Concurso Literário Escolar - Textos premiados 2022-2023

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CONCURSO literario escolar

TEXTOS PREMIADOS 2022-2023

POESIA

Vencedor do 1º Escalão | 2º Ciclo do Ensino Básico

Ó GENTE DO MAR

Ó gente do mar

Porque choram

Ó gente do mar

Porque imploram por voltar

Ó deuses do mar

Porque nos fazem tempestades

Ó águas do mar

Poupai-nos, ajudai-nos

Ó gente do mar

Ó gente da minha vida

Apanhei uma concha

Numa praia deserta

Parecia uma ilha fechada

Que nunca fora aberta

Um mundo de pouco amor

De tristeza e solidão

Ó gente da minha vida Ó gente do meu coração

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Mas por mais que eu queira Estamos perdidos em alto mar

Tantas tempestades e tão pouca esperança

Ó gente da minha vida Ó gente do meu coração

Ando às voltas Sem qualquer rumo

Não sei se vou

Para norte ou para sul Ou para lado nenhum

Mas são as voltas do meuPensamento

Ó gente do mar

Ó gente da minha vida

Se perguntarem onde estou

Eu responderei que não sei

Responderei que sou um homem perdido em alto mar

Que nunca recuperou a fé

Ó gente do mar

Ó gente da minha terra

Pensamento Positivo 437

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Vencedor do 2º Escalão | 3º Ciclo

OS PUTOS DO MEU BAIRRO

Ponho-me na janela, a observar

os putos do meu bairro a despertar.

Lembro-me de mim, com aquela idade...

Como o tempo passa!

Aquelas memórias, Que, agora, viram histórias, Põem-me a sonhar!

Vejo neles, tanta alegria e felicidade, naquela vida despreocupada.

Há tantos adultos que deveriam imitá-los...

Miúdos dos quatro cantos do Mundo, brincam sem rodeios, sem pensarem no futuro.

Era bom que todas as crianças pudessem ter uma infância assim,

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com uma vida alegre e adequada. Em vez disso, veem a infância destroçada, vítimas da guerra. Coitadas! Que vida bastarda!

São tantas as que têm como advogado entre a vida e a morte, um homem com a sua glock que, se premir o gatilho, tira o sorriso que devia ser a vida e traz a morte.

Lembro-me de tempos, não muito antigos, em que jogava à bola a tarde inteira, com os meus amigos.

Ah! Que saudades daquela vida de charme!

A infância, Que etapa bela, Uma distância eterna, na minha memória.

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Os putos do meu bairro, que futuro os espera?

Que sejam boas pessoas e, acima de tudo, não se esqueçam de onde vieram.

Nunca percam aquela essência tão característica da infância!

Tenham muita paciência e persistência, Sem esquecer a perseverança, pois o mundo de hoje não dá tréguas, mas faz tudo pelas trevas.

Nunca se esqueçam que a vida dá muita bofetada, mas o mais importante é seguir de cabeça levantada.

Nunca liguem à conspiração do insucesso, não é o lugar de onde vêm que vai ditar o vosso sucesso.

Lembrem-se que a vida é feita de sonhos!

Só nós os podemos realizar, sem nunca desviarmos a cabeça do lugar.

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No futuro, serão homens e mulheres do Mundo. Nunca se esqueçam que, cada um de nós, tem o poder da diferença, neste mundo de desavença.

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Dikito

Vencedor do 3º Escalão | Secundário OS PORQUÊS DO AMOR

Dizem que o amor é algo incrível, que é tão belo e poderoso, que se torna duradouro e inesquecível.

Dizem que é de outro nível, que é um violoncelo com um tom supersticioso, um rio de ouro invertível.

Dizem que é sensível, que é um elo cauteloso, um tesouro flexível.

Mas o que é que acontece quando estica tanto que quebra? Quando a mágoa arde mais alto que a chama?

Dizem que é algo horrível, que é um martelo incessante e tenebroso, um constante choro incompreensível.

Dizem que é uma angústia impossível, que é um duelo tumultuoso, um coro proeminente invisível.

