Digital entrega 2016 (edição temporária)

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Entrega de prémios – 25 de maio, 2016

Versão em digital dos textos premiados

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Escrever com arte Prémio António Arroio Concurso Literário 4ª edição 2015 | 2016

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POESIA

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Ritmo Renasce

Que rasgam por sebes revoltos Assaltos devotos caroços, De origens apenas Terrenas que visam, acenas. Que arrasam aldeias, Que fazem, que vivem, Que morrem a meias. Que pescam sereias Onde em mim eu quebro rochosas saudades Que seguem soando, Que seguem voando as árvores, As aves. Assombros escombros injustos Enterram-se na areia. Um sólido na veia Tu cismas, um líquido na pressa ressequido? Ele bate-me na derme E expira um ruído E revolta cuspido. E retorna a facada Como faz um amigo, mais nada. Dignidade que me resta E que me testa a tal saudade, Ei-la estendida ao sol. O que há de mais raro, No jardim acedido agredido Onde queda um vaso partido E caneta de aparo. Onde queda o caminho corrido.

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E o sol que não vem? Estará lá para mim, mais para o fim Onde não morre ninguém? Profundo remoinho de ira, Desejo-te moribundo repetindo essa mentira. Caminho de terra batida (a pisar e queimar e cuspir?) Em que um vulto escolheste seguir. Recuso-me, apelo ao que resta Que não, que não permita A tudo o que é misto, resisto Que seja só Que seja só isto. Segrega, que arde, que suga. (Não vale a pena, merda). Não há verão que não muda. Exista ele, que renasça Com urgência. Queda sedenta dormência, Sedosa demência.

1º prémio Ana Sofia Almeida 12ºL

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Bruma- nevoeiro, atmosfera escura e chuvosa. Uma pressão no maxilar, Zumbidos nos ouvidos, O efeito placebo incrível no seu melhor dia. O som profundo de carros ao longe À noite Através da bruma das árvores. Obrigado corpo por te mostrares bom. A mão treme, o corpo vacila. O modo automático dominado pela mente, os seus desejos, as suas vontades, e o mais esclarecedor de tudo, As suas ambições. De volta ao dicionário, Na mesa bem iluminada as suas letras parecem talha dourada duma igreja com nome de santo, não me lembro do nome. O título Universal dá-lhe um ar imponente, Proveniente de tudo ou de todos Logo universal, Descendente de Átomos os Heróis, cresceu neles uma vontade. Um dia, já com músculos nas pernas e pronto a assumir a bipedia, Bipedia- doença relativa a bípede. Morre um deles e os factos desconhecidos levam a crer num objecto. O tio macaco está morto e a aldeia pôs-se de joelhos Uns, com nojo do chão, Viram-no igualmente bem em cima da pedra Estendido, Viram-no ainda de mais perto e a sessão ainda não tinha começado. No fim, juntaram-se para a última cerveja e pensaram se iriam pedir mais ou ir embora de vez. Esses animais são para ser domados, Pede ao tio que traga a melhor nuvem que encontrar e o guardachuva. Depois copia-o e oferece aos mais próximos que vão achar genial. Desde o princípio, esteve aqui um som presente, um som que simpatizou com os meus ouvidos, Pedir silêncio é pedir por muito. 10


-tun-tin-tun-tin-tinArrepiante e paranóico - tun- tin- tun- tin- tinGotas do casaco encharcado pendurado Revelam-se pela falta de continuidade e são Declaradas culpadas Neste caso com cobertura das estações principais. A televisão chama e escutada por alguns, acende-se e brilha, tal igual a um interruptor funcional. Sinto-me melhor, a gripe tende a curar, as vacinas estão prontas a ser enviadas. Tenho os braços leves, As veias partiram há muito. Ainda não saí do corpo, Tenho saído muitas vezes. - Varanda degradada, gosto em conhecê-la, o serão foi ótimo.

2º Prémio Hugo Miguel Gonçalves 12º E

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“Sete noites mais alto e muda o vermelho para vermelho” Paul Celan

Sete noites atrás era vermelho o que vermelho é. Sete noites à frente serei vermelho outra vez. De sete em sete noites muda o tom uma oitava acima ou duas abaixo, conforme. Passadas sete noites notei que, a cada volta, aumentou o tom sete vezes. A cada volta, um tom de cada vez. Sete noites mais alto e já não suporto a estridência! Tanto som já nem espaço me deixa. Tanto som e já não tenho ar nesta paisagem que atiça o olho mais atento. A mudança de tom é indómita e eu fico encandeado com tanto espaço ocupado. Se houvesse sombra seria diferente e eu não seria tão de repente incomodado com a mudança drástica de vermelho para vermelho. Porque do vermelho ao vermelho, afinal, são apenas sete noites! Curto circuito na minha cabeça e tu curtes o circuito da tua – sete noites 12


mais alto e a cor que muda és tu quem faz. Uma, duas, três, sete voltas e está cada um a seu tom.

