Revista duo22 edicao outubro

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Coisas DUO Amor

Por Marinaldo de Silva e Silva mdesilvaesilva@hotmail.com

Já sei falar

por mim mesmo

Bem, meu nome é Willy. Hoje papai e mamãe não participam da história, só indiretamente; é que foram num barzinho ouvir uma moça amiga deles que canta igual à Marisa Monte, que é uma moça cabeluda que eles ficam acompanhando quando toca a música Amor I Love You. Nossa, não aguento mais essa música, e pensar que estamos já em 2001 e desde o ano passado eles ficam repetindo: quando faz comida, mamãe fica cantarolando, aí chega meu pai e começa a engrossar a voz pra ficar imitando o Arnaldo Antunes. Quando eles veem minha cara séria, riem, acham engraçado e dizem que eu tenho personalidade... Nossa! Quando falaram isso, adorei, me senti crescido, e olha que já tenho 6 anos! Mamãe disse que depois da virada do ano 2000, quando os computadores sobreviveram ao Bug do Milênio e as pessoas viram que o Apocalipse ficou para o século 30, ela teve certeza que a minha geração – ainda não sei o que

quer dizer isso! – seria muito avançada. Deve estar certa: olha eu! É tão bom ser criança e ser filho! Minha brincadeira preferida é usar a imaginação. Mamãe me conta histórias e é só começar que eu me transporto pra longe. Ela mistura elementos, fala de casas que tem homens de vidro e mulheres que são feitas de ametista: acho que fala dela e de papai, porque tem coisas nos olhos deles que parecem esperança e ambos têm tanta transparência que parecem de cristal, mas de um jeito de ser cristal que não se quebra. Meu professor me disse que sou bom nesse negócio de escrever, mas tenho problemas de gramática, então pedi pra ele escrever pra mim, e ele foi me ajudando a ligar coisa com coisa. Por exemplo, eu não sabia o que era ametista e ele me mostrou num livro, e então lembrei que essa pedra parecia mamãe quando me chamava pra comer seus legumes mágicos e suas

couves-orquídea! Um dia eu perguntei pra ela: mãe, couve-molho é pra misturar no macarrão? Ela sorriu. Jogou meu cabelo com sua mão grandona e disse que eu sou a cara do papai; adulto fala tanta coisa estranha! Papai tem tanta espinha! Acho que sou mais bonito que ele. Ele tem uma bocona assim ó... Bem, eu ia continuar me achando adulto, mas quando terminava de escrever essa carta pra vocês lerem aí, mamãe chegou, me pegou ao colo, me ergueu no alto e começou a cantar Amor I Love You. Gente, ser criança é difícil!


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