A Verdadeira História da Cachaça - Prefácio

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MESSIAS S. CAVALCANTE

A VERDADEIRA HISTÓRIA DA

CACHAÇA


Ao menos se acreditarmos no silêncio dos documentos, a difusão da aguardente, se ocorreu logo, ficou por algum tempo encoberta por outras tarefas mais imperiosas da produção açucareira, possivelmente restrita ao consumo doméstico. Descrições de cronistas, missionários, mapas de arrecadação fiscal, relatórios administrativos da situação dos engenhos, e mesmo as leis que tratavam de regular o comércio e a distribuição sobre o açúcar, no início do século XVI e ainda nas primeiras décadas do século XVII, não mencionam a existência de aguardente, nome que aparece associado à destilação. Luciano Figueiredo & Renato Pinto Venâncio (2005), Águas Ardentes: O Nascimento da Cachaça232*

Neste caso ele (o rum) foi provavelmente inventado nas ilhas espanholas de Hispaniola ou Cuba (onde foi chamado de aguardiente ou ‘água ardente’) ou por colonos portugueses no litoral do Brasil (onde seria depois chamado cachaça). Wayne Curtis, And a Bottle of Rum197

*Os números sobrescritos correspondem ao número da Fonte (pág. 503-556) de onde foi obtida a respectiva informação.



SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO ............................................................... ............11 BEBO PORQUE É LÍQUIDO! .......................................................... 15 Até bicho bebe! ................................................................. 20 Fermentadas e destiladas ................................................ 22 Paixões nacionais .............................................................. 24 Carnaval ......................................................................... 25 Futebol ........................................................................... 26 Cachaça .............................................................................. 31 Resumo ............................................................................... 34 QUEM INVENTOU A CACHAÇA? .................................................. 35 De onde vem o nome cachaça? ..................................... 35 Onde está a certidão de nascimento? .......................... 53 Vai ver que foi o índio! ................................................... 57 Bebidas dos índios ........................................................... 61 Será que foi o africano? .................................................. 81 Cachaça/Escambo ............................................................ 84 A honra é do europeu? ................................................... 86 Nasceu ou não no século XVI? ..................................... 90 Parece que nasceu no século XVII ................................ 97 Resumo ............................................................................. 106 CACHAÇA: TRANSTORNO DISSOCIATIVO DE IDENTIDADE ............. 107 Cachaça e rum – Irmãos gêmeos? ................................ 107 Uma cachaça para cada gosto ........................................ 114


Envasamento da cachaça ............................................... 119 Cachaça no barril ............................................................ 120 Cachaça na garrafa .......................................................... 127 Pensa que é fácil fazer uma boa cachaça? .................. 137 Cachaça e pão de queijo ................................................. 141 Eta cachaça ruim da peste! ............................................ 143 Artifício para driblar barreiras ..................................... 158 Resumo ............................................................................. 164 TERRA (DA CACHAÇA) À VISTA! ................................................. 165 Cachaça a bordo .............................................................. 165 Adivinha quem chegou para nos jantar? ..................... 166 Quem descobriu o Brasil? ............................................. 169 Se beber não navegue! .................................................... 178 Piratas .............................................................................. 181 Índios na idade da pedra ................................................ 186 Mandioca .......................................................................... 189 A gentinha que veio...! .................................................... 191 Bicho de pé ....................................................................... 192 Resumo ............................................................................. 197 ENGENHOS DE AÇÚCAR .............................................................. 199 Implantação dos engenhos no Brasil ........................... 200 Escravos no engenho ...................................................... 204 Papéis dos engenhos ....................................................... 208 Açúcar colonial ................................................................ 211 Inimigos do canavial ....................................................... 216 Proibir ou taxar? ............................................................. 217 Decadência dos engenhos .............................................. 228 Engenhos de rapadura .................................................... 236 Cangaceiros ..................................................................... 238 O sufoco dos alambiques ............................................... 243 Setor sucroalcooleiro ..................................................... 246 Resumo ............................................................................. 252


CACHAÇA NO ALTAR .................................................................. 253 Cultos indígenas ............................................................. 262 Cultos africanos ...............................................................264 Cachaça e inquisição ...................................................... 266 Resumo ............................................................................. 273 CACHAÇA DESBRAVADORA ......................................................... 275 Desbravando pela água .................................................. 277 Desbravando a pé ............................................................ 290 Bandeirantes ................................................................... 294 Desbravando com boiadas ............................................. 297 Tropeiros .......................................................................... 300 Viajantes e outros escribas ............................................ 307 Resumo ............................................................................. 316 DATAS E LOCAIS DA CACHAÇA .................................................... 317 Resumo ............................................................................. 338 CACHAÇA NAS LETRAS ............................................................... 339 Resumo ............................................................................. 501 FONTES .................................................................................... 503 ÍNDICE REMISSIVO ..................................................................... 557



