Revista Agrotejo

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Sara Pelicano Jornalista

PORTUGAL FICOU PRESO ÀS REGRAS DA POLÍTICA AGRÍCOLA COMUM (PAC) E DEIXOU DE TER UMA POLÍTICA AGRÍCOLA. O SOCIÓLOGO FALA DA NECESSIDADE DE UM ESTADO MAIS «DETERMINADO» E COM ESTRATÉGIA.

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ANTÓNIO BARRETO CONSIDERA A FLORESTA E O VINHO OS SECTORES MAIS COMPETITIVOS. NUMA CONVERSA DESCONTRAÍDA, MAS DE DISCURSO CRÍTICO E CONSTRUTIVO, O SOCIÓLOGO DIZ SER URGENTE CRIAR UMA ADMINISTRAÇÃO FLORESTAL FORTE QUE ORGANIZE A FLORESTA E A TORNE COMPETITIVA. É «INIMAGINÁVEL», DIZ, QUE PORTUGAL ESTEJA A IMPORTAR MADEIRA DE PINHO. URGE AINDA UMA APOSTA FORTE DA FORMAÇÃO E NA INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA. O FUTURO AGRÍCOLA NACIONAL, O ENTREVISTADO VÊ-O CONSTRUÍDO POR PESSOAS URBANAS PORQUE AS POPULAÇÕES NÃO VÃO VOLTAR À TERRA.

ENTREVISTA AO SOCIÓLOGO ANTÓNIO BARRETO “A POLITICA AGRÍCOLA PORTUGUESA QUASE NÃO EXISTE, OU TEM MUITOS LIMITES” AGROTEJO: Como descreve o mundo rural de que elas próprias trabalhavam as suas terras, seja dos assalariados, que trabalhavam as terhoje? São territórios desenvolvidos? ras dos proprietários, era semelhante no país António Barreto: Era possível, talvez há 40, inteiro, país rural. Nessa altura, havia várias 50 anos falar do mundo rural onde as con- pessoas, sociólogos, professores que falavam dições de vida, independentemente da região muito de um Portugal dual. Portugal sociedaonde as pessoas viviam, Trás-os-Montes, Beiras, de dualista, isto é o mundo urbano e o mundo Alentejo, Algarve, eram no essencial um modo rural. E o mundo rural tinha indicadores parede vida rural e agrícola, que são coisas diferen- cidos de Norte a Sul. Talvez o Sul tivesse um tes ainda que muito parecidas. A organização pouquinho mais de alfabetização, talvez no das aldeias, seja das famílias camponesas, em Norte houvesse um bocadinho mais de cren-

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ças religiosas. A dimensão da família era um bocadinho maior no Norte do que no Sul. Havia pequenas diferenças, com certeza, mas no essencial os costumes, os hábitos no mundo rural eram muito parecidos no país inteiro. Isto acabou. O país diversificou-se muito por razões várias. Muita gente sai do mundo rural para as pequenas vilas, pequenas e grandes cidades do litoral. Se olharmos ao que aconteceu em 50 anos, grande parte da população deslocouse para as cidades e para o litoral. E a maneira como cada região agrícola, cada região rural se adaptou ou evoluiu tornou-as diferentes umas das outras. A organização do mundo rural no Norte intensivo, regado, Norte de pequena e média propriedade é hoje muito diferente do que se vê no interior de Trás-os-Montes, interior das Beiras ou no Alentejo. O mundo rural é muito diversificado hoje.

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AGROTEJO: As vias de comunicação também alteraram muito este mundo rural… A.B.: Há pouco tempo alguém me desafiou a enumerar quais os factores de mudança neste últimos 30 anos. Tinha de enumerar dez. É difícil, mas sei que entre as cinco primeiras está a mudança nas distâncias. Eu recordo-me que vir a Lisboa de Vila Real era um dia inteiro. Tinhase de preparar almoço, merenda, jantar, onde se ficava em Lisboa. Ao Porto era quase a mesma coisa. As estradas alteraram profundamente o

país, alterou as instituições, a vida das famílias, a organização das empresas, a colheita dos produtos. Em muitos casos, faz-se uma empresa e não importa a onde. O sítio deixou de ser importante. Por isso em muitos casos você tem fábricas de automóveis, em Lisboa, em Setúbal, em Vendas Novas, em Portalegre. Pode haver em qualquer sítio, o mesmo na agricultura. A última grande industrialização na agricultura que conhecemos, creio eu, foi indústria do tomate. Em pouquíssimos anos apareceram dezenas de fábricas de concentrado de tomate, plantamos milhares de hectares no Ribatejo e no Alentejo. Neste caso faz sentido a indústria estar ao lado das plantações. Mas hoje você monta a sua indústria onde lhe apetece. O Douro hoje já não se faz no próprio sitio, leva-se as uvas para os grandes lagares, para grandes adegas. Muitas vezes andam 50, 60 quilómetros. Não existe um mundo rural homogéneo, o mundo rural e agrícola é muito diversificado, uma boa parte do mundo rural está integrado no tecido urbano, pelas estradas, pelas instituições, pela televisão, pela internet, pela escola, pela rádio, pelos correios, pelos serviços de saúde.

importância na produção agrícola, isso é uma coisa, mas teve também no mundo rural. Houve uma grande oscilação nos produtos, a vinha já foi recompensada, castigada, penalizada, arran-

