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Ficha TÊcnica Título: Villa da Feira - Terra de Santa Maria Propriedade: LAF - Liga dos Amigos da Feira Ž Diretor: Celestino Portela Diretor Adjunto: Fernando Sampaio Maia Coletivo Editorial - Fundadores LAF: Alberto Rodrigues Camboa; António Luís Carneiro; Carlos Gomes Maia; Celestino Augusto Portela; Joaquim Carneiro Processamento de Imagem e Design: Joaquim Carneiro Coordenação Científica: J. M. Costa e Silva Supervisão Editorial e Gråfica: Anthero Monteiro Colaboração: TOC, Belmiro da Silva Resende Periodicidade: Quadrimestral Assinatura anual: 30 euros Assinatura auxiliar: 50 euros Este número: 15 euros Pagamentos por: Transferência bancåria NIB 007900001127152910124

Publicidade: Telef.: 965 310 162 | 256 379 604 Fax: 256 379 607 Tiragem: 400 exemplares Edição: N.º 39 - Fevereiro de 2015 PrÊ-impressão, Impressão e Acabamento: Empresa Gråfica Feirense, S. A. Apartado 4 - 4524-909 Santa Maria da Feira Sede Social: Edifício Clube Feirense - Associação Cultural Vila Boa - 4520-283 Santa Maria da Feira Apartado 230 - 4524-909 Santa Maria da Feira Email: villadafeira@gmail.com Email da direção: carla.gab.dr.portela@hotmail.com http://www.villadafeira.blogspot.pt/ Depósito Legal: 180748/02 ISSN: 1645-4480 Reg. ICS: 124038 Depositåria: Livraria Vício das Letras Rua Dr. JosÊ Correia e Så, 59 4520-208 Santa Maria da Feira

Cheque Ă ordem de LAF - Liga dos Amigos da Feira Capa: Dom Florentino de Andrade e Silva. Fotografia. Fotografias: Ă“scar Maia, JosĂŠ Oliveira, J. M. Costa e Silva, Filipe Pinto, Biblioteca Municipal, Gabinete da Comunicação Social, DÂŞ Maria Adelina Castro, Manuel PlĂĄcido, Arquivos particulares, LAF e Fotos Web por AntĂłnio Madureira. Redação e Administração: "QBSUBEP t 'FJSB

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Apoios:

- Câmara Municipal Santa Maria da Feira - Grupo Empresarial - Rodrigo Nunes, SA - União das Freguesias, Santa Maria da Feira, Travanca Sanfins e Espargo - Irmãos Cavaco, S.A. - Feira Viva, E.M. - Patrícios, S.A.


MORREU JOAQUIM CARNEIRO SÓCIO FUNDADOR DA LIGA DOS AMIGOS DA FEIRA

De seu nome completo Joaquim Domingos Carneiro Pereira, nasceu no Alto da Maia, Águas Santas, concelho da Maia, a 12 de Julho de 1944 e morreu a 1 de Março de 2015, em São João de Vêr, concelho de Santa Maria da Feira. Com 11 anos ingressou no ofício das Artes Gráficas, na cidade do Porto, como aprendiz de impressor de Litografia – impressão direta sobre pedra -, passando pela Offset – impressão indireta sobre chapa de zinco – e mais tarde para a Fotolitografia – processo de transporte para a pedra litográfica ou chapa de zinco, de fotografias, desenhos ou textos -, neste setor exerceu fotografia, retoque, desenho e maquetização. Tirou o curso e exerceu Serigrafia – impressão através de seda. Em Março de 1962, fixou-se definitivamente em Vila da Feira, onde veio chefiar o sector de Fotolito/ Offset, na Empresa Gráfica Feirense, Lda. Casou com Dª Maria Fernanda Campos Resende em 05 de Agosto de 1967, deixou dois filhos, Vítor e Susana, e Carlota, neta que era o seu enlevo. Em 1980, estabelece-se e cria um atelier de pré-impressão, denominado “GrafiPub – Estudos Gráficos Fotolito”, mais tarde equipa-se com o setor de impressão. Entretanto, forma sociedade, com a designação social de “Grafipube - Artes Gráficas, Lda”. Por motivos particulares retira-se da firma e forma nova sociedade denominada “ PubliGrifo – Artes Gráficas, Lda. Por desistência de um dos sócios, esta é extinta e forma com a mulher e o filho, a Publlbis – Artes Gráficas, Lda. Executou inúmeros cartazes, logótipos institucionais, de associações e privados. Na Filatelia produziu linhas gráficas para eventos filatélicos nos concelhos da Feira, Maia, Matosinhos, Guimarães e Vila Nova de Gaia. Está representado no bloco filatélico do Uruguay, comemorativo do Ano Internacional del Oceano, 1998.

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Desenhou vários carimbos filatélicos para exposições nacionais e internacionais. Na Cartofilia criou cartões telefónicos para o Certame Filatélico Internacional – Ambiente 98 e para a Exposição Nacional de Cartões Telefónicos 98. Está representado num cartão telefónico da coleção Trenes – Serie especial férias: 1 de 4, telefónica – Espanha. Nas artes plásticas, como autodidata, tem trabalhos em tinta da china, guache, sanguínea, aguarela e óleo – coleção particular. Criou inúmeras capas para livros e revistas. Os brasões das freguesias de Espargo e de Santa Maria da Feira são de sua autoria. Na coleção “cadernos do mosteiro”, nº. 6, 1ª edição, Câmara Municipal da Maia, Junho/2001, em coautoria com Paulo Sá Machado, é convidado a escrever o livro A Literatura Portuguesa no Coleccionismo I, com o tema “Fernando Pessoa”, um estudo bioiconográfico. Tinha em preparação os livros Ao Redor da Filatelia no Concelho de Santa Maria da Feira e Fernando Pessoa no concelho da Feira. Foi com entusiasmo e dedicação que colocou ao serviço da comunidade a sua sensibilidade de artista, os seus conhecimentos e experiência. O último trabalho que executou, já com a saúde bastante debilitada, foi para a homenagem prestada ao seu amigo e nosso companheiro, Celestino Portela, em 24 de Outubro de 2015, no Salão Nobre do Castelo da Feira, e cuja Comissão Executiva integrou. Deixamos aqui, com profunda mágoa, o nosso agradecimento pelo talento que expressou tão evidencialmente em todas as nossas iniciativas. A LAF curva-se com respeito perante a sua memória e o seu testemunho de sempre: Dar de si antes de pensar em si .

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IN MEMORIAM JOAQUIM CARNEIRO

12/07/1944

01/03/2015 121


E prova inequívoca disso é de como as crianças o amavam, de como as marcava. E a prova disso é que não há quem não tenha gostado dele “Não me fales disso, nem me quero lembrar”! Dizia-me o meu filho mais novo com uma tristeza nos olhos. “O Quim Carneiro faz parte da minha infância... tenho que ir aí “- Dizia-me outra que estava mais longe. Não, filho, temos de falar disso.

Eu não resisto a quebrar o protocolo e fazer neste momento uma simbólica homenagem a este Amigo porque o Quim Carneiro à sua maneira era um irreverente

Falar sobre o Quim Carneiro não é fácil Não é fácil porque por mais que se diga

Sim, filha, fez parte da tua infância...e faz parte da infância que existe em cada um de nós... porque a infância é a inocência e a pureza da vida... e era isso que o Quim Carneiro transmitia. Não lhe podemos dizer adeus porque as pessoas que nos marcam continuam sempre connosco... a única coisa que podemos mesmo dizer é ... pena de não termos sabido ou podido usufruir mais da sua companhia. A sua passagem não foi inútil porque deixou pegadas bem fortes ... as do amor... da alegria... da sensibilidade ... e da reflexão.

sempre faltará por dizer Que era um grande artista

Foi o heterónimo de sorriso aberto que faltou a Pessoa ... o seu poeta.

Pintor desenhista e poeta (porque quem ama a poesia é poeta)

E deixa a marca do poeta como tal

Todos sabem Que era simpático e trazia no bolso sempre um grande sorriso que engolia qualquer tristeza também muitos testemunharam Que tinha um humor fino e brincalhão que fazia emergir o que de melhor existe em cada um de nós muitos beneficiamos Mas todos todos os que o conheceram de perto ou menos perto sabem que era uma Alma Grande aquilo a que se costuma dizer “ Uma boa pessoa” que parece tão banal mas que é tão raro 122

“Morrem jovens os que os deuses amam?” Sim, se isso significar uma velhice velha ou de muitas limitações... Sim, se isso significar dor gratuita ou solidão... Sim, se ... Mas que os deuses amaram o Quim Carneiro não podia ser de outra maneira Ana Paula


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Postal do 30ยบ Aniversรกrio da Liga dos Amigos da Feira.

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Fernando Pessoa - 贸leo s tela, 1999. Por Joaquim Carneiro.

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D.ÂŞ Susana Carneiro

Padre Domingos Azevedo Moreira

Celestino Portela

HeteronĂ­mia


Homenagem do Rotary Clube da Feira à Prof. Drª Dª Maria da Graça, em 7 de Outubro de 1996. Presidente Fernando Ferreira Lino Protocolo José Monteiro Fernandes Secretário Geordano Magalhães Tesoureiro Paulino Santos Silva

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Mestre Joaquim Carneiro, talento e dedicação Emídio Sousa*

Santa Maria da Feira é um concelho onde a Cultura assume um papel fundamental na vida das pessoas e das instituições. A nossa terra tem uma marca indelével no panorama nacional e internacional, como geradora de iniciativas culturais e artísticas do relevo e dimensão da Viagem Medieval e do Imaginarius. Mas somos também um território de mulheres e homens de enorme valor e talento cultural, nas mais variadas vertentes artísticas. Está neste rol restrito de homens, cuja obra é intemporal e perene, o Mestre Joaquim Carneiro. Como Presidente da Câmara, curvo-me reconhecido e homenageio a figura de Mestre Joaquim Carneiro, com uma vida preenchida e dedicada às instituições culturais do concelho, como colaborador do Centro de Cultura e Recreio do Orfeão da Feira, do Rotary Club da Feira, da Santa Casa da Misericórdia, da Confraria da Fogaça, do Clube Feirense Associação Cultura, da Confraria da Broa de Avintes, e da Liga dos Amigos da Feira. A sua obra ficará sempre escrita nos anais da história cultural deste concelho, tão rico em manifestações culturais e em personalidades que têm contribuído para elevar Santa Maria da Feira a um lugar singular e único na Cultura nacional.

*Presidente da Câmara Municipal de Santa Maria da Feira.

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Joaquim Carneiro e esposa Dona Fernanda Campos.

Procissão da festa das Fogaceiras. 138

Três Mestres: Joaquim Carneiro, António Joaquim e Adolfo Batalha.


