Informativo 138

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Índice SAÚDE

Editorial pg . 3

A Primavera das Antocianidinas.

ACADEMIA

pg . 4

Artigo: Biodiesel e o Método TDSP.

TECNOLOGIA

pg . 8

Os benefícios e desafios da nanotecnologia no Brasil.

MURAL E AGENDA

pg .11

Expediente Presidente Paulo Roberto Bello Fallavena Vice-presidente Estevão Segalla Secretário Renato Evangelista Tesoureiro Ricardo Noll Assessoria de Comunicação do CRQ-V assecom@crqv.org.br Jornalista responsável e Redação Carolina Reck Editoração Gráfica Giuliana Lopes Galvão Tiragem 2.000 Impressão Gráfica Ideograf INFORMATIVO CRQ-V AV. ITAQUI, 45 - CEP 90460-140 PORTO ALEGRE/RS FONE/FAX: 51-3330 5659 WWW.CRQV.ORG.BR

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Esta edição marca a chegada da primavera. Como a Química pulsa em todas as coisas, relacionamos a estação florida à Ciência, apresentando as antocianinas, derivadas das antocianidinas. Estes compostos, produzidos e acumulados em determinadas plantas, podem ser fontes de benefícios à saúde do ser humano. Ainda falando sobre o que não vemos a olho nu, discutimos sobre a nanotecnologia. Movimentando cerca de US$50 bilhões no Brasil, a tecnologia a base de nanopartículas é uma das alternativas para o futuro da Ciência. Utilizada em plásticos biodegradáveis feitos com polpa de frutas, e até mesmo em medicamentos que alcançam a cura do câncer, as nanopartículas configuram um cenário inovador no país. As suas vantagens são indiscutíveis, mas os desafios para que esta área se consagre no mercado de forma totalmente benéfica são inúmeros. Nesta edição você vai saber mais sobre estas pequenas partículas, entendendo o panorama atual que marca estudos e mercado alusivos a elas. Para tanto, foram consultados profissionais da área da Química, Medicina e Direito, dando um leque diversificado e buscando fomentar, assim como as soluções sugeridas por estes para o futuro da nanotecnologia no Brasil, um diálogo interdisciplinar da temática. Para consolidar esta parte, foram fundamentais os depoimentos de Maria de Fátima Torres Faria Viega, médica da FUNDACENTRO RJ, do Dr. Everson Thiago da Silva, pesquisador do núcleo de desenvolvimento de biossensores do Instituto de Química da UNICAMP, da Dra. e pesquisadora Arline Sydnéia Abel Arcuri, coordenadora do projeto “Impactos da nanotecnologia na saúde dos trabalhadores e meio ambiente”, da FUNDACENTRO SP e do Prof. Dr. Wilson Engelmann, especialista em direito relacionado à nanoteclonogia, da UNISINOS-RS. Finalizando a matéria, abordamos a visão empreendedora de Cândice Felippi, farmacêutica e diretora da empresa gaúcha Inventiva, que aplica nanotecnologia a cosméticos. Completando a sessão de artigos dos Acadêmicos, abordamos a produção de biodiesel por meio do método Transesterication Double Step Process (TDSP) e seis variedades de óleos vegetais, além de óleo residual de frituras, processo que transforma o resíduo em produto com alto valor agregado. O estudo aponta a utilidade da espectroscopia de infravermelho na classificação destes óleos. Para entender mais sobre o método e seus resultados, confira a produção que conta com a presença do acadêmico Dimitrios Samios.

Dica de Livro

A COLHER QUE DESAPARECE Contextualizando a invenção da tabela periódica e passando pelo estudo da radioatividade, o autor Sam Kean combina a ciência com a tradição clássica da invenção, investigação e descoberta, abordando a história dos avanços científicos, desde a descoberta do átomo até a criação de elementos artificiais. A narrativa de “A colher que desaparece” envolve história, finanças, mitologia e artes à Ciência, buscando apresentar as modificações pela qual a vida humana passou devido a descobertas como o silício, utilizado na informática, o cobre, protagonista na produção de moedas, e o urânio, um dos responsáveis pela bomba atômica. O enredo, construído tendo como alicerce a tabela periódica, apresenta diversas tramas que tecem as origens por trás de cada elemento químico.

Números do Conselho JUL/AGO/SET Registro Profissional

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PJ

66

Fiscalizações

866

Autuações

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SAÚDE

C

olorindo e perfumando a primavera, as flores carregam poderosos fitoquímicos, encontrados também em certos alimentos. É o caso das antocianinas, derivadas das antocianidinas: compostos produzidos e acumulados em determinadas plantas que trazem benefícios à saúde do ser humano. Considerado um dos mais importantes grupos de pigmento do reino vegetal, elas conferem às pétalas tonalidades do vermelho ao azul, podendo também ser usadas como corantes naturais na indústria alimentícia. As antocianinas resultam de uma reação com os açúcares das células vegetais. Sem o grupo glicosado, são chamadas de antocianidinas. Sua estrutura química básica é policíclica de quinze carbonos. Sensíveis ao Ph do ambiente, as antocianidinas mudam a coloração do vegetal de acordo com o meio. Além disso, são responsáveis por atrair agentes polinizadores, como abelhas e borboletas, e proteger a planta da luz ultravioleta (UV). Nos humanos, tem ação antioxidante, retardando o envelhecimento e prevenindo contra doenças cardiovasculares, neurodegenerativas, pulmonares e certos tumores. Podemos ter acesso aos benefícios das antocianidinas ingerindo alimentos como repolho roxo, amora, cassis, mirtilo, uva preta, cereja, morango, vinho tinto, ameixa, jamelão, figo, açaí, acerola, romã e feijão.

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ACADEMIA

ANÁLISE EXPLORATÓRIA APLICADA A ESPECTROS DE REFLEXÃO TOTAL ATENUADA NO INFRAVERMELHO COM TRANSFORMADA DE FOURIER (ATR-FTIR) DE BLENDAS DE BIODIESEL/DIESEL Carla Felippi Chiella Ruschel, Chun Te Huang, Dimitrios Samios e Marco Flôres Ferrão

Instituto de Química, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 91501-970 Porto Alegre – RS, Brasil Recebido em 17/09/2013; aceito em 29/01/2014; publicado na web em 10/04/2014

