo modal aéreo no Brasil (Georges, 2004; Lima, 2003). A Figura 1 apresenta um setor de mapa rodoviário do DER e ilustra claramente a extensa malha rodoviária referente à RMC, contendo estradas de boa qualidade e duplicadas, em sua maioria. Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Marcos Ricardo Rosa Georges, Maria Rachel Russo Seydell

Figura 1 - Malha rodoviária na RMC. Fonte DER/SP

3.2. INDÚSTRIA, COMÉRCIO E SERVIÇOS

estabelecimentos instalados na RMC nos últimos vinte anos. A Figura 2 ilustra este fato e a distribuição dos estabelecimentos Segundo Martins (2002), houve um segundo os tipos de segmentos: indústria, expressivo crescimento do número de comércio e serviços.

Figura 2 - Crescimento e distribuição dos estabelecimentos na RMC. Fonte MARTINS (2002)

Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

67


Panorama da educação formal em logística e do mercado de trabalho na região metropolitana de campinas

A Tabela 1 apresenta a distribuição evidente a posição de liderança exercida por dos estabelecimentos industriais nos Campinas, que concentra quase 40% dos principais municípios da RMC, tornando estabelecimentos industriais da região. Tabela 1 - Distribuição de estabelecimentos industriais pelos municípios da RMC

MUNICÍPIOS

Nº de estabelecimentos

%

Campinas

5.354

38,6

Americana

1.812

13,1

Santa Bárbara D’Oeste

933

6,7

Indaiatuba

926

6,6

Sumaré

667

4,8

Valinhos

655

4,7

Demais municípios

3.509

25,5

TOTAL

13.856

100,0

Fonte MARTINS (2002)

Do total de quase 14 mil indústrias, 1% é de grande porte, 11% são de médio porte, 61% são de pequeno porte e 27% são micro indústrias (Martins, 2002). O grande número de estabelecimentos industriais é um dado importante que afeta diretamente a oferta de serviços de natureza Logística, afinal, toda indústria necessita da distribuição de seus produtos, bem como da captação de insumos industriais e matériaprima. De modo mais específico, as grandes indústrias detêm, em geral, a Logística como área funcional dentro da organização, executando ela própria as atividades Logísticas. No entanto, as pequenas e médias indústrias

não possuem um volume de mercadorias a ser transportado suficientemente grande para justificar a criação da função Logística, sendo esta atividade, em geral, terceirizada, seja para empresas de transporte ou operadores logísticos. Este fato atraiu um grande número de operadores logísticos e centros de distribuição para a RMC nos últimos 10 anos. O comércio também apresentou um crescimento expressivo nos últimos vinte anos. Em 1985, existiam 9.710 estabelecimentos comerciais e, em 2002, este número cresceu para 47.925, dos quais 5.952 são atacadistas e 41.973 são varejistas, conforme mostrado na Tabela 2.

Tabela 2 - Distribuição de estabelecimentos comerciais pelos municípios da RMC

MUNICÍPIOS

Nº de estabelecimentos

%

Campinas

20.923

43,65

Americana

4.744

9,89

Indaiatuba

3.210

6,69

Santa Bárbara D’Oeste

2.802

5,84

Sumaré

2.463

5,14

Itatiba

1.827

3,81

Demais municípios

11.956

24,94

TOTAL

47.925

100,0

Fonte MARTINS (2002)

68

Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Marcos Ricardo Rosa Georges, Maria Rachel Russo Seydell

A área de serviços foi a que apresentou o maior crescimento. Há dez anos, existiam 7.000 estabelecimentos de serviços e, em 2002, existiam 37.768, sendo que 51,87% concentram-se em Campinas. A Tabela 3

ilustra a distribuição dos estabelecimentos de serviços em Campinas segundo setor de atividade, com destaque para o grande número de empresas que oferecem serviços de transporte na RMC. (Martins, 2002).

Tabela 3 - Distribuição, segundo setor de atividade, de estabelecimentos de serviços da RMC

Setor de Atividade

Nº de estabelecimentos

%

Adm. Loc. Bens e Loteamentos Bens Imóveis

2.758

14,1

Saúde

2.620

13,4

Alojamento e Alimentação

2.473

12,6

Técnicos / Profissionais

1.884

9,6

Auxiliares Diversos

1.846

9,4

Comunitários e Sociais

1.695

8,6

Serviços de Transportes

1.676

8,5

Ensino

909

4,6

Pessoais

783

4,0

Radiodifusão, Televisão e Diversão

300

1,6

Financeiros

160

0,8

Outros

2.487

12,8

TOTAL

19.591

100,0

Fonte MARTINS (2002)

Outro destaque está nos investimentos recebidos. A RMC concentra um grande volume de investimento de grandes empresas que se expandiram ou criaram novas instalações. Entre 1998 e 2003 foram investidas cifras da ordem de 20 bilhões de reais, segundo a ACIC (2002), sendo que a indústria concentra aproximadamente 14 bilhões de reais, os serviços 4 bilhões de reais e, o comércio, aproximadamente 1,5 bilhão de

reais. Estas cifras consolidam a RMC como pólo de investimento, seja na ampliação de instalações existentes ou na criação de novas. De qualquer modo, estes investimentos são convertidos na geração de empregos, dentre os quais estão os empregos na área de Logística. A Tabela 4 mostra os valores investidos nas indústrias da RMC entre 1998 e 2003 (em milhões de reais), estratificados por setor industrial.

Tabela 4 - Distribuição, segundo setor de atividade industrial, dos valores investidos na RMC

Ramo de Atividade Industrial

Valor Investido (em milhões de reais)

Destaque

Telecomunicações

2.530,7

Tess, Motorola, Nortel, Luccent, Qualcomm

Informática

548,4

Compaq, GT/SCI, HP, CGT Digital

Automotivo

1.592,6

Honda, Toyota, Valeo, Benteler, Bosch, Eaton

Eletrodomésticos

326,5

BS Continental, GE Dako

Tubos

326,5

Fortilit, Consulplast, Dura Line, Tigre

Têxtil

624,2

Du Pont, Vicunha, Ober

Farmacêutico

265,9

Prodome, EMS, Eli Lilly, Apotex, Merial, Medley

Químico

48.252,6

Petrobras (OPP1), Rhodia, Shell, Degussa, BYK

Embalagem

56,5

Plastpaking, Termotécnica

Energia

2.104,5

UTP Paulínia, Congás/Gasbol

Outros

1.362,5

Metal Conteiner, Tabacow, 3M, Replan, Aços Vilares

Fonte MARTINS (2002) Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

69


Panorama da educação formal em logística e do mercado de trabalho na região metropolitana de campinas

Dos investimentos em serviços, podemse destacar a expansão do Aeroporto de Viracopos, a ampliação da rede hoteleira (Hilton Hotel, Royal Palm Plaza e Sleep in), a criação de condomínios industriais (IBM Park e Tech Park) e parques temáticos de diversão (Hopi Hari e Wet’n Wild). Dos investimentos em comércio, destacamse a criação e ampliação de Shopping Centers (Parque Dom Pedro, Iguatemi e Unimart – um total de mais de 1.200 lojas), abertura de mega lojas especializadas (Leroy Merlin, Decatlon, Fnac e Lafarje) e, aproximadamente, 1 bilhão de reais em centros de distribuição (Ambev, Deickmar, Katoen Natie e Perdigão). Estes investimentos afetam diretamente

a necessidade de oferta de empresas especializadas em transporte e armazenagem, sejam por pequenas transportadoras ou operadores logísticos, para abastecer suas unidades e evitar que os produtos faltem em suas prateleiras. 3.3. ASPECTOS SOCIAIS A RMC apresenta renda per capita de US$ 10.689, contra US$ 5.620 do Estado de São Paulo e US$ 3.506 do Brasil. O poder aquisitivo da população da cidade de Campinas é apresentado na Tabela 5, estratificado por faixa salarial e indicando a porcentagem e o valor absoluto da População Economicamente Ativa (PEA) (Martins, 2002).

Tabela 5 - Distribuição da renda da população de Campinas

Faixa de Renda (SM*)

%

PEA

1,0 – 3,5

1,3

6.679

3,5 – 8,0

19,0

97.619

8,0 – 14,0

36,7

188.588

14,0 – 20,0

32,7

168.007

Acima de 20,0

10,3

52.920

Fonte MARTINS (2002)

Em relação ao perfil da mão de obra, Campinas tem mais trabalhadores formais que informais. Dos trabalhadores formais, 62,34% são homens e 37,66% são mulheres. A escolaridade do trabalhador formal é assim distribuída: 11,70% com curso superior completo, 43,20% com 2º grau completo, 34,59% com 1º grau completo e 10,5% com 1º grau incompleto (Martins, 2002). Pode-se concluir que a RMC é um pólo de investimentos, possuindo uma malha rodoviária extensa e de boa qualidade, com alto poder aquisitivo, mão de obra qualificada e parque industrial diversificado. Assim, a RMC tem atraído muitas empresas, gerando empregos, inclusive na área da Logística, sendo que, por motivos equivalentes, diversas faculdades e universidades foram instaladas na RMC nos últimos anos. Estes fatos, entretanto, levantam a seguinte questão: “Os cursos oferecidos tem sido capazes de preparar o profissional para preencher as vagas que surgem na área de Logística?” 70

4. O CONHECIMENTO NECESSÁRIO AO PROFISSIONAL DE LOGÍSTICA Para responder à pergunta anterior, é necessário saber quais são as habilidades que um profissional de Logística deve possuir para desempenhar de forma satisfatória a profissão. Um curso formal (reconhecido pelo MEC) é capaz de preparar adequadamente um profissional para a Logística quando as disciplinas que oferecem e seus docentes possam construir as habilidades que são requisitadas pelo profissional. A Organização Logística concentra as disciplinas que abordam o sistema logístico e suas atividades. Podem ser de caráter teórico ou prático, como por exemplo, Logística Empresarial, Cadeia de Suprimentos, Fundamentos de Transporte, Logística Internacional etc.. Deve ser enfatizada a importância da integração entre a Engenharia Civil e a Administração de Empresas, já que a Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Marcos Ricardo Rosa Georges, Maria Rachel Russo Seydell

área de Transportes é proveniente da Engenharia e a Logística Integrada, sendo constituída das atividades de transporte, armazenagem e distribuição, necessita dos conceitos e aplicações da área de Transportes. Os Métodos de Decisão envolvem o conjunto de disciplinas que abordam as técnicas utilizadas para se decidir. Geralmente de caráter prático, têm-se como exemplos: Pesquisa Operacional, Métodos Quantitativos, Teoria da Decisão. A Tecnologia envolve as disciplinas de caráter prático e geralmente apoiado por laboratórios de informática, por exemplo, TI/SI (Tecnologia de Informação e Sistemas de Informação) aplicado a Logística, sistemas de roteirização, sistemas de armazenagem, sistemas de gerenciamento de estoques, sistemas ERP etc.. Há, também, disciplinas correlatas, que não estão diretamente ligadas a Logística, mas ajudam a formar o profissional de gestão de operações, como exemplo, Administração da Produção, Serviços, Qualidade, disciplinas do curso de Comércio Exterior, entre outras.

necessárias que o profissional de Logística deve possuir e quais os conjuntos de disciplinas que formam estas habilidades, foi possível avaliar o grau de aderência dos cursos oferecidos aos requisitos do profissional de Logística. Foram avaliados somente os cursos de graduação reconhecidos pelo MEC ministrados na RMC. Por questões éticas, não são citados os nomes das instituições avaliadas. Os cursos avaliados foram os de Administração de Empresas (e suas diversas ênfases) e os cursos de Engenharia, justamente por serem os cursos que apresentam maior número de disciplinas correlatas e que têm profissionais atuando em Logística. Foram pesquisados 45 cursos de Administração de Empresas (em todas as ênfases) e 21 cursos de engenharia (em todas as áreas). A Figura 4 ilustra a explosão do oferecimento de cursos de Administração na RMC nos últimos 10 anos. Isto se deu em função da atratividade da região, mas, 5. A EDUCAÇÃO FORMAL principalmente, em função da alteração EM LOGÍSTICA NA REGIÃO das regras de concessão de licenças para novas instituições promovidas METROPOLITANA DE CAMPINAS no governo do Presidente Fernando Sabendo quais são as habilidades Henrique Cardoso. Figura 4 - Evolução do oferecimento de cursos de Administração de Empresas na RMC

Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

71


Panorama da educação formal em logística e do mercado de trabalho na região metropolitana de campinas

5.1. AVALIAÇÃO DOS CURSOS A avaliação dos cursos de Administração de Empresas e Engenharias consistiu em ponderar cada uma das disciplinas da grade curricular da seguinte forma: 2 pontos para disciplinas altamente relacionadas com a Logística (que pertencem ao conjunto: Organização Logística, Métodos de Decisão e Tecnologia) e 1 ponto para as disciplinas correlatas (tais como: Administração da Produção, Qualidade, Serviços etc..).

Assim, houve a necessidade de se pesquisar a grade curricular de cada um dos cursos levantados e determinar quantas e quais disciplinas se enquadram nas categorias definidas anteriormente e, por fim, levantar o número total de pontos conquistados por cada um dos cursos pesquisados. Muitas dificuldades foram encontradas durante este processo de levantamento da grade curricular de cada curso e a consecutiva pontuação. O resultado final da pontuação e um ranking foram obtidos e apresentados na Figura 5.

Figura 5 - Resultado da pontuação dos cursos de Administração e Engenharia

Alguns comentários são feitos em função do resultado e das dificuldades encontradas durante o levantamento da grade curricular e da pontuação: Os 16 cursos que apresentaram pontuação zero não apresentaram grade curricular (em reformulação ou readequação). Apenas 12 dos 63 cursos tinham uma disciplina de Logística na grade curricular, aproximadamente 19% do total. Apenas 6 dos 63 cursos tinham uma disciplina de Cadeia de Suprimentos na grade curricular, apenas 9,5% do total. Foram criados/reformulados recentemente. O curso de maior pontuação foi o de Administração de Empresas com ênfase em 72

Logística e Serviços da PUC-Campinas. O único diretamente relacionado com a área de Logística na RMC. Das engenharias, a maior pontuação foi a da Engenharia de Produção da Unimep em Santa Bárbara do Oeste. Na Unicamp, apenas a Engenharia Civil apresenta uma disciplina de Logística, mas é optativa (eletiva). Nenhum curso de engenharia apresenta a disciplina Cadeia de Suprimentos. O elenco das disciplinas do pilar Tecnologia é o menos oferecido, seguido de Métodos de Decisão, que passou a ser oferecido em função do CNE, que exige o oferecimento de Pesquisa Operacional nos cursos de Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Marcos Ricardo Rosa Georges, Maria Rachel Russo Seydell

administração. De um modo geral, o engenheiro é um profissional com maior capacidade analítica, enquanto o administrador é um profissional com maior capacidade estratégica. Um curso de

Logística deve possuir uma divisão equilibrada de disciplinas que visa ampliar a capacidade analítica em relação ao administrador tradicional, mas sem perder sua capacidade estratégica, conforme ilustra a Figura 6.