Joaquim Carneiro Serafim Guimarães* Durante anos, conheci, apenas de vista, o Sr. Joaquim Carneiro. Era uma pessoa nem alta nem baixa, de face magra e morena, de olhar vivo e semblante risonho. Foi uma imagem que, existiu, sozinha, durante anos, na minha retina, mas que não passava daí. Não era mais do que um perfil, um contorno, uma periferia, mas que, com o passar do tempo, me ia apontando para um certo interior, que me gerava curiosidade. Uma ou outra referência, vinda de amigos comuns, não me permitia ultrapassar uma certa expectativa mais passiva que activa. Em Junho de 2007, terminada a elaboração do texto para o livro O Castelo de Santa Maria da Feira, era altura de avançar para a montagem do mono que precede o envio do arranjo final para a Editora. Havia uma certa urgência em dar andamento à publicação e eu, sem perda de tempo, procurei saber quem poderia tomar conta dessa tarefa. Foi tal a convergência de opiniões quanto à pessoa indicada que eu, quase sem dar por ela, me encontrei a bater à porta do Senhor Joaquim Carneiro. Num certo bairro habitacional moderno dei com uma porta e um sorriso abertos e foi por aí que entrei. Porta e sorriso que nunca mais se fecharam. A esta entrada, sem dúvidas nem receios, seguiramse várias tardes, de dois meses, cheias de trabalho e aventura. Foi próximo e denso o nosso convívio nessa actividade que exige talentos, mais inatos que aprendidos. Sempre o Joaquim Carneiro mostrou um à-vontade surpreendente, mesmo quando tinha dúvidas: nunca o perturbou a necessidade de inventar: as formas, as cores, as distâncias, o arranjo dos diferentes elementos que têm de ser combinados na fase preparatória de uma publicação e que exigem sensibilidade estética e capacidade decisão segura e pronta.

Nunca soube nem procurei saber qual era o grau da sua literacia. É que não há curso para estes conhecimentos. Sei, sim, que Joaquim Carneiro nunca conviveu com farturas económicas. Às vezes, o computador que usava queixava-se disso. Várias vezes aconteceu eu ter de regressar ao Porto a meio de uma sessão - às vezes até antes de a iniciar – porque, com o cansaço, o “aparelho” se negava a colaborar. Depois desta experiência directa passei a acompanhar mais de perto o Joaquim Carneiro e nunca o vi sozinho, porque ele foi sempre dos outros. Vivia na órbita de certas pessoas e de certas actividades o que, aparentemente, o secundarizava, mas engana-se, rotundamente, quem pensar assim. O Joaquim Carneiro era, de facto, homem de mil ofícios, mas de ofícios raros, não dos ofícios habituais que, mais ou menos, os homens comuns têm e dos quais vivem, mas dos ofícios de que poucos são capazes, porque exigem sensibilidade, cultura, paciência, devoção, criatividade, grandeza de espírito. Desta multiplicidade de talentos e de relações humanas resultava o seu único pecado: às vezes chegava atrasado!

Em todas as frentes em que actuava era sempre uma presença marcante, jubilosa e optimista. De um conhecimento epidérmico inicial e de uma amizade provável, passei a ter, por este Homem, uma admiração sincera e a uma estima profunda e crescente. Acrescentou-me muito o convívio com uma pessoa tão sã, tão capaz e tão objectivamente boa. Recordo-o como exemplo de sensibilidade para a arte, de fidelidade aos amigos e de humildade intrínseca que o levava a apagar-se para glorificar aquilo que fazia ou ajudava a fazer.

Porto, 6 de Abril de 2015

*Professor Emérito da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto.

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Com o Sr. General António Ramalho Eanes e a Excelentíssima esposa nas Comemorações do Vigésimo aniversário do Monumento a Fernando Pessoa.

No Monumento ao Espírito Feirense - Homenagem a Henrique Veiga de Macedo e António Joaquim.

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Joaquim Carneiro faleceu no dia 1 de Março de 2015. Mario Fernandes da Silva Cancela* Recordo-o como um homem íntegro, vertical e sem ambições que sempre lutou pelos outros e nada exigiu em troca. Foi um homem com verdadeira vocação para dar, mais do que para receber. Foi um homem de visão rectilínea, com ideias simples e claras. Ligado às artes, viveu a vida tal qual desejou, como planeou, como sonhou. Colaborou com uma boa parte das instituições culturais Feirenses, a todas tendo dado o seu melhor. Era bom, profundamente bom.

Aprendeu a rara ciência de bem lidar com os seus semelhantes. Quem era seu amigo podia ter confiança nele. O amigo, para ele, não era o companheiro de acaso. Era, antes, um verdadeiro irmão. Foi um marido carinhoso, um pai atento e um avô doce. Deixou o mundo com a consciência tranquila de que cumpriu com exemplar dignidade o seu percurso na Terra. Dele fica a memória de um homem simples, culto, solidário e justo.

*Juiz Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça. Jubilado.

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Na Homenagem ao Prof. Doutor Francisco Ribeiro da Silva.

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Joaquim Carneiro Alfredo Oliveira Henriques* Joaquim Carneiro, não sendo feirense de nascimento, mostrou e demonstrou ter uma forte ligação e amor à Vila da Feira. Chegou jovem, enamorou-se pela terra e pela Fernanda que o acompanhou por todos os dias da sua vida. As artes gráficas trouxeram-no até nós. A alma de artista descobriu belezas que aos nossos olhos por vezes passam despercebidas. Respirou e viveu intensamente tudo o que era cultura, património e vida associativa. Marcou o design gráfico do Concelho. Foi autor do cartaz da Festa das Fogaceiras durante vários anos.

Interveniente nos mais diversos setores da vida feirense, militou num partido dito radical, sem nunca ultrapassar a barreira do razoável e nem esquecer o respeito por todos. Solidificou amizades que perduraram, tendo a sua prematura partida deixado um vazio e saudade em todos nós. Joaquim Carneiro foi e partiu como um grande feirense e santamariano.

Santa Maria da Feira | Junho | 2015

*Comendador.

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Homenagem a Joaquim Carneiro Aurélio Pinheiro* Joaquim Domingos Carneiro Pereira, nasceu no Alto da Maia, freguesia de Águas Santas, concelho da Maia, em 12/07/ 1944. Com a tenra idade de 11 anos, iniciou o seu percurso de artista. Após o ensino primário, 4ª classe, no seu tempo, frequentou Artes Gráficas. Fixou-se em diversas áreas da arte identificando-se em técnicas e suportes variados. Em 1962 veio residir para Santa Maria da Feira, então Vila da Feira, e começou a trabalhar na Gráfica Feirense. Após várias tentativas de trabalho em sociedade, iniciou a sua atividade por conta própria como empresário e mais tarde constitui sociedade com a esposa e o filho, fundando a empresa “Publíbis-Artes Gráficas lda.”. Dedicou-se sobretudo ao desenho e gravura. Era procurado para obras simples e trabalhos complexos. Tudo cumpria com devoção e amor à arte que amava. *Presidente da Câmara Municipal de Santa Maria da Feira. Governador CIvil de Aveiro.

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Joaquim Carneiro entregava-se por completo ao compromisso artístico então assumido. E esta emoção vale tudo. A técnica que o artista aplicava não era apenas para desenhar mas sobretudo uma forma de constituição do olhar, era acreditar no seu ideal. Era verdadeiro e concreto, de conceitos claros que transmitia nas obras que realizava. Acreditamos que ele ao olhar para o que fazia poderia afirmar “era isto mesmo que eu queria dizer…” Na Medalhística, era o preferido para executar obras relevantes, em grande quantidade, obras essas que nos legou como testemunho da sua arte e ao mesmo tempo da sua vontade de servir. Sobressaem nesta área, obras dirigidas a Personalidades, Instituições, Desporto, Cultura, Política, etc. (Vide: Revista Villa da Feira, nº 28, Junho 2011). A obra que nos deixou como artista, implica em nós a obrigação de o recordar e fazê-lo participar da história cultural de Santa Maria da Feira, comunidade onde se sentiu verdadeiramente inserido e participativo. Ficará sem dúvida, na memória de todos os Feirenses. Amou a sua terra e norteou a sua vida por lhe ser útil, prestável e disponível, deixando no seu legado a verdadeira expressão do seu valor.


Recordar um amigo que nos deixou, homenageando-o, é prestar-lhe justiça, é dizer-lhe que continua connosco, que nos atende e que continua a cumprir com o sentimento da amizade que nos alimentou e afirmar que nós continuamos a ouvi-lo e a receber a sua mensagem. Da nossa parte é cumprir um dever, é valorizar a sua vida numa atitude de justiça e reavivar a memória de um grande feirense. Gostaríamos de registar tudo o que ao longo de vários anos aprendemos dessa sua mensagem, sempre simples, mas de enorme simbologia. Sensível a todas as solicitações, cumprindo com verdadeiro sentido de artista nato, enriquecido pelo melhor relacionamento humano, dotado de ótimo humor e por um diálogo aberto e franco, era elegante no trato, solidário e íntegro na amizade. Por tudo isto não poderá ser esquecido. É sem dúvida, motivo de emoção, recordar o amigo Joaquim Carneiro, nesta homenagem sincera e digna de quem a merece. É a pessoas simples e humildes, mas muito uteis a uma sociedade, que devemos o nosso respeito e a nossa homenagem. Creio que Joaquim Carneiro mexe connosco, pela maneira como esteve na vida. Pessoas desta estirpe devem ficar presentes em nós que sentimos a obrigação de celebrar a sua capacidade de realizar e de ser úteis à sociedade. A sua vida ia-se apagando, em sofrimento crescente, suportado com a serenidade que lhe era peculiar e que fazia dele um homem respeitado por todos. Embora doente continua a trabalhar, fazendo realçar a sua criatividade e a sua capacidade de corresponder aos seus talentos. O rasto da sua passagem representa vivamente o carimbo que nos legou. Numa sociedade em que os valores artísticos quase se escondem, a sua vida deixa-nos uma grande lição. Jamais negava um sorriso. Adorava o que fazia. Era contudo um homem desassossegado, até inseguro, refugiado na arte. A sua vida não foi fácil. Realizaria ele os sonhos da sua vida? Haveria ainda

tanto para fazer!...o artista nunca dá por terminado o seu trabalho. Nunca pensaria numa atividade profissional tão intensa como a que realizou. Fazer da arte a única comunicação com o mundo ilustra o Homem, o Artista. Obrigatoriamente relembro a sua dedicação a Fernando Pessoa, enquanto o lia, o refletia na sua arte, a quem dedicou obras que claramente exprimem o seu culto pessoano. Por isso atrevo-me a terminar esta humilde homenagem citando: “Eu amo tudo o que foi Tudo o que já não é A dor que já me não dói Antiga e errónea fé O ontem que a dor deixou, O que deixou alegria Só porque foi, e voou E hoje é já outro dia” (Fernando Pessoa)

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Homenagem a Ant贸nio Joaquim e Domit铆lia de Carvalho.

Paulo Neves, Joaquim Carneiro, Alfredo Luz e Ant贸nio Joaquim.

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Com Roberto Le茫o.


Joaquim Carneiro José Manuel Leão* Joaquim Carneiro personifica ilustres feirenses que aqui não nasceram. Amou a nossa terra e a sua terra, defendeu-a de forma intransigente e deixou um grande e valioso legado cultural. Amigo leal e dedicado, pulverizava tudo e todos quantos o rodeavam com o seu humor constante, de frases curtas e incisivas. A jogar a sueca ou simplesmente numa cavaqueira dava prazer a quem o rodeava ao abordar os assuntos sérios com "tiradas" à mistura, tornando o ambiente sempre agradável. Tinha a preocupação de estar bem informado sobre os assuntos de Santa Maria da Feira e não raras vezes questionava as decisões de âmbito concelhio, denotando um enraizamento profundo à sua terra e uma vontade imensa no seu progresso e desenvolvimento. No período em que participei no executivo municipal, Joaquim Carneiro teve um papel preponderante em vários projetos e durante esses 12 anos deixou-nos

um espólio valiosíssimo com a sua criatividade, desde os cartazes das fogaceiras ao mais simples evento, as medalhas que concebeu, as mostras filatélicas e de medalhística em que participou, enfim uma imensidão de contributos que sempre tentei sentisse em vida, quando era importante para mim e para a comunidade, toda a sua dedicação e o seu talento. Partiu um amigo que deixa muita saudade a todos que com ele conviveram.

