Revista Redemoinho ano 09 nr 15

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Ano 09 • Número 15

Revista do Curso de Jornalismo do IESB - Brasília, dezembro de 2018

Violência virtual

Pelo celular ou internet, agressão contra mulheres é cada vez mais comum

Múltiplo Conic Idealizado por Lúcio Costa como uma espécie de Champs-Elysées brasiliense, local hoje é marcado por decadência e ecletismo

Bullying contra idosos Agressão sistemática é agravada por preconceito, negligência e descaso e, muitas vezes, família é principal responsável


O mundo está mudando. Vamos criar as novas leis? Mestrado em Direito Social e Processos Reinvindicatórios. O único no Brasil. Tinha que ser do IESB.

O IESB foi autorizado pelo MEC a oferecer o curso de Mestrado Profissional em Direitos Sociais e Processos Reivindicatórios. O IESB é o único do Brasil a oferecer esse curso e foi todo pensado sob o conceito de inovação e por produções científicas nas linhas de pesquisa. Com ele aprofundaremos os estudos teórico e prático dos procedimentos e processos em que se inserem as ambiências e conflitualidades referentes às relações de trabalho. Estamos em um mundo novo e novas ideias sobre os conflitos que nos surgem diariamente sairão daqui. Bem vindos.

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EDITORIAL A décima quinta edição da Revista Redemoinho é uma produção de muitas mãos. Nós, alunos do 5º. semestre do curso de jornalismo do Iesb, ganhamos companhia dos que ainda vão chegar por aqui e também dos discentes de design gráfico. A galeria de fotos é a estreia dos estudantes do 2º. período na Revista. Já o pessoal do design deu cara nova à Redemoinho, embalagem fundamental para deixar a leitura mais sedutora, com mais qualidade visual e harmonia. Ao longo desses anos, a publicação tornou-se patrimônio do curso. O ‘”fazer jornalismo” em uma era de tantas fakes News é um desafio e tanto. Estar na Redemoinho é um marco para cada um de nós. Desde a apresentação da pauta, quando nos esforçamos por produzir conteúdos inéditos e com olhar diferenciado, até podermos folheá-la, são muitas as semanas. Entre “sims” e muitos “nãos” recebidos, ela vai aos poucos se construindo. Foi assim que decidimos falar sobre a violência contra a mulher escondida atrás de cliques e da crença no anonimato, a vingança pornográfica, o sexting, a importunação sexual e o cyberbullying, formas de agressão com conteúdo viral e devastador. A intimidação também está presente entre os idosos. De forma sistemática. Somam-se ao bullying, preconceito, negligência, descaso e falta de políticas públicas. Mas a Redemoinho é plural. O Conic, uma espécie de Champs-Elysées brasiliense na concepção de Lúcio Costa, também tem sua história retratada aqui. Da mesma forma, pode ser conhecida a rotina das meninas que decidiram adotar um estilo de vida religioso que inclui uso de véu, saia e cabelos longos, orações diárias e castidade, as chamadas consagradas. O dia a dia das drag queens, o movimento minimalista, o tabu quando se trata de saúde mental, o risco de extinção da nossa floresta invertida e a educação a distância também estão entre nossas produções. O que oferecemos a você, agora, é o nosso melhor. Um importante degrau no desafio de retratarmos cotidianamente nossa história! Boa leitura! RE D E M O IN H O | 1


Coordenação editorial e edição: Leila Herédia. Projeto gráfico: Gabriel Cordova, Maycon Cardoso e Thaynara Martins, sob a supervisão de Amaro Júnior, Cecília Bona e Noel F. Martínez. Direção de arte: Mariana Pagotto. Conselho editorial: Cândida Mariz, Carlos Siqueira, Daniella Goulart, Guilherme Lobão, Leila Herédia, Luísa Guimarães e Márcio Peixoto. Coordenação do curso de jornalismo: Daniella Goulart. Direção geral do Iesb: Eda Coutinho Machado. Tiragem: 1.000 exemplares. Redação: (61) 3445-4577. Repórteres e fotógrafos do 5º semestre de Jornalismo: Andréia Maranha, Ingrid Pires, Jhonatan Guimarães, Mariana Figueiredo, Matheus Costa, Maína Chaffin, Mayara da Paz, Pâmela Maria, Rodrigo Albuquerque e Zilá Motta. Foto da Capa: Rayra Paiva. Galeria de imagens: João Lucas Santana.


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Bullying contra idosos agrava situação de vulnerabilidade

18

Buscar ajuda é fundamental para a saúde mental

24

Comer extrapola nutrição ou conquista do corpo ideal

30

‘Consagradas de Maria’: vida de restrições no século XXI

36

Jovens transformistas buscam estrelato

42

Acúmulo é inimigo de tendência que privilegia qualidade

48

Conic, 18 condomínios e mais de 50 anos de história

54

Os desafios da opção pela educação a distância

60

Cerrado, a floresta invertida corre risco de extinção

66

Galeria de fotos

Foto: Maria Eduarda Jardim

Mulheres denunciam sexting e cyberbullying


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C OMPORTAMENTO

Violência com cliques Pelo celular ou na internet, agressão virtual contra mulheres, o chamado cyberbullying, tem efeito devastador com propagação de conteúdo instantânea e viral

por: Mariana Figueiredo

Um insulto que chega por mensagem no celular. A exposição de conversas pessoais pela internet. A divulgação de fotos íntimas em redes sociais e comunicadores instantâneos. A violência virtual contra a mulher tem muitas formas, todas, no entanto, com alto poder de multiplicação e devastação. O efeito cascata, o alcance, a instantaneidade e a dificuldade de controle e reversão são importantes agravantes. Foi assim com a fotógrafa Larissa*, 25 anos. Ela foi surpreendida com imagens íntimas, enviadas anteriormente ao ex-parceiro, publicadas em um perfil no Facebook, no qual ela e alguns amigos foram adicionados. “Não conseguia comer, não conseguia falar com ninguém. Eu só sabia chorar”, lembra. A violência sofrida por ela, porém, tinha começado muito antes. Apenas mudou de local. As ameaças e agressões

físicas cometidas cara a cara passaram a ser repetidas e potencializadas no ambiente virtual. Trata-se, da mesma forma, de violência sexual, como explica a psicóloga Marília Lobão, que trabalhou no Tribunal de Justiça por 30 anos. “É uma violência contra a liberdade sexual de uma pessoa. É uma violência de gênero, porque você está atacando justamente a questão dos valores de gênero da nossa sociedade, a visão de ser mulher ou ser homem, mas o que está acontecendo na verdade é a exposição de fotos à revelia”. Além da sexual e da física, a Lei Maria da Penha também prevê a violência psicológica, patrimonial e moral. Nos últimos anos, a legislação foi ficando mais dura no sentido de garantir a proteção. Assim surgiram a Lei Carolina Dieckman, que trata dos RE D E M O IN H O | 5


crimes cibernéticos; a Lei Lola, sobre a investigação de crimes de ódio contra mulheres pela internet; a punição para a importunação sexual; e o Artigo 218C do Código Penal, que criminaliza e prevê até cinco anos de cadeia para quem divulgar imagens íntimas sem prévia autorização. É a chamada vingança pornográfica. A norma é considerada um grande avanço. A defensora pública e integrante do grupo de trabalho de Monitoramento de Política para as Mulheres da Defensoria Pública do Distrito Federal, Rita Lima, diz que agora é possível responsabilizar criminalmente o agressor, o que antes era mais difícil. “A gente tem essa nova possibilidade que vai trazer um pouco mais de segurança e proteção às vítimas desse tipo de conduta”, comenta. O titular da Delegacia Especial de Repressão aos Crimes Cibernéticos, Giancarlos Zuliani, observa que antes havia

O efeito cascata, o alcance, a instantaneidade e a dificuldade de controle e reversão são importantes agravantes no cyberbullying brechas que deixavam o agressor impune. “Estava se dando um jeitinho para tentar criminalizar a conduta de quem publicava um vídeo”, afirma. Tanto o delegado quanto a defensora pública explicam que os crimes online mais comuns são feitos contra a honra da mulher, como ofensa, difamação, ameaça e publicação de imagens íntimas. Os insultos em forma de texto, por exemplo, continuam

Delegado Giancarlos Zuliani lembra importância das provas para criminalização 6 | REDEMOI NHO

atendendo a uma lei geral de difamação ou injúria, sem tipificação específica. Em geral, quando a polícia recebe a denúncia deste tipo de crime, o primeiro procedimento é verificar o material e contatar os administradores da rede social ou provedor da internet onde está publicado e, em seguida, pedir a exclusão do conteúdo. “Eles têm dados de IP que a gente usa para localizar e identificar o verdadeiro administrador do perfil”, afirma. No momento da denúncia, o delegado lembra que é importante a vítima comparecer com provas. Ele sugere que seja feita, ainda, uma ata notarial, um documento no cartório que demonstra que naquele dia foi constatado que determinado conteúdo estava publicado na internet. “Se você tem a ata notarial, o conteúdo pode ser apagado, mas se você não tem a ata e apagou, a nossa prova foi embora”, explica. De acordo com a ONG Safernet Brasil, que é uma organização com foco na promoção e defesa dos direitos humanos na internet, no ano de 2016 as violações de direitos humanos mais registradas no portal foram, respectivamente, cyberbullying/ofensa, sexting/exposição íntima, problemas com dados pessoais, conteúdos de ódio/violentos e fraudes/ golpes/e-mails falsos. Os desafios da criminalização da violência online, porém, têm a ver com a banalização desse tipo de agressão sob a crença de que elas começam e terminam no meio digital, e que, portanto, são passageiras. Além disso, a questão da culpabilização da vítima é uma das reações à violência online, como se a responsável fosse a mulher que enviou as fotos, deixou o perfil público ou mandou as mensagens.


Crimes online mais comuns são contra a honra da mulher e crença de impunidade é agravante

Pode acontecer, ainda, um processo de naturalização da violência, em que homens e mulheres enxergam essas atitudes como normais e passíveis de serem esquecidas. Por isso, para combater a violência contra a mulher, é necessário, primeiramente, reconhece-la como tal. A internet ocupa um papel fundamental neste processo porque abriga, ao mesmo tempo, possíveis agressores que buscam impunidade e anonimato e associações e grupos de mulheres em busca de justiça, além de informações sobre políticas públicas e leis que auxiliem as vítimas.

Whatsapp

Cada vez mais o whatsapp vem sendo usado em casos de violência contra a mulher. Embora não existam estatísticas, é comum o relato delas sobre a mesma fonte de disseminação. Foi assim com a orientadora educacional Nilda*, 52, e com a estudante Kedna, 24. Após muitas agressões dentro de casa, a universitária decidiu pela separação do marido. A violência, no entanto, permaneceu, desta vez por mensagens instantâneas. Dali passou para a difamação em grupos de amigos em comum nas redes

AFINAL, QUAL A DIFERENÇA? Sexting: União dos termos “sex” (sexo) e “texting” (envio de SMS). É o ato de enviar textos, fotos ou vídeos de cunho erótico por mensagens, geralmente, em redes sociais. Vingança pornográfica: É o ato de tornar público vídeos e fotos íntimos sem consentimento. Geralmente ocorre após o término de relacionamentos, por isso o termo “vingança”, já que o agressor usa imagens recebidas durante a relação para afetar o ex-parceiro. Cyberbullying ou assédio virtual: É a violência que acontece no meio online. Pode se caracterizar por ameaças, perseguição, humilhação e até mesmo envio de malwares. Importunação sexual: Ato libidinoso sem o consentimento da outra pessoa. Por ato libidinoso pode-se entender todo ato de satisfação do desejo sexual, como as ações de apalpar, masturbar, tocar, desnudar, entre outros. RE D E M O IN H O | 7


sociais. À época, ela ignorava que os comentários eram a prova do crime. Até que foi alertada e tirou uma cópia das telas para mostrar à polícia. “Se eu tivesse tido uma boa orientação naquele momento, eu teria registrado muito mais ocorrências e o desfecho teria sido diferente”, ressalta. Segundo ela, a exposição afeta a pessoa em todos os tipos de relacionamentos e emoções. Outro ponto que a estudante destaca é a questão dos preconceitos e estereótipos. Para Kedna, as mulheres não são levadas a sério no ato da denúncia. “Quando a gente faz uma denúncia, a gente é louca”, lamenta. Com Nilda*, as mensagens no Whatsapp com insultos, difamações e imagens comprometedoras foram enviadas por um número desconhecido a colegas e alunos do local onde trabalha. A orientadora educacional mantinha um relacionamento aberto e acredita que o conteúdo foi vazado pela ex-parceira do namorado. Ela registrou boletim de ocorrência, mas afirma que não obteve resultados. “Tenho a sensação de que esse tipo de atitude não tem punição, a polícia não me deu nenhum suporte e tratou como algo sem grande importância”, alega.

Larissa* também denunciou, mas ficou sem o amparo que gostaria. Tirou “print” das telas e procurou a Delegacia da Mulher para registrar a ocorrência. O agressor alegou inocência e disse que o computador dele havia sido invadido. Não houve punição. “Os governantes deveriam ter uma lei que realmente punisse, porque é uma marca que é eterna”, lamenta. A fotógrafa ainda defende a necessidade de ampliar o número de mulheres que trabalham nas delegacias especializadas. “A última coisa que ela quer na vida, naquele momento, é ser julgada. A mulher busca ser compreendida. Quer ser abraçada e pensar que tudo vai ficar bem”, opina. De acordo com Marília, muitas vezes a mulher encaminha confidencialmente as imagens ao parceiro por necessidade da aprovação dele. Neste caso, é ele quem determina o valor que ela tem. “Elas acreditam que o seu valor está no corpo, está na capacidade do seu corpo de atender e agradar o imaginário deste homem.” Marília diz que as imagens vêm à tona quando o relacionamento acaba, porque o homem tem um desejo de ter poder sobre

ESCOLA DE APP: AÇÕES DE ENFRENTAMENTO PARA MENINAS

feminino. “A principal vítima dessa violação é a menina e por isso a gente decidiu focar o projeto no empoderamento dessas meninas”, explica.

O projeto Escola de App é uma das iniciativas existentes para enfrentar a violência online contra a mulher e, mais especificamente, contra a menina. A ideia é um projeto de pesquisa que integra o Laboratório de Políticas de Comunicação (Lapcom) da Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília (UnB).

As ações nas escolas têm o foco de mostrar para as meninas que a internet é um cenário de riscos e oportunidades, alertando para a violência contra a mulher que acontece nesse meio. Além disso, as estudantes são convidadas a aprender a programar aplicativos como forma de empoderamento tecnológico. “A gente fala de gênero e fala sobre violência contra a mulher e ensina a programar”, afirma Janara.

O objetivo é entender a violência online de gênero na totalidade e propor ações de enfrentamento para meninas estudantes de escolas públicas de ensino médio. A idealizadora e coordenadora do projeto, Janara Kalline de Sousa, conta que a ideia surgiu a partir da percepção da violação de direitos humanos que acontece na internet, principalmente no que tange ao gênero 8 | REDEMOI NHO

A Escola de App está rodando o Brasil e já passou pelo Distrito Federal, Rio de Janeiro, Ceará e Amapá. O formato é um workshop de vinte horas em grupos formados apenas por meninas estudantes do ensino médio. Para saber mais sobre o projeto acesse: https://www. internetedireitoshumanos.com.br/


a mulher. Segundo a psicóloga, muitos fazem o estupro real, mas outros, pela naturalização que a sociedade dá à violência psicológica, realizam o ato pela internet. “Ele não se sente um estuprador quando joga a foto da mulher na rede social”. A psicóloga defende que a pornografia de vingança é uma violência sexual como um estupro, apenas realizado de uma maneira diferente e vista como banal. Quanto às consequências psicológicas para as vítimas, Marília aponta que são inúmeras. As mais comuns são o estresse pós traumático, a ansiedade, a depressão, os pensamentos suicidas, a falta de auto confiança e a dificuldade de concentração e de continuar a vida de uma forma normal. A psicóloga distingue duas maneiras que a vítima tem para lidar com a situação, os enfrentamentos negativos e os positivos. Os negativos abrangem principalmente o comportamento de evitação. “Ela nega que isso aconteceu e é muito ruim, porque quando ela nega, não pode lidar com os sintomas que vêm dessa dor e pode adoecer”, explica. Além disso, a vítima pode recorrer ao uso de substâncias químicas lícitas ou ilícitas e ficar obcecada com a história, se culpando pelo o que aconteceu. Já as respostas positivas, que podem vir após os enfrentamentos negativos, vão desde procurar ajuda, seja na psicoterapia ou na religião, até participar ou fundar organizações de apoio à mulher vítima de violência. “Isso são maneiras de enfrentar aquela dor de uma forma que traz saúde mental às mulheres, enquanto que os enfrentamentos negativos são aqueles que fazem com que a mulher adoeça cada vez mais”, afirma.

Marília Lobão: homem não se sente estuprador ao jogar foto de uma mulher nas redes sociais

Trabalhos de conscientização e educação da sociedade para as questões e igualdade de gênero são as soluções que Marília vislumbra para o avanço nas formas de lidar com atos de violência contra as mulheres. A ampliação de grupos de apoio e de discussão das masculinidades e das feminilidades em centros de saúde também são, segundo ela, uma questão de saúde mental. “O governo precisa enfrentar isso não só pelo bem-estar da sociedade, por uma questão de justiça e direitos humanos, mas também de saúde mental”, conclui. Segundo a defensora pública, as provas em casos de crimes cibernéticos são elementos complicados de se obter. Por isso, ela afirma que o conhecimento técnico da polícia é um elemento fundamental para o processo.

“Eu acredito que as delegacias vão ter que, cada vez mais, capacitar os seus agentes e peritos”, afirma. Rita recomenda ainda que as mulheres que sofreram violência online tirem o máximo de prints possíveis para que seja possível a comprovação do ato. A defensora conclui que não acredita que seja possível inibir o comportamento da sociedade de compartilhar esse tipo de conteúdo online. “Não vejo como nós voltarmos a um tempo em que as pessoas não pratiquem isso, isso faz parte dos relacionamentos pós modernos e é um fato”, diz. Para ela, o problema é a culpabilização da vítima e é preciso trabalhar para que a responsabilidade seja reconhecida como inteiramente do agressor.

