Edicão 372

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Em tempos de fome, desemprego e outras diversasfamíliasinseguranças,relatamao Brasil de Fato as dificuldades e contam que resgatam memória de anos anteriores para escolher em quem votar nestas eleições. EDIÇÃO ESPECIAL.

"NOSSASCRIANÇASESTÃOMAISDESPROTEGIDASSEMVACINAÇÃOEMDIA",AFIRMAPESQUISADOR

Baixa participação do Ministério da Saúde em campanha contribuiu para queda da imunização.

EVANGÉLICASFAMÍLIASCONTAMCOMOOINGRESSONAUNIVERSIDADEGARANTIUDIPLOMAEEMPREGO

Acesso ao ensino e formação superior, de 2003 a 2016, são apontados como responsáveis por melhoria de renda. ESPECIAL, PÁG

Segundo levantamento, a arma de fogo é o principal instrumento empregado nos assassinatos de mulheres no Brasil.

RJ ACESSE AS NOTÍCIAS DO BRASIL DE FATO RJ TAMBÉM PELO CELULAR, ATRAVÉS DO QR CODE ESPECIAL EDIÇÃO ESPECIAL Ano 9 setembr o de 2022 distribuição gratuita brasildefatorj.com.br /brasildefatorj fato_rj brasildefatorj “ELE DIZIA QUE A ARMA ERA PARA DEFENDER A EX-ALVEJADADIZFAMÍLIA",MULHERPELOMARIDO
ESPECIAL, PÁG 8. Fotos Agência Brasil EVANGÉLICOS QUEREM PÃO NA MESA, COMO TODOS OS BRASILEIROS
ESPECIAL, PÁG 6.
5.

Um dia, após o culto, na saída da galeria onde fica a igreja, re cebi um panfleto. Eu tinha acabado de ouvir uma be la pregação sobre o profe ta Samuel escutar o cha mado de Deus e ter que se manter diferente no con texto de desrespeito, falta de temor e profanação do sagrado, no qual os filhos de Eli viviam. Vinha pen sando sobre isso e peguei o panfleto ainda achando que era algo da igreja. Mas, não, era o óbvio: campa nha política, de candida tos apoiados por um pas tor midiático (de uma ou traQuandodenominação).medei conta achei desconfortável, afi nal eu acabava de sair de um momento de reflexão espiritual e ainda esta va envolta nele. Particu larmente, acho inconve niente a distribuição des te tipo de material na sa ída das igrejas. Não é ile gal, mas considero imoral. Não poderia, pelo menos, ser mais Entretanto,afastada?ser“sem no ção” ou até oportunista não é crime. E, vivemos numa democracia. Co loquei o material na bol sa e fui embora. Aprovei taria para ler que tipo de proposta para o povo ha viaNoali.entanto, não para a minha surpresa, como es perado: não havia nenhu

OPINIÃO: “Espalhar mentira e ódio para gerar medo é profanar o sagrado”

ma proposta, apenas fake news contra a esquerda. O panfleto dizia sobretudo

que “a esquerda odeia va lores cristãos” e que “farão leis que vão nos perseguir”.

A esquerda governou por 14 anos e nunca a igreja foi perseguida, muito pe lo contrário. A igreja cres ceu e foi no governo de Lu la que foi sancionada a Lei que garantiu personalida de jurídica às igrejas asse gurando uma série de fa cilidades; foi também ele que sancionou a lei que criou o Dia da Marcha pa ra Jesus, que pecaminosa mente neste ano teve ale gorias de armas e se tor nou palanque de politica gem. Foi Dilma que insti tuiu o Dia do Evangélico.