Santa Maria da Feira muito lhe deve e certamente não deixará de lhe prestar uma merecida homenagem.

Até sempre, Joaquim Carneiro

*Vereador da Câmara Municipal de Santa Maria da Feira. Governador Civil de Aveiro.

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Às vezes ouço passar o vento, e, só de ouvir o vento passar, vale a pena ter nascido. (Fernando Pessoa)

Encontros com a Pessoa de Joaquim Carneiro. Gil Ferreira* Não obstante considerar que pouca “autoridade” tenho para testemunhar uma vida tão completa como a que Joaquim Carneiro desenhou no seu percurso e na sua relação com Santa Maria da Feira, testemunho os discretos encontros que o percurso, particularmente associativo, nos proporcionou. Conhecida sua ligação às artes gráficas, o seu postulado da obra de Pessoa, a sua paixão pela filatelia destacarei sobretudo a sua dedicação às instituições e, por conseguinte, às gentes de Santa Maria da Feira. Recordo que Joaquim Carneiro me foi apresentado no Centro de Cultura e Recreio do Orfeão da Feira como um dos amigos da instituição que após o 25 de abril, no fervilhar da procura de um novo Portugal, se dedicou à reconstrução, em distintas dimensões, desta instituição – inclusive à reconstrução física, colaborativa e comunitária, do edifício que viria a ser a sede da instituição, nos tempos em que os apoios mais não eram que força de vontade individual orientada para o bem coletivo. Logo neste momento aprendi com Joaquim Carneiro que a “autoridade” se exerce pelo exemplo e muito mais por aquilo que se faz do que por aquilo *Vereador do Pelouro de Cultura, Turismo, Biblioteca e Museus.

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que se diz – porque o que se diz muitas vezes decorre de demagogias de circunstância que se esfumam em inativos intangíveis e que raramente atendem ao bem geral. Pois é no exemplo do fazer associativo que podemos testemunhar a sua preciosa colaboração desde logo na colaboração com teatro amador do Orfeão da Feira através da elaboração de elementos cenográficos - nos tempos que o fator que ditava a duração do trabalho a realizar mais não era do que o tempo disponível para que ele ficasse concluído! Ainda dentro desta instituição Feirense apraz-me recordar que é da autoria de Joaquim Carneiro o desenho da medalha das 5ªs Mini-Olimpíadas Concelhias, assim como o design dos magníficos cartazes e brochuras das primeiras edições deste evento aglutinador e percursor de um conjunto de modalidades, instituições e sobretudo pessoas. Guardaremos certamente a sua forma de estar, o seu inteligente e apurado sentido de humor, a sua dimensão humana enquanto amigo desta terra e das suas gentes numa ação fundada no exemplo de uma entrega altruísta aos projetos por onde “passou” e que hoje nos recordam o quanto valeu a pena o ter encontrado! Até sempre!


Homenagem a Francisco da Costa Neves.

Na apresentação do livro As 5 Sentidas de J.M. Matos Vila, por António Rebordão Navarro, no C.C.R.O.F.

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Tributo à Memória de Joaquim Carneiro Eduardo Cavaco*

Honrado pelo convite no sentido de expressar aqui o meu sentimento de tributo à memória do Mestre Joaquim Carneiro – que recente nos deixou – não posso deixar de evocar o meu amigo pessoal “Quim Carneiro”, como ele gostava que o tratasse. O Quim Carneiro era uma pessoa apaixonada pela sua terra, que fazia da sua inteligência e grande bondade, um instrumento de participação na vida das diversas associações em que deixou a sua marca. Sempre com uma palavra de conforto ou um sorriso para oferecer, acrescentava a sua grandiosidade humana ao fortalecimento das relações com aqueles que tiveram oportunidade de com ele privarem.

*Vereador da Câmara Municipal de Santa Maria da Feira.

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Ainda recentemente, fez questão de acompanharme activamente na homenagem prestada ao nosso Amigo comum, Dr. Celestino Portela, exercendo funções na Comissão Executiva, num derradeiro exemplo de entrega em que pude constatar o seu orgulho e enorme paixão pelo que fazia. Joaquim Carneiro foi um homem que, através da sua intervenção no seio da comunidade, perpetuou a sua própria história, pois “Os homens fazem as coisas, as coisas não fazem os homens”; e o meu amigo “Quim Carneiro”, deixa-nos muitas saudades…


Até logo, Quim Carneiro! Anthero Monteiro* Nunca tive dúvidas acerca do meu atributo de mortal, mas também nunca me ocorreu que, de repente, nos fosses agora faltar assim tão precipitadamente, sem dizer até logo, sem um aceno de amigo. É por me sentir também tão acessório e dispensável, como os deuses te quiseram, à revelia dos teus amigos, que ganho coragem para te tutear finalmente. Afinal sou apenas mais novo dois anos, mas como cheguei mais tarde ao convívio da LAF e sempre me portei como um iniciado, não te atribuí mais idade, mas um estatuto de pré-existência como “lafiano”, o que criava, ou poderia criar, pensava eu, algum distanciamento. Cedo, porém, me apercebi de que me aceitavas como igual e não foram poucas as vezes em que estivemos sentados lado a lado ou, pelo menos, à mesma mesa, conversando e até chalaceando como velhos conhecidos. Foi aí que me apercebi que não havia distanciamento nenhum. Tinhas sempre uma piada para esbater distâncias e até aquela tendência ocasional de tropeçar numa ou noutra sílaba era mais um fator que nos irmanava. Na adolescência, também eu tropeçava na timidez e em algumas consoantes, até que aprendi a fazer como o célebre orador gago Demóstenes, não a treinar os discursos com seixos na boca, mas recitando poemas em voz alta, pronunciando bem todas as sílabas, e em locais de contacto mais estreito com a natureza. Era então, lembrado disso, que eu sentia por ti uma calorosa simpatia. Sabia muito mais dessa tua permanente boa disposição do que do talento que todos te reconheciam para as artes gráficas. No entanto, de uma coisa eu tinha a certeza: estavas ali connosco porque os teus serviços eram imprescindíveis. Digo-o de outro modo: apesar de naturalmente te apagares, estavas ali para servir e não para te servires. Foi algo de que se aperceberam, logo nos primórdios do nosso mútuo conhecimento, os meus

olhos habituados a admirar os que se dão às causas do coletivo. Era por isso que eu tinha inteira confiança em ti. Só mais tarde conheci algumas das tuas obras gráficas, plásticas e gravuras. Não terão sido muitas, mas as suficientes para aquilatar dos teus dotes e das tuas enormes aptidões. Peças de medalhística, mostras filatélicas, cartazes, diplomas, ex-libris, postais, logótipos e outras sinaléticas, desenhos, pinturas a óleo, certidões de homenagem e tantas outras representações andaram por aí a falar-nos da tua sensibilidade estética e do teu talento criativo. Fernando Pessoa foi talvez o génio que mais apreciaste e serviste. Nunca esquecerei aquele teu óleo sobre tela denominado “Heteronímia”, uma obraprima de rigor, de capacidade de síntese e de riqueza de detalhes que eloquentemente conciliam no mesmo espaço os poetas do Guardador de Rebanhos, da Ode Marítima e da antiguidade greco-romana. Foi precisamente este último, Ricardo Reis, quem inspirou o teu ex-libris e deve, portanto, ter iluminado os caminhos da tua vida, apostada decerto em seguir os preceitos de Horácio sobre o culto do “carpe diem”: “Cada dia sem gozo não foi teu: foi só durares nele.” E não fora teres sabido colher o dia e aproveitar o momento, a tua vida, tão rapidamente assaltada e destruída pela doença, sem que tivéssemos dado conta a não ser nas proximidades do epílogo, teria sido uma tragédia muito maior, se não tivessem ficado na nossa memória o teu amor à terra que rapidamente adotaste como tua, o teu amor à arte que sempre acompanhou os teus gestos de permanente dádiva, o teu amor à tua Fernanda, o teu amor aos teus amigos, entre os quais também eu me senti distinguido e honrado. Obrigado, Quim Carneiro. E até logo! Um dia destes sentar-nos-emos de novo a uma mesa para rememorar tudo isto e concluirmos sobre o teu percurso solidário e ativo que uma vida assim valeu bem a pena. “Tudo vale a pena, se a alma não é pequena” – escreveu o teu poeta predileto. E, se há uma palavra para definir-te, essa bem poderia ser: Magnanimidade.

*Diretor da Biblioteca Pública de S. Paio de Oleiros.

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Joaquim Carneiro assina o Diploma, que executou, para o Dr. Anthero Monteiro. 152


Morrer é só não ser visto (Fernando Pessoa) António Carneiro* É com grande emoção que me associo a esta linda homenagem, inteiramente merecida, que a revista Villa da Feira presta a este grande homem e artista, ao meu amigo Quim Carneiro. Agradeço o convite que me foi feito, pois é para mim uma grande honra poder dar o meu contributo nesta revista que muito tem feito na divulgação de áreas como a História, a Cultura e a Arte. Escreverei sobre um período da vida do Quim Carneiro que conheci bem, na certeza de que outros escreverão sobre outras épocas da sua vida, da sua atividade associativa na nossa terra e do grande artista que foi. Destacarei também as qualidades morais de um homem simples, íntegro, respeitador e humano. A minha amizade com o Quim Carneiro surge no tempo em qua as palavras tinham de ser ditas em silêncio. Cresceu e consolidou-se na partilha de ideias que nos levava à defesa de ideais em que acreditávamos. Aconteceu nos longínquos anos 70, ainda antes dessa data histórica e sempre lembrada, o 25 de Abril de 1974. O registo que tenho na minha memória da aproximação a esse grande amigo, transporta-me para o espaço do Café Moderno, que se localizava em frente à Igreja Matriz da nossa querida cidade, onde hoje existe a Cafetaria. Naquele tempo, todos nós, jovens e menos jovens, frequentávamos esse espaço, quase único na altura, pois vivíamos um tempo em que as ofertas da nossa linda Vila da Feira, com a sua rara beleza natural, eram muito limitadas, no que diz respeito a espaços de convívio e de cultura. O Café Moderno, espaço por excelência de tertúlia, de cultura, de convívio e de lazer, foi também um espaço para conhecer novas pessoas, fazer e solidificar amizades. Necessariamente de tertúlia, de opinião e de aprendizagem. Durante muito tempo, nem aparelho de televisão teve e quando isso aconteceu, foi sempre um elemento ignorado nesse espaço. Quem não se lembra da simpatia e bairrismo do Sr. Alberto Machado e mais

tarde, do Sr. Silva? Quem não se lembra do convívio quase familiar de todos os que o frequentavam? Quem não se lembra dos campeonatos de matraquilhos vividos com uma emoção ímpar? Quem não se lembra das brincadeiras e das partidas que se iam fazendo e que constituíam para nós uma grande diversão? Para além de tudo isso, nesse espaço havia também lugar a grandes conversas e discussões sobre as mais diversas temáticas e que levaram a uma inevitável aproximação das pessoas que estavam em sintonia, aqueles que interpretavam a situação que se vivia com uma sensibilidade e consciência política muito próximas. Desse convívio, por volta do final do ano de 1973, começa a formar-se um grupo de pessoas que integrava estudantes feirenses que frequentavam faculdades e institutos de Lisboa, Porto e Coimbra, e por isso, com informação privilegiada de combate ao antigo regime. Relembra-se que o movimento estudantil foi muito importante no combate ao regime fascista, constituindo, muitas vezes, uma verdadeira vanguarda nessa luta. Para além dos estudantes, nesse grupo pontificavam outras pessoas que também acreditavam ser possível construir um futuro diferente. Entre elas estava o Quim Carneiro. Este grupo começou a fazer reuniões em sigilo, não podia ser de outra maneira, tendo em vista a melhor forma de lutar pela liberdade, democracia e contra essa guerra colonial que nos sufocava. Apesar de o conhecer há mais tempo, foi nesse contexto que começou a crescer a minha amizade com o nosso Quim Carneiro. Acontece o 25 de Abril e grande parte desse grupo feirense acima referido posiciona-se politicamente na esquerda revolucionária, em concreto, no Movimento Reorganizativo do Partido do Proletariado (MRPP), partido já conhecido por alguns de nós e que existia desde 1970. Relembro que nem sempre foi tarefa fácil ser simpatizante ou militante desse partido, pois muitas vezes foi perseguido, antes e depois do 25 de Abril. Relembro que foi impedido de participar nas primeiras eleições livres para a Assembleia Constituinte, em 1975. A título de curiosidade, tanto eu como o Quim

*Presidente da Escola E.B. 2 3 Fernando Pessoa. Aposentado.

