Gilson o que e feito do seu voto?

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O QUE É FEITO DO SEU VOTO?


Sant'Anna, Gilson Carlos e Amador, Luis Filipe Chateaubriand Baracho Ferreirinha. "O que é feito do seu voto?" - Rio de Janeiro - Ed. Cervantes, 1998 1. Sistema Eleitoral - Brasil. 2. Partidos Políticos - Brasil. 3. Eleições - Brasil. Protocolo / SBN - 010503/98

CDD - 329.981

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Gilson Carlos Sant'Anna é Doutor em Direito Econômico, Mestre em Administração Pública e em Educação. Luis Filipe Chateaubriand Baracho Ferreirinha Amador é Mestre em Administração Pública e Professor Universitário.


A s s o c i a ç ã o Te i x e i r a d e F r e i t a s

O QUE É FEITO DO SEU VOTO?

Gilson Carlos Sant'Anna Luis Filipe Chateaubriand Baracho Ferreirinha Amador Ilustrações: Reginaldo Barbosa dos Santos e Marco Antônio dos Santos



Introdução Um dos problemas cruciais no Brasil é a falta de identificação entre cidadãos e políticos. A insatisfação está ligada ao sistema político, cheio de distorções, com o qual convivemos. Este estudo não tem a pretensão de se alongar em complexas discussões acadêmicas. Sua finalidade principal é mostrar, de forma simples, como funciona o Sistema Eleitoral Brasileiro, bem como retratar algumas de suas falhas. Analisamos, à luz de algumas informações pertinentes, a lei eleitoral no Brasil e algumas de suas conseqüências, bem como as alternativas possíveis de mudanças. Longe de nós propor tais mudanças. Pretendemos, tão somente, alertar a sociedade da importância de discutir este tema, por vezes relegado ao esquecimento da classe política, a quem interessa deixar tudo como está.


O que é Sistema Eleitoral? Em países com eleições regulares, o povo elege seus representantes através do voto. O sistema eleitoral é um instrumento de transformação dos votos em distribuição de cadeiras parlamentares.


A importância do Sistema Eleitoral Um bom sistema eleitoral deve ter como meta o fortalecimento da cidadania e da vontade popular. Quando grupos privilegiados apoderam-se da política partidária, as práticas públicas tendem a favorecer a elite, em detrimento do povo.


Logo, deve-se defender um sistema eleitoral que seja capaz de fazer com que o povo influencie mais o processo polĂ­tico, gerando uma maior solidariedade entre as comunidades democrĂĄticas.


O Sistema Eleitoral Atual Na teoria, temos um sistema eleitoral proporcional. Isto quer dizer que um partido que tiver 10% dos votos deve conseguir 10% das cadeiras do parlamento. Exemplo: S達o Paulo tem 70 cadeiras para deputado federal. Se o partido X tem 10% dos votos de S達o Paulo, tem 10% das cadeiras, ou seja, sete cadeiras.


Na prática, entretanto, uma série de distorções faz com que, ao nível nacional, não tenhamos um sistema eleitoral proporcional. Exemplo: Na eleição para deputado federal de 1994, tanto o PFL quanto o PT tiveram cerca de 12.8% dos votos do eleitorado nacional. Desta forma, ambos os partidos deveriam ter um número de deputados igual ou, pelo menos, muito próximo (cerca de 66 deputados). Curiosamente, o PFL elegeu 89 deputados, ao passo que o PT elegeu 49. Logo, o PFL conseguiu a obtenção de 40 deputados a mais que o PT. Por que isto acontece? É o que veremos a seguir.


As Distorções do Sistema Eleitoral O sistema eleitoral não é totalmente proporcional porque o número de deputados eleitos em cada Estado não respeita a proporção nacional. Isso decorre do artigo 45, parag. 1º da Constituição Nacional, que determina que nenhum Estado pode ter menos de oito deputados e mais de setenta. Exemplo: Se São Paulo tem mais de 250 vezes a população eleitoral de Roraima, deveria ter uma representação cerca de 250 vezes maior. Só que São Paulo elege 70 deputados e Roraima, 8. Logo, o voto de um cidadão em Roraima vale muito mais que o voto de um cidadão residente em São Paulo.


O sistema eleitoral não é totalmente proporcional porque as coligações de partidos entre si distorcem a vontade do eleitor. Exemplo: Nas eleições para deputado federal de 1994, o PC do B deveria eleger pela proporção verdadeira - seis deputados. Ao se coligar com outros partidos em vários Estados, conseguiu uma representação de 10 deputados, sendo, portanto, um partido com perfil de "carona eleitoral".


O sistema eleitoral não é totalmente proporcional porque o Senado Federal - normalmente uma casa conservadora - privilegia a representação igual entre todas as unidades da Federação. Exemplo: Tanto o Amapá quanto o Estado de Minas Gerais possuem três senadores, muito embora a população eleitoral mineira seja muito superior. Logo, senadores de Estados com pouca população eleitoral têm o mesmo poder absoluto que os senadores de Estados mais populosos e, obviamente, possuem maior poder relativo.


O sistema eleitoral não respeita a vontade popular, uma vez que nega acesso à representação aos pequenos partidos, marginalizando as minorias políticas. Exemplo: Em uma eleição com 2,5 milhões de votos válidos para eleger 25 deputados, o nosso sistema determina a necessidade de um partido ter, ao menos, 100 mil votos para eleger um deputado (2,5 milhões/25 cadeiras = 100 mil votos). Os 100 mil votos são o coeficiente eleitoral, e constituem "cláusula de barreira" a quem não atingir este patamar. Logo, o partido que tem 99.999 votos não tem direito a representação.