Dizem que é terrível, que é um flagelo no peito doloroso, um matadouro infelizmente previsível.

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Mas nunca se deve perder a esperança.

Porquê?

Porque amar é inevitável, é comum embora inigualável, e único e incontrolável.

Porque amar é afável, é na amizade indispensável, e na família insaciável.

Porque o amor completa-nos criando as raízes de uma linda flor.

Porque o amor faz-nos descobrir um novo caminho devastador.

Porque podemos amar mais do que uma vez sem pavor.

Porque podemos amar mais do que uma pessoa, causando dor.

Porque o amor faz passar o tempo e o tempo faz passar o amor.

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Vencedor

do 1º Escalão | 2º Ciclo do Ensino Básico PAULO E A FÉNIX

Era uma vez, numa cidade muito distante, um menino chamado Paulo. Ele era alto, magro, moreno, aventureiro e inteligente. Quando era pequeno, aconteciam sempre coisas estranhas, das quais os seus pais sempre se queixavam: faíscas no ar quando o Paulo nasceu, as velas dos bolos de aniversário em que as chamas saíam como foguetes… ele ficava sempre no mesmo lugar desde pequeno, conhecia todos os cantos, pessoas, esconderijos…

Não havia mais nada para ver e ficava sempre intrigado com as coisas estranhas que lhe tinham acontecido no passado. Os seus pais não permitiam que ele saísse do seu bairro, pois o mundo lá fora era perigoso, diziam eles muitas vezes ao filho. Numa noite de março, Paulo, quando toda a gente estava a dormir, agarrou em alguma comida, água e outros bens essenciais e fugiu de casa, para finalmente perceber a origem daquelas coisas estranhas e ser independente.

Como a zona onde morava era rodeada de bambu, agarrou alguns daqueles pedaços, enrolou-os com sisal e fez um escudo e uma espada improvisada por causa dos “tais monstros e animais” que ele tanto temia. Depois de tanto andar, já era de dia e ele estava cansado e com fome, até que encontrou um templo antigo que tinha frutas, alguns artefactos e pergaminhos.

Como o Paulo estava com todo o tempo do mundo para usar, decidiu ler um que lhe chamava à atenção. O pergaminho estava coberto de couro, no meio tinha uma imagem de uma ave vermelha e laranja. Depois de ler, descobriu que era uma fénix, uma ave de fogo que renasce das suas cinzas após a sua morte. Depois de recolher todos os itens precisos e o pergaminho, continuou a andar e encontrou uma montanha maior que três blocos do tamanho do seu apartamento.

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CONTO

Pensando nisto, sentiu saudades daquilo que deixou. Decidiu então subir ao topo daquele rochedo para ver o quão longe estava de casa. Tinham passado dias, estava cheio de feridas, sem comida, água… mas finalmente tinha chegado ao topo da montanha onde viu algumas chamas que revelaram uma fénix que estava a olhar para ele de uma forma especial.

Passado algum tempo nesta infinita troca de olhares, perceberam que podiam confiar um no outro e que algo os unia. De repente viram uma grande nuvem escura ao longe, a aproximar-se da cidade do Paulo, esta tinha duendes de neve em cima. Criaturas brancas com orelhas pontiagudas que tinham acabado com muitas cidades, vilas e aldeias antigas.

O Paulo e a fénix trocaram olhares aflitos, algo tinha de ser feito. O Jovem sobiu para as costas da sua nova amiga e juntos voaram até verem que a nuvem estava por cima da cidade em que ele nascera e tinha deixado para trás. Os dois amigos decidiram defender a cidade destes duendes de neve, até não sobrar nenhum. Mesmo antes da nuvem se desfazer, já tinham derrotado todas as criaturas.

Depois desta vitória, a fénix vê que o Paulo estava mortalmente ferido, por isso, deu-lhe todo o poder e vida que tinha o que o tornou num menino feito de chamas e com asas. A fénix morreu sem volta a dar, não podia renascer do que sobrou dela. Atualmente, o Paulo ainda guarda as cinzas da fénix na montanha onde estava, onde agora, miraculosamente apareceu um ovo vermelho e laranja.