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Carneiro fomos incluídos na lista de candidatos por esse partido no distrito de Aveiro. Vivia-se um tempo de grande militância e por isso, o meu convívio com o Quim Carneiro começou a ser quase diário. Como era necessário fazer grande propaganda dos ideais que defendíamos, as artes gráficas tinham um papel importante nesse trabalho. Foi um tempo de aprender com ele aspetos ligados a esta área. Lembrome com muita saudade, termos feito com ajuda dos seus conhecimentos, uma máquina de reproduzir comunicados e cartazes de fabrico muito artesanal, a que se dava o nome de “vietnamita”. Com essa máquina passávamos noites a reproduzir comunicados para serem distribuídos à população, materiais de apoio à divulgação do que ia acontecendo e ao mesmo tempo, apresentar a nossa linha política. O Quim Carneiro era para nós o mestre na arte de fazer materiais de propaganda política. Com ele, fizemos bonitos murais e aprendemos a fazer moldes para pinturas e as melhores técnicas na elaboração e colocação dos cartazes. Nesse trabalho e como era seu apanágio em tudo o que fazia, punha todo o seu talento, amor e dedicação à causa que defendíamos. O artista, também aqui, fez-se notar, constituindo um privilégio para todos nós o facto de o termos a nosso lado. O Quim Carneiro, como elemento mais velho desse grupo, com a sua experiência de vida e as qualidades de homem ímpar e de grande humanismo, constituía para todos nós uma referência, que nos ajudava a refletir melhor nas situações que por vezes surgiam como mais extremas. Recordo também que foi ele que serviu de anfitrião quase sempre aos companheiros que nos visitavam: Arnaldo Matos, Fernando Rosas, Saldanha Sanches, Luís Marques, José Lamego, entre outros. Foi durante esse espaço de tempo, que durou alguns anos, que eu convivi mais proximamente com o Quim Carneiro e que levou à formação e consolidação da nossa solidariedade e amizade. Passado esse período e pelo facto de andarmos nas linhas avançadas das nossas vidas, o nosso convívio próximo e assíduo tornouse mais raro, mas a amizade permaneceu através dos 154

tempos. Sempre que o encontrava era para mim um imenso prazer e um grande momento de alegria. Recentemente, no exercício das minhas funções de Diretor do Agrupamento de Escolas Fernando Pessoa e antes de me aposentar, tive novamente o prazer de trabalhar com ele muito proximamente em duas atividades, como resultado de uma parceria entre o nosso Agrupamento e a Liga dos Amigos da Feira (LAF) - à qual o Quim Carneiro esteve sempre intimamente ligado. Essas atividades foram de homenagem ao nosso grande poeta Fernando Pessoa. Uma assinalou a data do nascimento do poeta e a outra, a data da sua morte. Ambas tiveram um enorme êxito e realço a importância que o Quim Carneiro, como elemento organizador da LAF, teve nesses eventos. Mais uma vez fez questão de mostrar o seu lado artístico em todo o seu esplendor e o amor pelo poeta que tanto ajudou a divulgar. Aqui, emergiu mais uma vez a sua humildade, pois depois da elaboração dos materiais que serviram de apoio e divulgação a essas atividades, teve a preocupação de pedir a nossa opinião sobre o seu trabalho, partilhando desta forma todo o seu talento e criatividade. Todos temos, também, a perceção que o seu contributo na Liga dos Amigos da Feira foi de grande notoriedade, de grande valia para a cultura da nossa terra e do nosso país. Tendo desenvolvido um trabalho de grande qualidade, dedicou-se a mais essa causa de forma apaixonada, como era normal na sua personalidade. Poderia descrever alguns episódios que vivemos em conjunto, mas tornaria este texto um pouco longo e fugia ao pretendido nesta homenagem. No entanto, quero ainda destacar alguns aspetos, que serão, porventura, os mais importantes no quadro deste meu contributo e que estão mais ligados à sua personalidade e caráter enquanto pessoa. Ao recordar o Quim Carneiro, aquilo que salta ao nosso pensamento é que se tratava de um homem de uma enorme simplicidade. Terno, de olhar muito profundo, era dotado de um sorriso aberto e contagiante que parecia atravessar todo o seu corpo. Pessoa


de convívio muito fácil e extraordinária proximidade, facilmente fazia amizades. Homem de caráter íntegro e de uma dedicação à família ímpar. A essa família, quero deixar aqui uma palavra de apreço e de coragem. Aos filhos que conheci muito pequenos e à Fernanda, sua querida esposa, por quem nutro uma grande estima e consideração, também ela, pessoa muito afável e de uma extrema simpatia na relação com os outros. Incapaz de ofender os outros, Quim Carneiro pautou a sua vida como homem de diálogo franco e aberto. Com um ânimo persistentemente alegre, dotado de um humor fino e inteligente, chamava a si o maior respeito de todos que com ele conviviam. Determinado e sempre com uma grande subtileza no trato com as pessoas, era fácil gostar dele. Profissionalmente, foi sempre uma pessoa imensamente competente, a sua dedicação ao seu ofício era total, um apaixonado pela profissão. Um grande artista, que punha toda a sua sensibilidade e perfecionismo nos trabalhos que realizava. Era um predestinado para as artes, revelando uma sensibilidade rara nos trabalhos que realizava. O seu

legado artístico, a sua forma de ser e de estar, vai trazer sempre à nossa memória este nosso amigo. Por isso, vai estar sempre na nossa presença. A tua morte é de facto uma perda coletiva para as gentes da nossa terra e para a sua cultura. Quim Carneiro, jamais te esqueceremos. Ficarás para sempre na nossa memória mais reservada, pois afinal e como escreveu Fernando Pessoa, de quem tanto gostavas, "A morte é a curva na estrada, morrer é só não ser visto". Porque tudo o que se perdeu em ação vai estar no nosso pensamento. Talvez seja isso que atenua um pouco a tua perda. Obrigado, Quim Carneiro, pela amizade. Obrigado, Quim Carneiro, pelas lições que nos deste de simplicidade, humildade e generosidade. Obrigado, Quim Carneiro, por teres deixado um pouco de ti em todos nós. Que saudade! Um eterno bem hajas. Até sempre, querido amigo.

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Em visita a casa de Miguel Torga.

Em A Vêr o Sol.

Homenagem a Miguel Torga.

Celestino Augusto Portela, Joaquim Carneiro e Esposa.

Em vilegiatura por Sever do Vouga. Celestino Portela, Joaquim Carneiro, Magalhães Lima, Fernando Sampaio Maia, Padre José Almeida Campos, Carlos Maia e Elisio Costa Amorim.

Executivo Laf em visita de investigação no Concelho.


O desempenho do Sr. JC na LAF fica na história e a sua participação na Revista Villa da Feira é muito relevante. Para não falar da sua criatividade e veia artística ao longo de toda a sua carreira. Dedicamos-lhe este poema, do seu grande amigo Fernando Pessoa: “Viver não é necessário; o que é necessário é criar. Não conto gozar a minha vida; nem em gozá-la penso. Só quero torná-la grande, ainda que para isso tenha de ser o meu corpo e a (minha alma) a lenha desse fogo. Só quero torná-la de toda a humanidade; ainda que para isso tenha de a perder como minha. Cada vez mais assim penso.

(carta a título póstumo) Santa Maria da Feira, 2015-05-15 Caro Senhor JC (Joaquim Carneiro), Esperamos que se encontre bem. É difícil escolher as melhores palavras para lhe transmitir uma mensagem de amizade, de conforto e de esperança. Por cá continuamos na luta diária por um futuro melhor… sabendo que “estamos na infância da eternidade” e que, como diz o nosso amigo Fernando Pessoa, “O próprio viver é morrer, porque não temos um dia a mais na nossa vida que não tenhamos, nisso, um dia a menos nela”. Escrevemos-lhe para recordar algumas das passagens da nossa vida comum que lembramos com saudade: a sua simpatia (o ponto alto era quando tomava conta do nosso copo nas festas), generosidade (quantos cigarros lhe cravamos?), a sua calma e espírito consensual. É sempre bom conversar consigo…. E com a sua família: a D. Fernanda tão carinhosa e afável, a Susana tão querida e destemida e o Vitor tão solícito e criativo…

Cada vez mais ponho da essência anímica do meu sangue o propósito impessoal de engrandecer a pátria e contribuir para a evolução da humanidade. É a forma que em mim tomou o misticismo da nossa Raça. «Não sou nada. Nunca serei nada, não posso querer ser nada. À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.» (Em Tabacaria, por Álvaro de Campos - um dos heterónimos de Fernando Pessoa) O Manoel Oliveira, recentemente falecido, disse assim: “Todos sabemos que vamos morrer. É a única certeza que temos. Não tenho medo da morte, tenho medo do sofrimento. É na vida que se encontram todas as maldades do mundo. A morte é o descanso” . Descanse em Paz, Sr. JC, é a nossa vez de tomar conta do seu copo nas festas… Um abraço amigo da Clara, Tino e “meninos” (Cati e Tininho)

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Foto de Carlos Maia.

Apresentação do n.º 1 da Villa da Feira, no restaurante do Vila, espaço da Viagem Medieval - António Carneiro, Joaquim Carneiro e Valdemar Campos. 158


IN MEMORIAM do Senhor Joaquim Carneiro Belmiro Resende*

Conheci o Senhor Joaquim Carneiro, não sei quando nem preciso onde, contudo, sei que tem longevidade criadora de empatia e muita estima. Ao longo de todo este tempo, houve, naturalmente, diversos encontros, alguns casuais e outros proporcionados . 0 Senhor Joaquim Carneiro era um dos fundadores da LAF e assíduo intervencionista nas edições da revista VILA DA FEIRA, encontrei-o algumas vezes, com o seu amigo Senhor Dr. Celestino Portela e em cerimónias de índole cultural, artística e outras, dado ser, desta, um modesto colaborador. O Senhor Joaquim Carneiro, era um dos convidados indispensáveis, quando acontecia um jantar de caça e outros convívios mais ou menos programados. Pessoa extraordinariamente bem disposta, tinha um sorriso fácil e umas piadas, ditas inofensivamente, mas com traço maroto, que eram ditas em monossílabos saltitantes.

