Gabriela dalla costa tc influência da cultura africana na formação cultural afro brasileira

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UNIVERSIDADE LUTERANA DO BRASIL – ULBRA Canoas/RS UNIDADE ACADÊMICA DE GRADUAÇÃO CURSO DE LICENCIATURA EM ARTES VISUAIS Gabriela Dalla Costa

Influência da Cultura Africana na Formação Cultural Afro-brasileira

Canoas, junho de 2014.


Gabriela Dalla Costa

Influência da Cultura Africana na Formação Cultural Afro-brasileira

Trabalho de Curso apresentado como prérequisito parcial para obtenção de título acadêmico de Licenciada em Artes Visuais, pelo Curso de Licenciatura em Artes Visuais da Universidade Luterana do Brasil, sob orientação dos professores Dra. Rejane Reckziegel Ledur, Me. Ana Lúcia Beck e Me. Renato Garcia dos Santos.

Canoas, Junho de 2014



RESUMO O presente Trabalho de Curso (TC) foi desenvolvido a partir da pesquisa e aplicação do projeto de ensino “Influência da Cultura Africana na Formação Cultural Brasileira” realizado na escola de Ensino Fundamental William Richard Schiler, na cidade de Porto Alegre - RS, junto à turma 62 que corresponde a 6ª série do ensino fundamental, durante o segundo semestre de 2012. O tema escolhido para o desenvolvimento do projeto de ensino teve como base a lei 11.645, de março de 2008 que torna obrigatório o ensino da história e cultura afro-brasileira e indígena nos estabelecimentos educacionais, sejam eles privados ou públicos, bem como o questionário respondido pelos educandos que apontou para a falta de conhecimento a respeito da cultura afro-brasileira. O objetivo principal foi proporcionar a compreensão dos educandos com relação a importância da contribuição que os afro-brasileiros e africanos tiveram na formação cultural brasileira. A metodologia de ensino aplicada propôs atividades as quais os alunos não estavam habituados a realizar. Desta forma, através dos artistas Rubem Valentim, Mestre Didi, Esther Mahlangu e da simbologia adinkra foi possível instigá-los através das imagens e das atividades práticas procurando desenvolver suas capacidades críticas, a compreensão, o conhecimento e, a valorização da cultura afro-brasileira e africana, atingindo os objetivos propostos para o projeto de ensino. Os autores Roger Bastide, Hamilton Faria, Renata Felinto, Duarte Junior e Anamélia Buoro foram fundamentais para o desenvolvimento do projeto de ensino e auxiliaram as reflexões a respeito da prática do mesmo. Os resultados obtidos puderam ser percebidos pelas falas, escritas e arte produzida pelos educandos demonstrando sensibilidade, compreensão e respeito pela cultura a arte afro-brasileira e africana.

Palavras Chave: Afro-brasileira. Arte. Cultura.


Sumário INTRODUÇÃO.............................................................................................................. 07 1. CAPÍTULO 1 – Reconhecimento do Espaço de Ensino............................................ 11 1.1 – Dados Gerais da Escola............................................................................. 12 1.2 – Observações Silenciosas............................................................................ 13 1.2.1 – Primeira Observação Silenciosa.............................................. 13 1.2.2 – Segunda Observação Silenciosa ............................................. 16 1.2.3 – Terceira Observação Silenciosa.............................................. 17 1.2.4 – Quarta Observação Silenciosa................................................. 18 1.2.5 – Quinta Observação Silenciosa................................................. 20 1.2.6 – Sexta Observação Silenciosa................................................... 21 1.3 – Análise das Observações Silenciosas...................................................... 22 1.4 – Análise do Questionário Respondido pela Professora............................. 24 1.5 – Análise do Questionário Respondido pelos Alunos................................ 25 2. CAPÍTULO 2 – Pesquisa sobre o Tema nas Artes Visuais........................................ 26 2.1 – Origem da Arte Afro-Brasileira................................................................. 27 2.1.1 – Arte Africana.............................................................................. 27 2.1.2 – África do Sul............................................................................... 28 2.1.3 – Arte Sul-Africana........................................................................ 29 2.1.4 – Rubem Valentim......................................................................... 37 2.1.5 – Simbologia Adinkra.................................................................... 40 2.1.6 – Mestre Didi................................................................................. 42


3. CAPÍTULO 3 – Projeto e Prática de Ensino em Artes Visuais.................................. 47 3.1 – Dados Gerais do Projeto de Ensino........................................................... 48 3.2 – Prática de Ensino....................................................................................... 50 3.2.1 – Primeiro Encontro....................................................................... 50 3.2.2 – Segundo Encontro....................................................................... 73 3.2.3 – Terceiro Encontro....................................................................... 80 3.2.4 – Quarto Encontro.......................................................................... 92 3.2.5 – Quinto Encontro........................................................................ 109 3.2.6 – Sexto Encontro......................................................................... 117 3.2.7 – Sétimo Encontro....................................................................... 128 3.2.8 – Oitavo Encontro........................................................................ 136 3.2.9 – Nono Encontro.......................................................................... 148 3.2.10 – Décimo Encontro.................................................................... 165 3.2.11 – Décimo Primeiro Encontro..................................................... 180 3.2.12 – Décimo Segundo Encontro..................................................... 189 CONCLUSÃO.............................................................................................................. 202 REFERÊNCIAS........................................................................................................... 211 APÊNDICES................................................................................................................ 214 Apêndice 1........................................................................................................ 215 Apêndice 2........................................................................................................ 217 Apêndice 3........................................................................................................ 219


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INTRODUÇÃO Num domingo de sol, como era de costume da família, fomos a um almoço promovido por alguns colegas de trabalho de meu pai. Estávamos meu pai, minha mãe e eu, quando um casal aproximou-se de nós, cumprimentou meu pai e perguntou a ele quem era minha mãe. Meu pai, educadamente apresentou minha mãe ao casal. Minha mãe é uma mulher baixinha, que usava vestimentas simples e negra, logo o casal associou que uma menina loirinha não poderia ser filha desta mulher e, disseram ao meu pai que achavam que minha mãe era minha babá. Essa não é uma história de ficção, é a minha história. Este fato criou em mim, naquela época eu tinha em torno de 5 ou 6 anos, um sentimento que, com aquela idade, eu não sabia explicar. Hoje sei que era um sentimento de indignação com o preconceito que o casal teve com minha mãe. Creio que nada neste mundo seja por acaso, apesar do sentimento de indignação ter nascido em mim ainda muito pequena, este fato que ocorreu na minha vida serviu para que eu crescesse com um sentimento de que era necessário fazer algo para mudar, pois mesmo adulta, ainda não consigo entender o preconceito seja ele qual for. A imagem pejorativa dos negros africanos foi criada a partir de textos medievais que associavam os negros com o demônio. Darwin também contribuiu para a criação de uma imagem ruim do negro africano quando classificou os povos africanos como seres inferiores, incapazes de evoluir e organizarem-se socialmente, justificando a escravização destes povos. Devido a estes textos e teorias infelizes, o preconceito e a ideia de superioridade perduram até hoje. Os povos escravizados que vieram para o Brasil trouxeram consigo suas crenças, artes, línguas, costumes, etc. e essa cultura aos poucos foi sendo incorporada a cultura brasileira. A formação cultural brasileira é pouco conhecida pelos educandos, apesar de existir a lei 11.645 que tornou obrigatório o ensino sobre História e cultura afro-brasileira e indígena nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, públicos e privados. Os educandos pouco conhecem a respeito da cultura a qual estão inseridos, pude constatar isso ao observar os questionários respondidos pelos educandos do Ensino Fundamental e Médio. Percebi que eles não possuíam conhecimento a respeito da arte afro-brasileira e africana, esse foi um dos aspectos observados para que eu acreditasse na necessidade desenvolver um projeto de ensino voltado a essa temática.


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Devido a isso e aos diversos fatos que presenciei ao longo da minha vida, é que escolhi o tema para o projeto de pesquisa baseado na cultura afro-brasileira e africana, o qual intitulei; A influência da cultura africana na construção cultural afrobrasileira. Ao iniciar o desenvolvimento da pesquisa durante o estágio I, encontrei uma diversidade artística muito grande, tanto na cultura africana quanto na cultura afrobrasileira. Portanto procurei pesquisar artistas africanos, os quais eu pudesse fazer relações artísticas e culturais com os artistas afro-brasileiros, tais como Rubem Valentim e Mestre Didi que expressam em suas obras simbolismos das religiões de matrizes africanas. A artista Esther Mahlangu foi inserida ao projeto, pois achei de fundamental importância apresentar ao grupo de educandos uma artista mulher, negra e africana e, sua importância na preservação cultural da África do Sul. Esta artista é uma das artistas mais representativas da África do Sul, pois ela faz parte de uma tribo chamada Ndebele, a qual as mulheres desenvolvem pinturas simbólicas em muros e paredes como forma de expressão de acontecimentos dentro da comunidade. Também achei que seria pertinente incluir a simbologia Adinkra, que tem origem na República de Gana, no projeto de ensino, pois é formada por um conjunto de símbolos que representam conhecimentos relacionados às crenças e a história do povo ashanti que está relacionada ao comportamento humano, animal e vegetal. O trabalho de curso apresentado foi aplicado em duas instituições educacionais de ensino público estadual. A escola Estadual de Ensino Fundamental William Richard Schiler, localizada no bairro Menino Deus e, o Colégio Estadual Padre Rambo, que possui somente o Ensino Médio e está localizado na Avenida Bento Gonçalves e, atende alunos de diversas regiões de Porto Alegre e da cidade de Viamão. Aplicar o projeto de ensino em ambas as escolas foi um aprendizado bastante positivo para mim, pois possibilitou que eu pudesse colocar em prática conhecimentos adquiridos ao longo da minha jornada acadêmica. No Ensino Fundamental o projeto foi aplicado na turma 62, que tinha em torno de 25 alunos no turno matutino com idades entre 11 e 15 anos e, no Ensino Médio com a turma 2F que tinha em torno de 20 alunos no turno vespertino com idades entre 15 e 18 anos. O projeto de ensino foi aplicado no Ensino Médio em uma escola diferente a que realizei as observações silenciosas, devido a não autorização da direção da escola para realização da prática, a qual não houve explicação para tal. A experiência com os educandos foi bastante proveitosa, pois os alunos foram muito participativos e contribuíram muito com as atividades de leitura de


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imagens e práticas artísticas que foram propostas ao longo da aplicação do projeto de ensino. No Ensino Fundamental foram 12 encontros de 50 minutos e os principais conteúdos trabalhados foram imagens de obras dos artistas brasileiros Mestre Didi e Rubem Valentim, da artista sul-africana Esther Mahlangu, imagens, significados e importância da simbologia Adinkra e o filme Kiriku e a feiticeira. Para contextualizar os conteúdos estudados procurei desenvolver atividades plásticas, textuais e de leituras de imagens e do filme Kiriku e a Feiticeira que proporcionassem diferentes experimentações, integração do grupo de alunos e compreensão a respeito da cultura afro-brasileira e africana. Através das atividades citadas foi possível perceber que os alunos conseguiram atingir os objetivos propostos, pois desenvolveram as leituras de imagens expressando suas ideias, posicionaram-se de maneira crítica quando discutimos a respeito da cultura africana e afro-brasileira, foram capazes de se organizarem e relacionarem suas ideias dentro da proposta de cada aula e desenvolveram suas potencialidades através das atividades práticas realizadas em sala de aula. As atividades em grupo proporcionaram que os alunos, antes desunidos, interagissem mais entre si, criando um ambiente escolar mais harmonioso. No Ensino Médio foram 13 aulas de 45 minutos, permaneceram no projeto de ensino os mesmos conteúdos, artistas e atividades que foram trabalhadas no Ensino Fundamental, todavia foi modificada uma atividade prática. Ao invés dos alunos criarem uma escultura com galhos, flores e fitas, eles desenvolveram uma escultura que chamei de toten, com papelão e tintas. Acredito que foi possível desenvolver com os alunos uma compreensão mais ampla e mais real da importância dos afro-brasileiros e africanos na construção da identidade cultural brasileira. Desestereotipando a imagem e a cultura afro-brasileira e africana desenvolvendo desta forma uma ideia menos preconceituosa e mais humanista com relação às diferenças socioculturais, isso foi possível tanto no Ensino Médio quanto no Fundamental.

Através das atividades

plásticas pude perceber que os educandos do Ensino Médio expressaram sentimentos que estavam vivendo naquele momento e, foram capazes de relacionar os conteúdos estudados com seus sentimentos. Foram necessárias diversas conversas com os educandos para que eu pudesse compreender a forma com que os alunos contextualizaram o aprendizado. Outro fato relevante era a desunião do grupo de alunos. Quando iniciei a prática de ensino nesta turma era possível visualizar pequenos grupos


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em sala de aula, depois que as atividades em grupo começaram os alunos tornaram-se mais unidos e toleráveis uns com os outros. Durante o processo de desenvolvimento do estágio I procurei desenvolver aulas as quais os educandos pudessem potencializar suas capacidades criativas e imaginativas, compreender as diferenças e semelhanças culturais afro-brasileiras e africanas com o intuito de contribuir para a desestereotipação da imagem dos negros brasileiros e africanos. Durante o estágio II realizado no 2º semestre de 2012 e, estágio III realizado no 1º semestre de 2013, tive a oportunidade de colocar em prática o projeto de ensino planejado. Acredito que apesar de algumas dificuldades disciplinares que enfrentei com os alunos e também pela minha falta de experiência consegui aplicar e atingir os objetivos que eu havia proposto para ambos. No estágio IV foi preciso optar por um dos níveis de ensino para relatar minha experiência em sala de aula. Optei pelo Ensino Fundamental, pois foi com este grupo de alunos, que era muito agitado, onde encontrei as maiores dificuldades e mesmo assim os resultados obtidos superaram minhas expectativas. Essa constatação proporcionou que eu aprofundasse as minhas reflexões que estão descritas na conclusão do trabalho, onde descrevo as situações que proporcionaram tais reflexões a respeito do meu aprendizado e, do aprendizado dos educandos. Ainda na conclusão levanto alguns questionamentos a respeito das soluções e decisões que precisei tomar, bem como minha postura frente aos educandos. Também descrevo o quanto o desenvolvimento do projeto contribuiu para ampliar meu conhecimento como aluna e como profissional, além de criar proporcionar laços de amizade com um sul-africano, chamado Ntsiki Thobella, que tive a oportunidade de conhecer em uma feira de artesanato. Essa primeira experiência docente foi de grande valia em diversos aspectos, pois pude iniciar uma caminhada em busca de maior aprimoramento dos meus conhecimentos como educanda e como educadora. Também acredito ser um pequeno passo para a construção de uma sociedade que conheça e aprenda a respeitar e contribuir para a preservação da cultura afro-brasileira e africana.


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Capítulo 1. Reconhecimento do Espaço de Ensino


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1.1. Dados Gerais da Escola

Escola de Ensino Fundamental William Richard Schiler A Escola Estadual de Ensino Fundamental William Richard Schiler está situada na rua Visconde do Herval, 970 – Bairro Menino Deus, em Porto Alegre. Esta escola é pequena, possui somente um prédio com 8 (oito) salas de aula e outro nos fundos com três salas de aula. A escola atende o ensino fundamental séries iniciais e séries finais, funciona nos períodos da manhã, tarde e noite. Os alunos que a frequentam são de classe média baixa e que moram nos conjuntos habitacionais construídos pela prefeitura nas redondezas do bairro. Na entrevista com a supervisora da escola pude observar que a escola apesar de não ter um espaço direcionado para as aulas de artes, disponibiliza espaços nos corredores para a exposição dos trabalhos dos alunos, valorizando as atividades da disciplina de Artes. Quanto à avaliação dos alunos, a escola exige que eles sejam avaliados como em qualquer outra disciplina do currículo escolar.


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1.2.

OBSERVAÇÕES SILENCIOSAS

1.2.1 Primeira Observação Silenciosa Aula 01 Ano: 6ª série do Ensino Fundamental. Data: 02/04/2012 – Turno da manhã. Duração: 1 período de 50 minutos. O sinal soou às 07h45min. A professora foi até o pátio da escola e formou uma fila com os alunos da 6ª série, em seguida os levou até a sala de aula. Aguardou que todos se acomodassem em suas classes. Após todos estarem acomodados, a professora me apresentou a turma e solicitou que os alunos comportassem e tivessem respeito. Explicou a eles que depois das férias escolares eu estarei aplicando meu projeto de ensino com eles. A professora iniciou a chamada. Os alunos responderam sem bagunça. Após a chamada concluída, a professora cobrou de quatro alunos o trabalho que foi desenvolvido há algumas semanas atrás, o qual ela chamou de trabalho da “capa”. Ela disse que os alunos que não entregaram o trabalho ficarão em recuperação. Como estes alunos não haviam feito a atividade, a professora resolveu dar outra chance para que eles entregassem os trabalhos na próxima aula. A professora foi até o quadro e começou a explicar uma nova atividade, chamada de “trabalho do azulejo”, que foi iniciada na aula anterior. Na primeira parte do trabalho, os alunos tiveram que traçar um quadrado de 10 cm de largura por 10 cm de comprimento. Depois traçar uma linha no meio deste quadrado e em seguida fazer um desenho cego somente em um dos lados do quadrado. Após o término desta primeira parte do desenho, os alunos tiveram que escolher o lado que mais gostaram, recortar e refazer o desenho no lado que permaneceu em branco. Quando a professora terminou de explicar um aluno veio mostrar o seu desenho. Ela mostrou o desenho para a turma e comentou que a aquele não era um desenho cego conforme ela havia pedido. Então ela explicou que com aquele desenho o aluno não ia conseguir refazer o desenho por não ter simetria. Conforme a professora percebia que os alunos iam terminando a primeira parte do trabalho, ela começou a explicar a segunda parte da atividade. Ela solicitou aos


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alunos que pegassem uma folha A4 e régua, os alunos começaram a se movimentar e a conversar. A turma estava com dificuldade para realizar a atividade. A professora explicou para os alunos porque eles estavam com dificuldades em desenvolver o trabalho proposto. Ela disse a eles que isso estava acontecendo porque os alunos não sabem utilizar a régua. Ela explicou mais uma vez como eles deveriam fazer. Conforme explica Barbosa (2010, p. 12), Nas artes visuais ainda domina na sala de aula o ensino de desenho geométrico, o laissez-faire, temas banais, as folhas para colorir, a variação de técnicas e o desenho de observação, os mesmos métodos, procedimentos e princípios ideológicos encontrados numa pesquisa feita em programas de ensino de artes de 1971 a 1973.

Acredito que trabalhar o desenho geométrico em sala de aula não seja ruim, todavia é necessário que essa prática seja bem fundamentada, utilizando, como por exemplo, a leitura de imagens para que os alunos sejam capazes de compreender melhor a atividade proposta e que a mesma passe a fazer sentido e, contribua para o aprendizado dos alunos. Desta maneira Duarte Júnior (1991) explica que “[...] uma educação que apenas pretenda transmitir significados que estão distantes da vida concreta dos educandos, não produz aprendizagem alguma”. A professora disse que quem tinha conseguido fazer as medidas, deveria traçar uma linha reta, ligando uma marcação a outra, alguns não entenderam o que ela havia dito. Ela pediu que eles terminassem de traçar as linhas para formarem quatro quadrados iguais. Explicou o que é comprimento e largura, e perguntou: ─ O que surgiu?

─ Que figura geométrica é?

Os alunos responderam que era um quadrado, e a professora perguntou: ─ O que é um quadrado?

Os alunos brincavam e conversavam, não prestavam atenção na aula, pois a proposta da aula era confusa, confesso que eu também estava com dificuldades para entendê-la. Não havia bagunça nem gritaria, eles comportavam-se bem, mas não demonstravam interesse pelo trabalho. Os alunos continuavam com dificuldades para


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entender a atividade e nĂŁo conseguiam desenvolver o trabalho. A professora passou nas classes para explicar individualmente. O sinal bateu. Os alunos continuaram calmos, a professora pediu que eles terminassem de fazer a atividade em casa, mas sem pintar, e que trouxessem na prĂłxima aula para finalizar o trabalho. Acredito que a falta de planejamento da aula tenha dificultado a compreensĂŁo dos alunos para desenvolverem a atividade prĂĄtica. Talvez se a professora tivesse apresentado imagens e desenvolvesse uma atividade mais simples antes de propor a atividade dos azulejos, os educandos teriam maior facilidade para compreender a proposta desta aula.


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1.2.2 Segunda Observação Silenciosa Aula 02 Ano: 6ª série do Ensino Fundamental. Data: 03/04/2012 – Turno da manhã. Duração: 1 período de 50 minutos. A professora entrou na sala e iniciou a aula mostrando os trabalhos da “capa”. Os alunos falavam alto. A professora pediu silêncio para poder fazer a chamada. Ela disse que ia recapitular o trabalho da aula passada. A porta da sala estava aberta e alguns alunos de outra turma passavam gritando pelo corredor, mal se ouvia a professora chamando o nome dos alunos. Ao terminar a chamada alguns alunos mostraram a ela o trabalho da aula anterior que tentaram fazer em casa, a professora vai até o quadro e inicia uma nova explicação. Os alunos faziam a atividade comportados, sem bagunça. Havia alguns alunos que chamavam a professora ao mesmo tempo, ela pediu calma e já atenderia a todos. Ao observar os desenhos vi que os desenhos cegos solicitados pela professora são todos muito parecidos. Enquanto eu circulava pela sala de aula observando os trabalhos, começou um tumulto, alunos movimentavam-se, chamavam a professora e conversam todos ao mesmo tempo. A professora começou a discutir com um aluno, pois ele não havia feito o trabalho. O aluno gritou com a professora e, ela o mandou para fora da sala. O aluno retornou, pediu desculpas a ela e sentou-se em sua classe. A aula estava quase no final e os alunos que estavam retornando da aula de educação física passavam gritando deixando a aula mais tumultuada. O sinal bateu, a professora solicitou que antes de saírem os alunos entregassem os trabalhos a ela.


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1.2.3 Terceira Observação Silenciosa Aula 03 Ano: 6ª série do Ensino Fundamental. Data: 09/04/2012 – Turno da manhã. Duração: 1 período de 50 minutos. As aulas do primeiro período sempre começavam com a professora indo buscar os alunos no pátio. Neste dia estava faltando um professor na escola e a professora de Artes precisou atender o 6° e o 8° ano no mesmo período. Enquanto a professora saiu da sala para atender o 8° ano, os alunos conversavam e davam continuidade ao trabalho da semana passada. Todos estavam quietos em suas classes, alguns conversavam, mas sem bagunça. Um aluno falava alto que tinha esquecido seu trabalho em casa. A professora pediu que um dos alunos saísse da sala para falar com a supervisora e me mostrou que para eles poderem sair da sala de aula precisavam usar um crachá que serve como autorização. Os alunos seguiam quietos fazendo suas tarefas. Uma da aluna levantou-se para mostrar o trabalho pronto a professora. A professora falou para ela que ela deveria recortar as partes que estavam fora do quadrado, e mostrou para a turma o resultado do desenho. Enquanto os alunos trabalhavam a professora passava uma fita adesiva larga em cima dos trabalhos da “capa” para proteger o desenho. Um dos alunos me observava o tempo todo, pois na aula anterior a professora disse a eles que eu estava fazendo um relatório de tudo o que eles faziam. A turma começou a se movimentar para entregar os trabalhos, enquanto isso alguns deles foram para a porta. A professora gritou com eles dizendo que a aula ainda não havia terminado. Em seguida tocou o sinal e todos saíram.


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1.2.4 Quarta Observação Silenciosa Aula 04 Ano: 6ª série do Ensino Fundamental. Data: 10/04/2012 – Turno da manhã. Duração: 1 período de 50 minutos. Os alunos estavam em sala de aula quando a professora entrou. Eles discutiam sobre o ventilador. Os alunos estavam agitados, talvez porque a aula anterior tinha sido a de Educação Física. Aos poucos os alunos foram se acalmando. A professora fez a chamada e em seguida solicitou que os alunos terminassem o trabalho do azulejo nesta aula. Durante a explicação, a diretora da escola entrou na sala sem bater, e pediu a professora se poderia interromper, pois precisava falar com os alunos. A diretora informou aos alunos que a professora Ceci, que é a professora de Artes, não iria mais ser conselheira da turma, porque a 8ª série a escolheu antes. Então a diretora optou por deixá-la como conselheira da 8ª série. A professora explicou que aceitou ser conselheira da 8ª série porque está com esta turma desde a 5ª série. Por causa deste fato iniciou-se uma bagunça generalizada na sala. A professora pediu silêncio e eles continuaram sem atender ao pedido, mesmo com a bagunça ela saiu da sala para colar os trabalhos na parede do corredor da escola. Depois de pronto, ela chamou os alunos para olharem os trabalhos expostos, conversou a respeito das atividades realizadas e disse que para que o trabalho ficasse bonito e bem feito, era necessário saber fazer o bom uso da cor e sempre pintar no mesmo sentido. Ao ouvir essa frase pensei; o que seria de Iberê Camargo ou Van Gogh se eles pensassem desta forma? Talvez o expressionismo também não existisse. Pensei por um tempo porque os professores de artes ainda se baseiam em práticas tradicionais delimitando a capacidade criativa dos alunos. Pesquisei a respeito destas práticas e encontrei a resposta conforme afirma Barbosa (2010, p. 11),

A identificação da criatividade com espontaneidade não é surpreendente porque é uma compreensão de senso comum. Os professores de arte não têm tido a oportunidade de estudar as teorias da criatividade ou disciplinas similares nas universidades


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porque estas não são disciplinas determinadas pelo currículo mínimo, logo lhes resta o senso comum.

Depois de observarem os trabalhos dos colegas todos retornaram a sala de aula. A bagunça continuava, os alunos falavam todos ao mesmo tempo. Professora explicou aos alunos que gostaria de levá-los ao museu, e que eles precisavam aprender a se comportar, pois no museu não poderiam ficar correndo e colocando as mãos nas obras de arte. Devido à agitação dos alunos a professora decidiu liberá-los mais cedo para irem ao recreio e finalizou a aula.


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1.2.5 Quinta Observação Silenciosa Aula 05 Ano: 6ª série do Ensino Fundamental. Data: 16/04/2012 – Turno da manhã. Duração: 1 período de 50 minutos. Soou o sinal para o primeiro período. A professora dirigiu-se para o pátio da escola para formar a fila e levá-los até a sala de aula. Ao entrar na sala os alunos encontraram algumas classes separadas em um canto, elas foram separadas para a limpeza, pois alguns alunos do turno da noite haviam pichado as classes. Os alunos acomodaram-se calmamente e em silêncio. A professora informou aos alunos que esqueceu o seu material na escola que ela trabalha à tarde. Ela disse à turma que nesta aula ela daria uma atividade extra. Ela sugeriu que os alunos fizessem um cartão convidando a professora Sandra para que fosse conselheira da turma. Compreendo que podem ocorrer situações as quais a aula planejada não seja possível de ser executada, todavia é preciso pensar em alguma saída para que a aula não seja baseada em uma simples atividade de “fazer algo”. Um dos alunos perguntou se valia nota, a professora disse que todas as atividades realizadas em aula valem nota. Ela saiu da sala. A turma continuou desenvolvendo suas atividades cada um em suas classes sem bagunça. Alguns alunos estavam terminando a tarefa que era para ser entregue na aula passada. A aula segue tranquilamente, porém são poucos os alunos que concluíram o cartão, a maioria deles está terminando a atividade da aula anterior. O sinal bateu, a turma organizou as classes e saiu.


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1.2.6 Sexta Observação Silenciosa Aula 06 Ano: 6ª série do Ensino Fundamental. Data: 17/04/2012 – Turno da manhã. Duração: 1 período de 50 minutos.

A aula iniciou com a professora fazendo a chamada. Ela me pediu para fazer a aplicação do questionário no começo da aula. Expliquei aos alunos que não era necessário colocar o nome, somente responder as questões. Distribui os questionários e eles responderam em silêncio. Após o término da atividade os alunos comentavam entre eles sobre as questões, fazendo piada um com o outro. A professora iniciou um trabalho sobre cartazes, ela explicou que os alunos deveriam confeccionar cartazes sobre as regras da escola, o que é permitido e, o outro que é sobre os deveres dos alunos. Ela trouxe alguns modelos que as turmas do ano passado fizeram e mostrou para os alunos, explicou que primeiro deveriam fazer uma frase e logo abaixo uma ilustração. A professora formou duplas aleatórias para os alunos iniciarem o rascunho dos cartazes. Os alunos se movimentavam para formar as duplas, e iniciaram o rascunho do trabalho em silêncio. A professora foi até o quadro e passou um tema para a próxima aula; os alunos deveriam responder três questões:

Que tipo de cartazes você já viu? O que eles anunciavam? Onde eles estavam?

Ela explicou que esse tema valia como avaliação do trimestre e eles precisavam fazer para completar a nota, caso não fizessem poderiam ficar em recuperação. Os alunos que estavam sentados ao lado da porta brincavam, cantavam e falavam alto. Uma dupla estava com dificuldades e chamou a professora que foi atendêlos. Enquanto ela atendia a dupla de alunos o sinal bateu.


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1.3.

ANÁLISE DAS OBSERVAÇÕES SILENCIOSAS

Durante o período das minhas observações silenciosas pude perceber que os alunos da 6ª série do Ensino Fundamental tem grande interesse pelas aulas de Artes. Os alunos possuem um bom relacionamento com a professora, porém as atividades propostas pela por ela não foram interessantes, não os instigaram. A atividade artística para ensiná-los a usar a régua, propondo criar “azulejos” e não apresentando a eles imagens e referências artísticas, causou um grande problema para a professora. Os alunos que têm em torno de 11 e 15 anos não conseguiram entender a proposta, pois eles não tinham referências de imagens, não conheciam nenhum artista ligado a essa prática, não tiveram nenhuma explicação sobre arte com azulejos e sobre História da Arte. Isso acontece conforme explica Barbosa (2010, p. 12),

Apreciação artística e história da arte não têm lugar na escola. As únicas imagens na sala de aula são as imagens ruins dos livros didáticos, as imagens das folhas de colorir e, no melhor dos casos, as imagens produzidas pelas próprias crianças. Desta forma acarretou um grande desgaste da professora que passou a maior parte das aulas explicando o trabalho. A atividade proposta pela era de traçar um quadrado com lados iguais, e dividi-lo em quatro partes. Após desenhar no primeiro quadrado, deveriam espelhar os outros três. Este trabalho causou grande confusão para os alunos e estresse para a professora, pois eles não entenderam qual era a proposta da atividade. A professora poderia ter levado a sala de aula imagens de artistas que trabalham com formas geométricas, incluindo a geometria na História da Arte, fazendo uma leitura de imagens com eles, mostrando porque é importante saber e entender o conteúdo, proporcionando maior interesse dos alunos e os incentivando a desenvolver a criatividade e a imaginação.


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Desta forma ela teria facilitado o seu trabalho e os alunos teriam compreendido melhor a proposta e desenvolvido um trabalho mais satisfatório. Esta proposta de ensino está fundamentada em Ana Mae Barbosa, que salienta:

Um currículo que interligasse o fazer artístico, a análise da obra de arte e a contextualização estaria se organizando de maneira que a criança, suas necessidades, seus interesses e seu desenvolvimento estariam sendo respeitados e, ao mesmo tempo, estaria sendo respeitada a matéria a ser aprendida, seus valores, sua estrutura e sua contribuição específica para a cultura. (BARBOSA,1980, p.36). A autora ressalta que é necessário respeitar os interesses dos alunos e o desenvolvimento dos mesmos, fazendo uma relação entre o conhecimento, o fazer artístico e os conteúdos necessários a aprendizagem. Neste caso observado, acredito que deveria ser levando em consideração, a faixa etária dos alunos. A professora não deveria exigir deles atividades as quais eles ainda não estão preparados para desenvolver. Durante as observações silenciosas pude perceber que a disciplina de artes continua sendo vista como uma disciplina de passatempo, sem agregar conhecimento e estagnada apenas ao fazer, sem justificar aos alunos o porque de tais atividades. Acredito que seja sempre necessário apresentar aos educandos atividades as quais eles possam contextualizar e perceber a importância para que as aulas de arte não continuem sendo vistas como a aula do desenho e da brincadeira.


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1.4. ANÁLISE DO QUESTIONÁRIO RESPONDIDO PELA PROFESSORA A professora de Artes da Escola Estadual de Ensino Fundamental William Richard Schiler é formada em licenciatura em artes plásticas curta e plena na Urcamp de Bagé/RS, ela acredita que a disciplina de artes é muito importante, pois é possível trabalhar com a interdisciplinaridade, desenvolvendo o raciocínio, adquirindo cultura e conhecimento através da arte. Ela avalia seus alunos individualmente de acordo com o desenvolvimento de cada um, expondo os trabalhos dos alunos nos corredores da escola valorizando o trabalho de cada um. Observei que a professora não costumava levar para a sala de aula imagens de obras e também não falou sobre a História da Arte, dificultando a compreensão dos alunos e o desenvolvimento da aula. É imprescindível que o professor utilize imagens em suas aulas, pois a imagem auxilia para a contextualização do conteúdo conforme afirma Barbosa (1980, p.36): “Nosso mundo cotidiano está cada vez mais sendo dominado pela imagem. Há uma pesquisa na França mostrando que 82% da nossa aprendizagem informal se faz através da imagem e 55% desta aprendizagem é feita inconscientemente”. É preciso proporcionar aos alunos leituras de imagens para que essas imagens não sirvam somente como referência, mas como estimulo para a capacidade crítica de cada aluno, ampliando os seus conhecimentos gráficos, para que os mesmos consigam compreender com maior facilidade a proposta do professor, atingindo os objetivos propostos.


