Financeiro 26 - Julho 2005

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pação, que pressupõe um relacionamento mais flexível entre demandantes e os que ofertam serviços, favorecendo o aumento do nível geral de ocupação economicamente relevante e tirando o gesso das relações de compromisso e reserva entre as partes. A chave do crescimento passa pela discussão de como viabilizar um maior intercâmbio produtivo entre as pessoas, minimizando atritos e desperdícios. Nesse campo das relações de trabalho, nossas bases são muito anacrônicas, ainda calcadas no homem-máquina e no operário. Não quero dizer com isso que o homem-máquina vá desaparecer, mas vem sendo substituído pela própria máquina. Ou seja, precisamos nos adaptar para uma sociedade de serviços e abandonar a idéia de um emprego como um casamento indissolúvel entre um patrão e seus empregados. De que forma poderia ser implantado esse novo modelo que o senhor preconiza? Eu acredito que o governo tem de ser o indutor de todo esse processo. Hoje, para garantir ocupação ao brasileiro, é necessário capacitá-lo intelectualmente para que possa entender as instruções para o desenvolvimento de sua atividade. Portanto, educação é fundamental, é pré-requisito. Agora, temos de ver que tipo de educação é preciso oferecer. Existem dois tipos de educação. Um deles é o que transforma a pessoa em alguém socialmente ativo. Nesse campo, creio que a educação no Brasil vem melhorando muito. Existe, porém, um segundo tipo de educação, aquela que transforma a pessoa em alguém economicamente viável, a profissionalizante, que ainda está muito aquém do necessário no Brasil. Podemos dizer, inclusive, que nessa área houve, até, perda de qualidade em nosso País. Formamos técnicos em vez de pessoas adaptáveis a um cenário econômico em constante mutação. Temos de considerar, também, outros aspectos, como o dos brasileiros que estão atualmente ociosos por dificuldades de alocação. Aí podemos identificar dois contingentes. O primeiro, é o das pessoas com mais de 50 anos de idade que, ao perderem o ACREFI

emprego, têm menor competividade no mercado de trabalho, ou, pelo menos, no mercado formal ou mais organizado. Eles têm expertise, bagagem, mas acabam subutilizados. Há, ainda, o grupo dos estudantes e dos recém-formados, que também têm dificuldades para conseguir algo que não seja uma subocupação. Acredito que o governo poderia, por exemplo, priorizar os maiores de 50 anos e acesso nos concursos públicos, minimizando gastos com aposentadorias precoces. Para os jovens, seria importante melhorar sua qualificação via programas de certificação profissional, a exemplo do que já ocorre no mercado financeiro e de capitais. As certificações geram custos e dificuldade de o potencial empregador enco ntrar um funcionário adequado e bem qualificado. Essas informações das certificações poderiam ser disponibilizadas em um grande cadastro para que, facilmente, se pudessem encontrar os profissionais certos para as vagas certas, de uma forma mais rápida e eficiente. O que mais pode ser feito nesse sentido? O avanço da tecnologia, por exemplo, é uma questão que vem sendo mal trabalhada no Brasil. Muitas vezes, priva-se uma parcela dos cidadãos de benefícios tecnológicos mais eficientes, porque a regra não seria aplicável a todos os brasileiros. Um exemplo disso é o nosso sistema de identificação. A carteira de identidade, o RG, é um dos documentos mais frágeis que existem, facilmente passível de adulteração, mas o único que se aceita de forma ampla. Por que não aceitar documentos digitais, além do RG, que é o básico? O sistema de identificação não precisaria ser único. Isso facilitaria muito, por exemplo, as transações no mercado financeiro. Poderíamos ter, até, um cadastro compartilhado por todos os agentes do setor que assim o quisessem para facilitar nosso dia-a-dia, ainda que o clienteconsumidor mantivesse a prerrogativa de dar acesso aos agentes que bem entendesse, através de uma senha, cartão ou outro método, sem necessidade de reapresentação de todos os papéis e, o que é pior, de refazer toda a conferência e confirmação dos dados.

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“Para os jovens, seria importante melhorar sua qualificação via programas de certificação profissional, a exemplo do que já ocorre no mercado financeiro e de capitais”

Esse tipo de sistema compartilhado poderia trazer benefícios também para o setor de crédito? Sem dúvida alguma, porque com isso poderíamos reduzir uma série de custos que oneram hoje os financiamentos. A intermediação financeira, em especial as operações de crédito, tem uma tributação excessiva, que opera na contramão e também precisa ser revista. Para melhorar o mercado de crédito, o que nós precisamos no Brasil é de um novo enfoque sobre a conveniência da poupança, o que nos remete à questão previdenciária. Hoje, o brasileiro tem um pseudo-seguro para o qual contribui diretamente com apenas 15% do que são os gastos correntes do sistema, acreditando que esta corrente da felicidade se manterá eternamente. Obviamente, essa conta não fecha e, mais cedo ou mais tarde, precisaremos rever esse contrato. Sendo assim, é preciso conscientizar a população que está na hora de uma mudança de mentalidade: temos de assegurar benefícios apenas para quem, na inatividade, tiver rendimento, por exemplo, menor do que 25% da renda per capita do país, mesmo assim limitado à complementação desse valor mínimo. Os demais, enquanto suficientes, não teriam de receber nada da Previdência Social. Isso incentivaria que os trabalhadores da ativa de hoje poupassem espontaneamente para o futuro, o que estimularia muito o mercado de crédito, como já ocorreu em países que deixaram o sistema previdenciário de repartição simples para trás. Agora é a nossa vez!


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