No final do ano passado, encontramo-nos no Castelo, na Homenagem feita ao Senhor Dr. Celestino Portela. Da conversa, nasceu da minha parte, a perspectiva de continuarmos a ter o Senhor Joaquim Carneiro, junto a nós, por muito mais tempo, ao murmurar esta convicção com a Esposa (Grande Senhora), a sua resposta foi um sobre olhar um tanto carregado. Voltei a ver o Senhor Joaquim Carneiro, no dia 02 de Março. Ao sobrepor as minhas mãos nas suas, notei que estavam frias, não fiz perguntas porque não obteria respostas.

ATÉ UM DIA, AMIGO.

*Técnico Oficial de Contas.

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Joaquim Carneiro visita uma enferma da sua estima.

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Quando recebi o convite do Dr. Celestino Portela, para dizer algo, sobre a pessoa de Joaquim Carneiro, de imediato aceitei, e agradeço a oportunidade que me deram de lhe prestar a minha homenagem sentida, com estas palavras. É para mim uma honra e um privilégio falar de um homem, com o qual mantive relações familiares e de amizade, ao longo de 50 anos. É um prazer partilhar com todos os leitores da revista Villa da Feira o meu testemunho. Joaquim Carneiro (meu cunhado), era sobretudo uma pessoa de afável relacionamento, que criava empatia ao primeiro contacto, com as pessoas que com ele privavam, pela sua humildade, caráter humano e de humor requintado. Homem desprendido de todos os valores materiais, mas muito preocupado com os valores morais. Com ele ninguém estava triste, pois sempre que se apercebia de um ambiente mais pesado, logo procurava inverter as coisas. As crianças também o adoravam, porque tinha sempre muita atenção para com elas e um carinho muito especial. É óbvio que não vou transcrever tudo o que com elas fazia, mas apenas dizer que, relativamente aos meus filhos, sempre que houvesse um convívio familiar, eles me perguntavam se o tio Quim também estaria presente. Isto demonstra tudo o que ele sentia pelas crianças, e as crianças para com ele.

Joaquim Carneiro, sem formação académica, mas de muita aplicação literária, era pessoa de cultura elevada e impressionante a forma como sabia conversar de temas que só estão ao alcance de alguns intelectuais. Quanto à sua veia artística não me vou pronunciar, porque o meu conhecimento na matéria é nulo. No entanto tenho a certeza de que outras pessoas mais credenciadas terão todo o prazer em dar a sua opinião. Se me for permitido, gostaria de dizer o quanto prazer me deu, ter privado e convivido contigo, cunhado Joaquim Carneiro, e deixar-te dois pensamentos, um dos quais tu adoravas:

“Disso se trata a vida Se trata de uma onda atrás da outra E você tem que lutar Para seguir em frente.” “Cada dia sem gozo não foi teu: Foi só durares nele. Quanto vivas Sem que o gozes, não vives.”

Com eterna saudade, onde estiveres, descansa em paz. Teu amigo e cunhado, Júlio Rodrigues. 161


Com o Sr. Padre Domingos Azevedo Moreira.

A sempre agradรกvel ironia do Quim.

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Durante a Ceia Medieval no Dia Triunfal Laf.


Recordando JOAQUIM CARNEIRO Habituados a pronunciar este nome, vamos ter muita dificuldade quando fizermos a chamada, no seio do nosso grupo comum de amigos, verificarmos que o Quim Carneiro fugiu. Ele é assim, sempre foi um brincalhão e agora resolveu desaparecer. Um dia volto com certeza a encontrá-lo e nessa altura ele terá que me explicar porque nos abandonou tão cedo. Ele sabe que faz falta à comunidade, à sua comunidade, aos feirenses, à Feira. Foi um grande lutador pelas coisas da sua terra de opção e por isso mesmo, eu testemunho publicamente a sua grande actividade na concretização das diversas infra-estruturas actualmente existentes na nossa, porque também era dele tão querida Santa Maria da Feira. Fez parte da Comissão de Construção do nosso Hospital S.Sebastião, a grande obra destes dois últimos séculos. Fez parte do grupo de reconstituição do Orfeão da Feira, assim como da reconstrução do respectivo edifício, sendo o principal responsável pelo revestimento das paredes em corticite. Até neste pormenor ele mostrava arte. Fez parte do conjunto de pessoas, apoiando incondicionalmente outro grande feirense, Celestino Portela, que inaugurou a primeira escultura nacional do grande poeta Fernando Pessoa, instalada num espaço nobre da nossa terra. Foi e sempre será um elemento preponderante na criação e expansão da revista Villa da Feira, especialmente na sua composição gráfica. Joaquim Carneiro era efectivamente um artista. A sua arte era natural, era singela mas acima de tudo facilmente atractiva e penetrante na medida em que nós reconhecíamos, nas suas pinturas, amostragem da sua vontade. Era um artista na pintura e artes gráficas. Era um enorme amigo como já não se usam nos tempos que correm.

Desculpa lá, Quim, mas nunca me irias perdoar se eu neste singelo texto, só evidenciasse os teus atributos artísiticos e intelectuais. Para mim tu foste muito mais do que isso, o que é manifestamente importante. De ti gosto mais de falar de amizade, solidariedade, enorme alegria de viver e acima de tudo de conviver, pois tinhas uma faceta na tua vida que a todos encantava, a alegria contagiante, a piada fácil e permanente. Aqueles almoços confraternizantes anuais do grupo de reconstrução do Orfeão da Feira, onde invocávamos os avanços e recuos das nossas mais do que justas pretensões, tu conseguias ser sempre o grande animador dessas reuniões e até um dos grandes responsáveis da nossa contínua luta pela concretização dos objectivos. Visitámos restaurantes, desde Lisboa ao norte de Espanha como Baiona, Sanxenxo e outros, sempre com a companhia do nosso patriarca, António Lamoso, que continuamente te pedia para contares as tuas estórias. Digamos que eras o pivot dessas fantásticas manifestações. Chegamos a ir ao teu quarto buscar-te, pois tinhas-te esquecido e adormeceste. Que saudades! Não há outro como ele e agora temos que nos contentar recordando as suas histórias, a sua boa disposição, visionando a sua arte, até que um dia nos voltaremos a encontrar e então nessa altura vai ser uma festa de arromba, pois estaremos todos presentes. Até um dia, fugitivo, até um dia, caro amigo, JOAQUIM CARNEIRO de Águas Santas.

26 de Março de 2015 Artur Brandão

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Quatro pessoas na homenagem a Ă lvaro de Campos.

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JOAQUIM CARNEIRO. Separação É muito simples de explicar a acção da separação. É um simples afastamento, o ir para longe um do outro e ficar-se sozinho, temporariamente ou não. Até as crianças compreendem o significado da palavra separação quando os mais crescidos precisam de lhes explicar o que quer dizer, em determinadas situações. Agora a separação última, aquela a que todos estamos sujeitos e à qual ninguém foge é muito mais difícil de ser explicada. Direi mesmo incompreensível e em que ninguém gosta de pensar e muito menos interiorizar. Esta é a separação chamada morte. Palavra que nos arrepia, entristece e assusta Nas muitas e variadas filosofias sobre a vida e morte cada um aceita aquela que está mais de acordo consigo, com o seu profundo sentir, no grau de fé em que acreditar. Pode acreditar-se, por exemplo, num quadro de uma outra vida tão cheia de luz, perdão e bem estar que supere tudo aquilo que possamos imaginar, como frágeis e vulgares humanos que somos. E será para essa vida superior que implacavelmente caminhamos.

Joaquim Carneiro separou-se de nós, atravessou o portal chamado morte no final da sua vida terrena finita e entrou numa vida eterna. A sua imagem ficará para sempre nos nossos olhos e nos nossos corações. A imagem de um artista nu de vaidades, dum amigo sincero e dum companheiro alegre e sempre bem disposto. A sua piada fina encantava todos aqueles que com ele contactavam. Homem de trato educado, sincero e humilde e com quem os amigos podiam contar quando dele se abeiravam. Joaquim Carneiro, alma de artista, repousa no céu da vida cheia de luz em que acredito. Só a saudade ficará nos nossos corações, mas a tua imagem continuará eternamente a pairar no universo desconhecido da Arte

26 de Maço de 2015 Alcide Campos Brandão

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Ao meu amigo Joaquim Carneiro Domingos Rodrigues

Conheci o Sr. Joaquim Carneiro há anos e noutras circunstâncias. Primeiro como Amigo e Artista e mais tarde, como uma pessoa mais fragilizada e a precisar de um Médico-Amigo. Por vezes parece um pouco difícil tratar um Amigo – doente, mas, o Sr. Joaquim Carneiro mostrou-se sempre uma pessoa forte, com vontade de vencer e foi isso que consegui fazer até ao dia 1-3-2015 Foi compreendendo e conhecendo a componente emocional, sociocultural, afetiva e familiar que se tornou mais fácil lidar com a pessoa e com a doença. O Sr. Joaquim Carneiro montou como que uma estratégia, como se fosse um desafio a ser enfrentado e empenhou-se lutando ferozmente contra a doença, não a aceitando como uma punição ou algo irreparável Estou a ver o meu Amigo Joaquim Carneiro em sua casa e com a Família por perto, já com alguma dificuldade em reconhecer quem estava presente e quando me viu chegar, teve uma expressão facial de

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alegria e contentamento. Até parecia que tudo tinha passado e que já quase estava curado. O seu cumprimento e a sua expressão de contentamento de me ver chegar naquela hora difícil ficarão gravadas para sempre, como sinal de que vale sempre a pena fazer mais alguma coisa, mesmo parecendo que o que podemos ou vamos fazer nos parece pouco, pois haverá alguém que dará outro valor àquela nossa insignificância. Foi um privilégio ter lidado com o Sr. Joaquim Carneiro Amigo-doente. Sei que dei alguma coisa mas também recebi. Todo o médico reage, querendo ou não, sabendo ou não, de modo emocional e muitas vezes inconsciente estabelecendo com o seu doente uma relação complexa dominada pela relação Médico - Doente. O Sr. Joaquim Carneiro foi singular. Sim, foi singular porque viveu como quis, deixou-se amar, nunca deixou de lutar e reconheceu e aceitou os outros tal como são

Um abraço e até à …………………………….


EVOCACAO DE JOAQUIM CARNEIRO Joaquim Carneiro desapareceu recentemente do mundo dos vivos. Dizia o padre António Vieira que o delta da memória é levar-nos aos ausentes para que estejamos com eles e trazê-los ate nós para que estejam connosco. Por isso, com saudade, do Quim Cameiro recordo que o conheci há mais de 40 anos e desde então sempre o considerei um bom, leal a sincero amigo, amizade que se tornou extensível a sua família, a sua extremosa esposa Fernanda a aos seus dilectos filhos, Vitor a Susana. Recordo ainda a franca convivência com os seus amigos, a sua grande e desinteressada generosidade e uma alegria contagiante, mesclada de uma fina ironia. Também, ao longo dos anos , acompanhei de perto a sua abundante actividade profissional, nomeadamente, no campo das letras, bem como o seu empenhamento cívico, traduzido na colaboração assídua com várias entidades culturais. Como apaixonado pela obra de Fernando Pessoa não deixou, como paradigma de vida, de interiorizar o seu pensamento reflectido na seguinte máxima: “Para ser grande, sê inteiro”.