INTRODUÇÃO O estudo de combustíveis alternativos aos derivados petroquímicos tem recebido grande estímulo na última década no Brasil, especialmente com o desenvolvimento dos programas de incentivo a produção de novas matrizes energéticas, como é o caso do biodiesel adicionado ao óleo diesel mineral. A utilização do óleo diesel como combustível teve seu início amplamente reconhecido quando Rudolf Diesel patenteou o seu motor em 1892 e introduziu o primeiro motor diesel destinado a funcionar com óleo vegetal. Em 1900, ele abasteceu e utilizou o motor com óleo de amendoim por várias horas, com sucesso. Já em 1912, ele previu que, no futuro, o óleo vegetal poderia ser um combustível importante assim como o óleo diesel.1 Por razões tanto técnicas quanto econômicas, com o passar do tempo os óleos deram lugar ao diesel mineral.2 Na época, o baixo preço e a oferta abundante dos derivados de petróleo resultaram na escolha pelo diesel de petróleo. Em 1940, enormes reservatórios de petróleo foram encontrados, sua extração e refinamento foram relativamente fáceis e baratos. Em 1970, o monopólio de algumas nações e circunstâncias políticas geraram uma nova situação, o que obrigou os engenheiros e pesquisadores a desenvolver combustíveis alternativos e ambientalmente amigáveis. Desde então, há um interesse renovado na utilização de derivados de óleos vegetais em motores a diesel por várias razões, incluindo considerações políticas, preocupações ambientais e aspectos econômicos.3 Neste sentido, o biodiesel, que é constituído de uma mistura de alquil-ésteres de cadeia linear, é obtido pela reação de transesterificação dos triglicerídeos presentes em óleos e gorduras com álcoois de cadeia curta gerando como subproduto o glicerol. A importância do biodiesel como aditivo e até como possível substituinte do óleo diesel decorre do fato de que este biocombustível apresenta vantagens sobre o óleo diesel, pois é proveniente de fontes renováveis, não é tóxico e diminui as emissões de poluentes durante a sua combustão.4 O biodieselproduz cerca de 10% menos de energia que o diesel de petróleo, mas seu desempenho no motor é praticamente o mesmo em termos de potência e torque, segundo alguns autores.5 Este biocombustível apresenta ainda maior viscosidade, proporcionando maior lubrificação ao motor do que o diesel mineral, resultando numa redução do desgaste das peças do motor. Além disso, a reação de transesterificação produz o biodiesel com estruturas moleculares mais simples que o seu triglicerídeo precursor, diminuindo a sua viscosidade comparativamente ao óleo ou gordura, resultando numa queima eficiente que reduz significativamente a deposição de resíduos no motor.6 A metodologia Transesterification Double Step Process (TDSP) para a produção de biodiesel vem sendo constantemente aperfeiçoada pelos seus autores, no intuito de produzir um biodiesel de ótima qualidade de maneira mais simples e rápida que os métodos tradicionais. 7-9 Atualmente, Samios e colaboradores conseguem produzir biodiesel, tanto metílico quanto etílico, utilizando o método TDSP. Esta metodologia que consiste numa sequência de duas catálises, uma básica e outra ácida, permite a produção de biodiesel a partir de qualquer matéria prima. Além disso, este biodiesel também tem sido estudado como matéria-prima para a produção de outros materiais como polímeros e epóxidos.10,11 Várias técnicas são utilizadas no controle de qualidade de inúmeros produtos, como alimentos, bebidas, polímeros, inclusive combustíveis em geral. Dentre elas as mais comuns são a espectroscopia de infravermelho, ressonância magnética nuclear, difração de raios-x entre outras. Na área de biocombustíveis o infravermelho já se tornou uma técnica bastante difundida entre os estudiosos deste assunto. No trabalho de Mueller et al. esta técnica clássica foi utilizada juntamente com HCA e PCA para classificar am ostras de biodiesel, produzidos a partir de seis variedades diferentes de óleos vegetais. Os espectros foram adquiridos por espectroscopia de infravermelho com transformada de Fourier utilizando um sensor de reflectância total atenuada universal (UATR-FTIR). Os resultados mostraram que é possível desenvolver uma metodologia confiável e rápida para identificar óleos vegetais utilizados como matéria-prima na produção de biodiesel por meio da aplicação destas técnicas não supervisionadas de análise multivariada aos dados de infravermelho médio.12 Em outro trabalho de Veras et al. foi utilizada a técnica de infravermelho próximo no qual foi obtido um total de 108 espectros de amostras de biodiesel, de quatro tipos de óleos provenientes de nove fabricantes diferentes: semente de algodão, de girassol, de soja e de canola. A classificação das amostras de biodiesel também foi possível a partir de modelos quimiométricos de HCA e PCA. Estes modelos agruparam adequadamente

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todas as amostras de maneira eficiente, não destrutiva e sem necessitar várias determinações analíticas das amostras.13 A espectroscopia Raman também tem sido utilizada na avaliação da qualidade de combustíveis aliada a quimiometria. No estudo de Zhang e colaboradores a PCA foi aplicada a dados espectroscópicos de Raman para avaliar a qualidade e detectar adulterações com MTBE e benzeno em amostras de gasolina. A PCA utilizando apenas a PC1 x PC2 distinguiu as amostras de gasolinas autênticas daquelas adulteradas. Além disso, foram aplicadas a PCA em conjunto com redes neurais para a previsão quantitativa dos adulterantes baseado nos espectros de Raman. Portanto, a técnica mostrou-se promissora para a análise tanto quantitativa quanto qualitativa de gasolinas.14 Há ainda outros trabalhos que exemplificam ainda mais a utilidade da espectroscopia de infravermelho aliada a ferramentas quimiométricas.15 Essas duas técnicas vêm sendo amplamente empregadas na análise de combustíveis e de matérias-primas para produção de biocombustíveis como, por exemplo, os óleos vegetais, pela sua rapidez na obtenção do espectro, pela simplicidade de interpretação dos dados e baixo custo comparativamente a outras técnicas. Poppi e de Souza utilizaram a espectroscopia de infravermelho médio, unida à análise de componentes principais, para avaliar óleos vegetais comestíveis. Segundo os autores, o uso de espectroscopia no infravermelho médio com transformada de Fourier (FTIR) combinado com análise quimiométrica é constantemente explorado em estudos de reconhecimento de padrões de óleos vegetais comestíveis, na análise de parâmetros físico-químicos de qualidade e no estudo de autenticidade e adulteração desses óleos. A FTIR é uma técnica rápida, requer o mínimo necessário de preparo de amostras e sua instrumentação é facilmente encontrada nos laboratórios. Esta técnica permite a análise qualitativa de compostos orgânicos porque os modos característicos de vibração de cada grupo provocam o aparecimento de bandas no espectro infravermelho em frequências específicas, que também são influenciadas pela presença de grupos funcionais próximos (acoplamentos). Sendo assim, um espectro de infravermelho geralmente contém mais informação do que apenas os valores de posição ou de absorção de alguns picos, atuando como uma impressão digital de uma dada amostra quando utilizado integralmente. Além disso, a espectroscopia FTIR é uma excelente ferramenta para análise quantitativa porque as intensidades de absorção das bandas no espectro são proporcionais à concentração.16 Este estudo insere-se nesta mesma área, porém visa classificar blendas preparadas a partir de óleo diesel metropolitano (S500) e de vários tipos de biodiesel metílico e etílico, através das ferramentas de análise de agrupamento hierárquico, do inglês, Hierarchical Cluster Analysis (HCA) e de análise por componentes principais, do inglês, Principal Component Analysis (PCA) utilizando dados de espectroscopia por refletância total atenuada horizontal no infravermelho com transformada de Fourier (HATR-FTIR). Estas análises foram ferramentas importantes para este estudo, uma vez que permitiram reconhecer padrões a partir de uma gama bastante variada de blendas de diversas concentrações e tipos de biodiesel. Os diferentes tipos de biodiesel produzidos para este estudo foram produzidos a partir de óleo de soja comercial, óleo residual de fritura e gordura vegetal hidrogenada com metanol e etanol. O óleo de soja foi utilizado uma vez que esta matéria-prima corresponde a aproximadamente 90% da produção nacional de todos os óleos vegetais e 28% da produção mundial.17,18 O óleo residual de frituras, por sua vez, como normalmente é descartado de maneira incorreta, resulta em um problema ambiental cada vez maior e sem perspectiva de uma solução efetiva em curto prazo. Alternativamente, o uso deste material que seria um poluente para o meio ambiente, na produção de biodiesel, torna-se uma opção econômica e ambientalmente mais adequada, transformando este resíduo em um produto com alto valor agregado.19 Já a gordura vegetal hidrogenada diferencia-se dos óleos vegetais pelo seu aspecto sólido, mas principalmente pela grande quantidade de isômeros trans presentes na sua composição, o que ocorre como resultado da reação de hidrogenação sofrida por esta gordura.20 PARTE EXPERIMENTAL Materiais e métodos Foram produzidos para este trabalho, a partir da metodologia TDSP, seis tipos de biodiesel diferentes: Biodiesel metílico e etílico de óleo de soja, de óleo residual de fritura e de gordura vegetal hidrogenada. Os álcoois utilizados nas reações de transesterificação foram metanol (CH3OH) e etanol (CH3CH2OH), e os catalisadores foram o hidróxido de potássio (KOH) e o ácido