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Semínima Arom Alvis

Vencedor do 2º Escalão | 3º Ciclo

ARREPENDIMENTO

O sol já se escondera em Kassa, tal como nos anos há muito esquecidos, e 1944 não seria diferente.

Só se ouvia nas ruas a melodia suave da rádio e os batuques das sapatilhas de pontas da única bailarina da área. A jovem girava, assemelhando-se a um anjo, quando um forte estrondo percorreu a casa inteira.

Sem saber o que a esperava, Anelise Eger abriu a porta antiga e duas mãos apressadas agarraram-na. Ao olhar em frente viu três homens que entraram em casa e buscaram a mãe e a irmã.

Atiradas para dentro de um veículo, ficaram assim as três acompanhadas de muitas outras pessoas. Anelise apercebeu-se então o que se passava, iam ser levadas como prisioneiras para um campo de concentração. Quando a camioneta parou, encaminharam-nas para um comboio.

- Mãe, eu não quero partir sem me despedir do Eric! – Gritou Anelise histericamente.

- Não te preocupes meu anjo, nada te vai acontecer! – Assegurou-lhe a mãe. Foi quando escutou o seu nome gritado fora da janela. Era o Eric, o namorado de Anelise.

- Ouve-me, eu nunca me vou esquecer dos teus olhos e das tuas mãos, elas ficarão sempre na minha memória! – Disse o jovem carinhosamente, tentando segurar as lágrimas.

Anelise não conseguiu dizer nada, o comboio apitava e tinha começado a andar, o que quer que lhe dissesse nunca ia parar aos ouvidos de Eric.

Horas intermináveis se passaram, a escuridão do lugar era o único porto seguro das crianças vencidas pelo sono e cansaço. Na noite escura como breu, alguns choros abafados podiam ser ouvidos, mais uns metros e a viagem chegaria ao fim.

Quase a amanhecer, as mulheres mais velhas olharam os raios de sol a nascer no horizonte. Nada se passava na cabeça de Anelise, os zumbidos eram os únicos

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barulhos que ouvia, sem saber o que pensar, chorou. Pensou na guerra e no horror que estavam todos a viver.

Chegaram finalmente ao que parecia uma estação de comboios. Saíram e todos formaram uma fila, foram informados que, quem saísse do lugar destinado, morria. No final, todos iriam morrer, mas a vontade de persistir por mais um mísero dia, era tentadora. Caminhando para a sepultura, sabia que não voltaria àquele cais, não iria escapar. Viu um monte de corpos, as vestes que foram brancas, estavam cinzentas e de vermelho tingidas. No fundo do corredor ouvia-se o zumbido de uma máquina, um a um entraram e saíram sem cabelo.

A mãe e a irmã foram à frente e ela foi logo atrás. Juntaram-nos todos no átrio e foram apresentados a um dos comandantes, que separou os prisioneiros uns dos outros.

- Esta é sua mãe ou irmã? – Disse, referindo-se à mãe de Anelise.

- É a minha mãe, senhor. – Retorquiu lentamente.

- Esta vai para já para o banho! – Gritou o homem para os guardas.

Antes de a arrastarem, a mãe colocou as mãos no cimo da cabeça de Anelise.

- Não importa o que me aconteça, lembra-te que o futuro está mais perto do que pensas, não te percas nele, prometes? – Proferiu calmamente.

Lágrimas subtis apareceram nos olhos da mãe quando a afastaram à força. Passaram-se muitas horas e dias, Anelise sentia-se cada vez mais afogada num arrependimento, na resposta que deu. Finalmente, conseguiu entender o que a mãe tentou dizer-lhe. Se nunca nos desprendermos do passado, ele acabará por nos consumir por completo até não restarem forças para tentarmos ver o que o futuro nos aguarda. A mãe de Anelise queria que a filha tivesse esperança.

Um súbito toque ecoou pela sala, alguém tinha acabado de bater na porta onde estavam todos os prisioneiros.

- Quem aqui sabe dançar? Se ninguém responder vão ser punidos! – Perguntou rudemente o homem de bata que estava na entrada, junto à porta.