Pela obra valiosa que nos legou e que alimenta a memória contra o esquecimento, Mestre Joaquim Careiro e credor do nosso público reconhecimento. Vítima de doença prolongada, a sua morte chocou-nos brutalmente. Perante isto, ocorreu-me, uma vez mais, o sentido da expressão de Shakespeare parafraseada por Hemingway em “ Por quem os sinos dobram” e que, sem preocupações de rigor, cito de memoria: “Quando morre alguém morre sempre um pouco de nós mesmos”. É certo que neste caso foi mais que um pouco de nós mesmos que morreu. Na memória dos que ficamos e prosseguirmos definhando, o correr dos anos, a imagem deste bom amigo, permanecerá viva ate ao fim do caminho que, inexoravelmente, nos conduzirá ao destino que, cedo de mais, teve.

Vitor Fontes Abril 2015

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HOMENAGEM SIMPLES À MEMÓRIA DO “QUIM CARNEIRO” Artur Eugénio Campos Pais A personagem de quem falamos, nasceu (fruto duma família que viria a ser numerosa), em Águas Santas, no concelho da Maia, a 18 de Julho de 1944. Aos dezassete anos rumou à Vila da Feira, para trabalhar na Empresa Gráfica Feirense. Pouco depois, viria a namorar (cerca de cinco anos) e a casar, pela única vez, a 5 de Agosto de 1967. Cumpriu trinta e seis meses de serviço militar (em tempo de ditadura) em Leiria e Tancos. Residiu trinta e três anos na sede do concelho – Santa Maria da Feira – grande parte desse tempo, no lugar de Eiras de Baixo, que veio também a chamarse Rua Dr. Guilherme Moreira, agora Rua Dr. Elísio de Castro e outra parte desse período, na Avenida Sá Carneiro, também conhecido por lugar da Cruz. Os últimos catorze anos, residiu na freguesia de S. João de Ver, do mesmo concelho, onde veio a falecer (depois de afligido durante catorze meses por doença que o sujeitou a tratamentos de quimioterapia), a 1 de Março de 2015. 168

Conheci-o muito cedo. Entre os dez/treze anos. Percorria ele, os seus vinte/vinte e três. Era a sua altura de namoriscar. O namorar daquela altura era um acto verdadeiramente solene. Fazia-se à porta da rapariga (não havia autorização para muito mais), sempre em dias determinados, designadamente aos domingos à tarde (e quem especialmente neste dia não aparecesse o povo logo comentava – deve ter outra). Recordo isto, para enquadrar a época em que viveu e para contar que, num domingo desses, era verão, namoriscava ele e a sua futura esposa, sentados, cada um em seu banco, à porta de minha casa (para aproveitar a sombra) mesmo em frente à casa dela. Estava ele a entreter-se a fazer palavras cruzadas (sinónimo já naquela altura da sua vertente intelectual para as palavras e dizeres). Naquele instante estava a faltar-lhe a palavra chave para completar o puzzle. Caminho estreito com seis letras, perguntou em voz alta. Ao passar, recordo-me,


atirei para o ar, "vereda" (há ocasiões que disparamos e acertamos à 1ª). Ele ficou a olhar. É isso, disse. São momentos que nos ficam em memória. Da boa memória doutros tempos. Vem isto a “talhe de fouce” para recordarmos que, de facto, o caminho que nos conduz, é estreito, condiciona e limita a vida humana, especialmente quando as doenças são graves, como esta que padeceu nos seus últimos meses. Falando do seu percurso de vida, recordamos um homem sempre respeitador e sociável. Do sentimento "detestar", verdadeiramente, só lhe dei conta quando sentia injustiças. Das atividades gráficas fez a sua vida profissional. Como hobbies, lia, escrevia, colecionava, desenhava, pintava. Como intelectual, era de gosto refinado, conhecedor e admirador do maior (leia-se melhor) poeta de que há memória - Fernando Pessoa. Das suas paixões, direi do "Quim Carneiro" que, apesar da sua forma discreta, era notório "depositar" na família (nomeadamente na esposa Fernanda a quem apelidava no período da doença da sua melhor enfermeira, nos filhos Vitor e Susana e na neta Carlota), a prioridade das suas opções de coração. Por último, a parte humorística do Quim. Adorava estar em grupo, criar bom ambiente, rir, fazer rir e espalhar bom humor à sua volta. É com saudade que

recordo férias algarvias, em campismo selvagem, na sua companhia. Até o seu frágil esqueleto lhe servia para se rir e fazer-nos rir. Aquelas corridas em bicos de pé para "testar" a água do mar eram, simplesmente, inimitáveis. Eu diria, só comparáveis às que vi, em fato de banho, no cinema português, pelo Ribeirinho (com quem tinha algumas parecenças). Recordo, também, falando desta parte humorística, já nos seus últimos meses de vida, período em que a doença o perturbava imenso (mesmo assim conseguia ter ironia e arranjar motivos para sorrir). Recordo, dizia, no átrio da igreja da Misericórdia, aquando duma cerimónia fúnebre, em grupo, alguém lhe disse "Oh Quim há quanto tempo não te via, só nestas infelizes ocasiões a gente se vê", pois, respondeu "a semana passada a minha família da Maia disse-me o mesmo e eu disse-lhes" ide morrendo que eu vou aparecendo". Citando o seu (e nosso) poeta preferido: "Somos morte. Isto, que consideramos vida, é o sono da vida real, a morte do que verdadeiramente somos. Os mortos nascem, não morrem" – fim de citação. De facto, os mortos não levam, deixam. O “Quim” deixou grandes saudades. É a minha singela homenagem.

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IN MEMORIAM DE JOAQUIM CARNEIRO Alexandra M. Sousa Tão simples e tão bonito Silencioso, mas muito presente Discrição… sem nada que lhe compare Uma educação inigualável Humor muito bem colocado Resistente, sem palavras amargas Inspirador de um respeito muito especial Amigo… muito amigo E o vazio que fica? Ui, quando assim é… que vazio que fica! Uma sensação que vem bem do centro do coração, que fica aberto A lembrança, inevitável, daquele dia em que não pudemos ficar mais tempo A lembrança daquele dia em que… era tarde demais O fim chegara As nossas recordações, que julgávamos tão únicas, são afinal partilhadas por tanta gente que, como nós, naquele dia último estava ali, só porque estava, e estava apenas. 170

Numa cerimónia que permitiu reflectir sobre o que fazemos, com quem estamos, o que deixamos quando partimos Muito… Para mim, deste pouco tempo, ficou muito O fim não chegou porque permanece em nós Quando assim é não partimos… ficamos para sempre

Obrigada Sr. Carneiro.


Ao J. Carneiro O dia em que morreste amanheceu triste … As nuvens choraram a tua perda e aquele pássaro de luz não cantou na minha janela Estamos mais pobres e mais sós Porque partiste… Perdemos todos aquele sorriso franco e alegre que relativizava as barreiras e fossos que Imaginamos para nós

ES.

E com a palavra saudade o pesar da sua partida, pois, ele ainda tinha mais para dar à terra que o acolheu com estima. Como a vida não é eterna, aqui lhe presto esta homenagem "in memoriam" Para ti amigo Joaquim; Neste dia de eterna saudade; Porque a vida é mesmo assim; Com tristeza fica a saudade; Saudade de partires tão cedo, Desta terra dos mortais. Por isso não tenhamos medo, Porque na morte somos todos iguais.

José Moreira 171


Visita da Associação Fernando Pessoa: Dª Manuela Nogueira, Dª Isabel Morteira França, Miguel Roza, César Máximo, Orlando Silva, Dª Fernanda Campos e Vitor Belém. Joaquim Carneiro presente atrás da máquina.

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Do que já passou e do que já se viveu, as memórias são o que de mais genuíno fica. E, curioso, é que essa selecção de memórias não é de todo aleatória, mas construída pela intensidade e emoções de cada momento.

Agradeço ao Quim Carneiro pelas recordações de gargalhadas de infância que tenho! Diana Portela

O meu Mestre Joaquim Carneiro O meu Mestre Joaquim Carneiro deixou-nos esta semana. Foi com ele que dei os meus primeiros passos nas artes gráficas. Tudo o que sei aprendi com ele, graças à sua enorme generosidade. Numa época em que não existiam computadores (como os conhecemos hoje...) ele, com a sua arte, revolucionou a comunicação gráfica. Exímio gráfico e brilhante designer, influenciou tendências e gerações. De trato fácil, com uma vastíssima cultura, de piada inteligente e oportuna, cativante conversador,

granjeou para ele o respeito e admiração de todos. Por mim, permanecerá vivo na minha memória e será recordado com enorme saudade e gratidão. Que a comunidade lhe faça o devido e merecido reconhecimento. “Fazer mal dá mais trabalho do que fazer bem porque, depois, temos de fazer tudo outra vez”... A sua máxima. O meu esforço diário em o seguir.

Tó Pedro 173


IN MEMORIAM DE JOAQUIM CARNEIRO

Se fechar os olhos, consigo ver o teu sorriso contagiante. De cigarro na mão, emprestas-me o isqueiro para acender o meu. Brindámos um copo de vinho e contas uma das tuas anedotas. Despertas-me uma sensação genuína de bem estar. Assisti de perto o homem apaixonado e amigo leal que és, mas não conheço as tuas paixões, os teus gostos, as tuas crenças. Conhecemo-nos desde que me lembro de mim, e está-me gravado na memória a tua eterna boa disposição. Os momentos que tivemos juntos foram, apesar de muito breves, suficientemente intensos para sentir falta.

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Tivemos conversas sobre os mais variados temas, e terminavas sempre com o teu humor, cunho pessoal, que relativizava até o assunto mais complexo. Era impossível estar na tua presença sem um sorriso rasgado contagiante, como se nada fosse realmente necessário/importante para conquistar a nossa paz pessoal. E não terás tu razão, caro amigo? Um abraço, igual ao de tantos outros e até um dia destes. Rafael Portela da Silva


In memoriam do amigo Joaquim Carneiro Naquele cansado olhar de espanto, Olhos fixos nos fitos meus, O treslido dos enigmas do castelo Três vezes me confessou.

Sem o labor dele E da alma mater da Laf Taurus e símbolo em coordenada oculto, No Belo adormecido Se manteria sepulto. Noé Oliveira Bernardes Cortegaça, 06 de Maio de 2015

Joaquim Carneiro Que poderei eu dizer senão repetir o que toda a gente sabe de Joaquim Carneiro: o artista que utilizava o seu dom não com espírito comercial, mas para nos mostrar o que não conseguimos percepcionar. Conheci o JC em 1980, através do comum amigo Dr. Celestino Portela, para lhe apresentar a “encomenda” de um ex-libris que identificasse a minha costela feirense e a minha actividade forense, o qual se destinava aos livros que, então jovem e sonhador, iriam acompanharme e compor, na medida das possibilidades, a minha desejada biblioteca. Reparei na sua dedicação ao espírito feirense, manifestado de imediato na definição do esboço do desenho e no prazer sentido no que iria fazer: vincar o Castelo através das janelas do meu escritório. Se bem o pensou, melhor o concretizou: foi o Mestre Joaquim Carneiro que expressou a arte no meu ex-libris, que ainda serve de escolha e referência para, com vaidade e orgulho, me representar. Não conheci o fervoroso e militante Joaquim Carneiro dos ideais revolucionários de Abril de 1974, mas conheci esta militância imbuída das utopias progressistas através

das suas recordações, acompanhadas de sonoras e prolongadas gargalhadas. Conheci e acompanhei o Joaquim Carneiro na LAF Liga dos Amigos da Feira, desde a sua fundação até ao dia em que não superou a morte. É na LAF que JC liberta a sua expressão artística de espírito feirense, presente em todas as suas manifestações e eventos culturais e artísticos, em especial assumindo a responsabilidade de imagem e design da sua Revista VILLA da FEIRA. Empenhado na cidadania e nos valores democráticos, respeitado pela comunidade no seu carácter e na sua obra, com a sua morte fica mais pobre a LAF, o espírito feirense perde uma figura dedicada, uma referência incontornável para as gerações mais novas. O destino, a natureza, a morte podem-nos tirar a presença do Joaquim Carneiro, mas não me podem tirar a circunstância de ter sido seu amigo e companheiro feirense.