Vingança pornográfica é a divulgação de imagens íntimas sem prévia autorização e pode levar a até cinco anos de cadeia RE D E M O IN H O | 9


A defensora pública Rita Lima orienta que as vítimas tirem prints das telas

A violência online contra as mulheres também é objeto de discussão do Estado. A secretária de Políticas para as Mulheres da Presidência da República, Andreza Colatto, reconhece com preocupação esse tipo de violência e aponta os recentes avanços legais como indispensáveis para a sociedade. Segundo ela, o papel da secretaria é articular com os governantes a discussão de pautas referentes às mulheres. Porém, Andreza afirma que não basta trabalhar apenas no âmbito das leis, é necessário implementar políticas de educação. A secretaria tem um trabalho em parceria com a Universidade de Brasília de conscientização de meninas quanto à violência online, o projeto piloto Escola de App. “A educação é a ferramenta mais importante, por isso estamos desenvolvendo esse trabalho nas escolas”, conta. Organizações de mulheres também exercem papéis importantes no combate à violência. O Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea) é uma instituição que trabalha pela cidadania das mulheres e pela igualdade. A assessora técnica do Cfemea, Milena Argenta, conta que relatos sobre violência e pedidos de ajuda são recebidos com frequência pela instituição, mas que as denúncias de agressões feitas na internet não surgem com a mesma regularidade. Para ela, isso se dá pela banalização dos fatos que acontecem no meio online. “Fato é que as mulheres, e a sociedade brasileira de modo geral, não reconhecem as agressões no espaço virtual como violência passível de ser denunciada e combatida”, afirma. 10 | REDEMOI NHO

COMO A LEGISLAÇÃO PROTEGE? - Lei Maria da Penha (Lei 11.340/06)Destinada a casos de violência doméstica, mas pode ser aplicada a quaisquer casos de violência contra a mulher. Divide a violência em cinco grupos: física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral; - Lei Carolina Dieckman (Lei 12.737/2012) é uma alteração do Código Penal que tipifica os crimes informáticos. Ela abrange invasão de dispositivos informáticos e falsificação de documentos e cartões; - Lei Lola (Lei 13.642/2018) atribui à Polícia Federal a investigação de crimes praticados no meio online que disseminem conteúdos misóginos, como a propagação de ódio ou a aversão às mulheres; - Lei nº 13.718/18 traz o acréscimo do artigo 218C ao Código Penal e determina como crime a publicação, em qualquer meio de comunicação, de fotos e vídeos que contenham cena de estupro ou de sexo, nudez ou pornografia sem o consentimento da vítima; - Marco Civil da Internet (Lei N° 12.965/14) é uma disposição legal que visa também proteger a privacidade dos usuários. O artigo 21 da lei faz com que os provedores sejam responsabilizados pelo conteúdo publicado, de forma que apenas uma notificação destinada ao site torna possível a exclusão do material e a identificação do agressor.


O Cfemea investe no desenvolvimento de metodologias de autocuidado e cuidado no espaço virtual como estratégia de defesa dos direitos humanos. Por isso, a entidade lançou, em 2017, uma campanha em parceria com outras organizações feministas e elaborou um guia com métodos de segurança digital para mulheres, a Guia Prática de Estratégias e Táticas para a Segurança Digital Feminista. Milena reitera que a violência, em geral, não é enxergada pela própria vítima e que no espaço virtual é ainda pior. “Existe uma falsa ideia de que o ambiente virtual é uma realidade paralela, que o que acontece lá não tem impacto na vida real”, lembra. Além disso, ela afirma que a propagação do ódio e da violência online é estimulada pela aposta no anonimato e na impunidade.

Especialista afirma que aposta no anonimato e na impunidade estimulam propagação do ódio e da violência online Apesar do recente avanço em termos legais, Milena afirma que ainda há muito a se discutir sobre como prevenir ações violentas, reconhecer o machismo e incluir nas escolas o debate sobre igualdade de gênero. “Até que as leis se efetivem na prática temos um caminho longo”, diz. Para a assessora técnica, as discussões sobre temas que afetem o gênero devem ser sugeridas por mulheres. “Qualquer proposta de alteração na lei Maria da Penha, tão importante para as mulheres brasileiras, deve partir das próprias mulheres, ser construída por elas e refletir as reais necessidade e demandas das mulheres para ser levada ao diálogo com o Congresso”, afirma. A organização tem o papel de promover o debate público sobre o tema e de divulgar e fomentar ferramentas de prevenção, atendimento e denúncia. Porém, Milena também aponta outras atitudes que o governo e a sociedade precisam tomar em relação aos casos de violência no ambiente online. Políticas públicas para igualdade de gênero e enfrentamento da violência contra a mulher, criação de grupos de apoio e atendimento terapêutico em postos de saúde, capacitação de agentes públicos e respeito à vítima são os pontos essenciais apontados pela assessora técnica. “Temos um árduo e longo caminho pela frente que também depende da mobilização da sociedade, do engajamento de todas e todos na visibilização e denúncia das violências”, conclui.  RE D E M O IN H O | 1 1


S AÚDE

Eles também sofrem bullying por: Zilá Motta

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Intimidação sistemática contra idosos é agravada por preconceito, negligência, violência, descaso e dificuldade no cumprimento das políticas públicas


Quando se pensa em bullying, ofensas e xingamentos costumam ser as primeiras características que vêm em mente, mas não é só isso. De acordo com a Lei 13.185, a intimidação sistemática, o chamado bullying, é muito mais sério que isso. Todo ato de violência física ou psicológica, intencional e repetitiva que ocorre sem motivação evidente com objetivo de intimidar a vítima e agredi-la causando dor e angústia, em uma relação de desequilíbrio, é caracterizado como tal. “As pessoas pensam que bullying acontece só com os jovens, mas é com idoso também”, afirma a professora de Terapia Ocupacional da Universidade de Brasília (UnB), Kátia Vanessa Meneses.

crescido tanto no Brasil que hoje vários estados adotaram medidas para proteger e preservar a integridade dessas pessoas. A Secretária Nacional de Promoção e Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa, por exemplo, surgiu com este entre os seus objetivos. Especialistas apontam ainda que a prática do bullying na terceira idade se caracteriza pelo desprezo ao envelhecimento. O resultado disso faz com que os idosos sejam mal vistos pela sociedade e enfrentem situações de preconceito e constrangimento diariamente. Entretanto, a maioria dos casos de intimidação sistemática ocorre dentro do próprio lar do idoso. A geriatra do Conselho Federal de Medicina de São Paulo, Maísa Karalla,

“Às vezes, o idoso está morando com um filho que ele nunca teve contato. E com isto as agressões e os abusos têm como base uma relação onde as pessoas são desconhecidas entre si” Maísa Karalla, geriatra

Uma das formas mais comuns de agredir os que têm mais de 60 anos é desconsiderar a capacidade deles. Segundo Kátia, duvidar da autonomia, dizer que não dão conta de fazer as mesmas atividades que antes, que não servem para mais nada ou que são lentos demais são atitudes do tipo. “Isso vai fazendo o idoso recuar e automaticamente se reprimir. E geralmente esses abusos se iniciam com a própria família”, alerta. Apesar de se falar muito sobre a prática da agressão sistemática contra crianças, as pessoas idosas também são vítimas frequentes. Os relatos têm

afirma que o contexto familiar colabora para que os casos de agressão física e psicológica ocorram com frequência. “Quando o bullying é praticado dentro de casa, temos que estudar e perceber como funciona o contexto e ambiente familiar ao qual aquele idoso pertence. Às vezes, o idoso está morando com um filho que ele nunca teve contato. E, com isto, as agressões e os abusos têm como base uma relação onde as pessoas são desconhecidas entre si”, analisa. E foi nessa situação de pouco relacionamento com a família que Augusto Silva foi inserido. São três filhos, mas

nunca teve uma relação estável com a mãe de nenhum deles. Quando chegou à terceira idade, se viu sozinho e ficou meses internado no hospital. Com a ajuda da assistência social, foi encaminhado para o Lar dos Velhinhos. Após alguns meses no abrigo, Augusto conseguiu entrar em contato com dois de seus filhos, por meio de uma das voluntárias do abrigo. A voluntária, Inês Rodrigues, lembra que o trabalho foi de reintegrar Augusto à família. “Eu tentei contatar todos os filhos dele, eu até mandei dinheiro para um deles que morava na

O QUE CARACTERIZA O BULLYING? O bullying com idosos é uma situação que se caracteriza por agressões intencionais, sejam elas verbais ou físicas. Essas ofensas geralmente partem de pessoas que veem naquele indivíduo alguma característica que elas sentem desprezo ou medo. Essas agressões podem ser feitas de maneira repetitiva pelo agressor. As principais são: ameaças, opressão a vítimas, intimidação, humilhação e maus-tratos. O Estatuto do Idoso não trata precisamente do termo bullying contra a pessoa idosa, mas existem leis que protegem diretamente o cidadão dessas práticas. Segundo o artigo 96 da legislação, discriminar pessoa idosa, impedindo ou dificultando seu acesso a operações bancárias, aos meios de transporte, ao direito de contratar ou por qualquer outro meio ou instrumento necessário ao exercício da cidadania, por motivo de idade, pode resultar em prisão de seis meses a um ano, além de multa. O mesmo artigo ainda trata de questões de humilhação e menosprezo. RE D E M O IN H O | 1 3


Bahia vir visitá-lo. Ele veio e queria levar o pai, mas o Augusto não quis”, lembra. A filha de Augusto, no entanto, que também morava no estado do nordeste, convenceu que ele fosse. Mas a história não teve o final que Inês esperava. “Depois de um tempo, ele conseguiu encontrar meu número e começou a me ligar. Pedia que eu tentasse colocá-lo no abrigo novamente. A família o maltratava, e ele sentia muita dor devido ao estado de saúde. Eles o agrediam de todas as formas”. Foram semanas de tentativas diversas. Tentou reinseri-lo em outro abrigo, mas sem sucesso. “Ele ligava chorando e contava que ela só decidiu ficar com ele devido à pensão. E a filha dele me telefonava brigando e dizia que eu era culpada do que estava acontecendo”, desabafa. Com os números telefônicos alterados pela filha, Inês acabou por perder o contato novamente. “Para

Dados da Secretária Nacional de Promoção e Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa

mim é horrível saber que eu não consegui mudar a situação, agora não posso fazer nada. Ele estava passando por tanto sofrimento, nem podia se levantar de uma cama. A última coisa que eu queria era expor ele a esse tipo de abuso”, emociona-se. A maioria dos casos de violência, 76,3%, ocorrem na própria casa da vítima, segundo o secretário Nacional de Promoção e Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa, Rogério Ulson. Ele afirma que é importante tentar identificar o perfil do agressor e os sinais físicos ou emocionais que o idoso apresenta. “Temos total entendimento que na maioria das vezes essas agressões partem dos próprios familiares. Mas nada impede que venham também de outras pessoas. Recebemos denúncias de todos os tipos”, ressalta. Ulson lembra que a denúncia deve ser encorajada e feita também por pessoas que estejam fora daquele ciclo familiar ou na relação entre idoso e cuidador. “Muitas vezes o idoso não quer que denuncie porque tem medo da retaliação que pode sofrer. Ou, quando se trata do próprio filho, ele não tem coragem de fazer a denúncia. Então é importante que pessoas de fora também ajudem na intervenção desses casos”, alerta. Os especialistas relatam que quando o idoso muda o seu comportamento com o cuidador ou familiar, fica mais retraído e quieto, pode ser um sinal de que sofre algum tipo de agressão. Quando ele tem medo das pessoas que estão por perto, não responde às perguntas que são feitas diretamente para ele ou diz frases que indicam baixa autoestima, já são indícios de que pode estar passando por agressão física ou verbal. De acordo com Luiz Ricardo Vieira Gonzaga, psicólogo especializado em idosos e terapias cognitivas, a sociedade brasileira não foi educada para respeitar, zelar e valorizar as antigas gerações. O desprezo com o idoso está enraizado na comunidade, pois na concepção atual envelhecer é algo ruim, e esse pensamento tende

MARCOS LEGAIS DA PROTEÇAO AO IDOSO Os estudiosos lembram que a experiência da pessoa idosa tem um valor incomparável para a sociedade. A inclusão, então, é fundamental, assim como o direcionamento do tempo livre para a realização de novos projetos que contribuam para uma sociedade mais justa e fraterna. No Brasil, a proteção legal a eles está prevista principalmente no Estatuto do Idoso: 14 | REDEMOI NHO

Artigo 3º: É obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do Poder Público, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar;

Artigo 10º: É obrigação do Estado e da sociedade assegurar à pessoa idosa a liberdade, o respeito e a dignidade, como pessoa humana e sujeito de direitos civis, políticos, individuais e sociais, garantidos na Constituição e nas leis; Artigo 20º: O idoso tem direito à educação, cultura, esporte, lazer, diversões, espetáculos, produtos e serviços que respeitem sua peculiar condição de idade.


muitas vezes o quadro é silencioso, o que pode ser sério. “O paciente fica com sintomas que devem ser percebidos e vistos com atenção, como a baixa estima, sentimento de desvalia e perda de apetite. E as agressões levam a esse quadro, pois o idoso fica se sentindo inferiorizado e que não é querido e bem-vindo naquele ambiente”, afirma. Para Maísa, a gravidade da depressão deve ser avaliada. Moisés e Angélica superaram dificuldades em reuniões com grupos de apoio “Esse quadro é muito mais grave do que pensamos e pouca gente sabe disso. Para a fazer com que o idoso seja estigmati- mais prazerosas. Com 70 anos de idade, termos ideia, a taxa de suicídios entre zado. Para ele, o bullying com idosos se Alfa ainda lança discos e canta em vários idosos é altíssima. O quadro de deprescaracteriza devido à própria condição que locais. Ela passa uma boa parte do seu são é mascarado e muitas vezes a família o idoso pode apresentar em função das tempo em aulas de canto e, aos finais de só vai perceber quando é tarde demais, limitações físicas ou psicológicas. “Como semana, coloca em prática o que sabe nas isso é muito comum”, declara. as pessoas não veem o idoso como um reuniões da igreja que frequenta. Mas foi O Mapa da Violência de 2014, orgamentor, elas tendem a desencadear precon- justamente lá, no local que mais gosta nizado pelo sociólogo e coordenador ceitos, ofensas e agressões simplesmente de cantar, que enfrentou o preconceito. da Área de Estudos sobre Violência da pelo fato de a pessoa ser idosa. O que pode “Uma vez fui convidada para me apre- Faculdade Latino-Americana de Ciências desencadear um estresse pós-traumático sentar em uma igreja e me chamaram Sociais (FLACSO), Julio Jacobo Waiselno idoso, agitação, depressão e até mesmo para ficar lá na frente, junto com todo fisz, aponta que, acima dos 60 anos, há a despersonalização dessa pessoa”, explica. mundo. Quando eu virei as costas, ouvi oito suicídios por 100 mil habitantes no O psicólogo frisa ainda que idosos dois homens comentando em como Brasil. Uma taxa maior que a registrada que apresentam patologias físicas e psico- poderiam deixar uma velha na frente, eu entre outros grupos etários, como jovens lógicas são os mais vulneráveis a agressões ia destoar o lugar. Eu tento ser forte, mas de 16 e 17 anos. Entre 1980 e 2012, períem ambientes externos ou internos. “É aquilo me abalou muito. Eu fui agredida odo avaliado no estudo, o número de uma situação que precisa ser investigada com palavras simplesmente por ser idosa”. casos entre idosos aumentou 215,7%. por quem está por perto. A solidão apontada como “Nós temos o total fator de risco para os casos Perceber os sinais de que algo está errado ali e não fazer de suicídio foi dolorosa para entendimento de que na nada, também é grave”, conta. Angelina Santos*. Aos 66 anos, maioria das vezes essas agressões ela mora no Lar dos VelhiEle adverte também sobre a nhos Bezerra de Menezes, em importância do diálogo com partem dos próprios familiares” o idoso para saber o que Sobradinho, há nove meses. está acontecendo. “Às vezes, Angelina chegou em Brasília Rogério Ulson, secretário dos Direitos da Pessoa Idosa o idoso está tão angustiado nos anos 80 para trabalhar com o bullying que está sofrendo que como doméstica. Por aqui, desenvolveu apenas com a conversa ele mesmo escla- Depressão um quadro grave de úlcera e hérnia de rece o que está realmente acontecendo”. A violência psicológica causada pelo disco. Sozinha, enfrentava diariamente A cantora profissional Alfa Monteiro bullying diário que os idosos enfrentam o preconceito. Desenvolveu um quadro lida com o preconceito diariamente, até pode levar a um sério quadro de depres- de depressão e foi parar no hospital. mesmo no momento de suas atividades são. A geriatra Maísa Karalla afirma que Foi lá que recebeu o encaminhamento RE D E M O IN H O | 1 5


para o Lar dos Velhinhos, onde recebeu cuidados de vários profissionais e um acompanhamento semanal com psicólogos e geriatras. As novas amizades foram decisivas para que superasse os efeitos da intimidação sistemática, sobretudo a depressão. “Quando eu cheguei aqui, não andava. Eu não queria falar com ninguém. Me sentia triste e não me arrumava. Eu não tinha prazer para fazer nada. Agora, eu não quero nunca mais sair daqui. Sou bem tratada e não me sinto sozinha”. A psicóloga do Lar dos Velhinhos, Priscila de Oliveira, acompanhou toda a evolução do quadro de Angelina. Ela conta que as atividades realizadas no abrigo, como a horta e a produção de agendas, auxiliaram na superação dos traumas e da doença. “Quando ela chegou, estava muito triste. Os dias foram passando, as atividades e os acompanhamentos foram sendo feitos e, quando eu vi, a Angelina estava sorrindo e conversando com todos”.

de interação durante as atividades”, diz. Situações de intimidação sistemática, como as agressões, sejam elas físicas, verbais, psicológicas, sexuais e financeira são consideradas agravantes para a depressão. De acordo com a Ouvidoria Nacional do Ministério dos Direitos Humanos, a violência contra idosos gerou 33.133 denúncias somente em 2017. Nos casos relatados, 76,84% são de negligência, 56,47% de violência psicológica, que inclui o bullying, e 42,82% de abuso financeiro ou econômico.

