Unipautas nº 04 (2014/2)

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No foco, a História PORTO ALEGRE/RS SEMESTRE 2014/2 ANO II • NÚMERO 4

Do golpe à redemocratização, os principais fatos políticos dos últimos 60 anos pela lente do experiente fotógrafo Ricardo Chaves, o Kadão. central AGÊNCIA UEL DE NOTÍCIAS

JORNAL DA FACULDADE DE COMUNICAÇÃO SOCIAL DA UNIRITTER

Vinte e quatro anos depois de os carapintadas saírem às ruas para pedir o impeachment do presidente, como o cinema e a música influenciam a política. O voto ao longo das décadas e os dilemas da lei eleitoral brasileira, uma das mais modernas do mundo.

1992

O Brasil de duas gerações JORGE AGUIAR

2013

O que ficou dos protestos de junho e julho? O que pensam os jovens que saíram às ruas no ano passado para pedir saúde e educação padrão Fifa, quem faz política no seu dia a dia e uma semana para discutir o jornalismo e a democracia.

RICARDO CHAVES

Em que pé está a nossa democracia?


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Expediente O Jornal UniPautas é um projeto da Faculdades de Comunicação Social (FACS) do Centro Universitário Ritter dos Reis – UniRitter/Laureate International Universities. Este é um espaço de divulgação do material produzido nos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda. Seu projeto gráfico foi desenvolvido pelos designers e professores Sandro Fetter e Jaire Passos. UniRitter / Laureate International Universities Campus Porto Alegre: Rua Orfanotrófio, 555• Alto Teresópolis • Porto Alegre/RS CEP 90840-440 • Fones: (51) 3230.3333 | (51) 3027.7300 Campus Canoas: Rua Santos Dumont, 888 • Niterói • Canoas/RS • CEP 92120-110 Fones: (51) 3464.2000 | (51) 3032.6000 Reitor: Telmo Rudi Frantz Chanceler: Flávio D’Almeida Reis Pró-Reitora de Graduação: Laura Coradini Frantz Pró-Reitora de Pesquisa, Pós-graduação e Extensão: Márcia Santana Fernandes Coordenação do curso de Jornalismo: Laura Glüer Coordenação do curso de Publicidade e Propaganda: Sônia Zardenunes Unipautas Edição: Laura Glüer Rodrigo Lopes Projeto Gráfico: Jaire Passos Rogério Grilho Sandro Fetter Diagramação: Alunos do Projeto Experimental Jornal Supervisão diagramação: Rogério Grilho Supervisão fotográfica: Rogério Soares Professores envolvidos: Rogério Grilho (Projeto Experimental Jornal), Rodrigo Lopes (Redação Jornalística), Rogério Soares (Fotografia) e Ana Carolina Trava Dutra (Criação Publicitária) Fale conosco: unipautas@uniritter.edu.br www.unipautas.uniritter.edu.br issuu.com/unipautas

APRESENTAÇÃO/ARTIGO A cobertura de um semestre eletrizante A

cobertura de um processo eleitoral, seja em nível estadual ou federal, é um dos momentos mais eletrizantes da atividade jornalística. Tudo pode acontecer e ali se experimentam todos os desafios contemporâneos do jornalismo: a apuração e a edição respeitando os critérios de noticiabilidade, a profissionalização das assessorias, a preparação das fontes. Neste semestre, nossos alunos de Projeto Experimental Jornal sentiram na pele como é viver uma cobertura eleitoral. Entrevistaram pessoas de diferentes partidos, acompanharam os debates, viveram a movimentação das ruas. Isso certamente dará a eles uma experiência ímpar em sua formação como futuros jornalistas. Mais uma vez, Unipautas cumpre sua função de ser um jornal laboratório temático, de caráter local, mas sem perder o olhar sistêmico. O destino do nosso país e Estado nos próximos quatro anos foi

observado com atenção pelos acadêmicos do terceiro semestre, discutido a partir da visão de diferentes fontes, como deve fazer o bom jornalismo. Os jovens que foram as ruas em 2013 foram ouvidos, seus sonhos, crenças e descréditos. Também foi feita ampla cobertura da Semana de Jornalismo Político que abriu o semestre 2014/2, com a presença de grandes jornalistas de veículo e assessoria, na área política. Nossos alunos deram exemplo de como se faz este bom jornalismo, em um semestre em que não foram raros os momentos em que a grande imprensa cometeu desvios éticos, na cobertura e veiculação de notícias envolvendo partidos e candidatos. Por outro lado, um semestre também em que a liberdade de imprensa foi colocada à prova e, mais do que nunca, teve de ser defendida. Parabéns ao professor Rodrigo Lopes, que trouxe sua larga experiência

editorial na imprensa gaúcha para desafiar os alunos na construção das pautas. Parabéns também ao professor Rogério Grilho, jornalista com mais de 20 anos de experiência na diagramação de jornais e revistas, que mostrou aos alunos a arte de planejar e executar as páginas de uma edição de jornal. E, sobretudo, parabéns aos alunos que se envolveram nesta proposta. Uma turma pequena, porém pró-ativa, inovadora, sem medo de desafios. “Vamos fazer dois jornais neste semestre”, indaguei a turma, lá no início de agosto. Eles se olharam e não hesitaram em responder: ”sim”. Em breve, esta mesma turma terá uma segunda edição, com nova cobertura de fatos importantes deste agitado e inesquecível 2014. Vamos em frente, cultivando sempre o bom jornalismo. Laura Gluer Coordenadora do curso de Jornalismo

A democracia nossa de cada dia

S

aímos de um longo, desgastante e renhido processo eleitoral. Temos um novo governador e presidente reeleita. O Rio Grande do Sul cumpriu sua tradição de não reeleger o mandatário do Estado. Em nível federal, os eleitores deram mais quatro anos à atual presidente. Nós, eleitores, não saímos do pleito ilesos: tivemos um presidenciável morto em uma tragédia aérea, debates pouco propositivos e muita baixaria. Nas disputas regionais, uma avalanche de candidatos desconhecidos do público disputando a tapas milésimos de segundos no horário político no rádio e na TV. Bom para quem já é conhecido. E aí levam a melhor atores e atrizes, ex-jogadores de futebol e palhaços. Com larga vantagem de votos.

Bate-bocas de campanha, candidatos de ocasião ou vazios de propostas. Isso você não encontrará nesta edição do UniPautas. Produzido pelos estudantes de Jornalismo da disciplina de Redação I – Ênfase em Jornal Impresso, a publicação que você tem em mãos foi produzida com o intuito de mostrar a política muito além das eleições: aquela que é feita no condomínio, no grêmio estudantil, no cinema, na música, no fotojornalismo, nas ruas, nas ideias. Durante este semestre, a UniRitter rea­ lizou um Painel de Jornalismo Avançado, que serviu como pauta e como ponto de partida para discussões como lei eleitoral, reportagem política, História – afinal, o Brasil lembra, com feridas ainda abertas,

os 50 anos do golpe de 1964. Neste semestre, a UniRitter também estreou uma disciplina dedicada especificamente ao Jornalismo Político – algo raro nas faculdades de Jornalismo país afora. O que ficou dos protestos de junho do ano passado? Com esta pergunta ecoando aos nossos ouvidos, produzimos um jornal que tem como tema a democracia. Afinal, ela não se faz presente apenas na urna, a cada dois anos, ou nas ruas, de vez em quando. Faz, ou deveria fazer, parte de todos os nossos dias. Boa leitura! Rodrigo Lopes, professor