As mulheres olharam entre si com medo enquanto murmúrios ecoavam. O homem parecia que ia explodir de raiva pela demora. Com medo e sem nada a perder, Anelise decidiu arriscar, pensando que tudo tem um fim.

- Eu sei… – Sussurrou.

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O homem foi até ela e agarrou-a com força, levando-a consigo.

- Dança pra mim. – Disse maliciosamente.

Ela assim fez, dançou desesperadamente, pensando no amor, lutando pela vida. Passaram-se meses, ou talvez semanas. A rotina continuou, dançava quase todas as noites.

O vento uivava na manhã em que Analise pensou que iria marchar para a morte. Lucidamente pensou que a sua vida chegara ao fim, ainda quase antes de começar. Mas naquele dia de março de 1945, foi libertada. Saiu de Auschwitz e foi para um hospital apinhado quase a morrer. Conseguiu sobreviver, mas a irmã não.

Sem nada e sem ninguém, foi para casa, ou para o que dela restava. Recebeu a notícia de que Eric morrera num campo de concentração um dia antes da libertação.

Estava então sozinha, sem corpos para derramar as lágrimas já secas havia muito tempo e sem poder aliviar o fardo dos seus ombros por não se ter despedido quando teve oportunidade. No fundo, soube que podia tê-la tido. Sem sepultura para desabafar e gritar, não tinha nada do Eric nem da família, nem sequer as cinzas.

O melhor que podia fazer para honrar a sua partida e conseguir acalmar o seu coração, era pedir-lhe perdão no último sítio onde o viu. Tudo que tinha era o arrependimento de não ter aproveitado o tempo que teve com ele.

No final, pensou, com alguma admiração, que só percebemos que algo é importante quando o perdemos.

Alexandria de Babel

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Vencedor do 3º Escalão | Secundário

Deplorável Mundo Novo

O sol despontava no horizonte. Amélia observava-o ao longe. Os sons da floresta à sua volta invadiam os seus ouvidos, enquanto ela ansiava por sentir os raios da grande estrela na sua pele demasiadamente branca. Precisava de retornar ao estúdio para estudar. Um grunhido escapou-lhe com o pensamento. Não lhe apetecia voltar à sala gélida. A lembrança das paredes brancas e dos monitores luminosos causou-lhe um arrepio, fazendo-a puxar os joelhos para perto e cruzar os braços sobre eles, deixando um espaço para deitar a cabeça cansada. Prolongaria aquele momento ao máximo para ficar longe de toda a comoção de máquinas e luzes que a aguardavam na cidade.

Uma vibração no pulso, porém, relembrou-a da responsabilidade. Clicou na tela do dispositivo digital que lhe mostrou que as aulas começariam dentro de uma hora. Amélia respirou fundo, por mais que odiasse o seu curso, sempre foi uma aluna pontual e cumpridora dos seus deveres, não seria agora que colocaria a perder tudo que construíra. Levantou-se e aproximou-se da sua motocicleta. O visor acendeu com a proximidade do relógio, que controlava o veículo e duas hélices, posicionadas em baixo foram acionadas fazendo-o flutuar levemente. Amélia tirou o capacete de dentro do banco, colocou-o na cabeça e ajustou a fivela que abraçava o seu queixo. Baixou o visor e, com um clique, ele acendeu mostrando um GPS interativo mesmo à frente de seus olhos, fazendo-a piscar.

Ao seguir pela larga avenida, dividia o espaço com outros automóveis. Todos dispensavam a presença de rodas e dispunham de uma tecnologia que os fazia flutuar, permitindo-lhes alcançar grandes velocidades. À medida que se adentrava na cidade, a tecnologia erguia-se com uma força sufocante, varrendo toda a paisagem natural e substituindo-a por monitores gigantes a piscar anúncios em todas as esquina. As árvores, que noutros tempos se encontravam nas ruas já não existiam. Todo o espaço era ocupado por carros e motos. Até a

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grande e imponente Amazónia, o grande pulmão da Terra, já estava resumida a apenas alguns quilómetros de extensão.