Estereótipo

Em 2012, a população brasileira com mais de 60 anos correspondia a 25,4 milhões de pessoas. Em seis anos, a população idosa superou a marca de 30,2 milhões. Somente de 2017 para 2018, foram mais 4,8 milhões As mulheres são a maioria, com 16,9 milhões, enquanto os homens somam 13,3 milhões. Os dados são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios

“A sociedade não foi educada para respeitar, zelar e valorizar as antigas gerações, o desprezo com o idoso está enraizado” Luiz Ricardo Vieira, psicólogo especializado em idosos

Priscila Oliveira observa que o quadro de depressão é extremamente comum nos idosos. “A maioria aqui não tem a atividade cognitiva preservada. Mas mesmo assim conseguimos observar o processo de depressão no idoso, até mesmo naqueles que já apresentam demência. E conseguimos perceber isso principalmente na falta 16 | REDEMOI NHO

Contínua. De acordo com a pesquisa do IBGE, em 2030 o grupo acima de 60 anos vai ser maior do que o de crianças com até 14 anos. A estimativa é de que em 2055 o total de idosos supere o dos que têm té 29 anos. No DF, o cenário não é diferente do restante do país. A população dos com mais de 60 anos aumentou mais de 80%

entre 2000 e 2010, saltando de 109 mil para 197 mil. Conforme o IBGE, a proporção de idosos para jovens no DF em 2060 será a segunda maior entre as 27 unidades da Federação, com cerca de dois para um. Na contramão, ainda não há infraestrutura necessária. “Os idosos não estão mais naquele tempo onde só ficavam em casa, estão buscando qualidade de vida, atividades de lazer e programas culturais”, alerta o secretário de Promoção e Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa. Especialistas ainda frisam a importância em melhorar a acessibilidade, a mobilidade urbana e a moradia. De acordo com os estudos da Secretária dos Direitos Humanos, o DF ainda está longe de alcançar a plenitude e o Estatuto do Idoso tem que ser respeitado por todos. A reduzida destinação de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção ao idoso e a discriminação nos planos de saúde pela cobrança de valores diferenciados em razão da idade são reivindicações.


Após ficar por muito tempo sozinha, Dona Geraldina foi adotada e ressignificou a vida

Respeito

Em uma cadeira de balanço, olhando para o movimento de domingo na rua, na quadra 03 de Sobradinho, a dona de casa Geraldina Fernandes, 93, contempla a sorte e o amor que a acolheram há três anos. Sem poder ter filhos e após ter ficado viúva por duas vezes, foi diagnosticada com alzheimer aos 90 anos. Uma das netas do segundo marido dela, a professora Ana Irís Rolim, 55, decidiu levá-la para casa após o diagnóstico da doença. “Nenhum dos sobrinhos ou outras partes da família a procuram, ela não tem vínculo com essas pessoas, ficou sozinha. E com o alzheimer só identifica a minha família e a cuidadora que me ajuda a ficar com ela durante a semana”, conta. Hoje, dona Geraldina mora em uma casa no mesmo terreno de Ana Irís. Ajuda em pequenas atividades diárias. “Eu sou muito feliz aqui, ela me visita, cuida de mim o tempo todo, essa é a minha família”. A neta diz que muito da memória já se foi.

“Ela fica horas aqui na varanda só olhando quem passa, esqueceu muita coisa, mas às vezes a memória traz à tona algumas lembranças”, comenta Ana Irís. A partir da situação de dona Geraldina, ela criou um grupo de apoio com idosos que se reúne mensalmente para conversar, trocar lembranças e garantir a socialização. A história de Geraldina teve um final feliz, mas grande parte dos idosos não tem qualidade de vida. Atualmente, o número dos que sofrem abusos financeiros, psicológicos, físicos e emocionais é alarmante. De acordo com a Secretaria de Envelhecimento Saudável e Qualidade de Vida, a cada dez minutos um idoso é agredido e, na maioria dos casos, o agressor é o próprio filho. Segundo a Secretaria Nacional de Promoção e Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa, cerca de 25 mil casos de violência contra o idoso registrados no país são os de negligência, violência física e abuso financeiro e econômico. Uma pesquisa feita pela Secretaria junto

com a Ouvidoria Nacional apontou que a maioria dos abusos e agressões vêm dos próprios familiares. “Essa prática pode ser caracterizada por chantagem emocional, afetando o psicológico dessas pessoas. E quando não conseguem o que querem dos idosos, que na maioria dos casos é dinheiro, agridem o idoso fisicamente”, declara Rogério Ulson. Mirian Clemente é cuidadora de idosos há mais de oito anos. Ela conta que geralmente é contratada quando a família não consegue lidar com o idoso. Algumas vezes, as negligências ocorrem por esta razão. “Nem todas as famílias estão prontas para lidar com o idoso. Dependendo da patologia que essa pessoa tem, ela precisa de muita atenção e cuidado e às vezes a família não sabe nem ao menos como proporcionar isso”, observa. 

COMO DENUNCIAR? Hoje, no Brasil, existem canais e delegacias destinados apenas para denúncia de casos de violência contra as pessoas idosas. A denúncia pode ser feita por meio do Disque 100, número do Conselho de Defesa dos Direitos Humanos. Entretanto, a Secretaria dos Direitos Humanos do Distrito Federal também pode ser contatada juntamente com o Ministério Público pelo telefone 3411-4212. Dependendo da gravidade da situação, o idoso ou a pessoa que deseja fazer a denúncia pode se encaminhar diretamente para a Delegacia Especial de Repressão aos Crimes Contra a Pessoa Idosa (Decrin), que fica no complexo da Polícia Civil ao lado do Parque da Cidade Sarah Kubitscheck e atende pelo telefone é 3207-4242. RE D E M O IN H O | 1 7


S AÚDE

Cuidados com a mente Quebra de tabu e busca por ajuda são fundamentais em casos de transtornos mentais; apoio da família e de profissionais, sigilo e não julgamento costumam ser decisivos

por: Ingrid Pires

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Nove em cada dez casos de suicídio podem ser prevenidos, de acordo com a Organização Mundial de Saúde, desde que a pessoa receba o apoio no momento adequado. Ainda segundo a OMS, em países de baixa renda, existem apenas dois profissionais de saúde mental a cada 100 mil habitantes, enquanto nos de alta renda, o índice é de mais de 70 profissionais. Uma das principais dúvidas entre os que passam por sofrimento psíquico é justamente onde e quando buscar ajuda, o que fazer para vencer o medo, a falta de prazer, a desesperança e o tabu que marcam essas doenças. Para o estudante Kaio Henrique Maloney, de 23 anos, até mesmo reconhecer que precisava de ajuda levou um tempo. Ele não sabia como lidar com as crises de ansiedade e depressão. O sofrimento que parecia interminável durou pelo menos três anos, em silêncio. Há um ano, procurou a psicoterapia. “Além de me sentir mal por me isolar e não conseguir sair com meus amigos, sentia que para melhorar eu precisava de um tempo para mim, mas

demorou muito até entender e aceitar que cuidar de si é também cuidar das pessoas que te cercam”, conta. A psicóloga Nayara Nascimento explica que nem sempre entender o que faz mal é fácil. “O que vem a ser uma doença emocional? Falar assim: ‘ah, eu estou triste. Então estou doente?’ Não. Todos nós nos sentimos tristes, todos nós nos sentimos felizes, todos nós nos sentimos em algum grau ansiosos”. Ela observa que para ser considerado um transtorno mental precisa, de fato, deixar a pessoa transtornada. “Se aquela tristeza em excesso incomoda, se aquela alegria em excesso incomoda, então vale a pena prestar atenção e tentar ver se pode ser algum tipo de transtorno e qual a melhor forma de tratar”. Mas, qualquer tratamento, deve ser feito por um profissional. Em geral, o psiquiatra é quem faz o diagnóstico e, se necessário, receita a medicação. A psiquiatra Renata Figueiredo afirma que as doenças emocionais não possuem causa orgânica conhecida, então para confirmar um transtorno ou uma

doença psicossomática é necessário que, antes, o especialista faça um diagnóstico de exclusão daquelas que têm origens orgânicas, por meio de diversos exames. Os principais métodos de tratamento para doenças e transtornos psíquicos são a psicoterapia, o acompanhamento psiquiátrico e o apoio de pessoas próximas.

CUIDADOS NECESSÁRIOS Segundo especialistas, cuidar do corpo físico é essencial para a prevenção e para o tratamento de transtornos mentais. De acordo com a psicóloga Nayara Nascimento, gastar energia com exercício saudável e adequado causa alterações positivas no cérebro, pois libera substâncias que beneficiam diretamente os neurotransmissores responsáveis pela saúde mental. Serotonina, adrenalina, noradrenalina, dopamina e outras substâncias cerebrais liberadas a partir do exercício físico são fundamentais para que os neurotransmissores atuem da melhor forma no cérebro. A atividade física libera principalmente a endorfina, substância que promove várias mudanças no cérebro, como crescimento neural, menor resposta inflamatória e novos padrões de atividade que promovem sentimentos de calma, bem-estar, melhor qualidade de sono, aumento da autoestima, da sensação de relaxamento e da disposição. Além do exercício físico, também é preciso uma boa alimentação para que os precursores gerem neurotransmissores saudáveis.

A psicoterapia é considerada parte fundamental no tratamento de transtornos psíquicos

A psiquiatra Renata Figueiredo explica que a deficiência nutricional leva ao envelhecimento cerebral e desenvolvimento de doenças neurodegenerativas, portanto, o papel da nutrição é manter o equilíbrio necessário para a química do cérebro funcionar adequadamente. RE D E M O IN H O | 1 9


Para a estudante Sarah Ariel Mas é importante que o diagnóstico Rodrigues, 25, o processo foi longo e não limite a pessoa à doença, com um de forma mais drástica. Sem entender rótulo. “Se uma pessoa tem ansiedade, o que sentia, acabou internada em 2015, ela se torna a ansiedade. Então tudo que durante uma crise. O desespero, naquele ela faz é por causa desse transtorno, isso momento, era tamanho que ela sabia às vezes limita um pouco a capacidade que não conseguiria continuar vivendo. de o próprio sujeito ser autônomo e ter O diagnóstico: transtorno bipolar, consciência das próprias ações”, avalia. ansiedade e depressão. “Já fazia muitos O processo de se autoconhecer é, então, anos que eu sofria com esses transtor- facilitado pela psicoterapia. nos, mas isso não era muito discutido na A autonomia é uma questão sociedade, então eu não tinha conheci- importante para quem passa por algum mento e nem informação suficiente para transtorno mental. Andar com os correr atrás da cura”, conta. próprios pés, fazer as próprias escolhas Acreditar que a dor chegou a um e ter consciência das ações faz parte do estado insuportável e que é preciso ser humano. Nayara comenta que casos acabar com ela pode expressar um de depressão, ansiedade, síndrome do quadro de ideação suicida. “O pensamento de que Quando a pessoa começa a manifestar preocupação psicólogo é coisa de gente com a própria morte, falar doida e que remédio vicia da falta de esperança, dizer que quer desaparecer ou não condiz com a realidade” que queria poder dormir e nunca mais acordar está Sarah Ariel, estudante indicando a necessidade de ajuda. Desemprego, discriminação pânico, transtorno bipolar e borderline por orientação sexual e identidade de são exemplos de doenças que precisam gênero, agressões, conflitos familiares de cuidado. “Temos também as psicoses, ou perda de algum ente querido são alucinações, delírios, histeria... Apesar agravantes nestes casos. de as doenças e transtornos psicológicos terem origem no cérebro, os sintomas Barreira para prevenção são físicos e podem ser percebidos tanto Fato é que a desinformação é uma das barrei- pela própria pessoa, quanto por familiaras para a prevenção e, principalmente, para res e amigos”. o tratamento. Muitas vezes a pessoa se culpa A origem dos transtornos está por não assumir determinados compor- diretamente relacionada com a forma tamentos, sem saber que precisa de ajuda. como as pessoas lidam com as quesChega a negar o sofrimento. “Saber que o tões que a cercam. “Existem coisas que sofrimento é real e a gente pode sofrer é o permeiam o nosso psiquismo, como passo mais importante para conseguir lidar sentimentos, pensamentos, emoções, com tudo. Porque se a gente nega o tempo sensações, lembranças, coisas inconstodo, tudo se torna muito mais complexo e cientes que vão se aglomerando ali e dependendo de cada pessoa, e da forma complicado”, comenta a psicóloga. 20 | REDEMOI NHO

como cada um lida com as suas questões, isso pode refletir no corpo. Os transtornos e doenças psíquicas são um sofrimento que passa para o corpo”, explica a psicóloga. Essas questões influenciam fortemente a produção de hormônios e neurotransmissores que, por sua vez, afetam o equilíbrio mental. É neste momento que muitas vezes começam a ser emitidos sinais que as pessoas mais próximas podem perceber e, neste caso, devem incentivar para que se busque amparo. Ela lembra, porém, que não existe uma forma eficaz de convencer alguém a procurar ajuda profissional. “O crucial é que o tratamento seja feito de corpo e alma, ou seja, a própria pessoa precisa querer se tratar”. O primeiro passo é decisivo. A partir daí, as orientações dos profissionais envolvidos costumam por si ajudar na manutenção do tratamento, assim como a certeza da segurança e do sigilo. “Então, é saber que não tem como convencer a pessoa a ir, mas no momento que ela vai, as coisas já seguem o seu fluxo”, afirma. Nos casos em que a ajuda profissional é insubstituível, Renata lembra que a rede pública, em especial os Caps, oferece tratamento. Mesmo com a ajuda da família, é comum a resistência em seguir com algum tipo


de tratamento. A vergonha é um dos sentimentos que costuma atuar neste processo. Acreditar que vai ser julgada, vista como fraca ou incapaz leva a pessoa a se isolar ainda mais. “Apesar de um quarto da população mundial em algum momento da vida ser afetada por um transtorno mental, essas doenças ainda são alvo de preconceito e com isso há uma demora para buscar tratamento, o que pode gerar um desfecho desfavorável”, comenta a psiquiatra. Alguns não compreendem ou mesmo aceitam que a doença mental é como qualquer outra. O preconceito, segundo a psicóloga, é comum, sobretudo entre os mais velhos, pois a saúde mental era pouco discutida. “Pessoas

ONDE PROCURAR AJUDA? Todas as unidades básicas de saúde podem encaminhar o indivíduo para atendimento psicossocial gratuito. Outras instituições oferecem apoio mediante comprovante de renda.

O isolamento é uma das características mais comum da depressão

- CAPS, Centro de atenção psicossocial, serviço gratuito e multiprofissional oferecido na rede pública. Encaminhamento pelo telefone (61) 3567-1967. - CVV, Centro de valorização a vida, sérviço de apoio emocional e prevenção do suicídio pelo telefone 188 - CAEP, Instituto de psicologia da UnB. Telefone: (61) 3107-1680 - COMPP, Centro de Orientação Médico Psicopedagógico (até os 17 anos). Telefones: 3325-4995 ou 3326-3201 - IBAC, Instituto Brasiliense de Análise de Comportamento. Telefones: 3242-5250 ou 3443- 4086

com transtornos eram consideradas loucas e internadas em clínicas e hospitais psiquiátricos, onde raramente recebiam tratamento apropriado”. Para Sarah, é urgente quebrar qualquer tipo de tabu. “A nossa saúde mental precisa estar acima de qualquer coisa. O pensamento de que psicólogo é coisa de gente doida e que remédio vicia não condiz com a realidade. Assim como o corpo, a mente também adoece e precisamos tratar da mesma forma, sem preconceito ou ignorância”, ressalta. A psicoterapia e apoio de pessoas próximas foram essenciais para o estudante Igor Vasconcelos, 23. Após passar por um surto, veio o diagnóstico: depressão e ansiedade. Ainda passou por uma

- IGBT, Instituto de Gestalt-terapia de Brasília. Telefones: 3033-7094 ou 9967-7569 - Instituto São Paulo de Análise de Comportamento. Telefones 3425-2717 ou 3327-7338 - Clínica social do IMPI. Telefone: 33642745 - Clínica Social InterPSI/CBP. Telefones: 98118-0548 e 99982-3224 - IBNeuro, Instituto brasileiro de Neuropsicologia. Telefones: 3226-3002 ou 32259185 - Clínica Social de Taguatinga. Telefone: 3967-3060 - SOBRAP, Instituto Brasileiro de Psicanálise, Dinâmica de Grupo e Psicodrama. Telefone: 3323- 5366 - Faculdades particulares que oferecem atendimento psicológico gratuito: Iesb. (61) 3445-4502 Universidade Católica de Brasília. (61) 3356-9000 Uniceub. (61) 3966-1626 RE D E M O IN H O | 2 1


amnésia ocasionada por estresse e exaustão. “Foi um dia que ninguém me reconheceu e isso foi em frente de várias pessoas. Eu não lembro o que falei, só o que os amigos contam que eu fiz”. Desde então, faz tratamento. Os sinais da ansiedade ainda estão lá. Unhas roídas e compulsão por comida são alguns deles. “Eu penso no futuro, me martirizo com o passado e não sei viver o presente. E é uma situação bem ruim”. O apoio, segundo ele, é essencial para seguir com o tratamento, que já dura sete meses. Além dos familiares e amigos, também os professores da faculdade em que estuda fazem parte desta rede de atenção.

Doenças psicossomáticas

As doenças psicossomáticas, ou transtorno de somatização, são caracterizadas por múltiplos sintomas físicos que não têm causa apontada em exames, nem são explicadas por doenças ou alterações orgânicas, mas que, ainda assim, causam desordem no corpo. As questões psíquicas refletem de forma negativa em sintomas físicos. Os principais exemplos desses sintomas são dores e queimação no estômago, enjoos, gastrites, falta de ar, palpitações, pressão alta, dificuldade para urinar, coceira ou alergia na pele, diminuição da libido, alterações no ciclo menstrual e problemas no sistema nervoso, como enxaqueca, alterações no equilíbrio e na sensibilidade. O diagnóstico deve ser feito por um psiquiatra, que precisa identificar a existência de no mínimo quatro sintomas diferentes para confirmar o diagnóstico. Por cinco anos, o estudante João Gabriel Oliveira, 22, sofreu com enxaqueca crônica e teve problemas no sistema nervoso e imunológico causados pela exaustão mental. João buscou ajuda de um clínico geral diversas vezes, depois que os sintomas começaram a atrapalhar o desempenho tanto no trabalho, quanto na faculdade. Após meses e uma série de exames, buscou um psiquiatra, onde recebeu um diagnóstico definitivo que apontava transtorno de somatização. João Gabriel conta que ficou preocupado com o diagnóstico, pois, no início, não compreendia o motivo dos outros exames não apontarem uma causa orgânica para os sintomas. “Fez sentido quando entendi que o nosso cérebro e nosso corpo não são coisas distintas. Então se nossa psiquê não está bem, nosso corpo começa a sofrer com isso”, conta. Segundo a clínica geral Eliane Aires, pode ser necessário o uso de medicamentos no tratamento de doenças psicossomáticas para o alívio dos sintomas, mas a psicoterapia é 22 | REDEMOI NHO

CAPSi é voltado para atendimento de crianças e adolescentes

APOIO AO ALCANCE DE TODOS Os Centros de Atenção Psicossocial (Caps) fazem parte do SUS e são constituídos por equipes multiprofissionais. No Distrito Federal, há várias unidades no Plano Piloto e nas regiões administrativas. Para ser atendido é necessário comprovante de residência e identidade. Não é necessário agendamento, mas gestantes, idosos e crianças têm preferência. São seis diferentes modalidades de serviços: CAPS I: atendimento a todas as faixas etárias para transtornos mentais graves e persistentes, inclusive pelo uso de substâncias psicoativas; em cidades e/ou regiões com, pelo menos, 15 mil habitantes. CAPS II: atendimento a todas as faixas etárias, para transtornos mentais graves e persistentes, inclusive pelo uso de substâncias psicoativas; em cidades e/ou regiões com, pelo menos, 70 mil habitantes.