APRESENTAÇÃO

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uito já se estudou e se escreveu sobre bebidas alcoólicas, versando sobre suas origens e suas interrelações com o ser humano. Assim, de forma sucinta, este tema é abordado inicialmente. Uma vez que o futebol, o carnaval e a cachaça fazem parte importante da cultura brasileira eles são em seguida ligeiramente mencionados como um aperitivo antes de ser servido o prato principal, ou melhor, a bebida principal, que é a cachaça. O próprio termo cachaça não encontra unanimidade quanto à sua origem, não obstante a sua aplicação à bebida alcoólica derivada da cana de açúcar seja razoavelmente bem documentada, tendo sua genealogia associada inicialmente às escumas originadas durante o processo da produção do açúcar. Apesar de fazer parte do cotidiano do brasileiro há séculos, há poucas certezas sobre as origens da cachaça e muitos que escrevem sobre o assunto são obrigados a deixar, por ausência de suporte documental, muitas lagunas. Alguns preenchem estes vazios com su-


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posições razoáveis, calcadas em evidências históricas, enquanto outros apelam para achismos, baseando-se em fatos desprovidos de comprovação. Outros afirmam que foi criada em determinado local e em determinada época, sem apresentar registros históricos que corroborem suas afirmações. Pode-se observar que em todos os escritos sobre a cachaça, consta que foi criada no Brasil na primeira metade do século XVI. Será que isto é uma verdade incontestável ou mero nacionalismo? Documentos históricos permitem rastrear o nascimento da cachaça apenas a partir da mesma época do nascimento do rum. Enquanto Portugal estava sob o domínio da Espanha, de 1580 a 1640, que coincide com o aparecimento da cachaça e do rum, navios espanhóis aportavam tanto nas costas brasileiras como em outras colônias espanholas. Poderia a aguardente de cana de açúcar, cujo nome variava de acordo com a colônia que a produzia, ter sido gerada fora do Brasil? O objetivo do presente levantamento é tentar lançar alguma luz sobre alguns aspectos ainda obscuros como, por exemplo, quando, onde e quem inventou a cachaça. Para introduzir estes temas, a presença de bebidas alcoólicas no cotidiano do europeu e nas embarcações que singravam os mares é apresentada. Na tentativa de encontrar respostas a estas questões foi efetuado um pequeno histórico sobre o descobrimento do Brasil e a implantação de engenhos de açúcar, o berço da cachaça. A ascensão dessa primeira indústria que progrediu na colônia, sem contar a da extração do pau-brasil, e sua importância como geradora de povoações, que depois progrediram para cidades, bem como a importância dos senhores de engenho ao longo dos séculos são delineadas. Como atores dessa odisséia, que é a criação da cachaça, havia os índios, os escravos africanos e os colonizadores europeus, todos versados em bebidas alcoólicas. A possibilidade de cada um destes povos ter descoberto o vinho de cana (caldo de cana fermentado), que deu origem à cachaça, é aventada.


A verdadeira história da cachaça

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Inicialmente a cachaça e o rum eram uma só bebida, produzidas com as mesmas matérias primas e pelos mesmos métodos. As dúvidas que ainda pairam sobre os primeiros passos dados para a criação do rum são as mesmas da cachaça. Com o tempo, enquanto o rum manteve como fonte praticamente todas as matérias primas originais, na produção da cachaça começou-se a utilizar apenas uma delas, o caldo de cana fermentado. Os motivos para esta especialização são discutidos. As razões para a tentativa do Brasil em tentar impor ao mundo o conceito de que a cachaça é uma aguardente distinta do rum também são aventadas. O desbravamento do sertão brasileiro feito a pé e por utilização de canoas em busca de riquezas minerais e escravos, assim como por boiadeiros à procura de novos pastos para o gado e tropeiros transportando mercadorias para os povoados, é descrito, sempre tendo em vista a presença da cachaça. Os papéis desempenhados por estes grupos de pioneiros na criação de povoados e cidades são descritos. É também feita uma abordagem sobre o papel da Igreja Católica, na época colonial, no que se refere à cachaça. Embora combatesse práticas religiosas e de costumes que iam contra seus ensinamentos, inclusive o uso de bebidas alcoólicas, vários religiosos possuíam engenhos que produziam cachaça. Em muitos casos a cachaça servia como instrumento para a catequização dos índios. Um dos capítulos contém, cronologicamente, datas relevantes para a história da cachaça. Em outro, algumas palavras relacionadas à cachaça e obtidas de livros de ficção como contos e romances, bem como de relatos históricos e sites da internet são apresentadas alfabeticamente. As informações foram obtidas através de escritos de piratas, colonizadores, invasores, pesquisadores, historiadores, religiosos e livros que abordam o assunto. Artigos, obras e blogs presentes na internet foram também de grande ajuda. Além de apresentar os registros deixados por essas obras sobre fatos relacionados à cachaça,


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assuntos paralelos com conotações curiosas ou de interesse foram também incluídos. Na maioria das vezes, os relatos e opiniões dos autores consultados são transcritos literalmente uma vez que este recurso empresta um colorido adicional à narrativa. Os números sobrescritos, por exemplo o 26 em: “Jânio Quadros, Orador de outros tempos26” (pág. 15), correspondem ao número da Fonte (pág. 503-556) de onde foi obtida a respectiva informação. No final, um Índice Remissivo detalhado é apresentado para facilitar a busca dos assuntos. Meu profundo e sincero agradecimento a Maria Cláudia Curimbaba pelas palavras de incentivo ao longo da elaboração deste livro e pelo gentil patrocínio do mesmo. Messias S. Cavalcante


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