Amélia gostava de assistir ao nascer do sol todas as manhãs na tentativa de escapar do mundo robotizado no qual se encontrava. Para isso, deslocavase até uma reserva florestal que ficava a uns trinta minutos da faculdade. A mãe liderava uma equipa de biólogos que faziam pesquisas naquela área e, por isso, tinha-lhe conseguido um cartão de acesso.

"Daqui a trezentos metros, virar à esquerda.” A voz mecânica do GPS ressoou no capacete. “O seu destino fica à esquerda."

"Não importa quantas atualizações eu faça, essa vozinha continua irritante." Observou.

“O seu destino fica à esquerda." repetiu a voz.

"Já entendi!" Amélia respondeu ao robô e dirigiu-se ao estacionamento destinado aos alunos.

O edifício da Universidade de Ciências Tecnológicas era uma construção nova, feita para substituir o imponente prédio antigo construído em 1885.

À entrada, Amélia aproximou o seu relógio do painel que controlava a porta. As luzes acenderam-se e depois de piscarem por alguns segundos as portas abriram-se.

O vento frio que soprou de dentro do saguão afastou alguns fios de cabelo que se haviam desprendido da longa trança dourada e pendiam em frente ao rosto da jovem.

"Bom dia, Lia!" Dois longos braços envolveram o pescoço de Amélia num abraço caloroso que a pegou desprevenida.

"Bom dia, Cathy! Assim me derrubas, génia." Amélia respondeu ao abraço de sua amiga fingindo incómodo.

"Ai, peço desculpas, génia." Catarina imitou. "Tens alguma aula aqui no Pavilhão A, hoje?"

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"Todas, até ao almoço." Amélia respondeu entediada. Catarina era uma apaixonada pela escrita. Cursava Tecnologia das Letras com o intuito de trabalhar na área de escrita e publicação de livros digitais, já que os de papel já haviam sido extintos pelo facto das únicas árvores restantes no planeta serem reservas destinadas à estudos. Já Amélia, cursava Tecnologia das Belas Artes e Cathy era a única pessoa que sabia do desgosto que esse curso lhe trazia.

"Tem paciência, amiga, só mais um ano." Confortou Cathy.

"Eu sei… o que é mais um ano quando já se aguentou dois…?"

"Sim. Olha, tenho que subir, hoje minhas aulas são todas no Pavilhão B. Fica bem. Vejo-te no almoço."

O relógio inteligente vibrou outra vez. Faltavam cinco minutos para a aula. Amélia fez a confirmação de presença num monitor à entrada e reservou seu almoço. Então, seguiu pelo longo corredor sem janelas com luzes e paredes brancas imaculadas.

Ao chegar na sua sala, passou o relógio outra vez num painel ao lado da porta, que abriu-se. Nenhum de seus colegas tinha chegado ainda. A sala era igualmente branca e fria, porém microprojetores instalados nas paredes projetavam obras de arte de vários períodos diferentes.

As mesas eram grandes de forma a comportar um monitor com teclado e rato e eram dispostas em fileiras. Amélia sentava-se na última, perto da janela.

A jovem pendurou sua mala no encosto da cadeira acolchoada, sentou-se e ligou o computador. Em poucos segundos o dispositivo estava desbloqueado através de reconhecimento facial.

Pela janela, era possível ver o sol a brilhar lá fora, mas nenhum de seus raios eram sentidos através do vidro, que era duplo, para manter a temperatura e possuía uma película que filtrava a radiação Ultravioleta. Esse tipo de tratamento nas janelas e o uso de bastante protetor solar se fazia extremamente

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necessário, pois há séculos estudos demonstravam a diminuição progressiva da Camada de Ozono.

De onde estava sentada, Amália observou o pátio. No centro havia uma mórbida estátua do fundador da Universidade. À volta dele foram colocados alguns vasos com plantas artificiais. Há alguns anos tinham tentado cultivar alguns arbustos verdadeiros, mas eles não sobreviveram aos cuidados dos diferentes robôs que formavam a equipa de manutenção do edifício.