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1.5. ANÁLISE DO QUESTIONÁRIO RESPONDIDO PELOS ALUNOS A turma de 6ª série possui 25 alunos, mas somente 23 responderam ao questionário, pois 2 alunos haviam faltado a aula neste dia. Os alunos que responderam o questionário disseram que gostam da disciplina de Artes, isso equivale a 100% da turma, porém é perceptível que o conhecimento levado a eles ainda é muito pequeno. Ao ler os questionários notei que 60,9% dos alunos responderam que não conhecem algum artista, já 39,1% responderam que conhecem algum artista citando Van Gogh, porém alguns deles confundiram artistas plásticos com aristas de novelas. Também é possível perceber que a grande maioria 91,3% nunca visitou uma exposição de Arte e, a linguagem que eles mais conhecem é a do desenho 82,6%. Quando questionados a respeito da África, que é o tema de meu projeto de ensino 95,7 % deles responderam que não conhecem a arte africana e/ou afro-brasileira, e 100% nunca ouviu falar a respeito de algum artista africano e/ou afro-brasileiro. O que me impressionou com o questionário foi que 73,9% dos alunos não sabem que a cultura brasileira está diretamente ligada com a africana. Os questionários me levaram a refletir a respeito da deficiência que a educação brasileira vem sofrendo a muitos anos e também o longo caminho que precisamos trilhar para que de fato exista alguma mudança. Ao analisar os questionários e me deparar com tamanho desconhecimento dos alunos com relação a aspectos culturais e artísticos afro-brasileiros e africanos me perguntei porque os professores resistem em trabalhar esse tipo de temática em sala de aula. Seria por falta de conhecimento e preparo ou porque ainda existe preconceito da parte dos professores para trabalhar essa temática? Prefiro pensar que é por falta de preparo e conhecimento.


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CapĂ­tulo 2 Pesquisa sobre o tema nas artes visuais


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2.1 Origem da arte afro-brasileira Com a chegada dos povos africanos no Brasil, vieram também os costumes, a arte, a religiosidade e a cultura de diferentes partes do continente africano, pois os negros escravizados eram de origens Banto de Angola, Congo, Moçambique, Nigéria, entre outros. Desta maneira, conforme afirma Trindade (2002, p. 34),

Esses povos eram de diferentes origens, de língua e cultura próprias, com grau de desenvolvimento e preocupações ocupacionais diversas, contribuindo para formação dos bens culturais brasileiros, como por exemplo, os diversos tipos de língua, costumes, crendices, culinária, música, danças, vestimentas e principalmente na religiosidade, um dos aspectos de maior importância. Os africanos trouxeram consigo suas divindades, os deuses orixás (forças imateriais), representação das forças da natureza. A partir da chegada dos negros e com o contato destes com os indígenas brasileiros e portugueses, iniciou-se uma miscigenação cultural promovendo o processo de formação cultural brasileira. A partir de 1808 iniciam-se no Brasil investimentos culturais e educacionais, como a inauguração de teatros, bibliotecas, museus e dentre estes a fundação da Academia de Belas Artes. Todavia esta foi uma forma de implementar no Brasil um sistema sociocultural baseado na cultura europeia, que estava na contramão da realidade brasileira.

2.1.1 ARTE AFRICANA O continente africano é composto de uma grande variedade de culturas. Cada uma delas possui seu próprio idioma, sua arte e suas tradições. Apesar de existirem diferenças entre a arte produzida em cada país, as artes africanas possuem certa similaridade quanto às formas, técnicas e crenças religiosas. Isso se deu devido às migrações e a interferência do europeu na cultura africana. Os objetos desenvolvidos pelos africanos não tinham como objetivo serem contemplados, mas sim, para a utilização em rituais e cerimônias religiosas. Logo esses objetos possuem um conjunto


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de significados para a comunidade pertencente que podem ser místicos, emocionais, religiosos, etc.

2.1.1 ÁFRICA DO SUL Bartolomeu Dias, navegador português, em busca de especiarias da Índia em 1487, chegou a Cidade do Cabo, neste período de viagem cartografou todas as baías da então hoje África do Sul, abrindo as portas deste país então desconhecido para a exploração europeia. No início do século XX, em 1902 após a Guerra dos Bôeres, os descendentes de europeus (ingleses e holandeses) que iniciaram a exploração do país, passaram a definir um regime racial para manter o domínio sobre a população nativa. E a partir 1948, este regime racial, chamado de apartheid, ganhou força quando o partido nacional dos brancos, composto pelos Afrikaaners, de origem holandesa, assumiu o poder no país, que privou a grande maioria negra de seus direitos, e contribuiu para garantirem o seu poder no país. O regime do apartheid durou de 1948 a 1994, durante este período o povo da África do Sul sofreu com a discriminação implantada no país, a saúde e educação disponibilizada para os negros era diferenciada da dos brancos. Devido a lei do Ato de Terras Nativas, muitos negros foram expulsos de suas residências forçados a viver em reservas destinadas a negros, eles foram proibidos de comprar terras fora das áreas delimitadas, criando uma grande desigualdade na divisão de terras no país, a catalogação racial para cada criança recém nascida e também foi implantada a Lei do Passe, que impedia os negros de locomoverem-se sem que fosse apresentado passaporte. Devido as leis impostas pelos brancos os negros decidiram lutar contra essas imposições e, acionaram o Congresso Nacional Africano – CNA, que tinha como líder Nelson Mandela, o CNA era uma organização negra clandestina que após o massacre de Sharpeville, decidiu por uma luta armada contra o governo. Em 1962, Nelson Mandela é preso e condenado a prisão perpétua. Somente a partir de 1975, com o fim do império português no país, iniciaram-se os avanços para acabar com o apartheid no país, mas somente em 1991, devido as pressões internacionais o presidente Frederick de Klerk, enfim liberta os líderes políticos, entre eles Nelson Mandela. A África do Sul é um país composto por vários grupos étnicos, entre eles os Nguni, que é formado pelas tribos de Xhosa, Zulu, Swasi e Ndebele, formando assim


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mais da metade da população negra. A população é formada por negros, brancos, asiáticos e os coloured são os mestiços descendentes de africanos, europeus (ingleses e holandeses) e asiáticos. Como se pode ver a África do sul é um país multiétnico, devido a grande miscigenação o país tem onze línguas oficiais, porém o inglês é a língua mais falada no país. As manifestações culturais na África se dão por vários segmentos, entre eles; a música, a religião, o artesanato e as danças.

2.1.3 ARTE SUL AFRICANA A tribo de Ndebele é uma das poucas tribos que ainda cultiva os costumes de seus antepassados, os zulus, apesar de terem sofrido influência ocidental principalmente na religião, eles ainda praticam alguns rituais herdados de seus antecessores. A tribo Ndebele de Gauteng fica situada a 40 km ao norte da cidade de Pretoria, e Pretoria fica a 60 km e Johannesburgo, é uma das menores tribos do país, mas sua arte tem grande destaque em todo o continente.

Mapa Sul Africano (Fonte: http://www.voyagesphotosmanu.com/mapa_da_africa.html)

A maior característica desta tribo são as casas pintadas com formas geométricas e com cores fortes, que servem para reforçar sua identidade cultural. Por ser uma tribo patriarcal, as mulheres são subordinadas aos homens e, ficaram


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incumbidas de fazer todo trabalho que seja manual, por isso, quem produz a arte na tribo são as mulheres, e foi onde elas encontraram liberdade para expor seus sentimentos, suas individualidades, de se colocar como pessoas perante a sociedade e, mais recentemente utilizaram de sua arte para protestar contra do apartheid. As artistas desta tribo têm grande fascínio pelas formas geométricas, utilizam elementos do ambiente em que vivem, todas as pinturas são feitas a mão livre, sem utilização de materiais geométricos que possam auxiliar na pintura. Porém suas pinturas não são feitas aleatoriamente, todas são projetadas antes da sua execução. Tamanha é a preocupação dessas artistas em ter uma boa pintura em suas casas que elas fazem um projeto de pintura que introduz as janelas da casa como parte de sua obra, criam um foco utilizando cores para aliviar a rigidez da geometria. As cores mais utilizadas são verde, vermelho, azul e amarelo, mas isso não impede de observarmos cores variadas em suas pinturas. Com o passar do tempo às pinturas passaram a estar presentes também no interior das casas, e as artistas passaram a produzir artesanatos, devido ao crescimento turístico na região.

Casa e muro da tribo de Ndebele (Fonte: http://www.dreamstime.com/stock-photos-ndebele-house-image9114353)


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Casa da tribo Ndebele (Fonte: http://galatiak12art.blogspot.com.br/2012/04/ndebele-art-and-culture.html)

O grande destaque e quem levou a arte da tribo de Ndebele para o mundo foi a artista Esther Mahlangu. Nascida em Ndebele, em 1935, a artista aprendeu com sua mãe e avó a técnica do esterco de vaca, que serve para fazer o acabamento da casa antes de introduzir o barro para a decoração das paredes e, também, a arte da pintura em muro e paredes, pois é da cultura de sua tribo que esses ensinamentos passem de mãe para filha. Mas foi em sua adolescência que Esther conseguiu ter um bom resultado da sua pintura, introduzindo tintas coloridas que serviram para o desenvolvimento da arte de Ndebele, bem como sua definição artística. Com a evolução de seu trabalho a artista passou a utilizar tintas fluorescentes e a desenvolver técnicas e projetos baseados na arte tradicional. Esther destacou-se tanto pelo seu trabalho que passou a receber encomendas do mundo todo, até ser convidada em 1989 para fazer parte da exposição Magiciens de la Terre (Magos da Terra). Esta exposição teve como curador Jean-Hubert Martin, criada em contraposição à exposição “Primitivismo”, ocorrida no MOMA em Nova York. A exposição “Primitivismo” apenas apresentou a arte nativa, como uma arte estética utilizada somente como fonte de inspiração para artistas modernistas, sem falar da complexidade e qualidade deste tipo de arte. Magiciens de la Terre ocorreu em 1989, no Centro Georges Pompidou e no Grande Hall do Villette em Paris. Jean-Hubert Martin teve como propósito com esta exposição mostrar o valor destas manifestações artísticas como identidade cultural e


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artística. Foi através da mesma que a arte dos Ndebele foi mostrada ao mundo, representada por Esther Mahlangu.

Esther Mahlangu, 1989 (Fonte: http://magiciensdelaterre.fr/artistes_pro.php?id=53)

Em 1975, Hervé Poulain criou a Art Car e convidou o artista Alexander Calder para pintar o seu carro de corrida, um BMW 3.0. Após essa primeira iniciativa de Hervé, outros artistas como Roy Lichtenstein, Andy Warhol, R. Rauschenberg, Matazo Kayama, entre outros, foram convidados a pintar telas móveis com sua arte contemporânea. E a primeira mulher a ser convidada a fazer parte deste projeto foi Esther Mahlangu, em 1991, ela pintou um BMW 525i, levando o reconhecimento da arte sul africana e da mulher para o mundo.


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Esther Mahlangu, 1991 (Fonte: http://en.bmw-art-cars.de/)

Em seguida Esther fez parte de com projeto da marca “Comme des Garçons” e a partir daí nunca mais parou participando de exposições individuais e coletivas pelo mundo todo. Esther e sua tribo foram de fato vistas pelo mundo quando em 2006, Alexandre Herchcovitch lança a sua coleção verão 2007, com peças inspiradas na arte da tribo de Ndebele, incluindo peças criadas pela própria tribo, utilizando muitas cores e miçangas, mostrando as pessoas que a arte africana é contemporânea ao contrário do que a maioria das pessoas pensam, ela não está presa ao passado. O corte das peças também foi inspirado na arte da tribo, Herchcovitch trabalhou com formatos mais quadrados fazendo uma ligação entre a arte dos Ndebele e a cultura punk.


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Alexandre Herchcovitch, 2006 (Fonte: http://mulher.uol.com.br/moda/album/12_spfw_v07_05alexandreherchfeminino_album.htm#fotoNav=9)

Alexandre Herchcovitch, 2006 (Fonte: http://mulher.uol.com.br/moda)

Em 2009, mais uma vez a arte da tribo de Ndebele é levada para a moda. Esther foi convidada para estampar os calçados da coleção Afromania da marca Melissa, ela desembarca pela primeira vez no Brasil para participar do lançamento da coleção inverno 2009 na São Paulo Fashion Week. Esther criou a estampa da sapatilha que foi chamada de carro-chefe da coleção, também colocou sua arte em sandálias e sapatos, mantendo sempre em sua arte suas raízes. Segundo entrevista para o site mdemulher.com.br, Esther respondeu quando questionada a respeito dos significados de suas obras: “Não tem, é apenas bonito. Acontece assim: entre os da comunidade


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Ndebele, é comum pintar a fachada de sua casa. Quando você fica adulto e vai morar em uma casa, você a pinta e chama todo mundo para te visitar. As pessoas comparecem e veem se você pintou direitinho, se sua mãe e sua avó ensinaram bem”.

Melissa Afromania, 2009 (Fonte: http://sandaliamelissa.net/tag/melissa-afromania/)

Melissa Afromania, 2009 (Fonte: http://toddyteste.wordpress.com/page/28/)

Os trabalhos da artista relacionados a moda não pararam por ai, recentemente em 2011 a marca Versace lançou sua coleção primavera/verão 2011 um vestido inspirado nas obras de Esther. Tamanha a diversidade de criação da artista que em cada obra sua desperta tanto na moda quanto na arte, uma nova maneira de ver sua arte. A arte da tribo dos Ndebele pode ser para muitos somente uma arte geométrica, colorida e primitiva, porém ela vai muito além do que se pode ver, é uma arte complexa


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que faz uso de uma simbologia para a composição das obras, sejam elas nas casas ou nas telas produzidas por Esther.

Mahlangu, 2010 (Fonte: http://www.vgallery.co.za/esther2.htm)

Esther Mahlangu, 2003 (Fonte: http://www.nationalgalleryfirenze.it/info/Africa_Today_Roma/index.htm)


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Esther Mahlangu, 2007 (Fonte: http://www.vgallery.co.za/esther.htm)

2.1.4 RUBEM VALENTIM Rubem Valentim, nascido em Salvador/ Bahia em 1922, considerado um artista construtivista e um dos maiores representantes da cultura afro-brasileira, autodidata, inicia suas produções artísticas a partir de 1948, suas primeiras obras fazem referência às tradições populares do nordeste brasileiro. A partir da década de 50 começa a ser influenciado pela cultura religiosa de origem africana como o candomblé e a umbanda. O artista passa a expressar em sua arte formas geométricas conforme indica Felinto (2012, p. 87) “Valentim interessa-se pela geometria, não pelos jogos óticos comuns a essa estética. Sua preocupação é desenvolver o que ele próprio vai chamar de “riscadura brasileira”. O artista foi classificado como concretista, porém o concretismo defendia a racionalidade das formas, Rubem Valentim não se considerava um artista concreto conforme ele mesmo disse: “Nunca fui concreto. Tomei conhecimento do Concretismo através de amizades pessoais com alguns de seus integrantes. Mas logo percebi, pelo menos entre os paulistas, que o objetivo final de seu trabalho eram jogos óticos, e isto não me interessava. Meu problema sempre foi conteudístico ( a impregnação mística, a tomada de consistência de nossos valores culturais, do nosso povo, do sentir brasileiro). Claro,


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mesmo não tendo participado do Concretismo, percebi entre seus valores a ideia da estrutura que se adequava ao caráter semiótico de minha pesquisa plástica. Mas posso dizer que sempre fui um construtivo”. As obras de Rubem Valentim possuem um sentimento místico e poético que está diretamente ligado a religiosidade afro-brasileira, ao chamado “ponto riscado”.

Rubem Valentim, 1987 (Fonte: http://www.catalogodasartes.com.br/)

Valentim, 1981 (Fonte: http://www.catalogodasartes.com.br/)


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É possível identificar nas obras de Rubem Valentim alguns elementos que estão presentes nas representações de alguns orixás, como por exemplo, o machado do orixá Xangô, as flechas do Caboclo 7 Flechas, cada uma representando as vibrações de cada orixá e assim por diante. No entanto, para quem não possui algum conhecimento sobre as religiões de matrizes africanas, identificar alguns elementos que estão representados nas obras de Rubem Valentim pode ser um tanto complicado, porém existem representações que são universais. Todavia o foco desta pesquisa não está em decifrar os elementos que o artista representou em suas obras, mas em valorizá-lo como preservador da cultura afrobrasileira. Por volta do final da década de 60, Rubem Valentim passa a desenvolver esculturas em madeira e relevos mantendo as mesmas características de suas pinturas tornando-se um dos maiores representantes da cultura afro-brasileira tanto no Brasil, quanto no exterior. É possível perceber a semelhança entre as obras de Esther Mahlangu e Rubem Valentim, não só pelo trabalho geometrizado, mas também pelas cores utilizadas, a simbologia e misticismos representados nas obras dos artistas em questão.

Rubem Valentim, 1978 (Fonte: http://www.catalogodasartes.com.br/)


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2.1.5 SIMBOLOGIA ADINKRA A simbologia adinkra é formada por um conjunto de símbolos que representam conhecimentos relacionados às crenças e a história do povo Ashanti. O povo ashanti vive onde hoje está localizado a República de Gana na África ocidental. A iconografia criada pelos Ashanti está baseada na percepção entre o homem e seu meio, ou seja, relações entre o comportamento humano, animal e vegetal. Pode-se citar como exemplo o comportamento do carneiro que está relacionado à sua força e humildade. Este comportamento está representado no símbolo chamado Dwennimmen.

Dwennimmen ─ Simboliza humanidade com a força. (Fonte: http://www.adinkra.org/htmls/adinkra/dwen.htm)

Alguns símbolos adinkra podem ser facilmente relacionados a imagens conhecidas, que não é o caso do Dwennimmen que é um símbolo que dificilmente saberíamos relacionar a imagens conhecidas. Desta maneira, conforme afirma Gibson (2009), Este símbolo “retrata dois pares de chifres de carneiro enrolados fechando um espaço branco. Como esses animais lutam com os chifres, o dwennimmen evoca agressividade”. Seu significado está relacionado com a humildade juntamente com a agressividade, pois segundo a simbologia, o carneiro luta ferozmente contra seu oponente, porém sabe ter humildade na hora do abate. Portanto alguns símbolos servem como reflexão para o comportamento humano seja ele baseado no comportamento dos animais ou na beleza, cheiro ou longevidade das plantas. Assim como nas obras de Rubem Valentim, que possuem significados místicos na simbologia adinkra alguns símbolos são estilizados de tal forma que uma pessoa não iniciada na cultura adinkra dificilmente consegue identificar o significado


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das imagens. Também é possível perceber que alguns símbolos são semelhantes a imagens que conhecemos como é o exemplo do símbolo Akoma, que é a imagem de um coração e logo a relacionaríamos com amor, paixão, etc., porém este símbolo possui um significado bem diferente na simbologia adinkra. O coração, que tem o nome de Akoma é o símbolo da paciência, boa vontade, fé e tolerância, este símbolo costuma ser estampado em roupas usadas em cerimônias matrimoniais devido ao seu significado.

“O coração” (Fonte: http://www.adinkra.org/htmls/adinkra/akom.htm)

Outro símbolo que pode ser relacionado a imagens que conhecemos é o chamado Chefe dos símbolos adinkra. Esta imagem pode ser facilmente relacionada a um alvo, porém para a cultura adinkra este símbolo foi utilizado como inspiração para a criação dos demais símbolos, por isso ele representa a importância do papel da liderança.

Chefe dos símbolos adinkra - Simboliza liderança, carisma e grandiosidade. (Fonte: http://www.adinkra.org/htmls/adinkra/adin.htm)

Os crocodilos siameses possuem um significado bastante interessante e reflexivo, pois representam crocodilos que partilham do mesmo estômago, porém brigam pelos alimentos.


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“Crocodilos Siameses” – Simbolizam a democracia e unidade. (Fonte: http://www.adinkra.org/htmls/adinkra/funt.htm)

2.1.6 MESTRE DIDI Mestre Didi - Deoscóredes Maximiliano dos Santos- artista plástico e escritor, foi um dos maiores ícones e cultivadores da cultura negra no Brasil. Filho de uma renomada ialorixá baiana, desde a infância manipula materiais e desenvolve objetos de cunho ritual. Em seus trabalhos utiliza materiais orgânicos e também materiais utilizados em rituais místicos como contas, búzios, entre outros elementos sagrados. Mestre Didi foi um sacerdote artista. Suas inspirações para criar suas obras estão diretamente relacionadas a sua intimidade com a religião, logo cria suas obras inspirado nos elementos rituais das religiões afro-brasileiras. Para entendermos melhor a arte de Mestre Didi é preciso que se conheça um pouco sobre alguns orixás, pois o artista transfere para suas obras conhecimentos e simbologias que somente os iniciados na religião afro-brasileira conseguem compreender, assim como pode-se notar nas obras de Rubem Valentim, ambos expressam através da arte conhecimentos sagrados sobre as religiões afro-brasileiras. Conforme ele mesmo afirmou no vídeo Mestre Didi Arte Ritual desenvolvido

pelo

site

Arte

na

Escola

que

está

disponível

em

<https://www.youtube.com/watch?v=LnQPR2kfgro>: “Os meus trabalhos estão inspirados na natureza, na Mãe Terra – lama, representada pela orixá Nanã, patrona da agricultura”.


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As obras criadas por Mestre Didi estão baseadas em quatro orixás, Oxumare, traduzido como arco-íris carrega consigo a sabedoria. Na figura abaixo pode-se ver uma das suas representações humanas.

Oxumare (Fonte: http://www.raizesespirituais.com.br/orixas/oxumare)

Todavia nas religiões de matriz africana é representado como uma cobra, pois pode sair da terra ir até os céus e voltar, completando os ciclos da existência. O arco-íris pode ser interpretado como uma ligação entre os céus e a terra. Abaixo segue a imagem de uma obra de Mestre Didi representando o orixá Oxumare.

Mestre Didi, 2002 (Fonte: http://murilocastro.com.br/2008-mestre-didi-da-ancestralidade-a-contemporaneidade/)


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Outro orixá que inspirava o artista a desenvolver sua arte era Nanã. Ela representa o princípio feminino na Terra, esse orixá assume as características de mãe e avó representando uma forma mais madura, calma e sábia da maternidade.

Nanã (Fonte:http://dallablog.zip.net/arch2007-07-01_2007-07-31.html)

Mestre Didi, ano desconhecido. (Fonte: http://murilocastro.com.br/2008-mestre-didi-da-ancestralidade-a-contemporaneidade/)


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Mestre Didi recriou o Ibiri, emblema de Nanã, que pode ser interpretado na cultura religiosa afro-brasileira como um filho que Nanã carrega nos braços. Já o orixá Obaluaê representa o princípio masculino na Terra.

Obaluaê (Fonte: http://universodaumbanda.blogspot.com.br)

O artista representa o orixá Obaluaê com uma forma ereta, que pode nos levar a relacionar com a sexualidade masculina, diferente da representação feminina que possui um arco na sua extremidade que pode estar diretamente ligado aos ciclos femininos.

Mestre Didi, 2003 (Fonte: http://murilocastro.com.br/2008-mestre-didi-da-ancestralidade-a-contemporaneidade/)


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Ossaim também é representado nas obras de Mestre Didi. Orixá que representa a natureza, como se pode ver na figura abaixo. Mestre Didi fez uma recriação do orixá Ossaim. Ele utilizou a simbologia do orixá para desenvolver sua arte. Na imagem é possível ver um pássaro na copa de uma árvore, a parte central da escultura representa a árvore e a cobra em volta representa o orixá Oxumarê. É possível perceber nas obras de Mestre Didi o quanto ele expressava conhecimentos religiosos e místicos em cada uma delas. A natureza e a simbologia estão diretamente ligadas a estas obras que em um primeiro olhar não é possível decifrá-las, somente com estudos mais aprofundados é que se pode relacionálas aos orixás e a religiosidade afro-brasileira.


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CAPÍTULO 3 PROJETO E PRÁTICA DE ENSINO EM ARTES VISUAIS


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3.1 Dados gerais do Projeto de Ensino Título do Projeto: Influência da cultura africana na construção da cultura afro-brasileira.

Tema: O tema do Projeto de Ensino trata a respeito da influência da cultura africana na formação cultural brasileira, sua importância em conhecê-la e respeitá-la. Para melhor compreensão da formação cultural brasileira e a influência da cultura africana sobre a mesma foram pesquisadas imagens urbanas, de florestas e de tribos para desestereotipar a imagem do continente africano. Também foram pesquisados os artistas brasileiros; Rubem Valentim, Mestre Didi, devido a grande importância destes dois artistas na formação e preservação da cultura afro-brasileira, a artista africana Esther Mahlangu, e a simbologia Adinkra.

Justificativa: A formação cultural brasileira é pouco conhecido pelos educandos, apesar de existir a lei 11.645 que tornou obrigatório o ensino sobre História e cultura afrobrasileira e indígena nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, públicos e privados. Os educandos pouco conhecem a respeito da cultura a qual estão inseridos. Portanto o ambiente escolar torna-se propício para que o educando tenha a oportunidade de conhecer, apreciar, interpretar e contextualizar os diversos significados que a cultura afro-brasileira e africana possuem.

Objetivo Geral: O objetivo geral do projeto de ensino busca desenvolver a compreensão dos alunos quanto a importância da contribuição que os afro-brasileiros e africanos tiveram na formação cultural brasileira. Bem como valorizar e respeitar a religiosidade e costumes dos mesmos.


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Objetivos Específicos: 

Compreender e valorizar os aspectos culturais e simbólicos da cultura afrobrasileira e africana.

Conhecer características fundamentais da cultura afro-brasileira e africana.

Desenvolver a capacidade crítica através das leituras de imagens.

Experimentar materiais diversos.

Desenvolver a capacidade imaginária e criativa.


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3.2 PRÁTICA DE ENSINO 3.2.1 Primeiro Encontro Aula 01 ( 90 minutos – 1 hora/ aula). Data: 18/09/2012 – Terça-feira. Horário 3° Período. Das 09h25 min. às 10h15min.

Tema da aula: Descobrindo a África.

Conteúdos: 

Apresentação do Mapa Mundi.

Leitura de imagens de centros urbanos, savanas e tribos africanas de diferentes

partes do continente africano. 

Relações entre Brasil e África.

Lista de atividades: 

Localizar o continente Africano no mapa.

Observar, discutir e apreciar as imagens apresentadas.

Participação na construção do cartaz.

Objetivos: 

Identificar a África como continente e saber localizá-la no mapa.

Identificar características da cultura africana.

Refletir e relacionar a respeito do que o Brasil e a África tem em comum.

Metodologia: 

Aula expositiva dialogada.

Leitura de imagem.


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Recursos Materiais: 

Mapa mundi.

Computador e projetor (data show).

Tesoura.

Cola.

Cartolina.

Revistas.

Avaliação: 

Verificar a compreensão dos alunos com relação às imagens apresentadas

contextualizando essas imagens à cultura e ao país em que vivem. 

Analisar as ideias desenvolvidas através do trabalho prático e da identificação dos

cruzamentos culturais. 

Critérios utilizados pelos alunos para o desenvolvimento do trabalho prático.

Planejado: Primeiro será apresentado aos alunos o mapa mundi para que através de um diálogo com a turma eles possam identificar a África como um continente que possui vários países. Essa identificação se dará através de questionamentos como, por exemplo: Onde fica a África? A África é um continente ou um país?

Mapa geográfico da África (Fonte: http://www.baixarmapas.com.br/mapa-da-africa/)


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Após esse diálogo, serão apresentadas aos alunos diversas imagens, entre elas estão imagens urbanas das cidades de Maputo, capital de Moçambique, Nairobi, no Quênia e Luanda, na Angola, de paisagens, de animais e de diferentes tribos de diferentes países para que os alunos possam perceber que o continente africano possui vários países e, como em qualquer outro país, possui cidades com avenidas, parques e prédios, mas que também tem as savanas com diversos tipos de animais e tribos cada uma com a sua própria cultura. Iniciarei a apresentação de imagens mostrando imagens urbanas das cidades de Maputo, capital de Moçambique, Nairobi, no Kênia e Luanda, na Angola. Todas essas imagens são imagens aéreas que podem ser comparadas às cidades brasileiras.

Maputo – Capital de Moçambique (Fonte: http://www.tripadvisor.com.br/Tourism-g293818-Mozambique-Vacations.html#22480369)


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Nairobi – Capital do Quênia (Fonte: http://www.silverbirdsafari-africa.com/blog/uncategorized/nairobi/)

Luanda – Capital da Angola (Fonte: www.lusomotores.com/index.php?option=com_content&view=article&id=28621:conduzir-emluanda&catid=305:via-rapida&Itemid=212)

Após as imagens urbanas, serão mostradas aos alunos imagens de paisagens africanas como savanas, florestas com árvores gigantes da ilha de Madagascar, montanhas, animais em meio a florestas, rios, girafas, rinocerontes, elefantes, zebras, gorilas etc.


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Savana – Quênia (Fonte: http://www.treklens.com/gallery/Africa/Kenya/photo262134.htm)

Floresta de Madagascar (Fonte: http://clydeandnora.blogspot.com.br/2012/03/adventuresmadagascar.html )


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Gorila (Fonte: http://www.africansecretsafaris.com/asf/ug7dayqueen.html)

Na seqüência serão apresentadas imagens das tribos Zulu da África do Sul, Pigmeus de Camarões, Samburu do Kênia, tribo Mursi da Etiópia, tribo Himba da Namíbia, tribo Kikukyu do Kênia, tribo Surma da Etiópia, tribo Daasanach do Kênia, tribo Ndebele na África do Sul, tribo Boroboro da Nigéria e os Quilombolas brasileiros.

Tribo Zulu da África do Sul (Fonte: http://lmargarito.blogspot.com.br/2012/06/zulu-and-andean-indian-tribes.html)


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Mulheres da Tribo Himba (Fonte: http://nerissak.blogspot.com.br/2011/07/africa-himba-women-and-baobab-trees.html )

Mulher da Tribo Daasanach (Fonte: http://laprovitera.blogspot.com.br/)


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Mulher tribo Samburu (Fonte: http://www.flickriver.com/groups/1486850@N20/pool/interesting/)

Após a apresentação das imagens, os alunos serão questionados a respeito do que mais chamou a atenção deles nas imagens vistas. Essas impressões serão escritas no quadro. Durante esta conversa eles também serão questionados se essas imagens observadas podem ter alguma relação com a nossa cultura, se existe alguma relação entre essas imagens e o Brasil. Logo após essas reflexões os alunos formarão grupos para a confecção de cartazes com imagens de revistas que indicam possíveis relações existentes entre o Brasil e o continente africano.

Realizado: Devido à forte chuva, poucos alunos foram à escola, a direção da escola decidiu então unir as turmas 61 e 62 em uma mesma sala. Unindo as turmas a sala ficou com catorze alunos. Iniciei a aula com uma conversa com os alunos falando a respeito do projeto de ensino. Dois alunos que estavam sentados no fundo da sala começaram com piadinhas e deboches. Olhei com uma expressão bem séria para os dois e, expliquei a eles que a partir daquele momento eu era a professora de artes e que eu não iria tolerar em nenhuma das minhas aulas desrespeito comigo e com o restante da turma. Confesso que não me senti nem um pouco intimidada pelos alunos, pois acredito que este tipo de atitude que eles vieram a ter foi somente como teste para ver quais eram seus limites


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comigo. Com o mapa mundi pendurado no quadro, comecei perguntando à turma se eles sabiam onde fica a África. Somente um aluno levantou o braço, pedi que ele se levantasse e viesse até o mapa mostrar para seus colegas a localização do continente. Ele levantou-se um tanto envergonhado, mostrou onde localiza-se a África, eu o agradeci e pedi para que voltasse ao seu lugar. Perguntei a turma se a África era um país ou continente? Cinco alunos responderam de imediato: ─ Um continente!

Fiz mais uma pergunta, e o que tem em um continente? ─ Muitos países! ─ Muitas cidades e pessoas!

E assim quebramos o gelo e parti para a apresentação das imagens. Os alunos estavam eufóricos, pois não estão acostumados a ter aulas com a utilização do data show. Pedi que os alunos sentassem bem ao centro da sala de aula, para que pudéssemos ficar mais perto uns dos outros, e para podermos conversar a respeito das imagens. Logo que iniciei a apresentação de imagens, iniciaram os questionamentos. As primeiras imagens selecionadas eram de centros urbanos, para que os alunos pudessem perceber que a África possui centros urbanos como qualquer outro país. Os primeiros comentários começam a surgir - Nossa! Não sabia que na África tinha cidades como aqui no Brasil, achei que só tivesse mato, bicho e pobreza!

Quando comecei a conversar com os alunos a respeito das cidades, a professora de Educação Física parou na porta da sala e ficou observando minha aula sem pedir licença. Como eu estava envolvida com a leitura de imagem, nem percebi que ela estava ali, os alunos que chamaram a minha atenção. Então ela disse aos alunos que tinha um recado, avisou que um galho havia caído sobre a rede elétrica e que os alunos não deveriam colocar a mão no portão, pois poderia haver corrente elétrica e saiu. Não achei pertinente a sua postura, pois “invadiu” minha aula sem pedir permissão e saiu sem ao menos agradecer, mesmo assim dei continuidade à aula sem que os alunos percebessem minha insatisfação. Seguimos com as imagens, os alunos ficaram


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impressionados com os animais e os comentários seguiram, o que mais me chamou atenção foi este, quando a aluna viu a imagem do rinoceronte;

- Olha! Esse bicho tem no zoológico, eu vi uma vez quando fui lá, igualzinho!