Figura 6 - Trade-off das habilidades do engenheiro e do administrador (Georges, 2004)

Engenharias

Administração Logística

Analítica

Habilidade

5.2. O PERFIL DOS ESTUDANTES DE LOGÍSTICA Este artigo apresenta um perfil dos estudantes verificado a partir de uma pesquisa realizada sobre o curso de Administração de Empresas com ênfase em Logística e Serviços da PUC-Campinas. Este curso foi escolhido por apresentar a maior pontuação dentre os cursos analisados na pesquisa de GEORGES (2004). As questões empregadas para levantar o perfil compreendem os aspectos sociais (idade, situação de emprego) e os aspectos educacionais (relacionados com a Logística). Algumas questões foram respondidas através de censo, outras exigiram amostras estratificadas, adotando-se 95% de intervalo de confiança e 3% de margem de erro. Dos 248 alunos matriculados, 64% são homens. A idade média do aluno matriculado em Logística é de 25 anos de idade, a mediana é de 24 anos, o aluno mais novo tem 19 anos e o mais velho tem 55 anos de idade. É interessante notar que 25% dos alunos têm de 26 a 55 anos de idade. Quanto ao trabalho, 71% dos estudantes têm empregos efetivos ou estágios. Observa-se Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

Estratégica

uma tendência de crescimento na quantidade de alunos empregados à medida que se aproximam dos últimos anos de graduação. Mas apenas 21% atuam diretamente no ramo da Logística. Sobre ferramentas de apoio a decisão logística e sistemas integrados de gestão, o software TransCad foi o roteirizador mais citado entre os alunos (24% das respostas) e o sistema R/3 foi o sistema de gestão integrado (ERP) mais citado (18% das respostas). A principal dificuldade encontrada no trabalho foi a de manipular softwares que nunca haviam sido apresentados em sala de aula (27% das respostas), seguida da dificuldade em realizar atividades de planejamento (20% das respostas) e realizar auditorias (12% das respostas). 46% dos estudantes possuem carro próprio, 97,5% possuem aparelhos de telefone celular e 79% possuem computadores com acesso a Internet; 13,7% são fumantes. Quanto a continuidade dos estudos, 65% pretendem fazer pós-graduação, sendo que a especialização é a mais pretendida (31%), seguida do MBA (14%), mestrado (8%) e extensão (7%). Sobre as disciplinas cursadas durante 73


Panorama da educação formal em logística e do mercado de trabalho na região metropolitana de campinas

a graduação, a Pesquisa Operacional (PO) foi considerada a mais difícil (42%), seguida de Estatística (20%), Logística (10%), Matemática Financeira (9%) e Administração da Produção (8%).

entidade regulamentadora, vinculada à iniciativa privada, e por entidades educacionais que promovam sua padronização, com conteúdo curricular mínimo a ser cumprido, uma vez que a profissão não é regulamentada. Nesse sentido, a ASLOG (Associação 6. DIRETRIZES PARA OS Brasileira de Logística), em seu Congresso CURSOS DE LOGÍSTICA Anual, ocorrido em junho de 2004, convidou à mesa de encerramento os representantes A partir do exposto é possível sugerir das principais instituições de ensino ligadas algumas diretrizes úteis para os cursos que a Logística (PUC-Campinas, Unicamp, Celalmejem formar alunos para atuar na área de Coppead, FGV, IMAM) para dar início a Logística, quais sejam: um comitê de educação cuja finalidade seja • Formar um profissional com forte discutir a educação em Logística no Brasil. raciocínio analítico, além de visão estratégica; 8. SUGESTÕES PARA FUTURAS • Fornecer ao aluno visão técnica PESQUISAS aprofundada, tornando-o habilitado para manipular softwares; Este trabalho se baseia em uma pesquisa • Dar importância à visão humanística e parcial que não pretende esgotar o assunto, ética; mas sim gerar algumas conclusões genéricas. • Cursos de graduação devem enfatizar a É necessário que a pesquisa ganhe maior formação do profissional para o cargo profundidade, avaliando os cursos de forma de analista logístico; mais abrangente e precisa (aperfeiçoando • Cursos de pós-graduação (extensão, Lato método e pontuação). Torna-se necessário e Stricto Sensu) para que o profissional que o levantamento do perfil dos alunos não possa se aperfeiçoar e assumir posições se restrinja a uma única universidade, mas de gerência e diretoria. a uma parcela maior de alunos de outras instituições, a fim de gerar dados suficientes 7. CONSIDERAÇÕES FINAIS para avaliações estatísticas mais sofisticadas. Outro passo importante a ser dado é A profissão Logística apresentou grande estender a avaliação para níveis educacionais crescimento gerando muitas oportunidades mais avançados, no sentido da pósde emprego. Atualmente, no entanto, a graduação, em todas as suas modalidades, procura pelo profissional de Logística Lato Sensu (especialização, extensão e MBA) estabilizou-se, ao passo que, devido ao e Stricto Sensu (mestrado e doutorado), além aumento dos cursos, a oferta do profissional de cursos profissionalizantes e técnicos. aumentou. Sendo assim, somente o profissional com boa formação encontrará 9. REFERÊNCIAS seu lugar. BIBLIOGRÁFICAS A conseqüência imediata será a necessidade Ballou, R. – Gerenciamento da Cadeia de de maior especificidade dos cursos a fim de permanecer em condições de formar Suprimentos. 4ºed., Ed. Bookman, Porto Alegre, um profissional competente, gerando, ao 2001. Georges, M. R. R. – Panorama da educação formal longo prazo, uma segregação dos cursos em Logística e o perfil de seus alunos na Região de Logística dos demais cursos. Não será Metropolitana de Campinas. Apresentação feita na 8ª surpresa o aparecimento de “engenharias” Conferência Anual da ASLOG (Associação Brasileira de Logística). São Paulo, junho de 2004. logísticas, ciências logísticas, entre outras. IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Recomenda-se que os cursos específicos estatística. Indicadores de população. Censo, 2002. de Logística sejam acompanhados por uma IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e 74

Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Marcos Ricardo Rosa Georges, Maria Rachel Russo Seydell

estatística. Indicadores de PIB. Censo, 2004. Lima Jr., O. F. – Profissional de Logística: Desafios e Rumos. Apresentação do GEL (Grupo de Estudos em Logística), LALT (Laboratório de Aprendizagem em Logística e Transportes) da UNICAMP, dezembro de 2003. Martins, L. - Relatório Econômico RMC 2002 – ACIC – Associação Comercial e Industrial de Campinas, 2002. Revista Tecnologística. Mais que uma profissão de futuro: a profissão do futuro. (Especial sobre Educação em Logística) – nº 80, julho 2002. Departamento de Estradas de Rodagem do Estado de São Paulo - DER/SP - www.der.sp.gov.br Associação Comercial e Industrial de Campinas – ACIC - www.acicnet.org.br

Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

75


Inovação em logística para pequenos produtores agrícolas: as centrais de abastecimento – ceasa

REVISTA DE EMPREENDEDORISMO, NEGÓCIOS E INOVAÇÃO ISSN 2448-3664

Marcia Carvalho de Azevedo Mestre e doutora em administração de empresas pela FGV/SP, professora do curso de administração da Unifesp.

INOVAÇÃO EM LOGÍSTICA PARA PEQUENOS PRODUTORES AGRÍCOLAS: AS CENTRAIS DE ABASTECIMENTO – CEASA INNOVATION IN LOGISTICS FOR SMALL FARMERS: THE SUPPLY CENTERS CEASA

José Henrique Bassi Souza Sperancini Professor e pesquisador do Centro de Engenharia, Modelagem e Ciências Sociais Aplicadas (CECS) da UFABC.

Luis Hernan Contreras Pinochet Doutor pela FGV-EAESP. Mestre em Administração pela PUC-PR. Professor Adjunto III do curso de Administração da EPPEN da Unifesp.

RESUMO Este artigo descreve o sistema Ceasa como uma inovação de apoio às pequenas empresas do segmento de hortifrutigranjeiros. O estudo de caso na Ceasa de Campinas/SP procura entender como as centrais auxiliam a expansão das microempresas. O estudo encontrou como informações marcantes o fato de que algumas empresas do sistema não estruturam apenas relações comerciais. Existe confiança e camaradagem entre empresários, apesar do ambiente de competitividade e de crescentes exigências de eficiência produtiva. Contrariando o senso comum, a experiência das Ceasas demonstra que algumas inovações podem apoiar o pequeno produtor familiar e reduzir o êxodo rural de microempresários agrícolas. Palavras-chave: Pequenas empresas. Agricultura familiar. Inovação.

Inês A. Mascara Mandelli Graduada e mestre em Administração pela PUC-SP, com doutorado em Engenharia pela Unicamp, professora dos cursos de Administração e Ciências Contábeis da PUC-Campinas. UNIVERSIDADE FEDERAL DO ABC AVENIDA DOS ESTADOS, 5001 BAIRRO BANGU, SANTO ANDRÉ - SP. CEP 09210-580 E-MAIL:RENI@UFABC.EDU.BR COORDENAÇÃO AGÊNCIA DE INOVAÇÃO INOVAUFABC

ABSTRACT This article describes the Ceasa system as a support innovation for small businesses in the horticultural industry segment. A case study at Ceasa de Campinas/ SP seeks to understand how the Ceasas help expand microenterprises. The study found as remarkable information the fact that some companies in the system do not only structure business relationships. There is trust and camaraderie among entrepreneurs, despite the competitive environment and increasing demands for productive efficiency. Contrary to common sense, the experience of Ceasas demonstrates that some innovations can support the small family producer and reduce the rural exodus of micro entrepreneurs. Keywords: Small business. Farm Households, Innovation.

Classificação JEL / JEL Classification: Q12 76

Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Marcia C. de Azevedo, José H. Bassi Souza Sperancini, Luis Hernan C. Pinochet, Inês A. M. Mandelli

1.

INTRODUÇÃO

No sentido econômico, uma inovação, somente é completa quando há uma transação comercial envolvendo uma invenção e assim gerando riqueza. Essa evolução inclui o estudo de modelos e práticas gerenciais voltadas à inovação e considera um universo ampliado que sai do contexto interno das empresas e organiza-se de maneira aberta na formação de novas redes de informação e criação. (Amabile; Gryskiewicz, 1989; Hamel, 2006 e OECD, 2005). A inovação tecnológica cria uma ruptura no sistema econômico, tirando-a do estado de equilíbrio, alterando, desta forma, padrões de produção e criando diferenciação para as empresas. Ela representa papel central na questão do desenvolvimento econômico regional e de um país. (Bell; Pavitt, 1993 e Metcalfe; Foster e Ramlogan, 2003, p. 33). Portanto, a inovação pode ser resultado de uma solução criativa de um colaborador, uma nova forma de atender o cliente, uma alternativa de determinada etapa do processo produtivo ou a modificação de um insumo para o novo produto (Cooper, 1998; Ernst, 2002). Essa nova forma de atender o cliente inclui o estudo de modelos e práticas gerenciais voltadas à inovação e considera um universo ampliado que sai do contexto interno das empresas e organiza-se de maneira aberta por meio da formação de novas redes de informação e criação. (Covin; Miles, 1999; Hashim; Mustafa; Fawzi, 2005; Chesbrough, 2006). Frequentemente as inovações tecnológicas são apontadas como responsáveis pela diminuição do número de postos de trabalho, pela piora da qualidade de vida do trabalhador e pela eliminação de pequenos negócios. Mas, seria possível a uma nova tecnologia reduzir os preços de bens essenciais, aumentar o mercado e fixar o trabalhador no campo diminuindo o êxodo rural? Mais que isso, e se imaginássemos que essa inovação tecnológica aumentasse a renda do pequeno agricultor familiar e ao mesmo tempo estimulasse um relacionamento mais solidário entre agentes econômicos? Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

Parece extremamente difícil que algo dessa natureza possa ocorrer, mas foi exatamente o que se estabeleceu com a instalação, no Brasil dos anos 1970, das “Centrais de Abastecimento” - Ceasas. Portanto, o objetivo deste artigo é entender como é a dinâmica de funcionamento dessas centrais e quais são os agentes envolvidos no negócio dos hortifrutigranjeiros. O segmento de hortifrutigranjeiros possui um papel social extremamente importante. Em primeiro lugar ele fornece suprimentos essenciais à qualidade de vida da população. Para o Brasil esse segmento ocupa um lugar de destaque no que se refere à saúde pública, apesar da queda consistente dos índices de desnutrição nos últimos 30 anos, o país ainda possui problemas nessa área. O segmento também é caracterizado pelo grande número de pequenas e microempresas agrícolas e de serviços. Assim, ele é responsável tanto pela segurança alimentar do país quanto pela manutenção do produtor no meio rural, pelo sustento financeiro de inúmeras famílias de produtores, pela manutenção da diversidade na oferta de alimentos, pela preservação e desenvolvimento de tecnologias agrícolas e de logística e pela geração de emprego urbano. Por isso é fundamental entender a capacidade de evolução de pequenas empresas que operam com mercadorias altamente perecíveis num ambiente cada vez mais exigente em termos de eficiência produtiva, segurança sanitária e avanço tecnológico. Normalmente associadas ao conceito de “concorrência perfeita”, pouco se sabe sobre o comportamento das pequenas empresas produtoras e distribuidoras de hortifrutigranjeiros. De fato, a denominação “pequenas empresas” diz muito pouco sobre a estrutura de mercado desse segmento. Por isso, nosso primeiro objetivo é descobrir “quem é” esse pequeno empresário que opera na Ceasa e qual é a sua real capacidade de concorrer e expandir seus negócios. O estudo de caso foi feito tendo como foco de pesquisa a Ceasa Campinas devido à sua importância em termos de volume comercializado e agentes envolvidos. Essa 77


Inovação em logística para pequenos produtores agrícolas: as centrais de abastecimento – ceasa

Central de Abastecimento será o “locus” no qual pretende-se investigar quem são as “pequenas” empresas que atuam no segmento de hortifrutigranjeiros e qual é a realidade do seu negócio em termos de posicionamento estratégico e capacidade de sobrevivência e crescimento. Para chegar a esse objetivo o trabalho vai basear-se na concepção de inovação schumpteriana de Michael Porter (1989 e 1990). O artigo possui a seguinte estrutura: introdução, fundamentação teórica que fornece a base conceitual utilizada no artigo, e na sequência são apresentados: o método, a análise do caso e as conclusões e considerações finais.

