T29 Fevereiro 2018

Page 21

Fevereiro 2018

T

21

n ENTREVISTA Manuela Araújo 64 anos, nasceu em Pevidém, onde ainda trabalha (a fábrica da Lemar está instalada na casa do avô, Leandro Magalhães Araújo, o fundador da empresa), e vive em Santo Tirso. Após a primária (Colégio da Nossa Senhora da Conceição, em Guimarães) e o secundário (Sagrado Coração de Maria, em Braga), esteve um ano em Londres, a tornar-se fluente em inglês, antes de fazer o Magistério Primário. Foi professora durante 11 anos até que em 1996 acedeu ao convite do pai para integrar os quadros da fábrica. Casada com Alfredo, tem dois filhos - Armindo, 40 anos, ex-campeão nacional e mundial de ralis, e Alfredo, 34 anos -, a quarta geração da família Araújo que já trabalha na empresa

e

stamos claramente ao nível dos melhores italianos - garante Manuela Araújo, 64 anos, CEO da Lemar, acrescentando que a tecnologia e inovação são importantes, mas também é preciso know how e design. Foi difícil trocar a vida calma de professora primária pela agitada e imprevisível de industrial?

Nem por isso. Sempre fui muito boa a adaptar-me a qualquer situação. Não demorou muito até me apaixonar pela indústria.

mercado tão exigente como o italiano?

Percebi que tínhamos de evoluir muito. Para sermos competitivos e os nossos produtos serem atraentes aos olhos dos compradores estrangeiros era obrigatório apresentarmos coisas novas e diferentes. O que implicou investirmos em teares mais versáteis. Um grande passo em frente...

Tinha de ser. Vi logo que não chegaríamos muito longe nos mercados internacionais com os teares que tínhamos. Com tecidos lisos não íamos a lado nenhum. Foi por isso que se envolveu no desenho dos produtos?

Atém de tudo os tecidos lisos não me enchiam as medidas. Gosto de mar, do verão, de cores fortes e alegres. Por alguma razão o verão é a nossa estação mais forte.

Por onde começou?

Na parte interna, comecei por explorar a essência dos tecidos e o posicionamento da fábrica nos mercados. E a virar-se para a exportação...

Rapidamente percebi que não podíamos viver só do mercado interno e decidi começar a ir a feiras e a visitar clientes. A Mare di Moda, em Cannes, foi a primeira feira a que fui, há 20 e tal anos. Ter estado um ano em Londres a aperfeiçoar o meu inglês foi fundamental neste esforço para arranjar novos mercados. Onde foi a primeira grande ofensiva externa?

A minha primeira grande aposta foi o mercado italiano. Diziam que estava louca, mas a verdade é que era lá que me sentia bem. Ainda temos agentes dessa altura - e grandes amigos como clientes. O que aprendeu nesses primeiros contactos com um

As famosas riscas da Lemar nascem nessa altura?

As riscas - toda a gente adora as nossas riscas :-). A minha principal preocupação é sempre a de oferecermos aos clientes tecidos alegres e muito versáteis, que com um tratamento possam ser usados em coisas tão diversas como anoraks, sacos de viagem, roupa para o golfe ou para a neve. Alargar a oferta a tecidos jacquard é o próximo desafio?

Essa hipótese esteve em cima da mesa. Mas decidimos não avançar já por aí. Em alternativa, investimos em novos teares da última geração. Vamos experimenta-los e veremo depois se encomendamos mais. É sempre assim tão cautelosa?

Parecem-me muito bons mas eu não devo um tostão a ninguém e quero continuar assim. Vamos experimenta-los e, se gostarmos, na próxima época compramos mais.

"Rapidamente percebi que não podíamos viver só do mercado interno"

Tecnologia e inovação são o essencial para ser competitivo?

crescer, mas sim modernizarmos a fábrica.

Tecnologia e inovação são fundamentais, mas também é preciso ter know how e design - uma área a que dou bastante atenção.

Small is beautiful?

Porquê?

Apesar de ter nascido numa família onde, há gerações a perder de vista, corre sangue têxtil, em miúda Manuela nunca ligou muito à fábrica que o seu avô fundou na parte de baixo da casa onde vivia, em Pevidém, onde regressou após uma aventura empresarial na Empresa Têxtil Poveira (“A minha avó nunca se deu com os ares da Póvoa…”). Estava posta em sossego, “numa belíssima casa”, em Santo Tirso, casada, com filhos ainda pequenos e professora (“Sempre gostei muito de dar aulas”), quando o pai a desinquietou para ir trabalhar para a Lemar. Pensou duas vezes - mas a voz dos sangue acabou por falar mais alto. Foi há 30 anos. Meteu um licença de vencimento e trocou a sala de aulas e as crianças pelo chão de fábrica e os teares.

Sempre gostei muito de desenho. É por isso que me envolvo muito na área do design. Não sei sentar-me ao computador a fazer o desenho final, mas trabalho em papel e depois passam à escala. Onde vai buscar a inspiração?

Gosto de ler, viajo muito, pesquiso bastante. De qualquer coisa sou capaz de arranjar uma ideia para um tecido. E nós, na Lemar, fazemos questão de estar sempre a apresentar coisas diferentes. Desistiram de vez do jacquard ou o assunto está em banho-maria?

Por uma questão de estratégia decidimos adiar esse investimento. É um projeto para a quarta geração?

Não penso reformar-me tão cedo :-). Os meus filhos já estão a trabalhar na empresa. O Armindo é mais extrovertido, virado para as Relações Públicas, e muito metódico, característica excelente para tomar conta das obras em curso na fábrica. O Alfredo sente-se mais à vontade com a parte interna e logística da fábrica. As obras são para ampliar a capacidade produtiva?

Não vamos pela quantidade. O que pretendemos é otimizar o aproveitamento do espaço, para sermos mais eficientes, melhorar as condições de trabalho, pois passamos todos aqui a maior parte da nossa vida. O nosso objetivo não é

Exatamente. Não nos interessa ser grandes. Queremos continuar a ser pequenos mas muito flexíveis com produtos de grande qualidade de modo a satisfazer os nossos clientes que estão sempre a pedir-nos a lua :-) E como é que conseguem entregar-lhes a lua?

Temos sempre investigação e produtos novos - e uma cultura de permanente inovação e criatividade, para diversificar e podermos sugerir-lhes coisas diferentes. Além de tecidos, na sua maioria para banho, a Lemar também fabrica fraldas. É um segmento interessante?

Sim É um negócio que vem do tempo do meu avô e que mantenho porque está estabilizado. Conseguimos racionalizá-lo. Com novas máquinas fazemos o mesmo que fazíamos dantes com mais máquinas. E temos produtos com uma qualidade excelente que agrada muito a clientes importantes. Como por exemplo...

Nas fraldas, vendemos para a Zara Home e a John Lewis, entre outros. E nos tecidos para carrinhos de bebé temos clientes como a Chicco ou a Peg Perego. O nosso produto não é o barato - distingue-se pela qualidade. Esse é o nosso posicionamento. A concorrência pelo preço dos asiáticos não vos afetou?

Mesmo antes de se falar disso e da adesão da China à OMC que nós já comprávamos os fios mais caros para fabricarmos os melhores tecidos, que levam na etiqueta, como garantia, o nome das conceituadas marcas que os forneceram.


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.