Alberto Camboa

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J.Carneiro e Fernando Leão, presidente da União de Freguesias de Santa Maria da Feira, Sanfins, Travanca e Espargo.

Em Espinho no encontro da Via larga com a Via reduzida na linha do Val Vouga.

Anthero Monteiro e Executivo Laf na BIblioteca Municipal.

Com o Historiador Roberto Carlos.

Celestino Portela, António Gil Ferreira Soares, Joaquim Carneiro, e Gaspar Cardoso da Costa em A Vêr o Sol.

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Homenagem a António Joaquim e Domitília de Carvalho.


Singela Homenagem É tarefa ingrata, mas um dever prestar esta singela homenagem ao Sr. Joaquim Carneiro, que terminou a passagem por este mundo. O Mestre Joaquim Carneiro deixa um vasto repertório de trabalhos para memória futura. Tivemos o privilégio de privar e aprender com ele, ensinou-nos que a qualidade do trabalho está na perfeição, porque se assim não for, todo o tempo gasto terá sido em vão. O tempo do mestre Quim Carneiro, como era conhecido também, não foi vivido em vão, serviu e engrandeceu a nossa cidade com os seus trabalhos, a sua arte e conhecimentos. Foi um devoto da obra de Fernando Pessoa, que o inspirou em diversos trabalhos. Com certeza muito mais será dito sobre a sua vida, a nós resta-nos como homenagem agradecer tudo que nos ensinou. Obrigado.

António Madureira José correia

Despedimo-nos com um poema de Fernando Pessoa.

A Morte Chega Cedo A morte chega cedo, Pois breve é toda vida O instante é o arremedo De uma coisa perdida. O amor foi começado, O ideal não acabou, E quem tenha alcançado Não sabe o que alcançou. E tudo isto a morte Risca por não estar certo No caderno da sorte Que Deus deixou aberto. Fernando Pessoa, in 'Cancioneiro'

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A presença… na ausência! Poderia começar este artigo de inúmeras formas… tantas quantas as características multifacetadas de Joaquim Carneiro ou a plêiade de acontecimentos nos quais colaborou e esteve presente. Mas começo exatamente por apresentar uma foto onde Joaquim Carneiro está ausente… mas está presente, por trás da máquina fotográfica que capta o momento para a posteridade. Esta é uma característica de Joaquim Carneiro: a disponibilidade desinteressada que se revelava na dificuldade de conseguir uma fotografia…provavelmente porque considerava que mais que uma imagem junto de alguém ou uma “selfie” o que importava era a relação de amizade que se estabelecia. Essa é a Fotografia que perdura no tempo! Convivi com ele, regularmente, no grupo dos quatro que era de três…Unia-nos a singularidade do algarismo das unidades dos nossos anos de nascimento – 4. E com diferenças de 10, 20 e 30 anos falávamos do presente, olhando o passado e construindo o futuro. Unia-nos a amizade, os princípios, aquilo que acreditávamos, o que desejávamos e mesmo aquilo que discutíamos ou discordávamos… Para esta nossa amizade de um artista gráfico, de um advogado e de um professor era irrelevante os cursos, as habilitações, as famílias, a política… A amizade radica sempre na condição básica e comum a todos: a singularidade única e fundamental de Ser(mos) Humano e de aprendermos uns com os outros! À mesa ou em viagem, delineavam-se os assuntos da Villa da Feira, entremeados por recordações do passado, da Vila da Feira dos anos 50 e 60. Do convívio, surgiam ideias, temas e trabalhos para a revista, enquanto a noite e a amizade avançava. Falava-se dos livros, de peças de colecionismo e de banalidades…de acontecimentos vividos que viraram história. Às vezes dizia: 178

- Vou até lá fora… ver o tempo…volto já! E fumava…cá fora, muitas vezes ao frio do inverno porque era incapaz de obrigar os outros a partilhar o “seu” fumo… Sempre o apreciei por este pequeno gesto revelador da grandiosidade de caráter do Joaquim Carneiro. Era incapaz de prejudicar o seu próximo mesmo sabendo que os restantes não fumadores eram capazes de permitir que fumasse na sua presença pela grande amizade que os unia. A sua verdadeira dignidade obrigava-o a ausentar-se sabendo que não era necessário! Ausente da mesa…presente na sala, no convívio. Continuávamos a falar e quando regressava, depois de terminar o cigarro, tudo era igual. Não era a sua saída momentânea que apagava a amizade…a pessoa, a alegria…a sua presença não se esfumava! Hoje, continuamos a falar, em estilo coloquial, porque o Joaquim Carneiro está presente!...embora ausente… Presente nos seus artigos com que colaborou para a LAF e que podemos ler na revista Villa da Feira… Presente nas suas medalhas, postais, quadros, trabalhos gráficos… Presente nas conversas, nas memórias e histórias…. Presente no coração de quem com ele priva...neste preciso momento! Presente quando tocamos nas revistas, nas medalhas… Envolvia a LAF e a LAF envolveu-o em azul celeste! Os trabalhos, as memórias, a família e os amigos, conservam a sua identidade e, por isso, mantê-lo-ão connosco! E tal como ele referiu “A morte e a vida continuam…”

J. M. Costa e Silva


JOAQUIM CARNEIRO – UM ARTISTA – UM AMIGO Tive o prazer de conhecer Joaquim Carneiro já lá vão mais de uma trintena de anos, quando nos conhecemos nas nossas andanças filatélicas, nas grandes exposições filatélicas internacionais como o foram a IBEROAMERICANA, a IBEREX e as nacionais INTERPOR, realizadas em Santa Maria da Feira. Que recordações inolvidáveis mantemos das muitas realizações levadas a cabo em Santa Maria da Feira, onde conhecemos várias pessoas, que admiramos, respeitamos e que criamos laços de profunda amizade. Neste momento, não podemos esquecer, entre outros: Dr. Celestino Portela, distinto advogado, Alfredo Henriques, que foi durante muitos anos um estupendo Presidente de Câmara, José Manuel Leão, Vereador da Cultura da Câmara e depois Governador Civil de Aveiro, que sempre e incondicionalmente confiou em nós, assim como outro entusiasta coleccionador António Luís Carneiro. Estava neste naipe de personalidades Joaquim Carneiro, um artista, competentíssimo designer de muitas dezenas de livros. Com ele publiquei largas dezenas de títulos. Foram todas as publicações das exposições filatélicas, que com arte e um amor inolvidáveis pelo coleccionismo, o levou a idealizar autênticas obras de arte tipográficas. Depois foram as publicações editadas pela Câmara Municipal da Maia, umas trinta, desde a estupenda colecção das Actas dos Congressos e Colóquios levados a efeito pela autarquia maiata, pela colecção Cadernos do Mosteiro e muitas outras que perpectuam o nome de Joaquim Carneiro. Joaquim Carneiro ia sempre procurando e inventando algo para ilustrar e valorizar as publicações. Que saudades temos dos momentos muito agradáveis que passamos juntos, e muito especialmente as visitas gastronómicas que fizemos a casa do Dr. Celestino Portela.

Também foi ele que preparou os três livros "Vultos da Filatelia" que publicamos em homenagem a filatelistas ilustres. Mas Joaquim Carneiro foi também nosso Amigo e Confrade em muitas actividades das Confrarias Gastronómicas. Foi ele, que praticamente elaborou todos os programas das cerimónias de entronização da Confraria da Broa de Avintes, assim como editou todos os livros editados relativamente aos Forum Avintense e Concursos das Quadras à Broa de Avintes, preciosidades etnográficas, que definem a cultura Avintense. Mas para além de um Artista, com A grande, foi um Amigo, capaz de abrir o seu coração, e que tinha um carinho muito especial para com todos aqueles que tiveram o prazer de o conhecer e trabalhar com ele. Muito preocupado com os seus amigos, estava sempre disposto a colaborar nas mais diversas iniciativas. Joaquim Carneiro não desapareceu, o Artista e o Amigo perpetuam-se, está permanentemente entre nós, pelo que a sua obra ficou e com ela a sua Marca.

Paulo Sá Machado Maio de 2015

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IN MEMORIAM JOAQUIM CARNEIRO Faleceu aos 70 ano, vítima de doença prolongada, o Mestre Joaquim Carneiro, conhecido entre as pessoas amigas por Quim Carneiro. Homem ligado às artes, desde cedo foi colaborador do Centro de Cultura e Recreio do Orfeão da Feira,do Rotary Club da Feira, da Santa Casa da Misericórdia, da Confraria da Fogaça, do Clube Feirense - Associação Cultural, da Confraria da Broa de Avintes, e membro destacado do executivo da Liga dos Amigos da Feira. Amante da Vida e Obra de Fernando Pessoa foi um destacado colecionador, reunindo brilhantes coleções nas áreas da filatelia, numismática e medalhística, deixando também gravado a letras de ouro o seu nome em diversas obras artísticas. Deixou imensas pinturas, tal como medalhas, brochuras, revistas e cartazes, bem como imensos artigos publicados na imprensa local, em particular na Revista Villa da Feira. O funeral realizou-se no passado dia 02 de Março, da Igreja da Misericórdia, onde esteve em câmara ardente, e daí seguiu a inumar no cemitério da cidade.

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Como escreveu Fernando Pessoa no Cancioneiro A Morte Chega Cedo A morte chega cedo, Pois breve é toda vida O instante é o arremedo De uma coisa perdida. O amor foi começado, O ideal não acabou, E quem tenha alcançado Não sabe o que alcançou. E tudo isto a morte Risca por não estar certo No caderno da sorte Que Deus deixou aberto. Até sempre Amigo Quim Carneiro, Roberto Carlos Reis.


O DESIGNER Joaquim Carneiro. O ARTISTA. As IMPRESSÕES Primeiras.

Se desenhava bem.. Tão bem o fazia! Como ninguém! Duma forma tão igual a alguém que conheceu e o tinha na Intimidade. O rosto simples, na opção ínsita de António Joaquim no Seu Pintar de Almas [Revista Sol Nascente – Junho de 2001- Ano 6/N.º Especial]. Seu Mestre, também. Olhavam-se, simplesmente se reviam. Que posso retratar mais: Que, afinal, tarde o conheci e dava de escala, por hábito são, sempre a Voz a Doutor Celestino Portela, a quem sempre tratava por ´Senhor Doutor`. Não alvitrava [não gostava, nem queria, mas sabia! o que queria], emudecia; calado, como se estivesse sentido. SIMPLES O ERA. E, não obstante, Sua Discrição, Sua Pureza DESENHAVA. Seu lápis o entretecia como um rio, um fluido, criativo, por assim dizer doce e bom, Simples, Claro e Pleno, não mais. Nenhum toque mais. Parado RECRIAVA! Da 1.ª vez que o vi, era EU um NOVO. Produzia calado, o que de pronto via?! [empilhar os livros de Viúvo para uma Biblioteca de Juventude, na V. Feira; assim, daquela vez]. Ajudava, sim; para Mim quase emudecia. Eu era Novo, migrado seria?.... E foi outrossim a forma como o conheci! - Mesmo à mesa do Aires, em Terras da Palhavã, meditava ainda. Impressionou-me que fumava, saborosamente melhor do que o prato, que a todos apetecia depois do esforço, para carregar os livros na carrinha de C. Maia. Será ISTO Lisboa?! Porventura, que o pensaria?! Sim. Sem dúvida, Seu Espírito Feirense o serenava, lho dizia: “ F. Pessoa fez de Lisboa uma Aldeia!” Em cartolina amarela, ou nas cruzadas duma tela, não se mostrava. Desenhava, só. Criava Simples, o resto para quê?! E entendia que, NA VILA, o Espírito que nos sobra ou que nos ronda, não sonhava, CONVIVIA! De um quotidiano de pôr os “pontos nos ii”. Com Beleza e com Bondade. Simples e Só.