CAPS i: atendimento a crianças e adolescentes com transtornos mentais graves e persistentes, inclusive pelo uso de substâncias psicoativas; atende cidades e/ou regiões com, pelo menos, 70 mil habitantes. CAPS-ad: Álcool e Drogas: atendimento a todas faixas etárias; especializado em transtornos pelo uso de álcool e outras drogas; atende cidades e/ou regiões com, pelo menos, 70 mil habitantes. CAPS III: atendimento com até 5 vagas de acolhimento noturno e observação; para todas as faixas etárias; atende transtornos mentais graves e persistentes, inclusive os provocados pelo uso de substâncias psicoativas, em cidades e/ou regiões com, pelo menos, 150 mil habitantes. CAPS-ad III – Álcool e Drogas: atendimento com 8 a 12 vagas de acolhimento noturno e observação; funcionamento de 24 horas; para todas faixas etárias; para transtornos pelo uso de álcool e outras drogas, em cidades e/ou regiões com, pelo menos, 150 mil habitantes.


fundamental para tratar os conflitos internos. “É preciso entender a complexidade do ser-humano, que inclui fatores emocionais, genéticos e hábitos de cada um para, então, tratar a verdadeira causa desses problemas”, explica.

Além da terapia convencional

As terapias não-convencionais auxiliam no tratamento de doenças e nos transtornos psíquicos. A proposta é que a pessoa seja

vista de forma harmônica, para que tenha uma vida saudável e equilibrada. Entre elas, estão, por exemplo, a yoga, a meditação, a musicoterapia e o thetahealing. Segundo a musicoterapeuta Isabella Paz, a modalidade melhora a comunicação e o aprendizado, além de empoderar o paciente para que descubra a própria capacidade de lidar com dificuldades cotidianas, além de contribuir para a memória e a interação social.

Existe também o ThetaHealing, técnica de cura energética considerada pelos adeptos como um reencontro com a própria essência. A proposta é usar a intuição natural de forma a alterar o ciclo de ondas cerebrais. O terapeuta se conecta à frequência cerebral “Theta” e visualiza a energia de harmonização no campo energético do cliente de forma consciente, por todo o tempo do tratamento. 

SÍNDROMES, DOENÇAS E TRANSTORNOS

SÍNDROME: É caracterizada por um conjunto de sintomas que ocorrem ao mesmo tempo e estão associados a um ou mais problemas na saúde do corpo. Elas podem tem causas biológicas e psicológicas. Os sintomas que compõem uma síndrome podem variar e desaparecer de acordo com o tempo. DOENÇA MENTAL:Também está associada a problemas na saúde física, pois tem origem clínica e apresenta um ou mais sintomas e alterações identificáveis no corpo. As doenças mentais precisam de uma causa física para se desenvolver. TRANSTORNOS: Alteração na saúde que não está sempre vinculada a uma doença de causa biológica. Geralmente, o transtorno mental está diretamente relacionado à saúde psíquica e não à genética, doenças ou lesões. PRINCIPAIS TRANSTORNOS ALÉM DA DEPRESSÃO E ANSIEDADE

Transtornos alimentares: Incluem anorexia nervosa – caracterizada por uma busca incessante pelo emagrecimento e restrição do consumo de alimentos, que resultam em peso corporal significativamente baixo, e bulimia que se caracteriza pelo consumo rápido e repetido de grandes quantidades de alimentos (compulsão alimentar) seguido de tentativas de eliminar o excesso de alimentos consumidos pelo corpo por purgação, jejum ou exercícios extremos. Transtorno bipolar: Inclui dois extremos, ou polos, dos transtornos do humor: depressão e euforia. Transtorno obsessivo compulsivo (TOC): É caracterizado por ideias, imagens ou obsessões recorrentes, persistentes, indesejados, que provocam ansiedade e são intrusivos. Fonte: Manual MSD

Crédito: Aureliano Medeiros

Os transtornos mentais psiquiátricos ou psicológicos são caracterizados pelas alterações de pensamento, emoções e comportamento. Segundo o Manual MSD, é comum que pequenas alterações nesses aspectos da vida aconteçam, mas quando causam muito desconforto ou interferem no cotidiano podem ser consideradas doença ou transtorno mental. Os efeitos de problemas psíquicos podem ser duradouros ou temporários, e incluem interações complexas entre influências físicas, psicológicas, sociais, culturais ou hereditárias. Há diferenças entre síndromes, transtornos e doenças mentais:

Esquizofrenia: É um transtorno mental caracterizado pela perda de contato com a realidade, alucinações, falsas convicções, pensamento e comportamento anômalo. RE D E M O IN H O | 2 3


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S AÚDE

O que você come? Relacionamento com alimentos vai desde necessidade nutricional, até socialização, conquista do corpo perfeito, prazer e prevenção de doenças

por: Jhonatan Guimarães

Garantir uma necessidade biológica. Fornecer ingredientes para o organismo. Reunir os amigos. Experimentar cores e formas. Ganhar ou perder peso. A lista não para por aí. A relação com a comida e com o ato de alimentar-se move o ser humano desde que ele existe. Ao longo dos anos, no entanto, passou por várias mudanças. Hoje, se pode ser sinônimo de boa saúde, também indica transtornos e doenças, principalmente quando o consumo fica desequilibrado. Transtornos alimentares como bulimia e anorexia podem causar complicações que vão muito além do físico. “É realmente como se a comida e o peso te perseguissem aonde quer que você esteja”, comenta a cineasta Cíntia Guedes, 23 anos, para quem fome e pensamento

de culpa passaram a conviver juntos e a união tornou-se sinônimo de tormento. Durante o período de faculdade, Cíntia procurava se isolar nos horários das refeições. “Ia para dentro do banheiro comer, porque eu tinha impressão de que todos estavam me observando”, lembra. Apesar do tempo, a dificuldade permanece. Desde 2015 ela passa por reeducação alimentar e, no início deste ano, iniciou sessões de terapia. “É difícil desvincular o sentimento de amor e ódio pela comida que a anorexia e a bulimia trazem”. Contar obsessivamente as calorias e tomar diuréticos eram comportamentos diários para tentar se livrar do sentimento de culpa. “A gente se perde muito no caminho, está tudo ligado no emocional”, relata. RE D E M O IN H O | 2 5


Cíntia foi vítima do bullying e sofreu com piadas até os 19 anos. De 2015 a 2017, perdeu 60kg com muita restrição e dieta low carb. Tudo o que comia era rigorosamente pesado e registrado em uma caderneta, inclusive com as calorias. Sem acompanhamento psicológico, a mudança foi mais difícil do que podia suportar. “Eu não estava engordando mais, mas eu me olhava no espelho e estava me vendo imensa, me vendo como antes”, conta. A distorção de imagem é comum nos efeitos que as pessoas enxergam em algo tão natural quanto o ato de se alimentar. A psicóloga Kelly Albini afirma que quando a pessoa vê na comida uma forma apenas de perder peso, é muito comum a ansiedade. “Então onde ela vai buscar conforto? Na comida, o que chamamos de fome emocional. Gera um pensamento do que vou ingerir e do que preciso me libertar”, complementa. O caminho, segundo ela, é buscar o equilíbrio. “É preciso um

equilíbrio da apreciação que a pessoa tem de si própria, do que ela realmente é, e do que ela há de ser”, complementa. De acordo com a psicóloga, a pessoa que sofre com a bulimia tem um comportamento exagerado e compulsivo com alimentos mais calóricos, tendo dificuldade em controlar atos de punição, como provocar vômito, tomar laxante, diurético e ficar muito tempo em jejum. Se para alguns é transtorno, para outros a alteração do cardápio é o passaporte para o bem-estar. A estudante Fabiana Carvalho, 27, diz que junto com a mudança na alimentação veio uma rotina de hábitos mais saudáveis que fazem diferença na saúde física e mental. “Eu mesma criei uma dieta, e fui cortando as coisas que faziam mal para meu corpo e minha mente”, explica. Legumes e folhas verdes ganharam mais importância. “Comecei em outubro de 2017 e até dezembro meu percentual de gordura baixou de 19% para 15%”, conta, orgulhosa. Fabiana cresceu em uma casa com hábitos saudáveis. A rotina com os pais não incluíam refrigerantes, sanduiches ou doces em excesso. “Depois que eu virei adolescente, estava sempre na rua. Comia muita porcaria, muito macarrão com creme de leite, essas coisas”, reconhece. Desde janeiro, ela adota acompanhamento profissional com o objetivo de perder massa gorda. “Foi uma dieta bem restrita, com muita proteína e pouco carboidrato. Fazendo exercício em jejum”, explica. “Eu comia 50 gramas de carboidrato por dia”. O mais difícil para Fabiana foi eliminar o açúcar da alimentação. “Hoje em dia se eu como algo com açúcar, me sinto mal”, relata.

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São inúmeros os tipos de dietas existentes e a conquista do corpo perfeito está sempre ligada à vida de muita gente que precisa reatar com a autoestima ou até mesmo pelo melhor funcionamento do organismo. A ideia do corpo perfeito é difundida por todos os lados. Muitas vezes, as pessoas dão o primeiro passo, buscam mudar a alimentação, mas colocam metas impossíveis de serem alcançadas. Para a servidora pública Maressa Ribeiro, 35, o mais complicado é justamente esse primeiro passo. “A questão mais difícil é adquirir o hábito dessas mudanças alimentares, independente da dieta”, conta a servidora pública. Ele adotou dois modelos bem restritivos: a low carb e a dukan, pois considera que aceleram o metabolismo e reduzem a fome. A motivação para seguir em frente foi o emagrecimento. “Foi o suficiente para continuar”. Para ela, 26 | REDEMOI NHO

< Obsessão pelo corpo perfeito pode levar a transtornos alimentares


Boa alimentação é rica em verduras, frutas e legumes

a readequação, que inclui exercícios Intolerantes e alérgicos emite. Os que têm efeitos colaterais físicos, passa por uma nova percepção Mas a relação com alimento vai muito com o consumo de leite, por exemplo, da própria imagem. além do emagrecimento, do transtorno podem ser alérgicos ou intolerantes. A perda de peso também foi o ou da busca pelo corpo perfeito. Alér- “Algumas pessoas podem excluir caminho para a dona de casa Adriana gicos, intolerantes, celíacos e diabéticos apenas o leite da vaca, mas podem Oliveira, 46. A opção foi pela digerir o iogurte, queijo e produtos com teor de lactose dieta macrobiótica, conside“É preciso equilíbrio na rada por alguns quase uma reduzido”, alerta. Caso a intoapreciação que a pessoa tem filosofia de vida. “Comecei a lerância seja severa, é preciso perceber que realmente tinha de si própria, do que ela realmente excluir todos os laticínios. “A alimentos que era melhor exclusão total de laticínios é, e do que ela há de ser” não deve ser feita sem a real evitar”, afirma. O melhor funcionamento do intestino Kelly Albini, psicóloga necessidade”, observa. e a sensação generalizada Para o professor de estar melhor foram outros resul- necessitam de cuidados especiais com Guilherme Sousa, 35, o desconforto com tados da disciplina, considerada por tudo o que ingerem. A mestre em nutri- a comida foi explicado apenas após um ela essencial. “A questão é você querer ção Fabiana Nalon, da Universidade de exame de sangue e uma endoscopia que manter o foco e não ter preguiça de Brasília, explica que em todos esses casos comprovaram alergia ao glúten. “Estava preparar os alimentos”. é preciso investigar os sinais que o corpo muito fraco, vivia cansado”. Guilherme RE D E M O IN H O | 2 7


chegou a pensar que estava com depressão. Não associava o desânimo à constante dor no abdômen. No resultado dos exames ficou comprovada a ausência de vários nutrientes, até mesmo da vitamina D. “Eu comia tudo normalmente com farinha de trigo, com muita frequência. O meu intestino estava todo machucado, por isso eu sentia as dores”, lembra. Ele ainda tentou manter a alimentação sem restrições, mas as reações do organismo eram ainda mais drásticas. “A minha sensibilidade foi aumentando”, explica. Resolveu mudar os hábitos sem abrir mão dos alimentos que mais gosta. “Eu aprendi a fazer pizza sem glúten, pão e bolo, que Nutricionistas lembram importância de se optar por alimentação saudável são coisas que eu gosto”, ressalta. Se a farinha é constantemente vilã das dietas para redução de peso, as frutas são alimentos integrais, como o pão integral, Filosofia tradicionais aliadas dos hábitos alimentares arroz, aveia. Já o consumo de frutas tem, A perda de peso antes que a conta mais saudáveis. Mas elas também podem sim, que ser de forma moderada”, diz. chegasse foi apenas uma das motivações ser banidas do cardápio por intolerânDe acordo com dados da Vigilância do fotógrafo Guilherme Macedo, 25. Há cia. É a chamada frutosemia. Neste caso, de Fatores de Risco e Proteção para Doenças três anos ele aderiu integralmente ao a nutricionista explica que são excluídos Crônicas do Ministério da Saúde, a diabetes vegetarianismo. Não concordava com alimentos ricos em frutose, frutas, açúcar atinge 8,9% da população brasileira, entre a forma de criação e abate de frangos e e alguns vegetais. “Na medida em que os crianças e adultos. Os sintomas caracterís- bois. Muito menos com o preparo. Como sintomas melhoram alguns alimentos são ticos, principalmente na do tipo 1, são fome nunca foi apaixonado por carne e ainda se reintroduzidos em pequenas quantidades excessiva, perda de peso não intencional, preocupava com os efeitos dos hormônios e com baixa frequência conforme a tole- excesso de urina e muita sede. No tipo 2, o usados na criação desses animais, colocou rância do paciente”, explica o regime em prática. “Minha alimentação Fabiana Nalon. O consumo hoje é formada por salada, grãos... sempre Na frutosemia, doença de frutas está relacionado ao faço tudo em casa e tento evitar comer rara, a restrição a frutas e melhor controle da diabetes sem saber de onde está vindo”. pois são alimentos ricos em A saúde sempre foi uma preocuaçúcar pode ser temporária fibra, vitaminas e minerais pação. Antes, estava com sobrepeso. ou permanente antioxidantes, mas quantidaCom a mudança, emagreceu 20kg dos des excessivas podem elevar 100kg anteriores. “Eu sinto que tenho quadro é silencioso e os sintomas só costu- uma digestão melhor, a minha pele a glicemia. Fernanda Bassan lembra que a mam aparecer em casos mais avançados, em melhorou muito sem carne”. O ovo e o alimentação de uma pessoa com diabetes que a glicemia está mais descompensada. queijo permanecem no cardápio. “O ovo deve ser a mais saudável e com controle Um sinal de resistência à insulina é a forma- é complicado, porque eu não concordo do consumo de carboidratos. Farinha, ção de manchas escuras em regiões como como ele é extraído também, mas é um açúcar, arroz, pães e massas no geral são axila, virilha e pescoço, reflexo do excesso alimento tão básico que às vezes salva restringidos. “A preferência deve ser por de insulina na corrente sanguínea. sua vida”, afirma. 28 | REDEMOI NHO


Grupos alimentares

A alimentação é composta por três grandes grupos alimentares: carboidratos, proteínas e lipídios. Segundo a nutróloga Nádia Haubert, quando o paciente exclui algum desses grupos, ele pode ter uma sintomatologia clínica. As dietas do tipo low carb, por exemplo, podem trazer fraqueza, astenia, mal-estar, tontura, tremores e halitose, que são os sintomas relacionados a uma dieta muito pobre em carboidratos e proteínas. “Os pacientes acabam perdendo peso às custas de massa magra, o que não é interessante”, alerta. Os lipídios, destaca, são importantes para a formação hormonal e as vitaminas A, D, E e K são absorvidas na presença deles. “Quando você exclui lipídios, você pode ter deficiência dessas vitaminas, tendo alterações hormonais também”, explica. A má alimentação pode causar deficiência vitamínica, de micronutrientes, de magnésio, cálcio, potássio.

É preciso ter disciplina, planejamento e organização, mas o excesso de restrições pode levar a transtornos e falta de nutrientes Mas os especialistas lembram que o corpo fala. A deficiência da vitamina C, por exemplo, pode causar sangramento gengival. “A falta de vitamina A pode causar diminuição da visão e até cegueira”, alerta. “Deficiência de vitaminas do complexo B pode causar fraqueza, formigamento, alterações neurológicas”, complementa, lembrando que, em casos mais graves, por dificultar inclusive a locomoção. O diagnóstico deve ser feito por um profissional. “Muitas vezes a gente vê o paciente com alterações neurológicas, com lesões de pele, cutâneas, lesões na mucosa oral”, explica Nádia Haubert. O tratamento é feito tanto no ponto de vista de intervenção nutricional, quanto com uma prescrição que privilegia alimentos que possam ser ricos em algum desses nutrientes que estão deficitários e até com medicamentos. RE D E M O IN H O | 2 9


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C OMPORTAMENTO

Elas são consagradas Meninas de até 7 anos adotam estilo de vida religioso que inclui uso de véu, saia e cabelos longos, orações diárias e castidade

por: Pâmela Maria

Saia longa, véu sobre os cabelos, opção pela castidade, corrente no pulso, terços diários e missa em latim. O ritual faz parte da rotina da universitária Marina Lopes, de 19 anos. Ela é uma das Consagradas de Maria, moças que mudam a forma de agir, de vestir e de falar em nome da fé. “Eu sou muito feliz do modo como me porto, do jeito que me visto. Eu antes usava roupas e me comportava como uma menina comum, mas depois que me consagrei eu escolhi um novo modelo de vida, e não me arrependo de ter escolhido isso”, afirma, em tom de voz baixo e doce, características recomendadas às consagradas.