2.

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1. A ESTRUTURA DE MERCADO DO SEGMENTO DE HORTIFRUTIGRANJEIROS O segmento de hortifrutigranjeiros normalmente é utilizado como exemplo de “concorrência perfeita” em manuais de economia. Seria, como pode ser verificado no quadro a seguir, um mercado onde impera a lei do livre comércio. Os compradores e vendedores seriam em tão grande número e seus produtos tão homogêneos que nem compradores, nem vendedores, possuiriam força para interferir na oferta, na demanda e nos preços.

Quadro 1. Estrutura de Mercado no Modelo Neoclássico.

Compradores Vendedores Um Poucos Muitos

Um Monopólio Bilateral Quase Monopsônio Monopsônio

Poucos

Muitos Produto Homogêneo

Produto Diferenciado

Quase Monopólio

Monopólio

Oligopólio Bilateral

Oligopólio Puro

Oligopólio Diferenciado

Oligopsônio

Concorrência Perfeita

Concorrência Monopolista

Fonte: Mankiw, 2001; Vian; Pitelli, 2005.

para o comércio e ganho. Como a concorrência se O preço seria determinado pela lei da oferta intensifica dentro de determinados mercados, as e da procura. Quando o preço é maior do que empresas com fins lucrativos inovam e diversificam o custo médio aparece o lucro, e esse é máximo os seus produtos na criação incessante de novos quando a receita marginal se iguala ao nichos de mercado ... A busca competitiva pelo custo marginal. Nesse mercado de produtos lucro pressiona as empresas a investirem em novas tecnologias ou novas habilidades. Nessa busca pela homogêneos, tanto compradores quanto inovação, as fronteiras da ciência e da tecnologia são vendedores possuem todas as informações avançadas, levando a novas áreas do conhecimento que precisam para tomar suas decisões. e da investigação. Os serviços são geralmente Também existe liberdade de entrada e saída mais diversificados do que bens manufaturados, de empresas. Na existência de lucros elevados portanto, a diversidade também aumenta com o aumento do tamanho relativo do setor de serviços. ocorre a entrada de novos concorrentes que Novas e variadas formas organizacionais são dividirão o mercado aumentando a oferta. concebidas para aumentar a produtividade e Nesse caso os preços tendem a cair junto com gerenciar um número exponencialmente crescente os lucros excessivos. Caso os prejuízos sejam de produtos e processos. (Hodgson, 2003a, p. 471). generalizados ocorre a saída de concorrentes Uma visão alternativa da estrutura diminuindo a oferta e elevando os preços. industrial, apresentada por Michael Porter A realidade econômica, na verdade, é muito (1989 e 1990), permite uma análise mais mais complexa. Segundo Hodgson, profunda e capaz de identificar as fraquezas, O capitalismo é o sistema econômico mais as virtudes e as especificidades do negócio dinâmico da história humana. Sua lógica de condução envolve a expansão e a diversificação de hortifrutigranjeiros. Porter descreve dos múltiplos mercados. Como ele se expande, as cinco forças que interferem na concorrência empresas procuram sempre novas oportunidades empresarial. São elas: “a entrada de novos 78

Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Marcia C. de Azevedo, José H. Bassi Souza Sperancini, Luis Hernan C. Pinochet, Inês A. M. Mandelli

concorrentes, a ameaça de substitutos, o poder de negociação dos compradores, o poder de negociação dos fornecedores e a rivalidade entre os concorrentes existentes”. Estas forças determinam a rentabilidade influenciando os preços, os custos e o investimento necessário por parte das empresas. Segundo Porter (1989 e 1990) os compradores precisam estar dispostos a pagar um preço por um produto acima de seu custo de produção, ou uma indústria não sobreviverá no longo prazo. A satisfação das necessidades do comprador pode ser um prérequisito para a rentabilidade da indústria, mas não é, por si só, suficiente. A questão crucial na determinação da rentabilidade é se as empresas podem captar o valor por elas criado para os consumidores, ou se este valor é capitalizado por outros. Assim, é a estrutura da indústria que determina quem capta o valor criado para o consumidor. (Vasconcelos; Cyrino, 2000). De acordo com Porter (1989 e 1990) uma visão comumente defendida sobre a rentabilidade industrial é que os lucros constituem uma função de equilíbrio entre a oferta e a procura. Se a procura for maior que a oferta o resultado é uma alta rentabilidade. Contudo, a longo prazo, este equilíbrio sofre uma influência da estrutura industrial. A oferta e a procura modificam-se constantemente, ajustando-se uma a outra. As consequências de um desequilíbrio, entre a oferta e a procura, para a rentabilidade da indústria vão depender muito da estrutura industrial. Em algumas indústrias, uma pequena quantidade de capacidade excedente desencadeia guerras de preços e baixa rentabilidade. Assim, a estrutura industrial é básica tanto para a velocidade do ajuste da oferta à demanda como para a relação entre a utilização da capacidade e a rentabilidade. Para Porter a empresa deve buscar um foco bem definido em termos de vantagem competitiva. A empresa pode optar por lutar pela liderança no custo procurando, com preços abaixo da média, obter vantagens sobre seus concorrentes. A estratégia de diferenciação foca em aspectos tais como localização, atendimento ou particularidades Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

que são atrativas para seus compradores como atendimento pós-venda, pronta entrega, assistência técnica e manutenção. Uma terceira estratégica genérica, o enfoque, nada mais seria do que focalizar um segmento de mercado e explorá-lo a fundo até se obter um bom resultado que refletirá no desempenho do preço final do produto. De qualquer forma mudanças na estrutura industrial podem afetar os alicerces sobre os quais a estratégia de uma empresa foi montada. 2.2. A HISTÓRIA, A ESTRUTURA E OS AGENTES DA CEASA Com a urbanização do país na década de 60 o processo de distribuição de produtos hortifrutigranjeiros tornou-se mais complexo e oneroso. Esta situação, aliada à precariedade dos mercados tradicionais, suscitou a necessidade de aperfeiçoamento das estruturas de comercialização de hortifrutigranjeiros. No Brasil dos anos 1950 e 1960 os produtores agrícolas dificilmente conseguiam comercializar seus produtos diretamente para o consumidor final ou para os revendedores urbanos (feirantes, supermercados e “quitandas”). Normalmente seus produtos eram vendidos para atacadistas que revendiam aos negociantes do varejo urbano. Tal estrutura de mercado provocava um duplo efeito negativo sobre a economia. Esses “atravessadores” pagavam preços aviltantes para o produtor, o que reduzia a renda dos pequenos e médios produtores agrícolas. Além disso, revendiam os produtos a um preço excessivamente elevado, diminuindo assim o poder de compra da população urbana. Esse problema foi considerado pela “Comissão Mista Brasil - Estados Unidos” (1951/53) como um dos estrangulamentos que travavam o crescimento da economia brasileira. Sua superação permitiria a melhoria na distribuição de alimentos, a ampliação do uso de recursos ociosos no campo, a expansão da atividade agrícola e a redução dos níveis inflacionários. Para diminuir o gargalo do abastecimento 79


Inovação em logística para pequenos produtores agrícolas: as centrais de abastecimento – ceasa

começaram a ser implantadas, na década de 70, as “Centrais de Abastecimentos (Ceasas)” destinadas a comercializar hortifrutigranjeiros, pescados e outros perecíveis nas principais cidades brasileiras. Inicialmente chamada de Sistema Nacional de Centrais de Abastecimento - Sinac, sob controle da Companhia Brasileira de Abastecimento – Cobal (atual Companhia Nacional de Abastecimento - Conab) a implantação dessa estrutura eliminou, em grande parte, o controle que os “atravessadores” detinham no mercado de hortifrutigranjeiros. Desse modo, por implantar uma nova estrutura industrial, pode-se considerar as Ceasas como legítimas inovações schumpterianas. É preciso lembrar que, para Schumpeter, a inovação tem um sentido amplo podendo ser um novo produto, novo método de produção, novos mercados, novas fontes de matériaprima e novas formas de organização. Esta última pode se configurar como “uma nova organização de qualquer indústria, como a criação de uma posição de monopólio (por exemplo, pela trustificação) ou a fragmentação de uma posição de monopólio”. (Schumpeter, 1985, p. 48). Assim, a criação das centrais de abastecimento implicou em uma nova forma de relacionamento entre empresas já estabelecidas e dessas com seus clientes. De fato, a instalação das Ceasas pode ser incluída na categoria de “novas formas de organização” por ter fracionado mercados altamente oligopolizados.

3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Em relação à metodologia utilizada, caracteriza-se como exploratória (Gil, 1999), e descritiva com uma abordagem qualitativa (Triviños, 1987) e concepção contextual. (Pettigrew; Ferlie; Mckee, 1992). O levantamento de dados para o presente trabalho foi feito por meio de consulta a documentos e entrevistas. A análise documental foi utilizada como técnica para a abordagem de coletas de dados. Os documentos obtidos, caracterizados como 80

fonte secundárias, conduziram a construção da base de conhecimento necessária para o desenvolvimento do referencial do estudo analisado, (Bryman; Bell, 2011; Yin, 2013). Foram realizadas consultas ao site da empresa, a material de divulgação e relatórios da Ceasa Campinas. O levantamento de dados foi complementado por meio de entrevistas com funcionários do setor administrativo da Central. Outra fonte importante de informações foram entrevistas com permissionários realizadas na Ceasa Campinas. Tais entrevistas não estruturadas e não gravadas tiveram duração média de aproximadamente 30 minutos. O tema era livre e discorria sobre as relações que esses permissionários estabelecem com a organização e com os demais permissionários. O objetivo foi fazer uma pesquisa exploratória para identificar padrões de conduta e percepções dos agentes. A partir desse primeiro estudo e da reflexão sobre os resultados será possível partir para a elaboração de uma pesquisa de campo com entrevistas estruturadas.

4.

ANÁLISE DOS DADOS

4.1. O ESTUDO DE CASO: A CEASA CAMPINAS A Central de Abastecimento de Campinas S.A., a Ceasa Campinas, foi fundada em 11 de maio de 1972, mas iniciou suas operações somente em 1975. Em 1989 a Prefeitura de Campinas passou a deter 99,9% das ações da empresa, dessa forma a Ceasa Campinas tornou-se uma empresa pública com orçamento próprio. É hoje uma das centrais mais importantes do país, e em 2016 estava em 7º lugar em valor de faturamento e em 8º em volume de comercialização, sendo a maior localizada fora de uma capital de estado. Atualmente conta com 180 funcionários administrativos, técnicos e operacionais. Tem 500.000 m² de área, sendo 130.000m² de área construída e 38.500m² de área para comercialização. Recentemente houve a construção de um píer de 1.500 m² para receber grandes veículos. O restante da Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Marcia C. de Azevedo, José H. Bassi Souza Sperancini, Luis Hernan C. Pinochet, Inês A. M. Mandelli

área é destinado ao tráfego de caminhões e carretas e estacionamento. Recebe produtos de 700 localidades, do estado de São Paulo e sul de Minas Gerais para abaster a RMC. Recebe a maior parte de seus compradores de um raio de 200 a 300 Km, de praticamente todas as regiões do estado de São Paulo, abastecendo mais de 500 municípios, 700 localidades do Brasil e aproximadamente 10 países. Fora do estado seus produtos atingem, principalmente, o sul de Minas, Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro, norte do Paraná, Goiás e o Distrito Federal. Semanalmente circulam na Ceasa por volta de 15 mil pessoas e 5 mil veículos de carga em dias de mercado. Suas atividades movimentam cerca de 3 mil empregos diretos e 18 mil indiretos, sem contar com os trabalhadores do Campo. “É uma cidade dentro da cidade com toda infraestrutura de serviços: bancos, lanchonetes, restaurantes e outros.” (Ceasa, 2017). Quem negocia os produtos agrícolas na Ceasa não é a própria Central, mas sim micro, pequenas, médias e grandes empresas, denominadas de “permissionários”. Essas empresas que atuam no interior e usam a infraestrutura da Central negociam anualmente cerca de 613 mil toneladas de frutas, verduras e legumes (2016); volume que gera vendas de cerca de R$ 637.900 milhões por ano de faturamento. Os permissionários recebem mensalmente clientes vindos das cinco regiões do Brasil e dos mais variados ramos - atacadistas, supermercados, varejões, hotéis, restaurantes, entre outros (Tabela 1). O consumidor final dificilmente frequenta a Ceasa. Em pesquisa realizada pela Central de Abastecimento a participação desse segmento chega a 3% e é mais comum a presença aos sábados, das 8 as 13h no varejão. Tabela 1. Clientes da Ceasa Campinas.

CLIENTES DA CEASA

%

Varejões e quitandas

13

Supermercados

40

Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

Feirantes e ambulantes

10

Atacadistas

20

Restaurantes e hotéis

14

Consumidor Final

3

Fonte: Ceasa Campinas, 2017.

A área de comercialização de hortifrutigranjeiros possui dois tipos de espaços: 134 boxes, localizados no setor de galpões permanentes (GP’s), com área entre 90 m² e 126 m² e 707 módulos, localizados no setor de módulos livres (ML’s), com 8 m². Existem quatro setores de galpões permanentes e quatro setores de módulos livres. A Ceasa conta atualmente com cerca de 390 permissionários de hortifrutigranjeiros e 190 de atípicos. Atualmente 120 permissionários atuam nos boxes, comercializando frutas, e 460 nos módulos também denominados pedras, que comercializam legumes e verduras. A troca de permissionários ocorre por meio da comercialização do ponto de venda entre o permissionário e a parte interessada. O valor do ponto de venda é influenciado pela localização, volume de venda e pelo tipo de produto comercializado e o custo total é acertado entre os interessados. A Ceasa recebe apenas uma taxa de transferência de acordo com a metragem envolvida na negociação. A comunicação da Ceasa com os permissionários é estabelecida pela ASSOCEASA - Associação dos Permissionários da Ceasa Campinas, que atua como ouvidoria e controladoria. A entidade periodicamente convoca reuniões com seus representantes para discutir em assembleia temas relativos ao funcionamento da Central e a implementação de soluções pertinentes. O volume de hortifrutigranjeiros ofertado pela Ceasa Campinas aumentou sistematicamente de 1997 até 2012, passando de 564.771 toneladas para 686.915 toneladas, o que correspondeu a um incremento de 22% (Gráfico 1). A partir de 2012 o volume começou a diminuir e em apenas dois anos, entre 2012 e 2014, houve 81


Inovação em logística para pequenos produtores agrícolas: as centrais de abastecimento – ceasa

uma redução drástica de aproximadamente 25%, tal redução está associada em parte à crise econômica no país, mas também a uma mudança de sistemática de contabilização do volume comercializado. A partir de 2014, com a manutenção da nova sistemática

de registro de volume comercializado, foi observada uma retomada no crescimento, com os volumes de hortifrutigranjeiros atingindo 613.083 toneladas em 2016, o que corresponde a um aumento de 8% ao obtido em 1997.