Eu fico pensando: com tanto sofrimento social, com nosso povo passan do fome, com nosso povo desempregado, sem saú de, sendo despejado de su as casas, com tanta gente morando nas ruas, como pode um panfleto de cam panha política não ter ab solutamente proposta ne nhuma e ter como objeti vo uma fake destinada aos evangélicos, contra o cam poEadversário.comocombinar o dis curso dos valores cristãos com armas, palavrões,

troca de esposas, deboche de gente morrendo, agres são às mulheres, apropria ção do dia da independên cia para fazer o país pas sar vergonha mundial fa zendo piada de cunho se xual, sem contar as coisas maisMasgraves.nós,evangélicas e evangélicos, não somos tolos, queremos de verda de um governo de concre tização da justiça social com esperança, liberda de, paz, alegria, amor, pão na mesa, emprego digno, segurança, saúde, educa ção,Eleslazer.sabem que conhe cendo a verdade haverá liberdade, por isso preci sam assegurar que a men tira não pare de circular, dando ares de sagrado ao profano. O valor cristão da verdade tem que exis tir na prática, não apenas na repetição de versículo bíblico. Espalhar mentira e ódio para gerar medo e temor é profanar o sagra do. Não queremos ser co mo filhos de Eli.

*Nalu Rosa é evangélica e pro fessora da Universidade do Es tado do Rio de Janeiro (Uerj).

CONSELHO EDITORIAL: Antonio Neiva (in memoriam), Carolina Dias, Joaquín Piñero (in memoriam), Mário Augusto Jakobskind (in memoriam), Rodrigo Marcelino, Vito Giannotti (in memoriam), Cláudia Santiago, Gerson Castellano, Carolina Proner, Maíra Marinho, Pablo Vergara, Olímpio Alves dos Santos, Silas Evangelista, Valéria Zacarias e Cristina Valle | EDIÇÃO: Mariana Pitasse | SUBEDIÇÃO: Eduardo Miranda | ADMINISTRAÇÃO: Catia Alves | DISTRIBUIÇÃO: Caroline Otávio | REDAÇÃO: Clívia Mesquita, Jéssica Rodrigues, Jaqueline Deister, Luiz Ferreira e Lucas Maia | DIAGRAMAÇÃO: Juliana Braga, Pablo Tavares e Érico Lebedenco.

NALU ROSA* O valor cristão da verdade tem que existir na prática, não apenas na repetição de versículo bíblico A esquerda governou por 14 anos e nunca a igreja foi perseguida, muito pelo contrário
Eles sabem que conhecendo a verdade pareaassegurarissoliberdade,haveráporprecisamquementiranãodecircular
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RIO DE JANEIRO (RJ)

"Tive fome e vocês não me deram de comer”: 33,1 milhões de brasileiros não têm comida no prato

Pesquisa aponta patamar de insegurança alimentar equivalente ao da década de 1990

Oaumento do preço dos alimen tos e a fome têm sido negligen ciados de forma recorrente pe lo atual governo. Em agosto, duran te uma entrevista para um podcast, o presidente Jair Bolsonaro (PL) afir mou: “Fome no Brasil? Fome para va ler, não existe da forma como é falado”.

Apesar da inflação ter diminuído nos últimos meses, o custo para se alimentar permanece alto. De acordo com a Pesquisa Nacional Cesta Bási ca do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômi cos (Dieese) divulgado em setembro, o Rio é a quarta cidade mais cara das capitais do país para se comprar uma cesta básica, ficando atrás de Floria nópolis, Porto Alegre e São Paulo, que está em primeiro lugar.

Segundo a pesquisa, em agosto, na capital fluminense, um trabalha dor que recebe um salário mínimo líquido de R$ 1.212,00 precisou de dicar 130 horas e 18 minutos de ser viço para arcar com o custo dos R$ 717,82 do valor da cesta básica, ou seja, 64,03% de seus rendimentos.

Além disso, dados do 2º Inquéri to Nacional sobre Insegurança Ali mentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil, apontam que em 2022, 33,1 milhões de pessoas não têm o que comer no país. O estudo foi realizado pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segu rança Alimentar e Nutricional (Re deOsPENSSAN).dadosepesquisas são revalida dos todos os dias por quem anda pe las ruas do Rio de Janeiro. A coorde nadora do núcleo Ministério de Mis sões e Evangelização da Igreja Me todista de Vila Isabel, Dilma Mello, conta que a demanda das pessoas por alimentos não para de crescer para o grupo que realiza a cada 15 dias uma ação social de distribui ção de 60 a 70 refeições nos bairros de Vila Isabel e Mangueira, na zo na Norte da “Começamoscapital.nopróprio bairro de Vila Isabel, no em torno da igreja, só que percebemos que tinha uma demanda muito grande na Aveni da 28 de Setembro com a popula ção [em situação] de rua e chega mos até a Mangueira”, relata Dilma, que ainda destaca que o núcleo te ve um aumento de pedidos de do ações durante o frio.