O modelo seguido por elas surgiu em 1712, a partir dos ensinamentos deixados por Luís Maria Grignion de Montfort, padre francês que viveu nos séculos XVII e XVIII e foi santificado pela Igreja Católica. Ele é autor do chamado Tratado da Verdadeira Devoção a Santíssima Virgem Maria, que propõe um novo modo de vida aos que se submetem à consagração. E é este o modelo adotado. A opção pela consagração, na realidade, está presente em diferentes segmentos cristãos, como lembra o professor Volney José Berkenbrock, doutor em Teologia pela Universidade de Bonn, na Alemanha. “O fenômeno RE D E M O IN H O | 3 1


Tratado com informações incluem modos de se vestir e de agir como leitura obrigatória

das consagrações é relativamente comum nas religiões. Dentro do cristianismo, temos exemplos disto desde o início, com a descrição dos evangelhos de que os apóstolos deixaram tudo para seguir Jesus”, afirma. O devotamento e o caráter de sacrifício presentes nas consagrações, assim como a ideia de ofertar algo de si para uma finalidade maior, encontra similaridade em outras crenças. Berkenbrock ressalta que a diversidade é grande. “Se olharmos para as tradições budistas ou hinduístas, por exemplo, temos coisas muito semelhantes”. Ele explica que entre os hindus, os renunciantes, chamados sanyassi, deixam tudo para viver em plena liberdade, sem depender mais de nada ou de ninguém. Já na tradição budista, os monges seguem o sangha, uma comunidade búdica. “No Candomblé, há por exemplo a iniciação ao orixá. O iniciado muda de vida com a iniciação e se submete a uma série de obrigações que dizem respeito ao comportamento, às cores, às comidas, à abstinência sexual”, completa o professor. A opção pode provocar riscos. As mudanças sociais e religiosas fazem com que muitas vezes essas pessoas cheguem a ser vistas com preconceito ou acusadas de 32 | REDEMOI NHO

RITUAL E CONSAGRAÇÃO A jovem que quer se consagrar a Nossa Senhora escreve uma carta, que deve ser assinada por ela e pelo sacerdote que realiza a cerimônia. No dia da consagração, de joelhos e diante da imagem da santa, ela deve ler o compromisso assumido, ritual que se repete uma vez por ano. O sinal mais claro de uma jovem consagrada é a corrente no pulso. Algumas optam por usar o adereço no tornozelo, na cintura ou no pescoço. O uso do véu é desejável, mas não obrigatório. O branco representa a castidade e o negro é adotado pelas demais. A reza do terço quatro vezes por dia, a oferta de orações a Maria e o uso da saia longa completam os hábitos.


radicalismo. Para Berkenbrock, o problema está no fato de os compromissos assumidos serem difíceis de cumprir. “Isso gera arrependimento”. Também integrante das Consagradas de Maria, a auxiliar de escritório Nathália Araújo, 20, afirma que há muito tempo não vive mais de modo tão rigoroso a consagração. “Rezo o terço normalmente, mas antes era todos os dias. É uma questão de escolha. Na época, eu acreditava que para me consagrar precisaria seguir essas regras, mas hoje vejo que não há necessidade”, conta. A prática da religiosidade sem extremismos também é defendida pela estudante Ludymilla Angélica, 22. Consagrada desde os 7 anos de idade, ela defende que é preciso levar em consideração que todas são humanas e falhas. “Devemos dar exemplos e seguir os passos de Jesus, pregar o que ele pregou, mas

nada ao extremo é bom”, opina. Para ela, é preciso respeitar os próprios limites e ver a prática de uma forma mais ampla, com princípios como solidariedade e amor ao próximo. “Não é a saia longa ou o vestido longo que nos faz modestos”, declara. Padre Antônio Carlos de Figueiredo, conhecido como padre Tininho, é capelão da Universidade Católica de Brasília e ressalta que é necessário ter cuidado com qualquer tipo de fanatismo, pois não é o que a igreja prega. “Se virar

naquele radicalismo é exagero, e vai totalmente contra aquilo que a igreja pensa”, diz. Na avaliação dele, a consagração precisa atingir a sociedade, para não se tornar algo pessoal. “As pessoas acham que para servir a Deus têm que fugir do mundo. Ao contrário. Você tem que estar no mundo, porque o fermento só fermenta a massa quando está no meio da massa. Hoje, o que está acontecendo é isso: as pessoas se afastam, acham o mundo pecador”, ressalta.

“A saia faz parte da modéstia no todo, tanto no interior como no exterior. É um conjunto de uma mulher virtuosa” Marina Lopes, 19, consagrada há três anos

HOMENS CONSAGRADOS Apesar de menos comum, o modelo também pode ser adotado pelos homens. O coach Anderson Carlos Bezerra, 26, é consagrado há seis anos. “O homem precisa se comportar como homem, assumir suas responsabilidades, seja na família, no trabalho, na igreja, na sociedade em geral”, afirma. Ele frequenta a missa em latim em Samambaia. Na cerimônia, os homens vestem terno e gravata e ficam sentados no lado oposto ao das mulheres. O estudante Lucas de Souza Maciel, 18, disse que o ritual mudou a forma de ele agir. “Aprendi a tratar melhor meus pais e colegas, e aderi também à modéstia masculina”, garante. Até mesmo o vestuário foi alterado. “Não uso camiseta regata, apenas as que cubram a parte do corpo onde eu sei que nenhuma mulher vai pecar”, declara. Modelo religioso também é adotado por homens RE D E M O IN H O | 3 3


O sacerdote afirma também que não há necessidade do uso do véu. “O véu é anti-Concílio Vaticano II, não vejo necessidade nenhuma. Mas se eu usar essas coisas todas, e isso me leva a estar em contato com os pobres, com os ‘lascados’, tudo bem”, avalia. A ideia defendida por ele é a de fazer com que todos se sintam iguais. “Eu acho absurdo a pessoa comungar de joelho porque ela está fazendo diferente dos outros. Na missa não é lugar de ninguém ser melhor do que ninguém”, conclui. Mas o ser diferente faz parte da rotina de boa parte das consagradas. Larissa Nadine da Costa Morais, 21, é formadora das meninas de Maria. Um dos principais desafios, segundo ela, é que muitas vezes os outros a veem como exemplo. “Fazemos questão de enfatizar que não somos exemplos”, comenta. Para Larissa, uma das principais virtudes deve ser a modéstia, mas a interior. “Aquela que os outros não veem. Então a jovem vai se policiando para ter cuidado com as palavras, com o modo de agir e, por último, com o modo de se vestir”, explica. Todo o aprendizado é reforçado semanalmente em reuniões nas quais estudam o livro Tratado da Verdadeira Devoção. Mas a preocupação com sinais externos também é defendida por algumas consagradas. Para Marina, a vestimenta é parte essencial, ao lado da humildade, quietude, caridade e virtude. “A saia faz parte da modéstia no todo, tanto a interior quanto a exterior. É um conjunto de uma mulher virtuosa.” O fenômeno da consagração é conhecido como hierofania, manifestação e experiência do sagrado. “Após essa experiência, a pessoa passa a interpretar o mundo a partir da consagração. Deste modo, é possível explicar o motivo da mudança radical das jovens, seja no comportamento 34 | REDEMOI NHO

“Devemos dar exemplos e seguir os passos de Jesus, pregar o que ele pregou, mas nada ao extremo é bom” Ludymilla Angélica, 22

ou nas atitudes”, afirma Berkenbrock. O teólogo Geimison Silva defende que o homem é um ser religioso e a consagração é um dos caminhos. “A diversidade religiosa é vista como uma riqueza”, opina.

Idade

Não há idade mínima para se tornar consagrado. Com 14 anos, a estudante Tamires Barbosa Felix adotou para si o modelo de vida por acreditar que seria uma forma de estar mais perto do divino. “Mudei o modo de me vestir, de falar e viver”, garante. A também estudante Sara Caldeira Tomas, 11, afirma que se consagrou após frequentar alguns cursos de preparação junto com a mãe e ver outras meninas usarem saia, véu e pulseira. “Quando eu vi, comecei a ter uma paixão pelo véu e saia longa”, declara. 

Aprendizado é reforçado semanalmente em reuniões


O RITO EXTRAORDINÁRIO

O Concílio Vaticano II foi uma série de conferências realizadas entre 1962 e 1965 e que resultaram em profundas transformações na Igreja Católica. Os concílios são assembleias com todos os bispos. A proposta liderada pelo papa João XXIII era modernizar e atrair fieis. Entre as mudanças, a do rito da missa, que deixou de ser celebrada de costas para os fieis e em latim, além da não obrigatoriedade do uso do véu. “Muitos foram os assuntos discutidos, mas a principal questão era a adaptação da Igreja Católica aos novos tempos”, destaca o professor Volney José Berkenbrock. Outros avanços importantes foram a adoção do ecumenismo como tarefa também dos católicos e a compreensão de que não cristãos também podem ser “salvos”. “Até os dias de hoje ainda há elementos a serem postos em prática”, explica ele.

As missas em rito extraordinário são aquelas em latim, tal como previsto antes do Concílio Vaticano II. Durante a celebração, na qual o padre fica de frente para o altar e de costas para os fieis, as consagradas usam véu e portam consigo um pequeno missal no idioma. A missa em rito ordinário difere por ser celebrada em português, pelo acesso das pessoas ao altar para leituras, pelas músicas cantadas durante a cerimônia e a diferença mais evidente é o sacerdote de frente para os fiéis. Padre Bruno Vitor, da paróquia Nossa Senhora das Graças, afirma que os dois ritos são importantes pois, por meio deles, a igreja acolhe a todos sem distinção. “É uma forma de garantir a expressão em todas as línguas e culturas”. O latim é considerado o idioma oficial da Igreja Católica e usado para a liturgia ocidental desde o século III. Em Brasília, há diversos lugares onde ainda ocorrem missas em rito extraordinário. Entre eles, a Capela de Santa Luzia, no Pistão Norte, em Taguatinga, e a Capela Nossa Senhora das Dores, em Samambaia.

Crédito: Aleteia SAS

CONCÍLIO VATICANO II

O Concílio Vaticano II foi uma série de conferências realizadas entre 1962 e 1965 e que resultaram em profundas transformações na Igreja Católica RE D E M O IN H O | 3 5


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C OMPORTAMENTO

De drag a queen Busca por visibilidade e a defesa da profissão como arte fazem parte da rotina dos que seguem a carreira no DF

por: Maína Chaffin

Com chinelos, jeans rasgado, camiseta e mochila nas costas, Felipe Ottero, 22 anos, chega à portaria da boate e se identifica. Diferente de outros jovens que estão na fila, esperando para entrar no local, Ottero vai a trabalho. Duas horas depois, vestido com body preto, botas de salto, peruca loira e muita maquiagem, o rapaz já não atende mais pelo nome de batismo. Pelas próximas horas, ele é Nancy Hallow, drag queen. A rotina de trabalho das drags é de glamour. Fotos com fãs e amigos no camarim antecedem a subida ao palco. Após dois anos de carreira, ainda se ressente da falta de reconhecimento do público do retorno financeiro. Para ele, no entanto, esta é uma etapa para a visibilidade. “Antes de ser drag queen, eu sou artista e, antes

< Carreira do comissário Pedro Paulo foi impulsionada pelo namorado, a drag Nancy Hallow

de ser artista, sou um ser humano. Quero mostrar para quem tem o mesmo sonho que não há nada de errado em ser estranho, em ser diferente do padrão que a sociedade cobra”, diz Nancy. Fã número um e namorado da Nancy Hallow, o comissário Pedro Paulo Deluque, 23, conta que desde que descobriu esse mundo drag sentia vontade de se montar. “Há uns quatro anos comecei a acompanhar o reality show RuPaul’s drag race e ali eu me peguei apaixonado por essa profissão”, lembra o comissário. Assim surgiu a drag queen Licorina. Licorina ainda não subiu aos palcos para uma primeira performance, porém sempre participa de eventos e paradas LGBTS que ocorrem na cidade. Outra drag que também está no início RE D E M O IN H O | 3 7


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da boate Victoria Haus, Pikineia lançou o próprio selo de festas, Baile da Piki, e também apresenta as entrevistas com celebridades convidadas pela boate no canal do Youtube. A drag brasiliense também é idealizadora do aplicativo clube da piki, que oferece vantagens e benefícios em festas para os usuários do app.

Começar a carreira é sempre um momento difícil para elas. Mas a persistência é considerada fundamental. “Eu agarrei minha oportunidade com unhas e dentes e não desisti”, afirma ela. A mudança veio em uma fase de luto, após a perda da mãe. Para ela, o trabalho foi uma passaporte superar o momento, realizar

CRIADOR E CRIATURA QUEM É RUPAUL? O norte-americano RuPaul Andre Charles, mais conhecido como RuPaul, é ator, modelo, cantor, autor e, claro, drag queen. Nos anos 90, tornou-se conhecido por diversos filmes, programas de TV e músicas. Desde 2009, RuPaul produz e apresenta o reality show RuPaul’s Drag Race, pela qual recebeu dois Primetime Emmy Awards, em 2016 e 2017. Em 2017, RuPaul foi incluído na lista anual da revista Time, das cem pessoas mais influentes do mundo. O QUE É A DRAG RACE? Criado em 2009 e com dez temporadas no currículo, o programa tem como anfitrião, mentor e musa inspiradora a drag queen RuPaul, que comanda uma série de desafios que exigem desempenho artístico, figurinos exuberantes e muita maquiagem. A cada temporada, as participantes disputam o título de maior drag queen dos Estados Unidos e um prêmio em dinheiro. Além do entretenimento, o reality também apresenta lições de respeito à identidade de gênero. Alguns episódios convidam veteranos do Exército, mulheres, pai de família, gays da terceira idade e até mesmo as mães das participantes para brincar com as expressões de gênero. O programa também busca apresentar a beleza do universo drag, para aquelas pessoas que não compreendem e condenam esta expressão artistica. Credito Rupaul.com

da carreira é a Piper Callazans, criada pelo maquiador Felipe Alves, 21. Piper surgiu devido à admiração do maquiador pelas drag queens que estão fazendo grande sucesso atualmente. “Esse boom de cantoras drags foi o que me motivou a começar a trabalhar com a arte de ser drag”, conta o maquiador. O fato de a mídia abrir espaço para as cantoras drag queens, como Pabllo Vittar, é o que estimula tantos rapazes a investirem na carreira, avalia o professor de antropologia Claudio Ferreira. “O menino gay que acompanha a carreira dessas cantoras vê segmentação de mercado que oferece uma oportunidade de emprego e até mesmo de fazer sucesso”, explica o professor. Ferreira também considera que as drags sempre tiveram oportunidade no mercado do entretenimento, pois não é de hoje que boates e eventos contratam os serviços delas inclusive para recepcionar os convidados. “Era mais comum ver as drags como hostess, hoje elas são a principal atração do evento”. A mudança ocorreu frente à própria adaptação das drags. O atual cenário das cantoras brasileiras drags conta também com representantes do DF. Aretuza Lovi, interpretada por Bruno Nascimento, 28, é goiano, porém iniciou a carreira em Brasília como hostess e drag residente da boate Victoria Haus. O espaço é considerado o principal do gênero em Brasília e o terceiro no Brasil. Hoje, Lovi tem mais de 23 milhões de views no Youtube e uma carreira nacionalmente conhecida. A mais renomada das drags do DF, no entanto, é Pikineia, interpretada por Edenilson Bernardo de Melo (Dennys), 33. Com os hits “Rainha da colmeia”, “Néctar bom” e o último lançamento, “Caipiroska”, ela já soma mais de 140 mil views no Youtube. Apresentadora titular

O polivalente RuPaul Andre Charles apresenta o reality show de sucesso


sonhos e garantir conquistas. “Havia mais de um ano que tinha ficado sem minha mãe e minha vida estava sem brilho e sem cor. Foi quando descobri que ser drag me devolveria esse brilho”, acrescenta. Devido à visibilidade alcançada por Aretuza e Pikineia, muitos jovens transformistas de Brasília e cidades proximas veem as casas de show e eventos LGBT da Capital como oportunidade para início de uma carreira de sucesso. A boate Velvet Pub, referência em festas gay friendly há sete anos, oferece oportunidade para as iniciantes. Sempre às quarta-feiras, na festa WoW, voltada para o público LGBT, um novo rosto está por lá. “As drags iniciantes precisam de um espaço para fazer portfólio, se mostrarem para o público”, explica o produtor da festa Daniel Martins, 26. Atributos como maquiagem extravagante bem finalizada, figurino que condiga com a música, coreografia elaborada e dublagem impecável são atributos exigidos. Foi na Velvet pub que o estudante de moda Igor Alessandro, 20, fez o primeiro show como Ayobambi Voorthes. O rapaz que sempre gostou desse mundo de cabelo, maquiagem e moda, encontrou inspiração em RuPaul ‘s drag race uma oportunidade de fazer tudo o que queria. “Descobri que não precisava mudar meu gênero e ser julgado por isso”, explica Igor. Ele esperou até completar 18 anos para começar a se montar em festas gays. Igor conta que um dos maiores desafios em seguir a carreira é o dinheiro gasto com figurino, cabelo e maquiagem, pois os baixos cachês oferecidos para quem está começando não cobrem as despesas. Em média, eles recebem de R$ 100 a R$ 150 por noite. “Eu gasto muito para receber somente o que gastei de volta, ou até

Lushonda procura fazer da arte drag queen uma ferramenta para combater o preconceito

menos. É muito raro ter lucro em cima disso”, reconhece. Até para quem já faz sucesso, o valor investido não é pequeno. “O investimento é a maior dificuldade”, completa Pikineia. Ainda assim, alguns optam por trabalhar exclusivamente na profissão. Luiz Guilherme da Costa, 24, a drag Lushonda, diz que não é fácil, mas é possível se sustentar. “Consigo fazer com que seja meu ganha pão”. Para ele, tudo na carreira é desafio. “As pessoas na rua, principalmente heteros, ainda julgam e pensam que sou travesti. Não sabem reconhecer que é trabalho. Ser drag é arte e arte é profissão”, argumenta. Lushonda reconhece que algumas pessoas são drags por hobbie. No entanto, afirma que só consegue destaque na carreia quem se dedica 24 horas. “Da hora que eu acordo, até a que eu vou dormir tenho que me dedicar aos figurinos, ensaios, shows e presenças”, diz a drag.