AGROTEJO: O mundo agrícola é hoje mais cada e subsidiada para não se produzir. O olival competitivo e inovador? a mesma coisa, o girassol, o algodão, o milho de regadio, tudo isto já teve períodos altos e A.B.: Há talvez duas mil empresas agrícolas períodos baixos, muitas vezes com dois anos de que são boas empresas, que trabalham bem, intervalo. O que hoje era pago para ser plantaproduzem bem para o mercado interno, pro- do, daqui a dois anos era pago para ser retirado. duzem para a exportação, produzem para a Isto criou instabilidade. Parece que o principal indústria agrícola. Essas duas mil empresas po- objectivo era retirar população da agricultura. derão talvez produzir 50% produção alimentar Historicamente foi o que aconteceu, só não sei portuguesa, o que é muito, dado que são muito se estava escrito. Isto teve várias consequências, poucas. São muito poucas mas eficientes. O que como não foi algo que se pensou, reflectiu e quer dizer que as outras produzem pouco e pro- definiu uma estratégia, isto teve consequências: duzem mal. As restantes 90 mil, produzem fora a instabilidade no mundo agrícola. O mundo de horas, produzem sem qualidade, não produ- agrícola e mundo rural precisa de alguma eszem nos prazos que deviam, seja para mercado tabilidade porque não se plantam videiras para interno, seja para o externo. Na conjugação da amanhã, plantam-se videiras para daqui a 30 mudança da agricultura e diversificação, a agri- anos; não se plantam oliveiras para daqui a 15 cultura é hoje maior do que há 50 anos. Em con- dias; não se arrancam arbustos ou árvores para jugação com a mudança do habitat. O habitat colheitas anuais a pensar no dia seguinte. Esta mudou radicalmente. instabilidade foi má. Foi positivo ter permitido a retirada da população mais idosa. No entanto, AGROTEJO: Uma mudança que, de algum modo, foi mau foi não tomar providências do ponto de vista da reconversão das explorações e sobretué resultado da Politica Agrícola Comum (PAC)… do da formação profissional. A.B.: Depois houve a PAC, a industrialização da agricultura. A política da PAC teve muita AGROTEJO: Em Portugal a população ligada importância no mundo rural português. Nor- ao sector agrícola ainda é significativa e desemmalmente só se pensa que a PAC teve muita penha um papel importante em termos da ocu-

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pação do território, em termos sociais e económi- muito importante que o mundo rural mantenha cos. Como caracteriza esta população? esta diversidade de situação e que as pessoas que têm outras profissões mantenham esta A.B.: Hoje há muita gente que vive no mundo possibilidade, por razões económicas, culturais, rural mas não tem profissões agrícolas, faz outras ambientais, biológicas, diversidade. A minha coisas. Estou a pensar por exemplo na região do avaliação é positiva e negativa. É positiva numa Douro, onde teoricamente ou legalmente há 35, coisa: os cidadãos que vivem no mundo rural, 40 mil produtores de vinho do Douro e Porto. com excepções eventuais, são cidadãos de pleno Dizer que todos eles são agricultores, lavradores, direito, o que não eram. Hoje, não há diferenças é uma brincadeira. A esmagadora maioria, talvez notáveis na esperança média de vida entre o 70% ou 80% são pessoas vivem de outras coi- mundo rural e mundo urbano. Dizem, mas não

Sul, entre continente e regiões autónomas, mas entre rural e urbano directamente não há. Existem muitas situações em que não há grandes diferenças. Isso é um bom sintoma. O mundo rural são cidadãos, têm os mesmos direitos, a facilidade logística, a facilidade de infra-estruturas que permitem que se exerçam os direitos. Por isso, quando agora há eleições, os comícios têm de ir ao mundo rural buscar esses votos. A população do mundo rural é mais atrasada. Os jovens estão alfabetizados, mas fazem os mínimos, seis anos, com sorte, nove anos, 12 anos raramente. Universidade é muitíssimo pouco. Ai há pressão social, pressão do meio, a distância, embora esta hoje não seja um factor crucial. Há em Vila Real, Évora, cidades universitárias que estão relativamente próximas. Há professores da universidade de Évora que vivem em Lisboa. De Vila Real que vivem no Porto. Alunos em Évora que vivem em Lisboa. Se isto é verdade assim, ainda é mais verdade se for em Arronches, no Divor que são localidades ainda mais perto. Mas nada disto foi pensado.

AGROTEJO: E onde fica a agricultura neste «novo» mundo rural?

sas, da segurança social às vezes, da emigração, do comércio, da função pública, do trabalho, serviços e por cima disso têm pequenas parcelas de terra. Eu não estou a desprezar estas pessoas, é

A.B.: Perdeu-se totalmente de vista a ideia de criar novos agricultores, novos lavradores, esperou-se pura e simplesmente que as famílias se reproduzissem como era antigamente. Hoje em dia para se ser um bom agricultor é preciso ter formação, ter base, escola secundária, formação de agricultura, de técnicas agrícolas, para já não falar de licenciatura, mestrado, doutoramento, porque não? Há muita gente em Portugal que consome produtos israelitas que são muito bons, de excelente qualidade, feitos em excelentes condições. Estes produtos frequentemente são produzidos por doutorados em agronomia. É essencial que a população agrícola seja formada. Pensou-se em Portugal, talvez, que a população agrícola, do lavrador, se faz por hereditariedade. É perfeitamente inimaginável. Note, em Portugal há alguns casos, poucos, mas na Suíça, no Norte de Itália, na França, há casos de pessoas que sendo urbanas de origem são agricultores e vão com frequência à terra. Não são só proprietários, são agricultores mesmo. Estuhá saúde no mundo rural. Não há os mesmos daram, os pais são da cidade, ou mudaram-se cuidados de saúde, mas há mais saúde, há me- na cidade. São urbanos mas são agricultores na nos doenças. E isto compensa. Há diferenças de sua vida profissional. mortalidade, de esperança de vida entre Norte e AGROTEJO | UNIÃO AGRICOLA DO NORTE DO VALE DO TEJO

