LANDRA
PT Nesta exposição, os Landra — nome da dupla artística e também da terra onde vivem Sara Rodrigues e Rodrigo Camacho — propõe uma escuta atenta ao mundo. Landra é agrofloresta em construção, é lugar de experimentação, abrigo e promessa. Mas é também gesto simbólico: as landras, frutos dos carvalhos, remetem-nos para uma cultura de abundância silenciosa, onde o alimento cai das árvores e a vida se organiza em torno do suficiente. O trabalho de Sara e Rodrigo cruza arte e ecologia, entre o vídeo, a performance, a instalação e a prática agroecológica. Estudaram permacultura e microbiologia do solo. Cultivam, investigam, constroem, partilham. Fazem da arte um modo de vida, e da vida um lugar para a escuta, para a regeneração e para a imaginação. Antigamente, o território a que hoje chamamos Portugal era coberto por carvalhais mistos, onde comunidades humanas e não-humanas conviviam com equilíbrio. Era possível viver com pouco, porque o pouco era partilhado. E o chão, esse, estava cheio de possibilidades. Desses tempos ficaram saberes: casas feitas com o que a terra dava, alimentos que caíam das árvores, modos de vida onde o comum era abundante. Com o império e a lógica do lucro, a terra passou a ser medida, vendida, esvaziada. Os baldios, os montes e os campos foram abandonados. Mas ainda aí reside uma hipótese de futuro.
Em Habitat, os Landra regressam à floresta como espaço fundacional — um lugar abundante em madeira, pedra, água e alimento. A exposição não é um regresso nostálgico. É uma convocatória. Sara e Rodrigo propõem uma arqueologia sensível do habitar: voltam à terra, à matéria, à escala humana. Pensam a casa, e a sua fundação, como extensão do ecossistema, permeável, transitória, viva. Uma casa que não corta o mundo, mas que o prolonga. Não se trata de opor o selvagem ao humano, mas de reconhecer que a intimidade pode nascer da porosidade com o mundo — e que a verdadeira riqueza talvez seja essa: estar em relação.
É na sala da Galeria Municipal, situada no piso -1 — esse subsolo onde começam as fundações de qualquer estrutura — que se apresenta simbolicamente as fundações deste Habitat. Aqui, o espaço expositivo assume-se como lugar fundacional, não apenas do projeto artístico, mas também de um modo de pensar o mundo: mais atento ao território, às matérias que o compõem e às formas como o habitamos. Neste espaço, somos convocados a imaginar, deambular e especular. Tolentino de Mendonça escreveu que “não se habita verdadeiramente um lugar sem habitar também o tempo que o atravessa”. Habitat é esse exercício de presença, de lentidão e de cuidado: uma tentativa de, com a arte, voltar a escutar a terra.
Filipa Oliveira
In this exhibition, Landra — the name of both the artistic duo and the land where Sara Rodrigues and Rodrigo Camacho live — proposes a careful listening to the world. Landra is an agroforestry project in the making, a place of experimentation, shelter, and promise. It is also a symbolic gesture: the landra, the acorns of oak trees, points to a culture of quiet abundance, where nourishment falls from the trees and life is organised around sufficiency.
Sara and Rodrigo’s work weaves together art and ecology, moving between video, performance, installation and agroecological practice. They have studied permaculture and soil microbiology. They cultivate, investigate, build, and share. They make art a way of life, and life a space for listening, regeneration, and imagination.
In earlier times, the land we now call Portugal was covered by mixed oak forests, where human and nonhuman communities coexisted in balance. It was possible to live with little, because the little was shared and the ground, always, was full of possibilities. From those times, certain knowledges remain: houses made from what the land gave, food that fell from trees, ways of life in which the commons were abundant. With empire and the logic of profit, the land came to be measured, sold, emptied. Commons, hills and fields were abandoned. And yet, even now, a possibility for the future resides there.
In Habitat, Landra returns to the forest as a foundational space — a place abundant in wood, stone, water and food. The exhibition is not a nostalgic return. It is a call. Sara and Rodrigo propose a sensitive archaeology of dwelling: they return to the earth, to matter, to a human scale. They imagine the house — and its foundation — as an extension of the ecosystem: porous, transient, alive. A house that does not divide the world, but extends it. It is not about opposing the wild and the human, but recognising that intimacy may arise from our porosity with the world — and that true wealth may lie precisely there: in being in relation.
It is in the Municipal Gallery’s basement room — that underground space where the foundations of any structure begin — that the symbolic foundations of this Habitat are laid. Here, the exhibition space becomes a place of grounding, not only for the artistic project, but for a way of thinking the world: more attentive to the land, the materials that compose it, and the ways in which we inhabit it. In this space, we are invited to imagine, to wander, to speculate.
Tolentino de Mendonça once wrote that “one cannot truly inhabit a place without also inhabiting the time that passes through it.” Habitat is such an exercise in presence, in slowness, in care: an attempt, through art, to once again listen to the land.
Filipa Oliveira
AGRADECIMENTOS:
Irene Rodrigues, Clara Santiago, João Ferreira, Bianca Hlywa, Gerard Ortin Castellví, Padre José Ribeiro, Carpinteiro José Machado, Mestre Carlos Jorge, Vizinho Júlio, Mário Rainha Campos.
ACKNOWLEDGMENTS:
Irene Rodrigues, Clara Santiago, João Ferreira, Bianca Hlywa, Gerard Ortin Castellví, Father José Ribeiro, Carpenter José Machado, Master Carlos Jorge, Neighbor Júlio, Mário Rainha Campos.
LISTA DE MATERIAIS:
postes, colunas, traves e vigas de madeira: carvalho alvarinho Quercus robur carvalho negral Quercus pyrenaica nogueira negra Juglans nigra
castanheiro Castanea sativa cinzas de carvalho, castanheiro e nogueira pedras de granito roladas saibro granítico carvão vegetal
4 vídeos de 8/10 min em loops não sincronizados
8 canais de som (transdutores instalados nas peças de madeira) impressão em papel de algodão 120 x 80cm objetos de medição em madeira
LIST OF MATERIALS:
Posts, columns, beams, and wooden structures:
Pedunculate oak (Quercus robur)
Pyrenean oak (Quercus pyrenaica)
Black walnut (Juglans nigra)
Sweet chestnut (Castanea sativa)
Ashes from oak, chestnut, and walnut
Rolled granite stones
Granite gravel
Charcoal
4 videos of 8–10 minutes in unsynchronized loops
8 audio channels (transducers installed in the wooden structures)
Cotton paper print, 120 x 80 cm
Wooden measuring objects