H
á em Portugal um amplo consenso sobre os princípios que enformam o Serviço Nacional de Saúde. Certamente que este consenso está suportado por fundamentos éticos associados ao direito à saúde e ao acesso aos cuidados e tem tradução nas grandes bases do SNS - generalidade, universalidade, gratuitidade tendencial, isto é - tudo, para todos tendencialmente grátis. São princípios generosos e inspiradores, mas ou lhe damos um conteúdo efetivo e sustentável ou correm o risco de setornarem uma concha vazia. Sabe-se que encarar frontalmente o desafio da sustentabilidade, especialmente em períodos de fraco ou nulo crescimento económico, é politicamente sensível e eleitoralmente pouco rendível, e por isso o debate (?) tem sido feito mais com retórica do que com serena aderência à realidade. Mas de facto é urgente questionarmo-nos, sem peias, sobre se é possível manter estáticos e inalteráveis os atributos com que o sistema foi estruturado há quatro décadas, ou se é necessário proceder a mudanças no próprio modelo, adequando a sua estrutura de financiamento e organização, de modo a garantir a acessibilidade, a equidade, a solidariedade e a sustentabilidade. Entre nós os sucessivos movimentos de reforma encetados por diferentes governos têm visado essencialmente aspetos operacionais do sistema, adotando apenas medidas "cost-oriented', muito delas com efeitos limitados ao curto prazo. E na realidade, as condições económicas e sociais exigem, mais do que nunca a adoção de formas disruptivas nos modelos de oferta e organização de cuidados e de ajustamentos corajosos no financiamento. Na abordagem às alterações de modelos de gestão e financiamento há, do meu ponto de vista, três questões relevantes para as quais é imperioso encontrar respostas concretas e consistentes: a) como otimizar os recursos disponíveis; b) quanto pode I deve o Estado gastar em saúde; c) que nível de cobertura deve ser oferecido.
CON[SENTIDO] OPINIÃO
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UM SISTEMA DE SAUDE ETICAMENTE RESPONSAVEL
E
xistem no sistema de saúde português enormes ganhos de eficiência a capturar, quer a nível macro - na arquitetura do sistema, numa melhor combinação de serviços - , quer a nível micro - através da continuada melhoria de performance das unidades prestadoras. A criacão de valor com os recursos financeiros já alocados ao setor constitui o primeiro e fundamental fator de sustentabilidade; é premente encontrar soluções de médio e longo prazo, mas é também importante agir no curto prazo. Saliento aqui algumas áreas de intervenção pela importância estruturante que lhes atribuo: > Adaptação da oferta às alterações que se têm veri-
ficado na natureza da procura, atuando designadamente na eliminação de barreiras entre cuidados primários e hospitais, através da atribuição formal e sistemática da função - coordenador de cuidados - ao médico de família, a quem competirá estabelecer o patient care pathway entre diferentes prestadores. As divisões CSP/HH tem sido um obstáculo a uma oferta eficiente e, por isso, há que avaliar os resultados das Unidades Locais de Saúde e melhorar e aprofundar o conceito. Impõe-se também que seja feita a substituição de serviços tradicionais de consulta hospitalar para doentes crónicos por formas avançadas de gestão de doença com larga participação de self-care management. > Estabelecimento de processos institucionalizados
de colaboração entre organizações públicas e privadas; o sistema de saúde português é de jure e de facto, um sistema misto e por isso nada deve obstar a que as unidades privadas, que preencham os requisitos de qualidade, possam integrar o perímetro de planeamento da oferta pública e as redes de referenciação, potenciando as capacidades existentes independentemente de serem públicas ou privadas.
Na abordagem às alterações de modelos de gestão e financiamento há, do meu ponto de vista, três questões relevantes para as quais é imperioso encontrar respostas concretas e consistentes: a) como otimizar os recursos disponíveis; b) quanto pode/deve o Estado gastar em saúde; c) que nível de cobertura deve ser oferecido.
JOSÉ CARLOS LOPES MARTINS Administrador da José de Mel lo Saúde
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COMO OTIMIZAR OS RECURSOS DISPONÍVEIS
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