sulfúrico (H2SO4). A origem e pureza dos reagentes utilizados são as seguintes: óleo de soja comercial (Cocamar Cooperativa Agroindustrial, Maringá/PR), óleo residual de fritura (Restaurante Universitário, Unidade Campus do Vale, UFRGS), gordura vegetal hidrogenada (Primor), álcool metílico (99% PA-ACS, Fmaia, Cotia/SP), álcool etílico (95% PA-ACS, Fmaia, Cotia/SP), hidróxido de potássio (85%, Synth, Diadema/ SP) e ácido sulfúrico (95-98% PA, Fmaia, Cotia/SP). Clorofórmio deuterado (99.8% D, Cambridge Isotope Laboratories, Andover/MA, USA) foi utilizado como solvente nas análises de Ressonância Magnética Nuclear de Hidrogênio (1H RMN). O óleo diesel do tipo metropolitano (S500) puro (sem adição de biodiesel) foi fornecido gentilmente pela empresa Refinaria Alberto Pasqualini (REFAP S.A.). Para as análises de infravermelho foi utilizado o espectrômetro de infravermelho FT-IR/FT-NIR Spectrum 400 Perkin Elmer, com acessório de refletância total atenuada horizontal empregando um cristal de seleneto de zinco (ZnSe). Todos os espectros foram obtidos em duplicata, na faixa de 600 a 4000 cm-1, com resolução de 4 cm-1 e 32 varreduras. Antes das medidas das amostras foi medido o espectro de infravermelho chamado ‘‘branco’’ empregando o cristal sem amostra. Os espectros das blendas foram obtidos da seguinte forma: primeiramente a amostra foi espalhada sobre a superfície do cristal de ATR, em seguida, foi realizada a obtenção do espectro e, por fim, para a obtenção de novos espectros, a cela foi limpa com hexano P.A. e acetona P.A. (ambos Fmaia, Cotia/SP). Para as análises de agrupamento hierárquico (HCA) e de análise de componentes principais (PCA) foi utilizado o software PLS - Toolbox versão 6.0 da Eigenvector e MATLAB versão 7.11 da Mathworks. Preparação do biodiesel Baseadas na metodologia TDSP foram realizadas as reações para produção dos diferentes tipos de biodiesel de óleo de soja, de óleo residual de fritura e de gordura vegetal hidrogenada, que posteriormente foram utilizados como parte integrante das blendas, objeto desse estudo. O método TDSP consiste numa sequência de duas reações que inicia pela mistura do óleo ou da gordura com o respectivo álcool, metanol ou etanol, na presença do catalisador, hidróxido de potássio na primeira etapa de reação e ácido sulfúrico na segunda etapa, produzindo, ao final, os ésteres metílicos ou etílicos, respectivamente, além do subproduto glicerol, como mostrado na Figura 1. Essa reação de produção do biodiesel é apresentada detalhadamente nos artigos de Samios e colaboradores.8,9 Ao final da reação a análise de 1H RMN foi utilizada para o cálculo da conversão de óleo ou gordura em biodiesel, obtendo-se para todas as variedades de biodiesel produzidas conversão acima de 95%.

Figura 1. Reação genérica de transesterificação de óleos vegetais ou gorduras

Preparação das blendas Na etapa seguinte deste trabalho foi realizada a preparação das blendas. Com o objetivo de distinguir as diferentes blendas de acordo com o seu teor de biodiesel foram estudadas as seguintes variações de composição: 5, 10, 20, 50, 75% (v/v) de biodiesel, além do óleo diesel S500 e dos diferentes tipos de biodiesel puros. Caracterização das blendas por espectroscopia no infravermelho com transformada de Fourier (FTIR) O óleo diesel da classe S500 e os diferentes biodieseis produzidos foram caracterizados por Espectroscopia no infravermelho com transformada de Fourier (FTIR). Esta técnica qualitativa permite saber quais são os grupos orgânicos mais importantes referentes aos componentes dessas blendas. Nos espectros de infravermelho mostrados nas Figuras 2a, 2b, 2c observam-se as principais bandas em: 1750 cm-1 referente ao estiramento da carbonila do éster, picos na região de 1300 a 800 cm-1 que indicam sobreposição de bandas presentes tanto no óleo quanto no éster correspondente, picos na região de 1000 a 900 cm-1 referentes à deformação angular simétrica fora do plano de ligação C-H de olefinas. Picos em 1200 cm-1 referentes à deformação axial da ligação CC(=O)-O do éster, enquanto picos em torno de 1183 cm-1 podem ser relacionados à deformação axial assimétrica da ligação O-C-C. A região de 1300 a 900 cm-1 é conhecida como região de “impressão digital” do espectro, que inclui várias bandas acopladas. Além disso, diferenças mais significativas entre os espectros de óleos, ésteres e do óleo diesel podem ser observadas na região de 2240 a 2270 cm-1, onde ocorrem combinações de estiramentos de ligações C-O e C=O.21,22 Observa-se ainda, uma importante diferença no espectro do óleo diesel, Figura 2a, em relação as Figuras 2b e 2c referentes aos espectros dos ésteres metílicos e etílicos: a ausência da banda característica da carbonila em aproximadamente 1750 cm-1, que é bastante útil para diferenciar o óleo diesel do biodiesel. RESULTADOS E DISCUSSÃO Espectroscopia de infravermelho O conjunto de espectros de infravermelho obtidos é apresentado na Figura 3. A faixa de 1800 a 650 cm-1 do espectro de infravermelho foi selecionada para a utilização nas análises de HCA e PCA por ser a faixa mais representativa das diferenças presentes nos espectros das blendas estudadas. Resultados da HCA e da PCA Para a construção do dendrograma da Figura 4, foi realizado inicialmente um pré-processamento dos dados de espectroscopia por refletância total atenuada no infravermelho com transformada de Fourier (ATR-FTIR). A primeira etapa consis-

