O Jeitinho no Direito Administrativo Brasileiro (e seus efeitos no desenvolvimento)

Page 43

espelha a necessidade de conhecimento pessoal é o dito: quem tem padrinho, não morre pagão.122 O nivelamento entre jeitinho e corrupção depende do grau financeiro, enquanto as coisas ficam no nível da cerveja, do cafezinho e da gorjeta em níveis mais altos estaria a corrupção, segundo BARBOSA123. Há referências aos princípios ético-morais: não nego nada a ninguém, ajudo a quem posso, todos devemos nos ajudar mutuamente, uma mão lava a outra.124 Nos domínios do jeito há a negativa ao caráter biológico, difícil de contemporizar: na vida só não há jeito para a morte, só não há remédio para a morte. A técnica do jeito trabalha com as relações pessoais, ora com bom papo, seja simpático ou charmoso, realçando as características de igualdade entre os sujeitos, ora realçando as diferenças, por meio do denominado carteiraço: você sabe com quem está falando?125, a primeira modalidade usada pelo joão-ninguém a segunda pela autoridade.126 A história do padrinho no Brasil vem do começo do século XVI, em que Portugal estava na transição da idade média para a era moderna, o Estado reconhecia e acatava as leis da Igreja que dominava soberana pelo batismo, tão necessário à vida civil como à salvação da alma.127 Daí resulta a necessidade de se ter padrinho para se garantir a autoridade e o favor, esta instituição advém da necessidade de se ter um batismo e não ficar pagão e reza o folclore brasileiro que o pagão, sem batismo, quando morre não pode ir para o céu, porque não é cristão, nem para o inferno, porque não pecou, o pagão vagará pelo Limbo e reaparecerá sempre nas encruzilhadas, esquinas de cemitério, pátios de fazenda, estradas solitárias, choramingando pelo batismo.128 Por sua vez, se o viajante, batiza o pagão, proferindo as palavras: Eu te batizo em nome do Padre, do Filho e do Espírito Santo! Ouvirá risos e os pagãos, tornados anjos de Deus, serão protetores do padrinho.129 122

PINTO, idem, p.124. BARBOSA, Lívia. O jeitinho brasileiro: a arte de ser mais igual do que os outros. Rio de Janeiro: Elsevier, 2006, p. 44 e ss. 124 BARBOSA, idem, p. 45. 125 DAMATTA, Roberto. Crônicas da vida e da morte. Rio de Janeiro: Rocco, 2009, p. 51, referindo-se às culturas igualitárias e desenvolvidas: “Credos mínimos estruturas essas culturas. Por exemplo: o “First come, first serve” (quem primeiro chega, primeiro é atendido) é um dos princípios fundamentais do igualitarismo moderno que ainda não precisou de “regulamentação” por nenhum jurista de fala enrolada e de linguagem criptográfica, com o fito de limitá-lo às elites.” 126 BARBOSA, idem, p. 52 e 53. 127 ABREU, Capistrano de. Capítulos da História Colonial do Brasil. Ministério da Cultura. Fundação Biblioteca Nacional. Departamento Nacional do Livro, s/d., p. 8, no site: http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/bn000062.pdf, acesso em 01/08/2011. 128 CASCUDO, Câmara. Dicionário do Folclore Brasileiro. 9ª Ed. Rio de Janeiro: Ediouro, 1954, p. 659. 129 CASCUDO, Câmara. Idem, p. 659. 123

43


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.