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AGROTEJO: Não houve um pensamento estra- ro. Um bicho que já lá está há 40 anos. tégico neste sector? A.B.: A política agrícola portuguesa quase não existe, ou tem muitos limites. Qualquer coisa que o Estado queria fazer na agricultura, aparece a PAC e não pode subsidiar ou não pode isto, ou aquilo. Há algumas coisas que percebo. Mas internamente devíamos ter lutado por mais autonomia e devíamos ter tido já algumas ideias. Tivemos 30 anos em que podíamos ter feito mais regadio, atraia mais população, pessoas que queiram fazer daquilo vida. Na formação, Portugal tinha toda a margem que quisesse, não era preciso autorização da União Europeia para nada, podia fazer o que entendesse. E não fez formação em comercialização dos produtos agrícolas, na industrialização. Excepto no tomate mas isso já lá vão 40 ou 50 anos. Portugal não fez nenhum esforço para a investigação científica, na industrialização dos produtos agrícolas. 36 Portugal fez muito pouco esforço ou nenhum no fito sanitário. Nós temos o maior montado do mundo, o maior produtor de cortiça do Mundo e só há 15 dias é que apareceu um instituto que vai investigar o bicho que está a matar o sobrei-

exportar, estamos a importar! Só agora é que Portugal, talvez, fique auto-suficiente em azeite, o que também é inimaginável. Nós exportamos, mas precisamos de importar porque não chega para o mercado interno. Nestes dois, três anos vai ser auto-suficiente em azeite. Esperemos que por muito anos. Isto tudo foi muita negligência, muito deixar correr, não previsão, não estratégia para integração na União Europeia. E a ausência de estratégia para reconversão da agricultura portuguesa e do pessoal da agricultura. Tudo isto porque se viveu pelo fascínio da cidade. A indústria é que é bom. Nós fizemos uma espécie de trade off com a União Europeia. AGROTEJO: O mesmo está a acontecer com o Recebemos tudo o que podia ajudar às estradas, nemátodo no Pinheiro… à indústria, à energia, e em troca demos uma área de terra. A.B.: No pinheiro é uma coisa terrível. Nós não estamos à altura da doença do pinheiro. Nós estamos a importador pinheiro. Inimaginável quando tínhamos uma das maiores manchas de pinho, “NÓS ESTAMOS A IMPORTADOR PINHEIRO. temos boas condições em quase todo o país INIMAGINÁVEL QUANDO TÍNHAMOS UMA para a produção. Estamos a importar milhares DAS MAIORES MANCHAS DE PINHO, de toneladas para fazer móveis, para construção TEMOS BOAS CONDIÇÕES EM QUASE civil. Isto é impensável! Num dos raros produtos TODO O PAÍS PARA A PRODUÇÃO.” em que Portugal pode ser auto-suficiente e até

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AGROTEJO: A contínua falta de investimentos nestes territórios tem levado a uma migração massiva para os centros urbanos. Quais os impactos futuros destes movimentos? A.B.: Tem impacto no plano económico. Se nós produzimos muito mais produtos agrícolas e alimentares, produzir para o que necessitamos, tínhamos uma balança um bocadinho mais equilibrada. Estamos a importar uma parte enorme da nossa alimentação e matérias-primas agrícolas para a indústria. O segundo impacto, que é a meu ver o pior, porque é o de mais longo prazo é o abandono. Eu não tenho oposição nem filosófica, nem moral, nem política, nem social, com o despovoamento. Em Portugal toda a gente rosna contra o despovoamento. A agricultura moderna faz-se muito em regiões pouco povoadas, além disso, a nossa principal vocação é a floresta. A floresta por natureza é despovoada. O que eu queria é que Portugal não fosse um país abandonado. Portugal está em vias de despovoamento e de abandono e este é que é trágico. Para ter grandes manchas de montado, de pinheiro, de carvalhos, de soutos, em grande parte do país essas regiões precisam ser preservadas e quanto menos povoadas melhor. Tornam-se mais produtivas, estão mais protegidas, com menos incêndios. Não tenho problema com o despovoamento se houver cuidado, protecção, serviços florestais. Das coisas mais graves que se passou em Portugal foi não ter uma administração florestal. Acaba-se com muita coisa, mas criar alguma coisa é que não se faz. AGROTEJO: O que urge fazer? A.B.: Tem de se fazer uma poderosíssima administração florestal, com poderes políticos, poderes legislativos, poderes económicos, financeiros, científicos. Uma administração que tivesse a capacidade de pôr na ordem os proprietários da floresta que são descuidados, não limpam, não tratam, não protegem, não criam, não contribuem. Uma administração florestal que tivesse capacidade de melhor regulamentar, melhor repartir as áreas, criar melhores protecções contra incêndios. Nós podemos minimizar muito os incêndios com uma nova estrutura florestal, novos acessos e um mundo, que não importa nada que seja despovoado. O que preocupa é o abandono de pessoas, de actividades económicas, de interesse científico. A Escócia é um modelo. Sei

que o exemplo não é comparável pelo clima, mas a Escócia tem hoje dezenas de milhares de hectares seguidos em que não há uma casa, a não ser a dos serviços florestais, casas de protecção, mas não está abandonado. As espécies estão ordenadas, o chão é limpo, a floresta é limpa regularmente, aquilo produz riqueza para proprietários, para pessoas que lá vivem, pessoas que visitam, porque há um mundo rural que é essencial para a cultura, para o lúdico, a estética. O ser humano precisa disto também. O ser humano que conhece isso é mais rico, mais interessante.