Reforma política, uma exigência da cidadania N ão há mais possibilidade de contornar temas aflitivos que despertam indignação tanto na sociedade quanto na classe política. A sucessão de comissões, grupos de trabalho e adiamentos, legislatura após legislatura, a par do desperdício, impulsiona a sensação de que o desfecho pretendido jamais será alcançado. Se a um ângulo a constante exposição da matéria converteu a reforma política numa espécie de fetiche, souvenir de campanha eleitoral ou redenção ética de cunho salvacionista, a outro é leviano supor que a sua aprovação funcionará como um antídoto capaz de eliminar todas as mazelas públicas que vicejam no país. Reforma política não significa somente a necessidade de alteração, mas de evolução nos mecanismos de acesso e desempenho de mandatos. A sistemática atual, defasada, exige recomposição para viabilizar o resgate da política como atividade digna e respeitável, hoje em profundo desalento. Esta necessidade é inadiável

porque as relações entre candidatos, partidos e mandatos estão num processo de saturamento que beira a hipertrofia. Conforme apontam estudos e análises, nenhuma alteração preconizada encerra solução definitiva. Há um regime de interdependência entre itens como financiamento de campanha, horário eleitoral, votação em lista, etc. Até porque, uma modificação integral jamais será executada, seja porque as resistências são muito sólidas, seja porque algumas propostas são incompatíveis com a realidade brasileira. No entanto, os projetos e as comissões que são formadas para “estudá-los” não estabelecem as necessárias conexões. A isso, some-se a desproporcionalidade nas representações estaduais junto ao Congresso Nacional, uma anomalia histórica tolerada décadas a fio sem qualquer esboço de reação. Indiferentes às tímidas e frustradas tentativas de ajuste ou correção, os 20 Estados que formam as regiões Norte (7), Nordeste (9) e Centro-Oeste (4), embora reunindo

menos da metade da população brasileira (43%), seguem monopolizando 74% das 81 cadeiras do Senado Federal. Na Câmara dos Deputados, a situação não é diversa quando estas mesmas bancadas controlam 50,1% das cadeiras (257), enquanto que deputados oriundos dos 7 Estados que formam as Regiões Sul (3) e Sudeste (4), sabidamente as mais industrializadas e populosas do país (IBGE), preenchem 49,9% (256). A cada legislatura, um contingente de respeitáveis e respeitados parlamentares se mobiliza visando reação a tudo isso. Contudo, eles expressam uma minoria. A reforma política é uma exigência da cidadania que depende do Congresso Nacional restaurar a sua missão precípua: legislar para a coletividade, nos termos da Constituição Federal. Antônio Augusto Mayer dos Santos Presidente da Comissão de Direito Eleitoral da OAB/RS


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POLÍTICA NAS RUAS

Lembranças e histórias de um junho que jamais será esquecido

Jéssica Kasper

O

s protestos de junho e julho de 2013 mostraram como a população de Porto Alegre se sentia. Muitos eram os motivos que levaram dezenas de pessoas de diversas faixas etárias a irem às ruas protestar por um transporte público melhor, saúde digna e menos corrupção na política. Em muitos momentos, cerca de 10 mil manifestantes se reuniam no centro da cidade, geralmente entre 17h e 18h e se deslocavam em direção às avenidas mais movimentadas de Porto

Alegre, bloqueando o trânsito com cartazes e chamando atenção de quem tentava voltar para casa. Porém, no meio de quem lutava por esses ideais, estavam aqueles que protestavam de forma diferente: levando violência e vandalismo às ruas da Capital, causando danos e depredando o patrimônio público. Mariana Catalane, 19 anos, estudante de Jornalismo da UniRitter, conta que ficou sabendo dos protestos por meio de convites nas redes sociais. Para ela, o ideal mais importante é a democracia: “Escrevi um cartaz que dizia: ‘Onde está a democracia? Queremos ver com os próprios olhos’. O foco era o valor da passagem, mas isso não foi suficiente para me levar às ruas. Pedi e gritei por democracia.” A jovem também conta que, na época, estudava no centro, e acompanhava a movimentação das escolas, que fechavam mais cedo devido aos protestos. Isso a deixava ainda mais motivada a

Participamos de uma onda de protestos nacionais que abordavam temas dos quais grande parcela da população não tem conhecimento. João Pedro Soares, estudante

ARQUIVO PESSOAL

Não havia um tema mais importante do que o outro, mas sim um conjunto de exigências da população, de responsabilidade de diferentes órgãos públicos e que atingem diversas parcelas da sociedade

grupos que queriam vandalizar. Com todo o monitoramento da polícia, alguns manifestantes não mostravam medo e seguiam em frente. Diversas pessoas sofreram danos, tiveram materiais furtados, e até mesmo sofriam ferimentos no meio dos protestos. Mais de um ano após as manifestações, a população deixa marcas de um país que pode se unir e lutar contra a impunidade e a corrupção. Preço da passagem foi origem das manifestações

Com gritos e cartazes, Mariana (E) participou dos protestos nas ruas de Porto Alegre

fazer cartazes com seus amigos e ir para as manifestações. A onda de protestos não atingiu apenas Porto Alegre. A nação se mostrava revoltada. O aumento do inconformismo dos brasileiros se multiplicou ao longo dos dias e contagiou a população. Eles reivindicavam um país com mais igualdade e menos corrupção. João Pedro Soares, 24 anos, estudante também estava nas ruas. Ele acredita que as manifestações foram desordenadas e sem objetivo central, e que

no Brasil batalhar por direitos é frustrante. “Participamos de uma onda de protestos nacionais que abordavam temas dos quais grande parcela da população não tem conhecimento de causa para tratar, Para mim, não havia um tema mais importante do que o outro, mas sim um conjunto de exigências da população, de responsabilidade de diferentes órgãos públicos e que atingem diversas parcelas da sociedade.” O que levava medo e insegurança a quem apenas queria protestar de maneira civilizada eram

Para a especialista em Ciência política, Cibele Cheron, as manifestações de junho foram voltadas ao aumento das passagens do transporte público alastrando-se pelas principais cidades brasileiras. E, com a adesão da população, outras insatisfações populares vieram à tona, entre elas a corrupção. Afirma também que o legado foi imenso pois: “as passagens de ônibus, efetivamente baixaram em diversas capitais, e os Tribunais de contas iniciaram o cálculo dos valores das passagens a partir das planilhas das empresas de ônibus.” O Brasil se manifestou, e mostrou que é possível reivindicar por direitos e mudar as leis com a voz do povo. Todo o tipo de manifesto é válido para que possamos viver na nossa sociedade sempre buscando e lutando pelos nossos direitos.


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COM A PALAVRA, OS JOVENS

Do entusiasmo do primeiro voto à descrença na classe política FOTOS AMANDA QUEVEDO/LETÍCIA ANELE

Por que o número de jovens eleitores vem diminuindo nos últimos pleitos no país Amanda Quevedo e Letícia Anele

N

o último dia 5 de outubro, mais de 140 milhões de eleitores foram às urnas. Um número alto, mas pouco se olharmos para a faixa etária de quem está estreando no voto.. Como votar é facultativo para jovens entre 16 e 17 anos, há quem prefira deixar para exercer este direito ao completar 18. O voto aos 16 foi uma conquista do movimento estudantil, incorporada à Constituição de 1988. Entre o fim da década de 1980 e o início da seguinte, estudantes e jovens, de um modo geral, demonstravam interesse na vida política nacional e o desejo de se manifestar sobre os rumos do país. Essa vontade de participar tem diminuído. O Unipautas foi até o Parque da Harmonia, em Porto Alegre, em uma tarde de sábado, conversar com alguns estudantes. A pergunta foi: Você se interessa pela política? As respostas foram quase unânimes. A maioria não tem interesse. Alguns dizem que muitos candidatos são corruptos, ou até afirmam desconhecer o assunto. Dos 12 entrevistados, três disseram gostar de política e acreditam que podem mudar o Brasil pelo voto. “Basta se interessar e fazer a diferença”, declarou um dos entrevistados.

Natália Peracchi, 17 anos, não tem título de eleitor:

Gizelly Vicente, 18 anos, professora de Inglês, tem título eleitoral:

“Meu voto não vai fazer a diferença e não vale a pena votar nos políticos. Eles falam muito e fazem pouco, os jovens querem que os políticos façam algo.”

“Estou empre na política. A partir do momento em que você está na política, você tem de fazer pelo povo, que precisa de educação.”

Jonathan Machado, 16 anos, estudante:

Lucas Mog, 17 anos, estudante:

“Não me interesso por política porque os políticos. São todos corruptos.”

“Os jovens pensam mais no individualismo, em vez de se preocupar com a igualdade e votar. Nós preferimos ficar sentados e não fazer nada.”

Matheus Ximenez, 17 anos,estudante.

“Se houvesse política social ensinada nas escolas, os jovens iriam aprender mais sobre o assunto”.

Franciele Souza, 18 anos, estudante:

“Não gostoa de política, é coisas para a pessoas mais velhas. Vou anular o meu voto.”


