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PRIMEIROS PASSOS NO ESTUDO DA CIÊNCIA DA VIDA: A BIOLOGIA NA 1ª SÉRIE DO ENSINO MÉDIO

A Biologia costuma ser uma disciplina muito aguardada pelos alunos que ingressam no Ensino Médio, especialmente por aqueles que já simpatizam com as Ciências da Natureza no Ensino Fundamental. Entretanto, qual é a ideia que vem à mente quando se ouve este nome? Bio de onde? Logia de quê? Augusto dos Anjos não respondeu a essas perguntas ou declarou seu olhar sobre a Biologia, mas escreveu um enigmático poema com ar epistemológico intitulado "A ideia". Este foi publicado no livro Eu em 1912, aprecie-o:

De onde ela vem?!¹ De que matéria bruta Vem essa luz que, sobre as nebulosas, Cai de incógnitas² criptas misteriosas Como as estalactites duma gruta?!4

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Vem da psicogenética e alta luta Do feixe de moléculas³ nervosas, Que, em desintegrações maravilhosas5, Delibera, e, depois, quer e executa!

Vem do encéfalo absconso que a constringe, Chega em seguida às cordas do laringe, Tísica, tênue, mínima, raquítica...

Quebra a força centrípeta que a amarra, Mas, de repente, e quase morta, esbarra No mulambo da língua paralítica!

O estudo da Biologia no Ensino Médio inaugura um novo olhar para a vida e "De onde ela vem?!"¹. Introduz um novo modo de estudo, um olhar mais profundo para os organismos, lança um desafio e tanto para os estudantes recém chegados neste novo ciclo escolar. Para manter os estudantes estimulados a desvendar as incógnitas² apresentadas pela ciência da vida, não basta apresentar os objetos do conhecimento propostos para esta fase escolar, que aliás são muitos, é necessário também um extenso trabalho pedagógico que articula os métodos mais adequados para cada conteúdo e de acordo com o cenário de ensino.

Para melhor gerir este processo, o caminho pedagógico se inicia olhando para o fim, selecionando os objetivos de aprendizagem, identificando quais evidências aprendizagem que se deseja coletar e finalmente idealizando as experiências de aprendizagem mais adequadas, uma abordagem que se alinha com o que propõe Wiggins e McTighe (2019) sobre a abordagem denominada planejamento reverso. Na primeira série os objetivos de aprendizagem na área de ciências biológicas se organizaram em três componentes curriculares: o curso de Biologia no ensino regular e os cursos do itinerário formativo do eixo de Ciência da Natureza denominados de Frankenstein (aborda saberes de Biologia e História) e O Homem Vitruviano (aborda saberes de Biologia e Química).

A Biologia no ensino regular

A Biologia do ensino regular começou com uma apresentação das diversas áreas das ciências biológicas para informar quais delas serão o foco da 1ª série e foi procedida pela exploração dos princípios básicos do estudo da vida.

O que define um ser vivo? Quais compostos orgânicos e inorgânicos estão relacionados às funções vitais? Como as biomoléculas são metabolizadas no organismo humano?

Essas são algumas das perguntas que motivaram as investigações iniciais.

Ao longo das aulas do 1º bimestre os estudantes solucionaram exercícios de modo individual e também coletivo, seja em pequenos grupos ou em discussões mediadas por representantes com toda a turma. Glicídios! Glicerídios! Foram algumas das palavras chaves da elaboração de mapas mentais de Bioquímica (quer saber mais? Acesse o capítulo "O ensino de Bioquímica no Ensino Médio"). E, como foi animosamente aguardado, eles realizaram atividades práticas no laboratório de Biologia, uma vivência que neste início também se concentra em trabalhar as boas práticas de um laboratório além dos temas centrais como por exemplo a manipulação e reconhecimento do Microscópio.

E a regra é: Se tem laboratório, tem relatório! O relatório das aulas práticas é um modo de instrumentalizar os estudantes na escrita científica, algo que desenvolverão ao longo de todo o Ensino Médio e que cultivará habilidades e competências que serão importantes para além da vida escolar. A escrita de relatórios configura mais um passo em direção ao desenvolvimento da leitura da natureza e da compreensão do trabalho científico, algo que o Colégio Uirapuru valoriza e no qual investe.

Passado o 1º bimestre e analisados os resultados das principais avaliações, foi recalculada a rota para o segundo bimestre. Este se iniciou com investimentos em procedimentos de estudos e registro, intensificaram-se a aplicação de atividades que demandavam a sistematização das compreensões de modo dissertativo, algo que se mostrou importante para as novas temáticas: A composição, replicação, transcrição e tradução do DNA e a Citologia.

O estudo do DNA envolve muitos processos, moléculas e enzimas, faz jus a importância desta molécula³ na constituição das características vistas e não vistas em cada indivíduo e para sistematizar esses saberes os estudantes criaram, entre outras coisas, representações gráficas de modo manual e digital.

