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EDUCAR PARA O SUCESSO E PARA O SENTIDO: CONTRIBUIÇÕES DA COORDENAÇÃO PEDAGÓGICA E DA ORIENTAÇÃO EDUCACIONAL
Para desenvolver os encontros, ao longo do ano, nos propusemos a estudar integralmente dois livros: "10 princípios para a aprendizagem visível - educar para o sucesso", de John Hattie e Klaus Zierer, e "Educação em busca de sentido - pedagogia inspirada em Viktor Frankl", de Eloisa Marques Miguez.
Hattie e Zierer (2019), começaram nos apresentando o "círculo dourado", desenvolvido por Simon Sinek (2019, p. viii), nos apresentando perguntas que nos levaram a pensar nas características dos líderes.
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"Educar para o sucesso e para o sentido: contribuições da Coordenação Pedagógica e da Orientação Educacional" foi o tema escolhido para os encontros de formação continuada da equipe pedagógica em 2022. Por que este tema? Porque uma educação escolar que implique no sucesso acadêmico dos alunos e na busca de sentido precisa ter como premissa um trabalho articulado e colaborativo entre Coordenação Pedagógica e Orientação Educacional. Embora tenham atribuições específicas, elas têm interfaces fundamentais, pois ambas trabalham com os alunos e com os professores, cada uma em sua dimensão.
A introdução deste tema chegou carregada pela literatura de Bartolomeu Campos de Queirós, nos dizendo que "por meio dos sentidos suspeitamos o mundo" (2009). É essa a nossa convicção: se aquilo que pretendemos ensinar, desenvolver em nós mesmos, em nossos professores e em nossos alunos, não passar pelos sentidos dificilmente encontrará eco em aprendizagens significativas, em aprendizagens que ultrapassem os limites da escola.
Após reflexão, percebemos que a principal questão do líder bem-sucedido se concentra em por que algo deve ser feito, seguida do como fazer e, consequentemente, definindo o que fazer. É um movimento de dentro para fora, que impacta diretamente na vida e na formação da equipe pedagógica, dos professores e, também, na dos alunos. Isso nos levou ao conceito de "bom trabalho" (Gardner, Csikszentmihalyi e Damon, 2004), onde a ética, o engajamento e a excelência são responsáveis pela qualidade daquilo que se realiza.
Desse modo, um bom profissional "sabe o que está fazendo, garante que as coisas sejam feitas e consegue nomear as razões pelas quais está fazendo o que faz" (HATTIE e ZIERE, 2019, p. xi).

Os autores descrevem dez princípios que fundamentam a visibilidade da aprendizagem, a partir de evidências empíricas, e mostram o quanto é importante que os professores estejam atentos e conscientes do impacto de suas ações à aprendizagem dos alunos, da natureza do significado desse impacto, assim como sua validade. O livro oportunizou a vivência de ferramentas e estratégias que se referem a "como os educadores refletem sobre a profissão, as intervenções, os alunos e seu impacto" (HATTIE e ZIERE, 2019, p. xv).
Miguez (2014/2020), tendo referência no pensamento de Viktor Frankl, nos reforça a ideia de que "para viver, o homem tem, sobretudo, necessidade de sentido. (...) O homem é capaz de manter-se responsável para buscar a cada dia o sentido da vida, ainda que na situação mais adversa e inumana" (p. 20). Nesse sentido, ele é um ser que decide, "a cada decisão realiza a si mesmo e se autoconfigura como personalidade" (p. 39). Aqui, o sentido pode se referir à uma situação ou a uma pessoa.
"O sentido é relativo enquanto está relacionado a uma pessoa específica que, por sua vez, está envolvida também em uma situação específica. Isso porque cada pessoa é singular em sua irrepetibilidade, como também sua existência é singular, e nela se apresentam as possibilidades de realização de um sentido a cada momento" (MIGUEZ, 2014/2020, p. 74).
É nesse espaço existencial, de tensão entre o ser e o dever ser, que o ser humano se mostra constitutivamente educável.
É na articulação das ideias de Hattie e Zierer (2019) e de Miguez (2014/2020) que buscamos educar para o sucesso e para o sentido, afinal, "a educabilidade humana (...) reconhece a dinâmica por excelência da educação em seu aspecto formativo: um processo que parte do sujeito (de dentro para fora), que acontece no espaço existencial entre o ser que sou e o ser que devo ser ou que aspiro ser" (MIGUEZ, 2014/2020, p. 119).
Contemplando o 1º princípio (Sou um avaliador do meu impacto na aprendizagem dos alunos), nos questionamos: Será que o impacto do que fazemos é mais importante do que o que fazemos? Esta pergunta foi disparadora para avaliarmos nosso impacto na aprendizagem dos professores e, consequentemente, dos alunos e para buscarmos nossas características e reconhecermos o impacto de nossas ações, como Coordenação Pedagógica ou Orientação Educacional.