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Unipautas: Com a diminuição dos jovens votando, por que você acha que eles estão desmotivados? Matheus Gonçalves: O aumento na abstenção é um sintoma do distanciamento que ainda existe entre as pessoas e a política institucional e do desfavor promovido pela mídia privada que procura deslegitimar a política como vetor de transformação social para se colocar no lugar das instituições políticas,

ARQUIVO UNIPAUTAS

C

om experiência no ativismo das ruas, Matheus Gonçalves, 27 anos, vice-presidente do Conselho Estadual da Juventude do Rio Grande do Sul (Conjuve-RS), explica a relação entre política e jovens. Em entrevista ao UniPautas, ele cita Platão: “Não há nada de errado com aqueles que não gostam de política, simplesmente serão governado por aqueles que gostam”. Leia os principais trechos:

ARQUIVO UNIPAUTAS

“Quem não gosta de política será governado por quem gosta”

Milhares de brasileiros saíram às ruas em várias cidades do país contra a corrupção e exigindo saúde e educação de qualidade

Matheus Gonçalves

como representante das vontades do povo. A voz das grandes empresas de comunicação quer que o povo acredite ser ela a voz de todos(as). UniPautas: Com os índices mostrando a diminuição dos jovens votantes a cada pleito eleitoral, qual o papel do teu gabinete para melhorar estes números? Matheus: O Conselho de Juventude do Rio Grande do Sul, criado em 2013, é um

#VEMPARAURNA

Em 2010, o Brasil tinha 2,3 milhões de eleitores entre 16 e 18 anos. Em 2014, são 1,6 milhões. O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Dias Toffoli, afirma que a redução do número de jovens com título eleitoral se deve à nova metodologia no cadastro de eleitores. Agora, o TSE considera a idade do eleitor no dia da votação. Não é o único motivo. O que se percebe pela opiniões dos entrevistados para esta reportagem é que a muitos jovens não têm interesse pelo assunto, mesmo que estejam conectados à internet e às redes sociais. O TSE vem investindo em campanhas para que os jovens votem para fazer a diferença no Brasil, o movimento #vempararua, que se tornou uma frase marcante nos protestos de julho de 2013, se tornou #vemparaurna incentivando deste cedo fazer a diferença. No Facebook do TSE, há dicas de como votar, postagens de como tirar a segunda via do título de eleitor. Também é possível, no momento da eleição, acompanhar em tempo real a contagem dos votos.

espaço de proposição e fiscalização de Políticas Públicas para Juventude (PPJ). É uma ferramenta de participação composta por sociedade civil (66%) e governo (33%). Aumentando a participação dos(as) jovens e efetivando conquistas o CONJUVERS pode servir de exemplo para provar que fazer política faz diferença. Unipautas: A corrupção endêmica no país é causa desta desmotivação dos jovens em assuntos políticos ou você acredita que é uma nova tendência de reprovação aos governantes? Matheus: Acredito que são quatro os fatores que influenciam a abstenção: distanciamento proposital do povo e política para manter antigos privilégios das elites, ação da mídia para afastar as pessoas da política, eleição de políticos corruptos e indiferença de alguns, que preferem se abster do que tentar melhorar o sistema.

nosso cotidiano. Escolher entre um produto e outro, ou meio de transporte é um ato político. Pagar ou sonegar imposto é um ato político. Cuidar do que é público é um ato político. Buscar se informar com diversas fontes sobre a política, sobre fatos que nos interessam, ser participativo e ativo nos momentos políticos necessários para as demandas que nos solidarizamos é fazer política no meu entender. Nesse sentido acredito que estamos todos na política desde que nascemos. No sentido mais compreendido pelo senso comum e (calculadamente) promovido pela grande mídia, “estou” na política desde 2008, quando comecei a participar do Movimento Estudantil na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, motivado a aproveitar melhor o espaço de organização dos estudantes (Diretório Acadêmico da Comunicação - Dacom), subutilizado e negligenciado pelo grupo político que antes dirigia o diretório.

Unipautas: Há quanto tempo você está na política, como iniciou e o que te motivou a fazer parte? Matheus: Entendo e defendo que a política faz parte do

Unipautas: O que você diria para os jovens como parcela positiva do interesse e participação nos meios políticos? Matheus: “Não há nada de

errado com aqueles que não gostam de política, simplesmente serão governado por aqueles que gostam”. Foi o que disse Platão. Vale a pena participar, contribuir, construir. Pessoas bem intencionadas sempre fazem a diferença. Unipautas: Como você avalia os jovens da atualidade, traçando um comparativo do antes e depois das manifestações de junho de 2013? Matheus: Acho que os jovens estão mais politizados, pois passaram por um processo complexo, envolvendo muitos fatores, como manipulação midiática, mobilização de massa e viram que muitas pessoas, quando organizadas, podem fazer muita diferença. Unipautas: Você foi para rua pelos R$0,20 ou tinha muito mais a reivindicar naquele momento? Matheus: Assim como a maioria, fui pela transformação social, pela democracia e pelo combate à exploração do transporte público por cartéis empresariais. Deixei de participar quando verifiquei manipulação midiática e desrespeito aos princípios da democracia.

Buscar se informar com diversas fontes sobre a política, sobre fatos que nos interessam, ser participativo e ativo nos momentos políticos necessários para as demandas que nos solidarizamos é fazer política no meu entender. Matheus Gonçalves, vice-presidente do Conselho Estadual da Juventude do Rio Grande do Sul (Conjuve-RS)


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A EMENDA QUE NÃO PASSOU

1984, povo nas ruas, derrota no Congresso e vitória da democracia Paulo Nunes e Stheve Balbinotti

O

ano de 2014 não deve ser lembrado apenas pelas eleições de outubro no Brasil. Acontece também o aniversário de 30 anos do maior movimento democrático do país, as Diretas Já. Sem o movimento, o país não teria um processo de votação direto para presidente. Foi um evento marcante e contribuiu para derrubar um sistema autoritário, a ditadura militar vigente desde 1964. “As Diretas Já colocam a pá de cal na ditadura civil militar. Muitas vezes, a memória pega essa parte positiva, que é a da mobilização popular e do rechaço

à ditadura. Mas é importante pensar que a emenda Dante de Oliveira (projeto no Congresso que gerou as Diretas) é derrotado pela maioria, ainda composta pelos apoiadores da ditadura”, analisa Marcus Vianna, professor de História pela UFRGS e especialista em História do Brasil contemporâneo pela Faculdade Porto-Alegrense (FAPA). Alguns políticos e partidos da época ficaram marcados para sempre na história política brasileira. “O candidato da ditadura na eleição de 1985, Maluf, só é derrotado pela oposição, porque Tancredo Neves consegue o apoio de um setor de políticos da ditadura, que tinham rompido com a própria ditadura na véspera da eleição. Um deles é o senador Sarney e o outro o Marco Maciel, que vão sair da Aliança Renovadora Nacional (Arena), Partido Democrático Social (PDS) e formar a Frente

REPRODUÇÃO JORNAL ZERO HORA

Diretas Já, movimento que, mesmo derrotado, abriu as portas para a redemocratização, completa 30 anos

Manifestantes lotaram o paço municipal, em Porto Alegre

“O processo que aconteceu no ano Liberal”, destaca Vianna. O especialista acredita que as passado também envolveu miDiretas Já tiveram uma vitória lhões de pessoas. Existe diferenmoral. A eleição de 1985, mesmo ças também: nas Diretas, existia que indireta, sepulta a ditadura. um foco, uma pauta central, que Os protestos de junho de 2013 era a volta a democracia, a volfizeram algumas pessoas voltar ta das eleições para presidência no tempo e lembrar do cenário pelo voto popular. Agora, a gendas ruas na época das Diretas Já. te tem outra realidade histórica,

em que não há uma pauta unificadora das manifestações, afirma Vianna. O jornalista Ronaldo Ludke Bonemann participou das Diretas em Porto Alegre e afirma: “Foi emocionante e pacífica, sem brigas. Tínhamos uma turma de amigos que dialogavam e sempre chegávamos a um consenso e tudo acabava bem”. Bonemann comenta sobre a luta pela democracia: “Saber que de nada valeu (em termos), porque a democracia que naquela época buscávamos, na realidade não foi conseguida, me deixou um pouco frustrado. Queríamos que acabasse a escolha feita pelo Congresso e que o povo escolhesse os seus comandantes. Esta vitória final, que Bonemann lamenta não ter ocorrido em 1984, só viria em 1989, quando o Brasil votaria pela primeira vez, diretamente, para presidente da República.