Gráfico 1. Ceasa-Campinas: Evolução Anual do Volume de Hortifrutigranjeiros Ofertado em Toneladas 1997/2016.

Fonte: Ceasa Campinas, 2016.

4.2. A CEASA NO MERCADO DE DISTRIBUIÇÃO DE HORTIFRUTIGRANJEIROS No negócio operado pelas centrais de abastecimento existem inúmeros fatores que interferem nas barreiras à entrada. No que se refere à “economia de escala” podese imaginar que não é qualquer empresa que conseguiria se estabelecer em uma localização privilegiada e desenvolver uma capacidade logística e uma infraestrutura capaz de receber milhares de clientes. Tal vantagem comparativa da Ceasa teve uma evolução gradual de mais de 40 anos. Convivendo com permissionários 82

e seus clientes, adaptando sistemas e gerenciando fluxos e espaços foi possível à Ceasa detectar e solucionar problemas de forma a atender da melhor maneira possível seus usuários. Desse modo, no que se refere a sua localização, a Ceasa ocupa uma posição de monopólio. O custo para construir e manter uma estrutura como essa é de tal ordem que acaba por tornar o empreendimento pouco atrativo para possíveis concorrentes. Na figura 1 a seguir, elaborada com base no modelo de Porter, podemos observar em destaque quais são os elementos da Estrutura Industrial que influenciam o negócio da Ceasa Campinas. Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Marcia C. de Azevedo, José H. Bassi Souza Sperancini, Luis Hernan C. Pinochet, Inês A. M. Mandelli

Figura 1. Análise da Indústria no Caso Ceasa.

Fonte: Elaboração dos autores.

Para qualquer entidade interessada em entrar no mercado da Ceasa o volume de negócios e o baixo retorno acabam dificultando “ganhos de escala” constituindo-se assim em barreiras de entrada. O montante de capital necessário para o capital fixo e para divulgar uma nova marca em comparação com o que é possível obter de retorno provavelmente reduzem a atratividade do empreendimento. Quanto ao “acesso à distribuição” a localização da Ceasa possibilita uma fácil logística para transportadores, permissionários e clientes. Está localizada a 100 km de São Paulo com acesso fácil à grandes rodovias como: Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

Anhanguera, Bandeirantes, Santos Dumont, Fernão Dias, Carvalho Pinto e Dutra. Os consumidores da Ceasa podem optar por outros canais de abastecimento como hipermercados. A indústria, por exemplo, pode chegar ao produtor sem passar necessariamente pela Ceasa. O modo de vida nas grandes cidades brasileiras tem levado as famílias a buscar mais praticidade no que se refere à alimentação. Na antiga família patriarcal somente o homem trabalhava e a mulher cuidava da casa e das crianças. Nos dias atuais ambos trabalham e a busca pela praticidade leva as famílias a pagar um 83


Inovação em logística para pequenos produtores agrícolas: as centrais de abastecimento – ceasa

preço maior pelos produtos pré-prontos, o que reduz a demanda por produtos hortifrutigranjeiros in natura. Desse modo, é possível que muitas famílias passem a procurar alimentos prontos e pré-prontos em supermercados e restaurante, o que diminuiria a procura pelos serviços da Ceasa. Ciente desses fatos a Ceasa procura ampliar seu “acesso a insumos necessários” investindo na ampliação do mix de bens colocados à disposição de seus clientes. As vantagens de “custos absolutos” criadas pela otimização do atendimento e da infraestrutura geram um custo reduzido para os usuários da Ceasa. Na verdade, o custo reduzido é mesmo uma necessidade já que no segmento de hortifrutigranjeiros o custo fixo tende a ter uma grande participação no preço final do produto. Os hortifrutigranjeiros apresentam um valor unitário relativamente baixo, portanto, diluir o custo fixo em um volume grande é um fator decisivo na obtenção de preços competitivos. Assim, qualquer novo empreendimento que queira entrar no negócio ou substituir a Ceasa terá que oferecer um custo de infraestrutura bastante reduzido. Essa barreira à entrada pode ser ainda maior se considerarmos o risco envolvido no empreendimento e a necessidade de apoio governamental para execução de obras civis que causam impactos grandes no meio ambiente e no sistema de transporte. Em relação à “curva de aprendizagem”, saber operar com os fornecedores e com os compradores, suas características, demandas, formas de pagamento e problemas logísticos é um capital importante. Ao longo de 40 anos de existência os operadores da Ceasa trilharam uma “curva de aprendizagem” adquirindo conhecimentos sobre produtos, produtores, consumidores e determinantes de demanda que não estão disponíveis para qualquer entrante. As tecnologias de processo, manuseio de material, armazenamento, transporte e relacionamento com os clientes estão, na verdade, dispersas entre a gerência da Ceasa e os permissionários que possuem total liberdade para tomar decisões. Em relação aos determinantes da rivalidade 84

um elemento importante é a “identidade da marca”. Atualmente, quando um feirante, quitanda ou supermercado pensa em distribuição de produtos hortifrutigranjeiros a primeira referência que é lembrada é a Ceasa. Em função do conhecimento acumulado ao longo dos anos a “complexidade informacional” é outro aspecto significativo da vantagem competitiva da Ceasa. Os determinantes de poder do fornecedor jogam um peso menor na estrutura da “indústria” de hortifrutigranjeiros já que, em geral, atingem os agentes de forma horizontal. Fornecedores de insumos agrícolas determinam o preço final de todos os agentes, embora os grandes permissionários possam obter vantagem na negociação de grandes volumes. A disponibilidade de empresas de serviços de transporte em grande quantidade diminui o risco de altos custos na mudança de fornecedores. Quanto aos determinantes do poder do comprador é de grande importância o papel que alguns grandes grupos de supermercados representam. A concentração desses clientes em grandes redes pode gerar um efeito de substituição de parte dos serviços da Ceasa. É o caso, por exemplo, de “Centros de Distribuições - CDs” que, integrando a indústria para trás, centralizam as compras diretamente junto aos produtores. Mas, por uma questão de ordem econômica, existem dificuldades no modelo de CDs em função do seu custo de construção e manutenção. 4.3. OS COMPONENTES E A CONCORRÊNCIA NO INTERIOR DA CEASA Para entender a lógica econômica que se estabelece entre os agentes que atuam na Ceasa é necessário, em primeiro lugar, definir quem são esses agentes. Existem dois grupos distintos de permissionários. Os permissionários comerciantes que somente comercializam produtos de terceiros e os permissionários produtores agrícolas. Nesse último grupo encontram-se o produtor que somente comercializa o produto que produz e o Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Marcia C. de Azevedo, José H. Bassi Souza Sperancini, Luis Hernan C. Pinochet, Inês A. M. Mandelli

produtor-comerciante que, além de vender os produtos de sua propriedade, também comercializa produtos de outros produtores agrícolas. Assim em relação a origem dos produtos comercializados na Ceasa existem três tipos de permissionários: o comerciante, o produtor e o produtor-comerciante.

Atualmente existem cerca de 390 permissionários de hortifrutigranjeiros, aproximadamente 30% são produtores, 70% são produtores-comerciantes e 20% comerciantes. O faturamento desses agentes pode ser classificado conforme o Quadro 3 a seguir:

Tabela 2. Faixa de Faturamento Aproximada dos Permissionários.

Permissionário

Mínimo Anual R$

Máximo Anual R$

Comerciante

300.000,00

3.000.000,00

Produtor

100.000,00

200.000,00

Produtor-comerciante

100.000,00

3.000.000,00

Fonte: Elaboração própria – Dados Ceasa (2017).

Deve-se ressaltar que a proposta inicial da Ceasa, que era de reduzir o papel do atacadista na distribuição de alimentos, e assim melhorar a eficiência do sistema, acabou sendo limitada ao longo dos anos. No início a Ceasa Campinas conseguiu ter entre seus permissionários 40% de pequenos produtores do total de permissionários, essa participação caiu ao longo dos anos, e atualmente esse percentual está em 30%. Essa queda pode ser melhor entendida ao se analisar as dificuldades relatadas pelos pequenos produtores, tais como falta de conhecimento sobre gestão, tributação dos produtos, estratégias para lidar com a sazonalidade dos produtos, habilidades de negociação, atendimento aos clientes, divulgação da empresa e dos produtos e conhecimento de formação de preços, entre outros. As habilidades necessárias no processo de comercialização são muito diferentes daquelas necessárias à produção. Inicialmente os pequenos proprietários avaliavam como muito vantajosa a comercialização dos seus produtos direto na Ceasa em função do melhor preço obtido com a venda. No entanto, muitos não possuíam as habilidades comerciais necessárias, o que acarretava em faturamentos menores e gastos maiores do que o estimado. Com um retorno abaixo do esperado, muitos pequenos produtores desistiram da comercialização direta. Esse fato indica a necessidade de políticas amplas em processos de reestruturação de mercados. Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

4.4. OS PERMISSIONÁRIOS “COMERCIANTES” OU “NÃO PRODUTORES” Os permissionários comerciantes se estabelecem na Ceasa para comercializar mercadorias produzidas por outros agentes econômicos. Esses permissionários fecham contratos de fidelidade com produtores, normalmente de forma verbal. Desse modo, passam a reter o “direito” de comercializar o produto de um fornecedor. Em alguns casos chegam a monopolizar o comércio de alguns bens. Especializando-se na comercialização dos produtos e formando carteiras de clientes e fornecedores, desenvolvem a vantagem da atualização constante a respeito das qualidades e especificidades de cada região e, principalmente, da variação de preço. A comercialização de produtos perecíveis requer muito cuidado, habilidade e conhecimento em termos de colheita, acondicionamento e manuseio, além de uma grande agilidade no transporte do produto. A garantia da oferta de produtos com qualidade é essencial para atender os clientes e se manter no mercado. Por isso, no caso do permissionário comerciante, ele precisa construir um bom relacionamento com os fornecedores, de forma a garantir a entrega de produtos de qualidade no prazo exigido. Diferentemente de outros tipos de permissionários, os não produtores estabelecem uma relação mais mercantil com a estrutura da indústria. Procuram, com 85


Inovação em logística para pequenos produtores agrícolas: as centrais de abastecimento – ceasa

a garantia de entrega para supermercados, varejões, quitandas e restaurantes, desenvolver uma vantagem competitiva sobre os demais permissionários. 4.5. OS PERMISSIONÁRIOS PRODUTORES Existem dois tipos de permissionários produtores: o produtor e o produtor– comerciante. O primeiro, comercializa somente sua produção, geralmente, de pequena ou média escala, já o produtorcomerciante também comercializa produtos de terceiros, comprando a lavoura de vizinhos ou arrendando terras de pequenos proprietários. O PRODUTOR-COMERCIANTE Os produtores-comerciantes geralmente compram a produção de pequenos produtores para obter um maior controle do mercado. Com esse sistema eles procuram complementar sua produção de forma a atender adequadamente a demanda, tanto em termos de quantidade, quanto de variedade de produtos. Apesar de agirem como atravessadores eles deixam espaço para que os pequenos se desenvolvam como fornecedores, ao mesmo tempo garantem o monopólio na comercialização de alguns produtos. Muitos destes produtores– comerciantes possuem plantações em diversas regiões do país e escritórios em vários estados, ou seja, controlam uma estrutura complexa e imensa que praticamente comanda o mercado de alguns produtos. Em termos de posição na cadeia produtiva, estão próximos aos “atacadistas” contra os quais as Ceasas foram pensadas. Ocorre que um relacionamento honesto, franco e duradouro gera vantagens de rentabilidade já que o permissionário mantém a sua disposição uma rede de produtores altamente empenhada em melhorias constantes. Com isso propicia a prosperidade de seu empreendimento e o sucesso de seus parceiros. Em geral o permissionário produtorcomerciante é “conhecido” de longa data dos pequenos produtores rurais. Com esse 86

relacionamento os produtores familiares correm menos risco e não precisam se aventurar em um mercado altamente competitivo como o de distribuição. Para o permissionário esse relacionamento é uma vantagem competitiva já que está sempre em contato com o lado da oferta e atualizado a respeito das alterações referentes à especificidades da demanda. Tornam, assim, a “indústria” mais técnica, estimulando a oferta e os ganhos em qualidade e produtividade, o que, em outras palavras, significa otimização de lucros. Tauile (2009), por exemplo, buscou demonstrar os ganhos de produtividade em empresas autogeridas em relação às empresas tradicionais e as vantagens (lucrativas) em conferir mecanismos de participação aos trabalhadores. Mantendo-se fiel aos produtores que não comercializam diretamente na Ceasa e que sofrem por não dispor de possibilidades de escoamento de sua produção, o permissionário comerciante depende e se dedica ao desenvolvimento do sistema de parceria. Isso é possível porque na parceria os custos fixos são diluídos pelo sistema não sobrecarregando nenhum dos parceiros e permitindo o foco na qualidade do produto e na garantia de atendimento. Diante do pequeno produtor familiar o produtor-comerciante, apesar de possuir alto poder de barganha, procura construir uma relação próxima a um sistema de parceria. Comercializar produtos sensíveis requer muito cuidado e conhecimento. A garantia de entrega é um fator essencial para se manter no mercado e atender a clientela, por isso, é preciso cuidar do relacionamento para garantir a entrega do produto no prazo e em condições adequadas. Assim, a relação entre os dois agentes não é puramente mercantil já que ambos “vivenciam” o drama da produção rural e, muitas vezes se apoiam mutuamente. O acesso do produtor não permissionário ao mercado da Ceasa, por meio do permissionário comerciante, reduz o perigo de oligopolização do mercado. Também amplia as condições práticas de desenvolvimento empresarial do pequeno produtor agrícola não permissionário. Assim, surge uma Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Marcia C. de Azevedo, José H. Bassi Souza Sperancini, Luis Hernan C. Pinochet, Inês A. M. Mandelli