O sistema eleitoral não favorece a boa representação da sociedade, uma vez que os votos de um determinado membro de um partido auxiliam a eleição de outro sujeito do mesmo partido. Exemplo: Em uma eleição em que o coeficiente eleitoral é de 100 mil votos, um partido com 200 mil votos elege dois deputados (200 mil/100 mil = 2 cadeiras). Se eu votei no candidato mais votado, com 140.000 votos, e ele defendia a ecologia, ajudei a eleger o segundo candidato mais votado, que se opunha ao controle ambiental pelo poder público.


O sistema eleitoral não favorece a coesão partidária porque transforma colegas de partido em inimigos na luta pela representação parlamentar. Exemplo: Se um partido tem, pelo seus votos, direito a eleger cinco deputados, os cinco eleitos serão os deputados mais votados do partido. Logo, todos os candidatos do partido se digladiam para chegar aos cinco primeiros lugares.


As Alternativas de Representação Em função do quadro caótico existente na representação eleitoral atual deve-se propor mudanças estruturais para o sistema eleitoral. Mas existem várias propostas para reformar o sistema político: viés proporcional reavaliado, sistema distrital e sistema distrital misto. Em que direção se deve caminhar?


Sistema Distrital O país é dividido em distritos, e o candidato a deputado federal mais votado no distrito é eleito. Exemplo: O Brasil poderia ser divivido em 500 distritos, com a eleição de um deputado federal em cada distrito (o mais votado), totalizando 500 deputados federais. Assim, se um distrito tiver um total de 200.000 eleitores apenas o candidato mais votado se elege, gerando a exclusão de outras correntes políticas.


A principal vantagem do sistema distrital é que favorece a formação de maiorias partidárias no Parlamento, viabilizando a governabilidade. Como só se elege um deputado por distrito, a tendência é que os partidos maiores elejam este deputado, e a representação dos partidos maiores torna-se mais elevada.


A desvantagem do sistema distrital é que não considera em nenhum momento a proporção de votos de cada partido, o que enfraquece os referidos movimentos sociais. Exemplo: Um partido que tenha 51% dos votos em todos os 500 distritos elege 500 deputados federais. Logo, com 51% dos votos nacionais tem 100% da representação parlamentar.


Sistema Proporcional O valor do voto de cada cidadão é aproximadamente igual, já que eles elegem um percentual de cadeiras coerente com seu percentual de votos ao nível nacional. Exemplo: O partido Z, com 30% dos votos nacionais, elege 30% das cadeiras do parlamento, ou seja, 150 deputados.


A principal vantagem do Sistema Proporcional Ê que, ao se dar igualdade aos partidos existentes, se incluem na representação todos os setores sociais relevantes.


Para alguns, a principal desvantagem do sistema proporcional é que não possibilita a formação de uma maioria parlamentar que auxilie a governabilidade por parte do Poder Executivo. Cabe salientar, entretanto, que democracia de verdade só se constrói a partir do debate de forças políticas heterogêneas.


Sistema Distrital Misto Combina o sistema distrital com o sistema proporcional. Exemplo: Para eleger 500 deputados no Brasil, o eleitor daria dois votos: um para deputado de sua preferência no distrito, o outro na legenda partidária de sua preferência. Assim, poder-se-ia ter 250 distritos elegendo um deputado cada um (250 deputados) e mais 250 vagas para um deputado completar a proporção de votos de cada partido. O partido A - que tem 10% dos votos nacionais - deve ter 50 deputados (10% de 500 deputados); se eleger 8 deputados nos distritos, 42 entram via eleição proporcional; se eleger 35 deputados nos distritos, 15 entram via eleição proporcional; e assim por diante.


A principal vantagem do sistema distrital-misto seria a que permitiria a conciliação de uma representação proporcional com um maior controle pelos eleitores sobre a atuação dos deputados de seu distrito. Exemplo: Um deputado distrital da Favela da Rocinha poderia defender os interesses da comunidade na Câmara dos Deputados sem se alterar a proporção de cadeiras de cada partido.


A principal desvantagem do sistema distrital misto é que, ao propor a eleição de apenas um deputado por distrito, empobrece a lógica eleitoral via a eleição de apenas uma opinião dominante. Exemplo: O deputado mais votado da Favela da Rocinha se elegeu, com 51% dos votos, enquanto que os outros candidatos da região foram preteridos. Dessa forma, 49% dos eleitores tiveram seus interesses excluídos da representação.


Conclusão A maior parte da população brasileira não se sente representada pelos seus políticos. A solução para a crise na democracia de nosso país exige o aprimoramento do sistema político, sendo necessária uma discussão ampla e democrática de nosso sistema eleitoral. O sistema proporcional no Brasil ficou empobrecido por causa de alguns critérios que o acompanham, os quais fazem com que um sistema chamado de proporcional seja, na verdade, desproporcional. O equacionamento de algumas distorções aqui apontadas pode contribuir para a adoção de um sistema político que verdadeiramente represente os interesses e os anseios refletidos na riqueza de opiniões contidas no domínio popular. Nós, brasileiros, precisamos fazer a nossa parte e conhecer melhor as propostas de mudança do sistema político que estão sendo debatidas no Congresso Nacional.



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