Entrevista a Stefano Riva

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Stefano Riva é um italiano em Lisboa. A postura descontraída de quem vive a vida de uma forma tranquila é a mesma com que diz que a crise para ele não é novidade, a novidade está no facto de agora toda a gente falar dela Texto: Ana Rita Sevilha | Fotos: João Reis e D.R.

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“Vim para ficar seis meses, já passaram 18 anos” S

tefano Riva é um italiano por Lisboa. A postura descontraída de quem vive a vida de uma forma tranquila é a mesma com que diz que a crise para ele não é novidade, a novidade está no facto de agora toda a gente falar dela. Chegou a Lisboa há 18 anos, de uma forma um pouco casual e “deixando o quarto por arrumar” por pensar que só ficaria seis meses, mas a vida trocou-lhe as voltas. Da arquitectura portuguesa conhecia relativamente pouco, tinha-a estudado, feito o “Siza Tour” e Eduardo Souto Moura era um arquitecto que acompanhava com alguma atenção. Mas pouco mais. “Nunca vim para ficar!” revela à Traço. “Tinha uma tese final para fazer, e a minha ideia era fazê-la cá e depois voltar...mas entretanto, de uma forma espontânea, começaram a acontecer milhões de coisas e fui ficando”. “Acabei a minha tese e comecei a trabalhar nos ARX”, corria o ano de 1997. Stefano Riva ficou no gabinete de José e Nuno Mateus durante seis anos.

organizado, mas à última da hora acabou por se alterar tudo e vim parar a Portugal”. No fundo, “sou um emigrante de Samsonite”, explica. “Eu venho de uma zona de Itália que talvez seja das mais ricas da Europa, e embora exista quem diga que em Itália não se faz arquitectura, recentemente vi um programa sobre a Lombardia que falava que em oito anos tinha sido construído o equivalente a oito novas cidades como Coimbra. Sempre que vou a Itália, mais concretamente a Milão, vejo coisas novas. Há dinheiro. Com isto quero dizer que a minha escolha em sair de Itália não foi feita no sentido de 'ter de me safar'. Foi mais o poder dar-me ao luxo de fazer uma escolha sem que o dinheiro fosse um factor muito importante”. “Hoje, o mais engraçado é que vivo uma série de contradições, entre elas o facto de ser um arquitecto português, porque nunca trabalhei num gabinete em Itália, o que eu conheço do mercado é o que me contam”, refere.

Volto, não volto “Sou um emigrante de Samsonite” Stefano estudou em Milão e fez Erasmus em Madrid. “Foi nessa altura que percebi que a arquitectura podia ter piada”. Contando à Traço o seu percurso, Stefano Riva comenta que saiu da Faculdade de Milão com a sensação de que tinha aprendido pouco. “Frequentei um Instituto de Arte de que gostei bastante, onde tive bons professores e onde aprendi muito. Mas depois, no Politécnico de Milão, parecia que estava numa fábrica, onde cada turma tinha demasiados alunos, o que levava a que nunca houvesse uma abordagem muito 'intima'. Em Madrid, deparei-me com o contrário, com uma abordagem muito diferente, por isso digo que foi lá que percebi que a arquitectura podia ter piada”. De regresso à sua terra Natal, depois da passagem por Madrid, percebeu que não queria ficar por lá. Não equacionou voltar a Madrid porque não sentiu a necessária empatia com a cidade para viver, e Barcelona foi o destino que escolheu. Contudo, não foi a cidade que o acabou por receber. “A determinada altura decidi ir para Barcelona, já estava tudo