estrutura produtiva menos oligopolizada, excludente e desigual do que aquela vigente até os anos 1960. O permissionário comerciante procura preços baixos. Porém, seu negócio também depende da qualidade, da disponibilidade, da garantia de entrega, da pontualidade, da segurança nos contratos, da variedade de bens e da logística. Assim, a confiança é um elemento central na relação entre permissionário e produtor. O PERMISSIONÁRIO PRODUTOR O permissionário produtor movimenta um volume reduzido de mercadorias em comparação aos demais permissionários. Entretanto, consegue permanecer no mercado já que este não é bloqueado por escala de produção ou por questões tecnológicas. O pequeno/médio produtor consegue lucros maiores vendendo diretamente, já o que o custo de armazenamento disponibilizado pela Ceasa é pequeno e, devido ao fato de que, na cadeia de produção, somente ele e os vendedores finais (supermercados, quitandas, feiras ...) adicionam valor. O atravessador que deprimia os preços dos produtos nas décadas de 1950 e 1960 teve sua participação na estrutura produtiva reduzida nos mercados onde a Ceasa opera. Por conta da relação de dependência que o pequeno proprietário familiar estabelece com sua propriedade, fonte de sobrevivência e bem estar de sua família, ocorre uma relação particular deste produtor com seu produto. É uma relação diferente daquela estabelecida, por exemplo, pelo grande comerciante. Existe um sentimento mais próximo à “criação artesanal” do que à produção de uma mercadoria. Para o pequeno proprietário seu produto é, na sua percepção, quase sempre, o melhor disponível no mercado. Essa carga emocional se manifesta quando o pequeno produtor procura valorizar ao máximo seu produto diante do comprador. De fato, como já afirmavam Mises (2006) e Hayek (1945, 2002 e 2013), o valor é subjetivo Outro ponto a ser ressaltado é que entre os pequenos produtores permissionários se Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

estabelece uma relação de camaradagem. Esses procuram “passar” seus pedidos para outros produtores no caso de não ser concretizada uma negociação. Já os grandes proprietários estabelecem uma relação mercantil com sua estrutura de produção, com seu produto e com os demais permissionários. Todavia essa relação mais mercantil e burocratizada muitas vezes não é capaz de estabelecer uma garantia de entrega de produtos com as características necessárias. Assim, o pequeno produtor, tanto no âmbito da Ceasa, como comercializando em conjunto com supermercados, varejões, quitandas e restaurantes, consegue se desenvolver, sobretudo aproveitando as brechas deixadas pelos grandes produtores. Com a garantia de entrega e a qualidade do produto consegue manter clientes fiéis operando nos espaços não ocupados ou não atendidos de forma permanente pelos comerciantes. O SISTEMA CEASA: ENTRE A INOVAÇÃO LOGÍSTICA E A PRODUÇÃO ARTESANAL O acesso do produtor, principalmente do pequeno produtor familiar, à condição de permissionário possibilita o desenvolvimento de seu empreendimento agrícola em paralelo ao grande produtor. Assim, a Ceasa serve como um importante instrumento de controle da oligopolização do mercado e de ampliação das condições práticas de desenvolvimento empresarial do pequeno produtor rural. Esse é um fator fundamental, é preciso reconhecer, para uma distribuição mais equitativa da propriedade agrícola, das oportunidades de negócio, do emprego e da renda no segmento de hortifrutigranjeiro. As Ceasas de grandes cidades vêm atendendo diversos municípios e regiões. Entretanto, está ocorrendo um processo de regionalização, através da instalação de inúmeras Ceasas em cidades menores. Dependendo da distância da cidade, em relação à Ceasa mais próxima, o custo do transporte, devido aos gastos com pedágio e combustível, passa a encarecer em demasia os produtos, que já se caracterizam por 87


Inovação em logística para pequenos produtores agrícolas: as centrais de abastecimento – ceasa

apresentar baixo preço para grandes volumes. O crescimento econômico e populacional das pequenas cidades também já é um fator que tende a criar mercados importantes para hortifrutigranjeiros. Assim, surge uma nova “fronteira” que será ocupada, sobretudo, por pequenos mercados e pequenos produtores. Quem pode se beneficiar com a nova expansão do mercado de hortifrutigranjeiros não será apenas o grande proprietário e permissionário que negocia em escala nacional, mas também o pequeno produtor local. Na Ceasa os permissionários podem ser diferenciados segundo produto, preço e

qualidade. Cada permissionário tem uma gama de produtos, próprios ou de terceiros, que ele comercializa. Dessa forma ele se torna conhecido e cria uma clientela fiel a seus produtos e preços. Entretanto, o preço no mercado de hortifrutigranjeiros é um fator imprevisível já que existem várias classes de produtos, como pode ser visto no quadro 2 a seguir, as quais dependem de inúmeras variáveis climáticas. A capacidade de monitorar essas variáveis é otimizada na Central. Lá é possível avaliar as tendências de um mercado que opera com produtos perecíveis e de baixo preço e cujas negociações são sempre muito velozes.

Quadro 2. Classificação de Produtos.

Classificação de Produtos

Qualidade

Tamanho

Durabilidade

Preço

Classe 1

Alta

Grande

Longo Prazo

Alto

Classe 2

Intermediária

Médio

Intermediária

Intermediário

Classe 3

Baixa

Pequeno

Curto Prazo

Baixo

Fonte: Elaboração própria.

A Ceasa é um local que centraliza informações sobre o negócio de hortifrutigranjeiros, o que possibilita que seus usuários tenham acesso a uma visão ampla do setor. Somente os agentes que convivem diariamente nas negociações conseguem obter vantagem por meio de informações exclusivas. Os permissionários mais experientes conseguem negociar em melhores condições, obtendo e analisando dados sobre quantidade e qualidade dos produtos, previsões do tempo, safra, divulgação de determinados produtos nos meios de comunicação e novas descobertas sobre os benefícios dos hortifrutigranjeiros para a saúde. Um desequilíbrio entre a oferta e a procura pode gerar uma guerra de preços entre os permissionários. Entretanto, como os produtos são perecíveis e suas características físicas são inúmeras (qualidade, durabilidade, maturação, etc...) não existe a possibilidade de manter estoques de produtos homogêneos. Cada permissionário negocia produtos com características distintas dos demais. Toda essa gama de informações vai ser levada em conta nas negociações entre os produtores, os clientes e os permissionários. 88

Apesar da oportunidade que a Ceasa oferece aos agentes monitorarem o mercado, o comportamento dos produtores, dos permissionários e dos clientes não obedece cegamente às leis de mercado. Do lado dos produtores não há uma relação puramente mercantil com seus produtos. Apesar de parecer inusitado, os pequenos e médios produtores, característicos da agricultura familiar, mantém uma relação até certo ponto emocional com os produtos que geram. Pelo lado dos permissionários existe todo um universo de amizade, respeito, lealdade e camaradagem com os colegas. Ao analisar o sistema produtivo dos pequenos e médios agricultores pode-se entender melhor o porquê desta relação tão especial dos produtores com o produto de seu trabalho. Para Martins de Carvalho (2004):

A ideologia dominante de seletividade social e econômica subjacente ao conceito de agricultura familiar, aliada à idéia subalterna de que camponês deve ser sempre um pobre que luta para sobreviver a partir de um processo de produção com baixo desenvolvimento das forças produtivas, tem dificultado o processo de se repensar o camponês sob uma outra perspectiva. Nela, o camponês é um produtor rural cuja racionalidade é centrada na reprodução social da família e com capacidade de

Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Marcia C. de Azevedo, José H. Bassi Souza Sperancini, Luis Hernan C. Pinochet, Inês A. M. Mandelli

gerar renda agrícola que lhe proporcione padrões de consumo familiar e de investimentos produtivos crescentes, sem que para tal estabeleça relações de produção capitalista.

Embora se dirigindo sobretudo aos produtores autônomos, Carvalho (2004) nos dá uma pista para entender como o pequeno produtor que abastece a Ceasa se relaciona com sua propriedade. Segundo esse autor a racionalidade é centrada na reprodução da família e não no lucro. Apesar disso existe uma preocupação com a melhoria da qualidade de vida e com o desenvolvimento das forças produtivas para redução das dificuldades associadas ao trabalho familiar. Carvalho argumenta que a empresa camponesa não é capitalista apesar da inserção dos seus produtos no mercado e a pretensão de melhoria das suas condições de vida e de trabalho pelo aumento da qualidade e da quantidade dos produtos para o autoconsumo, para a venda no mercado, assim como a aquisição de bens de consumo familiar. O que distingue a empresa camponesa da empresa capitalista é a relação social de produção. Na empresa capitalista essa relação é de assalariamento enquanto na empresa camponesa a força de trabalho é fundamentalmente familiar. É essa força de trabalho que decide o que, quando e como produzir. Também é ela a beneficiária da produção. Mesmo a contratação temporária e parcial de mão de obra não retira da pequena empresa agrícola seu caráter de “reprodução social da família”. Para o pequeno produtor a relação que constrói com seus produtos se assemelha à relação do artesão com suas obras. Muitos dos fatores que condicionam a produção, como, por exemplo, clima e custos (defensivos, sementes, maquinários, etc...) apresentam um grau enorme de incerteza. O capital imobilizado e o tempo de dedicação do produtor estão ligados a um produto de retorno incerto quanto a preço, riscos de perda, volume de produção e aceitação no mercado. Para que esse produto seja comercializado ele deve estar no melhor estado possível e nas condições de consumo ideal. Além disso, muitas vezes o pequeno agricultor enfrenta inesperados excessos de Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

oferta ou baixas repentinas na demanda. Com isso o preço muitas vezes não atinge o esperado, o que faz com que o capital investido e o tempo de dedicação à terra e à produção não sejam recompensados. O produtor é penalizado por fatores que não controla e para os quais suas forças e habilidades são impotentes. Por isso, a relação desse agricultor com seu produto é forte e emotiva. Seu produto é a esperança de fonte de renda para o sustento familiar, de redução da sua carga de trabalho e de investimento na próxima safra.

5. CONCLUSÕES E CONSIDERAÇÕES FINAIS Este trabalho identificou que as empresas de hortifrutigranjeiros que atuam na Ceasa, denominadas de “Permissionários”, são divididas em dois grupos: aqueles que não são produtores e comercializam gêneros de produtores rurais e os permissionários que são produtores agrícolas. Nesse último grupo encontram-se os produtores que comercializam somente os bens que produzem e os produtores-comerciantes que além de vender os produtos de suas propriedades também comercializam gêneros de outros produtores. Analisando os três tipos de permissionários foi possível ampliar o conhecimento sobre este mercado e identificar que uma parte das empresas do sistema Ceasa não se relaciona comercialmente de forma tipicamente capitalista. Na realidade existem dois tipos de relações fundamentais nesse sistema produtivo que pouco tem de capitalista. Pelo lado do produtor existe uma relação emotiva com sua produção. O objetivo último de sua “empresa” não é apenas o lucro, como poderia se esperar de uma empresa capitalista. O objetivo do produtor é elevar a renda da família e reduzir a carga de trabalho. A força de trabalho que atua nessas empresas é, também, familiar. Assim, não é possível descrever essas empresas através de categorias tipicamente capitalistas. Entre os permissionários existe um relacionamento muito diferente do que 89


Inovação em logística para pequenos produtores agrícolas: as centrais de abastecimento – ceasa

ocorre no mundo capitalista. Apesar do ambiente moderno de crescentes exigências de eficiência e acirramento das rivalidades empresariais, foi detectado, no caso estudo, uma relação de confiança e camaradagem entre as empresas familiares. Deve-se ressaltar também que a proposta inicial da Ceasa de reduzir o papel do atacadista na distribuição de alimentos e assim melhorar a eficiência do sistema acabou sendo limitada ao longo dos anos. No início a Ceasa Campinas conseguiu ter entre seus permissionários 40% de pequenos produtores e atualmente esse percentual está em apenas 15%. Esse fato indica a necessidade de políticas amplas em processos de reestruturação de mercados. Existe uma iniciativa ainda tímida de um novo pavilhão que atenda exclusivamente os pequenos produtores familiares, mas que não gera os resultados esperados. No caso da Ceasa, além de mudanças no sistema de distribuição, seriam necessárias também ações na área educacional, com o objetivo de qualificá-los para atividades comerciais. Para transformar os pequenos produtores em comerciantes não é suficiente apenas fornecer o espaço físico para a comercialização dos produtos. Habilitá-los para novas funções e tecnologias é fundamental para que consigam usufruir dos benefícios da dinâmica dos mercados mais sofisticados.

6.

