Revista Universidade | nº 06

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idosas. Quando a mulher é mais jovem, o agressor atenta contra o físico, como queimar ou marcar o rosto, porque seria atentar contra a beleza, a juventude. Na velhice, tem-se o pressuposto que a mulher é vista como feia, já gasta, e a agressão não se volta contra o físico, mas contra o psicológico. Assim, o que motiva essas mulheres a ir à delegacia é denunciar as ofensas e os xingamentos. O agressor as chamam de velhas caducas, dizem que elas não prestam mais para nada, que não são boas mães,

que cozinham mal. Portanto, a violência psicológica é o que mais parece nos boletins, mais que a violência física”. Portanto são diferentes tipos de violência. “Há uma associação entre violência psicológica e a violência física. Tem a negligência e o abandono associados, e tem a violência física, a violência patrimonial, a violência econômica – filhos e netos que roubam o cartão de benefício”, diz a pesquisadora.

estavam contemplando a diversidade de mulheres e de contextos em que a violência ocorre, mas não ignoro que exista violência contra os homens e que seja também uma questão de gênero. Os homens foram educados a tratar dos próprios assuntos, se mostrarem machos, donos de si. Então, ir até a delegacia denunciar esse tipo de violência é um sinal de fraqueza, fragilidade. Os estereótipos de velhice também acabam afetando os homens”, diz a pesquisadora. Ela esclarece também que não pôde averiguar a violência contra diferentes grupos étnicos e raciais, visto que os boletins de ocorrência da Delegacia não têm em seus campos de preenchimento os itens cor e etnia.

saudáveis, de uma sociabilidade mais ativa e aberta construindo diferentes imagens da velhice. “Mas essa ideia de velhice pode ser danosa também, porque acaba aprisionando, principalmente a mulher, nessa indústria do corpo e da saúde e encobrindo os estereótipos que continuam existindo em relação à velhice. Ao mesmo tempo, ela continua sendo vulnerável à violência. É um paradoxo”. Por fim, a pesquisadora enfatiza que precisamos questionar nossas atividades relacionadas ao idoso diariamente. “Vejo muitas pessoas julgando uma mulher por causa da forma como ela se veste, se comporta, que aquilo não é adequado para a idade dela, reclamando do idoso que está no ônibus ocupando espaço. Tudo isso é uma forma de preconceito. O que é ser velho? É ficar em casa e não fazer nada? Todo mundo que é velho vive a velhice dessa forma? Precisamos rever a nossa responsabilidade na reprodução desses preconceitos. Acabamos identificando tudo isso lá nos boletins, nas ofensas que são proferidas contra essa mulheres idosas. Esses filhos e netos ouviram isso durante a vida”, alerta Luciana. “Há muito o que avançar nas discussões sobre a violência contra as mulheres. Em termos acadêmicos e de políticas públicas, a violência contra mulheres idosas, por exemplo, ainda recebe pouca atenção. Acredita-se que ela guarda contornos próprios e deve ser analisada e enfrentada considerando suas especificidades, como as construções sociais acerca da velhice e os papéis sociais que a mulher deve desempenhar nessa etapa de vida”, conclui.

Preconceito Luciana destaca que é preciso educar melhor a sociedade a respeito do que é a velhice. “É preciso preparar também os policiais que trabalham nas delegacias, porque eles, em sua maioria, não têm noção das relações de gênero, das relações entre gerações, sobre o modo como se vê a velhice socialmente. Querendo ou não, no nosso dia a dia, a forma como falamos da velhice acaba reproduzindo os estereótipos”. Por outro lado, desde os anos 1980 começou a surgir a ideia de uma velhice ativa que, como diz Luciana, está próxima a tratar a velhice como uma questão de consumo. Tem-se a indústria da estética, dos comésticos, das academias, que coexiste com as ofertas de produtos alimentícios mais

UNIVERSIDADE - Revista da Ufes - Maio 2017

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