“No inverno tivemos demanda de cobertores, distribuímos mais de 70 [cobertores] e pares de meias tam bém. A gente está tentando manter alguns cobertores na igreja e alguns moradores de rua que já conhecem o nosso trabalho pedem quentinha, roupa, cobertor”, acrescenta.

Escolhas políticas

»De acordo com o economista e supervisor técnico do Dieese no Rio de Ja neiro, Paulo Jager, a alta dos preços dos alimentos ocorre em um contexto internacional desde 2020 com a pandemia e foi agravada com a guerra na Ucrânia, porém a situação brasileira atingiu níveis graves por rumos de terminados pelo governo federal.

“O governo federal foi reduzindo o apoio à agricultura família, desde o golpe de estado, em termo de crédito, de compras da produção para escolas e cre ches; deixou que a taxa de câmbio desvalorizasse a um nível muito elevado e isso incentivou os produtores nacionais a buscarem vender no mercado in ternacional porque aumentava a renda deles em reais”, detalha Jager.

De acordo com Jager, as famílias mais pobres são as mais impactadas pela alta dos preços alimentícios, pois destinam a maior parte do seu or çamento para se alimentar.

“A alta de preço desses produtos acima da inflação, penaliza mais as fa mílias com menor renda. Pesa principalmente para o orçamento das fa mílias mais pobres, porque, para elas, o aumento do arroz, óleo de soja, feijão, café, açúcar, no nível que ocorreu, significa acabar com a renda da família e não sobrar dinheiro para mais nada”, ressalta.

Apesar da inflação ter diminuído, o custo para se alimentar permanece alto
A alta dos preços acima da inflação penaliza mais as famílias com menor renda", afirma o economista
EDIÇÃO SETEMBROESPECIALDE2022 ESPECIAL 3EDIÇÃO 372 22 A 28 DE SETEMBRO DE 2022 ESPECIAL 3 Mauro Pimentel / AFP

Desemprego dobrou na gestão de Bolsonaro em relação a governos do PT, segundo estudo

Para o Dieese, índice atual é fruto da manutenção aprofundamentoe de estruturaisdesigualdadesde renda e oportunidades

As séries históricas do Instituto Brasileiro de Geografia e Es tatística (IBGE) atestam o que a população vem sen tindo nos últimos anos: a falta de políticas de empre gabilidade no governo Jair Bolsonaro (PL) e a chamada reforma trabalhista de Mi chel Temer (MDB) que fle xibilizou leis trabalhistas e prometia gerar mais em pregos foram responsáveis por mais desempregados.

No último trimestre de 2013, que corresponde aos meses de outubro, novem bro e dezembro daque le ano, no fim terceiro ano do primeiro mandato do governo da presidenta Dil ma Rousseff (PT), o índice

de desemprego na popu lação era de 6,3%, de acor do com a Pesquisa Nacio nal por Amostra de Domi cílios (Pnad) Contínua, do Instituto Brasileiro de Ge ografia e Estatística (IBGE).

Em 2003, no primeiro ano do governo Lula (PT), a taxa média de desocupados era de 12,4%, segundo a Pes

ENDIVIDAMENTO EM ALTA

»"Emprego desprotegido e instável gera renda instável e, assim, a vida dos brasi leiros fica mais difícil. Como planejar algo futuro se não se sabe se vai haver renda no dia de amanhã e de quan to será? E com menos di nheiro e os preços dos itens básicos (alimentação, ener

gia elétrica, aluguel, gás) al tos, o resultado é o endivi damento", afirma o relató rio do instituto.

O Dieese lembra que quase 80% das famílias es tavam endividadas no Bra sil em agosto de 2022, de acordo com a Pesquisa Na cional de Endividamento e

quisa Mensal de Emprego (PME), metodologia usada à época pelo IBGE. Em 2015, esse índice foi reduzido pa ra 6,8%, representando uma queda de 45%.