DICAS DE MAQUIAGEM QUE TODA DRAG PRECISA SABER: Preparar a pele é MUITO importante; Fazer a “quebrância” (é o contorno que as drags fazem para suavizar e destacar partes do rosto); Batom vermelho: para os lábios e para neutralizar o cinza da barba. (Um jeito fácil e barato de neutralizar a sombra que fica na pele após fazer a barba); Lápis marrom (melhor amigo de toda drag. Com o lápis, é possivel marcar o formato das sobrancelhas, o contorno do nariz e da boca; Sombra preta ou marrom (ideal para marcar o côncavo); Para finalizar, o pó translúcido faz toda a diferença. RE D E M O IN H O | 3 9


No entanto, dedicar-se à carreira 24 horas é diferente de interpretar uma drag o dia todo. “Se eu vivesse 24 horas por dia como uma figura feminina, eu seria uma transexual, o que no caso não sou. Drag é uma personagem, eu me monto para trabalho”, explica Lushonda. Presidente da parada LGBT da cidade de Samambaia e residente da Victoria Haus, Lushonda afirma que é muito caro ser drag devido aos gastos com o figurino e, principalmente, perucas. “Uma peruca custa R$

profissão revela uma busca por algo que não significa somente obter renda, mas também uma expressão artística”, declara. Silvia também destaca que atualmente o Brasil está mais aberto para as formas de expressão ligadas ao movimento LGBT. No entanto, a antropóloga considera a mídia ultraconservadora. “A abertura se dá dentro de um limite permitido, e ocorre por força do movimento social e também da curiosidade por outras formas de viver, avalia ela. Além da representatividade que as “As pessoas julgam e pensam drags iniciantes tem que sou travesti. na música e programas de TV. Há Não sabem que é trabalho. também sites, blogs e Ser drag é arte e arte é profissão” cursos que oferecem oficinas e consultoLuiz Guilherme, a drag Lushonda rias sobre a arte drag queen. O Pop up Drag, 300, R$ 400. Fazer um figurino não sai por conta do Instagram sem fins lucrativos, menos de R$ 300”. Ativista do movimento foi criado em 2017 para oferecer cursos LGBT, Lushonda busca fazer da arte drag e treinamentos de maquiagem, cabelo queen uma ferramenta para combater o e performances. preconceito. “Quero tentar deixar o mundo Fundador do portal, André que tantas pessoas deixam preto e branco, Gagliardo diz que grande parte dos rapazes que procuram a página são drags ou mais colorido”, deseja a drag. Para a drag Piper Callazans, o precon- aspirantes que têm em comum o grande ceito e a discriminação da profissão são os sonho de fazer parte daquele mundo. “São principais desafios da carreira. “A homo- jovens entre 18 e 25 anos, que vêm prinfobia é um desafio para quem busca essa cipalmente de Ceilândia e Samambaia”. profissão. Todo esse ódio tenta fazer você Muitos, sem recursos. Outro suporte desistir, mas é tudo questão de continuar que as drags, iniciantes e veteranas, de lutando”, considera Piper. Brasília possuem é o site Distrito Drag, A doutora em antropologia pela projeto que tem como uma das fundadoUniversidade de Brasília Silvia Guima- ras Ruth Venceremos, o pedagogo Erivan rães afirma que a profissão drag queen Hilário, 33. O site nasceu com cunho vai além da simples força de trabalho e cultural, político e social, devido ao fato refere-se a um movimento social, político de a cultura drag ser parte fundamental e artístico que questiona categorias de da comunidade LGBT. “Acredito na arte gênero hegemônicas, especialmente por drag como dimensão humanizadora e meio da arte. Aliar a identidade com a transformadora do mundo”, declara.  40 | REDEMOI NHO

GLOSSÁRIO DO MUNDO LGBT+ Transexual: Segundo a OMS, o transexualismo é “um desejo de viver e ser aceito enquanto pessoa do sexo oposto”. É a pessoa que, por se sentir pertencente ao outro gênero, pode manifestar o desejo de fazer uma intervenção cirúrgica no corpo para mudar de sexo. Travesti: É uma pessoa que não se identifica com o gênero biológico que nasceu e se veste e comporta-se como o sexo oposto. Ainda que modifique o corpo com ajuda de hormônios, implantes de silicone e cirurgia plásticas, não sente desconforto com a genitália que nasceu e, de maneira geral, não tem a necessidade de fazer a cirurgia de redesignação sexual. Crossdresser: Significa vestir-se cruzado, ou seja, com roupas do gênero oposto. É alguém que gosta de usar ocasionalmente roupas características do gênero oposto, geralmente em ocasiões específicas. Drag queen: São homens, não necessariamente gays, que se vestem como mulher com roupas e maquiagem extravagantes para realizar performances artísticas, geralmente em festas e casas noturnas. Atualmente, existem algumas mulheres se arriscando na carreira drag queen também. Drag king: São mulheres, não necessariamente gays, que se vestem com estereótipos de gênero masculino para realizar performances artísticas, geralmente em festas e casas noturnas. A cantora Lady Gaga já realizou performances como o drag king, Jo Calderone.


Pedro Paulo sempre admirou a carreira, mas só sentiu vontade de se montar depois que assistiu o reality RuPaul’s drag race

DICIONÁRIO DRAG Acuendar: O ato de esconder o pênis de forma que não fique aparente nas roupas. Bate cabelo: Dança criada por drags brasileiras em que movimentos rápidos são feitos com a cabeça. Babado: Fofoca Boy magia: Homem bonito Diva: Musas inspiradoras. Na grande maioria das vezes é a Beyoncé Death Drop: Movimento performático que consiste em se jogar no chão, de costas com uma das pernas dobrada e a outra esticada.

Muito usado no final das apresentações. Fishy: drag que visa ficar o mais parecida possível com o estereótipo feminino. Gongar: Criticar. Hino: Música com grande significado emocional para a drag. Lacre e tombamento: Atitude poderosa ou quando alguém vai muito bem em alguma atividade. Lace: Tipo de peruca com rede para dar ilusão de que o cabelo falso realmente sai da cabeça. Picumã: peruca. Pirelli: pedaços de espuma colocados para imitar o formato do corpo feminino.

Polida: Adjetivo usado para descrever uma performance bem executada ou figurino e maquiagem impecáveis. Mãe drag: É comum que as drags que estão começando escolham alguém mais experiente como mentora. Montação: Processo que consiste em maquiagem, peruca e figurino para assumir a persona drag. Neca: pênis. Shade: Comentário negativo sobre alguém de forma discreta e/ou sarcástica. Queen: abreviação de drag queen. RE D E M O IN H O | 4 1


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C OMPORTAMENTO

Nada de excessos Com o lema menos é mais, movimento minimalista atinge cada vez mais pessoas com a proposta de reduzir o consumo e garantir uma vida mais sustentável

por: Rodrigo Albuquerque

Comportamento que vai contra o fluxo de consumo do século 21, o minimalismo faz as pessoas repensarem sobre a falta de controle e o acúmulo exagerado na hora de comprar ou adquirir algo. A tendência busca valorizar as relações entre o indivíduo e os diferentes tipos de materiais com os quais se relaciona, na busca de fundamentar um estilo de vida em que menos consumo leva a uma vida com mais valor ao essencial, ou seja, menos é mais. A ordem é eliminar qualquer tipo de excesso, seja na alimentação, no vestuário, na arquitetura, na arte ou em qualquer outra área da vida. “Fiquei mais livre quando descobri o minimalismo. Foi como me livrar de um peso, no caso, coisas que só mantinha porque me

falavam ‘guarda que um dia você vai precisar’”, avalia a analista de mídias sociais Luana Marcelino, 21 anos, que há três aderiu ao movimento. As origens do minimalismo não estão diretamente ligadas ao comportamento, mas sim à arte. O antropólogo Cláudio Bull explica que o movimento surgiu nos anos 60, nos Estados Unidos. Os artistas começaram a utilizar uma lógica que vinha do construtivismo russo e começam a trabalhar com o mínimo de elementos que pudessem representar uma forma, como materiais industriais e repetitivos. Eles diziam que a proposta não era fazer esculturas, mas estruturas. “Os grandes trabalhos dos minimalistas vinham em esculturas que seriam RE D E M O IN H O | 4 3


Peças com valor sentimental se destacam em um mundo afetado pelo consumo exagerado

muito econômicas em termos de materiais e não valorizavam a capacidade emocional do artista”, conta. Bull lembra que o termo acabou absorvido e reestruturado pelos meios de comunicação de massa. A partir daí, passou a ser aplicado em vários contextos, como o de uma arquitetura racionalista e simplificada ou elementos da moda. “Qual o contraponto do minimalismo? É o maximalismo. Então a palavra vai se tornando um sinônimo de um comportamento seletivo, de se viver com pouco elementos”, observa. A contraposição de ideias surgiu com o arquiteto funcionalista Ludwig Mies van der Rohe, autor da frase menos é mais. “A palavra minimalismo cabe em várias necessidades que a imprensa tinha para definir um determinado comportamento”, avalia o antropólogo. Os hábitos comportamento de Luana foram adquiridos ainda na infância. Ela conta que a casa dela era marcada por acumuladores. “Por incrível 44 | REDEMOI NHO

que pareça, isso era considerado algo completamente normal e aceitável”, diz. Ao morar no exterior, conheceu um livro da consultora e organizadora japonesa Marie Kondo, no qual a autora explica como se livrar de coisas não

A partir da experiência, começou a pesquisar mais sobre o consumo consciente e percebeu que era novidade no Brasil. Não apenas no sentido de comprar o que realmente é preciso, mas também de pesquisar marcas que respeitem os funcionários, sejam sustentáveis e não “Mas, assim como qualquer testem ou utilizem matérias de origem desconstrução social, animal. “Doei e vendi leva tempo para mais coisas do que eu possuo hoje. Mas percebermos como o assim como qualquer modo de vida capitalista está desconstrução social, leva tempo para enraizado em nós” percebermos como o modo de vida capiLuana Marcelino, analista de mídias sociais talista está enraizado em nós”, conta. A necessárias, uma espécie de caminho analista de mídias sociais lembra que para se viver de forma mais simples se livrar do consumo excessivo a fez e feliz. “Quando voltei para o Brasil perceber o que é realmente essencial coloquei tudo do livro em prática e a para viver. “Te faz ver outras prioridiferença que senti foi incrível”, revela. dades na vida, que não são comprar o


Redução no uso de mídias sociais e outras atividades tecnológicas fazem parte da rotina

novo modelo de tênis. Te faz poupar bastante também e ter um maior controle sobre seus impulsos”, conta. Para a criadora do blog Minimalizo, Fernanda Marinho, 39, os estímulos de consumo chegam por todos os lados e provocam uma frustração eterna. “É propaganda para tudo quanto é lado, é notícia te dando dicas

para conseguir tal e tal coisa”, diz. Ela sente que as pessoas sempre precisam de mais, estão atrasadas e sentem falta de algo. “Compramos milhões de coisas e temos que trabalhar milhões de horas para pagar por essas coisas”, comenta. O início da mudança para ela veio há seis anos. “Essa escolha de focar no que realmente importa,

abrindo mão do que é bobagem, mudou profundamente a minha vida”, admite. Começou, então, a consumir menos e acumular menos. Consequentemente, passou a gastar menos e a precisar de menos espaço para guardar tudo. “Gasto também menos tempo lavando, guardando, organizando e cuidando desses objetos. Assim, começou a sobrar mais dinheiro e mais tempo. E tem coisa melhor do que isso? Conquistei liberdade”, declara. A estudante de artes cênicas Paula Tolêdo, 23, conheceu o minimalismo por meio de reportagens falando sobre o estilo de vida sustentável e a ideia difundida por Van der Rohe. “Eu decidi viver em relação às roupas com o mínimo possível. Ao invés de comprar as que não duram, prefiro roupas de qualidade e essenciais”, destaca. Hoje, tem três sapatos, duas blusas de frio, duas regatas pretas, uma calça jeans e duas calças leggings. “Em casa, eu tento ter sempre o mínimo possível, até para não me causar problemas em relação ao espaço, fora que realmente a sensação de limpeza é maior”, afirma.

Foto de divulgação/Netflix

‘UM DOCUMENTÁRIO SOBRE COISAS IMPORTANTES’ Lançado em 2016, “Minimalism: A Documentary About the Important Things” é um documentário com direção do youtuber Matt D’Avella, que trata de diferentes tipos do movimento. O filme apresenta pessoas que têm um estilo de vida voltado para o “menos é mais”, seja no espaço que convivem ou como educam os filhos. Entretanto, o real enfoque está na carreira e vida de Fields Millburn e Ryan Nicodemus, criadores site The Minimalists. O espectador acaba por vivenciar e compreender as dificuldades e pensamentos que levaram tanto Fields quanto Ryan a optarem por esse estilo de vida. RE D E M O IN H O | 4 5


Qualidade acima de quantidade é o mantra do grupo que prega o menos é mais

Movimento digital

O desenvolvedor web Mateus Figueiredo, 27, começou a se questionar sobre o estilo de vida que tinha quando percebeu o grande volume de livros, artigos e cursos que somava. Passou a estudar a ideia de nômade digital e, assim, chegou ao filme Minimalism: A Documentary About the Important Things, no Netflix. “Cheguei à questão chave do minimalismo: encontrar o porquê e

o como do seu próprio minimalismo”, diz. Para ele, foi uma forma de reduzir distrações e permitir focar intensamente nas próprias metas. Materialmente, Mateus usa a regra dos cem itens, não podendo ultrapassar esse número de objetos. “Desses cem, menos de 20 são minhas roupas, contando por unidade, mesmo as que possuo repetidas. Os 80 itens restantes cabem dentro de minha mochila e minha mala de mão”, afirma.

“Adotei a regra dos cem itens: menos de 20 são minhas roupas, contando por unidade, mesmo as que possuo repetidas” Mateus Figueiredo, desenvolvedor web

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PADRÕES REPETIDOS Tanto o minimalismo quanto o acúmulo podem ter efeitos negativos na vida de uma pessoa, se praticados de forma excessiva. A psicóloga Keila Brito lembra que todo o comportamento é aprendido a partir de algumas situações históricas da vida do indivíduo, necessariamente não existe uma regra para o surgimento, mas processos. “A partir do momento que o indivíduo passa por sofrimento, ele deixa de ter autocontrole dos comportamentos”, diz. Outro fator é quando o indivíduo perde a sensibilidade do que está acontecendo na própria vida e passa a repetir um padrão comportamental. “Ele não reconhece esse sofrimento e deixa de ter controle sobre acúmulo e o bem-estar. Todo acumulador tem um padrão”, finaliza.


Além do vestuário

A blogueira e uma das criadoras do coletivo de moda BSB no cabide, Elis Uchôa, vê na moda minimalista uma das soluções para minimizar o impacto ambiental, por se tratar de um design mais versátil e duradouro. Ela também fez essa escolha para produzir algo que fugisse da moda atual, que, na avaliação dela, polui muito e não paga corretamente os trabalhadores que participam de todo o processo de produção. “Muitos estão preocupados em vender e influenciar os consumidores a comprar cada vez mais. Nosso movimento é o contrário disso, queremos trabalhar com a moda atemporal”, diz. Elis trabalha com roupas para as pessoas usarem em várias ocasiões, sem precisar estar sempre adquirindo novas peças. Ela estuda desde a escolha do tecido até quem costura as peças, para ter um conhecimento de todo o processo. “O minimalismo não nos impede de ter roupas que fujam do mais básico, mas tudo sem exageros e que casem com o meu estilo e guarda-roupa”, afirma. O consumo consciente provoca bem-estar. “Sinto que o meu dinheiro é bem gasto. Me sinto bem mais leve e segura”, conta.

Em conjunto com Elis, a criadora do Bsb Cabide, Amandla Gandhi, 24, vê as promoções das lojas como algo que influencia um consumo leviano da moda. Ela percebe a sensação do consumidor em querer aproveitar mais do desconto do que pensar no que compra, o que leva a um consumo descartável de roupas. “Temos que desacelerar o nosso modo de consumir moda e a produção da mesma, pois ambos poluem o meio ambiente de diversas maneiras e produzem mais lixo”, diz. Por mais que tenha uma consciência ativa na hora de consumir, Amandla ainda não se considera minimalista pelo fato de não aplicar o comportamento além da moda, em outros aspectos da vida. Mas ela vê a diferença em ter o pensamento aplicado no próprio consumo. “Não caio mais nessa de: Pode ser que um dia eu use”, afirma. 

MINIMALISMO NA PRÁTICA Formada em cinema e mídias sociais pelo Instituto Iesb de Brasília, Gabriela Brasil apresenta no Youtube a série Minimalismo na prática, que busca mostrar a ideia para o público brasileiro. “Minimalismo é sobre encontrar o mais importante e abrir espaço para isso no seu dia a dia”, afirma. A série começou quando decidiu seguir um rumo diferente na vida. Ao praticar o estilo de vida minimalista por dois anos, conseguiu diminuir o tempo gasto em atividades desnecessárias e objetos que não sentia valor. Foi um pulo para trabalhar com consultoria de organização e produtividade, assim como ter uma vida mais simples. Atualmente, tenta compartilhar desse conhecimento por meio de consultorias que visam a criação de um ambiente e uma vida mais tranquila para o dia a dia das pessoas. No site gabrielabrasil.com, internautas podem ter acesso a mais conteudos relacionados com o tema. Arquivo Pessoal

A conduta adotada no mundo físico foi levada para o virtual. “Deletei todas as redes sociais. Possuo apenas um e-mail e sou extremamente conservador quando olho e respondo o assunto”, revela. O comportamento lhe trouxe menor custo de vida, facilidade de mudança e maior capacidade de analisar racionalmente o valor das coisas. “É como parar de comer doce, você sente coisas estranhas no início, mas depois passa e você percebe que não precisa comer doce”, afirma.