Figura 2. Conjunto de espectros de infravermelho de óleo diesel S500 (2a), de biodiesel metílico de residual de fritura (2b) e de biodiesel etílico de residual de fritura (2c)

tiu na correção da linha de base dos espectros por meio da ferramenta de correção “variação normal padrão” (SNV – Standard Normal Variate) e em seguida os dados foram centrados na média. A HCA dos dados espectrais resultou na formação de 4 grupos distintos. Esses grupos se formaram em função, primeiramente, do aumento do percentual volumétrico de biodiesel presente nas blendas. O primeiro grupo contém as amostras com baixo teor de biodiesel, de 0 a 10%. O segundo grupo é formado pelas amostras com percentual intermediário de biodiesel, igual a 20%. O terceiro e quarto grupos possuem amostras com teores de biodiesel iguais a 50, 75 e 100%. O óleo diesel apresentou semelhança com o primeiro grupo formado pelas amostras de baixo teor de biodiesel, conforme era esperado. O primeiro grupo subdividiu-se em dois subgrupos: as amostras de B5 e de B10. A HCA ainda foi capaz de agrupar as amostras de mesma rota alcoólica de produção do biodiesel, ou seja, separou as metílicas das etílicas de diferentes matérias-primas. O mesmo comportamento foi observado para as amostras B20. No caso das amostras com percentual de biodiesel entre 50 e 100% houve a formação de dois subgrupos. O primeiro subgrupo subdividiu-se em dois outros nos quais foram separadas as blendas de biodiesel etílico de óleo de soja e residual de fritura dos biodieseis de gordura vegetal hidrogenada. O segundo subgrupo subdividiu-se também em dois, de forma que foram agrupadas as blendas produzidas a partir de biodieseis de mesmo teor de biodiesel e mesma rota alcoólica, mas de diferentes fontes de matéria-prima. O último agrupamento também se dividiu em outros dois: o primeiro é formado pelas amostras com teor de biodiesel igual a 50% e o segundo contém amostras com teor de biodiesel de 75 e

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Figura 3. Conjunto de espectros de infravermelho de todas as amostras

100%, todos obtidos por rota metílica de diferentes matérias–primas. Ainda, analisando os resíduos, observou-se que a amostra B100MS apresentou um comportamento de outlier, podendo estar relacionado a problemas na aquisição do espectro. Para a PCA, considerando 4 componentes principais foi possível obter uma variância total dos dados de 99,63%. É importante observar que, a fim de evitar uma sobreposição da nomenclatura das amostras nos gráficos de escores, foram utilizados números para representá-las, conforme a Tabela 1. Analisando primeiramente o gráfico de escores com PC1 versus PC2, mostrados na Figura 5a, pode-se concluir que ao longo do eixo, a partir do valor mais positivo até o valor mais negativo da PC1, as amostras estão dispostas no gráfico, de acordo com o aumento do percentual de biodiesel presente nas blendas, ou seja, de B0, que é o óleo diesel puro, representada pelo número 1,

Número

Amostra

Número

Amostra

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28

B0 B5EF B5ES B5MF B5MS B5EGVH B5MGVH B550E50MF B550E50MS B10EF B10ES B10MF B10MS B10EGVH B10MGVH B1050E50MF B1050E50MS B20EF B20ES B20MF B20MS B20EGVH B20MGVH B2050E50MF B2050E50MS B50EF B50ES B50MF

29 30 31 32 33 34 35 36 37 38 39 40 41 42 43 44 45 46 47 48 49 50 51 52 53 54 55

B50MS B50EGVH B50MGVH B5050E50MF B5050E50MS B75EF B75ES B75MF B75MS B75EGVH B75MGVH B7550E50MF B7550E50MS B100EF B100ES B100MF B100MS B100EGVH B100MGVH B10050E50MF B10050E50MS B550M50EGVH B1050M50EGVH B2050M50EGVH B5050M50EGVH B7550M50EGVH B10050M50EGVH

Tabela 1. Numeração correspondente às amostras utilizadas no gráfico das Figuras 5 e 7

Figura 4. HCA de todas as amostras, onde: EF = Biodiesel etílico de óleo residual de fritura, MF = Biodiesel metílico de óleo de fritura, MS = Biodiesel metílico de óleo de soja, ES = Biodiesel etílico de óleo de soja, MGVH = Biodiesel metílico de gordura vegetal hidrogenada, EGVH = Biodiesel etílico de gordura vegetal hidrogenada, 50E50MS = Biodiesel 50% metílico 50% etílico de óleo de soja, 50E50MF = Biodiesel 50% metílico 50% etílico de óleo residual de fritura, 50E50EGVH = Biodiesel 50% metílico 50% etílico de gordura vegetal hidrogenada.

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Figura 5. Gráficos de escores da PCA. PC1 x PC2 (5a) e PC1 x PC3 (5b)


Figura 7. Gráficos da PCA. Gráfico de escores da PC4 (7a) e gráfico de pesos da PC4 (7b)

Figura 6. Gráfico de pesos da PCA. Pesos da PC1 (6a), pesos da PC2 (6b) e pesos da PC3 (6c)

até as amostras compostas apenas por alguma variedade de biodiesel puro, as B100, uma delas representada, por exemplo, pelo número 49. Quando analisamos o eixo da PC2, verificamos que as blendas produzidas a partir de biodiesel metílico têm, predominantemente, valores positivos para a PC2 e as blendas produzidas com biodiesel etílico têm valores negativos para a segunda componente principal. Ainda podemos observar que as amostras produzidas com biodiesel 50% etílico e 50% metílico estão localizadas próximo ao valor zero da PC2, ou seja, entre as amostras puramente etílicas ou metílicas. Como se pode ver pelo gráfico de pesos, Figura 6, a primeira componente principal está diferenciando, com base no espectro de infravermelho, as bandas presentes no óleo diesel das bandas do biodiesel (Figura 6a). As bandas referentes ao óleo diesel possuem valores positivos para a PC1 enquanto que as bandas do biodiesel possuem valores negativos. Isto pode ser observado verificando-se as principais bandas na faixa 1300-1500 cm-1 referente à deformação angular simétrica da ligação C-H da metila (CH3) e do metileno (CH2) e à deformação angular assimétrica da ligação C-H de metila (CH3) para o óleo diesel. Já para o biodiesel as bandas mais importantes são a banda em 1741 cm-1 referente ao estiramento axial da ligação C=O de éster alifático e as bandas na faixa 1000-1300 cm-1 indicativas do estiramento axial da ligação C-O.22 O gráfico de pesos para a PC2, Figura 6b, para a segunda componente principal está diferenciando, com base no espectro de infravermelho, as bandas presentes no biodiesel metílico daquelas do biodiesel etílico. Isto ocorre porque a principal banda referente ao estiramento axial da ligação C=O de éster alifático, para o biodiesel metílico, em 1742 cm-1, é adjacente a uma metila (CH3) e possui valores positivos para a PC2, enquanto que a mesma banda para o biodiesel