No governo de Michel Te mer (MDB), pouco mais de dois anos após o golpe par lamentar que tirou Dilma (PT) da presidência da Re

pública, o Brasil registrou desemprego de 11,7% na po pulação. Dois anos depois, já com Jair Bolsonaro (PL) na metade de seu mandato, a taxa atingiu 14,2%, com queda para 11,1% no últi mo trimestre de 2021. Nesse mesmo período, o desem prego entre a população de 18 a 24 anos chegou a 22,8%.

MELHORAFALSA

Inadimplência do Consumi dor (Peic), da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC)."Ainadimplência é recor de. São dívidas vinculadas às despesas correntes, como alimentação, tarifas públicas, habitação, entre

outros, e não resultantes de investimentos na compra de bens, como a casa própria, por exemplo. Inclusive, cresce a retomada de bens (carros e imóveis) por ina dimplência e para paga mento de dívidas", pondera o instituto de pesquisa eco nômica.

»Atualmente, a taxa de desemprego está me nos acentuada. Mas se gundo o Departamen to Intersindical de Es tatística e Estudos So cioeconômicos (Dieese), no relatório "As contra dições da melhora dos indicadores econômicos no Brasil", divulgado na semana passada, isso ocorre mediante ma nutenção e aprofunda mento de documentopelaaindariosmuitoreal"O60miliares,horascomlentados,desprotegidos,pados,dosegundomilhõessempregotirquevembroformaobservadaEssateiraeçãoCNPJcontanastosmaiorcarteirasalariadorecenteoportunidades.estruturaisdesigualdadesderendaeApesardoaumentodoempregoasformal(comassinada),ageraçãodeposdetrabalhoocorremodalidadesporprópria(semesemcontribuiparaaprevidência)assalariadosemcar(privadoepúblico).éumatendênciadesdearetrabalhista(node2017),masseacelerouaparde2021.Emsituaçãodedeháquase10debrasileiros,aúltimaPnad,IBGE.Entredesocutrabalhadoresdesaocupadosinsuficiênciadeeemnegóciosfasãocercademilhõesdepessoas.rendimentomédiodotrabalhoevoluipouco.Ossalánãocrescemesãocorroídosinflação",apontaodoDieese.

Edson Lopes Jr/Fotos Públicas Há quase 10 milhões de brasileiros em situação de desemprego, segundo a última Pnad, do IBGE
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Integrante da Igreja Pres biteriana Betânia de Ni terói (RJ), Valéria Vilar de Barros Araújo tem orgulho ao falar das mudanças pe las quais sua família pas sou nos primeiros 15 anos dos anos 2000. Foi em 2008, por exemplo, que ela se for mou em Psicologia, assu miu a área de uma regional de saúde mental do muni cípio e ainda viu as duas fi lhas terminarem as facul dades de Enfermagem e em Relações Públicas.

“Sou filha de pais semia nalfabetos, mas que sempre investiram na educação dos filhos. Meu marido é agente de redução de danos, traba lha com pessoas em situação de rua, um projeto do SUS. Somos uma família cristã protestante, e seguimos acre ditando nos dois primeiros mandamentos: amar a Cristo sobre todas as coisas e amar ao próximo como a si mes mo. Continuo na luta e acre ditando que amanhã vai ser melhor”, conta ela.

Valéria atribui as melho ras socioeconômicas na sua família e no seu entorno ao próprio esforço, mas também aos investimentos em educa ção feitos nos governos petis tas de Luiz Inácio Lula da Sil va (2003-2010) e Dilma Rous seff“Consegui(2011-2015).comprar meu carro, viajar de avião pela pri meira vez, o que para algu mas pessoas é comum, mas para mim era um sonho. Fiz pós-graduação na UFF, mi nhas filhas se formaram. Graças a todo o investimen to que foi feito em educação, meu orçamento foi melho rando e tive o prazer de po der ter formado duas filhas, hoje bem colocadas no mer cado de trabalho”, conta ela.