“TEM DE SE FAZER UMA PODEROSÍSSIMA ADMINISTRAÇÃO FLORESTAL, COM PODERES POLÍTICOS, PODERES LEGISLATIVOS, PODERES ECONÓMICOS, FINANCEIROS, CIENTÍFICOS. UMA ADMINISTRAÇÃO QUE TIVESSE A CAPACIDADE DE PÔR NA ORDEM OS PROPRIETÁRIOS DA FLORESTA QUE SÃO DESCUIDADOS, NÃO LIMPAM, NÃO TRATAM, NÃO PROTEGEM, NÃO CRIAM, NÃO CONTRIBUEM.”

para alimentar refinarias. A água ia atravessar o Alentejo todo em pipelines para ir alimentar Sines; em segundo lugar para produzir electricidade; em terceiro para abastecer Alentejo de água que tinha muito meses de seca; em quarto lugar para a agricultura. Era a última vocação. A primeira vocação desapareceu porque Sines não é o que era. O sector da electricidade concretizou-se. Conseguiu que uma grande parte do custo de Alqueva fosse paga pela agricultura. Foi o orçamento agrícola que pagou uma grande parte de Alqueva sem retirar o retorno, quem o recebeu foi o sector energético e urbano. Eu tive responsabilidades em 1976, já Alqueva estava em construção, nessa altura conclui que não havia estudos suficientes, nomeadamente nas capacidades e aptidões agrológicas de toda a região. Quando se dizia que Alqueva ia regar 250 mil hectares, as pessoas que fizeram as primeiras viagens comigo á região, os agrónomos, os economistas, diziam talvez 20 mil, 30 mil. Isto alterava a rentabilidade do projecto. Ao que me dizem a água que agora está a ser aproveitada no Alqueva, uma boa parte está a ser utilizada nos olivais ali perto, dizem-me; outra boa parte vai para campos de golfe que vão ser feitos. Parece que já há alguma vinha regada. Eu estou convencido que o aproveitamento agrícola, hidroagrícola da região ainda está muito aquém das suas possibilidades. A agricultura nessa região pode ser feita de qualquer sítio do país, por pessoas de origem urbana ou não, com licenciatura ou não, desde que saiba e queira. Em Alvalade, no Caia, no Divor onde se fez regadio, os ribatejanos e os alentejanos adaptaram-se. É possível ensinar. Quem fez 20 anos de sequeiro pode passar a regadio. Estas coisas conseguem-se com orientação, formação, reconversão, estratégia, desenvolvimento a longo prazo, investigação. O Estado falhou redondamente. 30 anos quase inteiramente perdidos pelas falhas do Estado.

AGROTEJO: Qual o papel das associações locais como fixadoras de populações, no sector AGROTEJO: Temos a floresta ao abandono e agrícola. projectos já feitos, como o Alqueva, subaproveiA.B.: Eu detesto o termo fixação. Um político tados. Quem comentário tece? que se preza e faz um bom comício eleitoral, A.B.: Alqueva é um caso que merecia estu- assim que sai de Lisboa começa a falar em fido, reflexão profunda. A primeira vez, que eu xar as populações nas suas terras. Fixar ao local tenha descoberto, que se falou na barragem onde nasceram, não há nada mais vergonhoso de Alqueva foi em 1964. A barragem foi falada do que isso. Então eu não saia de Vila Real, naspela primeira vez para arranjar água para Sines, ci e fiquei. O melhor que há no mundo não é AGROTEJO | UNIÃO AGRICOLA DO NORTE DO VALE DO TEJO

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poder sair, ir estudar, ir viver e voltar à sua terra se assim entender? Em 1974 conheci pessoas em Trás-os-Montes que nunca tinham o visto o mar, nunca tinham ido a Lisboa. Estas pessoas estavam fixadas. Então e a cultura, a diversificação, o crescimento, o pluralismo. Eu não quero fixar, o que eu quero é não abandonar as oportunidades. Estar constantemente a criar oportunidade para a actividade económica, para vida social, para instituições públicas.

AGROTEJO: O potencial agrícola do país não está aproveitado e muito longe de estar esgotado. Que políticas podem ser implementadas para a captação de gente nova para este sector? A.B.: Talvez a maior falha histórica de Portugal na economia rural, agrícola e primária portuguesa tenha sido a falta de atenção à formação profissional. Os urbanos acham que a agricultura é fácil, tal como a pesca. Vai-se à terra, põe-se 38 lá uma semente na terra e já está. Os urbanos pensam que Portugal tem um excelente clima para a agricultura quando é péssimo, o clima é muito mau, as terras, a geologia, a ecologia, chove na altura errada, não há gelo quando devia haver gelo, não há neve quando devia haver neve, tudo ao contrário. Temos boas condições para a floresta e para o arbusto. E isso nunca foi transformado em política oficial e devia ter sido.

pode dar uma melhor base, melhor almofada. E se fizermos a mesma coisa na pesca, ajuda muito. Nós hoje importamos metade do peixe que comemos o que é mais de um milhão de euros por ano. E já produzimos 100% do que precisávamos. Não é crónico, é um facto com 20 anos. Se nós nestes casos repensássemos, reorientássemos, nos dávamos mais sossego à sociedade portuguesa, ao rendimento dos portugueses, um pouco mais de emprego, um turismo melhor em algumas regiões, melhor aproveitamento dos recursos. As coisas melhoravam, sendo que o futuro Portugal não é a agricultura ou a pesca, o futuro é a indústria, os serviços, é informação, conhecimento, as grandes cidades. O mundo contemporâneo é urbano, não há nada a fazer. É realista pensar que Portugal tem um grande futuro florestal porque existe tudo o que é preciso, é realista que o vinho português pode ser excelente e ter melhor produção no mundo inteiro. Não é realista pensar que as pessoas vão regressar à terra.