De uma Outra Vez. À MESA, de A-Ver-O-SOL. No acordeão e na harmonia, no sabor prazenteiro e caloroso de Um cantarmos Todos o Sacrifício Tenaz do Manjar do GALO da CERCA, daquela Casa, tão anfitriã! Quiçá, para Joaquim Carneiro UMA CASA-JARDIM! Bisava, suas nuances, ao que o Outro asseverava ou diria. Bisava, de seu feitio, não se atrevia a criar, sua própria poesia. Que pensava e meditava e se sorria, sinal evidente que mais não queria. Bisava a Conversa. O mais ficava para o Desenho. Na Gráfica, na Ilustração, Na Criação significativa e de risco transparente, com cor. Sumia-se, estando sempre; convivendo e alegrando, participativo, antes, participando, talvez que por Aí estivesse SEU GÈNIO. Sombras (no tabaco) e luz. Espírito Altaneiro e Castelar. CASTELO E MAR. E perguntei-lhe: por que mudou a côr da Revista? A Revista, de Santa Maria. Citando O poeta respondeu-me “…e o Mar não é azul.” Quanto tempo demoraria a Sua Ideia…. Seu subconsciente traduzia impressão ou realidade de um GRAFIS NOVO… [ORPHEU 2 – 1915-2015, na B.N.L., “…não acabou, mas continuou!”]. Por sinal, inapagável. Sem curvas e arestas. Sem atrito. Coyrights de Vida. Em Animação; ou se quisermos, mas Todos, Ânimos Cheios de Vida. Aliás, havia apanhado do Seu Mestre, de quem era Excelso Admirador, A CÔR dos Outonos da Vida, das Meninas da Péla, no Parque a brincar, por assim dizer, os minaretes de um CasteLinho. E de MAR. Que direi….. Elogios, não. Lisonja, de forma nenhuma. Não lhe cabiam, nem o condimentavam. Suas Experiências – Seu Manifesto Traço Empírico – eram Suas Intimidades. Externalidades não lhe traziam COR. Mesmo que de fora surgissem “de caminhos longos”, “….de longe e de longa distância”. E … apesar de tudo e de todos, no fim, levou-me a Espinho, no Seu Carro.

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A última vez – é a PRIMEIRA. Grato e impressionado pela sua Bondosa Amabilidade. Que digo BONDADE, perguntei a Meu Primo Muito Amigo e Confidete, Dr. Carlos Moreira, “dizme cá quem é Joaquim Carneiro?!”. Emoldorou-mo, deu-lhe um encaste que mo enterneceu; sua descrição, por inteiro, DE UMA SIMPATIA DE CORPO E DE RAIZ, como os DA FEIRA. Não precisava de mais. Fiquei-lhe com o Seu Matiz e Guardei-o, até que….. Doutor Celestino Portela, ORGANIZADO E FORMAL – quem há-de escrever Um conto, quem é?! E aonde? No sonho de Um Outro Quando? Mas Quem e O quê?!vem POR UM DIA visitar a Exposição, na Fundação Calouste Gulbenkian, de Fernando Pessoa (Homenagem a Portugal, nas Comemorações Festivas no Brasil, à Pátria-Mãe). E da Liga dos Amigos da Feira traz quem deve. Há retrato. E pede-me para os acompanhar e fazer Equipa. Nessa altura, dado O Relato e Os Encontros já eu sabia, então, de Joaquim Carneiro. E interpretei-o por esta via: para quê, realmente fugir, indagar, sentir do Azul, das Marés e dos Pincéis, a pretexto de Um Dali ou dum Picasso, de um Neorrealismo, que grassa e chateia. Combinar Almada e A. Joaquim, com o Lápis e a Cor. E fica-se de Sua Experiência, tão vivida e tão poética (e por que não…) numa Revista. Nas Revistas. [São variadas e múltiplas as Suas Colaborações e Participações. Seu desenhar]. Diria ou sequer dirá: “ de mão firme e de bom curso, meu traço risca e desenha e creio e crio o que assumo, e o que sou”. Castrejo, severo, emudecido, na sombra e no risco do maravilhoso, passou… Não. Ajustei e medi Seu Rosto e Sua Índole. Em Verdade O vi, Mui justamente O considerei. Na onda poética e de história revivida que nos trazia a Exposição, nas Hostes de um Amadeo ou de um Cavalcanti recolector, no Desenho Rosacruzista dos Heterónimos de F.Pessoa, COMIGO JOAQUIM CARNEIRO FALOU. 182

Se riu. Me instruiu, de pintores, de indícios de oiros de Suas Cores, de seu Trabalho de pertinácia, que sacrificante [que a Vida lhe deparou], das Amizades da Minha Villa de que um dia parti… E conhecia tão bem. De um Ar da Política, quase despicienda, quase … mas tão interessada. Espírito interessante, direi magnificente até, mas se não dava sumia-se. Aqui, na Gulbenkian, falei e o designer falou. Conhecia de Arte. E das Belas-Artes que as fazia, e havia também Espírito Ciente de análise crítica. Não desenhava com satírico, religiosamente NOS DESCREVIA, A TODOS, AOS SEUS AMIGOS, AO SEU EMPIRISMO DE SUAS INTIMIDADES. Se bem percebo Seu Discurso, o que nos deixa, descreve-nos Como Se PAIRASSE CONNOSCO para nos irmos entretecendo e alegrando. Simples. Pensando! (mas não futurando, ok?!). E se gostou de estar, ver e falar; e na Fundação Oriente como se interessou e exemplarmente nos apontou diferenças e contrastes que não perceberia se não tivesse O ARTISTA a meu lado. Afinal, muito redondamente, o ARTISTA não se abstinha. O Artista desde a Primeira Hora revelava Sua Simplicidade. E como um Rio. Percebeu tanto desta TERRA MÃE DE PORTUGAL que lhe cultiva O Espírito, O Castelo viçoso e altaneiro, vivaz ALEGRANDO e Motivando, Esse Espírito Quase dum Livro, cuja Patente É Nossa, nas Terras de Um Areal Imenso, de Lajes que jamais tombam (da Escultura em pedra, de JOSÉ Aurélio). Di-lo ei Viva Voz, Agora, Meu Óptimo Amigo, Doutor Celestino Portela: “ O Castelo não caiu, o Castello da Villa não cairá” (entanto, in “ UM LIVRO, nas Comemorações do Vigésimo aniversário da Fundação da L.A.F., em 8 de Março de 2003).

Gaspar Cardoso da Costa. Quaresma de 2015.


E agora Joaquim? Nasceu no dia 12 de Julho de 1944 e morreu no dia 01 de Março de 2015. “ Entre uma e outra todos os dias são meus”, disse F.P. Entre uma e outra data o Poeta viveu para a sua obra, que nos deixou para ler, admirar, estudar, repartir, divulgar, espalhar, divertir, divertir… Contigo todos esses dias pertencem à tua mãe, irmão e dedicadas irmãs, à Dª Maria Fernanda, Vitor e Susana, à Carlota, neta querida, familiares, amigos, admiradores, mesmo que desconhecidos… Depois de ouvir um poema dito junto de ti, de ver o teu corpo descer à cova e serem lançados alguns punhados de terra fomos regressando… E no meu espírito, com insistência, aqueles versos tantas vezes ditos; “ A morte é a curva da estrada, Morrer é só não ser visto”. Em casa peguei na nossa Revista, o nº. 28, onde está o retrato que pintaste, em sanguínea, do Padre Domingos Azevedo Moreira, que tem no canto inferior esquerdo a tua assinatura e “Maio 2011”. A tua Homenagem àquele sacerdote, para ser capa da revista em que evocamos o nosso querido, dedicado e sábio colaborador campeão, falecido no dia 10 de Janeiro desse ano. Folheei a revista e deparo na página 229 o teu retrato pintado pelo nosso Mestre António Joaquim em 2000, que to ofereceu como mostra a dedicatória que nele escreveu. Reparo agora como o Mestre agarrou o teu sorriso maroto, grande artista, que muito te admira, que gosta muito de ti. Logo a seguir vejo-te em dezenas de medalhas que desenhaste para o Concelho e das quais destaco; Centro de Cultura e Recreio do Orfeão da Feira/ Liga dos Amigos da Feira/Comissão de Vigilância do Castelo da Feira/Rotary Clube da Feira/ Comissão Organizadora

da Homenagem a Marcolino Castro/ Comissão dos Dragões da Feira para a Homenagem ao Futebol Clube do Porto/ Câmara Municipal – Semana Cultural 1987/ Clube de Caça e Pesca da Feira/ Câmara Municipal – 1º Encontro de Autarcas do Concelho/ Câmara Municipal – 1ª Jornadas de Estudo sobre Terras da Feira/ Centenário do Nascimento de Fernando Pessoa / S. João de Vêr – Elevação a Vila/ Clube Desportivo Feirense/ Congregação dos Padres Passionistas/ Família Santiago/ 250 anos da Igreja de S.Jorge / Escola de Música de Espargo/ 6ª volta ao Concelho da Feira/ Lyoes Clube de Santa Maria – IV Convenção/ Casa da Gaia – Argoncilhe/ X Campeonato Europeu de Hóquei em Campo/ Externato de Santa Maria – cinquentenário/ Associação de Pais do Centro Infantil/ E agora Joaquim? Como bem sabemos, desde o nº. 1, a Villa da Feira continua…até um dia ! Mas ela ficará sempre como presença viva das tuas ideias, criatividade, paixão, amor, dedicação … Os deuses foram teus amigos, deram-te o tempo necessário para isso, tudo arrumadinho no computador e na Arca. Diz ao Fernando que não tenha razão. Estás bem visível nas criações artísticas que deixaste. Estás mais vivo do que julgas. Venceste a morte.

Celestino Portela

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Tributo* António Madureira**

Era verão quando nasceste o sol rompeu a madrugada na aurora afã de cada dia de mão dada com a emoção, viveste plantaste alegria com o olhar agitaste a essência das cores e da razão pintaste, com enlevo o sonho que não se adia e partiste "hoje" lado a lado com "Pessoa" descansas na planície da serenidade E o silêncio encheu-se com a tua alma, de primavera. *Homenagem ao mestre Quim Carneiro.

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** Nasceu em 1963 na freguesia de Massarelos, Porto. Atualmente reside e exerce a sua atividade profissional em Santa Maria da Feira. Tem alguns poemas publicados no livro "Poesia sem Gavetas" da Editora Pastelaria Studios de Lisboa. Abril 2013 - http://youtu.be/7risFbzNNV8 Antologia "UNiversus de Poesia" da Editora Universus de Lisboa. Dezembro 2014 https://www.youtube.com/watch?v=9cVze3cgkrl


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