2 de abril

31 de março

10 de abril

16 de abril

25 de abril

Deputado Dante de Oliveira apresentou uma proposta de emenda constitucional restabelecendo as eleições diretas à Presidência

A primeira manifestação pública é realizada em Pernambuco, na cidade de Abreu e Lima com cerca de 100 pessoas

Comício na Candelária, no Rio de Janeiro, reuniu 1 milhão de pessoas

Uma passeata saiu da Praca da Sé e foi até o Vale do Anhangabaú, em São Paulo, 1,5 milhões de pessoas participaram

A emenda é rejeitada por não alcançar o número mínimo de votos para sua aprovação

1983

1983

1984

1984

1984


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MAIS DO QUE UM DIREITO

Leony e a história do voto no Brasil Cristiane Vargas

A

o chegarem às terras brasileiras, a preocupação dos colonizadores portugueses era estabelecer na região seus representantes. Desde 1532 ocorreram votações para eleger os líderes de cada região. Com o passar do tempo foram ocorrendo algumas restrições. O voto passou a ser um direito somente de quem tinha maior poder aquisitivo. As pessoas deveriam ter idade mínima de 25 anos, mulheres, escravos, índios e assalariados não tinham o direito de escolher seus governantes e representantes. Década de 30 As reformas na legislação eleitoral resultaram no primeiro código eleitoral do Brasil, em 1932, que criou a Justiça Eleitoral, responsável por todos os trabalhos eleitorais. Também trouxe um regulamento em todo o país para as eleições federais, estaduais e municipais. Foi instituído o voto secreto, o voto feminino e o sistema de representação proporcional em dois turnos. Avanços ocorreram na legislação eleitoral pela Constituição de 1934. No mesmo ano, Getúlio Var­ gas foi eleito presidente da

VALÉRIA DA ROSA

“Meu voto faz a diferença, mesmo com alguns acontecimentos decepcionantes que estamos presenciando”, diz Leony Charão, 73 anos, aposentada

Ulysses Guimarães (que faleceria três anos depois). As manifestações contribuiram para a eleição pelo voto direto à presidência do país, que ocorreria no ano seguinte. Disputaram nesse pleito Fernando Collor de Mello e Lula. “Na minha visão de historiadora, vejo o país ainda lutando para consolidar sua democracia”, analisa Andreia Souza, 36 anos, professora de História pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). A historiadora reforça que as reformas precisam avançar para garantir o avanço e a consolidação do sistema político brasileiro. “Melhorias devem acontecer, pois a corrupção faz com que partiMesmo não sendo obrigatório, Leony sente prazer em votar a cada eleição dos e políticos fiquem desacreRepública de forma indireta. Gaspar Dutra, assume o poder. ditados e muitas vezes viram motivo de piada para o povo. O Com o apoio dos setores conser- Era o fim do Estado Novo. vadores da sociedade, o político A nova Constituição de 1946 caminho a ser percorrido ainda gaúcho anunciou por uma emis- proibiu a inscrição de um mes- parece longo”, diz Andreia. sora de rádio a “nova ordem” do mo candidato por mais de um Fazer a diferença país. Vargas indicou seu ministro Estado. Durante o regime militar, de Guerra, Eurico Gaspar Dutra ocorreram alterações no goverA aposentada Leony Charão, como seu candidato. no, como a duração de mandatos, Nesse mesmo dia, a Cons­ cassação dos direitos políticos, que vota desde os 18 anos, retituição de 1937 foi promulga- eleições indiretas para presiden- força que desde que passou a da, estabelecendo uma eleição te e governadores. acompanhar a política, não obindireta para presidente da servava mudanças. Ela conta que, República, com mandato de seis Diretas Já! durante o mandato do governaanos. Esse episódio gerou a opodor Antonio Britto no Estado, sição dos intelectuais, estudanEm 1988, a Constituição es- ela chegou a ficar oito meses tes, religiosos e empresários. A tabelece a obrigatoriedade do sem receber sua aposentadoria. cúpula militar ganhou força jun- voto para maiores de 18 anos e Hoje, ainda não vê melhorias da to à oposição e explodiu o golpe facultativo para quem tem mais administração pública. “Sempre de 29 de outubro de 1945, no qual de 70 anos. Cerca de 200 mil procuro definir um partido, e a Vargas foi deposto. pessoas, reuniram-se na Praça maioria dos candidatos em que Nessa situação, interina- da Sé em São Paulo, na maior voto pertence a este partido”, mente, o governo passou para manifestação política do Brasil. afirma Leony. José Linhares, presidente do O povo ouviu o discurso de noRelembra que a maior muSupremo Tribunal Federal (STF) mes do cenário político da época, dança que presenciou no cenário até um novo pleito. Com a queda como Luiz Inácio Lula da Silva, político nacional foi a padronide Getúlio, seu sucessor, Eurico Fernando Henrique Cardoso e zação dos partidos. Ela observa

que, mesmo que um candidato diga que é de esquerda, repentinamente muda de legenda ou se coliga a outro partido que não tem seus valores originais. Olhar atento e experiente “O resgate de contextos das eleições anteriores é importante, sim”, afirma o professor Rodrigo Mateus Nikel, 34 anos, formado em História pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Segundo o especialista, esta é uma habilidade que falta aos eleitores brasileiros desenvolver, principalmente em relação à política institucional. “A análise dos contextos históricos também é um exercício necessário para nos orientar durante as eleições”, conclui Nikel. Ele relembra que, em 2002, quando ocorreu a eleição de Lula, o PT surgia como opção de mudança a uma política econômica que desenvolveu-se durante a década de 1990. Surfando a onda da bem-aventurança da economia mundial, foram dois governos prósperos até 2010. Naquele ano, a continuidade do governo e de seu projeto se deu pelas mãos da então ministra da Casa Civil e atual presidente Dilma Rousseff. A eleição de 2014 é uma oportunidade para o país discutir o tipo de Estado que deseja para os próximos anos - social ou liberal. Isso está atrelado aos projetos políticos e econômicos de cada candidato. Outro fator importante, na avaliação de Nikel, é a assunção da política no dia a dia das pessoas, motivada pelas grandes manifestações de 2013.


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FOTOJORNALISMO FOTOS RICARDO CHAVES

Confronto entre manifestante e policiais no auge da ditadura em Porto Alegre

Manifestantes lotaram a Praça da Sé, em São Paulo, para pedir eleições diretas para presidente da República, em 1984

Entre os Dragões da Independência, o sempre atento Kadão

Atentado no Riocentro, um dos últimos atos do regime militar

Para acompanhar a corrida de Collor pelo Central Park, em Nova York, o fotógrafo alugou uma bicicleta


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Instantâneos de gerações que mudaram a História Jornalista por profissão e brizolista de coração, o fotógrafo Ricardo Chaves deu lições de idealismo durante painel na UniRitter Gicele Kreibich e Nicolle Lenuzza

C

ser comandado por quem gosta”, afirmou, explicando que, por ser uma editoria tão complexa, quem consegue dominar este assunto, pode dominar melhor qualquer outro. Em sua exposição, lembrou de suas principais coberturas: a visita do papa João Paulo II à Polônia, as viagens de presidentes brasileiros ao Exterior, como as de Collor, e duas Copas do Mundo. O assunto para o qual o fotógrafo deu mais ênfase foi o da ditadura militar no Brasil. Kadão deixa claro o que pensa sobre o período que marcou a história do país: “A pior coisa que pode acontecer a uma nação é a ditadura”.

om uma palestra que trouxe conhecimento e experiência de vida, Ricardo De Leone Chaves, conhecido como Kadão, fotógrafo há mais de 40 anos, foi um dos palestrantes do Painel das Eleições da Semana de Política da Uniritter. Desde o início dos debates, Kadão deixa claro sua ideologia política: “Brizola Lugar certo, não existe mais, mas eu ainda sou brizolista”. hora certa Kadão nasceu em Porto Alegre em 1951. Iniciou sua carreira em “Eu vivi esse período e foi 1969, como fotógrafo do jornal muito duro. Hoje, que todos coZero Hora. Em 1972, foi para a nhecemos as atrocidades da éposucursal gaúcha do Jornal do ca, eu sou o filho de um herói, um Brasil, onde ficou por dois anos. resistente à ditadura. Mas, por Trabalhou também para a revista muito tempo, fui marcado como Veja em Porto Alegre entre 1976 e o filho do bandido, do comunis1981 e no Rio de Janeiro de 1981 à ta”, disse o jornalista com lágri1984. Atualmente, assina a coluna mas nos olhos. Almanaque Gaúcho, de Zero Hora. Kadão acredita que a postuFilho do jornalista Hamilton ra dos veículos de comunicação Chaves, Kadão explicou que não com relação à política é parcial. escolheu a mesma profissão por “A imprensa discute muito sobre influência do pai. “As coisas fo- imparcialidade, em busca de preram acontecendo naturalmente servar a sua credibilidade com as na minha vida, eu não sofri pres- pessoas. Mas podem ter certeza: são nem influência para trabalhar todos têm um lado na política e com jornalismo”, afirmou. muitas vezes o manifestam”, desabafou o fotógrafo, que finaliO pai, um assessor zou a palestra dando uma dica para os futuros jornalistas prede Brizola sentes no evento. “O jornalista não pode ser inDesde muito cedo teve contato com a política, pois seu pai foi as- gênuo. Temos de ser maliciosos sessor de Leonel Brizola e secre- sempre e com tudo, desconfiar tário de imprensa do governo do até de nossas convicções”, comPDT. Com bom humor, demons- pletou o profissional. Ao final, para ilustrar sua tratrou ao longo de sua palestra a identificação com os ideais de jetória profissional, Kadão mosBrizola. “Meu pai era jornalista e trou algumas de suas principais saiu do jornalismo, pois se enga- fotografias e contou a história jou na campanha. Daí vem minha de como foi tirar cada uma delas, por estar no lugar certo, na hora paixão por política”, conclui. O fotógrafo também falou certa. Demonstrando mais uma sobre a importância do jorna- vez que para ser um jornalista lista gostar do assunto debatido. de sucesso é preciso um misto “Quem não gosta de política vai de sorte e arte.

