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‘Gap’ de entendimento Por Luiz Fernando Brandão Entre Helvécia, distrito no extremo-sul da
As centenas de turistas escandina-
Aqui, cabe remeter à questão es-
Bahia — região que concentra um dos
vos que se comovem e mobilizam diante
sencial: nós, os humanos, em nossa tra-
bolsões de miséria do nosso país —, e
de enormes painéis exibindo fotos belís-
jetória sobre a Terra, continuamos longe
Oslo, a impecável capital da Noruega, lo-
simas de caçadores, mulheres e crian-
de superar o desafio de nossa condição
cais que visitei no espaço de apenas 15
ças indígenas amazônicos, nas ruas de
intrínseca, utilitarista quanto aos recursos
dias, existe um fosso profundo. Que não é
Oslo, terão alguma idéia do contexto em
naturais e leviana quanto às consequên-
a imensa desigualdade de riqueza, educa-
que estes nossos povos originais sobre-
cias de nossos atos e escolhas sobre nosso futuro comum. Enquanto essa pulsão
ção, oportunidades e bem-estar social. É um fosso de desconhecimento, um hiato criado pela incapacidade de se
Somos um único povo, habitante
não for domada, disciplinada, pouca esperança restará para as próximas gera-
compreender um outro mundo que co-
e organicamente parte da Terra,
ções. A culpa e o imediatismo continuarão
existe neste mundo de nós todos. Um
e só vencendo nossas diferen-
a prevalecer, mesmo por trás da fachada
gap que os mais bem-intencionados
ças podemos sobreviver
de ajuda humanitária, de altruísmo dos
esforços de educação, comunicação e
muito ricos com relação aos muito pobres.
engajamento, pelo menos no horizonte
Esse quadro só poderá ser superado por
visível hoje, são incapazes de preencher.
vivem em meio a outros 20 milhões de
novas visões de mundo que conciliem os
A elegante senhora que se agacha, com-
conterrâneos de todas as origens — eu-
avanços da ciência e da tecnologia com
pungida e solícita, diante do jovem depen-
ropéias, negras e asiáticas — que habi-
o entendimento de que somos um único
dente químico maltrapilho e mendicante
tam a vasta Amazônia brasileira? Terão
povo, habitante e organicamente parte da
na imaculada Karl Johans Gate, a princi-
eles noção dos desafios de governança
Terra, e que só vencendo nossas diferen-
pal avenida de Oslo, terá idéia das condi-
de um país de dimensões continentais
ças poderemos sobreviver.
ções em que vivem os milhões de miserá-
como o nosso, com quase 200 milhões
É uma pena que a superficialidade
veis que lutam pela sobrevida nos confins
de habitantes e apenas 200 anos de
humana não nos permita usar com pro-
interioranos do norte e nordeste brasileiros
história nacional, num mundo de econo-
priedade a riqueza de informações on-
ou nas periferias de nossas metrópoles?
mias globalizadas?
line que a era da internet nos oferece.