Hattie e Zierer (2019, p. vii) nos dizem que "todos passamos cerca de 15 mil horas de nossa vida na escola (RUTTER et al, 1980) e temos aproximadamente 50 professores diferentes nesse período".
Levantamos quantos/quais professores provocaram profundas mudanças em nós. Pensamos nos professores que permanecem em nossa memória de modo positivo. Pensando nas lembranças de bons professores, recuperamos na memória o que lembramos quando pensamos neles. Por fim, pensamos na razão de alguns professores permanecerem em nossa memória, mesmo depois de muitos anos e outros nem serem lembrados, mesmo após um curto período de tempo.
Foi um exercício interessante que nos levou a concluir que o impacto que alguns de nossos professores tiveram em nossa constituição docente está muito ligado ao bom trabalho, no quanto ética, engajamento e excelência estavam presentes em suas ações. Eram professores apaixonados pelo ensino, pela aprendizagem, pelos alunos.
Hattie e Zierer (2019) nos dizem que são professores que identificam as motivações e disposição dos alunos para se envolverem com a aula, têm diversas intervenções, conhecem as habilidades dos alunos e as que precisam ser desenvolvidas e utilizam diversas formas colaborativas para avaliar, além de buscarem implementação de qualidade.


Usando a rotina de pensamento "Os quatro Cs (conexões, desafios, conceitos/ideias, mudanças)", que dá direcionamento quando queremos discutir questões relacionadas ao texto que lemos, em grupos, fechamos a discussão com as perguntas:
• Quais conexões conseguem fazer entre o cenário, as considerações e seu fazer cotidiano?
• Pensando no fazer cotidiano, no cenário e nas considerações apresentadas, quais são seus desafios?
• Destaquem os principais conceitos/ ideias apresentados que acreditam serem importantes para estruturar o impacto de suas ações, junto aos professores e/ou alunos.
• Quais mudanças de atitude/pensamento/ ideia apresentadas no cenário e/ou considerações são sugeridas, tanto para você, como para os professores e/ou alunos?
Trabalhe em pares: apresente suas ideias a um dos colegas. Organizem as ideias que são semelhantes às suas. Anote a(s) ideia(s) apresentada(s) pelo colega e que são diferentes das suas.
Compartilhe 1: apresente a(s) ideia(s) do seu colega e montem um quadro com as ideias que fazem mais sentido para o grupo.
Compartilhe 2: apresentem à turma o quadro de ideias que fazem mais sentido para o grupo. Aqui percebemos que os resultados dos processos de avaliação dos alunos também são feedbacks importantes para os professores, indicando aspectos sobre a aula e as questões pedagógicas. Desse modo, a compreensão e análise dos resultados do desempenho dos alunos contribui para o professor também avaliar o impacto que suas ações têm na aprendizagem deles. Esse processo permite que os professores ajustem o ensino promovendo intervenções mais assertivas para que os alunos avancem.