Em 6 de setembro de 1979, Leonel Brizola encerrou o mais longo exílio de um político brasileiro

Geração cara-pintada, o movimente estudantil que, em 1992, exigiu o impeachment do presidente Collor


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O PREFEITO E A APRENDIZ

Uma cidade dentro de Porto Alegre Daniela Fernandes

Q

uem disse que precisa estar filiado a algum partido para fazer política? No Condomínio Parete, as eleições para síndico são anuais e a disputa é acirrada: em média três candidatos a cada ano disputam os votos dos 996 proprietários. Construído há 31 anos em Porto Alegre, o Condomínio Edifício Parque Residencial Teresópolis, mais conhecido como Parete, abrange uma área de mais de 77 mil metros quadrados. São em média 4 mil moradores no local, que, além de ter uma imensa área verde, dispõe de uma academia ao ar livre, duas quadras de futebol, um centro comercial com supermercado e diversas lojas, cinco churrasqueiras, um grande salão de festas e uma cancha de bocha onde ocorrem até campeonatos

municipais. Administrar tudo isso não é fácil, todo ano, em outubro, acontecem as eleições no Parete. Vários grupos de moradores formam chapas que disputam os votos. É bem concorrido. E também é um dos grandes eventos no condomínio. Eleito há quase um ano, Nelci Conrado dos Santos, 50 anos, primeiro tenente da reserva da Brigada Militar, está no seu quarto mandato como síndico. Ele conta as dificuldades e o prazer de administrar um local que tem um número de moradores maior do que muitas cidades do Interior. Para administrar esse “município” encravado no bairro Teresópolis, em frente UniRitter, são necessários cerca de 50 funcionários, entre administrativos, zeladores, manutenção e serviços gerais. Conrado acredita que sua experiência na Brigada Militar foi fundamental para comandar o condomínio com segurança e eficiência. “Não temos como agradar a todos, é importante ter consciência disso, mas ser correto e pensar no coletivo já me dá um bom resultado”, comenta Conrado, que diz ter como meta tornar o lugar em que mora muito melhor, mais

bonito e economicamente viável. Dificuldades existem, mas nenhuma delas desanima o síndico do maior e mais arborizado condomínio fechado de Porto Alegre, Conrado atende todos os dias dezenas de moradores, com os mais variados tipos de problemas, desde o vizinho que reclama do outro por causa de barulho até vazamentos e danos estruturais. “Lidar com pessoas não é nada fácil, cada um acha que o seu problema é o maior do mundo, mas, com diálogo e muita paciência, é possível obter sucesso. Embora algumas divergências, fiz novos e grandes amigos, e isso para mim é o mais importante”, relata Conrado. Manutenção diária é um dos desafios

Administrar o Parete parece ser difícil, afinal, o condomínio já tem mais de 30 anos, o que requer uma rotina quase diária de manutenção: corte de grama, pintura de prédios, troca de telhas, conserto de vazamentos, rachaduras, sem contar com os problemas administrativos, como funcionários e a inadimplência. O condomínio conta

ROGÉRIO SOARES

O dia a dia em um dos maiores condomínios de Porto Alegre revela como é possível fazer política sem sair de casa

Nelci é o síndico do Residencial Teresópolis, em Porto Alegre, onde vivem 4 mil pessoas

com o auxílio de um departamento jurídico, uma contadora e uma administradora que assessora na parte administrativa e de pessoal. Ser síndico do Parete equivale a ser prefeito em uma cidade pequena, só que, aqui, as eleições são anuais e no próximo dia 25 acontecerá a próxima. Como em qualquer pleito, há campanha política, militância, oposição, e, depois do resultado, acontece

sempre uma grande festa de comemoração do síndico eleito com seus eleitores e simpatizantes. Andando pelo Parete, tem-se a impressão de que estamos em uma cidade do Interior: pequena, bem organizada, onde a maioria dos moradores se conhece. Há uma sensação de tranquilidade e harmonia, que, com certeza, deve-se a uma boa administração e ao respeito mutuo de todos os moradores.

Desde cedo, talento para o debate de ideias ARQUIVO PESSOAL

A trajetória de uma jovem que começou a fazer política no grêmio estudantil e hoje é uma das representantes da UNE Graziella Stiebe

“V

á lá, ocupe e mude a política! Vá lá você e lute!” Esse é lema que move a estudante de Relações Internacionais da UFRGS Juliana Souza. Aos 22 anos, ela é diretora do núcleo da União Nacional dos Estudantes (UNE) em Porto Alegre, que tem como objetivo

fazer com que centros acadêmicos e movimentos estudantis das escolas, sejam atuantes na busca por melhorias para educação e principalmente para aos estudantes. Ser diretora da UNE, é uma tarefa muito encantadora, segundo a estudante. E de grande responsabilidade. Seu papel é ajudar a construir um movimento estudantil democrático e comprometido com as lutas pela educação em todo o Brasil. Seu trabalho permitir conhecer diversas realidades da educação brasileira, por meio de caravanas realizadas pelos movimentos. Em cada encontro, é reforçado o objetivo

A política está ligada em tudo na vida das pessoas, especialmente nesta fase da vida Juliana luta por educação de qualidade

Juliana Souza, diretora do núcleo da União Nacional dos Estudantes (UNE)

principal: a luta por uma Política de Assistência Estudantil que garanta aos estudantes universitários uma permanência qualificada. Antes de estar a frente deste movimento, Juliana iniciou sua trajetória no grêmio estudantil de sua escola. Foi neste período que o seu perfil democrático despertou. A partir de então, participou de movimentos estudantis, inclusive da greve dos professores. Até que chegou na universidade e ingressou no movimento universitário da instituição. Em 2013, foi indicada pelo movimento para construir a gestão da UNE. Atualmente, está na Diretoria de Políticas Educacionais, representando as ideias e práticas do Movimento Mudança e construindo o Campo Popular. A UNE tem três campos políticos: campo majoritário, campo popular, oposição de esquerda. Fazer política de uma forma diferente, como na trajetória de Juliana, é uma maneira inteligente de buscar alternativas para tratar de temas pouco explorados

pelos políticos, como a educação brasileira. Mas será que falar de política para os jovens é uma tarefa fácil? Segundo Juliana, depende muito da conscientização do jovem. Ela costuma mostrar o quanto a política está ligado em tudo na vida das pessoas, especialmente nesta fase da vida. Os jovens não se identificam com a política tradicional. Alguns acabam influenciados pela mídia, que, na opinião da estudante, nunca apoia a luta de trabalhadores e estudantes. Pessoas como Juliana buscam fazer política de uma forma diferente, começando pelo principio, a educação. Seu maior desafio - e dos companheiros da UNE - é encantar muitos mais os jovens por meio deste projeto: mudar o sistema de educação das universidades e deixar como legado a sua contribuição. Ela acredita que o principal é a conscientização dos jovens. Ele pode, sim, por meio de sua realidade fazer uma revolução. Os jovem precisam ter personalidade e assumiar a sua posição diante da sociendade sem medo se expor suas ideeias e ir a luta.