3º Prémio Madalena Wallenstein 12º C

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A indiferença para comigo”

Como te chamas? O meu nome é josefina Mas prefiro JoJo

Sou conhecida como Rosa, Pois ninguém tem dó da minha voz. Meus amigos dizem Alberta Meus pais dizem Amélia.

Sou o bobo do povo que me rodeia, Não me queixo, não resmungo, Suspiro. Sou conhecida por Roberta, Edelberta e Alzira. No final, cinquenta nomes disseram, Uma pessoa protestou, Mas é assim a minha vida De que vivi e sempre foi.

Menção Honrosa Margarida Gusmão 10º A

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O Homem que passou por mim Tem dois metros e trinta, O Homem que passou por mim Tem um casaco que arrasta o chão, O Homem que passou por mim Tem seis dedos em cada mão, O Homem que passou por mim É apenas uma ilusão. O Homem que passou por mim Tem olhos pretos, lábios finos, nariz grande e testa achatada, O Homem que passou por mim Tem dois diplomas, um doutoramento, uma casa no campo e uma mente fechada. O Homem que passou por mim É rico, é pobre, é magro, é forte, O Homem que passou por mim É livre, é preso, é vida, é morte. O Homem que passou por mim É som, é cor, é olhar, é defeito, O Homem que passou por mim É uma forma, um sentir, um sabor, um jeito.

O Homem que passou por mim Não existe, O Homem que passou por mim É minha imaginação,

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No final percebo: - Eu sou o Homem que passou por mim. Ele não.

Menção Honrosa Vasco Ribeiro 12º M

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Folhas no chão. Árvores despidas. Vento de outono, balançando-as ao ar. Parque solitário. Banco vazio. Cheiro de chuva.

Relva verde, acabada de cortar. Pássaros a debicar. Fumo, fecho os olhos. Passos distantes.

Folhas no chão do meu quarto.

Menção Honrosa Joana Pinto 12º O

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NARRATIVA

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O Desabrochar de um terceiro mundo

Só queria mudar algumas coisas na minha vida pacata, nem que fosse por um minuto ou dois. Com o olhar criei um violino e, no canto, pu-lo a tocar o “Introduction and Rondo Capriccioso opening 28”. Pelas janelas começou a jorrar uma luz branca que iluminou o cinzento monótono da sala, acompanhando o começo choramingas do violino. O frio sem misericórdia era agora uma brisa quente de Verão. O aceleramento repentino da música convidou labaredas verdes para um baile aéreo. Eram incontáveis e dançavam em harmonia com a sinfonia agora mais alegre e catita, deixando um rasto de um pó verde que brilhava à luz branca. A dança abrandou tal como o violino, que agora executava movimentos lentos para que as notas soassem nas cordas. O volume foi diminuindo em vibrato até que desapareceu numa nota forte que ressoou estrondosamente pela sala, obra de um conjunto de violinos que aparentavam não estar lá. Nesse forte momento, as labaredas enfiaram-se no chão e nas paredes numa velocidade extrema, e desapareceram sem deixar aquele rasto brilhante. O solo voltou com mais rigor e perfeição que nunca! Senti nele uma educação à moda antiga, uma educação de lady e gentleman. Nas paredes e no chão, fendas foram criadas e delas saíram pequenas raízes que se entrelaçavam criando raízes maiores. Não eram raízes normais, eram raízes de Minerva, verdes com lírios vermelhos. Continuaram a serpentear pela sala criando mais fendas e apegando-se às mesas dos alunos e depois a eles próprios! O coro de violinos voltou para acompanhar a cena, as paredes quebraram e caíram, enquanto o teto e o chão eram suportados pelos criados da deusa. Olhei em volta: os edifícios, as estradas, os carros, eram invadidos pela imensidão de relva e plantas nunca vistas. A cidade fora engolida pela natureza. E eu via nela o castigo do homem ou a purificação da Terra. Uma sintonia de cores, um céu azul, uma música majestosa... sem dúvida era o Paraíso! 22


A música parou a meio num ré extravagante, e com ela, o Paraíso que tanto ansiava ruiu deixando-me cair num profundo negro, em silêncio. Acordei e reparei que a aula tinha acabado.