etílico em 1740 cm-1, porém neste caso adjacente à etila (CH2CH3) na cadeia, possui valores negativos.22 O gráfico de escores da PC1 versus PC3, Figura 5b, nos mostra que em relação ao eixo da PC3 ocorre a separação das amostras das blendas produzidas com biodiesel de gordura vegetal hidrogenada daquelas produzidas a partir de óleo de soja e de óleo residual de fritura. As blendas de biodiesel de gordura possuem valores positivos para a PC3 e as blendas de biodiesel provenientes dos óleos apresentaram valores negativos para a PC3. De acordo com o gráfico de escores, Figura 5b, os pesos positivos para a PC3 referem-se às blendas provenientes de biodiesel produzido a partir de gordura vegetal hidrogenada, que é saturada, e os pesos negativos para a PC3 são referentes às blendas de biodieseis dos óleos de soja e de fritura, que são mais insaturados. Isto pode ser observado no gráfico de pesos (Figura 6c) pela banda em 700 cm-1 referente à deformação angular no plano tipo balanço de CH2 em fase (CH2CH2CH2...) presente nos óleos, que possui peso negativo para a PC3. Além disso, observa-se também no espectro de infravermelho do biodiesel metílico de gordura vegetal hidrogenada que estão presentes as mesmas bandas com valores positivos para a PC3, conforme o gráfico de pesos da Figura 6c, indicando que assim como os pesos, os escores positivos da PC3 correspondem à matéria-prima empregada na produção do biodiesel. Já o gráfico de escores da PC1 versus PC4, Figura 7a, mostra que, em relação ao eixo da PC4, as blendas estão sendo diferenciadas também em relação à matéria-prima utilizada na produção do biodiesel que as compõe. Porém, nesse gráfico, as blendas de biodiesel de gordura vegetal hidrogenada possuem valores negativos para a PC4 e as blendas de biodiesel provenientes dos óleos de soja e de fritura apresentaram valores positivos para a PC4. O gráfico de pesos, Figura 7b, para a quarta componente principal está mostrando a partir do espectro de infravermelho as bandas cis e trans presentes respectivamente nos biodieseis provenientes dos óleos e da gordura. Isto é mostrado principalmente pela banda em 990 cm-1, que se refere à vibração sacudida fora do plano da ligação C-H trans presente no biodiesel derivado da gordura vegetal hidrogenada, que possui grande quantidade de ligações trans na sua molécula.22 CONCLUSÃO A partir deste estudo foi possível confirmar a utilidade da espectroscopia de infravermelho em conjunto com as ferramentas quimiométricas HCA e PCA para classificação de blendas de óleo diesel e biodiesel. Cabe ressaltar que essas ferramentas foram capazes de diferenciar essas blendas a partir dos seus espectros de infravermelho, mesmo essas misturas sendo compostas por vários tipos de biodiesel provenientes de três matérias-primas distintas: óleo de soja, óleo residual de fritura e gordura vegetal hidrogenada, além de duas rotas alcoólicas: a metílica e a etílica. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem ao CNPq pela bolsa, ao INCT-Bioanalítica, a REFAP pelas amostras e ao CECOM pelas análises e infraestrutura.

Quim. Nova, Vol. 37, No. 5, 810-815, 2014

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TECNOLOGIA

Os benefícios e desafios da nanotecnologia no Brasil E

m 1959, Richard P. Feynman apresentou na palestra “A sociedade Americana de Física” uma ideia inovadora, capaz de mudar os rumos da Ciência. Embora não tenha utilizado um termo para defini-la, trouxe conceitos totalmente transformadores, posteriormente nomeados pelo professor Norio Taniguchi, em 1974, como nanotecnologia. Hoje, a nanotecnologia pode ser encontrada em cosméticos, produção rural, automóveis, medicamentos e diversos produtos cotidianos, movimentando cerca de US$50 bilhões no Brasil. A tecnologia, baseada na manipulação da matéria numa escala atômica e molecular, lida com estruturas com medidas equivalentes à milionésima parte de um milímetro – os nanômetros. Elaborando tecnologias a partir do menor elemento, a nanotecnologia é capaz de encontrar respostas para diversos setores, alcançando até mesmo a cura para doenças. Em contraponto, ainda são necessárias diversas pesquisas que comprovem que os seus efeitos não apresentam graves riscos ao meio ambiente e à saúde de quem manipula seus produtos. Sendo a alavanca para importantes mudanças econômicas, sociais e ambientais, a aplicação da escala nano em tecnologias de diversos setores veio crescendo nos últimos anos. Um Inventário de Produtos de Consumo Nanotecnológico (CPI), publicado neste ano no Beilstein Journal od Nanotechnology1, atenta para este aclive. De acordo com o levantamento de dados, a partir de março foram registrados 1814 produtos, que representam um aumento de 30% sob os 54 produtos listados em 2005. A CPI é o maior inventário online de nanotecnologia existente até o momento, registrando produtos que provém de 622 companhias, localizadas em 32 países. Dos 1814 produtos listados na CPI, 47% (equivalentes a 846 produtos) anunciam a composição de pelo menos um componente nanomaterial e 62 produtos listam mais de um componente desta origem (por exemplo, um produto composto tanto de prata quanto de titânio de dióxido de nanomateriais). Do ponto de vista acadêmico, dentro do Brasil a nanotecnologia vem crescendo exponencialmente nos últimos anos. Seu impulso é fruto da criação de programas nacionais e laboratórios de pesquisa especializados, além de inúmeros projetos de pesquisa voltados para este tema. “Hoje, praticamente todas as empresas brasileiras já criaram algum produto com a tecnologia nano”, expõe Cândice Felippi, diretora da empresa gaúcha Inventiva, que desenvolve ativos cosméticos com base na nanotecnolo1 Nanotechnology in the real world: Redeveloping the nanomaterial consumer products inventory www.beilstein-journals.org/ bjnano/single/articleFullText.htm?publicId=2190-4286-6-181