2014/2 • UNIPAUTAS • 11

MISSÃO: MESÁRIO

Quem são os convocados para a Copa do Mundo das urnas Paulo Nunes e Stheve Balbinotti

T

FOTOS PAULO NUNES

Funcionários que atuaram na eleição deste ano acreditam que sua atividade não é apenas uma profissão. É um ato de cidadania

confirmando que nenhum computa voto), a ata da mesa receptora de votos, as três vias do boletim de urna, a via do boletim de justificativa, os formulários de justificativa e os cadernos de votação. As urnas eletrônicas são entregues e recolhidas por uma empresa contratada pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE). Cada seção é composta por quatro membros: presidente de mesa, 1º mesário, 2º mesário e secretário. Também existem os administradores de prédio, esses são responsáveis por abrir o local de votação, pelo recebimento, guarda e entrega das urnas eletrônicas aos presidentes de mesa, indicação das salas onde deverão ser instaladas as seções, orientação das salas e respectivas seções aos eleitores, entrega de formulário de justificava aos eleitores que votam fora do município e instruí-los quanto a seu preenchimento e orientar os eleitores que, não tenham o título e não saibam o número. Para essas pessoas orientam uma

ligação ao Disque Eleição (148), que fornecerá as informações prontamente. Além de ser um ato de cidadania e um aprendizado, há vários benefícios de ser mesário. Entre eles: dispensa de dois dias do trabalho pelo dobro de dias prestados à Justiça Eleitoral, auxílio-alimentação para o dia da eleição, créditos em disciplinas de cursos em instituições de

Ensino Superior, se conveniadas com os tribunais regionais eleitorais e vantagem de desempate em concurso público, se houver previsão em edital. “Há alguns benefícios que não utilizei, como vantagem de desempate em concursos. O auxílio alimentação e a dispensa de dois dias do trabalho eu usei”, afirma Filipe Anderson Rodrigues, 29 anos, social mídia e convocado para ser mesário pela segunda vez. A eleição em um país é um momento extremamente importante, onde se decide o futuro de uma nação e é preciso estar preparado para organizar este evento. O promotor de Justiça Rodrigo Zilio, com uma vasta experiência em processo eleitoral, comenta sobre a importância de um mesário no cenário da eleição. “É uma função extremamente relevante. O mesário convocado pelo juiz eleitoral, tendo a função de presidente de mesa, deve orientar todos os eleitores e organizar o momento da votação que, é o momento no qual o regime democrático tem sua plenitude”.

rocar o churrasco de domingo com a família e ter como companhia a urna eletrônica e a responsabilidade de colaborar com a organização de uma votação eficiente. “Um grande brasileiro nas eleições! Rayssa acredita no processo democrático O mesário colabora com a lisura do processo eleitoral, viabiliza as também os suplentes, que receeleições e fortalece a democra- bem uma carta convocatória encia”. A frase é de Paulo Henrique tregue em mãos por um oficial Konzen, chefe de cartório da 112ª de justiça. Caso necessário, são zona eleitoral de Porto Alegre, ao chamados para compor a equipe. falar sobre a importância do ato No domingo da eleição, os de ser mesário em um processo mesários recebem os materiais. eleitoral. Após às 17h, tudo é enviado para Para exercer esta função, da a junta eleitoral. Esses materiais qual muitos fogem, é preciso ter são: a mídia de resultado, zerémais de 18 anos e estar em situ- sima (relatório emitido ao ligar ação regular (estar apto a votar, a urna eletrônica demonstranFilipe foi mesário por duas vezes não significa a inexistência de al- do os candidatos registrados e guma pendência) com a Justiça Eleitoral. Existem dois caminhos, você pode se cadastrar no site do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) ou ser convocado. A presença é obrigatória. “Sem ele não existe eleição. As eleições não deveriam ser obrigatórias, como processo democrático deveriam ser facultativas, assim como a escolha dos mesários”, comenta Rayssa Monteiro Amorim, 22 anos, estudante de Serviço Social e convocada para ser mesária pela primeira vez. Ela ainda diz: “Ser mesária pela primeira vez é me permitir participar do processo democrático, auxiliar no cumprimento da lei e buscar uma reforma e melhorias para a sociedade”. Receber o eleitor, colher e conferir sua assinatura no caderno de votação, liberar a urna, garantir o sigilo do voto e manter a tranquilidade no ambiente de votação são funções que Rayssa exerceu no último dia 5. “Cabe ao mesário facilitar e assegurar ao eleitor o exercício do direito de votar e ser votado e que sua vontade seja respeitada”, destaca Konzen. Em julho, ocorre a indicação da composição da junta eleitoral, em agosto a cerimônia de nomeação dos mesários e, em setembro, os treinaNas semanas que antecederam o primeiro turno da eleição, Paulo Konzem e colegas do TRE/RS fizeram os ajustes finais das urnas eletrônicas mentos dos convocados. Existem


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ACORDES DA RESISTÊNCIA

Anos de chumbo,um grito contido Melissa Renz

A

única arma que os músicos tinham nos conturbados anos da ditadura militar no Brasil era sua música. Mas não pensem que foi fácil criar ou se expressar numa sociedade dominada por ideias repressoras tanto políticas quanto sociais. 0 MÚSICAS QUE MARCARAM A ÉPOCA DA DITADURA

1

Pra não dizer que não falei das flores – Geraldo Vandré

2

Cálice- Chico Buarque e Gilberto Gil

3

Apesar de você- Chico Buarque

4

O bêbado e a equilibristaElis Regina (Composição: Aldir Blanc e João Bosco)

5

Eu quero é botar meu bloco na rua- Sérgio Sampaio

6

Como nossos pais- Belchior

7

Alegria,alegria-Caetano Veloso

8

Acorda Amor- Chico Buarque

9

Que as crianças cantem livres- Taiguara

10

É proibido proibir- Caetano Veloso

Segundo o jornalista e espe­ cialista em música Juarez Fonseca, na história brasileira, sempre houve uma forma de controlar a divulgação de expressões culturais como a música: “Na forma da velha Divisão de Censura e Diversões Públicas, a República sempre teve um instrumento policial para liberar (ou não) as músicas”. Em 1964, quando o regime militar se instala no país, os movimentos de bases político-sociais eram os mais organizados. A União Nacional dos Estudantes (UNE), o Comando Geral dos trabalhadores (CGT) e Pacto da Unidade e ação (PUA) eram alguns destes grupos. Todos acabaram caindo na clandestinidade ou foram asfixiados pelo regime. Nessa época, começam a surgir movimentos como A Tropicália, Irmão do cantor e compositor Nei Lisboa, Nico Lisboa, foi preso pela ditadura militar em 1972 e dado como desaparecido deste então que, com sua irreverência, passa a incomodar os militares. foi proibida de ser gravada e can- teve suas músicas censuradas Center Copacabana, sede do Muitos artistas foram per- tada. Em uma apresentação, os por causa de palavras como Teatro de Arena no Rio de seguidos, alguns tiveram suas artistas chegaram a ter seus mi- “tesão”. Uma estratégia que os Janeiro com Nara Leão, Zé Kétti carreiras interrompidas. Outros crofones desligados no momen- artistas usavam para driblar a e João do Vale foi a primeira censura era por meio dos festi- grande manifestação de resiscompuseram hinos de resistên- to da apresentação. cia, como Geraldo Vandré, que Para Juarez Fonseca, a músi- vais de música. Mas nem estes tência à ditadura Em 1972, o Exército ordenou compôs “Pra não dizer que não ca exerceu um papel de crítica. conseguiam escapar da fúria que a presidente do Júri do falei das flores”. Alguns bus- Sobre Chico Buarque, ele diz: dos censores. Dois grupos se destacaram Festival de músicas Nara Leão caram o exílio político em ou- “Bastava sua assinatura para que tros países, como por exemplo as músicas fossem censuradas. como verdadeiros heróis da re- fosse substituída. Em solidaCaetano Veloso e Gilberto Gil, Ele descobriu a saída no pseu- sistência ao regime. Os políticos riedade, todos se demitiram. que já eram vistos pelos mili- dônimo Julinho da Adelaide, au- da oposição e artistas, que fize- Foram convocados novos juratares como inimigos do regime, tor de Jorge Maravilha (Você não ram do campo cultural um palco dos. Um dos demitidos, Roberto mesmo antes de deflagrado o AI5 gosta de mim mas sua filha gos- de crítica e contestação. O talen- Freire, atual deputado federal (o quinto ato institucional emiti- ta) e Milagre Brasileiro. Acorda, to driblou a estupidez afirma o pelo PSB, ao tentar ler o manido pelo regime militar brasileiro, Amor era a única assinada por crítico musical Nelson Motta na festo, foi arrancado à força do palco diante da estupefação da que escancarou a ditadura). Chico no álbum Sinal Fechado matéria do Jornal da Globo. plateia. Com isso, acabou a era Em 1973, o governo dos ge- (outra metáfora). Chico chegou A primeira grande dos festivais. nerais fez de Chico Buarque o a ter proibidas todas as músicas manifestação Nos dias de hoje, Fonseca afirseu alvo principal. O artista so- da peça Calabar.” ma que não existe mais críticas freu todas as censuras possíveis. Alguns gaúchos também Podemos afirmar que o show sociais na música: “Não há consNesse mesmo ano, ele e Gilberto não escaparam da perseguição. Gil lançam a canção “Cálice”, que “Raul Ellwanger foi um dos que Opinião no teatro do Shopping ciência crítica.”