Rinoceronte (Fonte: http://www.your-travelsite.com/category/africa/)

Cinco alunos não estavam participando da atividade de leitura de imagens, dois sentaram em um canto da sala e outros três num outro canto. Perguntei a eles porque não estavam participando da atividade, eles simplesmente deram de ombros. Prossegui a aula mesmo sem a participação dos mesmos. Novamente a professora de Educação Física parou na porta e os alunos me alertaram que ela estava ali. Desta vez, tive uma postura diferente, perguntei a ela se eu poderia ajudá-la, pois ela estava atrapalhando minha aula. Ela me respondeu ríspida dizendo que só tinha mais um aviso aos alunos e que não voltaria a me atrapalhar. Prossegui a aula agora com imagens das tribos africanas. Ao mostrar a imagem dos pigmeus, ouve um espanto de toda a turma, eles ficaram impressionados com a estatura deles e perguntam: ─ Por que são tão pequenos? ─ Como eles ficaram assim?


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Pigmeus (Fonte: http://arquivosdoinsolito.blogspot.com.br/2012/05/descobertos-genes-envolvidos-na-baixa.html)

Expliquei a eles que isso faz parte da genética dessa tribo, assim como existem pessoas com olhos claros e pessoas com olhos castanhos, existem pessoas com baixa estatura como as pessoas desta tribo. Perguntei a eles se compreenderam a minha explicação, todos dizem que sim e seguimos com as imagens. A professora titular seguidas vezes passava em frente à sala para verificar se os alunos estavam comportando-se bem. O aluno Darlan, o qual não estava participando da atividade, mas estava ouvindo e vendo tudo, começou a colocar apelidos e fazer piadas com os colegas. Falei a eles que não permitiria falta de respeito em minhas aulas, a professora titular ouviu tudo e chamou a diretora. A diretora da escola veio e passou cerca de 10 minutos conversando com os alunos, mais uma vez tive a aula interrompida. Assim que ela terminou, seguimos com a aula. Tentei ser um pouco mais rápida para que desse tempo dos alunos iniciarem a atividade prática, mas os alunos estavam tão curiosos e entusiasmados com a aula que não tive coragem de acelerar o processo. É importante entender que muitas vezes o mais importante não é cumprir todo o planejado para a aula, mas respeitar o interesse e desenvolvimento dos alunos conforme suas necessidades. Ao apresentar a imagem de uma moça da tribo Samburu – Quênia, a turma logo se impressionou com a imagem, pois a mulher possui uma espécie de tiara com flores, que fica posicionada no sentido da testa para a nuca.


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Mulher tribo Samburu (Fonte: http://www.flickriver.com/groups/1486850@N20/pool/interesting/)

Sem que eu dissesse uma palavra a respeito, eles começaram a fazer suas leituras da imagem, um menino relacionou a tiara com o cabelo moicano, e em seguida outro aluno diz: ─ Parece o cabelo do Neymar!

Nesta mesma imagem a moça possui um tipo de expansor na orelha, que também originou muitos comentários tais como: ─ Eu tenho um amigo que tem um tipo esse sora [sic]. ─ Depois que coloca isso ai a orelha não volta mais pro lugar, né?

Expliquei a eles que os expansores usados hoje em dia, que eles costumam ver nas pessoas, são cópias, inspirações destes adornos usados por tribos africanas e indígenas. Utilizar expansor na orelha é muito mais antigo do que eles podem imaginar. Questionei a turma para que observassem o que as mulheres desta tribo utilizam no pescoço, eles responderam com tom irônico; colares! Instiguei-os mais uma vez e esses colares do que vocês acham que são feitos? Um dos alunos diz: ─ São aquelas bolinhas, agora não me lembro do nome.


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Falei para a turma que o nome das bolinhas são miçangas, as mesmas que são utilizadas para fazer as pulseirinhas que usamos. Eles olham entre si com expressões de espanto. A tribo Himba também causou curiosidade.

Mulheres Himba (Fonte: http://nerissak.blogspot.com.br/2011/07/africa-himba-women-and-baobab-trees.html)

As mulheres desta tribo utilizam barro para criar seus penteados. Uma aluna espantou-se quando eu falei que nesta tribo as moças utilizam barro para arrumar seus cabelos e ela me perguntou: ─ Por que elas passam barro na cabeça?

Antes que eu pudesse responder, outra menina comenta: ─ Porque elas não tem creme! A gente passa creme e elas passam barro!

Expliquei a elas que é mais ou menos isso, passar barro no cabelo pode significar uma identificação para a tribo delas ou pode servir para proteger e hidratar o cabelo, assim como para nós passar creme não possui um significado, serve somente para facilitar o penteado, hidratar e deixar o cabelo cheiroso. Muito interessante a relação que as alunas fizeram, conforme indica Medeiros (2010) os sentidos atribuídos a uma imagem estão comprometidos com o contexto e com as vivências de cada leitor.


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Continuei com a sequência de imagens, apresentei a Tribo Kikuyu, em uma das fotos apareciam às pessoas da tribo em uma espécie de dança.

Kikuyu dance (Fonte: http://www.trekearth.com/gallery/Africa/Kenya/East/North_Eastern/photo675243.htm)

Ao ver essa imagem um aluno comenta: ─ Olha sora [sic] Parece carnaval!

Ao lado desta imagem há um integrante da tribo que veste uma espécie de cocar em sua cabeça.


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Guerreio da Tribo Kikuyu (Fonte: http://www.flickr.com/photos/mytripsmypics/5811234398/)

Imediatamente o relacionaram com os índios brasileiros e uma aluna me questionou: ─ Sora [sic], as pessoas dessa tribo, vem para o Brasil lutar com os índios brasileiros, né?

Expliquei a eles que os índios brasileiros e essa tribo africana, não se conhecem, talvez nem saibam da existência uns dos outros, pois eles vivem em tribos, assim como os índios brasileiros vivem em aldeias. No Brasil os índios que usam cocares são os caciques, então o cocar serve para identificar o líder da tribo. Nessa tribo africana também pode ser que eles usem cocares para identificar o líder da tribo, mas também pode ser um adorno utilizado para a guerra ou caça. Em meio a minha explicação, o aluno Vitor levantou o braço e fez a seguinte observação: ─ Professora! Esse brinco que a senhora está usando não é “meio” africano?

Então retirei meus brincos e mostrei aos alunos, expliquei a eles que comprei o brinco de um africano em numa feira de artesanato. Fiquei surpresa com a observação do aluno, pois foi um detalhe que nem eu mesma tinha me dado conta, simplesmente coloquei os brincos e fui para a escola. Importante destacar o quanto os alunos são


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observadores e prestam atenção em pequenos detalhes que muitas vezes passam despercebidos, fiquei muito feliz com a observação do aluno. Na imagem seguinte, ainda da tribo Kikuyu uma aluna faz uma observação curiosa: ─ Sora [sic], essa “coisa” que eles estão usando por cima, parece poncho de gaúcho, né?

Dançarinos da Tribo de Kikuyu (Fonte: http://www.photostaud.com/africa/kenya/kikuyu-people/2050-african-people-kikuyu-kenya.html)

Através desta observação da aluna é possível perceber como os alunos são capazes de fazer boas relações entre características da cultura a qual estão inseridos e uma outra cultura diferente da sua. Prossegui a aula, chegando nas imagens da tribo de Ndebele.


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Casa da tribo Ndebele (Fonte: http://galatiak12art.blogspot.com.br/2012/04/ndebele-art-and-culture.html)

Casa e muro da tribo de Ndebele (Fonte: http://www.dreamstime.com/stock-photos-ndebele-house-image9114353)


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Esther Mahlangu , 2010 (Fonte: http://www.vgallery.co.za/esther.htm)

Esther Mahlangu, 2010 (Fonte: http://www.vgallery.co.za/esther2.htm)

A turma ficou muito impressionada com os desenhos geométricos e cores das pinturas das casas e da arte de Esther Mahlangu. Eles me questionaram como as mulheres da Tribo dos Ndebele conseguiam aquelas cores para pintar. Expliquei que antigamente não existiam tantas variedades de cores e elas utilizavam terra, urucum entre outros materiais vindos da natureza para fazer sua arte. Hoje eles já possuem tintas feitas pela indústria para colorir suas casas. Prosseguindo com a leitura de imagens, chegamos a uma imagem na qual existem mulheres com trajes muito coloridos.


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Sem nome (Fonte: http://www.wildlife-photo.org/)

Uma aluna fez o seguinte comentário ao observar esta imagem: ─ Sora [sic]! Na África o céu é azul como o nosso?

Respondi que sim, exatamente igual. E ela me disse: ─ Nossa! Eu achei que o céu lá era preto!

Me surpreendi com o comentário da aluna. Refleti sobre o quanto as crianças possuem ideias negativas quando se fala sobre o continente africano. Me perguntei o que levou esta menina a pensar que o céu africano era preto, seria uma relação imaginária com a pobreza, fome e outras tantas imagens negativas e estereotipadas que eles costumam ver na televisão? A partir da fala dessa aluna percebi o quanto é importante e necessário trabalhar nas escolas as questões afro-brasileiras, africanas e indígenas para que estes alunos cresçam com um olhar mais crítico e desestereotipado quando se trata de uma cultura diferente da sua. Os comentários dos alunos prosseguiram:

─ Olha! Eles estão de pés descalços! Sora [sic] Por que eles não usam calçados?


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Respondi que eles não usam calçados porque faz parte da cultura deles andar descalços. Expliquei que faz parte do nosso dia a dia usar calçados e para eles é normal não usar, assim como os índios brasileiros que andam descalços. É interessante permitir que os alunos façam suas próprias leituras de imagens, pois uma imagem permite diferentes interpretações e significados conforme explica Pillar (2003, p79): “Essas leituras mostram a diversidade de significados, o quanto o contexto, as informações, as vivências de cada leitor estão presentes ao procurar dar um sentido para a imagem.” Essa primeira atividade com a turma foi muito proveitosa e me surpreendeu muito. Fui para este primeiro encontro focada a instigar os alunos a desenvolverem suas próprias leituras de imagens e a contextualizar essas imagens com o cotidiano de cada um. Para minha surpresa, tudo ocorreu ao natural. Os alunos estavam tão empolgados e tão à vontade comigo e eu com eles, que fizeram quase que por conta própria suas leituras de imagens. Atingindo o objetivo de relacionar as imagens com o cotidiano, com a nossa cultura, e desmistificar as ideias que tinham com relação à África e seu povo ampliando assim a visão cultural e de mundo, quebrando paradigmas e preconceitos. As imagens apresentadas não eram de “Arte”, mas conforme Anamélia Buoro salienta; [...] as linguagens manifestadas desde os primeiros momentos da história do homem e estruturada em cada época e cultura, de maneira singular, o conhecimento dessa linguagem contribuirá para maior conhecimento do homem e do mundo. Portanto a finalidade da Arte é propiciar uma relação mais consciente do ser humano no mundo e para o mundo, contribuindo na formação de indivíduos mais críticos e criativos que, no futuro, atuarão na formação da sociedade (BUORO 2003, p.32).

As imagens permitiram aos alunos além de ampliarem seus conhecimentos e visão de mundo, expressarem seus pensamentos assim como seus questionamentos e curiosidades acerca das imagens apresentadas. A cada imagem que foi vista por eles era possível visualizar as expressões de espanto, curiosidade e até mesmo de vergonha devido a uma imagem em que uma integrante de uma tribo deixava aparecer sutilmente um de seus seios. Terminei a apresentação das imagens e solicitei que os alunos formassem grupos para a confecção dos cartazes. Expliquei a eles que ia distribuir


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cartolinas, tesouras, colas e revistas e que eles deveriam procurar nas revistas imagens que eles poderiam relacionar ao Brasil e às imagens que acabamos de ver. Nesta atividade a turma toda participou do trabalho prático, inclusive aqueles alunos que não quiseram participar da leitura de imagem. Notei no trabalho prático que os alunos que participaram da leitura de imagem conseguiram compreender de maneira satisfatória o conteúdo trabalhado em aula. Foram capazes de entender e relacionar as imagens vistas na apresentação e as imagens pesquisadas por eles nas revistas. Segundo Rossi (2003, p.38): “O aluno estabelece essa relação quando demonstra acreditar que a imagem é, literalmente, a representação do mundo, das coisas que existem ou acontecem”. Eles foram capazes de relacionar aspectos estéticos, tais como estampas, cores, a utilização de miçangas para a produção de colares e roupas. Também notei que os alunos colocaram uma imagem de uma moça, aparecendo seu seio, talvez relacionando esta imagem, à imagem vista durante a apresentação dos slides.

Trabalho dos alunos Mahara, Thaisa, Julia e Elias (Fonte: DALLA COSTA, 2012)

Este grupo de alunos utilizou outros tipos de critérios para a seleção de suas imagens, relacionaram imagens urbanas, de guerras e negros vencendo em competições olímpicas. Fazendo assim outra leitura de imagem bem diferente da anterior. É possível notar neste trabalho que os alunos conseguiram entender que no continente africano


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existem cidades semelhantes a qualquer cidade no mundo, também foi muito positivo perceber a relação que eles fizeram com o negro vencendo em competições. Realizaram suas produções artísticas comunicando suas ideias que foram contextualizadas com o conteúdo estudado e discutido durante a aula. Também foi muito interessante observar enquanto os alunos trabalhavam na atividade que eles se organizaram muito bem, conversavam e discutiam sobre as imagens que usariam para construir o trabalho. Tudo de forma pacífica e bem organizada.

Trabalho dos alunos Erick, Andressa e Douglas (Fonte: DALLA COSTA, 2012)

De acordo com o trabalho prático realizado pelos alunos que não participaram da leitura de imagens pude perceber que os mesmos não expressaram através da atividade seus conhecimentos relacionados à África, permaneceram com a ideia de que a única relação entre Brasil e África é que ambos países possuem negros, sem fazer qualquer relação com sua cultura e cotidiano. No entanto é preciso ressaltar que os educandos conseguiram selecionar muito bem as imagens, pois as revistas que eu havia entregue a eles não tinham sido pré selecionadas, ou seja, eram revistas que


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geralmente não dão ênfase a pessoas negras e, que as vezes sequer aparecem negros em suas edições.

Trabalho dos alunos Darlan, Katiele e Márcia (Fonte: DALLA COSTA, 2012)

Meu primeiro encontro com os alunos ocorreu melhor do que o esperado. Apesar dos alunos não terem o hábito da prática de leitura de imagens, eles participaram da aula de uma maneira construtiva através das suas falas e questionamentos a respeito das imagens apresentadas. Conseguiram relacionar as imagens das tribos africanas com conhecimentos adquiridos no cotidiano escolar e de vida de cada aluno. Durante a prática artística os alunos que participaram da leitura de imagens souberam expressar melhor o conteúdo estudado, relacionando imagens que vimos com imagens que encontraram nas revistas. O único fato que me aborreceu nesta aula foi a postura da professora de Educação Física que interrompeu a aula sem pedir licença. Se os adultos que compõe o ambiente escolar não sabem dar exemplo de respeito e educação aos alunos, como querem cobrar tal postura dos mesmos. É necessário que os educandos façam uma reflexão diária sobre como é a sua postura na escola e em sala de aula, pois se não dão bons exemplos, não podem cobrar dos alunos um bom comportamento dentro do ambiente escolar.


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3.2.2 Segundo Encontro. Aula 2 ( 90 minutos – 1 hora/ aula). Data: 19/09/2012 – Quarta-feira. Horário 1° Período. Das 07h45 min às 08h35min.

Tema da aula: Kiriku e a feiticeira.

Conteúdos: 

Apresentação do filme Kiriku e a feiticeira.

Lista de atividades: 

Os alunos irão assistir o filme Kiriku e a feiticeira.

Objetivos: 

Apresentar aos alunos a lenda do filme Kiriku e a feiticeira para que eles possam

através do filme observar características de como vive uma tribo na África. 

Observar as características da tribo, vestimentas, casas, adornos usados por eles,

animais, vegetação típicos da África e os instrumentos utilizados para fazer música.

Metodologia: 

Apresentação de vídeo.

Recursos Materiais: 

Vídeo ou Computador e projetor (data show).

Avaliação: 

Interesse durante a apresentação do filme.

Questionamentos e curiosidades levantadas pelos alunos durante a apresentação do

filme.


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Anotações sobre o filme. Planejado: Ao iniciar a aula, os alunos serão informados que irão assistir a um filme

chamado Kiriku e a feiticeira. O filme Kiriku e a feiticeira conta a lenda de uma criança que, ainda no ventre de sua mãe, pode comunicar-se com ela. Assim que nasce Kiriku, pergunta a sua mãe onde estão seus familiares, dentre eles seu pai, tios e os outros homens da tribo. Sua mãe explica que todos foram lutar contra Karabá, a feiticeira e todos foram comidos por ela. O único homem que restou na tribo foi seu tio que está saindo para lutar contra a feiticeira, pois ela lançou um feitiço sobre a tribo que os deixou sem água. Então Kiriku resolve ir atrás de seu tio para ajudá-lo em sua missão. Kiriku é um menino muito pequeno, mas com características adultas, muito corajoso e inteligente, porém por ser pequeno acaba sendo subestimado pelas pessoas de sua tribo.

Kiriku e a Feiticeira, 1998 (Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=x-DgTQiHKdE)

Kiriku pergunta a sua mãe porque a feiticeira é tão má, sua mãe não sabe responder, mas diz ao menino que somente o sábio da montanha, que é seu avô, pode responder as suas perguntas. Kiriku pergunta onde seu avô mora, e sua mãe diz que é depois da montanha proibida; para chegar lá, ele teria que passar pela feiticeira. A feiticeira não permite que ninguém passe, pois o sábio da montanha ensina as coisas como elas são e a feiticeira precisa que as pessoas acreditem nas ilusões. O menino


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então decide que quer ir ver seu avô do outro lado da montanha. Sua mãe explica que ele não conseguirá passar pelo sentinela da feiticeira. A mãe de Kiriku sai com ele escondido em sua saia, para que o sentinela não os veja, se disfarça colhendo ervas. Então ela entrega ao menino o punhal de seu pai e o deixa próximo ao cupinzeiro. O menino entra no cupinzeiro e consegue chegar do outro lado da montanha proibida, encontrando seu avô. Ao encontrar o seu avô, Kiriku pergunta a ele porque Karabá, a feiticeira, devora os homens. Seu avô então explica que ela não devora os homens, mas que ela nunca desmentiu a lenda, pois quanto mais medo as pessoas têm, mais poderosa ela se torna.

Kiriku e a Feiticeira, 1998 (Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=x-DgTQiHKdE)

O sábio da montanha explica para o menino que a feiticeira não gosta das pessoas e quer lhes fazer todo o mal possível, porque ela sofre dia e noite. O sofrimento da feiticeira deu-se porque colocaram em sua coluna vertebral um espinho envenenado e para conseguir retira-lo somente com a força dos dentes, este é o grande segredo da feiticeira. E se alguém um dia conseguisse retirar o espinho de sua coluna, ela sentiria uma dor acima do que se pode imaginar. Mas existe outra razão pela qual Karabá jamais permitiria que alguém lhe arrancasse o espinho. É este espinho que lhe dá poderes mágicos, por esse motivo ela nunca sai de casa e procura não ficar de costas.


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Kiriku e a Feiticeira, 1998 (Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=x-DgTQiHKdE)

Kiriku então tem uma ideia para tirar a feiticeira de sua cabana. Ele cava um buraco, rouba as joias da feiticeira e as enterra na floresta. Ela resolve sair de sua casa para buscar suas joias e pegar Kiriku. Enquanto ela se abaixa para pegar suas joias, Kiriku, que está em cima de uma árvore, pula em suas costas e retira com os dentes o espinho. A feiticeira dá um grito muito alto, que todos na floresta podem ouvir. Imediatamente toda a maldade e sofrimento de Karabá somem, ela pergunta ao menino como pode retribuir a gratidão que tem por ele, ele pede que ela case-se com ele. Karabá recusa-se, pois Kiriku ainda é um menino, então ele pede a ela que ela encoste seus lábios aos dele. Kiriku então cresce e torna-se um homem.

Kiriku e a Feiticeira, 1998 (Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=x-DgTQiHKdE)


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Na aldeia todos acreditam que o menino está morto, até que ele aparece junto de Karabá. Todos duvidam que aquele homem seja Kiriku, todos o julgam por ele estar junto da antiga feiticeira e o mandam embora. A mãe de Kiriku vai até ele e o reconhece, mas todos continuam a julgar Karabá e ameaçam mata-la. Nisto os homens que haviam sumido da aldeia aparecem fazendo música com seus tambores, trazendo o avô de Kiriku.

Kiriku e a Feiticeira, 1998 (Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=x-DgTQiHKdE)

O sábio explica que Karabá mudou e que a tribo deve perdoá-la. Ela nunca comeu os homens, só os transformou em objetos e Kiriku libertou a feiticeira do mal libertando assim os homens do encanto. Após o término do filme os alunos farão anotações a respeito do que mais chamou a atenção, podem ser diferenças ou semelhanças a algo que conhecem ou qual a mensagem que o filme passou a eles.

Realizado Devido a mais um dia de forte chuva, poucos alunos foram à escola. Então a professora titular reuniu mais uma vez as turmas 61 e 62 numa mesma sala. Solicitei que os alunos levassem um caderno para anotações. Levamos os alunos até o segundo andar da escola, pois é lá que fica a sala de vídeo e o data show. Ao chegarmos ao segundo andar da escola, a porta de entrada estava chaveada. A professora titular


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desceu para solicitar que alguém viesse abri-la, a moça que faz a manutenção da escola demorou cerca de 15 minutos para vir abrir a porta e quando veio, andava bem devagar. A professora titular me pediu desculpas pelo ocorrido, pois ficou muito chateada com a atitude de quase deboche da funcionária. Entrei na sala e demorei em torno de 5 minutos para organizar tudo até iniciarmos o filme. Os alunos estavam um pouco agitados, mas devido ao som baixo das caixinhas de som, logo todos fizeram silêncio para poderem ouvir o filme. Enquanto os alunos assistiam ao filme, pude observar que todos assistiam interessados, e faziam suas anotações. Também foram perceptíveis suas expressões de espanto e curiosidade de como o menino Kiriku iria vencer a feiticeira, percebi isso devido aos comentários baixinhos que faziam entre si. Ter proporcionado aos alunos outra forma de perceber a cultura africana, e que ao mesmo tempo cruza-se com a nossa, foi muito proveitosa, pois o desenho animado prendeu a atenção dos alunos e possibilitou a turma a ver através da animação os costumes de uma tribo e conhecer uma lenda africana. Além dos alunos se envolverem com a história do filme, falando baixinho entre eles tentando descobrir o que o menino Kiriku faria para salvar sua aldeia. Os olhos da turma estavam vidrados no filme, enquanto eles envolviam-se com a história, observei suas expressões faciais que eram de espanto, medo, surpresa e curiosidade. Uma das cenas que mais causou espanto da turma foi quando Kiriku sai de dentro do buraco que ele usa para passar pela feiticeira, e encontra uma floresta linda cheia de flores e animais pequenos. Ao ver essa cena os alunos demonstram surpresa tanto em suas expressões faciais, quanto em suas falas. Acredito que essa surpresa deu-se porque a turma conhecia uma África estereotipada, a qual havia somente animais grandes como o elefante, o rinoceronte, girafa e árvores muito grandes, sem fazer ideia que lá também existem flores e pequenos animais. Conforme Duarte Junior (1991, p55): “[...]esta captação se dá a partir dos seus próprios sentimentos e de sua “visão de mundo.” Importante ressaltar que ampliar a visão de mundo dos alunos contribui para a desconstrução da imagem estereotipada que a África possui. Levando a estes educandos conhecimento para que conheçam e valorizem diferentes manifestações culturais contribuindo para a formação de cidadãos que compreendem e respeitam culturas e costumes diferentes do seus. Ao fazer uma pausa no filme, perguntei à turma onde Kiriku dormia. Ouvi respostas como:


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─ No chão! ─ Em cima daquela “coisa” que a gente leva pra deitar na praia!

Dei continuidade ao filme, fiz algumas observações quando o protagonista do filme começou a tocar uma espécie de cabaça, pedi aos alunos para observarem como era a casa que Kiriku morava, como é a floresta que ele encontrou quando saiu do buraco. Os alunos somente observavam e faziam suas anotações em seus cadernos fazendo comentários entre si. Perguntei se algum deles gostaria de falar alguma coisa a respeito do filme, se tinham alguma pergunta, nenhum deles se manifestou. Tudo transcorreu bem, porém os alunos não conseguiram terminar de ver o filme, faltaram apenas 10 minutos, justamente aqueles perdidos no início da aula devido à porta fechada, também não foi possível fazer nenhum comentário, pois utilizei todos os minutos da aula para a apresentação do filme. Quando o sinal tocou, combinei com a turma que eles terminariam de ver o final do filme na próxima aula. Todos os alunos saíram da sala acompanhados pela professora titular, enquanto isso fiquei terminando de organizar a sala. O aluno Darlan veio despedir-se de mim, então perguntei a ele se ele tinha gostado do filme, se ele tinha achado o filme mais interessante que as imagens que apresentei na aula anterior, quando ele não quis participar da leitura de imagens. Ele me respondeu que sim, que ele achava mais interessante assistir o filme porque ele conseguia prestar mais atenção. O que torna a prática de ensino, algumas vezes, desmotivante é a falta de organização e até mesmo de postura das pessoas que trabalham na escola. Eu tinha reservado a sala de vídeo com duas semanas de antecedência. Me senti muito frustrada com a falta de boa vontade da funcionária para abrir a sala. Demorar 15 minutos para pegar uma chave para abrir a sala é tempo demais. Devido a esse fato precisei reorganizar a aula seguinte, por outro lado, isso me fez aprender que essas atitudes são comuns dentro de algumas escolas e precisamos nos adaptar a situações adversas que vão ocorrer ao longo de nossa jornada profissional. Apesar deste fato negativo, a aula foi muito positiva, pois a turma interessou-se bastante pelo filme. Quando foram questionados, suas respostas estavam relacionadas com o conhecimento que os alunos adquiriram ao longo de suas vidas e com o cotidiano. O filme despertou interesse e curiosidade na turma que assistiu atentamente cada minuto do filme e ficaram curiosos para saber o qual seria o final.


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3.2.3 Terceiro Encontro. Aula 3 ( 90 minutos – 1 hora/ aula). Data: 25/09/2012 – Terça-feira. Horário 3° Período. Das 09h25 min às 10h15min.

Tema da aula: A arte da tribo de Ndebele

Conteúdos: 

Reflexão sobre o filme.

Produção Textual.

Imagens da tribo de Ndebele.

Obras da artista Esther Mahlangu.

Lista de atividades: 

Refletir com o grupo características relevantes tais como, modo de vida, vestimentas, utensílios utilizados pela tribo.

Desenvolver um texto expressando ideias relacionadas ao filme e imagens

estudadas na aula anterior. 

Apresentação da tribo de Ndebele, imagens da arte produzida nas casas,

significados que esta arte possui para tribo maneiras de vestir e viver. 

Reproduções de pinturas da artista Esther Mahlangu e sua importância para a tribo

Ndebele.

Objetivos: 

Conhecer e desenvolver competências de leitura e análise visual através da

produção textual de reflexão sobre o filme. 

Conhecer o valor cultural e simbólico que a arte e a cultura da tribo de Ndebele

possuem.


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Metodologia: 

Produção textual sobre o filme.

Aula expositiva dialogada.

Leitura de imagem.

Recursos Materiais: 

Lápis.

Folhas A4.

Mapa Mundi.

Avaliação: 

Avaliar o texto tendo como base os conteúdos vistos nas aulas anteriores, e a

coerência da escrita analisando a compreensão de cada aluno com relação ao conteúdo estudado. 

Participação na leitura de imagem.

Planejado: Iniciarei a aula conversando com os alunos resgatando em suas memórias o filme que eles viram na aula anterior, quais foram às anotações feitas por eles para que sejam colocadas no quadro. Em seguida, iremos iniciar uma conversa reflexiva utilizando as palavras escritas no quadro. Após esta atividade, eles irão produzir um pequeno texto individual utilizando as escritas feitas por eles durante o filme, relatando suas impressões e/ou características que consideram relevantes. Este texto deverá ser entregue. Logo após esta atividade, serão apresentadas imagens de obras da artista Esther Mahlangu e sua tribo. A tribo de Ndebele é uma das poucas tribos que ainda cultiva os costumes de seus antepassados, os zulus, apesar de terem sofrido influência ocidental principalmente na religião, eles ainda praticam alguns rituais herdados de seus antecessores. A tribo Ndebele de Gauteng fica situada a 40 km ao norte da cidade de Pretoria, e Pretoria fica a 60 km e Johannesburgo, é uma das menores tribos do país, mas sua arte tem grande destaque em todo o continente.


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Mapa Sul Africano (Fonte: http://www.goway.com/africa/southafrica/)

O grande destaque, e quem levou a arte da tribo de Ndebele para o mundo foi a artista Esther Mahlangu. Nascida em 1935, a artista aprendeu com sua mãe e avó a arte da pintura em muro e paredes, pois é da cultura de sua tribo que esses ensinamentos passem de mãe para filha. Mas foi em sua adolescência que Esther conseguiu ter um bom resultado da sua pintura, introduzindo tintas coloridas que serviram para o desenvolvimento da arte de Ndebele, bem como sua definição artística. Com a evolução de seu trabalho, a artista passou a utilizar tintas fluorescentes e a desenvolver técnicas e projetos baseados na arte tradicional. Esther destacou-se tanto pelo seu trabalho que passou a receber encomendas do mundo todo, até ser convidada em 1989 para fazer parte da exposição Magiciens de la Terre (Magos da Terra) que ocorreu em 1989, no Centro Georges Pompidou e no Grande Hall do Villette em Paris. Após esta exposição Esther participou de muitas outras exposições, incluindo exposições individuais, mais recentemente tem desenvolvido estampas para a marca Melissa e também para o estilista brasileiro Alexandre Herchcovitch que inspirou-se na tribo de Ndebele para criar sua coleção.


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Sapatilha Melissa Ultra Girl Afro Mania, 2009 (Fonte: Sandália Melissa, 2012)

Através do trabalho da artista, sua tribo pode ser conhecida no mundo todo, não somente como uma tribo com costumes que são mantidos ao longo dos anos, mas como uma tribo que possui e desenvolve sua própria arte, utilizando a mesma para falar dos problemas enfrentados pelo povo sul africano. É importante ressaltar a importância da simbologia que envolve a arte da tribo dos Ndebele, pois foi através da arte que as mulheres pertencentes a esta tribo encontraram liberdade para expor seus sentimentos, suas individualidades e como forma de protesto contra do apartheid.

Mahlangu, 2007 (Fonte: http://www.vgallery.co.za/esther2.htm)


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Mahlangu, 2007 (Fonte: http://www.vgallery.co.za/esther2.htm)

Mahlangu, 2010 (Fonte: http://www.vgallery.co.za/esther2.htm)


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Mahlangu, 2003 (Fonte: http://www.nationalgalleryfirenze.it/info/africa_today_roma/img_autori/Esther_Mahlangu.jpg)

Realizado:

Iniciei este encontro colocando o filme Kiriku e a feiticeira para terminarmos de assistir os últimos 10 minutos do filme. Não levei os alunos para a sala de vídeo, pois perderíamos muito tempo até que eu conseguisse organizar a sala. Reuni os alunos em torno do notebook e disse a eles que iriam terminar de ver os últimos minutos do filme na sala de aula, solicitei que todos fizessem silêncio, pois o som do notebook é baixo. A grande parte dos alunos assistiu e colaborou com a atividade, apenas 3 alunos negaram-se a ver o filme alegando não terem assistido à aula anterior. Pedi que mesmo assim eles viessem ver o final do filme para que pudessem ter alguma ideia de como é uma aldeia, os personagens do filme, mesmo assim eles se negaram. Após o final do filme, os alunos retornaram aos seus lugares e iniciamos um diálogo sobre o filme. Solicitei à turma que falassem sobre o que eles acharam relevante no filme. A turma começou a falar que no filme havia uma feiticeira, um menino chamado Kiriku que era muito pequeno e salvou a tribo. A feiticeira tinha muitas joias. Julguei essas leituras um tanto quanto superficiais, porém devo levar em consideração que os alunos não costumam ter atividades de leitura de imagens em sala de aula. Logo este seria um dos primeiros contatos deles com este tipo de atividade. É necessário entender que os alunos possuem seus próprios conhecimentos adquiridos através de suas vivências, portanto o que pode parecer interessante para mim, pode não parecer a eles. Devido aos registros de vida dos alunos e também o que o filme


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pode representar para eles naquele momento de sua vida. Analice Dutra Pillar afirma que: Desse modo, o observável tem sempre a marca do conhecimento, da imaginação de quem observa, ou seja, depende das coordenações do sujeito, das estruturas mentais que ele possui no momento, as quais podem modificar os dados. Assim, duas pessoas podem ler uma mesma realidade e chegar a conclusões bem diferentes. Isto porque, o que o sujeito apreende em relação ao objeto depende dos instrumentos de registro, das estruturas mentais, das estruturas orgânicas específicas para o ato de conhecer disponíveis naquele momento (PILLAR,1999 p.13).