AGROTEJO: A competitividade e a inovação do sector agrícola podem promover a captação de «novos povoadores»? A.B.: Este mundo rural não é uma alternativa para toda a gente, para Portugal inteiro não. Pensar que Portugal deve ter uma população agrícola de 10% a 15% é ridículo e é despótico. Os sectores que a meu ver têm melhores aptidões são toda a floresta, apoiar o desenvolvimento da floresta com a criação de uma administração florestal muito forte, muito poderosa porque há muitos proprietários, há milhões de proprietários florestais, é preciso por ordem nisto, criar qualquer coisa de produtivo, de interessante; segundo os sectores arbustivos com o vinho à cabeça, o vinho é a meu ver, o sector de potencialidades e aptidões. Alguma fruticultura, talvez sim. A fruta portuguesa, alguma, nasce, cresce e está pronta para a apanha em altura que não há noutros países. Temos culturas em estufa que podem estar prontas em Janeiro, Fevereiro e Março, e estar na Europa. Isto não resolve Portugal mas

AGROTEJO: A agricultura não pode estar dissociada do mundo rural. Este, pela abrangência de áreas como o turismo, ambiente, diversidade, património, gastronomia, até tem um programa exclusivo, o PRODER, mas com muito pouco sucesso na sua implementação e execução. Que comentários lhe apraz fazer? A.B.: Eu já conheço algumas quintas do Douro, algumas herdades no Sul, em que a actividade turística mais as actividades semi-artesanais

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como compotas, biscoitos, vinhos, azeites, rendem quase tanto como a própria actividade agrícola. Isto é excelente. Isto deve ser desenvolvido o mais possível. Não sei se são necessárias ajudas do Estado, ajudas europeias. O que eu gostava é o Estado que não emperrasse, não proibisse, não criasse obstáculos e dificuldades, que deixasse correr.

AGROTEJO: O Estado é um elemento fundamental? A.B.: O Estado nalgumas coisas é determinante. No reordenamento florestal é importantíssimo, na criação de uma administração florestal muito poderosa é importantíssimo, no desenvolvimento da ciência que é indispensável para o mundo, para a árvore, para a floresta. As universidades, são poucas as que se interessam pela agricultura em Portugal, estão a enfraquecer porque os professores de há 20/30 anos que estão a ficar velhos, estão a reformar-se e não há quem os substitua. O Estado estabelece números clausus em função de quê? Nunca se percebeu. Parece que pelo número de cadeiras: se uma sala tem cadeiras tem alunos, se não tem cadeiras, não há alunos. Excepto num caso ou noutro em que há obvia intervenção política corporativa. Haver números clausus para medicina, apertadíssimos como são, obviamente que há interesses pesadíssimos para impedir que haja mais estudantes em medicina. Mas noutras licenciaturas, outros estudos é o que calha. Isto está ligado às opções estratégicas. Se eu sou o Estado e tenho a opção estratégica de desenvolver a agricultura obviamente eu abro lugares e pago às universidades, além do orçamento normal pago às universidades. Posso orientar, se tenho opções estratégicas claras, o acesso à universidade. Eu posso dizer eu dou às universidade que tenham um departamento de enologia, ou um departamento de viticultura, porque o vinho é dos melhores sectores que há em Portugal, mais integrados no mundo, mais integrados na Europa e que mais se transformou nos últimos 20 anos. Houve mudança radical nas técnicas, na plantação, nos métodos, fabrico. Posso dizer às universidades quem que está preparado para criar um departamento de investigação cientifica, experimentação varietal, técnicas de envelhecimento de engarrafamento, é pago. Fomentase o acesso a esses estudos, atribuem-se bolsas de estudo para os melhores candidatos.


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AGROTEJO: Na sua opinião como será o mun- mente na terra da avó, do bisavô, dos antigos. do rural português nos próximos anos? Essa visão do mundo é muito interessante para escrever livros, fazer filmes e telenovelas. A.B.: Quem vai fazer agricultura no futuro não são só as pessoas rurais, são também os urbaAGROTEJO: Mas falamos de futuros profissionos. O futuro da agricultura portuguesa, se é que nais agrícolas, ou uma área de complementar a isso existe, tem de contar com as pessoas rurais outros rendimento? e do mundo urbano. Por exemplo, outra coisa que os governos se esqueceram nestes últimos A.B.: Há uma parte que é profissional, aque30 anos. Aquilo que se chama normalmente a les dois mil que produzem 50% da produção bolsa de terra. Há muita terra com capacidade alimentar portuguesa, esses são profissionais, agrícola ou florestal que não tem nem uma coi- proprietários. Quem dirige os seus profissionais, sa nem outra. Isto é abandono, nem pessoas, os seus terrenos. Essas pessoas são profissionais nem agricultura, nem floresta. Custava alguma da agricultura e é bom que assim seja, eu até coisa aos ministérios ter uma espécie de base gostava que houvesse mais. Nestes estão incluíde dados permanente das terras que estão para dos as associações, cooperativas. É gente que é vender, para arrendar, ou pura e simplesmente profissional, uns são urbanos e outros são rurais. abandonadas? Não é possível fazer isto a 100% O comércio e a indústria alimentar não são nedo país, nós não temos sequer um cadastro. cessariamente profissões dos camponeses, com Mas devia ter-se iniciado uma bolsa de terras tamancos, com xaile negro à volta. Isso é o munhá alguns anos, criarem uma base de dados de do do Júlio Dinis. Já não existe ou o que existe 40 pessoas que querem estabelecer um plano de são restos. Esse não pode vir a ser o mundo agricultura, e saber onde está a terra disponível. rural, e muito menos o mundo alimentar e agríNão é difícil, desde que se saiba, ir fazer agricul- cola português. tura para um sítio diferente. Não é necessariaA direcção é esta: trabalhar na investigação

“A DIRECÇÃO É ESTA: TRABALHAR NA INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA, TÉCNICA PARA AGRICULTURA, TRABALHAR NO ORDENAMENTO FLORESTAL, REFLORESTAÇÃO, TRABALHAR NA FORMAÇÃO PROFISSIONAL...”

científica, técnica para agricultura, trabalhar no ordenamento florestal, reflorestação, trabalhar na formação profissional, fomentar, incentivar, apoiar a formação profissional, recompensar algumas opções, quem escolher enologia, viticultura, silvicultura tem lugar garantido nas universidades, desde que seja bom aluno, com bolsa de estudo, contratos com promessa de emprego. É assim que o Estado deve agir com determinação, não é dizer a Europa não deixa.

