Metas de desenvolvimento sustentável para a saúde global: facilitando a boa governança em contextos complexos Just Haffeld Acadêmico afiliado ao Instituto Jurídico O’Neill para a Saúde Global e Nacional, Centro de Direito da Universidade Georgetown, Washington DC, USA. Correspondência: just.haffeld@medisin.uio.no
Resumo: Os processo de globalização tem produzido contextos crescentemente complexos. Sendo assim, os debates sobre as Metas de Desenvolvimento Sustentável (MDSs) requerem uma nova concepção que parta de uma critica às ferramentas políticas atuais e explore uma abordagem favorável à complexidade. Esse artigo propõe que as potenciais MDSs devem: tratar as partes interessadas, como estados, empresas e atores da sociedade civil, como agentes agregados à diferentes níveis de articulação em redes, incorporar bons processos de governança que facilitem o envolvimento precoce de recursos relevantes e a participação igualitária, processos de consulta e análises regulares sobre a implementação de políticas e programas, a adoção e execução dessas regras em processos democráticos nas instituições responsáveis e a inclusão de sistemas de avaliação abrangentes, incluindo indicadores de processo. Convenções globais podem ser instrumentos adequados para enfrentar alguns dos desafios relacionados à governabilidade em contextos complexos. Podem estruturar e legitimar o envolvimento governamental, engajar os atores globais, promover a deliberação e o processo de tomada de decisões com a devida participação e análise política sistemática, além de definir padrões mínimos para os serviços de saúde. Os processos de monitoramento podem assegurar que os agentes cumpram as metas, considerando os indicadores locais de resultados e de processo, superando o paradoxo entre controle governamental e espaços de política local. Assim, uma convenção pode explorar o dinamismo resultante do encontro entre sociedade civil, organizações internacionais e autoridades nacionais. Palavras-chave: globalização, ciência da complexidade, metas de desenvolvimento sustentável, governança de saúde global, convenção global de saúde “Vamos juntos desenvolver uma nova geração de metas de desenvolvimento sustentável para dar continuidade ao progresso iniciado pelas MDSs. E vamos chegar a um consenso sobre os meios necessários para alcançá-las.” (Secretário Geral da ONU, Ban Ki-Moon, 2011)1. Apesar da convocação do Secretário Geral da ONU para a elaboração de uma nova geração de metas de desenvolvimento sustentáveis (MDSs), os ODMs (Objetivos de Desenvolvimento do Milênio) não perderam relevância no período pós-2015. Mas os ODMs visavam principalmente os países em desenvolvimento, enquanto as MDSs voltam-se para todos os países e fazem parte de uma agenda que vai além do desenvolvimento para os países pobres, buscando atingir uma meta de sustentabilidade planetária. Assim, as MDSs podem ser vistas como complementares aos ODMs - oferecendo uma oportunidade para se cumprir a Declaração do Milênio. Após a Conferência Rio +20, a comunidade internacional incluiu nos debates sobre as MDSs o desenvolvimento de um conjunto de indiwww.grupocurumim.org.br/site/revista/qrs8.pdf
cadores para a avaliação do seu progresso: “O desenvolvimento das MDSs e de seus indicadores podem produzir maior legitimidade e impacto sobre o desenvolvimento se emergirem de um processo consultivo transparente e participativo”2. Como argumentado nesse artigo, tanto o processo de elaboração das MDSs e seus indicadores como as metas e indicadores finais devem ser concebidos de modo a facilitar processos consultivos transparentes e participativos, incluindo a incorporação dos princípios da teoria da complexidade e da governança articulada em rede ou multicêntrica. A abordagem baseada na complexidade funda-se no estudo da evolução e da dinâmica dos sistemas complexos. Em oposição à tradição cartesiana*, que enfatiza o estudo isolado de cada parte de um sistema, a abordagem complexa volta-se para o sistema em sua totalidade. Longe de * René Descartes é associado à lógica analítica reducionista, à
interpretação mecanicista da realidade física e à distinção dualista entre corpo (matéria) e mente (pensamento). Doi: (do artigo original) 10.1016/S0968-8080(13)42734-9
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