REFERÊNCIAS

AMABILE, T. M.; GRYSKIEWICZ, S. S. The creative environment scales: the work environment inventory. Creativity Research Journal, v.2, p.231-54, 1989. BELL, M.; PAVITT, K. Technological accumulation and industrial growth: contrasts between developed and developing countries. Industrial and corporate change, vol. 2, n. 2, Oxford University Press, p. 157210, 1993. BRYMAN, A.; BELL, E. Business Research Methods. 3. ed. New York: Oxford University Press. 2011. CARVALHO, Horácio Martins de. Repensando o Campesinato. Jornal Pastoral da Terra, Goiânia, p. 14, jul. 2004. CENTRAIS DE ABASTECIMENTO DE CAMPINAS S.A. Conheça a CEASA Campinas. Campinas: Ceasa. Disponível em: <http://www. ceasacampinas.com.br/>. Acesso em: 8 fev. 2017. CENTRAIS DE ABASTECIMENTO DE 90

CAMPINAS S.A. Estatuto da CEASA Campinas. Campinas: Ceasa. Disponível em: <http://www. ceasacampinas.com.br/cc_estatuto.htm>. Acesso em: 8 fev. 2017. CHESBROUGH, H. W. Open Innovation: The new imperative for creating and profiting from technology. Bringhton: Harvard Business, 2006. COOPER, R. G. Benchmarking new product performance: results of the best pratices study. European Management Journal, v.16, n.1, p.1-17, 1998. COVIN, J. G.; MILES, M. P. Corporate entrepreneurship and the pursuit of competitive advantage. Entrepreneurship: theory and practice, Spring, p. 47-63. 1999. ERNST, H. Success factors of new product development: a review of the empirical literature. International Journal of Management Reviews, v.4, p.1–40. 2002. Gil, A. C. Métodos e técnicas de pesquisa social. 5. ed. São Paulo: Atlas, 1999. HAMEL, G. The why, what and how of innovation management. Harvard Bussiness Review, v. 84, n. 2, p. 72-84. 2006. HASHIM, M. K.; MUSTAFA, Z.; FAWZI, D. A. Relationships between organizational structure, human resource practices and organizational culture. Journal of Technology Management Entrepreneurship, v.1, n.1. 2005. HAYEK, Friedrich A. “The use of knowledge in society”, American Economic Review, vol. XXXV, n. 4, 1945, pp. 519-530. HAYEK, Friedrich August von. Competition as a Discovery Procedure. The Quarterly Journal of Austrian Economics Vol. 5, No. 3 (Fall 2002): 9–23. HAYEK, Friedrich August von. O Caminho da Servidão. Primeira edição, Chicago: University of Chicago Press, 1944. São Paulo: Vide Editorial, 2013. HODGSON, Geoffrey. M.. Capitalism, Complexity, and Inequality. Journal of Economic. Vol. 37, No. 2 (Jun., 2003a), pp. 471-478. Published by: Association for Evolutionary Economics. http://www.geoffreyhodgson.info/user/image/capitalismcomplexity.pdf. MANKIW, N. Gregory. Introdução à economia: princípios de micro e macroeconomia. 2.ed. Rio de Janeiro: Campus, 2001. METCALFE, John S. & Foster, John & Ramlogan, Ronnie, 2003. “Adaptive Economic Growth,” Centre on Regulation and Competition (CRC) Working papers 30637, University of Manchester, Institute for Development Policy and Management (IDPM). MISES, Ludwig von. Economic Policy: thoughts for today and tomorrow”. Third Edition, Auburn: Ludwig von Mises Institute, 2006. ORGANISATION FOR ECONOMIC COOPERATION AND DEVELOPMENT. Oslo Manual: principes directeurs pour le recueil et l’interprétation des données sur l’innovation. Troisième édition. Paris: OECD, 2005. PETTIGREW, A.; FERLIE, E.; MCKEE, L. Shaping Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Marcia C. de Azevedo, José H. Bassi Souza Sperancini, Luis Hernan C. Pinochet, Inês A. M. Mandelli

Strategic Change. London: Sage Publications, Cap 2 Understanding the process of organizational change, p. 5-30. 1992. PORTER, Michael. A vantagem competitiva das nações. Rio de Janeiro: Campus, 1989. PORTER, Michael. Vantagem competitiva: criando e sustentando um desempenho superior. Rio de Janeiro: Campus, 1990. SCHUMPETER, Joseph A. A teoria do desenvolvimento econômico: uma investigação sobre lucros, capital, crédito, juro e o ciclo econômico. 3.ed. São Paulo: Nova Cultural, 1985. TAUILE, J. R. Trabalho, autogestão e desenvolvimento. In: Escritos escolhidos 1981-2005. Rio de Janeiro: Editora UFRJ. (2009). TRIVIÑOS, Augusto N. S. Introdução à pesquisa em ciências sociais. São Paulo: Atlas, 1987. VASCONCELOS, F; CYRINO, A. Vantagem competitiva: os modelos teóricos e a convergência entre estratégia e teoria organizacional. RAE – Revista de Administração de Empresas, out./dez, São Paulo: v.40, n.4, p.20-37. 2000. VIAN, Carlos E. de Freitas; PITELLI, Mariusa M. Estrutura de mercado e introdução à economia industrial. In: VIAN, C. E. F.; PELLEGRINO, A.; PAIVA, C. Economia: fundamentos e práticas aplicadas à realidade brasileira. Campinas: Alínea, 2005. YIN, R. K. Case Study Research: Design and Methods (Applied Social Research Methods). 5.ed. SAGE Publications, 2013.

Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

91


Mentoria para empreendedores: análise da essência do negócio

REVISTA DE EMPREENDEDORISMO, NEGÓCIOS E INOVAÇÃO

MENTORIA PARA EMPREENDEDORES: ANÁLISE DA ESSÊNCIA DO NEGÓCIO

ISSN 2448-3664

MENTORING FOR ENTREPRENEURS: ANALYSIS BUSINESS ESSENCE RESUMO Antero Paulo dos Santos Matias Universidade Metodista de São Paulo - antero.matias@ metodista.br

Partir de uma ideia para criar uma empresa parece ser o caminho mais comum na vida de um empreendedor e tal ação, provavelmente, tenha início quando ele, na sua rotina diária de afazeres, percebe a existência de uma oportunidade oriunda de um problema pelo qual esteja passando. Converter uma ideia em um negócio estruturado não é simples. O artigo pretende apresentar um instrumento criado para identificar se a ideia inicial é capaz de transformar-se em negócio, ou seja, seria possível identificar as falhas ou gaps existentes na formulação da ideia empreendedora permitindo ao empreendedor melhorar o desempenho desta ideia frente ao seu segmento de cliente? O uso deste instrumento facilitaria as ações do processo de mentoria, permitindo a análise e a orientação mais adequadas, reduzindo a necessidade de contar somente com a experiência do mentor, padronizando este processo? As dimensões estudadas pelo instrumento procuram mensurar a fortaleza da ideia frente ao seu futuro cliente / usuário, sendo: necessidade atendida, produto, diferencial, clientes, motivo de compra, inovação e processos internos. Tal instrumento poderá ser usado pelos diversos agentes presentes no ecossistema do empreendedor, principalmente aqueles que auxiliam os empreendedores no desenvolvimento e, por que não, na alavancagem financeira da ideia. É útil como apoio de mentores, que podem fazer uso deste instrumento como fonte de orientação e também de mensuração da evolução da ideia, dado que a cada encontro ou momento de mentoria, o instrumento pode ser novamente utilizado e apresentar ao candidato a empreendedor os ganhos obtidos com a mentoria. Palavras-chave: Mentoria, Criação de Empresas, Startup.

ABSTRACT

UNIVERSIDADE FEDERAL DO ABC AVENIDA DOS ESTADOS, 5001 BAIRRO BANGU, SANTO ANDRÉ - SP. CEP 09210-580 E-MAIL:RENI@UFABC.EDU.BR COORDENAÇÃO AGÊNCIA DE INOVAÇÃO INOVAUFABC

With an idea, is possible to create a business and this common way use for the entrepreneur when, in their daily routine tasks, realize that the existence of an opportunity. Change an idea to a business is not simple. The article introduces an instrument designed to identify if the initial idea can to transform a business, that is, it would be possible to identify the gaps in the formulation of the idea’s entrepreneurial allowing the entrepreneur improve the performance of this idea forward to its segment client. The use of this instrument will be able to the actions of the mentoring process, allowing the analysis and the most appropriate orientation, reducing the need to rely solely on the experience of the mentor, standardizing this process. The dimensions studied by the instrument measure the strength of the idea forward to its future customer / user, as follows: need attended, product differential, customers, buying motive, innovation and internal processes. This instrument will be use by the various agents present in the entrepreneurial ecosystem, particularly those entrepreneurs in development aid and, why not, the financial leverage of the idea. It is useful as support of mentors who can make use of this instrument as a source of guidance and also to measure the evolution of the idea, since every meeting or moment of mentoring, the instrument can be used again and submit to the entrepreneur gains with mentoring. Keywords: Mentoring, Business Creation, Startup.

Classificação JEL / JEL Classification: M13 92

Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Antero Paulo dos Santos Matias

1.

INTRODUÇÃO

É notório que o início desta década de 2010 o estímulo à criação de empresas chamadas de Startups tem se desenvolvido, sejam por ações oriundas do poder público, tanto quanto àquelas oriundas da iniciativa privada. Encontros, semanas de imersão, como o Startup Weekend, entre diversas outras iniciativas, tem se espalhado por todo o país. A ABSTARTUPS (Associação Brasileira de Startups) tem em seu site quase 4.000 destas empresas associadas, e este número parece ser somente a ponta de um iceberg. O impacto da atividade empreendedora no crescimento econômico de um país apresenta relação direta com o tipo de motivação para esta atividade. Os motivados por oportunidade têm maior impacto sobre o crescimento econômico, pois são mais bem preparados, desenvolvendo negócios baseados em inovação e novas tecnologias, já os motivados por necessidade, ou seja, aqueles que iniciam uma empresa por estarem fora do mercado de trabalho têm pouco impacto econômico, por motivos inversos aos apresentados anteriormente. (Degen, 2009, p. 15). Na última pesquisa realizada pela Guess Brasil, identificou-se o aumento na intenção de iniciar uma empresa em alunos após 5 anos de sua formatura quando comparados a alunos recém-formados. Do total de alunos recém-formados entrevistados apenas 16,4% deles desejavam criar um negócio próprio, sendo que este número cresceu para 40,5% para os formados após 5 anos de estudos. (Lima, 2011, p. 23). Partir de uma ideia para criar uma empresa parece ser o caminho mais comum na vida de um candidato a empreendedor. Tal ação, provavelmente, tenha início quando este candidato, na sua rotina diária de afazeres, percebe a existência de uma oportunidade oriunda de um problema pelo qual esteja passando. Mas, converter uma ideia em um negócio estruturado não é muito simples. É preciso que se pense no produto que será oferecido, no cliente que irá adquiri-lo e se realmente ele faz sentido na rotina deste cliente, e por fim todo o planejamento e Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

gestão do negócio em si, ou seja, compreender a essência do negócio em si. Ao compreendêla, o candidato a empreendedor será capaz de descrever a razão de ser da empresa para investidores, clientes, fornecedores e para si mesmo, já que, conhecer-se a si e ao seu inimigo garante ao comandante a maioria das vitórias. Portanto, entender a essência do negócio direciona o candidato a empreendedor a caminhos mais calmos, estimulando o repensar do negócio e quando houver a necessidade, remodelá-lo, pivotando-o se for este o caso. Tal situação se faz necessária, já que segundo alguns dados fornecidos por aceleradoras de empresas, aproximadamente 41% das startups encerram suas atividades e 21% dos jovens empreendedores que tentam iniciar uma voltam ao mercado de trabalho. (Perrin, 2015). Outro aspecto importante a se considerar está na descrição da ideia em modelo de negócio. Para buscar participação em desafios ou mesmo acessar programas de fomento ou incubadoras, o candidato a empreendedor não pode se sustentar apenas na criação da ideia, mas descrevê-la por completo, apresentando principalmente qual o problema ela pretende resolver. Atuo como avaliador de empresas que participam de desafios, um deles o 100 Open Startups, e tenho notado que grande parte dos inscritos ainda perambula com sua ideia, achando tratar-se da solução mais inovadora e infalível do mundo. O artigo pretende apresentar um instrumento criado para identificar o quanto da ideia inicial é capaz de transformar-se em negócio, ou seja, seria possível identificar as falhas ou gaps existentes na formulação da ideia empreendedora permitindo ao empreendedor melhorar o desempenho desta ideia frente ao seu segmento de cliente? O uso deste instrumento facilitaria as ações do processo de mentoria, permitindo a análise e a orientação mais adequadas, reduzindo a necessidade de contar somente com a experiência do mentor, padronizando este processo? As dimensões estudadas pelo instrumento procuram mensurar a fortaleza da ideia frente ao seu futuro cliente 93


Mentoria para empreendedores: análise da essência do negócio

/ usuário, já que reconhecer o quanto a ideia atende as necessidades deste cliente é o passo primordial para o sucesso do negócio. São elas: necessidade atendida, produto, diferencial, clientes, motivo de compra, inovação e processos internos. Para sua validação este instrumento foi aplicado a dez ideias de negócios apresentadas por candidatos a empreendedor durante a realização de um projeto de estimulo ao empreendedorismo universitário proposto pela Universidade Metodista de São Paulo denominado Farol Empreendedor. Estes candidatos a empreendedor foram entrevistados durante o momento de conhecimento e idealização da ideia do negócio e contribuíram no preenchimento do instrumento.

2.

REFERÊNCIAL TEÓRICO

2.1. EMPREENDEDORISMO O primeiro uso deste termo foi registrado por Richard Cantillon em 1755 para explicar a receptividade ao risco de comprar algo por um determinado preço e vendê-lo em um regime de incerteza (Hashimoto, 2013, p. 3). O estudo sobre empreendedorismo tem duas correntes principais sob o ponto de vista dos economistas: há aqueles que entendem empreender ligado à inovação e ao desenvolvimento econômico e os que enfatizam o comportamento empreendedor, estudando as atitudes empreendedoras, destacando-se aí a disposição em assumir riscos, bem como a criatividade e a intuição de compreender os problemas e transformálos em ideias. Se perguntássemos a algum leigo no tema como definiria Empreendedorismo, a grande maioria responderia: “Abrir Um Negócio Próprio”. Por esta definição estariam fora: Os herdeiros das empresas; os investidores e os funcionários que gerenciam uma empresa. Então como resolver este imbróglio? Já que podemos entender que existam vertentes que tentam explicar o empreendedorismo, proponho a reflexão da definição sob o ponto de vista de dois 94

autores que tratam do assunto de forma totalmente extrema, até por conta do seu contexto histórico. O primeiro, Schumpeter, economista austríaco no pós-segunda guerra mundial que entende empreendedorismo como: “o empreendedor é o agente do processo de destruição criativa que é o impulso fundamental que aciona e mantém em marcha o motor capitalista, constantemente criando novos produtos, novos métodos de produção, novos mercados e, implacavelmente, sobrepondo-se aos antigos métodos menos eficientes e mais caros” (Degen, 2009, p. 15). Esta definição compreende o empreendedorismo em seu papel de contribuir com a formação da riqueza de um país, por conta do que ele denomina de Destruição Criativa. Este processo traz grandes vantagens ao país e a sua população, que vai dispor, por conta da criatividade oriunda dos empreendedores de novos empregos, de novos produtos e serviços mais eficientes e mais baratos. O estímulo ao empreendedorismo será capaz de alterar os recursos econômicos de uma área de baixa produtividade, transformando em uma área de grande produtividade e lucratividade. Ele também desenvolve pessoas capazes de criar valor, principalmente nas áreas de tecnologia, materiais e por que não preços. Se este estímulo for orientado pelos preceitos do desenvolvimento sustentável, pode auxiliar na resolução dos problemas sociais e ambientais do país. O segundo reside no comportamento da realização de um sonho. Para Dolabela (2010, p.28) o empreendedorismo está diretamente relacionado ao fato de alguém que sonha e busca transformar este sonho em realidade. O próprio autor comenta que esta definição surgiu de seus trabalhos com educação empreendedora para crianças. O dilema era como explicar a crianças de 4 a 5 anos o que era uma empresa, dado que ainda não tinham esta percepção de mundo. Assim, entende que esta definição define empreendedorismo em toda a sua dimensão, e não somente no ato de abrir uma empresa, pois crianças e adultos não devam ser induzidos a abrir empresas, Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Antero Paulo dos Santos Matias