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gia. A profissional informa que o aumento do uso de ativos nanotecnológicos pela indústria cosmética é considerável, assim como os benefícios que provem destes. “Existem muitas vantagens ao utilizar a nanotecnologia e praticamente nenhuma desvantagem. Se pensarmos em nível de benefícios para a pele e estabilidade, utilizar ativos na forma livre (normal) e não encapsulados não tem muitas vantagens, pois os ativos na forma livre não têm muitas condições de penetrarem na pele e praticamente todos tem problemas de instabilidade. Portanto, o uso da nanotecnologia é extremamente benéfico”, salienta. Outro dos destaques desta tecnologia é alusivo à medicina. Para a Dra. Maria de Fátima Torres Faria Viegas, da FUNDACENTRO RJ, as vantagens que a nanotecnologia apresenta são especialmente nesta área. “Como médica, imagino que se a nanotecnologia for implementada da forma que se promete, e algumas coisas já estão sendo, basicamente o foco da nanomedicina é o tratamento do câncer, e nós vamos ter muitas vantagens em relação a isso”, explana. A profissional cita ainda como exemplo uma pesquisa que vem sendo realizada há cerca de três anos em São Paulo, em que um produto com nanopartícula é testado para tratar determinados cânceres de pele, tendo uma estatística extremamente positiva, alcançando 99% de cura das lesões. Uma das grandes invenções resultantes da nanotecnologia são os biossensores, explorados no Brasil nas áreas agrária, de alimentos, ambiental e também médica. Com alto índice de sensibilidade e seletividade, estes aparatos podem garantir diagnósticos precisos e confiáveis, além de terem baixo custo no mercado, podendo ser produzidos com materiais simples e baratos, como o papel. Testes como o de gravidez e o de glicose, amplamente difundidos, são exemplos desta tecnologia. “Um biossensor é criado através da imobilização direta de uma biomolécula de reconhecimento (específica para uma determinada substância) na superfície do material transdutor, o qual é responsável pela transformação do processo bioquímico que ocorre durante a reação de detecção (ou reconhecimento) em um sinal analítico mensurável. Para cada substância que se quer detectar, um “tipo” de biossensor é desenvolvido, com uma biomolécula de reconhecimento específica”, explica o Dr. Everson Thiago da Silva, pesquisador do núcleo de desenvolvimento de biossensores do Instituto de Química da UNICAMP. O pesquisador ressalta que também é possível a fabricação de diferentes biossensores em uma mesma plataforma, caracterizando dispositivos de multi-detecção. “As análises rotineiras de diagnóstico e monitoramento

clínico em hospitais, que levam dias para serem processadas, podem ser realizadas em tempo real pelo médico, ou até mesmo pelo paciente, em casa, com um dispositivo portátil. Já reduziríamos, pelo menos, a superlotação dos hospitais, melhoraríamos o atendimento, ajudaríamos pessoas com dificuldade de locomoção, tornaríamos o monitoramento de doenças crônicas mais eficiente”, elucida o profissional, mensurando os benefícios da aplicação de biossensores. O desenvolvimento da nanotecnologia tem possibilitado a criação de materiais, medicamentos, sistemas de comunicação e vigilância e avanços em diversas áreas do saber. “É inegável que várias doenças poderão ser tratadas, a comunicação entre as pessoas tem sido cada vez mais rápida e fácil, novos materiais poderão auxiliar inclusive as rotinas diárias das pessoas”, revela a Dra. e pesquisadora Arline Sydnéia Abel Arcuri, coordenadora do projeto “Impactos da nanotecnologia na saúde dos trabalhadores e meio ambiente”, da FUNDACENTRO SP . Para ela, este tipo de tecnologia provoca uma revolução em todas as áreas do saber humano, mas precisa ser analisada em seus impactos. De acordo com Arline, para o meio ambiente estes impactos têm dois aspectos. O positivo, referente a criações de maior eficiência, como a de filtros na despoluição do ar e da água, catalisadores que permitem reações químicas que necessitem menos energia, sistemas de aproveitamento de luz solar que contribuem como fonte importante de energia e objetos plásticos mais finos e impermeáveis, que diminuem a necessidade de matéria prima. E o negativo, com o uso cada vez maior de material particulado na escala nanométrica, cujo efeito ainda é muito pouco estudado. “Os estudos já existentes têm mostrado dados preocupantes, já que as nanopartículas têm capacidade de penetração nas células vivas com muito mais facilidade do que partículas em tamanho maior. Quais serão os impactos deste espalhamento no meio ambiente? Isto ainda não dá para prever com segurança”, evidencia. De acordo com Maria de Fátima, a grande questão da nanotecnologia é exatamente a dos impactos, pois além do conhecimento sobre os efeitos positivos desta, é necessária a consciência da proteção e de que efeito prejudicial isto pode causar. “O investimento em pesquisa para esses estudos é infinitamente menor do que os investimentos para a criação de novos produtos. Então novos produtos, tratamentos e terapias são colocados no mercado sem que tenham efeitos comprovados, seja do beneficio ou do tratamento, e também quanto a não prejudicar a saúde de quem está os utilizando”, analisa a médica. Ela enfatiza que existem mais es-


tudos focados na aplicabilidade e resolubilidade do produto do que o efeito negativo que possa surgir. Quanto a estes supostos efeitos negativos, Arline destaca que a diminuição do tamanho das partículas faz com que ocorra o aumento da área superficial destas. “A sua maior reatividade, devido à grande área superficial e aos efeitos quânticos, que regem o seu comportamento, pode provocar consequências não pretendidas e até desconhecidas quando elas entram em contato com o organismo humano ou mesmo outros sistemas biológicos. Um material que pode ser considerado seguro para ser manuseado em tamanho maior, pode facilmente penetrar na pele na forma de nanopartícula ou se tornar um aerossol e entrar no organismo via respiratória”, ilustra. Maria de Fátima complementa, ressaltando que existem alguns nanoprodutos que já são reconhecidos como prejudiciais, como o nanotubo de carbono. “A estrutura dele é muito semelhante a do asbesto, que é extremamente prejudicial, usado na construção civil e que só começou a apresentar doença nos trabalhadores que o manipulavam em torno de dez anos depois do uso”, exemplifica, relatando que a grande preocupação de pesquisadores é que no futuro resultados desfavoráveis comecem a aparecer em consumidores e também em quem trabalha com nanoprodutos em laboratórios. Dos produtos com nanotecnologia encontrados no mercado, grande parte está dentro dos hospitais, como próteses ortopédicas que possuem substâncias nano, que são mais leves e de maior durabilidade, ou cateteres que diminuem o risco de infecção. Maria de Fátima aponta para a falta de leis que exijam especificações no rótulo de produtos que estão nas prateleiras de farmácias e até mesmo mercados. “Eles não tem rotulagem. Na maioria das vezes não existe uma regulação específica, o próprio consumidor não sabe se o produto contém este material ou não. Pouquíssimas empresas divulgam o uso, por exemplo, em termos de cosméticos temos a Natura e a Boticário que assumem o uso de nanotecnologia e rotulam desta forma”, indica. Além da necessidade de fomento a pesquisas quanto a impactos futuros, a necessidade de regulamentação é um dos maiores desafios da nanotecnologia. O cenário legal é constituído dentro da Lei de Inovação e da Lei do Bem, sendo que cada Estado tem a sua lei estadual de inovação. Além disso, na Constituição Federal de 1988 existe um capítulo preocupado com a Ciência e Tecnologia, hoje abrangendo a Inovação, após a Emenda Constitucional nº 85, de 2015. “Não existe uma fiscalização específica para as nanotecnologias, dada a ausência de um marco regulatório específico. No caso de fármacos e cosméticos, por exemplo, o órgão fiscalizador é a ANVISA, que deverá liberar o produto, mediante a prévia avaliação do produto e dos seus testes de toxicidade. A Secretaria da Saúde, no caso do RGS, também poderá realizar fiscalizações”, esclarece o Prof. Dr. Wilson Engelmann, da UNISINOS, especialista em direito relacionado à nanotecnologia. O profissional também ressalta que não se pensa em importar a regulação para dentro do país, mas, após avaliação crítica quanto às necessidades e características das nanotecnologias brasileiras, a resposta é