Como eu gostaria que eles fossem um pouco mais fundo em suas observações, comecei a instigá-los a fazerem uma leitura um pouco diferente, comecei perguntando como era o lugar que as pessoas viviam. O aluno Enzo respondeu que as pessoas viviam em aldeias. Perguntei o que tinha nessa aldeia. A aluna Rahiane disse que haviam casas de barro e palha, e ressaltou que as pessoas dormiam em tapetes. Perguntei que tipo de tapetes eram esses, se eram iguais àqueles que temos em casa. Thaisa levantou o braço para responder e disse: - Não sora [sic], são tapetes de palha.

Mais uma vez perguntei: Essas casas de barro e palha, vocês já viram em algum lugar? Wellerson em tom de deboche e brincadeira disse:

- Vi na tv né sora [sic]! Ver de verdade não.

Perguntei ao aluno Wellerson quem vive em casas de palha e barro. O menino respondeu que são os índios, mas que eles não dormem no chão, em tapetes de palha, dormem em redes de palha. Os questionei sobre o que mais havia no filme. Ninguém me respondeu. Pedi a eles que lessem as anotações que fizeram durante o filme, pois tinha certeza que lá havia alguma anotação que eles poderiam expor para o grupo para que conversássemos a respeito. Após passados cerca de 5 minutos, retornei a questioná-los sobre o filme, perguntando, o que mais tinha no filme? O aluno Eliaz levantou a mão para falar. Ele disse que no filme também tinham potes de feito de barro. Perguntei se no Brasil são feitos esses potes de barro que chamamos de cerâmica. Yasmim pediu a palavra e disse:


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- Os índios fazem coisas de barro, tipo os do filme.

Cheguei então onde eu queria que era começar a relacionar a cultura brasileira com a africana. Perguntei à turma o qual a relação entre os africanos e os brasileiros. Enzo que é um menino que sempre está atento à aula, respondeu:

- Sora [sic] é que os africanos e os índios brasileiros vivem de maneira parecida, tipo em tribos, as casas são de barro e palha. Mas os índios brasileiros dormem em redes e os africanos em tapetes de palha.

Parabenizei o aluno e agradeci a sua colocação, mas alertei aos alunos que é sempre bom lembrar que na África, além de existirem muitas tribos que vivem de uma maneira semelhante aos nossos índios, também há muitas cidades e pessoas que vivem como a gente. O que nos diferencia é a cultura. Solicitei aos alunos que escrevessem um pequeno texto sobre o filme refletindo a respeito de tudo o que já estudaram. Conforme os alunos foram terminando seus textos pedi a eles que me entregassem para que eu pudesse dar continuidade à aula. Quando li os textos, percebi que alguns alunos conseguiram expressar suas interpretações, assim como fez a aluna, Julia G. “Para mim eles vivem como pessoas certas de que podem viver na simplicidade. E também sabem que atrás do mal tem um sofrimento que fez ele nascer. E através de um sábio já vivido descobrem porque o mal cresce conforme a dor”.

A aluna refere-se a dor que a feiticeira sentia por causa do espinho que tinha em sua coluna, causador da maldade da feiticeira, porém a expressão escrita da aluna também remete a uma reflexão mais profunda sobre como uma pessoa pode tornar-se má, qual foi o sofrimento que ela passou ao longo da vida que a deixou assim. Esse tipo de comportamento costuma ser observado em sala de aula, alunos que mudam seus comportamentos no decorrer do ano letivo sem que exista um motivo aparente. Por isso é preciso que o educando tenha sensibilidade e busque compreender o que pode estar acontecendo na vida destes alunos para tentar auxiliá-los de alguma forma evitando que aconteça algo pior. A aluna cita também a simplicidade que a tribo vive, referindo-se a


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eles como “pessoas certas”. Talvez fazendo uma referência a sociedade consumista a qual vivemos, pois o filme mostrava a união e a simplicidade que o povo da tribo de Kiriku vivia. Interessante essa reflexão da aluna referindo-se as pessoas da tribo como certas, porque viviam com simplicidade, através desta reflexão da aluna é possível perceber que o filme passou uma mensagem positiva relacionada a como as pessoas podem viver coletivamente em harmonia, diferente da realidade da nossa sociedade. Essa reflexão da aluna Júlia G. é bastante profunda e me remeteu a pensar o quanto os alunos podem ser críticos e reflexivos relacionando a sociedade a qual estão inseridos com um filme. É muito importante para o educador não subestimar as reflexões e posicionamentos dos alunos, pois creio que desta forma é possível valorizar o pensamento e a posição crítica de cada aluno, contribuindo para a formação de cidadãos capazes de se posicionar frente a questões sociais e políticas. O aluno Matheus B. faz uma leitura diferente de Julia G., mas não menos importante: “Achei o filme muito bom, o filme fala de muitas coisas interessantes e parece ser bem real. Mostra suas tradições, o clima, os seus costumes de se vestir...”.

Observando as diferentes maneiras de expressão escrita, cada uma falando de acordo com o conhecimento de cada aluno, sua maneira de ver e perceber o mundo. Notei que é necessário pensar, repensar e compreender o mundo visto pelos olhos dos alunos, respeitando seu histórico de vida, pois cada aluno possui sua individualidade apropriando-se do conhecimento de formas diferentes. De acordo com Analice Dutra Pillar: É preciso ter claro, que esta leitura, esta percepção, esta compreensão, esta atribuição de significados, vai ser feita por um sujeito que tem uma determinada história de vida, em que objetividade e subjetividade organizam, de modo singular, sua forma de apreensão e de apropriação do mundo (PILLAR, 2003, p.74).

Considerando as vivências da turma, a capacidade de cada um em compreender e expressar suas ideias e/ou interpretações sobre o filme, vejo que os textos produzidos por eles foram muito bons. Pois de uma maneira ou de outra souberam colocar no papel, mesmo de uma forma simples e resumida o que compreenderam com relação ao filme. No entanto, percebi que houve certa confusão ao


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invés de uma relação entre africanos e índios, eles misturaram as duas culturas referindo-se aos africanos como indígenas. Esta confusão está muito clara no texto de Julia S. ela escreve o seguinte: “Eu vi que os indígenas tinham aldeias bem diferentes de hoje em dia, por exemplo; eles dormiam no chão em esteiras feitas de palha, eles usavam poucas roupas”.

Texto produzido pelo aluno Matheus Fonte: (Fonte: DALLA COSTA, 2012)


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Texto produzido pelo aluno Wellison (Fonte: DALLA COSTA, 2012)

Após toda a turma ter terminado a produção textual, liguei o data show, para apresentar a turma imagens da tribo de Ndebele. Iniciei minha fala dizendo que esta tribo, é uma tribo da África do Sul. Perguntei se algum deles sabia onde fica a África do Sul. Wellison respondeu: ─ Onde fica eu não sei, só sei que teve a copa do mundo lá.

Pedi que a turma se aproximasse do mapa que estava pendurado na parede e que observassem onde fica o país sul africano, mas que ao descobrirem não falassem nada para dar oportunidade que todos pudessem fazer suas descobertas. Interessante ver as expressões faciais dos alunos buscando saber onde fica o país e após suas descobertas notei expressões de espanto. Uma aluna levou sua mão à boca, tamanha a surpresa com sua descoberta. Perguntei então se todos descobriram onde fica esse país. A turma respondeu que sim. Solicitei que um aluno viesse voluntariamente mostrar a toda à turma. O aluno Matheus levantou-se e apontou com o dedo. Perguntei à turma se todos concordavam com o colega, se todos chegaram à mesma conclusão, e a turma respondeu que sim. Comecei explicando que na tribo de Ndebele existe uma tradição que é passada de mãe para filha, que são as pinturas de muros e casas. Somente as mulheres da tribo é que produzem essa arte, e essas pinturas são feitas à mão livre, ou seja, sem utilizar qualquer material geométrico para auxiliarem a pintura de seus desenhos. Prossegui minha fala dizendo que essas pinturas não são feitas de qualquer maneira, que as artistas antes de iniciarem qualquer trabalho esboçam seus desenhos. Mostrei uma reprodução da obra Abstract 21, de Esther Mahlangu, perguntei à turma o que eles estavam vendo.


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Esther Mahlangu, 2007 (Fonte: http://www.vgallery.co.za/esther.htm)

Eles responderam que é um desenho geométrico com diversas cores. Perguntei então o que essa imagem representava para eles. Um dos alunos respondeu que parecia ser um símbolo para a tribo. Agradeci e parabenizei o aluno. Perguntei se mais alguém queria fazer alguma colocação, mas a turma permaneceu quieta. Expliquei à turma que nesta tribo eles costumam representar em seus desenhos acontecimentos que já ocorreram ou que vão ocorrer. Por exemplo: algumas imagens podem representar um casamento que vai acontecer, um status social, emoções, sentimentos, uma oração e também uma maneira de protestar. Enfatizei que essa tribo não expressa em suas pinturas rituais e religiões. Antigamente, as mulheres da tribo pintavam suas casas com pigmentos naturais, utilizando diferentes tons de terra, e elementos encontrados na natureza, hoje já são utilizadas tintas industrializadas ampliando assim a variação das cores. Apresento então a artista Esther Mahlangu. Falei que através do trabalho de Esther, ela levou ao mundo todo, a arte feita em sua tribo, tornando sua tribo conhecida no mundo inteiro, não só como uma tribo de costumes primitivos, mas como um povo que desenvolve uma arte cheia de significados e valores. Enquanto eu falava ia mostrando reproduções de obras feitas por ela. Prossegui explicando que a artista não trabalha somente com a pintura de quadros, mas também já fez trabalhos para a marca Melissa, criando estampas para sapatilhas e sandálias, e junto com o estilista de moda Alexandre Hercovich criou estampas para a coleção do estilista. Perguntei se alguém tinha alguma dúvida ou gostaria de fazer alguma colocação, em meio a minha fala o sinal tocou, os alunos saíram para o recreio.


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3.2.4 Quarto Encontro. Aula 4 ( 90 minutos – 1 hora/ aula). Data: 26/09/2012 – Quarta-feira. Horário 1° Período. Das 07h45 min às 08h35min.

Tema da aula: Arte brasileira e africana.

Conteúdos: 

Imagens de obras da artista Esther Mahlangu.

Imagens de obras e vida do artista Rubem Valentim.

Relações entre as obras de Esther Mahlangu e Rubem Valentim.

Lista de atividades: 

Relembrar as obras da artista Esther Mahlangu apresentadas na aula anterior.

Apresentação de imagens de obras e vida do artista Rubem Valentim.

Formar grupos que serão tribos, criando um nome e um significado para a mesma.

Atividade plástica que identifique cada grupo como tribo.

Objetivos: 

Conhecer e relacionar as reproduções das obras da artista Esther Mahlangu com as

de Rubem Valentim. 

Desenvolver sua própria produção plástica fazendo relações com as atividades de

leitura de imagens realizadas nas aulas anteriores. 

Desenvolver a imaginação criadora.

Metodologia: 

Aula expositiva dialogada.

Leitura de imagem.

Prática artística.


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Recursos Materiais: 

Data show

Folha A4

Lápis de cor

Avaliação: 

Participação na leitura de imagens.

Comprometimento com o desenvolvimento da atividade e com o grupo.

Atividade plástica.

Planejado: Iniciarei a aula relembrando e reapresentando as imagens da artista Esther Mahlangu e, apresentarei reproduções de pinturas e esculturas do artista Rubem Valentim. Ambos artistas trabalham com simbologias. A artista Esther Mahlangu desenvolve em suas obras simbolismos que fazem parte da cultura de sua tribo e que são passadas de mãe para filha, já o artista Rubem Valentim, expressa em suas obras simbolismos que estão ligados a cultura afro-brasileira e, as religiões de matrizes africanas. Os dois artistas representam simbolismos que estão ligados aos seus antepassados e buscam preservar esse aprendizado através das suas obras. Em cada imagem apresentada, os alunos farão sua própria leitura de imagens através de um diálogo comigo e com a turma. Eles serão questionados a respeito das formas, cores e simbologia das imagens que estão vendo, quais as relações que estas reproduções de pinturas possuem com a artista estudada na aula passada. As respostas serão escritas no quadro. Somente após esse diálogo é que apresentarei a eles o artista Rubem Valentim. Procurarei instigar e questionar os alunos a falarem a respeito da simbologia que está expressa nas obras do artista. E incentivá-los a desenvolver suas atividades práticas com cores fortes e com simbolismo que represente suas tribos, assim como Rubem Valentim expressa em suas obras.


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Rubem Valentim, 1987 Fonte: (Site: http://www.catalogodasartes.com.br/)

Rubem Valentim, 1981 Fonte: (Site: http://www.catalogodasartes.com.br/)


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Rubem Valentim, 1978 (Fonte: http://www.catalogodasartes.com.br/)

Logo após esta atividade os alunos irão formar grupos de quatro integrantes, estes grupos representarão suas tribos. O grupo irá desenvolver um desenho selecionando cores e formas que servirão como padronagem e como identificação da tribo baseados nas obras de Esther Mahlangu e Rubem Valentim conforme estudados em aula. O grupo também terá que criar um nome que tenha um significado para sua tribo.

Realizado: Iniciei a aula conversando com os alunos a respeito de como a cultura brasileira foi criada. Falei que, com a vinda dos escravos para o Brasil, eles trouxeram muitos de seus costumes, e devido a isso temos hoje o samba, o carnaval, a capoeira, a religião de umbanda que é a única religião de origem brasileira. Fiz uma breve explicação à turma a respeito do Candomblé e da Umbanda. Expliquei aos alunos que os escravos vindos da África na época da colonização possuíam as suas crenças, porém como o Brasil era um país católico devido a colonização portuguesa, os escravos eram proibidos de praticar os seus rituais. Portanto os escravos associaram seus deuses aos santos católicos, sendo assim eles conseguiram praticar a sua fé, por isso existe até hoje algumas relações entre os santos católicos e alguns orixás. Achei importante fazer esta introdução, mesmo sem tê-la colocado no planejamento da aula, pois como eu apresentaria o artista Rubem Valentim, achei que seria pertinente que antes do início da


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apresentação das obras, os alunos tivessem um pouco mais de conhecimento a respeito da influência religiosa e da formação da cultural do nosso país para entenderem melhor o trabalho do artista. A aluna Lavínia entrou na sala atrasada, empurrou a porta com força, não pediu licença. Eu olhei para ela e falei com um sorriso: bom dia Lavínia! Ela me olhou meio desconsertada, pois não esperava que eu fosse gentil com ela, e não me respondeu, mas esboçou um sorriso. Ao apresentar a primeira imagem no data show e perguntei aos alunos quais eram as relações que aquelas imagens tinham com as imagens vistas na aula anterior.

Rubem Valentim, 1981 (Fonte: http://www.escritoriodearte.com/artista/rubem-valentim/emblema/5684/)

Eles responderam que eram geométricas, as cores eram parecidas e que tinham algum significado, mas que eles não sabiam qual era. Perguntei a eles se lembravam quais eram os significados das imagens que vimos na aula anterior, a aluna Yasmim disse:

- Significavam os sentimentos das mulheres da tribo!

Após esta resposta, cerca de 5 alunos levantaram a mão para responder, Welerson disse: - E também poderia ser um protesto, né sora [sic]?


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Pedi que o aluno Darlan falasse e ele disse:

- Ou um casamento. A sora [sic] explicou que lá nessa tribo quando vai acontecer um casamento eles contam pelos desenhos.

Outros alunos estavam com a mão levantada e perguntei se eles desistiram de falar. Eles ficaram meio envergonhados e disseram que os outros alunos já tinham falado o que eles iam dizer. Parabenizei os alunos pelas observações e dei prosseguimento à aula. Expliquei a turma que, diferente das imagens da artista Esther Mahlangu, que representavam situações que ocorreram ou vão ocorrer na tribo, sem expressar a religiosidade, esse artista expressa em suas obras a religiosidade. Perguntei se eles conseguiriam identificar algum símbolo, nenhum deles respondeu. Então expliquei que esse artista teve influência da religiosidade trazida pelos africanos, o candomblé e a umbanda. Perguntei à turma o que eles achariam que aquelas imagens poderiam significar, o aluno Enzo respondeu:

- Aquele ali sora [sic] eu acho que aquele ali é um guerreiro, ou um santo que cuida da mata.

Enzo se referia a esta imagem.


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Rubem Valentim, 1974 (Fonte: www.catalogodasartes.com.br/)

Então perguntei se mais alguém tinha alguma colocação, ninguém respondeu. Achei muito interessante a colocação do aluno Enzo, pois a reflexão dele possui uma relação com o conhecimento que foi trabalhado nesta aula, em aulas anteriores e com o conhecimento que adquiriu ao longo de sua vida, pois quando cita guerreiro ou santo que cuida da mata, ele pode estar expressando algum conhecimento que ele tem sobre a religiosidade afro-brasileira. Dei prosseguimento à aula. Falei para os alunos que o artista que produziu aquelas obras criou uma signografia, ou seja, um simbolismo, baseado nos orixás. Comecei a apresentar o artista Rubem Valentim. Comentei com eles que este artista é brasileiro, aprendeu a pintar sozinho, ou seja, é autodidata, e, a partir de 1950, passou a desenvolver trabalhos que foram influenciados pelas religiões de origem africana. Ele passou a desenvolver um trabalho geométrico místico, baseado na simbologia do candomblé e umbanda valorizando a cultura afrobrasileira. Mostrei aos alunos que em algumas imagens pode-se observar a representação do machado de Xangô. Perguntei se alguém saberia quem é esse orixá. Ninguém respondeu.


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Rubem Valentim, 1978 (Fonte: http://www.catalogodasartes.com.br/)

Retornei a minha explicação e falei a eles que Xangô é o orixá do fogo, dos raios e tempestades e possui um machado com dois lados. Levei a imagem de Xangô impressa para que eles pudessem observar melhor e identificar nas reproduções de Rubem Valentim. Além do machado de Xangô, as obras do artista também possuem representações de estrelas, luas e altares. Perguntei à turma se alguém tinha alguma pergunta ou se algum deles conhecia a religião e gostaria fazer alguma colocação, ninguém respondeu. Solicitei aos alunos que formassem grupos e disse que esses grupos seriam suas tribos. Ressaltei que os integrantes dos grupos deveriam ser sempre os mesmos, pois eles estavam formando agora uma tribo. Esta tribo deveria que ter sempre os mesmos integrantes porque eles estavam, a partir daquele momento, criando laços entre eles. Cada um deles deveria criar um desenho para representar sua tribo que tivesse uma simbologia para eles, e em conjunto deveriam criar um nome com um significado para a mesma. A turma começou a formar seus grupos calmamente, sem arrastar as classes ou cadeiras. Coloquei então músicas africanas para que eles iniciarem seus trabalhos. Eles estranharam um pouco, fizeram algumas piadinhas, mas logo passaram a apreciar. A aluna Marcelli fez um comentário:


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- Sora [sic] que legais essas músicas africanas, eu não conhecia. Gostei, bem diferente.

A turma trabalhou tranquilamente. Somente a aluna Lavínia não participou da atividade, disse que não queria participar porque era muito difícil. Sugeri a ela que se juntasse a um grupo para desenvolver o trabalho e que eu a ajudaria. Mesmo assim, ela não quis. Falei a ela que seria importante para o conhecimento dela e que ela iria gostar da atividade, mas ela foi taxativa e negou-se a fazer. Pediu que eu a deixasse quieta, então retirei-me e fui auxiliar os outros grupos. Notei nessa aluna uma certa revolta, não comigo. Em certos momentos da aula ela encontrava-se quieta, porém quando percebia a turma calma e tranquila, ela soltava uns gritos. Quando isso acontecia a turma se voltava para ela e começava a xingá-la mandando que se calasse. Percebi que esta aluna tinha necessidade de chamar atenção, talvez estivesse passando por algum problema familiar, então aos poucos fui tentando me aproximar dela para tentar ajudá-la de alguma forma. Circulei pela sala de aula e percebi que os alunos estavam empolgados com a atividade, todos trabalhando em seus trabalhos plásticos e discutindo os nomes e significados de suas tribos. Caminhei pela sala auxiliando os alunos na atividade e, conversando com eles, percebi que eles possuem certa insegurança para desenvolver a atividade. Fui questionada por várias vezes se o trabalho estava certo, se poderiam utilizar determinadas cores, etc. Toda e qualquer ação que eles precisavam desenvolver sem que existisse uma determinação de quais cores deveriam usar, o que deveria constar no trabalho, como eles deveriam fazer para que ficasse bonito, sentiam-se inseguros e sem saber por onde começar. Alguns professores de Arte não permitem que seus alunos desenvolvam suas atividades plásticas utilizando a criatividade oportunizando experimentações de cores, formas, materiais, etc., deixando de estimular a capacidade criadora, seletiva, tátil e estética. Esse tipo de prática desestimula e deixa alunos inseguros quando precisam tomar de decisões na organização e desenvolvimento de seus trabalhos plásticos dificultando assim o desenvolvimento criativo individual e em grupo. Apesar desta dificuldade inicial, a turma desenvolveu um trabalho satisfatório, pois devido à liberdade para a criação de suas tribos e desenhos, eles sentiram-se à vontade para


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expressarem seu imaginário. Quando faltavam 15 minutos para o término da aula, passei pelos grupos e comecei a anotar os nomes de suas tribos e os significados. 

Tribo Tuba: O bem da tribo.

Tribo Amiga: Todos se ajudam como nas tribos.

Tribo Passos Solitários: Eu caminho sozinho.

Tribo Suricato: Preservação dos animais e florestas.

Tribo Caetes: Terra dos sábios.

Tribo Mirambu: Feiticeiras do bem ajudam a natureza e as pessoas.

Confesso que fiquei muito feliz com a maneira como os alunos criaram os nomes de suas tribos, mas ao mesmo tempo assustei-me com o nome da tribo passos solitários. O menino que criou essa tribo fez seu trabalho sozinho, não quis juntar-se a nenhum outro grupo, conversei com ele para tentar saber quais os motivos de não se relacionar com o restante da turma, pois ele sentava no canto direito da sala, na última classe. Ele não quis me dizer seus motivos, disse somente que preferia fazer sua atividade sozinho. Respeitei sua decisão, mas disse a ele que caso ele decidisse ir para algum grupo poderia ficar à vontade para juntar-se aos colegas, e que se precisasse de alguma coisa poderia me chamar a qualquer momento. Ele balançou a cabeça com um sinal positivo, me afastei e o deixei fazendo sua atividade. Ao mesmo tempo em que me preocupei com a atitude do aluno em não querer se juntar a um grupo, pois achei que ele pudesse ter algum problema de relacionamento, refleti a respeito da decisão do menino. Sempre que alguém nos contraria ou nos surpreende com uma atitude inesperada, acreditamos que esta pessoa possui algum problema que é um grande erro. Refletir sobre o fato me levou a entender que é necessário deixar de lado muitos julgamentos que fizemos com os alunos e respeitarmos suas decisões para que desenvolvam suas atividades de forma livre e espontânea. Recolhi os trabalhos dos alunos e percebi que eles conseguiram absorver boa parte do conteúdo passado a eles durante as aulas. Cada um em seu grupo expressou sua maneira de ver uma tribo, cada integrante do grupo criou desenhos semelhantes, porém a diversidade dos desenhos feitos pela turma foi bastante grande. As alunas Thaísa e Thalita tiveram uma dificuldade maior em iniciar o trabalho plástico, chamei-as para


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que elas mais uma vez pudessem observar as imagens de Rubem Valentim e Esther Mahlangu. Conversei com elas e expliquei que não deveriam preocupar-se se o trabalho ficaria bonito ou não, mas que colocassem no papel o que estavam pensando, sem medo. As alunas estavam preocupadas com a nota, me disseram que se o trabalho ficasse feio elas iriam tirar uma nota baixa. Expliquei a elas que o que pode ser feio para elas pode não ser para mim, e o importante é que elas desenvolvam e expressem suas próprias ideias e, que os critérios de avaliação não estavam baseados na estética, mas no aprendizado da turma. Após essa conversa fiquei observando as alunas de longe, notei que estavam mais confiantes e seguras para fazer a atividade. Depois de terem se passado uns 15 minutos, retornei ao grupo das alunas Thaísa e Thalita e vi um trabalho muito interessante, as alunas utilizaram réguas de diferentes formatos para desenvolver suas ideias, foram capazes de organizar os elementos geométricos criando uma composição de desenhos, desenvolvendo uma simbologia própria a partir de suas ideias, valores e conhecimento.

Trabalho da Tribo Amiga das alunas Thaísa e Thalita


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Fonte: (DALLA COSTA, 2012)

Foi possível perceber no trabalho plástico da aluna Diovana que ela desenvolveu um trabalho bastante simbólico envolvendo imagens apresentadas em sala de aula, juntamente com os seus conhecimentos adquiridos no decorres de sua vida.

Trabalho da Tribo Suricato da aluna Diovana Fonte: (DALLA COSTA, 2012)

Trabalho da Tribo Passos Solitários do aluno Guilherme Fonte: (DALLA COSTA, 2012)


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O aluno Eliaz sentiu-se tão entusiasmado com as aulas que trouxe uma estatueta para aula. Fiquei muito feliz por ver os alunos estimulados com o conteúdo e relacionando objetos que possuem em casa com as aulas. Desta forma posso notar que os objetivos propostos para o projeto estão sendo alcançados.

Estátua do aluno Eliaz (Fonte: DALLA COSTA, 2012).

O grupo o qual Eliaz faz parte utilizou a estátua para desenvolver a atividade prática. É interessante notar que apesar de existir alguns desenhos estereotipados, o grupo de alunos desenvolveu a atividade plástica com perspectiva. Achei muito interessante e bastante positivo a forma a qual eles representaram a sua tribo.


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Trabalho dos alunos Eliaz, Juliane, Matheus Garcia e Matheus Baio. (Fonte: DALLA COSTA, 2012).

As alunas da Tribo Mirambu, criaram dois desenhos. O primeiro, segundo elas, é a representação de uma integrante da tribo.


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Trabalho da Tribo Mirambu das alunas Yasmim, Julia M., Julia S., Janine e Rahiane (Fonte: DALLA COSTA, 2012)


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Trabalho da Tribo Mirambu das alunas Yasmim, Julia M., Julia S., Janine e Rahiane (Fonte: DALLA COSTA, 2012)

É possível observar no trabalho das alunas características bastante marcantes como desenhos nos braços, tiara na cabeça, pinturas nos seios e enfeites na saia que lembram as boleadeiras usadas pelos tradicionalistas gaúchos.


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Trabalho da Tribo Mirambu das alunas Yasmim, Julia M., Julia S., Janine e Rahiane (Fonte: DALLA COSTA, 2012)

O segundo desenho também é bastante peculiar com características próprias criadas pelas alunas e com bastante influência a arte de Esther Mahlangu e Rubem Valentim, pois existem muitas formas geométricas. Desta forma é possível perceber que os alunos souberam expressar o aprendizado das aulas, seus gostos e o conhecimento que adquiriram ao longo de suas vidas. Os objetivos propostos para esta aula foram atingidos, pois é possível perceber nos trabalhos plásticos que os alunos foram capazes de construir imagens simbólicas relacionadas com os conteúdos apresentados e o conhecimento e visão de mundo que cada um dos alunos possui. Desenvolvendo assim um trabalho plástico rico em significados e simbologias próprias e únicas criadas pelos grupos. Transmitir para os alunos segurança para que eles conseguissem expressar suas ideias foi fundamental para que eles se sentissem confiantes no desenvolvimento da prática artística. A Arte ainda é vista como um dom, com certo e errado e, enquanto essa visão errada da Arte existir em sala de aula continuaremos a ter alunos acreditando que não sabem se expressar artisticamente. É preciso mudar determinadas práticas de ensino para que os alunos sejam estimulados a desenvolver sua capacidade criadora, tornando-se alunos e, futuramente adultos, mais seguros.


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3.2.5 Quinto Encontro. Aula 5 ( 90 minutos – 1 hora/ aula). Data: 02/10/2012 – Terça-feira. Horário 3° Período. Das 09h25 min às 10h15min.

Tema da aula: Minha tribo, minha história. Conteúdos: 

Produção de um questionário a ser enviado ao senhor Gideon Babalola Idowu.

Produção Textual.

Lista de atividades: 

Desenvolver um questionário coletivo com cerca de 8 questões a ser enviado ao senhor Gideon Babalola Idowu, e que esse questionário auxilie a turma a tirar suas dúvidas relativas a uma pessoa que é originária da África.

Produzir um texto que conte a história das tribos criadas pelos alunos, baseados em atividades produzidas e estudadas em aulas anteriores, e em suas próprias vivências.

Os grupos irão se reunir para desenvolver a produção textual.

Objetivos: 

Desenvolver um questionário coletivamente para sanar dúvidas e curiosidades dos

alunos. 

Ser capaz de desenvolver uma história para sua tribo criando uma identidade para

a mesma, expressando suas ideias, sentimentos e o imaginário de cada grupo. 

Proporcionar à turma uma atividade coletiva para que possam aprender a entrar

em acordo comum para o desenvolvimento da atividade.

Metodologia: 

Questionário.


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Produção textual. Recursos Materiais:

Papel envelhecido.

Fita mimosa.

Caixa de sapatos.

Avaliação: 

Participação do grupo na formulação do questionário.

Produção textual coerente baseada em atividades e estudos das aulas anteriores incluindo suas próprias vivências.

Planejado: Iniciarei a aula conversando com os alunos que precisarei desenvolver um questionário para uma pessoa que vive na África. Caso eles pudessem entrar em contato com essa pessoa, quais as perguntas que gostariam de fazer? Todos os alunos poderão fazer mais de uma pergunta e todas elas serão escritas no quadro. Não será dito aos alunos que este questionário será enviado ao Senhor Gideon Babalola Idowu, somente após ele responder o questionário é que contarei a surpresa aos alunos. A sugestão de desenvolver o questionário com o Senhor Gideon surgiu através de uma conversa com a orientadora do estágio, pois acreditamos que seria interessante promover o contato dos alunos com uma pessoa de origem africana, mesmo que a distância. Esta pode ser uma forma de valorizar a curiosidade e os questionamentos dos alunos e aproximá-los de uma pessoa que possui uma cultura diferente a deles. Após o término desta atividade, os alunos irão unir-se aos seus grupos para escrever a história de suas tribos. Para que os alunos tenham uma experiência de escrita um pouco diferente, distribuirei folhas de cartolina recortadas e envelhecidas que serão utilizadas para as suas escritas. Explicarei aos alunos que na cultura africana muitas histórias se perderam porque existe a cultura da história oral. Por isso eu gostaria que eles se imaginassem vivendo em uma tribo e escrevam como é a vida deles dentro desta sociedade criada por eles. Falarei que devem conversar e discutir com os colegas do grupo para desenvolver a história e, que poderão ficar à vontade para criar suas tribos imaginárias, mas que deverão basear-se pelo nome que deram a


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tribo. Quando a turma terminar de escrever as histórias, irão enrolar os seus “papiros” e amarrá-los com barbante e guardaremos esses textos em uma caixa que será lacrada. Em seguida, explicarei aos alunos que somente no final de minhas 12 aulas é que essa caixa será reaberta.

Realizado: Esta aula iniciou-se muito conturbada. Os alunos estavam muitos agitados, tive bastante dificuldade em acalmá-los. Comecei conversando com eles dizendo que precisava formular um questionário para o meu projeto, e precisava da ajuda deles para fazê-lo. Perguntei a eles, se tivessem a oportunidade de conhecer um africano, quais perguntas gostariam de fazer. A maior parte da turma participou da atividade fazendo perguntas coerentes com os conteúdos que eles viram até então. Fui anotando no quadro as perguntas dos alunos. A turma elaborou perguntas bastante interessantes e ligadas a conteúdos que já estudaram. Como as que seguem abaixo: ─ Como são as vestimentas usadas em seu país? ─ Como são as religiões? ─ Sofrem muito preconceito? ─ Como é ser nascido na África? ─ Como são as casas? ─ Qual a língua falada? ─ Como é a convivência entre as pessoas de seus país? Existe violência?

Alguns alunos começaram a perturbar a aula enquanto eu conversava e tentava ouvir os alunos que estavam interessados na aula. Pedi que fizessem silêncio, mas fui totalmente ignorada por eles. Os alunos começaram a passar dos limites, solicitei ajuda da monitora. Ela, como não sabia o que fazer, chamou a direção da escola. A diretora entrou na sala pedindo silêncio, mas a bagunça continuou. Então ela gritou: ─ Calem a boca!