Gabriela é consultora de produtividade, adepta do minimalismo e autora de vídeos sobre o tema na vida RE D E M O IN H O | 4 7


Uma das galerias do Conic, marca arquitetĂ´nica do local


PATRIMÔNIO

Champs–Elysées brasiliense Edifício de 18 condomínios com administrações independentes, Conic foi inaugurado em 1967

por: Matheus Costa

Ali bem ao lado da Rodoviária de Brasília, local pelo qual circulam diariamente 700 mil pessoas, segundo dados do Transporte Urbano do Distrito Federal (DFTrans), está o Conic. O edifício de 18 condomínios com administrações independentes é uma verdadeira torre de babel na forma de centro comercial. A pluralidade de serviços inclui todas as tribos e tipos, de lojas de camisetas a consultórios médicos, de estúdios de tatuagem a igrejas e faculdade. O novo e o antigo convivem democraticamente. “É um lugar histórico e por isso deve ser respeitado. Ali eu lembro de conhecer José Saramago, e Oscar Niemeyer lançou um livro e deu autógrafos”, comenta o professor emérito da faculdade de arquitetura da UnB José Carlos Coutinho, 83 anos, também ex-diretor de Gestão do

Patrimônio Histórico da Secretaria de Cultura do Governo do Distrito Federal. O Setor de Diversões Sul, nome oficial do espaço, foi inaugurado em 1967, menos de uma década após Brasília. A forma como é conhecido, no entanto, Conic, é referência a uma das empresas responsáveis pela construção de parte dos prédios, a Companhia Nacional de Industria e Comércio. A empreitada foi liderada pelo cearense Antônio Venâncio da Silva, empresário conhecido por construir diversos prédios comerciais na capital. “O grande empreendedor imobiliário ali era o Venâncio, o mesmo que fez o Venâncio 2000 e o 3000”, lembra Coutinho. O Conic foi o Venâncio IV. Cada um dos blocos construídos ganhou uma estética própria, mas com uma fundação RE D E M O IN H O | 4 9


Cinemas, teatros, galerias, amplas calçadas e cafés deveriam predominar na plataforma superior da rodoviária em um “espaço adequado ao convívio e à expansão”. “Ele imaginava que chegariam as pessoas pela rodoviária, subiriam para a parte superior da plataforma e ali encontrariam todo o tipo de diversão e ocupação noturna“, revela Coutinho. Parte da diretriz foi cumprida inicialmente. O local já foi marcado pela sofisticação e a importância histórica é reconhecida ainda hoje. Os primeiros cinemas da capital do país foram construídos lá. “Havia uns cinco cinemas em Brasília, entre os quais o maior deles na época era o Cine-Atlântida“, recorda-se o professor de arquitetura. O Atlântida tinha capacidade para 1.200 pessoas. Hoje, abriga uma igreja. Já a extinta Casa do Livro era ponto de encontro e oferecia os melhores títulos. “Por ser a melhor livraria, ali se encontravam pessoas da mais alta estatura intelectual”, completa. A partir da década de 80, as coisas mudaram e o Conic reorientou sua vocação. Com a inauguração de outros pontos de diversão na capital, passou a ser um Diversidade arquitetônica dos 18 condomínios caracteriza fachada lugar de luta política, mas também de prostituição. Proprietário da loja Berlim em comum. Até mesmo o composiOriginalmente, porém, a preten- Discos e há 30 anos no local, o comertor Billy Blanco, que era formado em são era outra. No Relatório do Plano ciante Reinaldo Antonio Ribeiro, 63, arquitetura, chegou a ser responsável Piloto, Lúcio Costa apresentou o Setor lembra que o Conic chegou a ser chamado pela construção de um dos blocos. de Diversões Sul como uma espécie de boca do lixo. “Era um lugar estigmatiPara alguns, o complexo é um verda- de Champs–Elysées e Times Square. zado, um local de boates, de prostituição e deiro “frankenstein arquitetônico”. mais uma série de coisas. Hoje em dia é um centro Em artigo sobre o espaço, o sociólogo No Relatório do Plano Piloto, de compras frequentado Brasilmar Nunes, que foi professor de Lúcio Costa apresentou o por todas as tribos jovens sociologia da UnB, opina que a plurado DF’’, conta. lidade de públicos e a diversidade de Setor de Diversões Sul como A necessidade de espaços estão diretamente relacionadas. Na avaliação dele, sociabilidades revitalização é destacada uma espécie de pela vendedora de uma heterogêneas se articulam com espaços Champs–Elysées e Times Square das óticas, Ieda Braga, 52. construídos desta forma. 50 | REDEMOI NHO


Coutinho observa as mudanças do Conic ao longo de 50 anos

“São mais de dez edifícios, mas talvez uns oito cuidem bem dos prédios, os outros não”, comenta. A artista plástica Amanda Soares, 20, concorda. “Infelizmente, a atenção para esse lugar é pouca. Mesmo tendo atividades de teatro, de artes plásticas no fim de semana, as pessoas não vêm porque acham o Conic um lugar marginalizado”, lamenta. Também nos anos 80, o sindicalista Gilson Josias de Aguiar, 61, passou a trabalhar no Conic, no Sindicato dos Trabalhadores de Escolas Públicas. ‘’Aqui sempre teve gente trabalhando de tudo. Tem escritório de tudo, por exemplo, sindicatos, a maioria dos sindicatos hoje está no Conic... escritórios de advocacia, contabilidades, clínicas…’’, enumera Gilson. Para o sindicalista, a preferência está ligada à localização conveniente, ao lado da rodoviária, que torna fácil o acesso. Assim como as representações sindicais, fundações e ONGs também buscaram maior proximidade com o público. A bibliotecária e biblioteconomista Thalyta Jubé, 29, coordenadora da biblioteca Salomão Malina, que é ligada à Fundação Astrojildo Pereira, diz que a biblioteca surgiu a partir do falecimento do militante do Partido Popular Socialista Salvador Malina, que doou o acervo dele para a fundação. “Surgiu a ideia de fazer

uma biblioteca especializada em Ciências Sociais, voltada para a esquerda, marxismo, leninismo, e é essa a linha que a gente segue. Mas o espaço é público, porque é aberto ao público. Qualquer um pode vir aqui ”, conta Thalyta. A realidade cultural do Conic está presente também em um dos teatros mais antigos de Brasília. O Dulcina de Moraes, que fica na faculdade homônima. O professor Carlos Ferreira da Silva trabalha na faculdade há 30 anos. Ele declara que a diversidade é fundamental para a formação dos alunos. “Acho que é por isso mesmo que a Dulcina de Moraes escolheu este lugar para instituir a faculdade, exatamente neste lugar múltiplo que se chama Setor de Diversões Sul”. A história do músico Wilson Andrade, 47, também passa pela Dulcina. “Eu lembro na década de 90, era muito ativo. Eu cheguei a fazer dois cursos lá que eram abertos para o público”,

“É um lugar histórico e por isso deve ser respeitado. Ali eu lembro de conhecer José Saramago” José Carlos Coutinho, arquiteto Plataforma que liga a Rodoviária do Plano Piloto ao Conic RE D E M O IN H O | 5 1


Vista superior e interna do prédio permite observar galerias e blocos em suas diversidades

lembra. Fora os cursos, o músico participou e organizou uma série de espetáculos no teatro e hoje lamenta o descaso e a falta de investimentos em um espaço que lhe traz tantas memórias. “‘O sistema de áudio praticamente não existe mais. É o velho problema de Brasília: falta de manutenção”, declara. Para artistas dos mais variados tipos, como artesãos, grafiteiros, músicos e poetas, o Conic é um ponto de encontro. Amanda expõe a importância do lugar. “Acho que aqui é um ponto que resiste, um lugar de solidariedade e que pessoas que querem viver de arte se encontram para fazer”, opina. Mas a artista se aflige pelo Conic já ter tido tantos teatros e cinemas fechados. Ela teme que o teatro Dulcina siga o mesmo caminho. A diversidade do comércio também se apresenta na variedade de lojas de camisas, sapatos e brechós que se concentram no edifício. Vendedor de uma das lojas, Leonardo Martins Ribeiro, 24, diz que o comércio local dá espaço para todos. “Tem espaço para todos os lojistas, a gente conversa bastante, a gente reclama da obra em conjunto e os vendedores todos se conhecem e somos bem amigos”, diz Leandro. Outra tribo que se destaca no Setor de Diversões Sul é a dos skatistas. Gerente há sete anos de uma das lojas mais antigas do ramo, Célio José da Silva, 39, destaca que frequenta o Conic 52 | REDEMOI NHO

como skatista desde 1995. “Além de ficar próximo do lugar onde todo mundo anda, que é o Setor Bancário Norte, é também o lugar que é mais acessível para todos os públicos, para a galera de menor renda e até a galera de alta renda”, esclarece. A movimentação de diversas tribos fazem do Conic um ambiente relevante para a contra-cultura, segundo o tatuador e piercer Gabriel Brito, 27. “O Conic é o Setor de Diversões né, o

Amanda é artista plástica e tem no Conic um de seus espaços de expressão


O ANTIGO CENTRO DOS CINEMAS

nome já diz tudo. Ele agrega muito nessa questão cultural de Brasília da tatuagem, piercing e modificação corporal”, avalia. Outros ambientes que mantêm as portas abertas são as igrejas. Evangélicas e católicas convivem no espaço que reúne mais de dez templos de vertentes variadas. Danilo Souza, 26, é pastor da Igreja Mundial e afirma receber nos cultos muitos fiéis que trabalham por perto, almoçam nas proximidades ou que desembarcam na rodoviária por qualquer outro motivo. “A gente respeita os outros e os outros nos respeitam. Aqui é bom, dá certo”, afirma Danilo. Perto dali está um dos sex shops do Conic. O comerciante Luís Fernando Gonçalves, 42, assumiu há 15 anos uma das lojas, herdada do pai. ‘’Eu acho excelente esse ambiente democrático do Conic. A gente tem um nicho aí para pegar todas as tribos e de todas as formas’’, opina. Para o lojista, os clientes da sex shop a consideram discreta por estar em um lugar tão diverso. “O Conic é o tipo do lugar que é democrático, então qualquer um some no meio da multidão”, explica.

Arquivo Público do Distrito Federal (ArPDF)

Célio trabalha em uma loja de skate há dez anos

O Cine Atlântida, o Cine Ritz e Cine Venâncio Jr. são alguns dos exemplos de espaços que hoje só existem na memória de candangos mais velhos. Muito antes dos serviços de streaming de videos e antes mesmo de cada shopping ter o seu cinema, o Conic era o ambiente de Brasilia para assistir um bom filme ou uma peça. Ao todo, houve seis estabelecimentos diferente de cinemas, segundo registro da Faculdade de Arquitetura da UnB. “Era um local de frequência de bom nível, diversificado, mas com uma frequência de pessoas que exigiam um bom livro, um bom café e um bom cinema”, recorda-se José Coutinho.

O sindicalista Gilson de Aguiar guarda memórias similares. “Hoje, a parte cultural, realmente está devagar, até porque a principal parte eram os cinemas, e acabou”, revela Gilson. Em 1995, o Cine Atlântida, que tinha a maior sala de Brasilia, com 1.500 lugares, foi vendido para a Igreja Universal. O professor Brasilmar Nunes registrou essa mudança do espaço em seu artigo sobre o Conic. O que aconteceu foi que esses cinemas deixaram de ter frequentadores quando os shoppings abriram suas salas. E, apesar dessas salas serem tombadas pelo Iphan, as igrejas conseguiram comprar os espaços com o argumento legal de que templos também são espaços de divertimento, o que não altera o propósito original das construções.

Fotografia aérea do centro de Brasilia em 1970, com alguns dos edifícios do Conic já construídos RE D E M O IN H O | 5 3


Educação a distância: vantagens e desafios 54 | REDEMOI NHO


E DUCAÇÃO

Ensino no ambiente digital proporciona acesso à graduação, além de ser alvo de procura de quem busca especialização

por: Mayara Oliveira

Quando terminou o ensino médio reduzir à distância. “Não existem fronem 2015, Aline Barbosa sonhava cursar teiras. A modalidade traz o que há de veterinária. Sem dinheiro, adiou a entrada mais moderno na tecnologia de educana primeira graduação, com a esperança ção e informação. Tudo que é presencial de que a situação melhoraria em pouco pode ser feito à distância”, comenta. tempo. No início de 2018, já com 19 anos e sem perspectiva de finalmente entrar na Perfil do aluno faculdade que queria, optou por um curso De acordo com dados do MEC de EaD (educação a distância) para estudar 2017, as mulheres são 77% dos biomedicina. “Veterinária é um curso estudantes de EaD. Os solteiros muito caro e difícil de ingressar em uma representam 76,6% dos concluintes faculdade pública. Achei melhor manter dos cursos presenciais, modalidade os pés no chão e fazer o que está dentro de ensino que também concentra 46,7% dos alunos com idade entre 16 da minha realidade”, conta ela. A educação a distância surgiu com e 24 anos. Quase 80% dos alunos de a promessa de dar oportunidade de EaD trabalham, porcentagem que é de estudo aos que não conseguem cumprir 57,7% nos cursos presenciais. a jornada de aula presencial, na maioria Para o atual ministro da Educadas vezes por trabalharem nesse período, ção, Rossieli Soares, o perfil de um morarem em locais em que não há univer- estudante EaD é de alguém que busca sidades ou mesmo por algum problema especialização. “É aquela pessoa que de saúde. Além da flexibilidade de horá- está mais estabilizada, trabalhando rio, os cursos costumam ser mais baratos, e que quer continuar crescendo na já que não contam com a presença física carreira”, afirma. do professor. Ainda é possível concluir A estudante Ana Rafaela Moura uma faculdade ou pós-graduação em concluiu o curso presencial de admitempo reduzido. Para muitos, o EaD é nistração em uma instituição privada. considerado uma das revoluções da educação. “Não existem fronteiras. De acordo com dados do Censo da A modalidade (EaD) traz o que há Educação Superior de de mais moderno na tecnologia 2017, divulgado pelo de educação e informação” Ministério da Educação (MEC), o número André Lacerda, professor do IESB de alunos matriculados aumentou 3% em relação ao ano anterior. O crescimento ocorreu na Hoje, com 28 anos, para poupar tempo modalidade à distância. Com a expansão, e conciliar com a rotina de trabalho, o EaD já representa 21,2% do total de resolveu fazer a segunda graduação alunos e, em 2007, era apenas 7%. por EaD. “Avaliei como a mais vantaPara André Lacerda, coordenador josa para conseguir conciliar toda a de docentes do EaD do Centro Univer- minha rotina de trabalho, estudo e sitário IESB, a proposta é, basicamente, vida social”, explica. RE D E M O IN H O | 5 5


A estudante cursa pedagogia na modalidade 100% EaD e se sente confortável com o que é proposto. Mas, apesar das vantagens de preço, flexibilidade de horário e comodidade, ela diz sentir falta da interação presencial com outros alunos. Por outro lado, na opinião dela, o curso agrega bastante ao seu atual trabalho como pedagoga em uma escola infantil. “A teoria eu aprendo online, à distância, e a prática eu posso viver no meu trabalho, com as crianças”, ressalta. Quando adolescente, a auxiliar administrativa Miriam do Socorro Alves, 57, não conseguiu entrar na Universidade Federal do Pará para o curso de medicina. Grávida, aos 25 anos, se mudou para Brasília e não pensava mais em estudar. Foi no segundo semestre do ano passado que decidiu cursar design de interiores também na modalidade 100% EaD. Miriam optou pela modalidade EaD por não ter mais condições físicas de ir presencialmente para a faculdade

COMO SURGIU O EAD? Estudos revelam que pouco antes de 1900 já havia anúncios em jornais a respeito de cursos de datilografia (para usar máquinas de escrever) oferecidos por professores particulares. Formalmente, em 1904 é que as escolas de Ensino a Distância foram oficialmente instaladas como solução para que pessoas que viviam distantes de instituições físicas pudessem aprender. Surgiram, além de cursos nos Estados Unidos, iniciativas em países localizados na Europa, África, Ásia, Oceania e, mais tarde, na América do Sul.

Na década de 1920, o Brasil já contava com os primeiros cursos transmitidos pelas ondas do rádio, a novidade tecnológica da época. Os estudantes utilizavam material impresso para aprender Português, Francês e temas relacionados à radiodifusão.

No começo, os cursos EaD eram voltados para aperfeiçoamento profissional ou ofereciam conteúdo complementar da formação universitária. Com o passar do tempo, foi se tornando possível fazer até uma graduação completa a distância.

Em meados da década de 1990, as instituições passaram a utilizar a internet para publicar conteúdos e promover interações. Foi nesse período que várias universidades formalizaram suas iniciativas EaD, até a criação da Secretaria de Educação a Distância (SEED), do Ministério da Educação (MEC), em 1996. Naquele mesmo ano, o EaD no Brasil passou a contar com uma legislação abrangente que hoje garante, por exemplo, a validade de diplomas emitidos pelos cursos nesta modalidade.

No Brasil, o EaD surgiu com cursos de qualificação profissional. O registro mais antigo é de 1904, com um anúncio nos classificados do Jornal do Brasil de um curso de datilografia por correspondência. 56 | REDEMOI NHO

No final da década de 1970 , começou em Brasília a primeira experiência de EaD nos cursos superiores. Nesse período, muitos brasileiros já acompanhavam os telecursos, transmitidos pela TV, acompanhado do material impresso e o rádio.

Fonte: Ministério da Educação (MEC)


“Trabalho o dia inteiro e, devido a minha idade e aos meus problemas de saúde, não tenho mais condições físicas de ir presencialmente para a faculdade”. Miriam conta que a escolha do curso, apesar de não se relacionar com o seu atual trabalho, foi feita de acordo a paixão por decoração. “Quando eu era adolescente, perdi minha mãe para o câncer e queria cuidar dos outros, mas, depois de adulta, fui descobrindo afeições por outras áreas”, explica. Renato Dutra, diretor de educação a distância do Centro Universitário IESB, diz que, na modalidade

EaD, as instituições que trabalham com a dinâmica a distância têm um papel fundamental para fazer com que o protagonismo do aluno seja um sucesso. “A instituição tem o papel de oferecer recursos para o aluno desenvolver suas habilidades em determinada situação. A partir disso, ele cria sua rotina de disposição e comprometimento”, opina. Apesar das vantagens, João Carlos da Silva, 59, não se adaptou à modalidade a distância. Hoje, formado em Teologia por uma instituição privada, ele justifica a mudança para o ensino presencial devido

“Era como se a interação no ambiente digital fosse limitada, assim como o meu conhecimento” João Carlos da Silva, teólogo

à falta de interação na plataforma digital. “Comecei o ensino a distância pelas inúmeras vantagens, como flexibilidade e preço da mensalidade, mas senti falta da troca de ideias entre alunos e docentes no ambiente físico. Era como se a interação no ambiente digital fosse limitada, assim como o meu conhecimento”, argumenta. Para a pedagoga Patrícia Cabral, o aluno de um curso presencial, além de criar uma relação de proximidade com os professores, também tem a oportunidade de desenvolver relações com colegas de aula que podem influenciar no futuro

VANTAGENS E DESVANTAGENS VANTAGENS - Desenvolve a autonomia do aluno - Preços mais baixos - Flexibilidade: o aluno pode estudar quando e onde quiser - Não é preciso se deslocar para participar das aulas - Respeita o ritmo de aprendizado de cada aluno - Sem barreiras geográficas DESVANTAGENS - Falta de interação social - Pouca cobrança direta dos professores e colegas - Impossibilidade de compartilhar a responsabilidade com colegas - Menos cursos disponíveis - Discussões online focam no conteúdo e dificilmente alcançam questões do cotidiano do aluno - Menos dinamismo

João Carlos da Silva, 59, não se adaptou à modalidade a distância e se formou em Teologia presencialmente

Fonte: Patrícia Cabral, pedagoga RE D E M O IN H O | 5 7


profissional. “A troca de conhecimen- EaD caminha junto com a tecnologia a cumprir prazos, a ler mais, desenvoltos que vem da interação, de discussões da informação e isso é essencial. Ela vendo sua própria autonomia. Isso tudo em sala de aula e do planejamento de está presente em todos os momentos acaba sendo de interesse de uma empresa trabalhos ajuda o aluno a desenvolver um da nossa vida, o que me proporciona contratante, por exemplo”, conclui. senso crítico e abrir a mente para novas acessar uma aula a partir do meu De acordo com a presidente do smarthphone em qualquer hora e em Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas ideias”, observa. Patrícia ainda diz Educacionais Anísio Teixeira (Inep), Maria Inês Fini, a que tanto a modaliDe acordo com o Inep, a educação educação a distância está em dade a distância, como a presencial possuem a distância está em crescimento e é constante crescimento e é importante tanto para o profisvantagens e desvantaimportante tanto para o profissional, sional, quanto para o mercado gens. “Para saber qual modalidade escolher, é online. “Nenhuma profissão, quanto para o mercado preciso levar em conta nenhuma atividade, vai durar o estilo de vida do indipara sempre no mundo do víduo, assim como suas necessidades qualquer lugar”, argumenta. Além disso, trabalho (físico). Essa possibilidade de pessoais e perspectivas de futuro. A acredita que o mercado tende a buscar EaD para o trabalhador é muito impordica aqui é conhecer seus sonhos e por mais profissionais formados em tante. A partir de agora, num mundo tão objetivos para o futuro e fazer a escolha graduações a distância por motivos de digital, vamos precisar dessa modalidade que mais possa gerar frutos”, analisa. disciplina. “O EaD acostuma o aluno de ensino”, afirma ela.