Famílias evangélicas contam como o ingresso na universidade garantiu diploma e emprego

Acesso ao ensino e formação superior, de 2003 a 2016, são apontados como responsáveis por melhoria de renda

Colhendo os frutos

»Filha de Valéria, Mariana de Barros Araú jo, de 28 anos, conversou com o Brasil de Fato e relatou, com entusiasmo, a experiên cia que teve desde a entrada na universidade até os frutos que colheu profissionalmente por conta da educação pública de qualidade.

Para Mariana, que teve bolsa de ajuda de custo de R$ 400 da UFF, na época, por vul nerabilidade socioeconômica, refeições gra tuitas no bandejão e, de quebra, foi inserida em projetos de pesquisa e extensão dentro da universidade, o ensino superior público, com as aulas em horário integral, foi “um divisor de águas” na sua vida.

“Foi uma ajuda fundamental para eu conse guir não só me manter como ter a vida de uma jovem que conseguisse se dedicar aos estu

dos, fazer o que gostaria de fazer como jovem, ajudou a pagar passagem, comprar materiais, com gastos pessoais”, lembra a enfermeira.

Depois da graduação, prestou concurso para a UFF e fez a residência por dois anos com bolsa do Ministério da Saúde, se espe cializando em gestão saúde pública com ên fase em atenção primária.

“Quando entrei no mestrado, já no gover no Bolsonaro, houve muitos cortes de ver bas para as instituições públicas, para a pes quisa, e o número de bolsas para as univer sidades diminuiu muito mesmo. Nem todo mundo que precisava de bolsa conseguia por conta do número muito limitado”, rela ta Mariana, já sobre a história mais recente da educação no país.

Do ensino ao mercado de trabalho

»A melhoria de vida também foi testemu nhada pela pasto ra Marta Sueli Lece da Silva, de 64 anos e moradora de São Gon çalo, na região metro politana do Rio, e pela família, composta por três filhos, nove netas e agora um bisneto de sete meses. Foi na épo ca de governos petis tas, como ela salien ta, que ela conseguiu melhorar a renda com mais trabalho e com prar um terreno para construir sua casa.

“Cozinho nas casas, faço almoço e jantares. Foi na época do gover no Lula que consegui juntar dinheiro para comprar um terreno em que comecei a construir, mas parei porque come çou a dificuldade dos dias de hoje, então torço para voltar aquela época”, explica Marta.

Na entrevista ao Bra sil de Fato, Marta, que mora no bairro Porto Madama e é pastora da Igreja Pentecostal Cris to é a Solução, no bair ro de Porto Velho, em São Gonçalo comemo rou o acesso a lugares em que sua família não entrava antes.

“Vi mudanças na edu cação da minha família, na nossa alimentação, na cultura... A gente pas sou a ir ao cinema, fui ao museu com quase 60 anos, a cultura passou a entrar na minha casa. E tive a oportunidade de viajar para fora”.

EDUARDO MIRANDA RIO DE JANEIRO (RJ) Rogério Santana/ Governo do Estado Famílias atribuem as melhoras socioeconômicas no seu entorno aos investimentos em educação Entre 2002 e 2015, os
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bilhões2006quase(Fundeb),dadefoimeioR$debrasileirosgovernoseminvestimentoseducaçãopelosfederaispassaramR$49,3bilhõespara151,7bilhões.Nodesseperíodo,criadooFundoDesenvolvimentoEducaçãoBásicaquerecebeuR$1bilhãoemechegouaR$15em2015.

Aimunização contra a poliomielite, que causa paralisia infantil, vem caindo drasticamente nos últimos dois anos, assim como a cobertura vacinal contra outras doenças, segundo o pesquisador Akira Homma, assessor científico sênior de Biomanguinhos, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).

A baixa proteção levou o Comitê de Certificação de Eliminação da Poliomielite da Organização Panamericana de Saúde (Opas) a incluir o Brasil na lista de países com alto risco de retorno da poliomelite.

As crianças com menos de cinco anos estão mais vulneráveis a contrair a forma mais grave da doença que provoca paralisia irreversível. Hoje, o Brasil que já teve coberturas acima de 95% da vacina da pólio, registra os mais baixos índices da história. Em 2021, o índice ficou em 67%, enquanto o reforço oral chegou a apenas 52% das crianças.