buscar o que já existe como orientação. “Temos condições de estruturar o nosso próprio marco normativo para as nanotecnologias”, resume. Tampouco existem protocolos específicos quanto aos cuidados necessários dentro de laboratórios, referentes à precaução de formas de contaminação com nanotecnologia. Maria de Fátima afirma que tudo está dentro do princípio de precaução utilizado na lida com a maioria das substâncias químicas: uso de luvas, máscaras tipo pff3, proteção com elação em capelas com fluxo laminar e cuidados ao manipular o produto, não deixando que este deflagre na atmosfera. Arline acrescenta que em indústrias a manipulação de materiais nanotecnológicos deve ocorrer em equipamentos fechados, com controle sobre possíveis emanações. “Recomenda-se a consulta e a observação das normas sobre saúde e segurança do ambiente do trabalho e do meio ambiente como um todo, entre outras normas brasileiras, além das normativas internacionais, que estão sendo produzidas por um considerável número de agências e órgãos estatais e não estatais”, salienta Engelmann. Em quadros gerais, apesar de uma gama de possibilidades futuras e de todos os benefícios conhecidos e que ainda podem ser alcançados, o mercado nanotecnológico no país ainda se encontra em fase inicial. Dentro da área de biosessensores existem barreiras na comercialização, condizentes com o distanciamento entre a academia e as grandes empresas e indústrias. O pesquisador Everson salienta que a baixa estabilidade e o elevado preço de algumas biomoléculas de reconhecimento, além dos problemas de reprodutibilidade e contaminação na fabricação dos biossensores, diminuem a confiabilidade do dispositivo e dificultam a sua comercialização. “Os problemas que enfrentamos não são somente de caráter científico, mas também cultural, uma vez que dispositivos com preço tão baixo e preparados com materiais como papel, por exemplo, geram grande desconfiança por parte da população; sem falar do baixo investimento das grandes empresas fabricantes de instrumentos analíticos, devido à menor margem de lucro oferecida por esses dispositivos em relação aos sofisticados equipamentos normalmente empregados”, expõe. Dentro das soluções propostas pelo pesquisador, a aproximação de diferentes áreas do conhecimento e a formação de parcerias entre diferentes grupos de pesquisa e empresas é uma das respostas. “Se desenvolvemos um biossensor dedicado à detecção de glúten em alimentos, e um grupo desta área se dedica a realizar os testes de validação em amostras reais, outros grupos da área de engenharia e programação desenvolvem uma plataforma adequada para a produção e comercialização deste biossensor, não teríamos tanta dificuldade neste quesito”, defende. A ideia da possibilidade de realização de um diálogo interdisciplinar, em que todas as áreas sejam ouvidas, sem a preponderância de alguma em específico, é outro dos caminhos para que a discussão sobre nanotecnologia se aproxime do mercado e realidade da sociedade brasileira, possibilitando a maior difusão e compreensão sobre o tema. Nos quesitos legais, Engelmann sugere que alternativas de regulação da nanotec-

nologia se estabeleçam além da elaboração de uma lei por parte do Poder Legislativo. “Na Câmara dos Deputados estão em tramitação dois projetos de lei: um deles, sobre a rotulagem dos produtos que contenham nanotecnologia; um segundo, estabelecendo a Política Nacional de Nanotecnologia no Brasil. Os dois projetos são muito criticados pelos integrantes da indústria e pelos cientistas das áreas exatas. Existem muitas questões para serem discutidas, mas num cenário democrático, não poderão ser realizadas somente pelos pesquisadores que integram as Ciências Exatas. As Ciências Humanas, as Ciências Sociais e as Sociais Aplicadas, onde está o Direito, também deverão ser ouvidas e respeitadas”, assinala. São muitos os desafios para consolidar a nanotecnologia dentro do mercado brasileiro. As alternativas apresentadas por ela geram uma revolução na forma de entender e lidar com a Ciência. Com o fomento nas áreas de pesquisa para averiguar riscos, assim como alianças entre e empresas e laboratórios, o futuro é animador. A projeção dentro deste quadro possibilitaria testes rápidos, praticidade e que a comunidade científica e médica reconheça de imediato situações de risco, driblando doenças e aprimorando conhecimentos sobre os limites e diagnósticos de produtos e da sociedade.

Nanotecnologia como foco nos cosméticos gaúchos Destaque em inovação no mercado, a empresa Inventiva, de Porto Alegre, aplica nanotecnologia em seus produtos. Confira a entrevista com Cândice Felippi, diretora da Inventiva. 1) Como que a Inventiva desenvolve os seus produtos cosméticos, quimicamente, a base de nanotecnologia? Quais são as fases e desafios encontrados neste processo? Utilizamos variados processos para a fabricação de cada insumo, dependendo das características da molécula a ser encapsulada e do produto final na qual o ativo vai ser incorporado. Temos diferentes tecnologias para encapsular diferentes ativos, por exemplo, a técnica de encapsulação de ativos hidrofílicos é totalmente diferente da encapsulação de ativos lipofílicos. A fase mais importante quando se pensa em encapsular um ativo, primeiramente, é estudar as suas características físico químicas e estabilidade. Depois disso, estudamos diferenciadas formulações e verificamos qual das técnicas é a mais adequada para os testes. Geralmente são feitas diversas formulações e testes para cada desenvolvimento de insumo até chegar num final escolhido. Algumas vezes as técnicas disponíveis podem não ser adequadas e então é feito também o estudo e desenvolvimento de uma nova tecnologia de encapsulamento. Este é um dos maiores desafios que temos durante um processo, mas também o que move a empresa, a busca diária por inovação. 2) Que outro tipo de ativo encapsulado existe 9