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ASSUNÇÃO CRISTAS MINISTRA DA AGRICULTURA, AMBIENTE, MAR E ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO EMPARCELAMENTO RURAL VAI REQUER «IMAGINAÇÃO» Sara Pelicano Jornalista

A MINISTRA DA AGRICULTURA, AMBIENTE, MAR E ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO, ASSUNÇÃO CRISTAS CONSIDERA «ESSENCIAL QUE O EMPARCELAMENTO RURAL OCORRA», MAS COM «RECURSOS FINANCEIROS ESCASSOS», ESTE PROCESSO VAI REQUERER «IMAGINAÇÃO». EM ENTREVISTA À AGROTEJO ASSEGURA QUE NA NEGOCIAÇÃO DA POLÍTICA AGRÍCOLA COMUM (PAC) PÓS 2013, PORTUGAL ESTÁ A DEFENDER MAIS «EQUIDADE INTRA-COMUNITÁRIA NOS VALORES DOS PAGAMENTOS DIRECTOS AOS AGRICULTORES» E «A POSSIBILIDADE DE GERIR DE FORMA SUAVE OS AJUSTAMENTOS INTERNOS NA DISTRIBUIÇÃO DESSES PAGAMENTOS». HÁ «EMPENHAMENTO», DIZ, PARA ATÉ 2015 EXECUTAR NA TOTALIDADE OS FUNDOS DO PRODER E CONCLUI AINDA QUE O SEU MINISTÉRIO VAI APOSTAR NO REGADIO E NUMA MELHOR ORGANIZAÇÃO DA PRODUÇÃO, COM VISTA «A CRIAR MASSA CRÍTICA E DIMENSÃO NEGOCIAL».

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AGROTEJO: A Política Agrícola Comum (PAC) pós 2013 está a ser negociada. Sobre a mesa estão três ideias chave: a manutenção dos dois pilares com reestruturações, a renacionalização da PAC e a hipótese de deixar cair uma política agrícola comum. Qual o caminho que Portugal quer defender? Quais as expectativas em relação a esta reforma? Assunção Cristas: No dia 12 de Outubro foi aceite, pelo Colégio de Comissários, a proposta de revisão, a que se segue um período de negociação, que culminará numa versão final que deverá ser aprovada. Portugal tem acompanhado muito de perto todo este processo, com o meu envolvimento, o do Senhor secretário de Estado da Agricultura e o do Director do Gabinete de Planeamento e Políticas. Tendo


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em conta os primeiros documentos conhecidos, que provocaram uma reacção bastante positiva em Portugal, a evolução que se processou de então para cá tem-se afastado daquilo que são os interesses nacionais. Da nossa parte, e em traços muito gerais, posso dizer-lhe que concordamos com a manutenção dos dois pilares para a futura PAC, e somos frontalmente contra a renacionalização da PAC ou o seu desaparecimento. Estas duas últimas hipóteses, aliás, nem estão, neste momento em que converso consigo, em cima da mesa. Em termos igualmente genéricos, posso dizer-lhe que temos três grandes objectivos que tentaremos alcançar até ao final: – uma maior equidade intra-comunitária nos valores dos pagamentos directos aos agricultores, acompanhada por um pacote financeiro adequado à sua concretização; este objectivo traduzir-se-á no aumento do valor médio das ajudas directas, com aproximação à média comunitária; – a possibilidade de gerir de forma suave os ajustamentos internos na distribuição desses pagamentos, que forçosamente terá que ocorrer face à situação actual; – garantir uma composição para o segundo pilar que permita a sua utilização como verdadeiro instrumento de desenvolvimento.

AGROTEJO: No seguimento da questão ante- Que mecanismos estão previstos para diminuir rior, quais as estratégias do seu ministério para aqueles impactos? defender Portugal na discussão da PAC? Em particular no norte do vale do Tejo? A.C.: São problemas muito diversos, todos eles importantes, que estamos a abordar de forma A.C.: Como compreenderá não poderei aqui distinta. Em relação ao acesso ao crédito, estarevelar a estratégia negocial que iremos seguir. mos a trabalhar em duas frentes. Por um lado Ela está perfeitamente definida, pois sabemos a estabelecer uma moratória de um ano para bem qual é o interesse nacional, mas guardo-a as operações de crédito em vigor ao abrigo das para os momentos de negociação, se não me linhas de crédito bonificadas para a agricultura e levar a mal. AGROTEJO: O programa eleitoral do Governo estabelece como objectivo aumentar a produção com vista à auto-suficiência. Como alcançar este objectivo? Em que culturas? A.C.: Deixe-me esclarecer uma coisa. A autosuficiência não pode ser colocada em relação ao produto A ou ao produto B, mas sim de uma forma global e, portanto, em valor. O grande objectivo apontado é, sim, o de equilibrar a balança alimentar em valor. Teremos que exportar, no conjunto dos produtos agrícolas e alimentares um valor idêntico (idealmente superior) àquele a que correspondem as nossas importações. Este objectivo terá de ser alcançado, como disse, através de um aumento da produção. Para isso, penso que é essencial apostar claramente em duas dimensões: no regadio, enquanto modelo de produção de maior potencial produtivo e numa melhor organização da produção, enquanto via para criar massa crítica e dimensão negocial. Este último aspecto, aliás, será um tema particularmente acarinhado por mim no âmbito da reforma da PAC: que um maior volume de produção seja escoada através de Organizações ou Agrupamentos de Produtores. AGROTEJO: O difícil acesso ao crédito, o preço da água, o custo da energia e as taxas de IVA, podem ser, a curto prazo, factores desestabilizadores de muitas explorações agrícolas.