A verdade que as autoridades que financiavam esse uso desenfreado de tecnologia não queriam admitir, contudo, era que é necessário vida para gerar e manter a vida. Nem toda a tecnologia do mundo, sozinha, seria capaz de manter o planeta vivo.

Não havia nenhum sítio onde os alunos pudessem sentar-se lá fora, pois ninguém iria se expor ao sol, sem a proteção do filtro de raios UV. Quando foi que o mundo tornou-se tão mórbido e tão mortal? Muito inspirador.

"Mas quem precisa de inspiração quando tudo o que se faz e aprende nesse lugar é como programar computadores?!" Murmurou para si mesma.

"Disseste alguma coisa?" Perguntou-lhe Theo, que ainda arrumava suas coisas na mesa ao lado da de Amélia. Estava tão absorta em seus pensamentos que nem viu quando o rapaz entrou na sala. Outros colegas também já haviam chegado sem que ela tivesse notado.

"Nada não. Estava a ver o plano de estudos para hoje. Só temos aulas de programação.” Disse sem tirar os olhos do monitor que mostrava a lista de disciplinas que poderiam ser encontradas em qualquer curso de TI e que nada tinham a ver com Belas Artes. Mas, é claro que era por isso que o curso se chamava Tecnologia das Belas Artes.

“Hum, e o que mais a senhorita esperava cursar em pleno 3023 que não fosse 95% «tech»?” Theo respondeu achando piada do desânimo da colega.

“Esse é o problema.” Respondeu Amélia a colocar os fones de ouvido para assistir a mais uma aula dada por um robô sobre como programar um

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computador para gerar qualquer obra de arte desejada com apenas algumas palavras-chave.

Naquela manhã, as quatro horas de estudo passaram depressa, mas não renderam nada. Amélia não pode evitar o incómodo sempre que olhava em volta e via seus outros colegas, todos de fones, cada um a assistir a sua aula sem a presença de um professor humano. A turma nem sequer estava toda presente, pois esse sistema permitia que o aluno assistisse as aulas de qualquer lugar, desde que tivesse o equipamento para tal. Só era obrigatório a presença em sala de aula nos dias que estivesse agendado um debate, ou uma realização de trabalho de grupo.

Assim que seu relógio vibrou novamente as horas, indicando o término das aulas da manhã, Amélia pegou suas coisas e correu para o refeitório, situado no último piso, para se encontrar com Catarina. Sentia-se extremamente fatigada por estar cercada por robôs e precisava urgentemente de tempo de verdade com indivíduos de sua própria espécie.

Entrou no elevador e discou o número do andar. Sentiu o tradicional frio na barriga ocasionado pelo movimento ascendente da máquina e sentiu-se sufocada. Estava a ser literalmente engolida por todas aquelas máquinas com suas luzes e botões.

As portas do elevador abriram-se para um amplo salão iluminado com luz natural. O teto era feito de uma versão mais espessa do vidro das janelas e com o triplo do tratamento contra a radiação.

Amélia rapidamente encontrou Catarina que a cumprimentou com um sorriso.

“Olha só quem sobreviveu a mais um dia!” brincou.

“Há, há. Muito engraçadinha. Com muito custo, sobrevivi a mais um dia e vou sobreviver aos restantes, quero meu diploma. Não é porque esse curso é uma desilusão que não o vou obrigar a fazer valer o meu esforço.”

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“Exatamente. Mas, o que é que tu realmente esperavas deste curso afinal? Querias ser o próximo Miguel Ângelo…” Perguntou Cathy com um sorriso brincalhão nos lábios.

“Epah, estás a bancar a comediante hoje, né? Tiraste o dia para gozar do meu desgosto.” replicou Amélia apoiando o rosto nas mãos.

“Não estou a gozar do teu desgosto, Lia, mas uma de nós precisa aliviar o clima, senão, deprimimos nós as duas!” Cathy tinha razão.