Para iniciarmos o estudo do 2º princípio (Vejo a avaliação como um fator que informa meu impacto e os próximos passos), lançamos mão da seguinte rotina de pensamento "Pense sozinho e reflita / Trabalhe em pares / Compartilhe", que estimula a articulação do raciocínio, a síntese de ideias, a explicação em voz alta que leva ao entendimento de modo natural:
Pense e reflita sozinho: em silêncio, escreva três ideias apresentadas no texto e fizeram muito sentido para você.
O 3º princípio (Colaboro com os colegas e alunos sobre minhas concepções de progresso e meu impacto) aborda o conhecimento educacional como "produto de troca e colaboração" (HATTIE e ZIERER, 2019, p. 22), destacando a relevância do desenvolvimento do senso de comunidade entre as pessoas. O foco está na colaboração e na partilha, aproveitando "o poder da inteligência coletiva em benefício dos alunos e também em benefício dos professores" (HATTIE e ZIERER, 2019, p. 29).
Vejamos as sínteses realizadas pelos grupos.
O 4º princípio (Sou um agente de mudanças e acredito que todos os alunos podem melhorar) nos ensinou que aprender tem relação com perspectivas de diferentes atores envolvidos no processo: professor, aluno, pais, colegas porque a "aprendizagem bem-sucedida requer perspectivas específicas, e é responsabilidade de todo o entorno do aluno (professores, pais e colegas) construir, apoiar e desenvolver perspectivas positivas em todos os envolvidos" (HATTIE e ZIERER, 2019, p. 36), vendo a si mesmo como agente de mudança.






O 5º princípio (Esforço-me para que os alunos sejam desafiados, e não apenas para que "façam o seu melhor"), apresenta o desafio como elemento importante para a aprendizagem, desde que esteja ajustado, em um nível compatível ao desenvolvimento e repertório do aluno. Para isso é preciso que o professor tenha "clareza para nomear todas as etapas de planejamento em relação aos objetivos, ao conteúdo, aos métodos e recursos didáticos e use exemplos para explicá-los aos alunos. (...) É importante tornar os objetivos da aula claros para os alunos, tornando-os apropriadamente desafiadores e proporcionando muitas maneiras e oportunidades de monitorar o progresso começando do ponto em que o aluno inicia em direção aos objetivos da aula" (HATTIE e ZIERER, 2019, p. 55).
O 6º princípio (Dou feedback e ajudo os alunos a entendê-lo, interpretando e agindo de acordo com o feedback que recebo) nos traz a necessidade do aluno também dar feedback do trabalho do professor, por conta da aprendizagem e do ensino serem processos dialógicos.


Fatores da aprendizagem visível que consideram importante o significado do feedback para o processo de aprendizagem:
- Questionamento: perguntas cognitivas de nível superficial (sobre fatos), profundo (relacionar ideias, estabelecer conexões com os conhecimentos prévios) ou de transferência (aplicar em nova atividade)
- Estratégias metacognitivas: pensar sobre os próprios processos mentais, questionar a própria aprendizagem, tornar a aprendizagem visível para si mesmo, usar os erros para reflexão e coerência da própria ação, foco na autorregulação
- Habilidades de estudo: anotações, revisão e assimilação de conteúdos, regular a própria motivação, estabelecimento de metas e controle de aprendizagem
Níveis de feedback:
- Pessoal: avaliações pessoais e efeito (geralmente positivo) no aluno (elogios e críticas à pessoa);
- Da tarefa: quão bem as atividades foram compreendidas e executadas (produto da aprendizagem - acertos/erros);
- Do processo: processo necessário para entender/executar as atividades (como trabalhou - organização, métodos usados);
- Da autorregulação: automonitoramento, direcionamento e regulação de ações (mecanismos usados para regular a aprendizagem - refletir sobre a correção, o que poderia fazer melhor).
O 7º princípio (Envolvo-me tanto em diálogo quanto em monólogo) tem como premissa a troca com outros atores envolvidos no processo educativo: alunos, pais e outros professores. Tem como referência o ensino dialógico, que estimula e amplia o pensamento dos alunos, "permitindo a eles e ao professor diagnosticar com maior precisão o que sabem e o que entendem errado, para que a próxima atividade de aprendizagem possa ser realizada de forma mais adequada. Privilegia os alunos a pensar em voz alta. (...) Envolve não apenas escutar o que eles dizem, mas demonstrar que escutou e entendeu o que estão dizendo. É uma maneira de pensar sobre como ensinar por meio da escuta, do estímulo e da reação ao modo como os alunos estão pensando" (HATTIE e ZEIRER, 2019, p. 93).