"Há quase 30 anos, o Brasil não tem nenhum caso de poliomielite. Na década de 80, com a participação de toda sociedade, conseguimos alta cobertura vacinal. Hoje, esta queda da cobertura vacinal vem criando um enorme número de crianças desprotegidas pela vacinação", lembra Homma sobre a estratégia que chegou a imunizar 18 milhões de crianças em um só dia.

“Nossas crianças estão mais desprotegidas sem vacinação em dia”, afirma pesquisador

Baixa participação do Ministério da Saúde em campanha contribuiu para queda da imunização

Este ano, a Campanha Nacional de Vacinação contra a Poliomielite aplicou pouca mais de 5,5 milhões de doses desde agosto, o que representa apenas 48% das crian-

As crianças com menos de cinco anos estão mais vulneráveis a contrair a poliomelite

ças de 1 a 4 anos de idade, segundo o Ministério da Saúde.

Akira Homma aponta que uma das causas para a baixa adesão foi o sucesso da estratégia que livrou o Brasil e a América Latina da circulação do poliovírus em 1994. Cenário que pode mudar se o país não voltar ao patamar de cobertura vacinal recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

"O enorme impacto determinado pelas vacinações com altas coberturas vacinais, resultou em desaparecimento das doenças, mortes, surtos, epidemias, e a população sente uma grande segurança e não sente necessidade de vacinar contra a poliomielite e outras doenças imunopreveníveis", completa.

VACINA CONTRA A COVID

» No caso da vacina contra a covid, a ampla imunização foi um fator importante para proteger as crianças na pandemia, principalmente quando elas ainda não podiam se imunizar. No entanto, na avaliação do médico de família e comunidade Carlos Vasconcellos, a demora na disponibilidade da vacina infantil e falta de campanha ampla de vacinação do Ministério da Saúde prejudicou a adesão das famílias.

"Não tem apoio institucional, a presença do Ministério da Saúde como era no passado, mobilizando as pessoas para vacinar não existe. Como a vacinação [das crianças] foi liberada no momento de melhor controle da pandemia, as pessoas não tem aquele sentimento de urgência.

Segundo a Fiocruz, o Sistema Único de Saúde (SUS) oferece duas vacinas para a pólio. A inativada que deve ser aplicada nos bebês aos 2, 4 e 6 meses de idade. E o reforço, feito com a vacina atenuada, que deve ser administrada em gotas entre os 15 e 18 meses e depois, antes dos 5 anos de idade.

Tem poucos casos, mas um caso de covid grave que pode ser evitado em uma criança já faz diferença", reforça o Procuradomédico.pelo Brasil de Fato, o Ministério da Saúde afirmou em nota que fortalece os estados nas ações de vigilância epidemiológica em relação às doenças como o sarampo e a poliomielite no país. Além disso, afirma que orienta os estados na realização de ações de vigilância epidemiológica e imunização."Emrelação à poliomielite, a pasta tem destacado a importância da vacinação para crianças menores de cinco anos e da vigilância ativa e sensível das paralisias flácidas agudas em menores de 15 anos de idade", diz o texto.

Este ano, Campanhaa contra a Poliomielite aplicou vacina em apenas 48% das crianças de 1 a 4 anos de idade
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BrasilCamargo-AgênciaMarcelo

Cleilton de Souza, de 42 anos, é montador de andaimes, mas agora está desempregado. Ele se tornou um dos be neficiários do Minha Ca sa, Minha Vida em 2015, quando saiu da comuni dade do Dique, em São João de Meriti, na Baixada Flu minense, com os dois fi lhos, para um apartamen to de dois quartos no con domínio Trio de Ouro no mesmo município.

“Nós morávamos na co munidade, beirando a mar gem do rio, nós fomos re movidos de lá para estar mos com uma melhor mo rada e ganhamos esses apartamentos, não muito distantes de onde nós está vamos, para muitos de nós isso foi uma grande melho ria”,Nosconta.últimos quatro anos, ao contrário do que aconte ceu com Cleiton, muita coi sa mudou e o sonho da casa própria passou a ficar mais distante para muitas famí lias. O problema da mora dia no país foi agravado pe la pandemia, pela alta da inflação e, principalmen te, pela falta de investimen to em política pública habi tacional.Ocontexto levou famílias inteiras a ficarem nas ru as. Segundo dados do Ins tituto de Pesquisa Econô mica Aplicada (Ipea), a es timativa é que em março de 2020, 221.869 brasileiros vi

viam nas ruas, o equivalen te a cerca de 0,1% da popu lação total do país.