sendo esta uma escolha própria. A palavra sonho refere-se ao desejo que possa refletir a busca pela auto realização, dando origem a um projeto de vida. Se sonhar significa conceber um futuro, empreender determina a transformação deste sonho em realidade, sendo esta a essência do empreendedorismo. Mas, como sonhar em uma sociedade que não nos permite errar? Sempre há alguém nos cobrando resultados, como por exemplo, desde pequenos nos perguntam o que vamos ser quando crescer e não quais os nossos sonhos de vida. O sonho deve atender a alguns requisitos importantes: adequar-se as características, preferências e habilidades do sonhador e ser factível, ou seja, não depender de fatores ou condições que sejam inacessíveis ao sonhador. A busca de transformação do sonho sugere ser necessário um processo e não obrigatoriamente um fim. Assim, a realização de um sonho exige a formulação imediata de novos sonhos. Sob este aspecto é importante entender o surgimento de um novo conceito: o sucesso. Este deve estar muito mais na busca do que na concretização, mais no aprendizado do que na conquista. Pensando desta forma, o fracasso não significa derrota, perda, mas um recomeço. O fracasso não é pessoal, mas do projeto em si. E o projeto aqui não significa construir uma empresa, mas desenvolver uma nova forma de fazer as coisas, escrever um livro, realizar um curso, e porque não se manter em um relacionamento afetivo duradouro. O fracasso não significa não conseguir transformar sonho em realidade, mas desistir de sonhar ou de realizá-lo. Assim, o empreendedor não deve ser considerado um fracassado por não ter realizado aquilo para o que se dispôs, mas deve entender que o projeto fracassou não ele. O empreendedor vê a mudança como seu rumo e a considera sadia, mas não a provoca, está em constante busca por ela, reagindo e explorando-a como sendo uma real oportunidade (Drucker, 2008. p. 36). O conceito de empreendedorismo nasce na empresa, mas é valido para todas as atividades humanas. Empreendedorismo Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

deve ser encarado como uma forma de ser, e a busca por conhecimento nasce no momento em que o indivíduo começa a caminhar para a realização do sonho, isto é, quando descobre que precisa saber algo, assumir comportamentos, aprender ou desenvolver habilidades e competências com o objetivo maior de realizar seu desejo. Como diria Drucker o empreendedorismo é um comportamento e não um traço de personalidade, portanto, aprender a empreender significa liberar potencialidades adormecidas, ainda não testadas, disponibilizando-as para o mundo. (Dolabela, 2010, p.39). Hashimoto (2013, p.5) ressalta que alguns pesquisadores conseguiram compreender as duas facetas do empreendedorismo, uma mais voltada para o papel de criador de novas empresas bem como o papel do comportamento empreendedor, no seu significado de sonhador e realizador, criando o que chamaram de “a essência do empreendedorismo”. Nela residem três elementos muito importantes: • A inovação: O papel do empreendedor não finda na criação de uma empresa, mas na busca constante da criação de novos métodos de produção; abertura de novos mercados; novos e alternativos materiais, bem como a promoção de mudanças estruturais na organização; • O risco: Qualquer projeto está sujeito a riscos. Quanto maior a incerteza, maior a imprevisibilidade dos resultados. Alguns fatores que compõe o risco são as anomalias que os produtos e serviços criados estão sujeitos; a probabilidade de ocorrência destas anomalias; a gravidade das consequências dessas ocorrências. A união destes fatores eleva ou reduz o risco de um determinado empreendimento. • Na autonomia: O empreendedor goza de autonomia para definir os objetivos, decidir sobre o uso de recursos, escolher as estratégias de ação e até mesmo para buscar oportunidades relevantes. É importante não confundir autonomia com independência. Independência 95


Mentoria para empreendedores: análise da essência do negócio

significa trabalhar sozinho, fato este improvável para o perfil de um ser empreendedor, dado que este precisa e depende muito de parceiros, sócios, clientes, fornecedores e funcionários para que seu sonho se realize. Em termos gerais podemos classificar duas grandes vertentes no empreendedorismo: O empreendedorismo de oportunidade: onde o empreendedor visionário sabe onde quer chegar e sua nova empresa apresenta um planejamento prévio, gerando criação de lucros, empregos e riquezas. Aqui estão relacionados principalmente os investidores-anjo que apoiam jovens empreendedores na criação de sua empresa e até mesmo organizações sem fins lucrativos que incentivam jovens por meio de cursos de capacitação, incubadoras e aceleradoras de empresas (Artemísia, Endeavor, etc.). Destacam-se aqui também os empreendedores em série, indivíduos que identificam oportunidades reais de negócios ao analisarem os problemas que as pessoas têm e a partir daí geram ideias e procuram validas, por meio de protótipos. O empreendedorismo de necessidade: onde o empreendedor se aventura na jornada empreendedora mais por falta de opção, por estar desempregado e não ter alternativas de trabalho, apresentando empreendimentos sem planejamento prévio, trabalhando informalmente, o que na maioria das vezes leva ao aumento da mortalidade destas empresas. 2.2. OS JOVENS EMPREENDEDORES É possível ensinar a alguém a empreender? Ou as pessoas já nascem com determinadas capacidades e habilidades empreendedoras e cabe a um mentor somente auxiliá-las no melhor caminho a seguir? Alguns autores, como Dornelas (2001, p.25) comentam que há alguns anos era possível entender que a atividade empreendedora era inata às pessoas, ou seja, alguns fatores como um ambiente familiar empreendedor pudesse ser capaz de determinar se este ou aquele indivíduo será um empreendedor. Tal afirmação vem sendo 96

substituída gradualmente por iniciativas de se ensinar como tornar-se um empreendedor. Para Hashimoto (2013, 8), o termo ensinar empreendedorismo passa a ser visto de outra maneira: aprender a empreender. Desta forma, não se ensina empreendedorismo, mas se trocam informações entre empreendedor, mentor e alunos com o objetivo de novos conhecimentos surgirem desta interação. Neste contexto de conceitos de empreendedorismo, temos a nossa frente o aluno, um jovem com seus vinte e poucos anos, que sonha mas quer vencer na vida profissional. É nesta dicotomia de ideias e num ambiente acadêmico cheio de preconceitos, formando profissionais para o mercado de trabalho e não para realizarem seus sonhos, que o projeto aponta seu Farol Empreendedor. Como lidar com jovens que tentam resolver seus problemas de forma bem diferente da geração de seus pais, mais pautados na estabilidade de empregos formais, evitando o risco e a incerteza? Jovens que realizam conexões a distância, que tem amigos à distância, que realizam várias atividades simultaneamente e que pensam em sucesso imediato? Assim, entende-se que a contemporaneidade trouxe maior complexidade à atividade empreendedora, já que a ruptura com o mundo tradicional vem exigindo do empreendedor uma série de competências não exigidas nas décadas passadas como a capacidade de organização, a intuição, a experiência, a flexibilidade e a visão estrategista, além do otimismo, comprometimento e a determinação. Por conta dessas novas demandas, é importante direcionar este jovem a um caminho muitas vezes desconhecido por ele. As ideias podem surgir de várias maneiras, mas transformá-las em oportunidades viáveis tanto para a sociedade, posto que o empreendedor tenha papel fundamental na geração de renda, quanto para o indivíduo portador da ideia não é tarefa fácil. Desta forma, criar maneiras ou instrumentos capazes de: ouvir, refletir e praticar é algo importante na construção do novo perfil do empreendedor. Há aqueles que procuram classificar os Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Antero Paulo dos Santos Matias

empreendedores, principalmente quando se trata de um perfil psicológico, mas estes estudos devem ser analisados com grande cautela para que não caiamos no erro de rotulações demasiadamente generalizadas ou nas verdades absolutas, como se todo o ser humano pudesse ser “encaixado” em parâmetros preestabelecidos. (Matias; Chiuzi, 2014. p.162) 2.3. UM MODELO DE NEGÓCIOS Este termo foi cunhado por Osterwalder (2011, p. 14) que o definiu como a forma de criar, entregar e capturar valor por parte das empresas, mas Meira (2013, p. 154) vai além, conceituando como um conjunto de processos, métodos e práticas para resolver o problema de um conjunto de consumidores. É parece ser esta a grande sacada na busca do sucesso do negócio: resolver o problema do cliente. Blank (2012, p. 3) relata que a diferença entre vencedores e perdedores está no desenvolvimento de produtos cujo direcionamento tenha sido orientado para os consumidores e não para uma estrutura de marketing e vendas, posto que estes últimos estarão fadados ao fracasso. Meira (2013, p, 156) comenta que uma expressão útil para o modelo de negócios está no candidato a empreendedor responder as perguntas, Quem paga, o Quê, Para Quem, Por Quê e Como e que tais perguntas podem se tornar inúteis gerando respostas vagas se forem postas de forma muito ampla e aberta. Mesmo após a busca por conhecimento de como iniciar uma empresa por meio de cursos, sejam gratuitos ou não, o candidato a empreendedor ainda corre o risco de errar. Tal situação tem direcionado boa parte destes empreendedores para a busca de mentores para aconselhá-los, procurando construir as habilidades necessárias para evitar estes erros. Binder (2013, p.477) relata que a mentoria é capaz de auxiliar os empreendedores nas mais diversas situações: • A maioria dos produtos não resolve um problema claro de mercado; • Alguns empreendedores ficam tão embevecidos com seu produto, que Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

nunca chegam a terminá-lo; • Muitos dos empreendedores, principalmente os de base tecnológica, não sabem vender seu produto. Assim, a mentoria pode preparar as futuras empresas a enfrentar as suas deficiências, adaptando-se as novas técnicas e tecnologias presentes nos mais diversos mercados. Na minha experiência como mentor e professor de criação de empresas, notei a grande quantidade de candidatos e até empreendedores nascentes que criam seus negócios puramente baseados em um sentimento do provável sucesso, tornando-os míopes as mudanças oriundas do mercado. Pode-se dizer que há quatro grandes componentes do processo empreendedor que têm influência na criação de uma empresa. O primeiro é o empreendedor ou os empreendedores que criam a empresa, o segundo é a empresa que o empreendedor pretende criar, o terceiro é o ambiente onde a empresa é criada e por fim o processo de criação da nova empresa (Borges; Filion; Simard, 2013. p. 197). É possível dizer que o processo de criação de empresa seja o menos estudado até o momento, o que corrobora com a necessidade de um instrumento ou ferramenta capaz de orientar e dirigir o empreendedor no seu processo de criação do negócio. O uso exclusivo do conhecido quadro de Modelo de Negócios Inovadores, proposto por Osterwalder (2011), não oferece condições adequadas capazes de validar a fortaleza da ideia de negócio.

3.

METODOLOGIA

Nesta seção será apresentado o instrumento de Essência do Negócio, com suas dimensões de análise e em seguida, os procedimentos realizados para a validação do instrumento. 3.1. O INSTRUMENTO E SUAS DIMENSÕES 3.1.1.  NECESSIDADE ATENDIDA Esta dimensão tem a finalidade de verificar se o candidato a empreendedor reconhece o 97


Mentoria para empreendedores: análise da essência do negócio

problema ou necessidade que seu produto vai atender de seus futuros clientes. Deste modo, ao perceber a necessidade que deve ser atendida, será possível identificar os prováveis benefícios que este produto pode oferecer ao cliente. Perguntas que devem ser utilizadas para identificar o quanto o candidato a empreendedor reconhece a necessidade a ser atendida: • Como surgiu a ideia do negócio?; • Reconhece o problema ou necessidade que as pessoas possuem e que seu produto pode resolver? 3.1.2.  PRODUTO Esta dimensão verifica o produto que será criado, ou seja, suas características físicas e técnicas, bem como o modo pelo qual o cliente fará uso dele, levando-se em conta sua rotina diária. Perguntas que devem ser utilizadas para identificar o quanto o candidato a empreendedor conhece sobre seu produto: • Descreva como é o seu produto e o que ele faz? • Como ele fará parte da rotina diária da vida das pessoas? • Como você espera que seu produto seja reconhecido pelos clientes? 3.1.3.  DIFERENCIAL Como em qualquer ramo de negócios, o cliente tende a buscar diferenciais entre os concorrentes que solucionam seus problemas. Desta forma, o candidato a empreendedor deve ter muito claro que aspectos oferecidos pelo seu produto serão reconhecidos pelo cliente como importantes. Tal situação é de suma importância, pois, na maioria das vezes o candidato a empreendedor torna-se míope quando descreve os diferenciais de seu produto, posto que entende que sua proposta de produto é única e brilhante! Perguntas que devem ser utilizadas para identificar o quanto o candidato a empreendedor conhece os diferenciais de seu produto: • Conhece os concorrentes que resolvam 98

problemas que seu produto resolve? • O que o torna único, melhor do que o oferecido pela concorrência? 3.1.4.  CLIENTES Posto que o candidato a empreendedor reconhece um problema ou necessidade das pessoas que seu produto soluciona, é importante avaliar se tal produto resolve o problema de muitos ou apenas de seu criador. Desta forma, torna-se importante identificar quem realmente comprará seu produto, podendo em alguns casos atingir um determinado nicho de mercado. Muitas das vezes, ao ser questionado sobre quem é seu cliente, o candidato a empreendedor responde com a frase: “...qualquer pessoa...”. Tal resposta denota o pouco foco e direcionamento de quem realmente tenha interesse em adquirir o produto. Desta indefinição de direcionamento surge a dispersão no uso do investimento em ações de penetração do mercado, dado que, para atingir “qualquer pessoa” será necessário utilizar-se das mais diversas ações mercadológicas. Perguntas que devem ser utilizadas para identificar o quanto o candidato a empreendedor conhece seus prováveis clientes: • Quem são as pessoas que realmente terão suas necessidades resolvidas pelo seu produto? • Além delas, em algum outro momento, o seu produto pode auxiliar outras pessoas, mesmo que de forma indireta? • Seu cliente é o usuário final, ou outro ator da cadeia de suprimentos? 3.1.5.  MOTIVO DE COMPRA Apesar de entender a necessidade ou problema que seu produto solucionará na vida do cliente, muitas vezes, este cliente pode não reconhecer o real valor deste. Alguns aspectos são importantes no momento da decisão de compra: preço, benefício oferecido, etc. Esta dimensão trata de validar o produto com o cliente, ou seja, o cliente deve desejar possuir o produto. As discrepâncias oriundas desta Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Antero Paulo dos Santos Matias

relação podem acarretar em falhas e estas no fracasso mercadológico do produto. Perguntas que devem ser utilizadas para identificar o quanto o candidato a empreendedor conhece os motivos que farão com que o cliente compre seu produto: • Há uma necessidade real por parte de seus prováveis clientes que os faça comprar seu produto? • Compreende que exista uma armadilha mercadológica em seu produto, como a necessidade de uma mudança do comportamento do cliente? • Seu produto pode tornar-se obsoleto rapidamente? • É preciso aprender, realizando, por exemplo, a leitura de manuais, antes de utilizar seu produto? • A experiência anterior do cliente em utilizar produtos semelhantes ao seu é importante? 3.1.6.  INOVAÇÃO Esta dimensão procura verificar o quanto o produto oferecido é novo para o mercado em que será inserido. Inovação aqui representa não somente a criação de um produto completamente novo, mas, conforme a OCDE (2013, p. 55), a implementação de um produto (bem ou serviço) novo ou significativamente melhorado, ou um processo, ou um novo método de marketing, ou um novo método organizacional nas práticas de negócios, na organização do local de trabalho ou nas relações externas. Assim, o produto oferecido pode não ser inovador por haver outro semelhante no mercado, mas pode ser uma inovação, caso seja capaz de introduzir mudanças estruturais no modo de fazer as coisas como são feitas no presente. Perguntas que devem ser utilizadas para identificar o quanto o candidato a empreendedor desenvolveu uma ideia inovadora: • Seu produto pode ser considerado um produto novo ou significativamente melhorado, principalmente no que tange as suas especificações técnicas, componentes e materiais? Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