Somente assim foi ouvida pela turma. Ela pediu que a turma colaborasse comigo e disse que eu não estava ali para brincar, e saiu. Os alunos ficaram rindo, mas


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acalmaram-se. Notei nos textos anteriores que os alunos estavam fazendo confusões misturando costumes indígenas com africanos. Precisei fazer um parêntese explicando e questionando a turma a respeito das diferenças entre um e outro. Mostrei algumas imagens de africanos que vivem em tribos, e indígenas brasileiros explicando frente às imagens as diferenças que existem entre eles. Acredito que esta confusão deu-se porque muitos alunos haviam faltado a primeira aula, que foi a aula em que apresentei imagens de tribos africanas, e que conversei com eles a respeito das diferenças e semelhanças com tribos indígenas. Antes de iniciar a atividade prática expliquei aos alunos que em muitos países africanos existe a cultura da oralidade, ou seja, as pessoas costumam contar histórias e essas histórias não são escritas, por isso muito das histórias dos povos africanos perderam-se ao longo do tempo. Expliquei aos alunos que eles deveriam criar uma história para suas tribos, descrevendo como é a vida em comunidade, o que comem, como se vestem, quantas pessoas vivem nesta tribo, se cada integrante da comunidade possui um trabalho específico etc. Expliquei que a história deveria ser desenvolvida baseando-se nos nomes criados por eles e seus significados, vivências e identidade que eles já haviam criado para a mesma, porém poderiam criar a história conforme o grupo achasse melhor. Após a explicação, distribui a eles folhas envelhecidas para que eles pudessem começar a atividade. A turma gostou muito das folhas, ficaram curiosos para saber como elas haviam ficado com tal aspecto. Expliquei que recortei folhas de cartolina e as banhei em café solúvel, deixei secar e então elas ficaram com aspecto de envelhecidas. Os alunos formaram seus grupos para iniciarem a atividade. Pedi que assim que terminassem de escrever deveriam enrolar seus papéis e amarrá-los com a fita que lhes foi entregue. Depois que todos tivessem terminado, deveriam colocá-los dentro da caixa de papelão. Assim que todos terminassem a atividade, eu fecharia a caixa e disse a eles que só iríamos abri-las de novo no final da minha prática de ensino. A turma iniciou a atividade tranquilamente. Porém a aluna Lavínia, quando percebeu que todos estavam trabalhando, começou a cantar alto e a bater na classe. Alguns alunos acompanharam a aluna fazendo o mesmo. Pedi que parassem, mas eles ignoraram. Novamente tive que solicitar a intervenção da direção da escola. A diretora entrou e me perguntou quem eram os alunos que estavam fazendo bagunça. Falei para


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ela quem eram os alunos, e ela os retirou da sala para que o restante dos alunos pudessem continuar a tarefa. O aluno Eliaz me agradeceu por tirá-los da sala, e me explicou que não estava conseguindo concentrar-se para realizar a atividade devido à agitação de seus colegas. Perguntei ao aluno se este tipo de comportamento era comum, ou se havia sido um caso isolado. O menino me respondeu que isso acontece seguidas vezes, e que no dia anterior os mesmos alunos tinham ido à Direção pelo mesmo motivo. Me senti um pouco mais tranquila, pois achei que talvez eu não estivesse sendo capaz de ter domínio da turma. Após os 6 alunos terem sido retirados da aula, a turma acalmou-se e conseguiu terminar a atividade sem grandes dificuldades. Assim que o sinal tocou, a Direção da escola me chamou para uma conversa com os alunos. Atendi o chamado prontamente. Ao entrar na sala da Direção, os alunos acusavam-se uns aos outros, e aos colegas que haviam ficado em sala. Quando a diretora interrompeu a discussão os alunos faziam caretas e riam debochando. Tentei conversar e explicar à Direção o que havia acontecido, mas a diretora não me deixou falar. Me senti muito mal, e não entendi porque fui chamada para estar ali, pois pela maneira como a situação estava sendo abordada parecia que a culpada de tudo era minha. Nenhuma atitude foi tomada com relação aos alunos, somente foi solicitado aos mesmos que me pedissem desculpas e prometessem não fazer novamente, nem comigo, nem com outros professores, pois no dia anterior acontecera a mesma coisa com os mesmos alunos. Em momento algum me senti insegura com a situação junto a direção, mas não me agradou a postura da Direção comigo. Fui tratada como se fosse uma “coisa”. Entendo que estou ali para aprender, mas isso não tira o meu direito de ser respeitada como pessoa e profissional em formação. A diretora permitiu que os alunos fizessem caretas de deboche, e por vezes fizeram brincadeirinhas com eles, este tipo de atitude faz com que a Direção, que deveria dar exemplo, e ser vista como séria, perca todos os seus créditos, dando a entender aos alunos que quem coordena a escola são eles. Apesar dos contra tempos que geraram situações muito desagradáveis, e ainda prejudicaram os alunos que estavam interessados, acredito que a aula foi boa. A turma ficou muito preocupada, pois a folha que eu entreguei não tinha linhas, e a escrita deles ficaria torta. Disse a eles que não se preocupassem com isso, porque a ideia era essa, eles deveriam colocar-se no lugar de


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pessoas que não possuem papel com linhas. Mas que mesmo assim registram suas histórias sem se preocupar se estaria torto, se o papel era bonito, o importante era que registrassem seus pensamentos e suas criações. Os alunos estão muito presos às questões estéticas, ou seja, o que consideram bonito ou feio, preocupam-se demais com isso, questão que eu acredito que pode bloquear o desenvolvimento de criação e expressão dos mesmos. Conforme afirma Buoro (2003, p.33), Ao expressar-se, o aluno manifesta seus desejos, expressa seus sentimentos expõem enfim sua personalidade. Livre de julgamentos, seu subconsciente encontra espaço para se conhecer, relacionar, crescer dentro de um contexto que antecede e norteia sua conduta.

Por vezes pude perceber que algum aluno tinha grande vontade de escrever e/ou desenhar algo, mas por ficar com medo se ficaria feio ou bonito deixou de desenvolver o trabalho da maneira que gostaria. É importante deixa-los livres de julgamento para poderem desenvolver trabalhos que consigam expressar seus desejos e sentimentos proporcionando o desenvolvimento criativo de cada um. Os alunos que permaneceram na sala e que participaram da aula produziram textos coerentes com os nomes que criaram para suas tribos, foram capazes de utilizar o imaginário para desenvolver o texto, e souberam trabalhar em grupo discutindo, avaliando e entrando em consenso sobre como desenvolveriam tal atividade. Fazendo relações com o nome e a identidade que criaram para a tribo, expressando seus pensamentos, visões de mundo, e o imaginário procurando colocarem-se no lugar de uma pessoa que vive em uma tribo. Dois textos me chamaram muito a atenção, um deles foi o texto da aluna Thalia, ela contou em seu texto a sua própria história. Abaixo segue um trecho do texto:

Entrei para esta tribo, mas não demorou muito e eu sai, porque ainda não tinha certeza do que eu queria. Mas com 13 anos tive certeza e entrei de novo sabendo que essa seria a última chance para que eu me firmasse em uma tribo. Então resolvi entrar mesmo nesta tribo chegando descobri um mundo que ainda não conhecia. E hoje estou ainda na tribo cada dia mais firme e decidida do que eu quero. Essa história é real eu só adaptei ela a ocasião tipo a falar sobre tribo mas essa é a minha história. (Thalia, 6ª série)

A história da aluna Thalia chama muito a atenção, pois a menina utiliza o texto para expressar os seus sentimentos relacionando o imaginário com o real. A aluna


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fugiu um pouco da proposta, porém não posso desconsiderar a forma com que ela expressou um sentimento que estava guardado dentro dela, talvez causando sofrimento a muito tempo. O aluno Guilherme escreveu um texto falando de seus sentimentos. O nome de sua tribo é a Passos Solitários, ele explica em seu texto porque escolheu este nome. O nome de minha tribo é o retrato da minha vida. Porque será? É porque tudo ou é chato, ou é estúpido, ou é barulhento. Eu gosto de silêncio, como um ditado que diz o silêncio é uma prece. Por isso o nome de minha tribo. (Guilherme, 6ª série)

O aluno Guilherme foi o que eu me preocupei na aula anterior, pois ele recusou-se a fazer seu trabalho em grupo. Através de seu trabalho plástico pude entender o porquê do menino ter preferido realizar seu trabalho sozinho. Ele expressou em seu texto e no nome de sua tribo seus sentimentos. Esse texto me levou a refletir sobre a importância do educador ter respeito pelas escolhas dos seus educandos, os deixando escolher a melhor forma de se expressar, seja ela em grupo ou individualmente. Acredito que quando nos tornamos educadores precisamos carregar conosco muita sensibilidade e compreensão, pois estes dois alunos utilizaram a atividade como uma forma de desabafarem seus sentimentos e visão de mundo, por isso é necessário que o educando tenha consciência de seu compromisso social com os alunos, procurando compreendê-los, demonstrando carinho e confiança para que eles possam se sentir acolhidos e continuem frequentando a escola e tornem-se cidadão mais confiantes em si mesmos. Pude perceber nesta aula que os alunos foram capazes de desenvolver textos coerentes relacionados aos nomes de suas tribos, desenvolveram a atividade de forma organizada, discutindo e entrando em acordo com as ideias de cada integrante do grupo. O questionário que desenvolvemos coletivamente causou euforia na turma mesmo sem eles saberem que eu enviaria para o Senhor Gideon, essa atitude dos alunos me deixou muito feliz, pois grande parte da turma se interessou e participou da atividade, mesmo com a bagunça. Acredito que mesmo com os contratempos ocorridos durante a aula foi possível notar na atividade textual dos alunos que eles expressaram suas vivências e sentimentos conforme vêem e sentem o mundo em que vivem. Utilizando o imaginário para criar uma realidade a qual gostariam de viver. Faltando 5 minutos para encerrar a


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aula, os alunos foram colocando seus trabalhos dentro da caixa, enrolados e amarrados com a fita, fizeram tudo com calma e saĂ­ram para o recreio despedindo-se de mim.


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3.2.6 Sexto Encontro. Aula 6 ( 90 minutos – 1 hora/ aula). Data: 03/10/2012 – Quarta-feira. Horário 1° Período. Das 07h45 min às 08h35min.

Tema da aula: Identificando minha tribo.

Conteúdos: 

Imagens e significados da simbologia adinkra.

Atividade plástica.

Lista de atividades: 

Observar as imagens recebidas que servirão como referência.

Apreciação do vídeo sobre os símbolos adinkra.

Produção plástica, confecção da bandeira que representará a tribo.

Objetivos: 

Sensibilizar os alunos a observar uma simbologia desconhecida.

Utilizar uma simbologia desconhecida por eles para criar a sua própria identidade que identificarão suas tribos.

Desenvolver trabalho plástico sendo capaz de interagir com materiais oferecidos.

Desenvolver a capacidade criadora.

Metodologia: 

Aula expositiva dialogada.

Leitura de imagem.

Prática artística.

Recursos Materiais:


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Data show.

Vídeo Adinkra Symbols Ghana Part 3. Textile Printing.

Imagens impressas.

Folhas A4.

Tecido de algodão cru.

Avaliação: 

Participação dos alunos com a atividade proposta.

Comprometimento com o trabalho plástico e com o grupo.

Planejado: Neste encontro os alunos irão reunir-se com seus grupos para iniciar uma produção plástica de suas bandeiras. Antes que eles iniciem suas atividades, irei distribuir imagens da simbologia Adinkra de acordo com os nomes e significados de suas tribos. A simbologia adinkra é oriunda do povo Ashanti, situado no país de Gana e Costa do Marfim. Essa simbologia representa provérbios e aforismos. Estes símbolos costumam ser estampados em tecidos repetidas vezes criando assim uma estampa. Os ganeses costumam escolher suas vestimentas conforme as cores e significados estampados nelas, pois as cores e estampas simbolizam ocasiões específicas, como funerais, casamentos, ritos de iniciação, sentimentos etc. Além destes símbolos serem utilizados para estamparia, eles também são aplicados em paredes e cerâmicas.

Simboliza liderança, carisma e grandiosidade (Fonte:http://afrobrasileira.multiply.com)


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Simboliza paciência e tolerância Fonte: (Site: http://afrobrasileira.multiply.com)

Simboliza democracia e unidade (Fonte:http://afrobrasileira.multiply.com)

Simboliza a prudência (Fonte:http://afrobrasileira.multiply.com)

Apresentarei à turma o vídeo Adinkra Symbols Ghana: Part 3. Textile Printing de 3 minutos que mostra como o povo Ashanti estampa seus simbolismos através dos carimbos e da pintura manual. O vídeo será apresentado para que os educandos percebam o quanto a simbologia Adinkra é importante para o povo Ashanti e o quanto eles valorizam os seus costumes. Este vídeo pode ser encontrado em: https://www.youtube.com/watch?v=MawceWucCFc.


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Imagem do vídeo Adinkra Symbols Ghana: Part 3. Textile Printing (Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=MawceWucCFc)

Imagem do vídeo Adinkra Symbols Ghana: Part 3. Textile Printing (Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=MawceWucCFc)


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Imagem do vídeo Adinkra Symbols Ghana: Part 3. Textile Printing (Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=MawceWucCFc)

Acho importante mostrar aos alunos como se dá a produção do material, pois acredito que eles entenderão melhor como são as estampas, como são feitas, e a importância que esses símbolos têm para a cultura Ashanti, bem como sua preservação e a valorização do trabalho em grupo conforme aparece no vídeo. Distribuirei aos grupos imagens adinkra para que sirvam como referência para a atividade plástica de produzir as bandeiras de suas tribos. Primeiro a turma irá fazer um esboço do desenho de suas bandeiras em uma folha A4, em seguida eles irão desenhar com lápis no tecido de algodão cru.

Realizado: Os alunos costumam formar fila no pátio da escola antes de entrar para o primeiro período. Como nas semanas anteriores isso não foi possível devido à chuva e ao frio, a Direção permitiu que os alunos, conforme iam chegando, entrassem em sala de aula antes de soar o sinal. Hoje, como não estava frio nem chovendo, a professora titular me acompanhou até o pátio da escola para buscá-los. A turma 62 já encontrava-se em fila aguardando a professora. Eles entraram em sala um pouco menos agitados que no dia anterior. Mesmo assim, tive dificuldade em acalmá-los para fazer a chamada e iniciar a explicação da aula. Quando os alunos acalmaram-se, consegui terminar de fazer a chamada e expliquei que eu ia distribuir alguns símbolos que possuem


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significados muito semelhantes aos nomes que eles deram as suas tribos. Pedi a eles que observassem as imagens e falassem o que essas imagens pareciam representar a eles. Por um instante, os alunos ficaram olhando e cochichando entre si. A aluna Yasmim levantou o braço e me mostrou a imagem e disse que para ela aquela imagem parecia dois coqueiros entrelaçados. Perguntei à turma se mais alguém gostaria de fazer alguma colocação, mas ninguém se manifestou. Ouvi somente algumas piadinhas de alguns alunos. Percebi que os alunos não se interessaram muito pelas as imagens, tentei instigálos a falar, pois haviam símbolos conhecidos, mas eles recusaram-se. Me senti um pouco frustrada com a falta de interesse da turma, porém procurei refletir sobre porque a metodologia para esta atividade não havia dado certo. Talvez se eu tivesse abordado a simbologia adinkra através de imagens projetadas pelo data show, os alunos teriam se interessado mais do que pelas imagens impressas. Coloquei no quadro imagens impressas da simbologia Adinkra. Expliquei os significados de cada imagem e, o quanto elas são importantes para a cultura Ashanti. Falei a eles que esses símbolos são estampados em tecidos e, que os Ashanti costumam escolher as roupas a serem usadas conforme a simbologia da estampa, a cor e a ocasião como casamentos, funerais, etc. Expliquei à turma que eu apresentaria um vídeo sobre os símbolos Adinkra e, que a partir deste vídeo eles entenderiam melhor a minha explicação. Pedi aos educandos que prestassem atenção no vídeo, pois a partir dele, eles poderiam compreender melhor como a simbologia Adinkra é expressa como arte através das estampas. Apresentei o vídeo Adinkra Symbols Ghana: Part 3. Textile Printing de 3 minutos que mostra como os ganeses pintam e carimbam seus tecidos, achei que seria importante mostrar aos alunos como são feitas essas pinturas para que eles pudessem entender melhor a importância desses símbolos na cultura dos ganeses.


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Inseri a turma na criação de suas simbologias para que pudessem expressar suas ideias, suas criações, para os auxiliar a entender melhor o mundo em que vivem e modificar a maneira como eles vêem culturas diferentes da sua. De acordo com Duarte Junior (1991, p.70):

Na medida em que nos seja dado experienciar a produção artística de outras culturas, torna-se mais fácil a compreensão dos sentidos dados à vida por essas culturas estrangeiras. Através da arte se participa dos elementos, dos sentimentos que fundam a cultura em questão, o que é o primeiro passo para que se interprete as suas mensagens e significações. Há uma certa universalidade nos símbolos artísticos, que permitem que as barreiras impostas pelas línguas diferentes sejam derrubadas.

A simbologia proporciona aos alunos uma visão diferente a que estão habituados, ampliando o conhecimento e a visão de mundo de cada um. Colocar a disposição da turma uma simbologia desconhecida, e fazer com que eles apropriem-se da mesma para desenvolverem suas próprias interpretações. Entendendo que estes símbolos são utilizados para expressar sentimentos, não são feitos aleatoriamente, e possuem valores simbólicos e culturais tanto para a tribo estudada, quanto para o patrimônio cultural. É muito importante despertar nos alunos curiosidade com relação a questões culturais, pois precisamos desenvolver pessoas capazes de respeitar, entender e interpretar culturas diferentes das suas. Derrubando as barreiras do preconceito de uma sociedade incapaz de valorizar sua cultura de origem, e culturas muito diferentes ou desconhecidas da sua. Após assistirem o vídeo, perguntei o que eles tinham achado do vídeo, mais uma vez alguns alunos fizeram piadinhas, mas eu os ignorei. Perguntei se o vídeo os ajudou a entenderem melhor como os símbolos são feitos e utilizados na estamparia e a importância que cada símbolo possui dentro da cultura Adinkra. A turma respondeu que sim, então prossegui com a aula. Distribui pedaços de tecido de algodão cru, e disse a eles que deveriam utilizar esse tecido para fazer a bandeira de suas tribos. Sugeri que antes de desenharem no tecido, fizessem um esboço do desenho em um papel, pois, caso mudassem de ideia, poderiam apagar. A turma ficou curiosa com o tecido, eles olharam os dois lados, cheiraram, passaram a mão, tentando entender que material era aquele que eles não conheciam. Interessante foi perceber que apesar de simples, o tecido aguçou nos alunos seus sentidos tátil, olfativo e visual, tamanha a curiosidade em descobrir o


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novo material. Fiquei feliz por ter proporcionado a eles conhecer outro tipo de material que aguçou os sentidos e despertou a curiosidade da turma. Os alunos trabalharam um pouco mais calmos que na aula anterior, a turma toda estava participando da atividade, inclusive a aluna Lavínia que até então não tinha produzido nada. Acredito que o fato da aluna decidir participar da aula se deu devido ao material novo com que eles estavam trabalhando, nela também despertou interesse e curiosidade. Seu grupo não produziu um trabalho muito bem elaborado, o trabalho possui algumas formas geométricas soltas, sem muito sentido. Porém o fato da atividade ter despertado interesse da aluna já consta como um ponto positivo. Já o trabalho desenvolvido pela tribo Mirambu que significa tribo das feiticeiras, composto pela alunas Yasmim, Julia M., Julia S., Janine e Rahiane está sendo bem elaborado pelo grupo. As meninas pensavam, esboçavam desenhos, discutiam formatos e cores até chegarem num consenso entre elas. Elaboram um desenho com uma bola de cristal entre duas espadas no centro do tecido, na parte superior está a representação do fogo, na inferior a água, e na direita a mãe terra e na esquerda o vento. A explicação do desenho partiu delas e segundo as mesmas, simbolizam os quatro elementos escolhidos para representar a tribo criada pelas meninas. Percebi que cada grupo foi capaz de desenvolver seu desenho de maneira única, cada um com a particularidade de seus integrantes, expressando na atividade plástica seus conhecimentos adquiridos em aula, e suas próprias vivências formando assim desenhos organizados e que possuem sentido para cada integrante do grupo. Um diferente do outro com suas simbologias e significados. É interessante refletir que estas diferenças de desenhos podem ser comparadas com as diferentes culturas de um país. Por exemplo, apesar de vivermos em um mesmo país, existe uma grande diferença cultural entre o povo residente no sul, e o povo residente no norte. Duarte Junior (1991, p.30) explica que essas diferenças culturais em um mesmo país chama-se sub-culturas; “[...] isto é: todos são brasileiros (possuem traços comuns), mas apresentam características próprias de viver.” Pude notar esta diferença no trabalho dos alunos. Como em um país, cada grupo desenvolveu dentro de seu “estado”, ou seja, grupo, características diferentes que os identificam como uma tribo, de acordo com o conhecimento adquirido em aulas anteriores, vivências, preferências estéticas e afinidades. Foram capazes de organizar suas ideias no tecido, discutindo e interagindo com o grupo. Acredito que a turma


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atingiu os objetivos propostos para essa aula. Somente dois grupos, que por vezes tive que chamar a atenção, não desenvolveram um trabalho satisfatório. Ao conversar com um dos grupos, eles me disseram que fariam uma bandeira inspirada na bandeira da Itália. Informei a eles, que o grupo deveria se basear em imagens já estudadas, e que não deveriam fugir ao tema proposto. O grupo que fez este trabalho é a tribo Tuba. Apesar de acreditar que o grupo tivesse condições de desenvolver um trabalho mais elaborado e usado de suas capacidades cognitivas para criar uma bandeira, não insisti com eles e, os deixei trabalhar da forma que achavam que seria melhor. Procurei respeitar o desejo do grupo sem criticá-los.

Trabalho da Tribo Tuba dos alunos Enzo, Weslley Emerson, Wellison e Darlan (Fonte: DALLA COSTA, 2012).

A Tribo Suricato desenvolveu um trabalho simples, com poucos desenhos, todavia o grupo soube organizar bem os desenhos e formas criados por eles em aulas anteriores no tecido. Recriando suas ideias e conceitos, transformando seus desenhos em outro.


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Trabalho tribo Suricato dos alunos Marcelle, Diovana, Matheus B. Criseverton, João e Maria. (Fonte: DALLA COSTA, 2012).

É possível perceber que os alunos souberam fruir as formas artísticas observadas nas aulas anteriores e as suas próprias produções, utilizando informações perceptivas e imaginativas estabelecendo que as formas criadas por eles possuam um significado conforme suas capacidades de interpretação. Cada grupo foi capaz de desenvolver suas ideias de maneira única, criando características para suas tribos. Acredito que os objetivos propostos foram alcançados, pois pude observar ao longo da aula que o grupo de educandos foi capaz de desenvolver a capacidade criativa desenvolvendo uma identidade para a tribo através dos seus trabalhos plásticos, salvo alguns alunos que produzem pouco e não colaboram com o grupo. No entanto quando entreguei algumas imagens da simbologia Adinkra impressa os educandos não sentiramse motivados e sensibilizados com as imagens, somente após observarem o vídeo é que eles sentiram-se mais entusiasmados para desenvolver a atividade plástica. Apesar da agitação da turma que por vezes atrapalha um pouco, o desenvolvimento e a compreensão dos alunos está sendo satisfatório. Porque notei que


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estava existindo um entendimento maior com relação à África e seu povo, e uma evolução dos trabalhos em cada aula. Avalio esta aula como positiva, pois existem alunos interessados e comprometidos com a aula e, as atividades, porém existem alguns alunos que perturbam demais a aula atrapalhando o desenvolvimento e aprendizagem dos demais alunos. Todavia é preciso compreender que estas atitudes comportamentais fazem parte da realidade em sala de aula e é necessário que se busque meios para estimular estes alunos a serem mais colaborativos com professores e colegas.


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3.2.7 Sétimo Encontro. Aula 7 ( 90 minutos – 1 hora/ aula). Data: 09/10/2012 – Terça-feira. Horário 1° Período. Das 09h25 min às 10h15min.

Tema da aula: Identificando minha tribo

Conteúdos: 

Atividade plástica.

Lista de atividades: 

Finalização da atividade plástica utilizando tintas e pincéis.

Objetivos: 

Oportunizar aos alunos experimentações com tinta em tecido.

Buscar soluções para desenvolver as cores desejadas.

Metodologia: 

Prática artística com tintas e tecido.

Recursos Materiais: 

Folhas A4.

Tintas guache.

Pincéis.

Tecido de algodão cru.

Avaliação: 

Participação dos alunos com a atividade proposta.

Desenvolvimento do trabalho plástico.


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Capacidade de interagir com o grupo durante o desenvolvimento do trabalho plástico.

Capacidade de desenvolver soluções para o desenvolvimento da atividade.

Planejado: Nesta aula devolverei aos alunos as bandeiras iniciadas na aula anterior. Será oportunizado aos alunos experimentações de materiais como tecido, tintas e pincéis para que eles possam perceber os efeitos que a tinta pode dar ao tecido. Eles também poderão intervir no desenho que já foi esboçado, caso percebam que não estão tendo o resultado esperado, ou tenham mudado de ideia e queiram desenvolver um novo desenho, proporcionando aos alunos autonomia e confiança para desenvolver a atividade plástica. Serão disponibilizados aos alunos somente algumas cores de tinta para a pintura da bandeira. Pois a intenção da atividade é que eles possam fazer experimentações com as tintas, descobrindo por eles mesmos as diversas misturas que podem ser feitas para se obter diferentes cores. Como os alunos não estão acostumados a pintar em tecido será muito importante que todos os alunos participem da atividade. Os grupos terão que se organizar de maneira que todos os alunos do grupo possam participar da pintura da bandeira. Esta atividade também servirá para que os alunos possam interagir entre eles, discutindo, e buscando entre o grupo soluções para que consigam em comum acordo chegar ao resultado esperado por eles. Após o término desta atividade os alunos irão me entregar os trabalhos para que eu possa colocar em um local seguro para a secagem.

Realizado: Iniciei a aula devolvendo aos alunos as bandeiras confeccionadas na aula anterior, para eles iniciarem a pintura das mesmas. Pedi que eles se unissem a seus grupos, disse que eu distribuiria tintas guache, acrílica e pincéis. Alertei-os que para não haver bagunça, eu deixaria em cima da minha mesa um vidro com água e um pano para eles poderem lavar os pincéis. A professora Ceci, que é a professora titular da turma, me pediu licença, pois precisava conversar comigo. Ela veio me falar que a aula seria somente até às 10 horas, porque era dia da entrega dos boletins, portanto, a aula ficaria reduzida a 35 minutos.


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Como na semana passada a professora Ceci havia me dito que estava curiosa para ver os trabalhos dos alunos, convidei-a a participar da aula. Ela perguntou se eu não ficaria insegura, pois não era a intenção dela me atrapalhar. Respondi que não, e que assim ela poderia ver os trabalhos dos alunos. Devido à aula reduzida, muitos alunos faltaram, porém os alunos presentes estavam bastante envolvidos com a atividade plástica. Não foi necessário dizer a eles que todos deveriam participar da experiência da pintura em tecido. Eles organizaram-se de tal maneira que todos do grupo puderam participar da experimentação. A professora Ceci comentou comigo que estava espantada, pois era a primeira vez, neste semestre, que ela estava vendo toda a turma trabalhando em conjunto e sem bagunça. Proporcionar atividades diferentes e de experimentação em que os alunos possam interagir com o material disposto é de grande importância para o desenvolvimento da capacidade cognitiva e de criação. Acredito que seja por este motivo que os alunos envolveram-se tanto com a atividade desta aula. Pois tiveram a oportunidade de fazer suas experimentações com tinta em tecido, atividade a qual eles não conheciam. Sair do convencional auxilia os alunos a ampliarem seus conhecimentos, descobrirem outras formas de desenvolver a atividade plástica ampliando suas visões artísticas. A aluna Yasmin pintou a bandeira de seu grupo sozinha durante a aula, porque somente ela do grupo veio à aula. O grupo de Yasmin é o Mirambu.

Trabalho da tribo Mirambu das alunas Júlia G., Julia S., Janine, Yasmim e Rahiane (Fonte: DALLA COSTA, 2012)


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Como é possível observar este grupo foi capaz de desenvolver o trabalho plástico adequado com as ideias e aprendizados que elas vêm desenvolvendo ao longo das aulas. Percebi que este aprendizado está relacionado não somente ao conteúdo estudado em sala de aula, mas a maneira com que o grupo se coloca frente ao mundo. Conforme descrição das integrantes do grupo Mirambu, elas utilizam os 4 elementos da natureza que são: terra, água, fogo e vento para lutar em defesa da mesma. Estes elementos podem ser interpretados dentro do universo imaginário como poderes mágicos, ideia que possivelmente foi construída através de estórias e imagens assistidas em desenhos animados. Por isso é muito importante que o educador seja sensível e observe os trabalhos desenvolvidos pelos alunos levando sempre em consideração o conhecimento que eles adquirem fora do ambiente escolar. As alunas colocaram-se dentro do universo imaginário, intitulando-se como feiticeiras que protegem a natureza. O grupo desenvolveu uma simbologia própria, inspiradas em imagens da simbologia Adinkra e do artista Rubem Valentim, criando uma simbologia única, unindo diversos elementos estudados e que trazem, além dos conteúdos estudados, suas experiências de vida para a criação de uma imagem que as identifica como grupo. Apesar da aluna Yasmim ter pintado a bandeira sozinha, as cores foram escolhidas por todo o grupo na aula anterior. Já o grupo Caete, formado pelos alunos Thaisa, Matheus B, Juliane e Eliaz, passaram a maior parte da aula discutindo sobre assuntos que não faziam parte da aula. Por esse motivo desenvolveram um trabalho plástico que me pareceu, num primeiro momento, não ter um vínculo com o significado do nome da tribo que é “terra dos sábios”. No entanto, o grupo desenvolveu um trabalho plástico muito forte que expressa uma semelhança formal com o trabalho do artista Rubem Valentim, pois possui um simbolismo e uma relação com as religiões de matrizes africanas. É possível fazer uma leitura relacionada ao costume que os iniciados e, até mesmo os simpatizantes das religiões afro-brasileiras tem em colocar na porta de suas casas a planta chamada popularmente de espada de São Jorge cruzada como forma de proteção.


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Trabalho da tribo Caete dos alunos Thaisa, Matheus B, Juliane e Eliaz (Fonte: DALLA COSTA, 2012)

Perguntei ao grupo o que significavam as espadas cruzadas. O grupo não soube responder. Eu disse a eles que os trabalhos feitos por eles deveriam seguir uma linha de raciocínio, assim como o restante da turma estava fazendo. A aluna Thaisa, me respondeu em tom agressivo: ─ Ai sora [sic] a senhora é muito exigente e chata!

Respondi à aluna que precisava ser exigente com eles, porque eles precisavam entender que a aula de artes não é aula para se fazer qualquer coisa e entregar para ganhar nota. A aula de artes é tão importante para o aprendizado deles quanto qualquer outra disciplina. Apesar de eu não ter percebido qual foi a relação entre a bandeira criada e o significado do nome da tribo, devo levar em consideração que o trabalho plástico desenvolvido por eles, possui uma ligação com a religião afrobrasileira que foi estudada quando apresentei as obras de Rubem Valentim. O grupo soube desenvolver uma imagem muito forte. Que eles podem ter feito relações com alguma experiência de vida do grupo, ou imagens vistas e/ou interpretadas por eles em algum momento da aula. Importante ressaltar é possível que algumas vezes o professor se precipite com relação ao trabalho dos alunos, foi o que aconteceu comigo neste


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momento. Como criei muitas expectativas com relação aos resultados dos alunos não percebi que os educandos expressavam em suas atividades os conteúdos trabalhados em aula, somente depois de muita reflexão e leituras é que consegui abrir meus olhos e perceber o quanto esses alunos estavam expressando em suas atividades seus aprendizados. Por conta disso passei a entender e a olhar para as atividades desenvolvidas pelos educandos de outra forma, menos exigente e mais reflexiva. O grupo da tribo Suricato, criou uma bandeira utilizando desenhos e significados criados por eles em atividades em sala de aula. Inspiraram-se em imagens de obras de Rubem Valentim e Esther Mahlangu utilizando elementos geométricos para criar uma simbologia para a tribo.

Trabalho da Tribo Suricato dos alunos Marcelle, Diovana, Matheus B. Criseverton, João, Cristian e Maria. (Fonte: DALLA COSTA, 2012).

Já no grupo Tuba os alunos desenvolveram um trabalho plástico inspirado em bandeiras tradicionais, e utilizaram um símbolo, copiado por eles, da simbologia adinkra para colocar como brasão da bandeira.


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Trabalho da tribo Tuba dos alunos Enzo, Weslley, Emerson, Wellison e Darlan. (Fonte: DALLA COSTA, 2012).

Acredito que os integrantes do grupo poderiam ter baseado-se mais em conteúdos e imagens estudadas por eles em aula para a criação da bandeira. De qualquer forma não posso deixar de destacar, que os alunos foram capazes de desenvolver a atividade utilizando cores variadas observadas nas obras de Esther Mahlangu que foram estudadas por eles. O aluno Guilherme, único integrante da tribo Passos Solitários, não esteve presente na aula, portanto seu trabalho ficou sem a pintura. Porém é possível perceber, não somente neste trabalho, mas também nos anteriores, uma grande influência de imagens estudadas por eles, como as de Esther Mahlangu e Rubem Valentim. Desta maneira é possível perceber que no decorrer das aulas os alunos foram capazes de contextualizar, desenvolver suas próprias leituras de imagens para criar seus trabalhos plásticos.


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Trabalho da tribo Passos Solitários do aluno Guilherme (Fonte: DALLA COSTA, 2012).