ROGÉRIO SOARES

A música nos difíceis tempos da ditadura militar no Brasil foi extremamente criticada e censurada


2014/2 • UNIPAUTAS • 13

POLÍTICA NAS TELAS

Cinema pode limpar a cara, cara! Mariana Catalane Frantzeski

Q

compreensão da sociedade, mas são específicas. Há quem destaque a era do Cinema Novo como a mais brilhante do cenário audiovisual político brasileiro. Pensa assim, por exemplo, a diretora de fotografia Kátia Coelho, graduada em Cinema pela Universidade de São Paulo (USP): “Acho que a liberdade de expressão e a diversidade dos filmes caracteriza a democracia, foi um momento em que jovens discutiram novas ideias para a produção de filmes nacionais e usaram referências Referência ao cinema mudo e à censura, para montar a sua própria per- contraponto da era contemporânea sonalidade. O que esses jovens queriam era a produção de um Barbosa acredita que toda a forcinema barato, feito com ‘uma ma de arte é política e acrescenta câmera na mão e uma ideia na ca- “O cinema retrata a realidade do beça’, slogan da época formulado homem e do mundo em que vive”. por Glauber Rocha”, afirma ela. O cineasta Tabajara Ruas, diEm entrevista ao Unipautas, retor e roteirista do filme Brizola o cineasta Gustavo Fogaça - Tempos de Luta concorda com (Guffo) desconhece a existência Zé Adão “O cinema brasileiro do gênero filme político no país. tem uma grande tradição de ci“Atualmente, não existe cinema nema político: é só pensar em político no Brasil. Como o cine- clássicos antigos, como ‘Vidas ma virou refém do governo, do Secas’, ‘Deus e o Diabo na Terra financiamento público, da apro- do Sol’ ou ‘Os Fuzis’. Hoje em vação do sistema, não questiona dia podemos citar ‘Cidade de mais o próprio sistema”, opina Deus’, ‘Tropa de Elite’ e ‘Em Teu categórico. Nome’, do nosso amigo Paulo O ator e professor da Casa de Nascimento, como outros bons Teatro de Porto Alegre, Zé Adão exemplos”, ressalta o roteirista.

ILUSTRAÇÃO LEANDRO COUGO/FILME O GRANDE DITADOR (1940)

Em ano de eleições, é importante buscar informações e conhecer a história do país. Os filmes podem auxiliar a compreender a história política nacional

uem assistiu aos programas eleitorais na TV, pode ter percebido que são raras as campanhas com planos de governo que aprofundam as questões sociais realmente relevantes. Como complemento a este horário político, queremos conhecimento por outros meios. É aí que entram os filmes. Em 1980, o filósofo francês Gilles Deleuze disse que o cinema pode ser pensado como uma “máquina de guerra” no sentido de afrontar valores e servir demonstrações estéticas mais próximas da vida. Em se tratando de distribuições audiovisuais brasileiras, ou seja, a circulação dos filmes feitos nas nossas terras, os gêneros que lotam as salas de cinema geralmente são de comédia, ficção ou dramaturgia. Obras com fatos verídicos podem ajudar na

Terra em Transe (1967) de Glauber Rocha Parábola da história Brasileira no período de 1960-66. Os personagens têm diferentes tendências políticas.

O que é isso, companheiro? (1997) de Bruno Barreto A partir de licenças ficcionais, o enredo conta a história do sequestro de um embaixador norteamericano, no Brasil.

O ano em que meus pais saíram de férias (2006) de Cão Hambúrguer Um casal de militantes é obrigado a fugir devido a perseguição do regime militar em 1970.

Brizola – Tempos de Luta (2007) de Tabajara Ruas O filme versa sobre a vida do político gaúcho Leonel Brizola.

Em Teu Nome (2010) de Paulo Nascimento História de Boni, estudante de origem humilde, que adere a luta armada, mas carrega dúvidas sobre sua escolha.

Febre do Rato (2012) de Cláudio Assis O protagonista, Zizo, dedica a vida à publicação de seu jornaleco, cujo nome é o mesmo do título. O objetivo é expor suas ideias, repletas de propostas anárquicas que valorizam o livre arbítrio das pessoas.

Feix: não há cinema político brasileiro Jennifer Van Leuveen

E

m entrevista ao Unipautas, o jornalista e crítico de cinema, Daniel Feix, afirmou: “A enorme produção contemporânea do país, que hoje atinge cerca de 100 longas por ano, registra muitos filmes que abordam questões políticas de maneira lateral”. Leia os principais trechos:

Unipautas: Qual sua visão sobre o cinema político brasileiro? Feix: Temos produzido filmes riquíssimos, que têm dado conta de questões importantes da sociedade brasileira atual, do ponto de vista político, social, cultural e econômico. Infelizmente a maior parte desses filmes têm ficado restrito a nichos, um pouco por culpa do sistema de distribuição (nem todos os títulos têm o apelo popular de “Tropa de Elite” para cavar seu espaço mesmo com distribuição independente), mas também porque são filmes mais difíceis, construídos com propostas estéticas não tão simples quanto aquelas dos longas de mercado mais tradicionais. São os casos de “Castanha” e “Praia do Futuro”. Como o cinema político encara o mercado? O cinema de mercado é pautado cada vez mais pelas exigências do mercado. Para dialogar com um grande número de pessoas, os files seguem determinados preceitos tanto de concepção quanto de distribuição. O cinema autoral está, cada vez mais, restrito a nichos. Ganha espaço em salas comerciais de shopping, um espaço invariavelmente restrito. Nesses nichos, a censura raramente se manifesta e, quando se manifesta, ganha repressões barulhentas por parte do público e da intelectualidade (casos recentes foram a interdição do filme sérvio “A Serbian Film”, em 2011, e uma manifestação isolada

de um jurista quanto à bobajada “Ted”, em 2012). Em ambas as situações, os debates em torno desses filmes só serviram para torná-los mais conhecidos. Uma prova de que há liberdade para os cineastas se expressarem é o já citado Tropa de Elite 2: com críticas contundentes a figuras marcantes no âmbito da segurança pública, e à própria atuação do Estado nesse contexto, foi o filme brasileiro mais visto de todos os tempos. E teve distribuição independente (fora do esquema que envolve exibidores e grandes distribuidoras). Ou seja: não há muito o que driblar atualmente no que diz respeito a cerceamento político do governo. Há, sim, mecanismos limitadores no sistema (financiamento, produção, distribuição), mas isso também é outra coisa. Quais as mudanças do cinema político? O cinema de caráter político sempre existiu, e sempre refletiu características do lugar e da época em que foi produzido. Com exceção da produção italiana entre os anos de 1960 e 80, os filmes políticos raramente foram fruto de um movimento articulado de cineastas. A segunda parte de Tropa me parece um dos mais eficientes projetos recentes que se dedicam a discutir questões políticas. Há diversos exemplos nesse sentido, das coproduções internacionais como o cearense-alemão “Praia do Futuro” ao gaúcho “Castanha”, para ficar em dois títulos de 2014. O cinema ajuda a formar politicamente as pessoas e a consolidar a democracia? Pode ajudar assim como todas as manifestações artísticas de qualidade: usando a estética (o conceito aristotélico de estética) para formatar projetos artísticos capazes de enriquecer o repertório do público. Usá-la como instrumento para consolidar algum regime ou mesmo sistema de governo é possível

O cinema autoral está, cada vez mais, restrito a nichos. Daniel Feix, crítico de cinema