Além da pandemia e de um alto número de pessoas em situação de rua, o ano de 2020 foi marcado tam bém pela criação do pro grama Casa Verde e Ama rela, que substituiu o Mi nha Casa, Minha Vida, pro grama que esteve vigente por 11 anos no Brasil. Até 2019, o antigo programa habitacional entregou 4,3 milhões de unidades para famílias cadastradas, além de facilitar o acesso à mo radia para grande parte da sociedade, a iniciativa tam bém gerou empregos e ren da impactando favoravel mente a economia.

O QUE MUDOU?

»A principal mudança do Casa Verde e Amarela para o Minha Casa, Minha Vida foi a retirada da menor faixa do antigo programa que não ti nha juros e contemplava fa mílias com renda de até R$ 1,8 mil. Além de dificultar o acesso à habitação de pes soas mais pobres, o novo programa também não tem mais a modalidade “entida des” que existia no Minha Casa, Minha Vida e previa que entidades, coletivos e movimentos sociais, sem fins lucrativos operassem a faixa 1 do antigo programa.

Para Jurema Constância, coordenadora da União Na

cional de Moradia Popular no Rio de Janeiro, uma das or ganizações que eram cadas tradas como “entidades” no Minha Casa, Minha Vida, a po pulação de baixa renda não tem mais como acessar o programa habitacional do go verno federal atualmente.

“Trocou o nome, mas a gente não vê a entrega. Eu gostaria muito de ver a entrega. Eu tra balho até hoje com famílias. Eu tenho 190 famílias cadas trada aqui há 12 anos esperan do. Essas famílias que não foram contempladas, não con seguem se enquadrar nesse programa novo”, explica a coordenadora.

O sonho da casa própria passou a ficar mais distante para muitas famílias

DAORÇAMENTOMENORHISTÓRIA

»A dificuldade de aces so ao programa habi tacional apontada por Constância, fica ainda mais evidente quan do se consulta a verba destinada para o se tor. Um levantamento da Central Única dos Trabalhadores (CUT) concluiu que em 2022 o programa tem o me nor orçamento de sua história, ou seja, R$ 1,2 bilhão, uma redução de 90% da média des tinada ao programa de 2009 a 2018, de R$ 12 bilhões, quando ele se chamava Minha Casa, Minha Vida.

De acordo com o pre sidente da Confedera ção Nacional dos Sindi catos de Trabalhadores nas Indústrias da Cons trução e da

Casa Verde e Amarela substituiu Minha Casa, Minha Vida e menoresbeneficiáriasfamíliasdescartoucomrendas
"A gente não vê a entrega das casas", aponta líder comunitária sobre programa de moradia de Bolsonaro
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milnasemCasamentoquevidodio(Conticom-CUT),MadeiraCláudaSilvaGomes,oupelaCUT,ovalorconstanoOrçadaUniãoparaoVerdeeAmarela,2023,constróiapeentre100mile120casaspopulares.FernandoFrazão/AgênciaBrasil

"Depois que ele deu o primeiro tiro, que pegou na mão, ele deu o segundo tiro, pegou no pescoço. Eu tenho um projetil alojado no pescoço. Eu pensei que ele ia me ma tar e matar as crianças.” O dia 23 de dezembro de 2017 ficou marcado para sempre na memória de Luciana dos Santos. A psicóloga é sobre vivente de uma tentativa de feminicídio por arma de fo go cometida pelo ex-marido.

O caso aconteceu após o ex-marido de Luciana des cobrir que ela pretendia se separar. Luciana tomou a decisão depois de anos vi vendo um relacionamento abusivo com traição e vio lências psicológica, patri monial e moral, todas tipi ficadas na Lei Maria da Pe nha. Ela foi alvejada por três tiros dentro de casa e não entrou nas estatísticas de fe minicídio por pouco.

