10 • ponto
de vista
JOVENS Demônios d o BE M &quivocados
© Francesa | Dreamstime.com
*Fernanda Lira
Fico pensando o que faz os jovens tão egocêntricos. Será uma narcisismo extremo e egoísta? Será um forte vínculo com a fase pré-natal? Os dois pés enfiados na infância? O fato é que eles estão chatos, pelo menos para os adultos. E especialmente para o mercado de trabalho. Nada mais chato que um recém formado, que muitas vezes nem cursou uma boa escola, apresentar-se entregando um cartão de visitas. Nada de currículo (que ele não tem, exceto sobre seu perfil acadêmico). Ele se apresenta como um vencedor. Um empresário do setor que corresponde à sua graduação. Chega a ser patético. Afinal, ele fez uma curso. Estudou, mas não exerceu aquela atividade. De onde tira know how para atuar em pé de igualdade com quem está ali, há tempo, com experiência comprovada? Ok, há sim jovens empresários que saem-se muito bem organizando-se em suas próprias empresas. Mas todos fizeram bons estágios. Os que não fizeram e têm o possível dom do empreendedorismo e do autodesenvolvimento profissional, geralmente leitores vora-
zes e midiáticos fanáticos, patinam muito, ainda mais quando não têm a natural habilidade do convencimento para angariar clientes que lhes deem condições financeiras para contratar experientes auxiliares, especialmente no campo administrativo. Além de ser até constrangedor deparar-se com o recém-formado empunhando um cartão de visitas da sua própria empresa, chega a ser enfadonho, quando não irritante, lidar com a prepotência de quem acha que domina o mundo sem ter embasamento algum. Na hora errada, com os piores argumentos, está lá o jovem dizendo o que não deve, do modo errado. E achando-se o rei da cocada, o senhor da razão. Há quem os coloque no devido lugar. O que os faz bradar destemperos rumo à porta de saída mais rápida, causando um estrondoso – ou secreto – alívio ao ex-chefe. Há os que tentam educá-los. Ou conscientizá-los do quanto estão equivocados. Esses costumam ser os chefes mais frustados da história. Há quem tente alertá-los de suas atitudes descabidas (não faltam ótimos artigos a respeito em todo tipo de mídia, inclusive). Só que nada parece lhes atingir. Como se estivessem acima de tudo e de todos, na hora agá, viramlhe as costas e somem. Cheios de si. E vazios de noção. * jornalista paulistana que adora o interior | felira@caderno360.com.br
arte: Franco Catalano Nardo | 360
*José Mário Rocha de Andrade
A caixa-forte do Tio Patinhas erguia-se majestosa e imponente na paisagem e na fantasia das pessoas. Símbolo do poder, da determinação e do pão-durismo, abrigava em seu interior montanhas de incontáveis moedas onde Tio Patinhas caminhava e nadava com olhos cintilantes, levitando sobre monta-nhas de ouro e prata em êxtase de amor ao dinheiro e às conquistas de sua vida. Para o Tio Patinhas, cada uma das moedas na caixa-forte era uma medalha olímpica. Ele e somente ele havia ganhado uma a uma e cada uma delas tinha uma história, trazia o brilho de sua luta, o sabor de sua conquista, não era um amor gratuito à moeda, elas eram a prova viva do seu valor, da sua humanidade, de uma vida vitoriosa. Poderoso e bilionário, Tio Patinhas era vulnerável em sua origem: a moeda número 1. A primeira e única no valor, seu talismã, valia sozinha mais que as mil milhares de moedas erguendo montanhas em sua caixa-forte. E era cobiçada incansavelmente pelos terríveis vilões, os Irmãos Metralha. Tio Patinhas sabia que sem a moeda número 1, guardada em segurança em uma redoma de vidro, perderia tudo, sua fortuna, seu valor. E os Irmãos Metralha sabiam que, de posse da moeda número 1, seriam o novo poder no mundo. A moeda número 1 foi uma moeda qualquer cujo valor restringia-se a seu valor comercial, mas foi alçada ao valor de símbolo supremo do sucesso e poder pela vida vitoriosa de uma única pessoa, o pão-duro, o egoísta, o determinado Tio Patinhas.
Nos meus 61 anos vividos, recordar dos gibis que líamos com paixão na infância e tomar consciência dos símbolos que recebíamos lendo estórias infantis é sentir que fomos impregnados e enriquecidos por esses autores geniais. Brinco com alegria com algum colega médico chamando-o pelo nome do doutor cirurgião dos gibis do Tio Patinhas: doutor Ciro João. Moeda número 1? Todos as têm. Conquistadas ao longo da vida e guardadas em redomas de vidro, sem nenhum valor comercial, são cobiçadas continuamente pelos Irmãos Metralha, os inimigos que nos fortalecem e nos lembram que a vida continua, e, se a vida continua, sempre se pode dar um novo primeiro passo na direção que o coração mandar e o brilho de nossos olhos iluminar e, se a moeda número 1 não é um vil metal, os Irmãos Metralha não podem roubá-la. *médicosanta-cruzense radicado em Campinas | zemario@caderno360.com.br