pescas, a exemplo do que foi feito para as linhas PME-Invest. Por outro lado a discutir com diversos agentes formas alternativas e mais imaginativas de financiar a actividade agrícola. Não posso de momento adiantar muito mais, mas estamos a analisar diversas possibilidades de constituição de fundos financeiros que possam complementar o esforço dos agentes económicos, agricultores e agro-indústrias, interessados em investir. Quanto ao custo da energia o caminho à nossa frente não nos deixa muita margem: eficiência é a palavra de ordem para combater o aumento do custo com energia na nossa sociedade. No caso da agricultura, tenho a certeza que o caminho passará igualmente por conseguir tornar útil todo o potencial energético existente nas explorações: sol, vento, efluentes pecuários e biomassa vegetal são caminhos a que estaremos atentos. Em relação à reestruturação do IVA, nada posso adiantar neste momento. No momento em que falo consigo, o assunto está a ser trabalhado pelo Governo e estarei solidária com o que vier a ser decidido nesta matéria.

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pergunta anterior. Mais: para o conjunto das actividades ou sectores que me refere, bem como para os cereais, nomeadamente o milho, o que é verdadeiramente estratégico é o regadio e a organização da produção, que lhes conferem capacidade produtiva e acesso ao mercado com poder negocial acrescido.

AGROTEJO: O PRODER revelou-se de execução burocrática. A execução do programa tem sido muito baixa. Que medidas pensa tomar para melhorar a eficácia da aplicação a 100% deste programa que viabiliza a modernização do sector agrícola e potencia o mundo rural?

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AGROTEJO: Portugal é, nos países desenvolvidos, um dos que é menos auto-suficiente em cereais. O seu ministério considera a produção de cereais estratégica?

outro produto. Não nego, antes pelo contrário, a importância que, por exemplo o milho representa para a nossa agricultura. É uma cultura competitiva e, para além disso, uma cultura que permite escala na sua produção. Sei também da A.C.: Estratégico para o meu ministério e para importância que os cereais de pragana têm em Portugal é que a agricultura produza valor. Pen- diversos sistemas de agricultura. so que é um erro um Governo dizer o que é que é estratégico produzir. Sou da opinião que os “O PAPEL DO MINISTÉRIO É, EM MINHA agricultores sabem bem decidir o que é que, em OPINIÃO, O DE FACILITAR A ACÇÃO cada momento, devem ou não produzir. O papel DOS AGRICULTORES” do ministério é, em minha opinião, o de facilitar a acção dos agricultores: cumpre-nos tentar retirar os obstáculos inúteis do caminho dos agriculAGROTEJO: No PRODER, os cereais continuam tores, organizar os apoios que estejam disponíveis de forma simples e eficaz, zelando sempre menos prioritários que as culturas hortícolas, a pelo cumprimento da legalidade e pela utiliza- vinha e o azeite. Está prevista alguma alteração ção sustentável dos recursos naturais. Quanto neste âmbito? aos cereais, aquilo que lhe posso dizer é que, A.C.: Em termos substanciais, penso ter-lhe havendo condições que permitam a sua produção, o Governo acarinhá-los-á como a qualquer respondido a esta questão com a resposta à AGROTEJO | UNIÃO AGRICOLA DO NORTE DO VALE DO TEJO

A.C.: É verdade que o PRODER teve erros de concepção graves, nomeadamente a questão de que falávamos antes, da definição de sectores estratégicos. É igualmente verdade que, para além destes erros, as regras de implementação foram, em alguns casos, uma enormidade. Estes factos levaram a um arranque muito lento da execução do programa. Felizmente que a situação se inverteu, quanto à execução. O PRODER é hoje um programa com uma taxa de compromisso bastante elevada, diga-se em abono da verdade, graças à determinação dos agricultores e restantes entidades do sector que sempre se mostraram disponíveis para investir. Hoje, e de uma forma geral, o ritmo de execução do PRODER é sobretudo determinado pelas disponibilidades financeiras do Estado, necessárias para financiar a componente de Despesa Pública nacional. O meu empenho, neste momento, e como já tornei público, é conseguir garantir, em cada um dos próximos anos, financiamento público suficiente para permitir executar a totalidade das verbas comunitárias até ao fim do prazo previsto na regulamentação comunitária. AGROTEJO: A protecção do ambiente é tema fundamental quando falamos em agricultura. O seu Ministério abrange agora também o ambiente. Juntam-se na mesma pasta sectores cujas políticas, por vezes, criavam constrangimentos. Que estratégias pensa adoptar para que agricultura e ambiente comecem a ser pensados/trabalhados em conjunto? A.C.: Agricultura e ambiente são hoje sectores que já são pensados em conjunto. É verdade que existe um historial de desencontros. Mas é também verdade, segundo o que hoje constato, que muitos desses desencontros são mais artificiais


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do que reais. Resultaram muitas vezes da inexistência de um esforço sério de diálogo entre os serviços de ambos os ministérios. Curiosamente, e após a junção dos dois anteriores ministérios no MAMAOT, são muito mais os exemplos de boa convivência e colaboração construtiva do que o contrário. Temos mesmo uma vantagem: quaisquer diferenças de opinião terão que ser dirimidas internamente, pois, no limite, a posição final só pode ser uma pois só há uma ministra. Sobre o mesmo assunto deixará de haver uma posição do ambiente e outra da agricultura: haverá uma posição do Governo português. E é assim que deve ser.