“Quando eu abri a porta, eu vi que a polícia estava em frente a minha casa, tinham três viaturas passando, o po licial ouviu o primeiro tiro, pararam, desceram com o fuzil na mão. Eu gritei para ele [ex-marido] e disse: ‘é a polícia’. Nesse momento, ele estava dando o quarto tiro”, relata ao Brasil de Fato a psi cóloga, que mora no municí pio de Hortolândia, no inte rior do estado de São Paulo.

O ex-marido de Luciana não respeitou a ordem da polícia e começou a atirar na direção dos policiais. O ho mem acabou morto durante a troca de tiros. Já Luciana sobreviveu, mas carrega em seu corpo as sequelas da vio lência. Além do projetil alo jado no pescoço, ela perdeu também parte da mobilida de do braço.

“Ele dizia que a arma era para defender a família", diz mulher alvejada pelo ex-marido

Mulheres que estão em situação de violência doméstica podem buscar ajuda ligando 180. O serviço registra e encaminha denúncias de violência contra a mulher aos órgãos competentes. Em casos de emergência, é necessário ligar para a polícia no número 190 ou procurar uma das situaçãoàsCivilespecializadas(DEAMs),AtendimentoEspecializadasDelegaciasdeàMulherunidadesdaPolíciaparaatendimentomulheresemdeviolência.

DEFESA DA FAMÍLIA?

» Luciana casou-se ainda adolescente, aos 17 anos, com o homem que veio a ser o seu agressor. Ele não era des conhecido da família. Na verdade, era primo de segun do grau da vítima, que viveu a sua infância e adolescên cia no interior de Minas Gerais.

De costumes tradicionais, Luciana frequentava desde cedo a igreja evangélica Congregação Cristã. Como na época a religião não permitia que os integrantes ca sassem com pessoas que não pertenciam à religião, o seu futuro marido passou a frequentar a igreja para selar o matrimônio. Ao todo, foram 12 anos na Con gregação Cristã.

A situação ganhou outro contorno em 2015, quando o então marido da psicóloga resolveu adquirir uma arma de fogo. O revólver calibre 22 foi comprado do sogro de Luciana. Segundo ela, o principal argumento era para “defender a família”.

“Ele comprou uma arma do pai dele e dizia que essa arma era para defender a família, que cidadão de bem tinha que andar armado e ele carregava essa arma no carro”, conta a sobrevivente que relata ainda que o ex-ma rido não possuía a documentação para ter o revólver.

ARMAS DE FOGO EM CASA

» O medo de Luciana tinha fundamento. O estudo “O papel da arma de fogo na violência contra a mulher”, lançado em 2021 pelo Instituto Sou da Paz com base em dados do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) e do Sistema de Informa ção de Agravos de Notificação (Sinan) do Ministério da Saúde sobre mortes e lesões provocadas por armas de fogo no Brasil entre 2012 e 2019, mostra que a arma de fogo é o principal ins trumento empregado nos assassinatos de mulheres no Brasil.

Dos 4 mil casos de óbitos femininos por agressão registra dos em média por ano, a arma de fogo foi o meio empregado em mais de 2 mil deles, segundo a pesquisa. O Sou da Paz aponta ainda que, entre 2012 e 2019, o pior ano foi 2017 com 54% dessas mortes, ano em que Luciana sofreu a tentativa de feminicídio em Hortolândia.

“As principais mudanças que impactam na violência contra a mulher é que está mais fácil comprar a arma, e a fiscaliza ção dos requisitos piorou muito. Há baixa checagem dos do cumentos como antecedentes, aumentando as fraudes na compra. E hoje este homem que comprou a arma só precisa reapresentar um teste psicológico ou um novo atestado de an tecedentes, 10 anos depois”, destaca o advogado e gerente do Instituto Sou da Paz, Bruno Langeani.

Daniel Ramalho/AFP Segundo levantamento, a arma de fogo é o principal instrumento empregado nos assassinatos de mulheres no Brasil JAQUELINE DEISTER RIO DE JANEIRO (RJ)
O ano de 2017 foi o que registrou o pior índice de morte de mulheres por armas de fogo, atingindo 54% dos casos
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