Stefano Riva diz que houve alturas em que pensou em regressar, mas mais porque como saiu de Itália com a ideia de passar seis meses, “sempre vivi com uma espécie de drama do volto, não volto, o que é que faço!”. Mas curiosamente, relata à Traço, assim que deixou de se preocupar com isso começaram a acontecer coisas ao nível pessoal e profissional que fizeram com que criasse raízes muito fortes aqui. “De alguma forma o voltar acabou por passar para segundo plano”. Contudo, sublinha, ao nível dos honorários estaria bem melhor em Itália, onde os arquitectos são mais bem pagos. Questionado sobre o que o fascina então na arquitectura portuguesa que o levou a ficar tanto tempo, Stefano explica à luz da experiência que teve enquanto trabalhou nos ARX e com quem tem vindo a desenvolver alguns projectos que, relativamente aos seus colegas de Itália, “fez e faz uma arquitectutura muito mais profissional, menos especulativa”, e sublinha que: “tive a possibilidade de fazer uma série de projectos que não sei se em Itália teria tido”. Em jeito de conselho, Stefano Riva diz que Portugal de-

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veria vender a arquitectura como vende o vinho e o azeite. “A primeira coisa que os políticos deveriam fazer em Portugal era criar um imaginário português porque não existe”. Comparando os dois países Stefano diz que a arquitectura portuguesa tem actualmente um impacto na Europa muito maior que a Italiana. Com isto, refere o arquitecto, não quer dizer que Itália não tenha bons arquitectos, a diferença é que “ aqui a arquitectura é sentida como um fenómeno enquanto na Itália é um fenómeno muito disperso e quase não há presença na sociedade, na comunicação, por exemplo. Os arquitectos em Itália não têm um papel tão activo como em Portugal”.

“A crise existe, é um facto” Mas para Stefano Riva, não é propriamente uma novidade: “sempre vivi uma espécie de precariedade que não é novidade. A novidade para mim é que agora todos falam nisso”. Com isto não quer dizer que também não o sinta ao nível da encomenda. “Até há dois anos atrás eu tinha muita obra – principalmente dos trabalhos que fiz com os ARX, sempre com muito ritmo. Entretanto acabaram e em Setembro dei-me conta de que não tinha trabalho nenhum mesmo. E de alguma forma fiquei mais assustado porque depois toda a gente falava no mesmo, na falta de trabalho, na crise. Estava generalizado”. Ao deparar-se com esse facto, começou a organizar-se para participar em concursos, “estava a preparar-me para accionar o Plano B”. Contudo, Stefano vive a profissão da forma como a escolheu viver: “A precariedade é intrinseca na profissão do arquitecto. Sempre tentei aligeirar o mais possível as despesas, com uma estrutura muito pequena, que só cresce pontualmente quando é necessário para determinados projectos. Nunca tive colaboradores fixos. Fico contente pelo facto que desde que comecei a trabalhar sozinho, nunca tive de o fazer a um Sábado ou a um Domingo”. Neste momento Stefano, entre outros trabalhos, diz estar a realizar uma das suas quimeras: em colaboração com colegas italianos realizou duas moradias no seu país Natal. Entrevista

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Construir num bosque preservando o ambiente natural. Construir sobre um plano oblíquo mantendo a morfologia do terreno. Construir duas moradias separadas com o mesmo acesso. O programa previa a construção de duas moradias. O envolvente apresenta uma forte expressividade espacial, um lugar peculiar, as árvores de alto porte filtram e variam a intensidade da luz. As duas casas projectam-se no terreno em direcção ao bosque a partir de uma cota plana, conquistando um espaço habitável, suspendido no envolvente, valorizando a preexistência natural. A " casa sopesa", a Norte do lote nasce em volta de um páteo suspenso, que une num único gesto o espaço exterior e interior. A " casa pilar " tem um volume apoiados em pilares,que determina um espaço inferior de onde através de uma rampa ligamos o terreno às copas das árvores. As duas habitações apresentam um alçado que normalmente não existe, "o plano inferior", que resulta particularmente sugestivo, evidenciando a relação entre o costruído e o elemento natural. O sistema construtivo é um misto entre betão armado e estrutura de aço, com forro em painéis de fibrocimento e madeira de larice. Apesar de tudo isso, as folhas continuam a cair no outono e a renascer na Primavera.

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Ficha Técnica: Nome: "2 ville nel bosco" Autores: Marco Bigozzi, Massimo Bigozzi, Stefano Riva Localidade: Italia Área: 460 m2 Custo obra: 1.200.000,00 euros Início e Conclusão: 2006-2012

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