A proposta era que os alunos desenvolvessem a partir da leitura de obras, imagens e simbologias africanas e afro-brasileiras suas próprias imagens. Criando e apreciando tanto as obras dos artistas, quanto a simbologia e misticismo que há por trás dos símbolos e das religiões, acredito que a turma conseguiu atingir estes objetivos, pois desenvolveram trabalhos bastante simbólicos e souberam relacionar muito bem a teoria com a prática. Também foi interessante a prática de experimentação de tinta em tecido que serviu para que os alunos pudessem fazer suas experimentações e perceber como a tinta se comporta no tecido e fazer experimentos misturando as tintas proporcionando uma atividade a qual eles ainda não haviam tido oportunidade de ter. E como podemos obter diferentes resultados dependendo dos materiais que estavam sendo utilizados. A turma concentrou-se tanto na atividade que não se deram conta quando a vice diretora invadiu a sala para avisar que a aula havia acabado. Essa atitude da direção agitou os alunos, que guardaram seus materiais, entregaram os trabalhos e saíram correndo. Apesar do tempo reduzido, todos os grupos conseguiram terminar a atividade proposta para esta aula.


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3.2.8 Oitavo Encontro. Aula 8 ( 90 minutos – 1 hora/ aula). Data: 10/10/2012 – Quarta-feira. Horário 3° Período. Das 07h45 min às 08h35min.

Tema da aula: Conversa virtual.

Conteúdos: 

Questionário respondido pelo Senhor Gideon.

Produção plástica.

Lista de atividades: 

Leitura do questionário respondido pelo senhor Gideon.

Desenvolver o trabalho plástico que tenha uma ligação entre o questionário e os conteúdos já estudados pela turma.

Objetivos: 

Despertar o interesse dos alunos nas respostas enviadas pelo senhor Gideon.

Expressar e representar ideias relacionadas ao questionário através da atividade plástica.

Metodologia: 

Aula expositiva dialogada.

Prática artística.

Recursos Materiais: 

Folhas A4.

Lápis de cor.

Mapa mundi.


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Avaliação: 

Colaboração da turma na leitura do questionário.

Participação e envolvimento dos alunos com a atividade plástica.

Planejado: Iniciarei esta aula com uma conversa com a turma. Irei perguntar a eles se recordam-se do questionário que elaboramos na semana passada, que eu disse que seria para um trabalho que eu estava desenvolvendo na universidade. Em seguida perguntarei a eles se eles sabem onde fica a Nigéria, e um a um virão até o mapa para descobrir onde se localiza tal país. Após esta atividade, que servirá para auxiliá-los a entender sobre qual país estamos falando e onde ele se localiza no mapa, explicarei que consegui contato com uma pessoa nascida na Nigéria. E que o questionário elaborado pela turma foi enviado a ele. Contarei a eles que o nome desta pessoa é Gideon, ele é originário da Nigéria, mas atualmente vive em Porto Alegre, e que gentilmente disponibilizou-se a responder as dúvidas e curiosidades da turma. Em seguida irei ler para os alunos as perguntas e respostas, fazendo uma reflexão com a turma sobre cada uma delas. Questionarei e instigarei os alunos a recordarem-se de conteúdos já trabalhados em aula. Auxiliarei a turma a recordar e fixar os conteúdos vistos anteriormente. Após esta atividade reflexiva, os alunos irão desenvolver um trabalho plástico baseado nos conteúdos estudados e posteriormente enviarei via email as produções dos alunos para o senhor Gideon como forma de agradecimento pela atenção e gentileza dele conosco.

Realizado: Iniciei a aula perguntando aos alunos se eles recordavam-se do questionário que fizemos na semana anterior, a turma respondeu que sim. Com o mapa mundi pendurado no quadro, perguntei aos alunos se eles sabiam onde ficava a Nigéria. Fui chamando-os, um de cada vez para procurar no mapa onde se localizava o país, e que ao encontrar não falassem nada, para oportunizar aos seus colegas que também pudessem encontrar por conta própria. Os alunos estavam calmos, e colaboraram com a atividade. Cada um deles veio até o mapa, procurou o país, e retornou em silêncio para sua classe. Após todos terem participado da atividade, contei a eles que enviei o questionário feito


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em aula para uma pessoa que nasceu e viveu na Nigéria. Minha fala causou expressões de espanto e surpresa na turma, os alunos se olharam e fizeram comentários entre eles em voz baixa. Imprimi uma imagem do Senhor Gideon para poder mostrar aos alunos quem era a pessoa que fez a gentileza de ler e responder o questionário deles. Falei à turma que o Senhor Gideon é nigeriano de origem, e que hoje vive em Porto Alegre, expliquei também, conforme ele havia me falado, que nunca viveu em uma tribo, nem nunca teve contato com a mesma. Depois de ter situado os alunos a respeito de onde fica a Nigéria, e quem era a pessoa que havia respondido as perguntas deles, comecei a leitura das perguntas e respostas, a turma ficou em silêncio, prestando atenção.

1.

Como é ser nascido na África?

Eu nasci na Nigéria - que é apenas um dos 54 países africanos - ao meu ver, não deve ser diferente à experiência de qualquer outra pessoa que nasceu em outro continente. Os que nascem na América – os brasileiros, chilenos, canadenses, mexicanos, etc., devem se sentir contentes por pertencer a uma pátria de mesma maneira que eu me sinto.

2.

Como são as vestimentas usadas em seu país? Antes do contato com os europeus, temos nossas vestimentas, coloridas e

com túnicas bordadas a mão, panos com textura trabalhados em tear, considerado em outra cultura como algo exótico, mas para nós é bem comum. Depois de contato com os europeus, começamos a usar outro tipo de roupas, como as deles, ocidentais. Hoje, não é incomum ver pessoas vestidas com mesmo tipo de roupa que maioria usa aqui no Brasil. Ah, vocês lembram que aqui no Rio Grande do Sul os GAUCHOS se vestem um pouco diferente, com bombacha. Para mim, esta maneira de se vestir não é nada exótica, mas reflete uma tradição respeitada aqui no RS. Depois de eu ter lido a resposta 2, expliquei à turma que o Senhor Gideon fez uma comparação das vestimentas usadas pelas pessoas de seu país, e as vestimentas tradicionais do Rio Grande do Sul. Falei a eles que ele quis dizer que para algumas pessoas que não conhecem a cultura do Rio Grande do Sul, as bombachas podem parecer estranhas, assim como as roupas usadas no país dele. Mas para ele, essas roupas


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nada tem de estranhas, elas somente fazem parte da nossa tradição, assim como as roupas usadas em seu país. Antes de ir para a próxima pergunta, questionei a turma se eles recordavam da nossa primeira aula, em que apresentei imagens de cidades africanas, eles responderam que sim. Então perguntei como eram essas cidades, eles responderam que eram como as que temos aqui no Brasil. Dei prosseguimento à leitura das respostas.

3.

Como são as casas? De um modo geral, isso depende de onde você se encontra. Muitas pessoas

que não conhecem África pensam que as casas são muito diferentes daqui, mas confesso que muitos vão levar um choque ao ver que temos muitas coisas em comum com povos de outros continentes.

Ressaltei mais uma vez, pois já havia falado em outras aulas, que é necessário quando pensamos a respeito da África, lembrar que apesar de ser um continente distante, eles vivem como qualquer um de nós aqui no Brasil. Perguntei a eles se em nosso país só existe pobreza, pessoas que vivem em barracos, eles me responderam que não. Então disse a eles que nos países africanos é a mesma coisa, existem pessoas muito podres, mas também existem pessoas que vivem como nós. Moram em casas como as nossas, possuem trabalho iguais aos nossos, o que nos diferencia é somente o país no qual nascemos, e que nossa cultura está baseada em culturas trazidas pelos escravos vindos de vários países africanos.

4.

Como são as religiões em seu país? No meu país, Nigéria, tem várias religiões e contrário ao que se vê na

televisão, o povo tem direito de escolher sua própria religião, existem três religiões principais - Islamismo, Cristianismo e religião tradicional.

5.

Qual é a língua falada em seu país? Inglês é a língua oficial (e de ensino). Claro, existem várias outras línguas e

cada língua tem vários dialetos. Temos língua Hausas, Ibos, Ioruba, Fulani e tantos outros. A minha língua é ioruba, que falamos na minha cidade, Lagos, e outros estados de parte ocidental da Nigéria.


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6.

Os africanos de seu país sofrem muito preconceito? Não. Mas como eu só conheço dois países africanos e, portanto não posso

opinar sobre toda África. Eu pessoalmente acho que preconceito existe em toda a sociedade, em todos os lugares e em todas as situações. De certa maneira, a palavra “preconceito” por si não é ruim. Para mim é vocabulário como qualquer outro seja água, fogo, carro, homem, mulher, etc... Na Nigéria, meu país, o fato de sermos predominantemente negros fazendo a maioria da população, não existe esta visão de nos sentirmos inferiorizados pelos brancos, porque não temos brancos! Como exemplo, posso citar minha sobrinha Sola, que somente já adolescente, quando da vinda dela para os Estados Unidos, que viu de perto os brancos, e achava engraçado o tipo de cabelo, de pele, etc, porque nunca havia visto antes. A nossa autoestima é maior e temos mais orgulho de sermos quem somos, porque não existe dominação de raça e cor na sociedade nigeriana... temos em termos de etnias, mas nunca por cor da pele.

Esta resposta causou grande surpresa da turma. Os alunos se entre olharam, surpresos. A aluna Marcelle acreditou que não tinha ouvido bem, percebi isso em sua expressão facial, e levantou a mão e perguntou: ─ Sora [sic]!!! Lá na Nigéria não tem racismo?

Respondi que não, pois conforme o senhor Gideon escreveu, a população da Nigéria é basicamente de negros. Li novamente a resposta para a turma. Eles então começam a processar a informação da resposta, e mais uma vez espantaram-se quando se deram conta de que a sobrinha do senhor Gideon não conhecia pessoas brancas. Os alunos começaram a conversar e me perguntaram como a menina nunca havia visto uma pessoa branca. Tive que pensar rapidamente como eu iria explicar, de uma maneira que eles pudessem entender a situação que aconteceu com a sobrinha de Gideon. Procurei levar o notebook em todas as aulas, para caso de emergência, e este foi um caso. Liguei o notebook, e mostrei uma imagem que foi apresentada a eles na primeira aula, esta imagem foi a que mais causou espanto na turma naquele dia.


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Mulher da tribo Omo (Fonte: http://www.omovalley.com/)

Perguntei para eles que reação eles teriam caso encontrassem esta pessoa. Uns responderam, medo, curiosidade, espanto, engraçado, etc. Antes de iniciar a explicação, ressaltei que a menina Sola, sobrinha do Senhor Gideon, não vive em uma tribo. Ela vive em uma cidade, e em uma casa como as nossas, com pessoas como nós, a diferença é que no país em que ela vive, que é a Nigéria, todos são negros. E ao ver pessoas muito diferentes as que ela está acostumada, achou engraçado a cor da pele, os cabelos, etc. A mesma reação que eles teriam caso encontrassem uma pessoa muito diferente a que eles estão habituados. Questionei-os se haviam entendido a resposta do Senhor Gideon, os alunos responderam que sim, então li a última resposta.

7.

Como é a convivência entre as pessoas de seu país? Existe violência? Creio que Nigéria vive buscando forma de viver em paz entre todos os

grupos étnicos e religiosos e já que se trata de ser humano, claro que há chance de que algumas pessoas, por várias razões – pessoais ou de interesse localizado – podem partir para violência, mas devo dizer que isso nunca teve (nem creio que vai ter) apoio de governo do país.


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Distribui folhas A4 para eles, e expliquei que eles deveriam desenvolver um desenho baseado nos conteúdos que já havíamos trabalhados em aula como forma de agradecimento a gentileza do senhor Gideon em responder nosso questionário. Confesso que está sendo difícil fazer os alunos compreenderem que não só na África, mas no mundo todo existem pessoas muito diferentes de nós, e que temos muito a aprender com culturas diferentes. Ampliar a visão estereotipada do continente africano está sendo quase uma batalha. Duas alunas vieram me perguntar se poderiam desenhar cabanas. Apesar de eu já ter explicado muitas vezes, e ter feito comparações, explicando que em nosso país existem tribos de índios que vivem em cabanas, mas que a grande parte de nós vivem em casas comuns, na África não é diferente, tive a impressão de que tudo o que eu já havia falado não tinha servido para nada. Em uma conversa com senhor Gideon, via e-mail, na qual elogiou meu trabalho, e ao mesmo tempo alertou-me da dificuldade que eu teria em quebrar a imagem estereotipada do negro africano, nesta aula pude confirmar isso. Apesar de eu ter me decepcionado, olhei para este fato como positivo, pois parei para pensar nas atividades e conteúdos que estão dando certo e que não estão dando tão certo quanto eu esperava, e onde eu posso modificar e repensar meu projeto, bem como as próximas aulas. Contudo, a turma desenvolveu a atividade plástica muito bem. Destaquei o trabalho da aluna Lavínia, que nas duas últimas aulas tem participado das atividades, o que não tinha acontecido anteriormente. A aluna desenvolveu um trabalho muito interessante, ela desenhou dois elefantes, segundo ela, um do lado direito, e outro do lado esquerdo. Ao centro são duas pessoas que protegem os elefantes. Este desenho é de fato muito curioso, consigo notar as imagens que aluna descreveu, mas destaco a capacidade que ela teve em estilizar o seu desenho, sem preocupar-se com formas perfeitas, conseguindo representar muito bem a sua ideia, criando um simbolismo muito particular. A aluna utilizou cores, que para ela, lembram a África, desenvolvendo sua capacidade criadora e imaginativa.


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Trabalho da aluna Lavínia (Fonte: DALLA COSTA, 2012).

O outro trabalho que me chamou muito a atenção foi do aluno Criseverton. Em aulas anteriores precisei chamar a atenção dele para que ele fizesse as atividades, porém nesta aula foi diferente. O aluno prestou atenção enquanto eu explicava, esboçou um desenho no papel, e me chamou para perguntar se estava certo. Antes de responder, perguntei a ele o que ele achava de seu desenho. Ele me respondeu que achava legal, perguntei por que ele achava legal, e ele me disse que era porque nunca tinha feito um desenho como este. Questionei-o se o desenho tinha algum significado, o aluno disse que sim, que era o protetor dos povos, que o símbolo que ele tem no centro é o símbolo de seu poder de proteção.


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Trabalho do aluno Criseverton (Fonte: DALLA COSTA, 2012).

Criseverton utilizou formas geométricas para construir seu desenho, foi capaz de trabalhar seu imaginário para criar a imagem do protetor dos povos. Diferente de Lavínia, o aluno preocupou-se com as formas utilizadas, usando a régua para isso. No entanto, assim como Lavínia, o menino foi capaz de estilizar o seu desenho e representar muito bem, e a sua maneira, usando sua capacidade de criação para desenvolver a atividade plástica. Conforme Iavelberg (2006, p.57), através da atividade plástica e “por intermédio do desenho a criança pode expressar seus conhecimentos e suas experiências, colocando-se em sua poética de modo singular”. Mesmo com algumas dificuldades, percebi nos alunos uma confiança maior no desenvolvimento de seus trabalhos. A liberdade de expressão que tiveram durante a aula propiciou que eles conseguissem expressarem-se por meio de seus conhecimentos, experiências e sentimentos de uma maneira única e muito particular. O trabalho plástico do aluno Wellison foi o menos satisfatório, pois ele copiou o desenho da bandeira da Nigéria que estava no mapa. Todavia quando olhei para o verso da folha, li uma frase muito interessante escrita por ele, a frase era a seguinte: “Muito obrigado pela sua história. Gostei muito, você é um exemplo do que imaginei.” Apesar dele não ter desenvolvido um desenho criado por ele, a frase expressa seu sentimento com relação às respostas do senhor Gideon. Acho válida a


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escrita do aluno, pois mesmo não desenvolvendo um bom trabalho plástico, ele buscou uma outra forma de expressar o que estava pensando com relação às respostas.

Trabalho do aluno Wellison. Fonte: (DALLA COSTA, 2012).


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Trabalho do aluno Wellison. Fonte: (DALLA COSTA, 2012).

Em nossa segunda aula, notei certa insegurança na turma, pois eles estavam limitados a desenhar conforme a solicitação da professora. Isto ocorreu porque “[...] infelizmente observamos crianças inseguras com os resultados de seus desenhos, talvez isso se deva à precocidade com que são expostas a um excesso de imagens visuais pela mídia, sem trabalho orientador de leitura e desenvolvimento de percurso de criação pessoal” Iavelberg (2006, p. 57). Apesar dos alunos estarem inseguros com o desenvolvimento da atividade, avaliei esta aula como positiva. Mesmo alguns alunos não tendo conseguido terminar


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o trabalho, acredito que conseguiram alcançar os objetivos propostos, pois os alunos tiveram grande interesse em ouvir as respostas do senhor Gideon, e participaram da atividade proposta. O interesse foi tamanho que eles me pediram para eu levá-lo à escola. Expliquei a eles que o senhor Gideon também gostaria de conhecê-los, mas infelizmente ele está com a agenda lotada, não podendo deslocar-se até a escola para conversar com eles. O contato com o senhor Gideon por e-mail me surpreendeu muito, porque não imaginava que os alunos iriam sentir-se tão curiosos e interessados em suas repostas. Também foi muito importante perceber que os alunos valorizaram e sentiram-se valorizados com essa troca de informações. O desenvolvimento plástico dos alunos também estava muito bom, fiquei feliz em poder proporcionar para eles aulas nas quais eles puderam expressar suas ideias, sentimentos, vontades, e desenvolver a criatividade. Incentivando-os a serem capazes de tomar as suas próprias decisões, e a ter autoconfiança para desenvolverem o trabalho plástico, como por exemplo: quais cores escolher, que formas podem usar, sejam elas geométricas ou abstratas, como organizá-las no papel, etc. Acredito que a turma atingiu os objetivos propostos para esta aula, pois enquanto eu lia as respostas enviadas pelo senhor Gideon a turma permaneceu em silêncio para ouvir, argumentaram as respostas, relacionaram com imagens estudadas, e desenvolveram uma atividade plástica muito rica e simbólica conforme vinham fazendo em aulas anteriores.


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3.2.9 Nono Encontro. Aula 9 ( 90 minutos – 1 hora/ aula). Data: 16/10/2012 – Terça-feira. Horário 3° Período. Das 09h25 min às 10h10min.

Tema da aula: Descobrindo Mestre Didi

Conteúdos: 

Vida e obra de Mestre Didi.

Leitura e crítica das reproduções de obras de Mestre Didi.

Lista de atividades: 

Leitura de imagem.

Apresentação do artista Mestre Didi.

Construção de uma escultura para a tribo.

Prática e utilização de materiais orgânicos e recicláveis.

Objetivos: 

Fazer leitura de imagem oportunizando aos alunos que expressem suas ideias e

conhecimentos adquiridos em aulas anteriores. 

Oportunizar à turma desenvolver um trabalho plástico com materiais que eles não

estão acostumados a utilizar em aula, estimulando a criatividade dos alunos. 

Possibilitar aos alunos experimentar e explorar os materiais disponibilizados para

o desenvolvimento do trabalho plástico.

Metodologia: 

Aula expositiva dialogada.

Leitura de imagem.

Prática artística.


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Recursos Materiais: 

Data show.

Materiais recicláveis e orgânicos.

Pincéis e tintas.

Barbantes.

Flores de plástico.

Fitas coloridas.

Avaliação: 

Participação dos alunos na leitura de imagem.

Interesse e respeito pelas produções dos colegas.

Capacidade de interagir com o grupo e de manipular os materiais.

Planejado: Esta aula será iniciada com imagens do artista Mestre Didi. Apresentarei aos alunos as obras do artista. Antes de falar a respeito das obras, os alunos irão fazer uma leitura de imagem expressando suas impressões a respeito das imagens que serão apresentadas. Após esta primeira atividade, irei falar a respeito do artista, suas obras e influências africanas. Mestre Didi é um artista que desenvolve esculturas que possuem influências africanas, afro-brasileiras e religiosas. O artista desde muito pequeno teve contato com a cultura afro-brasileira e a religião candomblé. Ainda criança, aprendeu a manipular materiais dedicados aos deuses religiosos que influenciam o desenvolvimento de sua arte. O artista expressa em suas obras o simbolismo, mitos e a espiritualidade da religião afro-brasileira desenvolvendo um trabalho com materiais orgânicos como varetas que dão aspecto delicado às obras. Essas varetas referem-se aos deuses da terra e têm o orixá Obaluaê como figura central. O artista também combina outros materiais desenvolvendo uma cuidadosa composição de materiais e cores que fazem referência aos orixás Nanã e à serpente Oxumarê.


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Mestre Didi, 2007 (Fonte: http://murilocastro.com.br/2008-mestre-didi-da-ancestralidade-a-contemporaneidade/)

Mestre Didi, 2001 (Fonte: http://murilocastro.com.br/2008-mestre-didi-da-ancestralidade-a-contemporaneidade/ )


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Mestre Didi, 2003 (Fonte: http://murilocastro.com.br/2008-mestre-didi-da-ancestralidade-a-contemporaneidade/ )

Para que haja uma compreensão maior dos alunos a respeito de quem são esses orixás, também serão apresentadas imagens dos orixás Obaluaê, que é o orixá que representa proteção à saúde.

Obaluaê (Fonte: http://universodaumbanda.blogspot.com.br)


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Oxumarê, que representa os ciclos da terra, Nanã que é a representação da criação da terra, o princípio, o meio e o fim. E Xangô que é representado pelo artista com o machado de dois lados, esse orixá representa a justiça.

Oxumarê (Fonte: http://www.raizesespirituais.com.br/orixas/oxumare)

Nanã (Fonte: http://dallablog.zip.net/arch2007-07-01_2007-07-31.html)


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Xangô (Fonte: http://www.casaiemanjaiassoba.com.br/xango.html)

Após a leitura das imagens, irei colocar os materiais em cima da mesa do professor para os alunos escolherem os materiais para criarem a representação para as suas tribos.

Realizado Iniciei esta aula com uma conversa com a turma sobre o conteúdo que seria apresentado. Comecei falando que este artista que eles iam estudar foi um artista plástico, escritor e sacerdote afro-brasileiro. Abri a apresentação e a primeira imagem era de Mestre Didi junto a uma escultura feita por ele.


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Mestre Didi (Fonte: http://www.terra.com.br/istoegente/44/divearte/expo_didi.htm)

Falei aos alunos que o artista cria algumas de suas obras inspiradas no orixá Obaluaê. Quando comecei a explicar, notei que a aluna Thaisa retirou-se do lugar onde encontrava-se e foi para o fundo da sala. Pedi à turma que observassem a imagem que eu logo retornaria. Chamei a aluna para uma conversa fora da sala de aula, pois eu precisava entender porque ela teve tal atitude. Confesso que eu já esperava algum tipo de reação contrária à aula quando entrássemos no assunto da religiosidade, pois percebi que ela é de religião neopentecostal, logo imaginei que ela seria contrária a esse assunto. Conversei com ela fora da sala de aula porque queria que ela se sentisse mais à vontade para conversar e falar o que estava acontecendo. Perguntei à aluna porque ela retirou-se de seu lugar quando iniciei a explicação, se ela estava chateada com alguma coisa. Thaisa me respondeu que a sua religião não permite que ela tenha contato com religiões ligadas ao diabo. Eu disse a ela que respeitava sua religião, e que gostaria que ela entendesse que o intuito das minhas aulas era que ela e seus colegas aprendessem mais sobre a cultura do nosso país. E que isso somente seria possível entender quando relacionamos a cultura, costumes e a religião trazida pelos escravos africanos com as que temos no Brasil. Também disse a ela que as religiões africanas e afro-brasileiras não


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possuem relações com demônios ou diabos, e eu gostaria que tanto ela, quanto a turma, entendessem isso para que não houvesse mais preconceito religioso. Mesmo assim, falei à aluna que respeitava a sua decisão de não participar da aula enquanto estivéssemos falando sobre religião. Retornei à sala de aula com a aluna, e dei prosseguimento à apresentação das obras do artista. Quando entrei na sala, segui para a próxima imagem que era do orixá Obaluaê.

Obaluaê (Fonte: http://universodaumbanda.blogspot.com.br)

A turma espantou-se um pouco, pois ele possui palhas que tapam toda sua cabeça. Rahiane me perguntou como o orixá enxergava com tanta “coisa” na cara. Expliquei ao grupo que aquela imagem é uma representação do orixá, pois ele é como um espírito, e este orixá representa proteção à saúde. A aluna Marcelle fez um comentário depois que terminei minha fala. Ela disse que em sua casa tem várias imagens de orixás, inclusive a de Obaluaê, pois sua mãe ganhou de presente. Perguntei a ela se já sabia a respeito do significado deste orixá, e se ela participava de alguma religião afro-brasileira. Ela me respondeu que não, não sabia o significado do orixá, e que às vezes vai à “Casa de Santo” para acompanhar sua mãe, mas não participa. Foi muito importante ouvir esse relato da aluna, pois geralmente os alunos sentem vergonha em falar que frequentam alguma religião de


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matriz africana por temer que os colegas façam piada. Este é mais um motivo para que cada vez mais os professores trabalhem questões relacionadas a cultura africana e afrobrasileira em sala de aula para que este tipo de preconceito seja combatido a medida que os educandos compreendem a importância da cultura negra na sociedade brasileira. Segui para a próxima imagem que foi a de Oxumarê. Os alunos perguntaram por que o orixá possui uma cobra e um arco-íris atrás, expliquei que, segundo as religiões afrobrasileiras esse orixá representa os ciclos da terra, e ele vive entre o céu e a terra. O arco-íris é o caminho que ele utiliza para nos visitar. Perguntei aos alunos se eles haviam entendido a minha explicação e, se tinham mais alguma dúvida. Eles responderam que sim, haviam entendido. Na sequência, apresentei Nanã que é a representação da criação da terra, e também representa o início, o meio e o fim. É a mais velha de todos os orixás.

Nanã (Fonte: http://dallablog.zip.net/arch2007-07-01_2007-07-31.html )

Montei a apresentação com a imagem de Nanã, e, ao lado, uma obra que Mestre Didi reproduziu, o chamado Ibirí, ferramenta utilizada pelo orixá quando se manifesta no ritual. O orixá Nanã possui o papel de avó dentro das religiões afrobrasileiras, pois representa a maternidade de forma mais madura e sábia por isso carrega o seu Ibiri, simbolizando uma mãe que embala o filho entre os braços.


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Mestre Didi,, ano desconhecido. (Fonte: http://murilocastro.com.br/2008-mestre-didi-da-ancestralidade-a-contemporaneidade/)

Antes de explicar isso aos alunos, perguntei a eles o que eles achavam que era aquela escultura feita pelo artista. Eles disseram que não sabiam. A aluna Julia S. disse que era um objeto muito estranho, mas que tinha muitas “conchas” e era bonito, pois era diferente e colorido. As conchas a que ela se referiu são os búzios que estão em volta da escultura. Perguntei se mais alguém gostaria de se manifestar, mas eles permaneceram em silêncio, só depois da pergunta expliquei o significado da escultura chamada Ibirí e do Orixá Nanã que estavam sendo apresentados a eles. Expliquei aos alunos que o artista Mestre Didi representou na obra Ibiri o símbolo do orixá Nanã. O Ibiri é como se fosse o bebê do orixá. Os alunos ouviram atentos sem se manifestarem. A próxima imagem foi a de Xangô, antes que eu dissesse qualquer palavra, a aluna Yasmim disse: − Sora [sic]!!! Esse eu sei quem é, a senhora explicou numa outra aula: é o Xangô, aquele que protege as pessoas.


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Xangô Fonte: http://www.casaiemanjaiassoba.com.br/xango.html)

Parabenizei a aluna pela colocação e disse que era isso mesmo, que ela estava correta, e que assim como Rubem Valentim, Mestre Didi também faz referências em suas esculturas representando Xangô com o machado de dois lados. A aluna Marcelle levantou a mão pedindo a palavra, disse a ela que poderia falar. E ela comentou que em sua casa tem todos os orixás que eu mostrei, mas que não sabia que eles tinham influência na arte, nem os seus significados. Achei importante falar e mostrar aos alunos as imagens e significados dos orixás, pois sem essa introdução eles não entenderiam as obras do artista Mestre Didi. Coloquei neste slide duas imagens, uma de Mestre Didi, e outra de Rubem Valentim, ambas possuem no topo da escultura representações do machado de Xangô.


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Mestre Didi, 2007 (Fonte: http://murilocastro.com.br/2008-mestre-didi-da-ancestralidade-a-contemporaneidade/)

Ao apresentar este slide, perguntei à turma qual era a semelhança entre elas. Logo tive a resposta de que era o símbolo de Xangô, o machado. Comentei com eles que essas duas obras são de artistas diferentes, e que uma delas eles já viram em aulas passadas, perguntei se eles recordavam o nome do artista, ninguém se manifestou. Expliquei que uma imagem era de uma obra de Mestre Didi e a outra de Rubem Valentim, e que ambos fazem referências em suas obras ao mesmo orixá. Prossegui a aula com imagens das obras de Mestre Didi, fazendo a leitura de imagens com os alunos. O que mais chamou a atenção deles foram as contas e búzios utilizados pelo artista. Perguntei a eles se eles conheciam esses búzios de algum lugar, se já haviam visto. Janine disse que sim, mas não de perto, somente na tv, e que os búzios são usados para ver o futuro das pessoas. Durante as leituras de imagens foi possível notar através da escrita e fala dos alunos a grande influência que a televisão possui na vida desses alunos. Em diversas vezes eles mencionaram que conheciam alguma imagem, porém conheciam porque haviam visto na televisão, nunca haviam visto de verdade. Agradeci a aluna pela colocação, e perguntei se mais alguém tinha alguma coisa para falar ou perguntar. Nenhum dos alunos se manifestou. Organizei o data show e o computador em outra mesa, e organizei a mesa do professor com os materiais para os alunos utilizarem para fazer suas esculturas. Disse a eles que eles poderiam levantar-


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se para pegar os materiais, mas que fizessem de maneira organizada, pois teria material para todos. Os alunos organizaram-se em seus grupos, e em seguida vieram ver quais eram os materiais disponíveis para iniciar a construção de suas esculturas. As alunas do grupo Mirambu foram as que iniciaram primeiro a atividade, em seguida os integrantes dos outros grupos observaram os materiais que elas estavam utilizando para criar a representação da tribo, e as seguiram. Estavam disponíveis vários tipos de materiais, galhos, folhas verdes e secas, rolos de guardanapos e de papel higiênico, pequenas flores de plástico, tampinhas, garrafas pet, palitos de picolé, pedras, miçangas, palitos de churrasco, fitas coloridas, papéis coloridos, linhas, barbantes e fita adesiva. As alunas do grupo Mirambu foram as primeiras a terminar a atividade, criaram a varinha mágica das feiticeiras, segundo elas, esta varinha é a protetora da tribo Mirambu.

Trabalho das alunas da tribo Mirambu. (Fonte DALLA COSTA, 2012).

O grupo da tribo Tuba criou um guardião que protege a tribo, eles fizeram uma relação com o orixá Xangô e o guardião de Marabá, a feiticeira do filme Kiriku e a


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Feiticeira mas, de acordo com eles, esse guardião é do bem, ele protege as pessoas da tribo, os defendendo das pessoas más.

Trabalho da tribo Tuba. (Fonte DALLA COSTA, 2012).

Os alunos da tribo Suricato criaram uma escultura inspirada na imagem da obra de Mestre Didi, o Xarará. A representação criada por eles, assim como Xarará, afasta toda a maldade que possa atingir a tribo.


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Trabalho da tribo Suricato. (Fonte DALLA COSTA, 2012)

A aluna Thaisa que não quis participar da leitura de imagens devido a sua religião, uniu-se ao seu grupo que era a tribo Caete para a realização do trabalho plástico. Apesar da aluna não ter envolvido-se na leitura de imagem, e ter ficado somente observando as imagens de longe, ela participou ativamente da atividade plástica junto aos seus colegas. Somente um aluno integrante da tribo Caete, não envolveu-se muito com a atividade, ficou mexendo no celular e conversando com os outros colegas. O grupo criou um cajado que para ser usado em rituais para fazer chover e trazer sabedoria à tribo.


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Trabalho da tribo Caete. (Fonte DALLA COSTA, 2012)

Os alunos integrantes das tribos Passos Solitários e Ginasta, não compareceram a aula, logo não realizaram a atividade. Acredito que os alunos foram capazes de compreender e contextualizar as obras de Mestre Didi, e relacioná-las com a atividade plástica, pois criaram símbolos com significados místicos, como por exemplo, guardiões e protetores assim como viram representados nas obras do artista e no filme Kiriku e a Feiticeira. Acredito que os objetivos propostos para esta aula foram alcançados, pois os alunos participaram ativamente da leitura de imagens, expressando ideias e impressões que tiveram das obras apresentadas, e recordaram conteúdos estudados em aulas anteriores, como por exemplo, a imagem de Xangô citada por um dos alunos. Já na atividade plástica os alunos limitaram-se a utilizar somente fitas e flores para desenvolver a atividade. Não interessando-se pelas miçangas oferecidas. Por isso os trabalhos possuem pouca relação com as obras de Mestre Didi. Os alunos desenvolveram muito bem a atividade plástica interagindo com o grupo, participando ativamente da atividade, e da leitura de imagens levantando ideias e questionamentos durante a atividade. Foi muito positivo observar a forma como os alunos souberam manusear os materiais disponíveis e através destes desenvolveram suas pequenas


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esculturas relacionadas a identidade de cada tribo. Para mim foi muito gratificante poder perceber o crescimento destes alunos ao longo da prática de estágio, pois nas primeiras aulas eles tinham grande dificuldade para expressarem-se artisticamente sem que houvessem delimitações para suas criações. Nesta aula foi possível perceber o quanto eles tornaram-se autônomos e seguros para trabalhar com os materiais, os quais não estavam habituados.