O estudo mais aprofundado da citologia se inicia por sua delimitação: a membrana plasmática (MP). A MP tem uma constituição fantástica que permite a passagem de algumas substâncias por meio de diferentes tipos de transporte através da membrana como a osmose e a difusão simples, após estudá-los, os alunos foram ao laboratório vivenciar uma aula prática baseada na abordagem de ensino denominada ensino de ciências por investigação (ECI). No ECI diferente das aulas práticas tradicionais onde os estudantes recebem algo similar a uma "receita de bolo" para cumprir e observar, nesta eles receberam objetivos e foram desafiados a demonstrar sua compreensão a partir dos materiais disponibilizados. A aula prática tradicional também tem objetivo pedagógico legítimo, no entanto, para algumas práticas é algo bem-vindo o exercício da criatividade e mobilização dos conhecimentos a partir da investigação (MONTEFERRANTE-DELIBERALI, ANTONIO, 2019)

Nesta aula, a famosa extração de DNA também não podia ser deixada de lado.

O 3º bimestre por sua vez continuou com a exploração das células voltando-se para os seus processos energéticos e reprodutivos. Um dos tópicos mais desafiadores da Biologia é estudado aqui, a respiração celular e suas etapas: glicólise, ciclo de Krebs e cadeia respiratória.

O estudo desses fenômenos exige um maior preparo dos estudantes e para isso estes vivenciaram algumas Flipped Classrooms (aulas invertidas). Nesta abordagem antes da aula os estudantes recebem materiais simples e intuitivos para se familiarizar com o tema e realizar um estudo prévio, desta forma estes podem melhor desenvolver suas dúvidas a partir da realização de exercícios e das discussões em sala de aula (SCHNEIDER; BLIKSTEIN; PEA, 2013).

A divisão das células também foi estudada de modo teórico e prático, mobilizando as competências de trabalho em laboratório desenvolvidas ao longo do ano. Prófase, metáfase, anáfase ou telófase? A identificação das fases da mitose requer conhecimento e nossos alunos "tiraram de letra".

O 4º bimestre é representado por uma grande mudança de olhar, este sai do mundo microscópico da citologia e da bioquímica para estudar o indivíduo e sua relação com outros seres vivos e com o meio ambiente: a ecologia.

A ecologia é inaugurada pelo estudo do meio ao Parque Estadual Turístico do Alto Ribeira (PETAR). Lá os estudantes ficam imersos em descobertas sobre a mata atlântica, as cavernas e suas as estalactites4, saberes biológicos, geográficos e químicos se sobrepõem para convidar os discentes a conservar os ecossistemas pelo conhecimento, beleza e o respeito às formas de vida. Em sala de aula os exemplos práticos foram resgatados para compreender as terminologias da ecologia, as interações ecológicas e os ciclos biogeoquímicos. Quer saber mais sobre esta maravilhosa5 prática pedagógica? Acesse o texto sobre o estudo do meio na 1ª série.

A Biologia nos itinerários formativos: Frankenstein

Ao longo de 2022, os estudantes que escolheram a disciplina Frankenstein mergulharam na relação do ser humano com o mundo natural em uma perspectiva que analisou os eventos históricos e científicos desde o século XIX até os dias atuais. Para isso leram livros e assistiram a uma obra cinematográfica que contam a história que dá nome a disciplina e foi brilhantemente escrita por Mary Shelley.

Para materializar os saberes que construíram nessas experiências, em grupos os estudantes criaram encenações que retratavam um trecho da história e que concomitantemente respondia a uma das perguntas: "Como se deu a origem da vida?" ou "Como eram compreendidos os conceitos de vida e morte no século XIX?".

Inspirados pela criação da vida do monstro representado na literatura, as discussões se estenderam para as teorias de origem da vida e o método científico. Mas, afinal, qual é a natureza da ciência? Quais as características do trabalho científico? Estas e outras questões despertaram interesse que se desdobrou na leitura de artigos e na análise de uma obra cinematográfica, para sistematizar as discussões os estudantes produziram de modo individual resenhas que discutiam os materiais e respondiam a pergunta "A ciência é neutra?".

O próximo passo nessa exploração foi estudar os limites da ciência segundo a bioética. A sequência didática sobre bioética trazia a cada encontro um capítulo do livro The birth of bioethics escrito por Albert Jonsen da Universidade de Oxford em 2003 que foi transposto em atividades que se baseiam em diferentes metodologias ativas de ensino. Em um dos encontros os estudantes foram apresentados à doença renal crônica, elaboraram o perfil de um personagem acometido pela doença, contando suas características e história de vida. Depois foram surpreendidos com a notícia de que só uma pessoa poderia receber o tratamento e sem o tratamento os demais morreriam, desta forma eles deveriam elaborar critérios para decidir em um conselho quem seria selecionado para receber o tratamento. Ao final da discussão eles compararam os critérios e decisões que tomaram com uma história real narrada pelo livro de Josen (2003).

O último bimestre se dedicou a aprofundar os conhecimentos dos alunos nas áreas da biotecnologia e da evolução. Também a apresentar-lhes a importância da divulgação científica, prática esta que foi inaugurada com uma exploração no espaço Eco do colégio, mediada pela professora da disciplina Gabriela Deliberali e o responsável pelo laboratório de Biologia Davi Gutierrez.

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