1º Prémio Ricardo Encarnação 11º J

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O Deserto

No meio de um deserto vasto, existe uma pequena loja. A loja encontra-se maioritariamente vazia. Em relação a objetos para vender existem apenas umas garrafas de murmúrios e pequenas caixas de suspiros. A maneira como as coisas são vendidas nesta loja não envolve dinheiro, mas uma troca de objectos. No entanto também é possível que a rapariga por trás da bancada não aceite a troca. Ela chama-se Joana, é uma das poucas coisas que ela sabe sobre si própria. Outra coisa que sabe é que reconhece as pessoas que frequentam o seu pequeno negócio. Perdida nos seus pensamentos vazios, alguém abre a porta da loja e o sino é feito ouvir-se. Um homem de fato que já veio diversas vezes antes aproxima-se da bancada. Ele coloca um pequeno frasco cheio de um líquido transparente na mesa. - Um frasco de lágrimas por uma caixa de suspiros. - Ele pede delicadamente, baixinho, como se fosse possível quebrar algo caso falasse demasiado alto. Ele falava sempre assim. A Joana olha para o pequeno frasco e depois para o homem, abana suavemente a cabeça, sem dizer uma palavra. A sua expressão é impassível. Ele deixa cair os ombros, dando-se por derrotado, coloca outro frasco na mesa e dá uma volta, saindo da loja. No momento em que coloca um pé no exterior, desaparece como se fosse uma miragem. Os dias assim vão passando. Umas vezes aparece uma senhora idosa que traz um sentido de nostalgia a Joana; outras vezes as pessoas entregam máscaras de preocupação em vez de lágrimas; de vez em quando ela aceita a oferta dada e as pessoas acabam por acrescentar um saco de esperança aos objetos a oferecer à loja, como se fosse uma gorjeta. A rotina não muda e ela mantém-se sempre inexpressiva aos acontecimentos à sua volta. Os únicos que a visitam que ela não reconhece são umas pessoas vestidas todas de branco. Eles mantêm sempre expressões calmas e pedem sempre a mesma coisa - Mais tempo. - Joana não tem a certeza do que lhe estão a pedir, mas no entanto acena sempre a cabeça e eles desaparecem no instante seguinte. 24


Porém, numa certa tarde, um senhor que ela não reconhece entra na loja. Ele veste-se todo de preto e anda lentamente; a sua cara permanece invisível perante o dia brilhante. Aproximando-se da bancada ele diz: Adormece. Pela primeira vez ela reage. Um arrepio passa-lhe pela espinha. Está com medo. Com cuidado, recusa o pedido, abanando a cabeça. Olha para longe tentando evitar o olhar do senhor que a estuda calmamente. - Hei de voltar.- Promete ele, saindo da loja. O tempo volta a andar e Joana relaxa no seu lugar. Mais dias passam, talvez meses, talvez anos. É difícil contar o tempo num sítio onde o sol nunca se põe. O senhor de preto não volta, as pessoas continuam a visitar a loja, as coisas são normais, ou então ela pensa que são. Um dia o sol começa a pôr-se, o que a surpreende ligeiramente, mas ela não deixa isso mostrar-se na sua expressão. A noite vem e com ela um novo cliente, um cliente que se parece exatamente com ela. A sua réplica aproxima-se com passos determinados e começa a falar. - Acorda. – Pede ela, aproximando-se mais da bancada. - Acorda.- Ela suplica, as suas mãos tremem quando as pousa na superfície. - Acorda! Ela grita, batendo com as mãos na bancada. O barulho faz a Joana vacilar. Ela fecha os olhos. Um som constante faz eco nos seus ouvidos. - Ela está a acordar! - Alguém exclama. - Chamem o doutor! - Uma voz forte ordena.- Joana, acorda.Suavemente alguém suplica. Ela abre os olhos lentamente, encontrando rostos vestindo as máscaras de preocupação que lhe foram dadas, com olhos a transbordar das lágrimas que lhe eram entregue em frascos de vidro, e toda a aura em volta dela cheia da esperança ensacada que era dada como gorjeta. Desta vez, ela aceita a oferta sem pensar uma segunda vez e oferece um fraco sorriso a todos os seus antigos clientes.

2º Prémio Carolina Santos

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Sinto a lama nos meus pés, ando descalça em todo o lado. A minha avó disse-me para ir à horta buscar umas cenouras para a sopa. Sempre adorei arrancá-las, sentia-me como um coelhinho. De seguida tenho de ir regar as rosas, este calor secou a terra… Mais lama. De noite, saio outra vez à horta, mas desta vez não é para ir buscar cenouras, mas sim para olhar para o céu estrelado. “Tenho medo avó, parece que o céu se vai desmoronar sobre mim!”. Desde então tenho medo de me sentir pequena e insignificante. A cidade é um refúgio e uma prisão, livre de estrelas e da Via Láctea. Tenho saudades do peso do céu salpicado de astros, às vezes sonho com ele. Mas temo o desconhecido que ele esconde na sua dimensão imensurável mesmo depois de todos os anos vividos após essa visão. Mas gosto de acreditar que um dia vou enfrentar essa mesma paisagem e apreciá-la por fim, respeitá-la em silêncio.

3º Prémio Lina Pozhydayeva 12ªI

FIM

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