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3.2.10 Décimo Encontro. Aula 10 ( 90 minutos – 1 hora/ aula). Data: 17/10/2012 – Quarta-feira. Horário 1° Período. Das 07h45 min às 08h35min.

Tema da aula: Recordando nossas aulas.

Conteúdos: 

Imagens de obras dos artistas Esther Mahlangu, Rubem Valentim e Mestre Didi.

Simbologia adinkra.

Lista de atividades: 

Leitura de imagem.

Refletir e discutir com a turma as imagens que serão reapresentadas.

Objetivos: 

Relembrar com a turma os conteúdos estudados durante as aulas.

Esclarecer as dúvidas dos alunos.

Relacionar e questionar as imagens apresentadas.

Metodologia: 

Aula expositiva dialogada.

Leitura de imagem.

Recursos Materiais: 

Data Show

Avaliação: 

Observar e relacionar as imagens apresentadas.


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Participação na leitura de imagens. Planejado: Esta aula será dedicada à revisão dos conteúdos estudados, e para sanar as

dúvidas da turma. Devido a alguns alunos faltarem muito às aulas, e a atividade plástica da aula anterior ter sido terminada em uma aula, acho que será interessante revisar os conteúdos. Isso porque percebi em aulas anteriores que os alunos estavam fazendo algumas confusões, como por exemplo, confundir índios com africanos. Então serão reapresentadas à turma algumas imagens de centros urbanos de cidades africanas, de tribos africanas e indígenas para que eles percebam as diferenças e semelhanças entre os mesmos, possibilitando que eles façam suas próprias leituras de imagens. Começarei a atividade com imagens de cidades africanas como Maputo em Moçambique e Luanda na Angola. Irei questioná-los a respeito de onde localizam-se estas cidades fazendo comparações com as cidades brasileiras.

Luanda – Angola (Fonte: http://decaedela.blogspot.com.br)


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Maputo – Moçambique (Fonte: http://dream.santegidio.org)

Irei colocar duas imagens lado a lado, uma de uma menina indígena e outra de uma moça pertencente à tribo Samburu para os alunos poderem diferenciar um africano de um indígena, e perceberem as semelhanças e diferenças entre um e outro através da leitura de imagem. Escolhi estas duas imagens porque existem bastante diferenças entre as duas e que podem contribuir com questionamentos a respeito das características físicas que existem entre elas. Proporcionando aos alunos uma compreensão maior entre as diferenças de africanos e indígenas.

Menina da tribo Karajá


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(Fonte: http://indigena-grupo.blogspot.com.br/2010_06_01_archive.html).

Integrante da tribo Samburu (Fonte: http://www.tumblr.com/tagged/samburu-tribe)

Esta atividade também será importante para eles fixarem os conteúdos já estudados, e para que os alunos que por ventura faltaram alguma aula possam ter a oportunidade de aprender o conteúdo que haviam perdido. Darei sequência na aula relembrando imagens das obras de Esther Mahlangu, Rubem Valentim e Mestre Didi. Fazendo comparações entre as obras, como por exemplo, a geometria utilizada por eles, e a influência simbólica e religiosa que cada artista trabalha para compor suas obras.

Realizado: Iniciei este encontro com uma conversa com a turma. Disse a eles que como percebi que eles tinham dúvidas e estavam fazendo algumas confusões entre a nossa cultura e a africana, a aula seria dedicada à leitura de imagens. Também disse que toda e qualquer dúvida que eles tivessem deveriam levantar o braço e perguntar sem medo ou vergonha, pois esse era o momento de esclarecerem todos os questionamentos. Comecei a apresentação com imagens das cidades de Maputo/ Moçambique e Luanda/ Angola.


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Luanda – Angola (Fonte: http://decaedela.blogspot.com.br)

Maputo – Moçambique (Fonte: http://dream.santegidio.org)

Perguntei à turma onde eles achavam que ficavam essas duas cidades. Alguns responderam Brasil, São Paulo. Então perguntei se eles recordavam-se o que o senhor Gideon tinha contado em resposta ao questionário a respeito das cidades do país em que ele nasceu. A turma respondeu: Fica na África! Questionei-os se a África era um país ou continente. Ninguém respondeu. Pensei sobre como eu poderia ajudá-los a entenderem que a África é um continente, pois eu já havia conversado com eles em outras aulas a respeito disso. Resolvi ir por outro caminho para que eles chegassem à resposta que eu queria. Perguntei se eles recordavam-se do lugar o qual o senhor Gideon


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é originário, prontamente eles me responderam que ele é nigeriano. Perguntei a turma qual país o senhor Gideon é originário. A turma então respondeu em coro: Nigéria! Questionei-os mais uma vez: E a Nigéria, fica onde? Mais uma vez eles respondem em coro: África! E por fim argumentei à turma, se a Nigéria está localizada na África, a África é um país ou continente? E eles responderam: Um continente! Acredito que por ter usado como referência as respostas do senhor Gideon, que foi uma aula na qual eles se interessaram bastante, e inclusive recordavam-se de alguns aspectos que haviam lhes chamado a atenção, eles conseguiram compreender que a África é um continente. Prossegui com a aula. Coloquei na apresentação duas imagens uma ao lado da outra. Uma era de uma menina pertencente a uma tribo indígena brasileira e a outra de uma moça que pertence a Tribo Samburu da África.

Menina da tribo Karajá Brasileira (Fonte: http://indigena-grupo.blogspot.com.br/2010_06_01_archive.html).


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Integrante da tribo Samburu (Fonte: http://www.tumblr.com/tagged/samburu-tribe)

Fiz isso para que os alunos pudessem diferenciar através da leitura de imagem um índio brasileiro de um africano e para fazerem comparações entre ambos. Achei que seria muito importante rever algumas imagens e fazer mais uma vez a atividade de leitura de imagens, pois no decorrer das aulas percebi que a turma estava fazendo algumas confusões misturando “índio” com “africano”. Portanto, colocar as imagens lado a lado foi bastante importante para os alunos poderem ver suas diferenças e semelhanças. Quando desenvolvi o planejamento da prática artística não imaginei que os alunos teriam dificuldades em compreender as diferenças entre africanos e indígenas. Contudo esse “erro” aconteceu devido a minha inexperiência como educadora que me fez refletir e buscar formas para reparar este erro e esclarecer a turma essas diferenças existentes entre índios e africanos. O aluno Wellison é um menino que quase não presta atenção enquanto eu estou falando, porém ele é bastante participativo nas aulas, principalmente nas leituras de imagens e nas atividades práticas. Confesso que ele me deixa um pouco intrigada, pois, apesar dele me parecer não estar prestando atenção, foi o aluno que mais participou da leitura de imagens. O aluno fez comentários muito interessantes. Por exemplo, na imagem da moça da tribo Samburu, a moça possui uma tiara de flores de plástico na cabeça, e ao lado desta imagem está outra que é de uma indiazinha cheia de flores na cabeça. Wellison fez o seguinte comentário quando perguntei à turma qual das duas eles achavam que era brasileira e qual era a africana.


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─ Sora [sic], eu acho que a brasileira é a que está cheia de flores na cabeça, a menina pequena.

Perguntei por que ele achava isso. O aluno então se levantou, se aproximou da imagem e disse: ─ Olha só sora [sic]! Essa menina é uma índia brasileira porque os olhos dela são mais puxados. E olha só, essa outra, ela não tem os olhos puxados como os dos índios. E tem mais. Olha as árvores que estão atrás dela, são iguais às que a sora [sic] mostrou numa outra aula, quando a senhora mostrou as florestas africanas.

Perante a essa leitura de imagem do aluno, perguntei-me se de fato ele não prestava atenção na aula, ou se está ligado a tudo que está ao seu redor, inclusive nas coisas que estou falando. Esse fato me fez refletir bastante e me fez perceber que apesar da agitação do aluno ele está aprendendo, e também me fez pensar muito com relação à avaliação tanto dele quanto dos outros alunos. Percebi que não posso julgar um aluno, e muito menos cometer o erro de avaliá-lo, somente por seu comportamento, pois apesar da agitação de Wellison ele é um aluno muito participativo, fez uma leitura de imagem muito coerente observando detalhes da imagem e recordando-se de aulas anteriores. Também é importante ressaltar como o aluno foi minucioso em sua observação. Ele destacou características físicas comparando os olhos da menina indígena e da africana, destacou as árvores que apareciam atrás da moça africana recordando imagens vistas em aulas anteriores. Parabenizei-o pela colocação, e disse que foi muito boa a leitura de imagem que ele fez. Dei sequência à aula. O próximo slide possuía a imagem de um índio brasileiro com um cocar de penas azuis e a outra um integrante de uma tribo africana que também possui um cocar com penas, porém suas penas não são coloridas como às do índio. Conforme as imagens abaixo.


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Índio Brasileiro (Fonte: http://www.newsrondonia.com.br/imagensNoticias/602b0524a5185a070340e7161720350d.jpg)

Guerreio da Tribo Kikuyu (Fonte: http://www.flickr.com/photos/mytripsmypics/5811234398/)

Perguntei aos alunos o que eles estavam vendo, obtive a resposta que eram dois índios. Questionei-os mais uma vez perguntando: ─ Vocês tem certeza que são dois índios?

A turma pensou por um tempo e a aluna Yasmim decidiu responder dizendo que não eram dois índios, um era africano e o das penas coloridas era um índio do


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Brasil. Perguntei por que eles achavam que o homem com penas coloridas era o índio brasileiro. Wellison levantou-se de novo, e foi até a imagem para responder. ─ Sora [sic] este índio é o brasileiro porque aqui no Brasil tem muitas aves coloridas, tipo a arara, o papagaio, e o outro não. Porque na África não tem as mesmas aves que aqui, entendeu?

Mais uma vez Wellison me surpreende com suas observações, pois é capaz de fazer relações e reflexões sobre as duas imagens de acordo com o conhecimento adquirido através de suas vivências e dos conteúdos estudados em aula. Respondi ao aluno que sim, que eu tinha entendido, e perguntei à turma se eles concordavam com o colega. Eles responderam que sim. Então dei sequência à aula com imagens da artista Esther Mahlangu.

Esther Mahlangu, 2003 (Fonte: http://www.nationalgalleryfirenze.it/info/Africa_Today_Roma/index.htm)


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Figura 12 – Representação da tribo Ndebele (Fonte: http://artesvisuaisnaescolaclasse4.blogspot.com.br/2009/05/)

Questionei-os se eles recordavam-se daquelas imagens, Yasmim disse que sim, que era a arte de uma mulher que pertence a uma tribo onde somente as mulheres podem pintar. Perguntei se a turma concordava com a colega. Criseverton, para minha surpresa, respondeu que sim, pois no dia em que falei sobre a artista, que ele não lembrava o nome, eles fizeram os desenhos da tribo. Disse a ele que ele estava correto, e perguntei se mais alguém tinha alguma coisa para dizer, nenhum deles se manifestou. Recordei a turma a respeito da tribo de Ndebele, falei que as casas são decoradas com pinturas que possuem significados comemorativos, como o casamento ou o nascimento de um filho, também podem representar um protesto como aconteceu quando a África do Sul passou por um momento que as pessoas negras do país perderam muitos direitos. Recordei a importância que a artista Esther Mahlangu tem para o país, pois ela foi a primeira mulher negra pertencente a uma tribo a sair do país. Os alunos somente ouviram. Quando questionados se gostariam de falar algo a respeito, eles não se manifestaram. Segui com a apresentação relembrando sobre a simbologia adinkra. Falei da importância que ela tem para o país da República de Gana na África ocidental, perguntei quem deles recordava-se desta aula. A aluna Júlia G. disse que lembrava do vídeo que assistimos, que nele os africanos ensinavam os turistas como pintar os tecidos com os símbolos, e que o vídeo era em inglês. Continuei com a aula explicando que estes símbolos possuem significados que representam, família, tolerância, harmonia e,


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as pessoas destes dois países vestem-se de acordo com o significado do símbolo estampado e conforme a ocasião.

Adinkrahene ─ Chefe dos símbolos adinkra - Simboliza liderança, carisma e grandiosidade. (Fonte: http://www.adinkra.org/htmls/adinkra/adin.htm)

Akoma – “O coração” (Fonte: http://www.adinkra.org/htmls/adinkra/akom.htm)

Em seguida, mostrei as imagens das obras de Rubem Valentim. Ao aparecer a imagem, a turma toda começou a falar ao mesmo tempo, todos queriam responder que o artista representa em algumas de suas obras o machado de Xangô. Por diversas vezes durante a prática de ensino tive a impressão que os alunos não estavam interessados no conteúdo e consequentemente não estavam aprendendo. No entanto depois que aprendi a analisar os trabalhos dos alunos e, ao fazer essa revisão com eles ficou mais claro para mim que apesar das brincadeiras, bagunças e outros transtornos que ocorreram nas aulas anteriores, os educandos aprenderam e contextualizaram os conteúdos e atividades realizadas durante a prática de ensino. Esse aprendizado foi perceptível através das falas dos alunos e da prática artística.


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Solicitei que se acalmassem e disse que todos teriam chance de falar. Enzo, que é um menino muito quieto estava com a mão levantada para falar. Pedi a ele que falasse. Ele disse que lembrava que Xangô é o justiceiro da religião afro-brasileira, e nas obras do artista ele pinta o machado do orixá, e que para ele parecem dois triângulos um encostando no outro. Agradeci ao aluno pela colocação. Rahiane pediu para falar, dei a vez a ela. Ela disse que para ela o artista usou formas geométricas para fazer seus desenhos, e em uma das imagens ela enxergou duas pessoas uma de frente para a outra quase beijando-se.

Achei bastante interessante quando a aluna faz sua leitura de imagem dizendo que enxergou duas pessoas beijando-se, pois eu enxergava um símbolo completamente diferente. Conforme Pillar (1999, p.13): [...] o observável tem sempre a marca do conhecimento, da imaginação de quem observa, ou seja depende das coordenações do sujeito, das estruturas mentais que ele possui no momento, as quais podem modificar os dados. Assim duas pessoas podem ler uma mesma realidade e chegar a conclusões diferentes.

Ao olhar para a imagem após a interpretação da aluna, percebi que realmente pareciam duas pessoas uma de frente para a outra. Acredito que é fundamental para o educador ouvir e respeitar o que cada aluno percebe de uma imagem, pois cada um possui uma forma diferente de enxergar e perceber uma imagem. Também é fundamental respeitar a leitura de imagem de cada aluno, sempre incentivando para estimulá-los a continuar participando e, para que eles percebam o quanto é importante suas ideias, sentimentos e conclusões sobre os conteúdos. Passei para a próxima imagem e perguntei se mais alguém gostaria de falar a respeito das imagens. Eles mantiveram o silêncio e balançaram a cabeça com um sinal negativo. Passei para o próximo artista, Mestre Didi. Como eles haviam visto as imagens na aula anterior, mais uma vez todos queriam falar ao mesmo tempo. Esperei que se acalmassem, e quem quisesse falar deveria levantar a mão. Wellison levantou a mão e começou a dizer:


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─ Eu sora [sic], por favor, eu!

Disse a ele que falasse, pois parecia que se ele não falasse naquele momento seu raciocínio se perderia. Ele disse que o boneco cabeludo é o que varre as doenças para longe. Perguntei à turma se todos concordavam com o colega, ou se achavam que aquela imagem poderia significar alguma outra coisa. Expliquei que o nome do boneco cabeludo é Xarará que é um instrumento do orixá Obaluaê, e que Wellison estava correto quando disse que essa representação varre as doenças.

Mestre Didi, 2001 (Fonte: http://murilocastro.com.br/2008-mestre-didi-da-ancestralidade-a-contemporaneidade/ )

Dei oportunidade para todos que estavam com as mãos levantadas pudessem falar, mesmo que repetissem o que algum outro colega havia falado. Durante a leitura das imagens seguintes eles lembraram que o artista utiliza búzios, palhas, contas para criar suas esculturas. Acredito que esta aula foi bastante proveitosa, pois os alunos participaram da leitura de imagens, fazendo perguntas, falando sobre o que pensavam, e contextualizaram sobre o conteúdo estudado. Foram capazes de relacionar e identificar simbologias e símbolos estudados em aulas anteriores, bem como os artistas e suas influências religiosas. Fiquei muito feliz e surpresa ao perceber nos alunos o quanto eles aprenderam e se expressaram oralmente sem medo, querendo participar da aula falando


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o que tinham aprendido durante a prática de ensino. Acredito que quando percebemos esse aprendizado dos educandos, esse crescimento deles com relação ao conhecimento é que podemos notar a grandiosidade e o quanto um educador é importante para a vida e o aprendizado dessas crianças. Mesmo alunos que julgamos agitados que não prestam atenção, podem nos surpreender com um comentário ou um trabalho artístico que demonstra que algo eles conseguiu aprender durante as aulas, por isso é necessário que o educando seja atento e sensível para não julgar os alunos por suas atitudes em sala de aula.


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3.2.11 Décimo Primeiro Encontro. Aula 11 ( 90 minutos – 1 hora/ aula). Data: 23/10/2012 – Terça-feira. Horário 3° Período. Das 09h25 min às 10h15min.

Tema da aula: Nossa história em um livro.

Conteúdos: 

Confecção

do

portfólio

baseado

nos

conteúdos

desenvolvimento do projeto de estágio.

Lista de atividades: 

Atividade plástica com materiais diversificados.

Confecção do livro de imagens.

Objetivos: 

Experimentação de materiais diversos.

Interação dos alunos com o grupo.

Desenvolvimento da prática artística.

Metodologia: 

Atividade plástica.

Recursos Materiais: 

Tecidos variados.

Miçangas.

Fitas.

Papéis coloridos.

Cola.

estudados

durante

o


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Tesoura.

Pequenos gravetos.

Palha.

Avaliação: 

Interesse e respeito pelas produções dos colegas.

Capacidade de interagir com o grupo e de manipular os materiais.

Capacidade de transformar seus conhecimentos em imagem.

Planejado: Nesta aula os alunos irão reunir todos os trabalhos feitos durante as aulas anteriores, desenhos, textos e pinturas para confeccionar um livro, ou portifólio que vai contar toda história de suas tribos. Cada integrante de cada grupo terá que confeccionar uma página do livro, pois é necessário que todos do grupo tenham suas experiências plásticas e que através da imagem produzida contenha conteúdos que aprenderam durante as aulas. Irei preparar uma caixa de materiais para cada grupo, para todos os grupos possam trabalhar com os mesmos materiais. Explicarei a eles que este será o trabalho plástico final, e ele servirá como um resumo de toda a matéria estudada durante o desenvolvimento do projeto de estágio.

Realizado: Os alunos vieram me recepcionar no corredor da escola perguntando qual seria a atividade da aula. Eles estavam fora da sala de aula, porque a aula anterior era de Educação Física. Pedi que eles acompanhassem a professora deles, e em seguida, quando eu entrasse na sala para nossa aula, iríamos conversar. A professora de Educação Física costuma levar os alunos 5 minutos antes para a sala de aula para dar tempo deles tomarem água, irem ao banheiro e acalmarem-se, para que o professor que tem o próximo período entre em sala com a turma mais calma. Assim que o sinal bateu, entrei na sala. Comecei a aula conversando com os alunos e explicando que este seria nosso penúltimo encontro. Eles ficaram um pouco tristes, a aluna Yasmim disse que achava que eu seria professora deles até o final do ano. Eu disse à turma que já havia


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explicado a eles que eu estaria dando aula a eles somente por um período, que seria meu estágio, e depois a professora Ceci retornaria a dar aulas normalmente. Prossegui com a aula explicando a eles que, como é a reta final do projeto de estágio, essa seria nossa última atividade. Expliquei que nesta aula eles iriam montar um portfólio, e colocaríamos nele todos os trabalhos desenvolvidos por eles no período de minhas aulas, mais a atividade que eles fariam na aula de hoje. Distribui à turma pedaços de tecido tnt nas cores branca, azul e verde. Expliquei que eles poderiam desenhar com lápis, canetinhas, canetas, com o material que achassem interessante. Nesta aula tive o cuidado de levar bastante material, mais que o necessário, pois aconteceram em aulas anteriores discussões por causa de materiais. Houve grupos que pegaram uma grande quantidade de material sem deixar para os outros grupos. Para não haver mais brigas, resolvi levar uma quantidade grande de material para evitar possíveis brigas. Precisei solicitar ajuda da professora Ceci, pois eu não estava bem disposta devido à febre. Mesmo assim, procurei dar toda a atenção necessária aos alunos. Alguns alunos não pareciam muito interessados na aula, falei a eles que cada um do grupo deveria fazer um desenho ou escrever algo a respeito da tribo, ou mesmo das aulas. Alguns alunos ignoraram minha fala e continuaram conversando sem fazer a atividade. A professora Ceci tentou me ajudar conversando com a turma, e eles a ignoraram como fizeram comigo. De qualquer forma, prossegui dando atendimento aos alunos que estavam interessados na aula. A tribo Caete, dos alunos Eliaz, Matheus B. , Juliane e Thaisa, eles fizeram um desenho bastante interessante e simbólico. Envolvendo diferentes formas formam capazes de, ao longo das aulas, desenvolverem muito bem os conhecimentos adquiridos em aula. Nas primeiras aulas foi um pouco difícil trabalhar com este grupo, pois eles não estavam se permitindo criar. A maneira como as aulas são ministradas pela professora não permite liberdade de criação aos alunos. Nesta aula foi possível ver que apesar da dificuldade inicial do grupo, eles conseguiram criar uma simbologia própria a partir de imagens estudadas por eles em sala de aula. Conforme Duarte Júnior (1991) os alunos vem para a escola para decorarem teorias muito distantes de suas vidas cotidianas, “somente se aprende quando se parte das experiências vividas e sobre elas se desenvolve a aplicação de símbolos e conceitos que as clarifiquem”.


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É muito gratificante ver o crescimento dos alunos, e como a persistência do professor é importante num caso como este.

Trabalho da Tribo Caete dos alunos Eliaz, Matheus B. , Juliane e Thaisa Fonte (DALLA COSTA, 2012)

O aluno Guilherme, único integrante da tribo Passos Solitários, criou um tipo de estamparia para uma de suas páginas do portfólio, percebi que em cada atividade proposta o aluno criou simbologias diferentes, mas todas dentro do mesmo tema. Em uma das aulas mostrei aos alunos como as pessoas do país de Gana estampam seus tecidos com suas simbologias. Portanto, é possível perceber a influência do conteúdo estudado pela turma no trabalho do aluno.


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Trabalho do aluno Guilherme – tribo Passos Solitários Fonte (DALLA COSTA, 2012)

É notável a evolução gráfica dos alunos. Nas primeiras atividades eles faziam desenhos bastante simples, e com o passar das aulas, começaram a desenvolver atividades plásticas muito simbólicas, criadas por eles. No trabalho da tribo Suricato pude ver um M, duas flâmulas com dois S e um boneco de braços abertos. É interessante perceber como os alunos desenvolveram seus desenhos e transformaram seus conhecimentos, chegando à penúltima aula com um resultado excelente como este.


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Trabalho dos alunos tribo Suricato Fonte (DALLA COSTA, 2012)

A tribo Ginasta possui três integrantes, Thalia, Lavínia e Altair. Estes três alunos frequentaram muito pouco as aulas. Nesta aula, somente a aula Thalia compareceu. Ela desenvolveu sua atividade plástica de acordo com o nome de criou para sua tribo, porém, como faltou muitas aulas, e quando vinha chegava atrasada e, pôde aproveitar muito pouco as aulas. Mesmo quando ela chegava atrasada, procurei explicar o conteúdo, mas foi muito complicado dar atenção por muito tempo a um aluno só, pois os alunos me chamavam muito durante a aula. Thalia criou um desenho que não está relacionado com os conteúdos trabalhados em aula, porém acredito que a aluna colocou em seu desenho um desejo, talvez um sonho. Deixei que ela expressasse seus sentimentos, desejos ou sonhos em seus trabalhos, não interferi.


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Trabalho da aluna Thalia – Tribo Ginasta (Fonte: DALLA COSTA, 2012)

Acredito que os alunos conseguiram interagir através das atividades plásticas com os conteúdos abordados, e foram capazes de transformar seus conhecimentos em imagens, construindo suas próprias formas artísticas. Apesar de muitas conversas e brincadeiras, e por vezes os alunos ignorarem a minha fala, acredito que eles desenvolveram trabalhos pertinentes com os conteúdos que foram trabalhados em aula. A cada aula esperei sempre um pouco mais dos alunos, pois é necessário perceber evoluções no aprendizado deles. Confesso que eu estava tendo expectativas equivocadas com relação aos trabalhos, pois eu estava olhando para essas atividades plásticas de maneira errada. Percebi o quanto eu estava errada quando aprendi a olhar para os desenhos à maneira que os alunos olham para eles, de acordo com suas contextualizações dos conteúdos e das suas realidades. Antes que a aula terminasse, pedi que cada aluno escrevesse em uma folha o que havia aprendido durante as minhas aulas. Aos poucos, os alunos vieram entregar seus trabalhos e os textos. Devido à uma reunião pedagógica, os alunos tiveram aula somente até o recreio. Antes de liberá-los pedi que trouxessem para a próxima aula materiais que tivessem em casa, que eles achavam interessantes e pudessem usar no trabalho. Após o recado, os dispensei e todos saíram calmamente. Devido à turma ser bastante agitada, me perguntei algumas vezes se eles estariam aprendendo de fato alguma coisa, ou se estavam somente praticando


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atividades plásticas. E confesso que por várias vezes me senti muito frustrada, pois em todas as aulas, procurei deixar claro a eles a influência da arte africana na construção da arte e cultura brasileira, mas sempre que questionados pareciam nunca ter ouvido falar a respeito. Ao ler os textos dos alunos, me surpreendi com o que foi escrito. A aluna Julia S. relata em seu texto o colorido das casas, e que os africanos e brasileiros não são tão diferentes uns dos outros. O que mais chamou a atenção da turma foi que os africanos vivem em casas comuns como as nossas. Citaram também que a capoeira é de origem africana, e que os africanos também possuem costumes parecidos com os nossos. Eles falaram de diferenças que perceberam durante a apresentação das imagens, entre índios e africanos. Recordaram da arte de Esther Mahlangu e citaram que as pinturas são feitas para alguma ocasião festiva. Isso pode ser visto conforme os textos abaixo.

Trecho do texto escrito pela aluna Yasmim Fonte: (DALLA COSTA 2012).

A aluna Marcelle, enquanto escrevia seu texto, veio me perguntar como era o nome da artista da tribo que pintava nos muros e casas, escrevi no quadro para ela. Ela queria saber como se escreve o nome da artista para poder citá-la em seu texto.


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Trecho do texto escrito pela aluna Marcelle. Fonte: (DALLA COSTA 2012).

A aluna Juliane falou das pinturas suas simbologias e religião, não explicou o que aprendeu, mas as citou, em seu pequeno texto.

Texto escrito pela aluna Juliane. Fonte: (DALLA COSTA 2012).

Alguns alunos que bagunçaram quase que em todas as aulas e não prestaram atenção enquanto eu explicava o conteúdo, infelizmente não entregaram o texto. Achei um pouco difícil em lidar com alguns alunos quanto à questão do conteúdo, pois sempre que eu perguntava se eles haviam entendido, ou se gostariam de rever alguma imagem e comentar a respeito dela, nenhum deles se manifestava. Eu gostaria que eles tivessem absorvido um pouco mais do conteúdo, pois não citaram em nenhum texto os artistas Rubem Valentim e Mestre Didi, nem fizeram nenhuma menção à arte ligada à religiosidade. O sinal bateu, os alunos não conseguiram terminar a atividade plástica nesta aula. Deixarei para que terminem no próximo encontro. Eles entregaram seus trabalhos com calma, reuniram seus materiais e saíram.


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3.2.12 Décimo Segundo Encontro. Aula 12 ( 90 minutos – 1 hora/ aula). Data: 24/10/2012 – Quarta-feira. Horário 1° Período. Das 07h45 min às 08h35min.

Tema da aula: Conheça nossa tribo.

Conteúdos: 

Livro de imagens

Apreciação dos trabalhos da turma.

Lista de atividades: 

Conclusão do livro de imagens.

Apresentação das tribos para a turma.

Exposição dos trabalhos plásticos.

Reflexão sobre os trabalhos desenvolvidos durante as aulas.

Objetivos: 

Expressar-se oralmente.

Oportunizar que todos os alunos possam apreciar os trabalhos desenvolvidos pelos

colegas. 

Refletir sobre as aulas e os trabalhos realizados.

Metodologia: 

Expositiva dialogada.

Recursos Materiais: 

Todos os trabalhos realizados pela turma.


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Avaliação: 

Interesse e respeito pelas produções dos colegas.

Cooperação com a apresentação dos colegas.

Capacidade de transformar seus conhecimentos em imagem.

Planejado: Nesta aula, os alunos irão apresentar suas tribos para a turma. Irão expor seus trabalhos contando o que aprenderam, como foi a experiência de formar uma tribo, quais foram os materiais que eles mais gostaram de trabalhar, o que mais chamou a atenção deles, entre outras impressões que eles tiveram com as aulas. Depois que cada grupo apresentar sua tribo, iremos fazer uma leitura dos trabalhos feitos, pois é necessário que o grupo aprecie os trabalhos plásticos de seus colegas. Após a exposição, irei pedir à turma que escrevam o que aprenderam nas aulas de artes, como foi a experiência de criar uma tribo, o que eles gostaram, e o que não gostaram das aulas. No final da aula conversarei com eles e o quanto sou grata pela oportunidade de ter aprendido, e convivido com eles, mesmo que por um curto tempo, e pela escola ter me recebido. Em seguida, irei fotografar os grupos e seus trabalhos para ter o registro dos trabalhos e ter uma recordação da turma.

Realizado: Esta aula começou com 10 minutos de atraso. A direção da escola esqueceu de regular o relógio que dá o sinal, portanto perdi 10 preciosos minutos. Comecei a aula devolvendo aos alunos seus trabalhos iniciados na aula anterior, deixei-os bastante à vontade para escolherem os materiais que quisessem. Desta vez não houveram brigas. A professora Ceci me perguntou se poderia ficar na sala de aula, pois ela tinha algumas anotações para fazer, eu disse a ela que não me importava e que ficasse à vontade. A professora sentou-se no fundo da sala sem interferir na aula. Na aula anterior, eu havia pedido aos alunos que quem tivesse materiais que gostaria de colocar em seu trabalho trouxesse para a aula. Somente o aluno Eliaz trouxe uma caixinha com divisórias cheias de miçangas, cola e tesoura. Diferente da aula em que trabalhei com o artista Mestre


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Didi, em que eles desenvolveram a escultura, nesta aula a turma envolveu-se muito com as miçangas e linhas, não interessaram-se pelas fitas e tampinhas que eu levei. Enquanto eu atendia um grupo de alunos, os auxiliando com a atividade, dois alunos estavam se xingando. Como eu estava concentrada explicando ao grupo como eles poderiam trabalhar com os materiais escolhidos, e a turma é muito agitada, acabei não ouvindo o que os alunos estavam falando. Mas a professora Ceci ouviu, me pediu licença para tirar os dois alunos de sala, pois eles haviam dito que a professora não fazia nada. Concedi que ela tomasse a atitude que achava correta, pois eu não admitiria falta de respeito em sala de aula. A professora tirou os alunos da aula e os levou para a direção. Cinco minutos depois, estavam de volta à sala de aula sem que nenhuma providência tivesse sido tomada contra a falta de respeito dos mesmos com a professora. A aluna Júlia S. me chamou para perguntar porque a direção da escola nunca faz nada contra esses alunos, pois em quase todas as aulas eles faltam com respeito com os professores e prejudicam os alunos que querem estudar. Expliquei à aluna que não sei porque a escola tem essa postura quanto a esses alunos, mas se ela estava se sentindo prejudicada, deveria conversar com o seu responsável, e pedisse que ele viesse até a escola para conversar com a direção para cobrar uma postura mais enérgica da direção quanto a esses alunos. O sentimento da aluna Júlia S. pode ser percebido por outros alunos conforme a avaliação que pedi para a turma fazer. Pedi a eles que escrevessem os pontos positivos das minhas aulas de estágio e os pontos negativos, que eles achavam que deveria mudar. Os pontos negativos apontados pelos alunos foi que eles sentiram-se prejudicados por causa de alguns colegas que perturbaram muito às aulas.

Trecho do texto da aluna Julia S. (Fonte: DALLA COSTA, 2012).


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Trabalho do aluno Enzo (Fonte: DALLA COSTA, 2012).

Trecho do texto da aluna Marcelle (Fonte: DALLA COSTA, 2012).

Quando recolhi as avaliações da turma, vi que eles não haviam falado das minhas aulas. Então, perguntei o que eles achavam que eu deveria mudar com relação às aulas e ao conteúdo. O aluno Darlan, que é o mais velho da turma, levantou o braço e disse o seguinte: ─ Sora [sic] as suas aulas foram boas, aprendi bastante coisas que eu não sabia, mas acho que eu poderia ter aprendido mais se não fossem os colegas atrapalhando tanto.

Perguntei se mais alguém tinha alguma coisa para colocar, e se concordavam com o colega. Todos concordaram com Darlan. A aluna Yasmim disse que sempre que eu estava explicando o conteúdo, e que ela estava achando interessante e estava concentrada, eu tinha que parar para chamar a atenção dos colegas, o que fez com que


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ela perdesse a concentração na minha explicação, conforme ela relata em um trecho de seu texto.