O 8º princípio (Explico aos alunos de forma clara como é o impacto bemsucedido desde o início) nos revelou que a aprendizagem de sucesso requer clareza no processo e no resultado da aprendizagem. Para isso, é fundamental que os professores definam e compartilhem com os alunos os critérios de sucesso para que eles tenham clareza onde podem chegar e o que precisam fazer para isso. Essa ideia está ancorada na "abordagem da aprendizagem para o domínio em que todas as pessoas podem aprender algo quando são dadas explicações adequadas sobre a compreensão e o domínio do assunto a ser aprendido" (HATTIE e ZIERER, 2019, p. 110). A visibilidade dos objetivos de aprendizagem permite que os alunos compreendam melhor cada etapa do processo de aprendizagem, suas fragilidades e potencialidades, o que já sabem e o que ainda não sabem. Por outro lado, os professores têm mais elementos para entender o processo de aprendizagem dos alunos e propor feedbacks e encaminhamentos mais assertivos. Saber dos objetivos de aprendizagem, também, possibilita autocompromisso, autoconfiança, autoavaliação e compreensão conceitual mais aprofundada.

A "roda da aprendizagem visível" (HATTIE e ZIERER, 2019, p. 115) expressa a profissionalização coletiva dos professores e possibilita aos alunos visualizarem as ações da aprendizagem e do ensino.



O 9º princípio (Construo relacionamentos e confiança para que a aprendizagem ocorrer em um ambiente seguro para cometer erros e aprender com os outros) nos mostrou a importância:
- dos relacionamentos positivos, que abrem espaço para a confiança e a segurança, sendo precursores da aprendizagem;
- de usarmos a expressão "ainda não", no lugar de, por exemplo, "não sabe";
- do humor e da alegria para trazer leveza no ambiente;
- da credibilidade do professor;
- do professor mostrar respeito e admiração pelo desempenho dos alunos;
- da construção de regras e combinados que orientam, dão segurança e sentido de pertencimento.
"As relaçõs positivas levam à confiança para se envolver em desafio, para tentar uma atividade difícil, para construir a confiança para se envolver em trabalho árduo" (HATTIE e ZIERER, 2019, p. 127).
O 10º princípio (Foco na aprendizagem e na linguagem da aprendizagem) ao longo do estudo, reforçamos a ideia de que a aprendizagem "é um processo ativio e autodirigido, mas o sucesso não depende apenas do aluno: muito também está nas mãos dos professores, que podem decidir se o aluno tem o potencial de assumir a aprendizagem sozinho, com os outros ou com assistência especializada" (HATTIE e ZIERER, 2019, p. 130). Identificar os conhecimentos prévios dos alunos é fundamental para os encaminhamentos propostos pelo professor possibilite conflito e desenvolvimento cognitivo e, consequente, sucesso da aprendizagem.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
GARDNER, Howard; CSIKSZENTMIHALYI, Mihaly e DAMON, William. Trabalho qualificado: quando a excelência e a ética se encontram. Porto Alegre: Artmed/Bookman, 2004.
HATTIE, John e ZIERER, Klaus. 10 princípios para a aprendizagem visível - educar para o sucesso. Porto Alegre: Penso, 2019.
MIGUEZ, Eloisa Marques. Educação em busca de sentido - pedagogia inspirada em Viktor Frankl. São Paulo: Paulus, 2014/2020.




QUEIRÓS, Bartolomeu Campos de. Os cinco sentidos. São Paulo: Global, 2009.