Legislação EaD

A educação a distância é regulamentada em todo o território nacional. De acordo com o Ministério da Educação (MEC), as instituições de ensino superior podem ampliar a oferta de cursos superiores de graduação e pós-graduação. Além disso, através da legislação, é possível criar polos de EaD pelas próprias instituições, sem credenciamento prévio para a oferta presencial. Com a regulamentação, as instituições podem oferecer, exclusivamente, cursos a distância, sem a oferta simultânea de cursos presenciais. A estratégia do MEC, segundo o próprio órgão, é ampliar a oferta de ensino superior no país. André Lacerda diz que, antes do avanço tecnológico, o mercado profissional enxergava o ensino a distância de forma negativa, pois as pessoas faziam cursos de baixa qualidade. “Hoje, o 58 | REDEMOI NHO

Aline Barbosa, 19, decidiu cursar biomedicina na modalidade


Qualidade do ensino a distância

Os dados do Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade) 2017, divulgados pelo Ministério da Educação (MEC) em outubro, mostram que, na modalidade presencial, 6,1% dos cursos têm conceito 5. No caso do ensino à distância são 2,4% no patamar mais alto. O ministro da Educação disse que o ensino superior a distância tem se revelado uma possibilidade de inclusão no país, mas que é preciso monitorar a qualidade. “Observamos que temos que acompanhar na questão da qualidade. Tivemos uma concentração no conceito 3, que é razoável, mas também no conceito 2”, alertou. O Enade tem conceitos de 1 a 5, do pior para o melhor desempenho. Apesar da diferença da nota, o ministro ainda argumenta que não se pode comparar as notas dos cursos presenciais e a distância, devido à diferenças de perfil entre os alunos de ambas as modalidades. Rossieli também comenta que a razoável nota da educação a distância no Enade pode ser devido à recente instalação da modalidade no Brasil. “A avaliação do Enade é importante porque nos dá um norte para as políticas públicas do ministério referentes à educação a distância”, completa. O Enade é realizado com base em um ciclo trienal no qual a cada ano uma área diferente é avaliada em universidades públicas e privadas. A prova é composta por 40 questões, sendo uma parte de formação geral, que leva em conta atuação ética, e compõe 25% da prova; e outra de questões específicas relativas ao conteúdo do curso, que representa 75% do exame. A maioria das perguntas é de múltipla escolha e algumas são discursivas. 

MAIS SOBRE A LEGISLAÇÃO EAD Atualmente, existem diversos decretos, portarias e normativas que regulamentam a EaD no Brasil. Elas têm como objetivo fazer com que as instituições sigam essas normas pré-estabelecidas para de que o ensino seja transmitido de maneira formal. Abaixo, é possível observar, um pequeno histórico de alguns dos decretos que regulamentam a educação a distância no Brasil. DECRETO Nº 5.622/2005 Além de regulamentar o art. 80 da Lei nº 9.394 de 20 de dezembro de 1996, o decreto, que possui seis artigos, instituiu orientações gerais para este tipo de ensino, tais como metodologia, avaliação do desempenho do aluno, o credenciamento de instituições, entre outros. DECRETO 5.773/2006 De maio de 2006, o decreto tem por finalidade regulamentar, supervisionar e avaliar as instituições de educação superior e também de cursos sequenciais no sistema federal de ensino. O decreto conta com cinco capítulos que falam sobre a regulamentação e competências que cada entidade deve compor, o credenciamento específico (art.26) das instituições de ensino, fases do processo de credenciamento das instituições tanto como Mantenedora ou como Mantida.

DECRETO 6.303/2007 O Decreto 6.303 foi editado para adequações nos decretos nº 5.622/2005 e 5.773/2006. No primeiro decreto, com o intuito de ajustar o credenciamento junto a SINAES (Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior) incluindo novas regras as unidades de educação com atividade presencial. Já no segundo Decreto, altera o processo de Credenciamento de Campus Fora de Sede onde originalmente, tratava do processo de Credenciamento de Curso ou Campus Fora de Sede, entretanto o decreto de 2007 fez esta alteração em virtude de não existir a prática de credenciamento de cursos. DECRETO Nº 9.057/2017 Publicado em 26 de maio de 2017, tal decreto tem o objetivo de atualizar a legislação que regulamenta a educação à distância no país. Define, ainda, que a oferta de pós-graduação EaD, não necessita de credenciamento específico, ou seja, as instituições que já possuem o credenciamento a distância, estão autorizadas a ofertar essa modalidade. O decreto também regulamenta a oferta de cursos para o ensino médio e para a educação profissional técnica de nível médio. Fonte: Ministério da Educação (MEC)

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M EIO AMBIENTE

A floresta invertida pede socorro Desmatamento do cerrado, bioma que ocupa integralmente o DF, avança rapidamente e pode levar à completa extinção até 2030

por: Andréia Maranha

Com uma vegetação de árvores retorcidas de pequeno porte, cascas grossas e raízes e solos profundos, o bioma Cerrado é o mais desmatado no Brasil. O índice supera em até três vezes o que ocorre na Amazônia, são cerca de cinco mil quilômetros quadrados contra nove mil quilômetros quadrados por ano. A savana mais rica do planeta e que ocupa totalmente o Distrito Federal já é alvo de intervenção humana em 80% da área e 58% dela está totalmente desmatada. De acordo com pesquisas do Programa Cerrado, da CI-Brasil, o bioma corre o risco de desaparecer até 2030. A cada minuto, o equivalente a 2,6 campos de futebol somem, são 9,4

< Pau-terra-roxo, na entrada de Alto Paraíso de Goiás, na Chapada dos Veadeiros

mil quilômetros quadrados por ano. “O desmatamento implica em uma enorme perda de biodiversidade, que é importante como alimento, fonte de polinizadores, inimigos naturais de pragas agrícolas e remédios”, explica o doutor em ecologia Bonesso Sampaio, que também é analista ambiental do ICMBio. O impacto da intervenção humana está também nas nascentes, bacias hidrográficas e, consequentemente, na disponibilidade de água. Conhecido como “caixa d´água do Brasil”, o bioma está perto do limite. “Não tem como fornecer água para tanta gente, especialmente porque já desmataram demais e para criar mais bairros teriam que continuar RE D E M O IN H O | 6 1


desmatando. Com as mudanças climáticas, a chuva está diminuindo”, alerta. O Distrito Federal ocupa o 4º lugar no ranking das unidades da federação que mais perderam vegetação natural do Cerrado, atrás de São Paulo (81%), Mato Grosso do Sul (68%) e Goiás (57%). O engenheiro ambiental Bruno Walter, pesquisador da Embrapa, observa que Brasília é a capital mais alta do país, e a maior parte do DF situa-se acima de mil metros de altitude. “Diferentemente de outros grandes centros do país, como Rio de Janeiro, São Paulo ou Belo Horizonte, a água

Segundo estudos do Inpe, restam apenas 34% das áreas nativas remanescentes do Cerrado aqui não chega por gravidade de maneira barata”. As queimadas agravam a situação, na medida em que a água fica mais profunda, como explica o capitão Antônio Pedro Bastos de Souza, do Grupamento Ambiental. “A maior parte das árvores do Cerrado tem as raízes muito profundas, de 15 a 20 metros”. É por isso que alguns chamam o cerrado de “floresta invertida”, ou seja, a extensão das raízes no solo é muito superior à estrutura verificada na superfície. São elas as responsáveis pela retirada da água diretamente

OS CRIMES Apesar das diversas tentativas de proteger o Cerrado por meio de leis e decretos, o monitoramento ambiental ainda é ineficiente, segundo o capitão Antonio Pedro Diel. Muitas vezes não se consegue conectar a ação e o autor pela ausência de testemunhas. “A vigilância acontece praticamente nas áreas administrativas. Trilhas e afins não têm fiscalização”, admite. Ele cita a Lei de Crimes Ambientais, que prevê pena de dois a quatro anos de reclusão e multa para quem provocar 62 | REDEMOI NHO

queimadas intencionalmente. Essas leis são aplicadas de acordo com os tipos de infrações causadas, como empreendimentos sem a licença ambiental, desmatamento sem autorização, venda ou soltura de balões. Um exemplo é a Operação Shoyo, que aconteceu no início deste ano. O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais (Ibama) multou empresas por produção agropecuária ilegal no Cerrado, totalizando multa de R$ 105,7 milhões.

Na Chapada dos Veadeiros, Fazenda Touro Bravo tem 284 hectares de mata nativa


dos lençóis freáticos. “É como se fosse um poço”, compara Souza. Com pelo menos 3.536 ocorrências, as queimadas, atingem uma área de aproximadamente 2,3 mil hectares por ano, diminuindo a fauna e a flora. Hoje, a diversidade contempla cerca de 13 mil espécies, 40% delas exclusivas do bioma. Levantamento do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade mostra que são mais de 130 espécies ameaçadas de extinção no bioma que ocupa 14 unidades da federação e 24% do território nacional. “O cenário não é nada favorável, ainda mais sob o olhar da sociedade que vê o Cerrado como área destinada à agropecuária”, completa o pesquisador da Embrapa. Segundo a especialista em ecologia vegetal do Cerrado, Alba Evangelista Ramos, a savana originalmente tomava um quarto de vegetação e da biodiversidade de fauna e flora, mas atraiu, principalmente, as iniciativas de agropecuária. Ou seja, a vegetação nativa foi substituída por pastagem com a plantação de grãos, soja, milho e trigo. “A gente já perdeu muito do cerrado por essas práticas e muita gente não considera importante a existência das nascentes que vão verter para as principais bacias”, analisa. Apesar de ser o meio econômico mais promissor do Brasil, é preciso levar em conta que, as principais nascentes, que abastecem as bacias hidrográficas do país, estão no bioma. O analista de Conservação Sênior do Programa Cerrado Pantanal do WWF-Brasil Kolbe Soares afirma que 30% da biodiversidade estão nesta região que, inclusive, serve de conexão com outros quatro biomas brasileiros.

QUEIMADAS Segundo o Ministério do Meio Ambiente, as principais causas de destruição, em apenas dois anos, de uma área equivalente a três vezes o tamanho do Distrito Federal estão nos desmatamentos e queimadas. Estudos mostram que o monitoramento das queimadas é um desafio pela necessidade de diferenciar os incêndios não-espontêneos dos que fazem parte da própria ecologia. O capitão do Agrupamento de Proteção Ambiental (Gpam) Antônio Pedro Diel Bastos de Souza conta que no período de seca recebe, em média, cem chamadas de incêndios florestais por dia. Ele explica que as áreas com prioridades são as unidades de reservas, como das Águas Emendadas, Parque da Cidade e a Reserva Biológica da Contagem, por serem as maiores fontes hídricas da capital federal. Antônio afirma que as maiores queimadas ocorrem em função de incêndios em fazendas e em amontoados de lixos. Ele ressalta que o ponto principal para que isso acabe é a mudança da cultura de queimar terrenos para limpeza e do desenvolvimento de técnicas para o manuseio do fogo. “O grande negócio é a gente mudar essa cultura de colocar fogo nas coisas”. Este tipo de mentalidade já é diferente no Sul do país. “Eles entendem que ganham mais devolvendo essa matéria orgânica para o solo do que fazendo queimada, que é mais simples, mas que depois você acaba gastando mais com a suplementação do solo para nutrir com micro e macronutrientes”, diz.

Capitão Bastos: problema constante das queimadas RE D E M O IN H O | 6 3


Já a especialista em ecologia e biologia da conservação Isabel Belloni ressalta que, além da importância dos rios, as áreas das chapadas são decisivas para a infiltração e produção de água. E justamente aí está o problema. O desmatamento para o agronegócio, os commodities e as indústrias siderúrgicas, com a produção de carvão, comprometem o bioma de forma irreversível. “A gente gasta muita água, muita biodiversidade e ganha pouco dinheiro. Apesar de representar muito na nossa balança comercial, como a gente

exporta praticamente matéria-prima, isso vale muito pouco”, reclama. Alba Ramos explica que o sistema de córregos, rios e bacias com origem no Distrito Federal são estratégicos. Ele parte da região central do rio Paranaíba, que envolve o Descoberto, o Paranoá, São Bartolomeu, Corumbá e São Marcos, que formam o rio Paranaíba, fluindo por Goiás, em direção ao Paraná. Fora ele, na estação de Águas Emendadas, a região tem o rio Córrego Vereda Grande, que contribui para o Rio Maranhão em direção às bacias Araguaia e Tocantins, desaguando na

bacia Amazônica. Já na região Leste do DF, flui o rio Preto, que abastece a grande bacia nacional, São Francisco. Os pesquisadores defendem a criação de novas áreas de preservação. Isabel alerta que projetos urbanos com grandes ampliações de casas e asfaltos impermeabilizam a água, principalmente, se estão em volta de locais de conservação, como na região do Jardim Botânico de Brasília (JJB). “É uma extensão muito grande, que se a gente fragmenta, perde qualidade de vida, perde Cerrado e produção de água para todos nós”, afirma. 

Especialistas afirmam que não é possível dizer a quantidade de espécies que vivem na região, por nem todas serem catalogadas, mas a estimativa é de pelo menos 7 mil plantas nativas e mais de mil espécies animais vertebrados. A vegetação encontrada facilmente são caliandra, lobeira, cagaita e pau-terra roxo. Já as espécies animais comuns são as abelhas, calango, girinos e sapo-estrada. Oficialmente reconhecidos com riscos de extinção estão 119 mamíferos, 837 aves, 180 répteis, 150 anfíbios, 1.200 peixes. No total, 448 Vulneráveis (VU), 406 Em Perigo (EN), 318 Criticamente em Perigo (CR) e 139 Extinta na Natureza (EW). 64 | REDEMOI NHO

Foto: ferjflores

Lobo-Guará

Lobeira

Tamanduá-Bandeira Foto: ana_cotta

O aproveitamento de nutrientes e das riquezas dos recursos hídricos e energéticos destacam o Cerrado e a paisagem diferenciada. De acordo com a classificação da União Internacional para a conservação da Natureza (IUCN), as espécies vegetais que o caracteriza são o pequizeiro, a sucupira, o barbatimão, o pau-santo, a gabiroba, o pau-terra, a catuaba, o índia e o pepalantus. Já as espécies animais são a anta, o gato palheiro, o veado campeiro, o gato maracujá e a jacuda-barriga-castanha.

Foto: anda.jor

FAUNA E FLORA

Gato-Maracajá

Caliandra


EDUCAÇÃO AMBIENTAL O BeijaFAL é um projeto de Extensão da Universidade do curso de Engenharia Florestal da Universidade de Brasília (UnB) que existe desde 2001 e atualmente conta com cem membros. A ideia é levar crianças e adolescentes de escolas públicas e particulares, entre 5 e 18 anos, para a Fazenda Água Limpa, onde percorrem trilhas com métodos diferentes de acordo com a idade. A graduanda Ana Carolina Calvet é integrante do projeto e conta que, no semestre passado, alunos de CED 15 de Ceilândia, do 2º e 3º ano de ensino médio, aprenderam sobre a fauna e a flora do Cerrado, a simbiose, a fotossíntese e a ecologia. “É muito diferente ensinar algo dentro de sala de aula e no meio do mato com exemplos vivos e com pessoas da sua idade, falando na mesma linguagem que você, usando gírias e brincando ao mesmo tempo”, afirma. A estudante comenta que, o contato direto dos jovens com o meio ambiente, acaba trazendo uma visão muito mais crítica sobre a situação atual do cerrado. “É importante que tenhamos esse contato com eles para explicarmos a importância da preservação e da conservação do nosso bioma, que, a cada dia, vem perdendo um pouco mais de espaço”, afirma. QUEM ACENDE TEM QUE PAGAR Lei de crimes ambientais – Pena de 2 a 4 anos de reclusão e multa para quem provocar queimadas intencionalmente. Código Florestal - O uso de fogo em vegetações e proibido, mas em algumas situações agropastoris e permitido, se houver autorização dos órgãos autorização dos órgãos estaduais competentes. Decreto n. 6.514/2008 – Pena de 2 a 4 anos de prisão e multa para quem fazer uso de fogo em áreas agropastoris sem autorização do órgão competente. Código Penal – Pena de 3 a 6 anos e multa para quem causa incêndio, expondo a perigo a vida, a integridade física ou o patrimônio de outra pessoa sem autorização do órgão competente. RE D E M O IN H O | 6 5


GALERIA

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Uma sociedade fraturada As eleições presidenciais de 2018 revelaram as profundas divisões políticas que afetam nossa sociedade. Na era das redes sociais, o diálogo e o debate deram lugar a uma guerra de informação e desinformação. Ao invés de prover os cidadãos com subsídios para que possam tomar decisões fundamentadas e racionais, as tecnologias da comunicação têm servido para estimular a hostilidade e o antagonismo. No ensaio fotográfico Divergência, João Lucas Santana, estudante do 2º semestre de Jornalismo do Iesb, registrou o encontro de apoiadores dos dois candidatos que foram ao 2º turno das eleições presidenciais. O encontro se deu no vão livre do Masp, na Avenida Paulista, espaço tradicional das mais diferentes formas de expressões culturais e políticas da cidade. Frente a frente, os grupos se hostilizam. Cada um deles ostenta os sinais de sua identidade política. Funcionam como discursos silenciosos que tanto exibem a posição política como transmitem uma mensagem. Nessa guerra simbólica, até as tradicionais camisas das seleções de futebol passam a funcionar como discursos, expressando posições políticas contrastantes e divergentes.

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PRESENCIAL E A DISTÂNCIA


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