além das nanopartículas? Existem vários tipos de partículas nano ou nanopartículas, a diferença entre elas é a composição e a maneira que são produzidas. Por exemplo, nanopartículas lipofílicas veiculam ativos lipofílicos, já lipossomas veiculam ativos hidrofílicos. Existem também as partículas como nanocápsulas e nanoesferas, que possuem a parede constituída por um polímero e devido a ele necessitam de solventes orgânicos em sua fabricação. A Inventiva não utiliza essas duas últimas partículas, pois desenvolvemos e utilizamos somente técnicas consideradas verdes e que não possam prejudicar o meio ambiente. Existem muitas outras partículas como nanotubos de carbono, ciclodextrinas, dendrímeros, dentre outras, mas estas são menos utilizados na área cosmética, sendo algumas inclusive de toxicidade ainda em discussão. Para uso em cosméticos, as partículas mais adequadas são as nanopartículas lipofílicas e lipossomas, pois para sua fabricação são utilizados somente óleos vegetais e manteigas com características de afinidade pela pele e capazes de manter os ativos protegidos dentro da partícula, além de serem biodegradáveis.

tensa e com uso de concentrações muito menores devido ao aumento da eficácia. Outra classe de ativos que são amplamente utilizados no encapsulamento, são derivados de plantas, como óleos vegetais e extratos. Ambos são fontes promissoras de substâncias bioativas, porém em seu estado bruto, possuem a atividade antioxidante comprometida devido a instabilidade físico química. Essa instabilidade é eliminada com o encapsulamento. 5) Quais as diferenças no processo de criação, reações químicas e na forma com que agem no organismo humano as tecnologias de Nanopartícula Lipofílica, o Lipossoma, a Nanoemulsão e a Microemulsão em Fase Oleosa? Através das figuras é possível visualizar que o processo de fabricação de cada uma dessas partículas é totalmente diferente. Mas a forma com que elas agem na pele é muito semelhante, não existem diferenças consideradas muito significativas entre elas em relação ao efeito na pele, cabelo ou unhas.

3) Como são realizados os testes com produtos desenvolvidos a partir de nanotecnologia? São realizados diversos testes dos insumos desenvolvidos. O primeiro deles é estabilidade. Ela que vai nos dizer qual a validade do insumo. Durante todo o período de estabilidade são feitos testes de tamanho de partícula, pH, doseamento, centrifugação, viscosidade e características físico químicas. Posteriormente avaliamos a segurança clínica do produto, por exemplo, se ele é seguro para uso humano, não é alergênico. E por fim, verificamos se o produto desenvolvido é adequado para aquela finalidade, por exemplo, se o insumo for para redução das rugas, são feitos testes com voluntários avaliando a redução das rugas durante o período de uso do produto, tudo avaliado por médicos com comitê de ética envolvido. Com todos esses resultados em mãos, então é lançado o novo produto no mercado. Geralmente todo esse trabalho de desenvolvimento de um novo ativo dura em torno de 2 anos. 4) Qual é o produto da Inventiva que tem maior circulação no mercado? O produto “carro-chefe” da Inventiva é o NanoVit C, ele tem vitamina C nanoencapsulada, fabricado pelo processo de nanopartículas lipofílicas, ele aumenta a estabilidade em 100% do produto. Sabe-se que a Vitamina C é altamente instável, mas através do encapsulamento por este processo, foi possível reverter esse processo de degradação. NanoVit C já é usado por diversas indústrias de cosméticos, tanto de pequeno porte como grande. Suas vantagens são inúmeras quando comparamos com a Vitamina C na forma livre, além do aumento da estabilidade, ela tem um aumento na penetração da pele; liberação controlada, ou seja, a vitamina C é liberada de forma gradual, e devido a isso a duração do efeito é prolongada; redução das rugas e manchas de pele de forma mais in10

6) Os ativos nanotecnológicos garantem maior validade aos produtos. Qual é o tempo de duração de um produto cosmético da Inventiva em comparação a um produto produzido com ativos na forma livre? A validade dos insumos da Inventiva varia entre 1 e 2 anos. Existe uma grande diferença de estabilidade entre os ativos na forma livre e os ativos encapsulados. Os ativos como vitaminas A, E e C que degradam frente a luz, calor e umidade e são considerados altamente instáveis não tem uma duração muito grande. Por exemplo, a vitamina C na forma livre suporta somente algumas horas exposta a luz, sua degradação é tão rápida e pode-se chegar a uma concentração de zero depois de poucos dias exposta a luz. Já a Vitamina C encapsulada, possui uma parede que protege a vitamina C, deixando ela estável por até 2 anos dentro de um creme, sérum ou gel. Alguns ativos da Inventiva são estáveis também em fórmulas de esmaltes, o que é excelente, pois hoje é possível ter um esmalte com características não só de coloração, mas também de tratamento, hidratação, fortalecimento, tratamento de fungos e redução de manchas brancas. 7) Como a tecnologia de vocês é aplicada em cosméticos? Existe alguma composição química de algum produto, por exemplo, que torna incompatível a adesão de nanotecnologia? Ou ela pode ser aplicada a todos os produtos, além de cosméticos? O que faz se tornar compatível a utilização de nanotecnologia? Nossos ativos são diretamente incorporados em produtos cosméticos, como parte da formulação. Podem ser incorporados em géis, emulsões, xampus, condicionadores e até esmaltes e sabonetes em barra. Porém, nem todas nossas tecnologias são adequadas a todas as bases cosméticas. Um exemplo são os lipossomas que são muito estáveis em géis e séruns mas instáveis em emulsões. Entender a base é fundamental para obter um produto final de sucesso e nós damos todo este apoio ao cliente. Nossas tecnologias podem ser aplicadas em outras áreas como alimentos, fármacos e veterinária. Algumas destas áreas já utilizam nossos ativos, como em produtos para animais.


MURAL E AGENDA

Formatura Licenciatura em Química -UNISC, 12 de setembro de 2015

Agenda 07, 14, 21, 28 de Novembro de 2015

Curso de Gestor de Qualidade Informações e inscrições: www.msquality.net Telefone: (54) 3454-4020 E-mail: msquality@msquality.net

20 e 21 de Novembro de 2015 Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental em Porto Alegre/RS Informações e inscrições: www.maxiambiental.com E-mail: cursos@maxiambiental. com

28 de Novembro de 2015

Formatura Técnico em Química - Colégio Dom Feliciano 14 de setembro de 2015

Curso de Licenciamento Ambiental Informações e inscrições: www.escolaformula.com.br Telefone: (51) 3072 6508 E-mail: escolaformula@escolaformula.com.br

03 de Dezembro de 2015

Curso de Transporte de Cargas Perigosas – Nível I Informações e inscrições: www.escolaformula.com.br Telefone: (51) 30726508 E-mail: escolaformula@escolaformula.com.br

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