Trecho do texto escrito pela aluna Yasmim (Fonte: DALLA COSTA, 2012).

Perguntei o que eles acharam do conteúdo trabalhado em aula. Julia S. disse que gostou muito, pois conheceu “coisas” que não conhecia e aprendeu mais sobre seu país. Guilherme relatou em seu texto quase a mesma coisa que Julia S. disse.

Trecho do texto do aluno Guilherme (Fonte: DALLA COSTA, 2012).

Insisti na pergunta, perguntei mais uma vez se eles achavam que alguma coisa deveria ser mudada em minhas aulas, pois era muito importante para eu saber o que eles achavam. Disse que não se preocupassem em falar, porque isso não iria influenciar em nada nas notas deles. A turma respondeu que não, que gostaram muito das aulas, e que fui atenciosa com eles, e não tinham nada para reclamar com relação às aulas e à professora. Deixei então que prosseguissem com a execução da atividade.


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Durante minha conversa com os alunos, fui interrompida pela vice-diretora, como ocorreu em outras aulas. Ela simplesmente entrou na sala de aula gritando e sem pedir licença. Como uma escola vai exigir de seus alunos respeito se as pessoas que deveriam ensinar não sabem dar o exemplo? A aula prosseguiu como de costume, muita brincadeira, muita bagunça, mas todos os alunos envolveram-se no desenvolvimento de seus trabalhos. Mais uma vez a vice-diretora invade minha aula sem pedir licença. Como esta atitude vinha me incomodando ao longo da minha prática de ensino e, esta era minha última aula, resolvi que eu deveria dizer alguma coisa, mas sem perder o respeito. Ela entrou na sala aos berros perguntando quem era Carolina. Eu estava atendendo um grupo, simplesmente virei-me, e olhei bem para os olhos dela e disse: ─ Professora Santina, eu posso lhe ajudar?

Ela ficou um pouco envergonhada, pediu licença, depois de ter interrompido e respondeu, “quero saber quem é Carolina”. E eu disse com toda a calma do mundo. ─ Nesta turma não tem nenhuma Carolina, e eu gostaria de sugerir a senhora que quando for necessário interromper a aula, peça licença, pois por várias vezes durante meu estágio as aulas foram interrompidas de maneira brusca. Gostaria que servisse de sugestão para não acontecer com os outros professores, pois acredito que eles também devam sentir-se incomodados quando interrompidos, principalmente quando isso ocorre em meio a uma explicação importante.

A turma ficou em silêncio, e a vice-diretora também. Ela desculpou-se, ficou sem resposta e saiu. A professora Ceci que estava sentada ao fundo da sala me olhou e piscou como sinal de positivo. Eu precisava dizer alguma coisa, pois esse comportamento que acontece na escola estava me incomodando muito. Sei que às vezes é necessário interromper a aula para dar algum recado, ou chamar algum aluno, porém que isso seja feito com o mínimo de educação e respeito. O aluno Eliaz me disse que ela sempre faz isso, e que não respeita nenhum professor. E que as vezes quando a turma está calma, e prestando atenção no professor, ela invade a aula gritando, e ai a turma se agita e o professor não consegue mais dar aula. Eu disse ao aluno que já havia notado, e


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que quem sabe agora ela mudaria, porque eu não sou professora da escola, sou de fora. Então quem sabe agora ela mudaria suas atitudes. O que mais me incomodou durante minha prática, não foram as bagunças, brincadeiras, conversas, porque sei que os alunos estão passando por uma fase de transformação, e também alguns possuem problemas familiares que afetam o comportamento e o desenvolvimento escolar. O que realmente me incomodou foi a falta de profissionalismo de quem administra a escola, ou seja, da diretora e da vice-diretora. Duas pessoas sem o menor respeito e consideração aos profissionais que trabalham e se esforçam para levar uma boa educação aos alunos. Agem como proprietárias da escola passando por cima dos professores e os responsabilizando pelo mau comportamento dos alunos, incentivando a falta de respeito com esses profissionais da educação. A aula seguiu com os alunos bastante envolvidos na atividade prática, apesar de eu ter levado muitos materiais, como por exemplo: tampinhas, fitas, palhas, pequenos gravetos, folhas secas, tecidos lisos. Eles envolveram-se muito com as miçangas, linhas coloridas e canetinhas. O grupo da tribo Miranbu, fez em uma das suas páginas do portfólio o símbolo que representa a tribo, e que já foi visto em outros trabalhos. Como levei linhas coloridas, elas usaram uma das linhas para representar ao redor do símbolo o fogo, a terra, a água e o ar. Achei interessante a maneira que elas usaram nesta imagem para representar os elementos da tribo. Sem utilizar nenhum desenho e de acordo com a imaginação do grupo, criaram uma imagem abstrata e muito significativa para elas.


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Trabalho da tribo Mirambu (Fonte: DALLA COSTA, 2012).

A tribo Caete fez uma cabana para mostrar como os integrantes da tribo vivem em paz e felizes dentro da comunidade. Colocaram materiais coloridos para expressar este sentimento de alegria vivido na tribo. É interessante como os alunos expressam em seus trabalhos seus sentimentos e emoçþes, utilizando as cores para representar tal sentimento. A maneira como desenvolveram uma textura para a cabana usando miçangas mais finas e compridas para representar a palha da aba e linhas para representar o restante do telhado da cabana.


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Trabalho da tribo Caete (Fonte: DALLA COSTA, 2012)

O único integrante da tribo Passos Solitários não quis usar nenhum outro tipo de material. Utilizou somente caneta azul e canetinhas para desenvolver seu trabalho. Perguntei a ele se ele gostaria que eu tivesse trazido algum outro tipo de material que o interessasse mais, ele respondeu que não, que não queria estragar seu trabalho usando nenhum outro material. Eu disse a ele que ele não iria estragar o trabalho e que seria bem legal experimentar outras maneiras de colorir e criar texturas para seu trabalho. Mesmo assim ele não quis. Respeitei a posição do aluno e deixei que trabalhasse como achasse melhor.


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Trabalho da tribo Passos Solitários (Fonte: DALLA COSTA, 2012).

A tribo Tuba, com 5 integrantes, brincou quase toda a aula, e somente refizeram a bandeira que haviam criado em aula anterior, colando algumas miçangas. Não quiseram criar nada e pouco interessaram-se pela aula e pela atividade. Mesmo eu conversando com o grupo, não obtive nenhum resultado. Confesso que foi frustrante para mim.

Trabalho da tribo Tuba (Fonte: DALLA COSTA, 2012).


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O mesmo aconteceu com o grupo da tribo Suricato. O grupo era composto por 5 integrantes e criaram somente uma imagem e na outra reproduziram o desenho que já haviam feito. Perguntei porque cada um do grupo não fazia uma página do portfólio, eles disseram que não queriam, porque os colegas iam estragar o trabalho. Insisti e disse que cada um do grupo deveria criar uma página do trabalho, e ter a oportunidade de escolher os materiais, criar seus desenhos e fazer suas experimentações. Marcelle disse que se não fosse como eles queriam, não fariam mais o trabalho, fiquei sem saber o que responder, e sai.

Trabalho da tribo Suricato. (Fonte: DALLA COSTA, 2012).

Senti-me um pouco triste, desanimada com a resposta da aluna, mas procurei não deixar transparecer e prossegui atendendo os outros alunos. Existe grande


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resistência dos alunos para algumas atividades em grupos, eles são bastante apegados ao feio e ao bonito e muitas vezes isso impede a participação dos outros colegas para a realização dos trabalhos artísticos em grupo. Isso demonstra a importância de se desenvolver cada vez mais trabalhos em grupos para que os educandos aprendam a lidar com as gostos e opiniões diferentes, pois enfrentarão ao longo de suas vidas diversas situações semelhantes.

De qualquer forma, acredito que os alunos foram capazes de criar suas próprias linguagens de acordo com as suas contextualizações e vivências. Conforme Duarte Junior (1991, p.39):

[...] a linguagem não é uma simples lista dos objetos do mundo, um simples agrupamento de símbolos que representem as coisas existentes. A linguagem é mais que um inventário das coisas: é um instrumento de ordenação da vida humana, num contexto espáciotemporal. Por ela o homem organiza as suas percepções, classificando e relacionando eventos. Por ela o homem coloca ordem num amontoado de estímulos (sonoros, visuais, táteis, etc.), de forma a construir um todo significativo.

Acredito que os alunos conseguiram criar seus próprios significados através das imagens vistas por eles. Desenvolvendo desta forma a sua maneira de ver e representar o contexto criado em torno da tribo, suas histórias, significações e linguagens. Apesar de algumas vezes eu me sentir frustrada, sei que de uma maneira ou outra algum conhecimento a turma adquiriu. E por vezes isso pode ser visto através das imagens criadas por eles. Quando iniciei minha prática de ensino, eu esperava que os alunos fossem mais organizados e soubessem arrumar a sala quando solicitados, porém isso não acontecia anteriormente. Eles não eram exigidos a organizar a sala e a devolver os materiais que não utilizavam. De tanto insistir, no último dia de minha prática, tive uma grande surpresa. Ao tocar o sinal, os alunos reuniram todos os materiais que eu havia emprestado a eles e tudo o que não usaram e guardaram nas caixinhas. Alguns estavam preocupados, pois não queriam misturar as miçangas, eu disse a eles que não havia problema caso eles houvessem misturado as cores.


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Me ajudaram a organizar os materiais e organizaram a sala para receber a professora que tinha o próximo período. Senti-me feliz por ter conseguido ensinar a eles a se organizarem e terem respeito e consideração com o professor. Infelizmente não foi possível fazer uma exposição dos trabalhos nesta aula, nem fotografar os alunos com seus trabalhos, pois foi necessário recolher a atividade e trazer para casa para a secagem da cola. Perguntei à professora Ceci se ela importava-se em me ceder alguns minutos de sua aula semana que vem, para que eu pudesse fotografá-los com seus trabalhos prontos. Ela gentilmente concedeu esses minutos, e inclusive me pediu que enviasse a ela as fotos para guardar de recordação. Não me despedi da turma, pois farei isso na semana que vem quando eu for para a escola devolver os trabalhos aos alunos. Essa experiência com o ensino fundamental me ensinou a ter paciência comigo e com os alunos, mas acredito que meu maior aprendizado foi aprender a perceber as diferentes formas que os alunos possuem para expressar seus conhecimentos e aprendizados. Quando iniciei a prática de ensino tive grandes expectativas quanto aos resultados, porém estes resultados estavam baseados no meu conhecimento. Portanto no início da prática de ensino me senti frustrada, porque os alunos não estavam apresentando os resultados que eu esperava. Somente após algumas reflexões pude perceber que eles expressaram seus aprendizados de acordo com as suas capacidades e gostos. Creio as reflexões que fiz a respeito das aulas contribuíram muito para que eu compreendesse melhor como funciona uma escola, quais as dificuldades enfrentadas por professores e alunos e como se dá o processo de aprendizado dos educandos.


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Conclusão Ao optar por desenvolver um projeto de ensino com o objetivo de construir com o grupo de educandos conhecimentos sobre a importância da contribuição dos afrobrasileiros e africanos na formação cultural brasileira, baseado na lei 11.645, sabia que poderia enfrentar algumas dificuldades, entre elas a rejeição por parte dos alunos. Todavia acredito na importância de se trabalhar este tema dentro das escolas, pois é necessário desestereotipar a imagem dos africanos e afro-brasileiros que geralmente está ligada a conceitos preconceituosos que persistem ao longo do tempo. O projeto de ensino foi pensado de forma que os alunos participassem do processo de aprendizagem de forma ativa, buscando construir com eles relações sociais e culturais através das manifestações simbólicas da cultura africana e afro-brasileira. Quando iniciei o planejamento do projeto pensei em oportunizar aos alunos uma experiência diferente, queria que de certa forma, eles se sentissem como uma comunidade ou tribo africana que ainda hoje mantém suas práticas culturais. Optei por esta escolha para mostrar aos educandos como se vive em comunidade, proporcionando a eles discussões e planejamento de como seria cada atividade a ser desenvolvida e, também fizessem relações entre a nossa sociedade e uma sociedade tribal africana percebendo as diferenças e semelhanças entre ambas. Esta atividade também foi muito importante para a união do grupo de alunos. Desta forma os alunos teriam a oportunidade de ampliar suas visões de mundo percebendo que as diferenças e semelhanças entre as culturas existem e que é necessário conhecê-las e respeitá-las. Procurei não perder o foco entre o tema e o projeto de ensino, no entanto foi necessário acrescentar alguns recursos como, por exemplo, a entrevista virtual entre os educandos e o Senhor Gideon que não estava prevista no planejamento, mas que causou grande interesse e curiosidade por parte dos alunos. Essa atividade foi bastante importante, pois aproximou os alunos a uma pessoa de origem africana valorizando a curiosidade e os questionamentos dos educandos. Ao iniciar a prática de ensino passei por algumas dificuldades. Criei algumas expectativas quanto aos resultados das aulas. Devido a isso tive grandes dificuldades em perceber o quanto os alunos estavam expressando os conhecimentos adquiridos em aula através das práticas artísticas, textuais e orais. Somente depois de muita leitura e conversas com minha orientadora é que consegui perceber o quanto os alunos estavam aprendendo, mas expressavam isso da maneira as quais eles eram


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capazes. Acredito que meu erro foi idealizar expectativas baseadas no meu conhecimento. No entanto o projeto de ensino foi bastante positivo, pois proporcionou que os alunos tivessem uma visão mais ampla, mais real e menos preconceituosa da cultura afro-brasileira e africana atingindo grande parte dos objetivos propostos para o projeto. Posso citar como exemplo, o desenvolvimento da capacidade crítica através das leituras de imagens, a compreensão e valorização da cultura africana e afro-brasileira e, o desenvolvimento da capacidade imaginária e criativa através da experimentação de materiais, os quais eles não estavam habituados a utilizar. Também foi possível desestereotipar a imagem da cultura afro-brasileira e africana propiciando uma ideia menos preconceituosa e mais humanista com relação as diferenças socioculturais. No primeiro encontro apresentei algumas imagens que eram de diversas tribos africanas e centros urbanos de cidades africanas, esta prática de leitura de imagens serviu para que eu pudesse medir os conhecimentos dos alunos a respeito da África. Durante a atividade pude perceber através das falas dos alunos que existem muitos estereótipos quando o tema abordado está relacionado a africanos e afro-brasileiros. Os alunos disseram que achavam que na África havia somente mato, bichos e pobreza, não sabiam que existiam cidades como as brasileiras, mas o que mais me deixou chocada e, que me fez refletir muito a respeito da imagem que os alunos tem sobre a África e da necessidade de se trabalhar aspectos relacionados aos negros afro-brasileiros e africanos, foi quando uma aluna fez a seguinte pergunta: Professora na África o céu é azul como o nosso? Numa fração de segundos me senti sem chão, respondi a aluna que sim e, não poderia pensar que o ela ainda diria em seguida seria algo mais grave. Ela me disse que achava que o céu africano era preto. Jamais poderia passar pela minha cabeça que um aluno pudesse pensar que o céu africano é preto. Ao mesmo tempo que essa fala me deixou triste, senti a necessidade de mostrar a cultura afro-brasileira e africana de uma forma positiva e que estimulasse estes educandos a compreender a cidadania como participação social adotando no cotidiano atitudes de repúdio as injustiças, combatendo o preconceito étnico, respeitando o próximo e exigindo o mesmo para si. No entanto as leituras de imagens não se basearam somente em ideias ligadas ao preconceito que está intrínseco na sociedade e atinge diretamente as crianças. Os alunos fizeram comentários muito interessantes, como, por exemplo, quando apresentado a eles a imagem das mulheres da tribo Himba. Na imagem apresentada para a turma as mulheres Himba aparecem com uma espécie de dreads nos cabelos feitos com barro. Uma aluna


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questionou por que elas passam barro nos cabelos e, outra aluna respondeu em seguida que era porque elas não tinham creme e salientou que nós, ou seja, nossa sociedade, utiliza creme para passar nos cabelos e as mulheres Himba utilizam barro. É muito interessante perceber as relações que os alunos fizeram durante a prática de ensino, pois expressaram conhecimentos adquiridos no cotidiano e relacionaram com a imagem que estava sendo apresentada. Foi bastante estimulante para mim a motivação dos alunos nesta primeira aula, apesar da minha insegurança de que os alunos poderiam não entender a proposta da leitura de imagens, me surpreendi com a capacidade de interação com as imagens que cada um deles teve, sem receio de falar o que pensavam e as formas as quais eles fizeram as relações entre as imagens e os seus conhecimentos. Depois desta atividade pude compreender a importância de se valorizar as falas dos alunos e deixá-los expressarem-se de forma livre e conforme as suas capacidades e conhecimentos, pois desta maneira conforme indica Freire (1982, p. 6), é necessário que o educador “respeite a compreensão do mundo, da sociedade, da sabedoria popular e o senso comum que os educandos tem”. As práticas artísticas causaram bastante interesse dos alunos, pois eram materiais os quais eles nunca haviam utilizado em aula. Durante a atividade plástica os alunos demonstraram uma grande insegurança, perguntavam o tempo todo quais cores e materiais poderiam utilizar e, se os trabalhos estavam certos, pois tinham medo de receber uma nota baixa. Um exemplo disso foi quando entreguei as folhas brancas e os lápis de cores e, solicitei que os alunos criassem um símbolo que representaria a tribo criada por eles. As alunas Thaiza e Thalita não conseguiam desenvolver a atividade, pois estavam muito preocupadas em fazer um trabalho bonito para receberem uma boa nota.Precisei ter paciência e conversar com as alunas deixando claro que os critérios de avaliação não estavam baseados no trabalho bonito, mas no conhecimento que elas haviam adquirido durante as aulas.

Todavia os alunos saíram-se muito bem

expressando seus conhecimentos, souberam utilizar muito bem os materiais oferecidos buscando soluções para desenvolverem as atividades propostas. Percebi o quanto é necessário desenvolver atividades que proporcionem aos alunos autonomia para criarem, contextualizarem o aprendizado, desenvolverem conceitos críticos com os seus trabalhos e com o trabalho dos colegas. No sétimo encontro o qual os alunos deveriam desenvolver uma bandeira para a tribo, solicitei que eles criassem a bandeira de acordo com o significado que eles


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haviam criado para a tribo, pois deveria existir uma relação entre ambas. Um grupo de alunos, o qual o nome da tribo era Caete, criou uma imagem de duas espadas se cruzando, ao observar o desenho não consegui estabelecer uma relação entre a imagem criada por eles e o significado da tribo. Também me incomodou o fato dos alunos não estarem focados no trabalho prático. No entanto somente depois de algumas reflexões é que consegui perceber que apesar do trabalho plástico do grupo não ter uma relação direta com o significado da tribo criada por eles, é possível notar que existe uma relação muito grande com as obras do artista Rubem Valentim, pois ele desenvolveu através de sua arte, simbolismos presentes nas religiões de cultura afro-brasileira que foram apresentados durante a prática de ensino. Por isso é necessário estar sempre atento as diferentes formas de expressão dos alunos. Acreditei que o trabalho desenvolvido por eles não estava de acordo com o que eu havia proposto, todavia eu precisei compreender a subjetividade da expressão artística dos alunos para compreender que aquele trabalho estava sendo contextualizado com o conteúdo que foi trabalhado em aulas anteriores. Ao refletir a respeito de algumas aulas, notei que durante as primeiras aulas os alunos possuíam alguns conceitos bastante preconceituosos relacionados a cultura afro-brasileira e africana. Entretanto em nenhum momento notei nestes alunos algum tipo preconceito entre eles, suas ideias sobre a cultura afro-brasileira e africana estão baseadas nos conhecimentos e ideias que eles adquiriram através da televisão, família, amigos, etc. Todavia foi necessário apresentar e explicar muito sobre as diferenças entre culturas, religiosidade e etnias para que estas ideias e conhecimentos adquiridos fora do ambiente escolar fossem desfazendo-se aos poucos. Acredito que o objetivo geral do projeto foi alcançado, pois quando apresentei imagens dos orixás, os quais acreditei que teria grandes problemas, notei que os alunos trataram do assunto com muita naturalidade, inclusive manifestaram-se dizendo que possuíam estas imagens em casa e que pessoas de suas famílias frequentam alguma religião de matriz afrobrasileira. Conforme indica Parâmetros Curriculares Nacionais de Arte (1998, p. 51), é necessário o conhecimento e “valorização dos povos pelo reconhecimento de semelhanças e contrastes, qualidades e especificidades”, para que exista compreensão a respeito das diferenças, desta forma os educandos passam a entender e a respeitar o seus semelhantes contribuindo para a construção de uma sociedade menos preconceituosa com as diferenças.


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No sexto encontro aconteceu algo que eu não esperava que poderia acontecer. A metodologia proposta para a aula não funcionou muito bem, pois quando distribui aos alunos imagens da simbologia Adinkra e solicitei que eles falassem sobre o que aquelas imagens representavam a eles. Somente uma aluna falou sobre a imagem que havia recebido, o restante da turma não se pronunciou. Me senti frustrada por não ter conseguido instigar os alunos e estimulá-los a fazerem a leitura das imagens recebidas. Refleti sobre o que poderia ter dado errado com essa proposta, talvez se eu tivesse apresentado os símbolos Adinkra no data show teria conseguido estimular mais os alunos a participarem da atividade de leitura de imagens, pois quando apresentei o vídeo Adinkra Symbols Ghana: Part 3. Textile Printing, a turma foi mais participativa e interessada. Quando algo não acontece ao modo que planejamos, a primeira coisa que veem a mente é colocar a culpa nos educandos, dizendo que eles não tem interesse em aprender. No entanto, é necessário colocar-ser no lugar destes alunos e procurar pensar a respeito de qual seria a minha reação se um professor fizesse a mesma proposta para mim, talvez eu também não acharia interessante. Por isso é importante refletir sobre o papel do educador. Diversas vezes nos deparamos em situações as quais terceirizamos a responsabilidade de nossos atos, principalmente quando estes acabam por não darem certo. Responsabilizar o aluno pode ser mais fácil, porém não resolve o problema. É preciso buscar soluções através de reflexões perguntando-se os porquês de não ter dado certo e como posso mudar minhas metodologias para que se possa abordar o mesmo assunto de forma mais interessante e que possibilite que os educandos consigam contextualizar este conteúdo. Procurei desenvolver com a turma 62 trabalhos que proporcionassem atividades em grupo, pois durante as observações silenciosas percebi que os educandos desenvolviam somente atividades individuais, haviam muitas discussões entre os alunos e eles tinham dificuldades em partilhar materiais com os colegas.

Foi muito

significativo proporcionar atividades em grupo, pois eles tiveram a oportunidade de se relacionarem de forma cooperativa, precisaram partilhar materiais, debater e buscar soluções para o desenvolvimento das atividades plásticas. As atividades em grupo favoreceram o fortalecimento social e criador dos alunos, proporcionando a eles posicionarem-se frente as adversidades buscando soluções para as mesmas, transformando a postura destes alunos dentro e fora da sala de aula para que os mesmos


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possam saber posicionarem-se como cidadãos formadores de opiniões e integrantes da sociedade. Durante do desenvolvimento da prática de ensino me deparei com algumas situações inesperadas que me levaram a algumas reflexões sobre a realidade escolar. Uma delas foi com a aluna Lavínia. Esta menina, quando vinha a aula, estava sempre tentando causar alguma situação de enfrentamento e de tumulto em sala de aula. Pelo que pude perceber a escola e as aulas não eram interessantes para ela e a medida que consegui me aproximar dela, sua postura em sala de aula mudou. Ao desenvolver sua prática artística foi capaz de expressar em seu trabalho uma imagem muito significativa, simbólica e de uma forma muito particular e única. O caso desta aluna me levou a refletir a respeito de algo que acontece muito dentro das escolas. Quando um aluno causa algum tipo de problema e, é rebelde os professores e a escola em geral tendem a rotular o aluno como problemático, sem buscar soluções para o problema, afinal se adultos muitas vezes mudam seus comportamentos por estarem passando por algum problema, imagina uma criança. O fato de eu ter tratado ela com carinho e com conversas demonstrando que eu estava interessada por ela, causou uma transformação no comportamento da aluna em sala de aula, pois ela passou a se interessar e participar das aulas. A mudança de comportamento da aluna Lavínia iniciou no sexto encontro. Nesta aula, foi quando a aluna demonstrou mais interesse em participar, estava muito mais colaborativa e envolvida com a atividade. Acreditei que a aluna sentiria-se mais acolhida e frequentaria mais as aulas, porém ela continuou sendo infrequente. No entanto as aulas as quais ela esteve presente depois do sexto encontro ela permaneceu participativa e colaborativa com a turma e comigo. É muito difícil saber o que está passando no íntimo dos educandos, todavia é preciso ser acolhedor e compreensivo com os alunos, sem julgar este aluno somente por seu comportamento, visto que o comportamento pode estar diretamente ligado a fatores que estão fora do ambiente escolar. Outra situação foi a que ocorreu no nono encontro com a aluna Thaisa. A menina é de religião neopentecostal e quando iniciei o assunto sobre os orixás e a arte de Mestre Valentim a aluna foi contrária ao assunto. Imaginei que este assunto poderia causar alguma atitude contrária de alguns alunos, por isso procurei ser compreensiva e deixar muito claro aos alunos que eu não estava ali para convertê-los a alguma religião de matriz africana, mas para desenvolver um conhecimento para que eles aprendessem a


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respeitar as diferenças religiosas e culturais que existem não só no Brasil, mas no mundo todo. Não cabe ao educador julgar o aluno por essa atitude, porém é preciso compreender a atitude do educando, entender que essa ação é parte de uma cultura que ele traz de casa, por isso é preciso que se tenha uma conversa clara e se explique os motivos pelos quais é importante que este aluno participe da aula. Acredito que minha atitude de sair com a aluna para conversar foi bastante importante para esclarecer a ela que eu não estava ali pregando uma religião, mas sim ensinando que cada religião possui a sua importância e é necessário a compreensão e o respeito, quer a gente concorde com suas práticas ou não. Precisava deixar isso claro à aluna, pois temi que ela, ao chegar em casa, contasse aos pais que a estagiária de artes estava induzindo os alunos a mudarem de religião. Percebi o quanto é importante trabalhar a cultura afrobrasileira e africana nas escolas, pois infelizmente existem religiões que continuam pregando o preconceito religioso e étnico causando grandes danos às crianças e a sociedade. É difícil e delicado abordar conteúdos que falem a sobre religiosidade, pois os alunos podem confundir a intenção do educador que busca desenvolver uma consciência de tolerância e respeito as diferenças com a conversão religiosa. Depois de conversar com Thaísa e retornarmos a sala de aula, a aluna pareceu sentir-se mais confortável, mas não participou da leitura de imagens. Entretanto depois de encerrada a prática da leitura de imagens e dado início a atividade plástica, a aluna juntou-se ao seu grupo e participou da atividade artística ativamente, debatendo e auxiliando seus colegas com a atividade. Mesmo com as adversidades que ocorrem no desenvolvimento da prática de ensino, foi possível que todos os alunos participassem de forma ativa de alguma atividade proposta. Foi possível perceber que os educandos foram capazes de compreender e valorizar os aspectos culturais e simbólicos, bem como características fundamentais da cultura afro-brasileira, demonstrando esse conhecimento através da prática das leituras de imagens quando relacionaram as imagens dos artistas Rubem Valentim e Mestre Didi com imagens de orixás que possuem em casa, que conhecem através da televisão, que podem ter visto em lojas, na casa de algum familiar ou amigos. Os alunos também demonstraram sensibilidade, participação e interesse frente a proposta de leitura de imagens, sendo capazes de analisar as mesmas de forma coerente, percebendo elementos comuns, tais como, a relação feita por eles entre um manto usado por dois integrantes de uma tribo africana chamada Kikuyu e o poncho usado pelos gaúchos


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durante o inverno, a tiara de flores usada por uma mulher da tribo Samburu e o cabelo do jogador Neymar. Estes aspectos estão diretamente relacionados a sociedade a qual os educandos estão inseridos por isso fizeram relações diretas entre as imagens africanas e imagens as quais costumam presenciar em seus cotidiano. A atividade de leitura de imagens proporcionou que os educandos desenvolvessem suas capacidades críticas frente às imagens e a realidade. Através das práticas artísticas os alunos tiveram a oportunidade de contextualizar o aprendizado desenvolvido no decorrer das aulas e através destas expressarem seus sentimentos, conhecimentos e desenvolverem suas capacidades

imaginativas.

Possibilitei

que

os

educandos

expressassem

seus

conhecimentos teóricos e artísticos livremente, utilizando materiais, tais como, tecidos, tintas, flores de plástico, pedaços de madeira, tampinhas, papel e lápis de cores, os quais eles não estavam habituados a utilizar. Logo estes materiais também serviram como um desafio para os educandos buscarem soluções para as propostas de cada aula. Procurei utilizar métodos que não falavam diretamente sobre preconceitos étnicos, culturais, religiosos e etc., mas procurei desenvolver com os alunos conteúdos e atividades que estimulassem a capacidade imaginativa e através desta, eles compreendessem que as diferenças, independentemente de quais sejam, fazem parte da sociedade a qual eles estão inseridos e, cada um de nós possui o dever de respeitar estas adversidades culturais. Depois de concluída a prática de ensino, pude refletir com mais calma a respeito da minha postura como educadora. Como eu havia criado expectativas quanto alguns resultados, acreditei que os alunos não tinham alcançado os objetivos propostos. No entanto quem não estava conseguindo perceber o aprendizado dos alunos era eu. Estava muito presa a conceitos e expectativas as quais eu havia criado em minha mente que estavam baseadas nos meus conhecimentos, não ao conhecimento dos alunos. Também vivenciei a importância do papel social que o educador possui na formação de cidadãos que respeitem o próximo e suas adversidades, bem como a compreensão dos educandos que demonstram agitação e rebeldia como forma de chamar atenção para algum problema que estes podem estar passando em suas vidas. Quando o educador coloca-se frente a uma turma de alunos é impossível não sentir o peso da responsabilidade que temos frente a eles. Não somente como construtor, junto com os alunos, de conhecimentos, mas como formador de cidadãos. O projeto de ensino oportunizou para mim aprender mais a respeito da origem do preconceito étnico, como artistas africanos e afro-brasileiros expressam seus


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sentimentos e preservam a identidade cultural que são de fundamental importância para a sociedade brasileira. Contudo a prática de ensino proporcionou que eu pudesse vivenciar as dificuldades enfrentadas no cotidiano dos professores, possibilitando enxergar a realidade escolar por um outro ângulo. Ao analisar o projeto de ensino durante o estágio IV pude refletir a respeito da minha postura como educadora e sobre o aprendizado que adquiri ao longo da minha jornada acadêmica. Durante o desenvolvimento da pesquisa para o projeto de ensino aprendi muito a respeito das religiões de matrizes africanas. Pude compreender o carinho, o respeito e a seriedade que os iniciados possuem com os mais velhos, com os “Pais ou Mães de Santo” e todo o contexto cultural e místico que envolve essa atmosfera religiosa, além da necessidade de preservação da cultura afro-brasileira, bem como a sua valorização. Ter pesquisado sobre a África do Sul e ter conhecido a arte dos Ndebele, além de proporcionar que eu aprendesse mais a respeito da cultura sul africana, contribuiu para que eu conhecesse um artista sul africano que visitava a cidade de Porto Alegre e nos tornássemos amigos. Não poderia imaginar que meu projeto de ensino pudesse me proporcionar, além do conhecimento, amizades que mantenho até então. Quanto ao meu aprendizado em sala de aula, acredito que consegui superar alguns obstáculos e estabelecer um bom relacionamento com os educandos. Em alguns momentos tive dificuldades com os alunos e precisei ter paciência para buscar uma solução e manter um bom relacionamento entre eles e eu, pois se eu tivesse uma postura autoritária corria o risco de não conseguir aplicar o projeto de ensino de maneira satisfatória, porque poderia criar uma atmosfera de enfrentamento dos educandos comigo. Procurei colocar em prática o que aprendi em sala de aula, buscando soluções que possibilitassem que todos os alunos fossem tratados bem e pudessem aprender de maneira igualitária e conforme suas capacidades cognitivas. Acredito que o trabalho do educador está muito além de somente ensinar conteúdos. É necessário trabalhar questões sociais que levem os educandos a refletirem a respeito das diferenças, do dever de respeitar as opções, sejam elas religiosas, culturais ou sexuais, de cada indivíduo e sobre o seu papel dentro da sociedade como integrante da mesma.


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apĂŞndices


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Apêndice 1 Avaliação da aluna estagiária realizada pela professora da escola de estágio.


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Apêndice 2 Questionário respondido pela professora da escola de estágio


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1. A professora é formada em artes? Qual instituição? 2. Acredita que a disciplina de Artes é importante no desenvolvimento escolar? 3. Como a disciplina pode ser melhor aproveitada no currículo escolar? 4. O que fundamenta sua prática? 5. Como os alunos são avaliados? 6. Há um plano de trabalho para o semestre? 7. As atividades artísticas costumam ser variadas? 8. No conteúdo trabalhado está incluído imagens de artistas de diferentes períodos da história da arte? 9. Quais os materiais e recursos disponíveis na escola? 10. Os alunos já fizeram exposições dos trabalhos realizados em aula? 11. Este tipo de exposição é feito com frequência?


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Apêndice 3 Questionários respondidos pelos alunos pelos alunos da escola de estágio.


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