“Pois, estás a ver? O mundo virou uma coisa sem sentido. O criador aos poucos tornou-se escravo da criação. E não refiro-me a Deus. Estou mesmo a falar do ser humano. Não há nada que ele não faça sem a presença constante de tecnologia. Não estou a dizer que ela não seja importante. Na verdade, ela nos facilitou a vida em muitos aspetos e os grandes avanços na medicina só foram possíveis graças a ela. Mas chegamos a um ponto em que isto se tornou demasiado. Será que te submeterias a uma cirurgia a ser realizada 100% por um robô baseado num diagnóstico feito pelo próprio? Eu é que não. Gradativamente o ser humano foi afastado de suas funções para dar lugar a mais e mais máquinas até chegarmos ao ponto de sermos pessoas extremamente solitárias e, como tu mesma disseste deprimidas. Precisamos da presença uns dos outros. Não podemos fecharmo-nos numa redoma «high-tech» e fingir que isso é normal e que está tudo bem, porque não está. Onde foi parar o nosso intelecto? Já ninguém quer raciocinar nada! Basta pegar nos dispositivos eletrónicos e digitar o problema no site de busca que ele próprio apresenta um tutorial de como resolvê-lo. Isso, ao mesmo tempo que é prático, é extremamente cômodo para nossas mentes que necessitam estímulo constante. Até a arte está a sofrer com isso! Qualquer um pode «criar» uma obra-prima ao inserir algumas palavras num gerador de imagens e conseguir um resultado esplêndido sem qualquer esforço. A coisa mais fácil do mundo hoje é escrever uma poesia, basta dar o comando ao computador. Ficamos preguiçosos, Cathy, e por mais neurónios que se necessite para construir um computador ou uma outra máquina qualquer, em breve apenas uns poucos humanos serão necessários para clicar o botão de «start» e as máquinas, ligadas à tecnologia da Inteligência Artificial, governarão

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o mundo. E quando esse dia chegar, pode ser que haja escassez de vida na Terra, pois estamos a fazer-nos desnecessários. Que deplorável mundo novo.”

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POESIA

Vencedor do 1º Escalão | 1º Ciclo do Ensino Básico

p. 1

“Ó Gente do Mar”

escrito por Laura Lopes, do A.E. António Gedeão, da E.B. Comandante Conceição e Silva, do sexto ano, turma F.

Vencedor do 2º Escalão | 2º Ciclo do Ensino Básico

p. 3

“Os Putos do Meu Bairro”

escrito por Carlos Diogo Gonçalves Marques Pereira Antunes, da Escola

Secundária Emídio Navarro, do nono ano, turma A.

Vencedor do 3º Escalão | Secundário

p. 7

“Os porquês do amor”

escrito por Bruna Ramos, de A.E. António Gedeão da E.S. António Gedeão, do décimo ano, turma A.

CONTO

Vencedor do 1º Escalão | 1º Ciclo do Ensino Básico

p. 9

“O Paulo e a Fénix”

escrito por Gabriel Mora da Silva, do A.E. António Gedeão da E.B Comandante Conceição e Silva, do sexto ano, turma A.

Vencedor do 2º Escalão | 2º Ciclo do Ensino Básico

p. 11

“Arrependimento”

escrito por Lara Sófia Gonçalves Traça, do A.E. Prof. Ruy Luís Gomes / E.B.S Prof. Ruy Luís Gomes, do nono ano, turma C.

Vencedor do 3º Escalão | Secundário

p. 14

“Deplorável Mundo Novo”

escrito por Ana Beatriz Morais, do A.E. Prof. Ruy Luís Gomes da E.B.S Prof. Ruy

Luís Gomes, do décimo primeiro ano, turma D

Biblioteca Municipal de Almada – Fórum Municipal Romeu Correia

Praça da Liberdade, Almada | Tel: 212724920

Biblioteca Municipal José Saramago

Rua da Alembrança, Feijó | Tel.:212508210

Biblioteca Municipal Maria Lamas

Rua do Moinho ao Raposo, Caparica | Tel.: 211 934 020

Sítio: www.cm-almada.pt/bibliotecas

E-mail: bibl.mun.alm@cma.m-almada.pt www.flickr.com/photos/bibliotecasalmada/

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