• Seu produto será capaz de melhorar a forma de realização de tarefas diárias do seu cliente, propondo, como exemplo, uma economia significativa de tempo ou dinheiro? 3.1.7.  PROCESSOS INTERNOS Além de desenvolver seu produto, o candidato a empreendedor não pode valerse somente de seu perfil inventor, dado que isto não trará os resultados necessários que levarão seu produto ao sucesso. Conhecer como será o funcionamento do negócio, principalmente os aspectos de produção, entrega e captura de valor dos clientes, os principais recursos necessários, como o provável número de funcionários, equipamentos, formas de distribuição, além da forma de geração de receita e capital inicial são de fundamental importância. Perguntas que devem ser utilizadas para identificar o quanto o candidato a empreendedor conhece dos futuros processos de sua empresa no momento de sua estruturação: • Como será o processo de produção do produto desenvolvido? • Quais os canais de divulgação e distribuição serão utilizados? • Como serão geradas as receitas? • Quais os principais gastos para a produção? Para a aplicação do instrumento criouse um rol de afirmativas, baseadas nas perguntas descritas acima para cada uma das dimensões, capazes de mensurar a fortaleza destas dimensões com relação a Essência do Negócio. Para cada afirmativa o entrevistador utilizou-se de uma escala métrica de classificação que permitiu mensurar a sua opinião em relação a afirmativa apresentada. A escala é composta de 4 pontos: discordo totalmente, discordo parcialmente, concordo parcialmente e concordo totalmente. Para cada uma das afirmativas, há um valor percentual correspondente a fortaleza que esta pergunta tem em relação a essência do negócio, conforme o Quadro 1. Considera-se que cada uma das dimensões tenha o mesmo comportamento final em relação a essência 99


Mentoria para empreendedores: análise da essência do negócio

do negócio, portanto a importância de cada uma será a mesma.

dimensões apresenta maior fraqueza, permitindo tanto ao candidato a empreendedor e ao mentor redirecionar o caminho da ideia na busca de gerar uma real oportunidade de negócio; • Os resultados de cada dimensão de modo geral, tomando-se as 10 ideias: pode-se verificar qual das dimensões apresentou maior fraqueza entre as ideias apresentadas e desta forma, procurar gerar conhecimento nesta área, por parte de instituições de ensino, por exemplo; • O resultado final da Essência do Negócio de cada ideia apresentada, que tem como objetivo mostrar ao candidato a empreendedor a intensidade da fortaleza de sua ideia frente ao mercado. Vale salientar que, dado que a nota 67% representa “Concordo Parcialmente”, significa que a afirmativa feita está adequada a ideia, mas não totalmente, considerou-se que ideias que apresentaram notas finais (médias das notas de cada dimensão) superior a este valor, foram consideradas ideias com maior possiblidade de ascensão ao mercado, ficando as demais com a necessidade de receber maiores orientações e aperfeiçoamentos. Cabe salientar também que resultados inferiores ou próximos a 33% são considerados inadequados, podendo-se pensar em rejeição inicial da ideia, dado que uma de suas dimensões apresenta-se fraca demais.

Quadro 1: Escala Métrica de Classificação

Resposta

Percentual

Discordo totalmente Discordo parcialmente Concordo parcialmente Concordo totalmente

0% 33% 67% 100%

Fonte: Própria.

Cada uma das dimensões terá um resultado final, oriundo das médias das respostas relativas a esta dimensão e a média total dos resultados obtidos por cada uma das dimensões representará o quanto a Essência do Negócio é reconhecida pelo candidato a empreendedor. Este resultado direciona o mentor a melhorar a dimensão que se apresenta mais frágil, podendo assim, dispender adequadamente seu tempo na mentoria. Considera-se como adequada a essência do negócio que apresentar um valor mínimo final de 67% e nenhuma das dimensões com valor inferior a 50%. É importante que sejam desenvolvidas análises para cada um dos resultados das dimensões, dialogando com o candidato a empreendedor como ele deve repensar a ideia. 3.2. VALIDAÇÃO DO INSTRUMENTO Para validar a aplicação do instrumento e suas prováveis discrepâncias, este foi aplicado pelo autor do artigo a 10 candidatos a empreendedor que participaram do projeto de estimulo ao empreendedorismo universitário proposto pela Universidade Metodista de São Paulo denominado Farol Empreendedor, durante o momento de conhecimento e idealização da ideia do negócio e contribuíram no preenchimento do instrumento. Gerou-se uma planilha final que apresenta: • Os resultados de cada dimensão para cada uma das ideias apresentadas: deste modo foi possível avaliar qual das

4.

ANÁLISE DOS RESULTADOS:

Na apresentação dos resultados as ideias dos candidatos a empreendedor serão consideradas por meio de numeração de 1 a 10, pois desta forma ao omitir-se seus nomes, o sigilo fica garantido. Quadro 2: Resultado de cada dimensão estudada.

Quadro 2: Resultados de Cada Dimensão Estudada

IDEIAS APRESENTADAS

100

DIMENSÕES

1

2

3

Necessidade Atendida

67%

100%

33%

Produto

78%

100%

45%

4

5

100% 84% 67%

6

7

8

9

10

67%

100%

67%

100%

67%

89%

100%

67%

100%

78% 100%

Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Antero Paulo dos Santos Matias

Diferencial

67%

84%

0%

Clientes

0%

84%

100% 50%

Motivo De Compra

100% 100%

Inovação

34%

84%

0%

Processos Internos

84%

84%

100%

100% 67%

100% 100%

50%

83%

50%

34% 100% 100% 100%

84%

34%

67%

34% 100% 100% 100% 100% 100%

100% 84% 84%

0%

84%

67%

100% 100% 100%

100% 100%

67%

67%

84% 100%

Fonte: Própria.

Pelo quadro 2 nota-se que em sua grande maioria, as ideias apresentadas apresentaram poucas fraquezas, o que pode ser considerado um avanço no que diz respeito ao conhecer seu negócio, mas 50% delas apresentaram pelo menos uma das dimensões abaixo de 67%, índice mínimo esperado segundo a classificação de respostas e 40% delas apresentaram pelo menos uma dimensão com índices abaixo ou bem próximos de 33%, que seria um índice de rejeição para que a ideia fosse implantada. É de surpreenderse que 30 % das ideias tiveram pelo menos 1 das dimensões com valor 0%, o que denota a falta de estruturação da ideia como negócio. Este indicador corrobora a importância da

presença de um mentor para a descrição e estruturação da ideia de um negócio. Apesar do número amostral ter sido pequeno, apenas 10, vale ressaltar que a experiência do autor como avaliador de projetos para desafios de startups e incubadoras de empresas, intensifica esta afirmativa, pois nota-se que aproximadamente este é o percentual de propostas apresentadas que são rejeitadas. Vale salientar o caso da ideia 3 que apresentou a maioria de suas dimensões com resultado igual ou abaixo de 50%, denotando a necessidade por parte do seu candidato a empreendedor de repensar como sua ideia resolve o problema de seus prováveis clientes.

Quadro 3: Resultado Geral das dimensões estudadas

DIMENSÕES

RESULTADO GERAL

Necessidade Atendida

78,4%

Produto

82,3%

Diferencial

73,4%

Clientes

68,4%

Motivo De Compra

85,1%

Inovação

75,1%

Processos Internos

78,4%

Fonte: Própria.

Nota-se traçamos de todas dimensões

no quadro 3 que quando a média dos resultados as ideias, nenhuma das apresentou-se abaixo de 67%,

representando, que apesar de 50% delas apresentarem alguma dimensão inferior a este valor, as ideias estudadas tiveram mais fortalezas do que fraquezas.

Quadro 4: Resultado Final da Essência do Negócio

IDEIAS APRESENTADAS 1 Essência do Negócio

2

3

4

5

6

7

8

9

61,2 % 90,6% 46,8 % 81,0 % 54,0 % 88,1 % 98,4 % 90,6 % 81,0 %

10 81,0 %

Fonte: Própria.

Este quadro (4) pode ser considerado a Essência do Negócio abaixo do esperado síntese da pesquisa de validação. Nele nota- e que precisarão ser melhor orientadas se que 3 ideias apresentadas estão com sua para a descrição da ideia e de seu modelo Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

101


Mentoria para empreendedores: análise da essência do negócio

de negócios. Nota-se que ao compararse o quadro 3 com o quadro 1, as mesmas empresas que apresentaram pelo menos uma das dimensões com resultado 0% são as que necessitam de orientação para adequação da ideia e do modelo de negócios.

momentos, mas para o empreendedor, um bom diálogo com um mentor experiente supera qualquer resultado de testes ou instrumentos.

5.

ABSTARTUPS, 2015. Associação Brasileira de Startups. Disponível em: http://www.abstartups.com. br/. Acesso em 20 de outubro de 2015. BINDER, Robert Edwin. Aconselhamento e Mentoria de empreendedores. In: GRANDO, Nei. 1ª. Edição. São Paulo: Editora Évora, 2012. p.477 a 488. 557 p. BLANK, Steven Gray. Do sonho a realização em 4 passos: estratégias para a criação de empresas de sucesso. 3ª. Edição. São Paulo: Évora, 2012. 368 p. BORGES, C.; FILION, L. J.; SIMARD G., Criação de Empresas: um processo mais rápido e fácil resulta em empresas de melhor desempenho? Revista de Ciências da Administração, v. 15, n. 35, p. 196-207, abril, 2013. DEGEN, Ronald Jean. O empreendedor: empreender como opção de carreira. São Paulo. Pearson Prentice Hall. 2009. 440 p. DOLABELA, Fernando. Sonhos e Riscos bem calculados. Ed. Saraiva.2010. 150 p. DORNELAS, José Carlos Assis. Empreendedorismo: transformando ideias em negócios. Campus, 2001. DRUCKER, Peter Ferdinand. Inovação e Espírito empreendedor: prática e princípios. Tradução de Carlos Malferrati. São Paulo: Cengage Learning, 2008. 378 p. PERRIN, Fernanda. Moda das start-ups é desafiada por fracassos e falta de preparo de jovens. Jornal Folha de São Paulo, 2015. Disponível em: http:// www1.folha.uol.com.br/mercado/2015/06/1645335apos-serie-de-fracassos-onda-de-abertura-de-startups-enfrenta-ressaca.shtml. Acesso em: 21 nun 2015. HASHIMOTO, Marcos. Espírito empreendedor nas organizações: aumentando a competitividade através do empreendedorismo. 3ª edição. Saraiva, 2013.261 p. LIMA, E. et al. Intensões e atividades empreendedoras dos estudantes universitários: relatório do estudo GUESS Brasil, 2011. Caderno de Pesquisa – Grupo APOE, São Paulo. MATIAS, Antero Paulo dos Santos; CHIUZI, Rafael Marcus. A atitude de empreender e a proposta de uma tipologia psicológica de empreendedores para o contexto brasileiro. In: TANIGUCHI, Silvia P. 1ª. Edição. São Paulo: Editora Metodista, 2014. p. 159 a 174. 223 p. MEIRA, Silvio Lemos. Novos negócios inovadores de crescimento empreendedor no Brasil. 1ª. Edição. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2013. 416 p. OCDE, 2013. MANUAL DE OSLO: diretrizes para coleta e interpretação de dados sobre inovação. 3ª. Edição. 184 p.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Tal instrumento poderá ser usado pelos diversos agentes presentes no ecossistema do empreendedor, principalmente aqueles que desempenham o papel de investidores, bem como aqueles que propõe o auxílio aos empreendedores no desenvolvimento e, por que não, na alavancagem financeira da ideia. Como comentado no referencial teórico, desenvolver o modelo ou plano de negócios não permite ao empreendedor entender quais as discrepâncias existem entre a ideia e a gênese de um negócio, mas é importante contar com o apoio de mentores, que podem fazer uso deste instrumento como fonte de orientação e também de mensuração da evolução da ideia, dado que a cada encontro ou momento de mentoria, o instrumento pode ser novamente utilizado e apresentar ao candidato a empreendedor os ganhos obtidos com a mentoria. É importante frisar, que apesar da possibilidade de se reduzir a subjetividade de avaliação por parte do mentor ter sido um dos objetivos do artigo, ainda existe uma parcela, que entendo ser menor do que aquela em que não se faz o uso do instrumento, de subjetividade do mentor. Tal problema pode ser resolvido utilizando- se mais do que um mentor/entrevistador para a aplicação do instrumento, fato este que é realizado com frequência pelos promotores de desafios e incubadores. Há ainda a possibilidade de adequações deste instrumento, inserindo-se novas dimensões, bem como desenvolvendo-se perguntas e não afirmativas que possam ser capazes de gerar resultados fidedignos independente da experiência do mentor. Para tanto, será necessário o desenvolvimento de escalas quantitativas. Tal situação pode ser necessária, e até mesmo adequada em muitos 102

6.

REFERÊNCIAS:

Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação


Antero Paulo dos Santos Matias

OSTERWALDER, Alexander. Business Model Genaration – Inovação em Modelos de Negócios: um manual para visionários e revolucionários. Rio de Janeiro, Alta Books, 2011. 300 p.

Revista de Empreendedorismo, Negócios e Inovação

103


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.