14  •  UNIPAUTAS • 2014/2

IMPRENSA E POLÍTICA

Uma semana para refletir

Carlos Lacerda, Leandro Osório e Paulo Nunes

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o primeiro dia, o convidado foi o jornalista Wilson Rosa, do SBT. A palestra foi mediada pelos professores César Steffen e Denise De Rocchi. “Na TV, o tempo é muito curto, já, no rádio, ainda dá para encaixar melhor o tempo para debater as idéias sobre a atual política, pois, no momento, a palavra chave é renovação” Esta é a avaliação de Wilson Rosa sobre o cenário para as eleições. Sobre as campanhas eleitorais atuais, César afirmou que os últimos cinco dias são os que decidem uma eleição. Os três debatedores foram questionados sobre os protestos de 2013. “Na visão de vocês qual será o tamanho do impacto causado pelos protestos do ano passado nesta eleição?”, pergunta a reportagem: “Não mudará muito o cenário

da eleição, já que o brasileiro esquece rápido” respondeu Wilson Rosa. A professora Denise De Rocchi afirmou que as ondas dos protestos ficaram no ano passado. César complementou: “Os protestos ficaram sem foco, foram mais fogo de palha”. No segundo dia a convidada foi a jornalista e editora de Notícias da Zero Hora; Dione Kuhn. A palestra foi mediada pelo jornalista e professor Rodrigo Lopes. Dione contou detalhes dos bastidores de uma cobertura política e um pouco de sua carreira como repórter. Entre as grandes histórias, a principal foi a série “O Baú Brizola”, na qual a jornalista teve acesso aos documentos pessoais do político. Dione ganhou os prêmios Associação Riograndense de Imprensa (ARI) e Esso, com a reportagem sobre os 40 anos do movimento da Legalidade, liderado por Brizola. “Durante uma campanha eleitoral os políticos ligam muito para reclamar de qualquer má notícia onde eles podem estar envolvidos” contou, lembrando momentos em de repórter durante coberturas eleitorais. Olhar crítico No terceiro dia de painel, os alunos do turno da manhã receberam a visita do fotojornalista e colunista de Zero Hora, Ricardo Chaves - o Kadão, juntamente com os professores da UniRitter, o fotojornalista Rogério Soares e o repórter e correspondente

LEANDRO OSÓRIO

Entre os dias 18 e 22 de agosto, aconteceu na Uniritter o Painel de Jornalismo Político. Foram 16 convidados, em mais de 20 horas de debates. Organizador do evento, o professor e jornalista Leandro Olegário, buscou na iniciativa uma oportunidade para que os estudantes conhecessem o dia a dia de repórteres e candidatos antes e durante os pleitos

Kadão fala de sua experiência em coberturas políticas

internacional Rodrigo Lopes. Entre outros assuntos ligados ao tema proposto pelo evento, Kadão contou parte de sua grande trajetória pelo mundo fotográfico. Rico em registros históricos que estamparam as mais importantes revistas e jornais do Brasil, o fotógrafo mostrou o seu acervo de imagens que emolduram parte da história do país. Questionado sobre a importância da fotografia na cobertura política em momentos delicados, Kadão disse: “O fotógrafo deve estar preparado para tudo. Se a pessoa sorrir ou chorar é um momento único e que não pode ser perdido. (...) Toda a fotografia passa por uma interpretação de quem a fez, de

QUATRO PERGUNTAS PARA DIONE KUHN Por que você escolheu a política para a sua carreira no jornalismo? “Escolhi essa área porque sempre gostei de Ciências Políticas, e principalmente entender a política, suas polêmicas e as pesquisas eleitorais” Como será cobrir ex-colegas de profissão, como candidatos Lasier Martins (eleito senador pelo PDT) e Ana Amélia Lemos (candidata derrotada ao governo do Estado)? “Vai ser como sempre se cobriu Zambiasi e outros que já foram meus colegas e ingressaram na política logo depois” Qual a sua visão sobre a entrevista da Presidenta Dilma Rousseff para o Jornal Nacional? “É característica do Jornal Nacional essas entrevistas, mas os Jornalistas se perderam durante a entrevista. Dilma acabou dominando a entrevista e o tempo. Já Patrícia Poeta e William Bonner se perderam na condução das perguntas”. Como deve ser a relação do jornalista com os candidatos e seus assessores? “O jornalista tem de procurar uma boa relação com ambos, tanto com os candidatos quanto os seus assessores”.


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sobre os dilemas do país

Jornalista versátil Para Luciane Franco, o jornalista de assessoria política deve ser versátil e, no mínimo, ter uma pequena vivência em veículos de comunicação. Também é importante participar da cobertura política para compreender como funciona o outro lado do balcão. O objetivo: não fazer campanha política para o candidato. A

assessora acrescenta que o assessor de imprensa é o elo entre a imprensa e os órgãos públicos. Na segunda parte da palestra, o advogado Antônio Augusto Mayer, especialista em Direito Eleitoral, ofereceu uma visão jurídica diferenciada. Para o diretor da OAB, a sociedade necessita de mudanças fortes e que a convençam de que votar e participar das atividades públicas é importante para melhorar a nação. Convicto de uma redução de tamanho no parlamento, a Câmara com menos deputados federais, a redução de senadores, a proibição de convocação de suplentes durante o recesso parlamentar e a extinção do cociente eleitoral são medidas que poderiam colaborar para o resgate da convicção de que a vida parlamentar pode ser mais convincente. Nos dois últimos dias muita informação e aprendizado com convidados de renome. Na quinta-feira, sob mediação da coordenadora do curso de Jornalismo, Laura Glüer, os convidados foram o jornalista Flávio Dutra, o assessor de imprensa do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Gilberto Jasper e o assessor do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul, Jônatas Costa. Todos com experiência em assessoria política. Dutra ressaltou a importância de conhecer também as redações dos veículos formadores de opinião. “O fato de conhecer como é a dinâmica das redações, conhecer as pessoas, as características de cada veículo e como se dá todas as

argumentações é precioso para quem faz o assessoramento”. Assessor de Comunicação do governo de Germano Rigotto, Jasper acredita que é importante deixar as ideias claras na hora de aceitar o convite de trabalho. “Temos que colocar claramente em cima da mesa o que o assessorado quer e o que tu pode fazer, acima de tudo tem que haver uma sinceridade entre ambas as partes”. Costa lembra que no período eleitoral é o ápice para quem trabalha diretamente com as eleições. “É claro que no ano eleitoral existe um aumento e um volume de trabalho. No dia da eleição é nosso grande dia, onde mobilizamos a imprensa inteira, com coletivas de meia

em meias hora para atender a muito satisfeito”. Finalizando, demanda que é grande.” Brito afirmou que o mais imporSob o comando do professor tante da profissão de jornalista é Solon Saldanha, o convidado que a prestação de serviço. encerrou o ciclo de palestra foi Para o idealizador do projeto, o jornalista e comentarista ju- o professor Leandro Olegário a rídico do Grupo RBS e ex- pro- união do cenário estava a nosso motor de Justiça Cláudio Brito. favor, uma vez que ZH procuDurante a palestra, ele contou rou a UniRitter para apresensua trajetória de quase 50 anos tar o seu novo projeto gráfico. de jornalismo, entre os desta- “Convidamos profissionais espeques sua participação na produ- cialistas em política para dividir ção do programa do Chacrinha, experiência com nossos alunos. em 1968. Comparando suas ativi- Conseguimos cumprir o papel de dades de promotor e comentaris- dar vários olhares sobre as eleita, Brito avalia. “Mais tranquilo, ções. O painel deu muito certo, pois como promotor eleitoral ti- tanto que se tornou um evento nha de fiscalizar e, às vezes exer- oficial da FACS e a cada ano no cer o poder de denunciar. Agora, segundo semestre, terá um novo o conteúdo do meu trabalho sig- mote abordando o tema do monifica orientação, isso me deixa mento”, festejou. LEANDRO OSÓRIO

quem a vê e de quem a interpreta”- complementou o fotógrafo. Compondo a mesa a jornalista da TVE Angélica Coronel expôs a sua experiência em coberturas políticas, explicando as dificuldades e principais desafios de um jornalista recém chegado na área. Segundo Angélica, o político é um verdadeiro sedutor, um encantador que usa essa arte-manha para conquistar o seu eleitor. O jornalista iniciante deve estar atento e seguro sobre o assunto ou questionamentos que fará ao entrevistado, bem como municiado de informações. Ao contrário, pode-se deixar envolver com as técnicas de encantamento, caindo por terra a matéria. Sob a mediação dos professores Rodrigo Rodembuch e Leandro Olegário, os alunos contaram com a presença da jornalista com experiência em coberturas políticas e assessoria de imprensa Luciane Franco e também com o advogado e diretor da OAB Antônio Augusto Mayer dos Santos. Entre os temas impactantes abordados, estava os rumos e modos de melhorar a política no Brasil.

Wilson Rosa, do SBT, diz que o tempo é de renovação no cenário político brasileiro


16  •  UNIPAUTAS • 2014/2

IMPRENSA E POLÍTICA

4 dias, 6 painéis em 7 fotos Di o

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FOTOS LEANDRO OSÓRIO, LEONARDO MAYER E ROGÉRIO SOARES

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Durante os últimos dias do mês de agosto, a UniRitter recebeu uma série de encontros com comunicadores e especialistas da área política que abordaram temas como mídia e democracia, pesquisas e crimes eleitorais, redes sociais e gestão da imagem na administração pública. Nesta página, um resumo fotográfico do evento. Ric a

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