AGROTEJO: Instrumentos de ordenamento do território no espaço rural, nomeadamente a REN e a RAN, acabam por ser, entraves ao próprio desenvolvimento. Com a nova organização do Ministério da Agricultura e Ambiente, estão previstas acções que agilizem os procedimentos administrativos? A.C.: Não estou de acordo que a REN e a RAN constituam, à partida, obstáculos ao desenvolvimento. Constituem regulamentação fundamental no Ordenamento e como tal deverão permanecer. Outra coisa diferente é reconhecer, para certas circunstâncias em particular, os benefícios decorrentes da aplicação da legislação referida possam ser inferiores aos benefícios que decorreriam de uma excepção à sua aplicação. Esses mecanismos estão previstos. Diferente ainda é reconhecer que qualquer regime legal pode ser melhorado. No ministério esse assunto está a ser acompanhado de perto e, como em tudo, sempre que se considere importante melhorar a lei, fá-lo-emos. AGROTEJO: Os mercados de cereais beneficiam com o desenvolvimento dos mercados de biocombustíveis. Estes requerem políticas que os promovam. Que estratégias tem para a este sector?

de estímulo à produção de biodiesel (a partir de óleo de oleaginosas que não temos condições para produzir) em detrimento da produção de bioetanol, que poderíamos produzir a partir de cereais como o milho e também de beterraba sacarina. Devemos estar atentos, com o objectivo de poder aproveitar eventuais oportunidades que se nos deparem a este nível. Politicamente não é a melhor altura para desenvolvimentos neste domínio, tendo em conta a evolução dos mercados de cereais e de açúcar. É, no entanto, um assunto que não deixarei de considerar em momento oportuno.

AGROTEJO: O rejuvenescimento dos empresários agrícolas em Portugal continua aquém das metas inicialmente previstas. Que instrumentos estão previstos para incentivar a instalação de mais jovens agricultores? Um desses instrumentos pode ser através de incentivos à produção? Como poderão funcionar? A.C.: O principal é que os jovens portugueses passem a ver na agricultura uma actividade económica digna, que lhes possa abrir perspectivas de um futuro de sucesso. Este facto, quando se concretizar, valerá mais do que qualquer acção de apoio à instalação de jovens agricultores. No entanto, e como é evidente, cumpre ao ministério disponibilizar os sinais de que os jovens são necessários à agricultura portuguesa. Como disse, e bem, o rejuvenescimento dos empresários agrícolas em Portugal, não só está aquém do desejado, como teve mesmo um retrocesso de 1999 para 2009. Temos que ter presente que o nível de formação dos agricultores com menos de 35 anos é muito superior ao dos restantes. E esta formação tem consequência, por exemplo, da rapidez de adopção de novas tecnologias de produção, no desenvolvimento de formas de organização do negócio mais inovadoras e na abertura a iniciativas de exportação. AGROTEJO: Em Março de 2011, o anterior ministro, Prof. Dr. António Serrano, referiu que o nível de aproveitamento dos regadios portugueses era baixo, na ordem dos 40 por cento. Na captação de água e regadio, em particular no Alqueva, o que tem delineado fazer?

A.C.: No enquadramento orçamental actual, que decorre do memorando de entendimento com a ‘troika’, é muito pequena a margem existente para actuar em termos de incentivos financeiros ou fiscais na área da produção de biocombustíveis. Penso que, no passado, se perA.C.: O número que referiu traduz a realidade deu uma excelente oportunidade de actuar a dos regadios públicos. Existem diversos factores esse nível, abdicando-se de benefícios para o que ajudam a explicar uma taxa de adesão desenvolvimento agrícola. Criaram-se condições tão reduzida, e nem sempre da responsabilida-

de dos agricultores, que terei todo o gosto em explorar consigo noutra oportunidade. Primeiro temos que ter a noção que cada regadio é um caso específico, cujas causas de sucesso ou insucesso não podem ser generalizadas para os restantes. De qualquer forma, penso que muito pode ser feito para melhorar o aproveitamento das terras infra-estruturadas pelo estado para rega. É intenção do Governo empenhar-se numa revisão profunda do regime jurídico da estruturação fundiária, que inclui uma revisão e modernização do regime jurídico dos Aproveitamentos Hidroagrícolas e do próprio estatuto das entidades gestoras desses aproveitamentos, sejam elas Associações de Regantes ou outras. Por outro lado, é preciso ter presente que, para além das questões fundiárias e de acesso à terra, outros constrangimentos existem ao regadio, entre os quais destaco a dificuldade de acesso às fontes de financiamento tradicionais. Refiro-me por um lado ao PRODER e, por outro, ao crédito bancário. Quanto ao PRODER, e como já antes lhe referi, estou empenhada em que, até 2015, seja possível executar na globalidade os fundos previstos. Quanto ao crédito bancário, sou da opinião que o sistema financeiro, com realce para o Crédito agrícola Mútuo, tem ainda um contributo importante a dar, a par da capacidade que venhamos a ter de encontrar formas imaginativas e novas de financiamento, por exemplo, através da criação de fundos financeiros para investimento em agricultura. Estamos a trabalhar também nessa matéria.

“QUANTO AO PRODER, E COMO JÁ ANTES LHE REFERI, ESTOU EMPENHADA EM QUE, ATÉ 2015, SEJA POSSÍVEL EXECUTAR NA GLOBALIDADE OS FUNDOS PREVISTOS” Quanto a Alqueva. Alqueva é para terminar. E tão ou mais importante, Alqueva é para regar. E para que isso aconteça, estamos a programar acções que façam do ministério uma plataforma de encontro de vontades entre proprietários, empresários, fornecedores de equipamento, industrias, distribuição alimentar e sistema financeiro.

“ALQUEVA É PARA TERMINAR. E TÃO OU MAIS IMPORTANTE, ALQUEVA É PARA REGAR.”

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AGROTEJO: O emparcelamento rural na região do norte do vale do Tejo, tem sofrido alguns constrangimentos. Os agricultores já demonstraram vontade de avançar com este projecto e a própria AGROTEJO já deu passos consolidados para a sua realização. De que forma a Sra. Ministra pensa dar continuidade ao emparcelamento rural? Que apoios tem previstos? A.C.: Considero essencial que o emparcelamento ocorra, nesta como em diversas outras regiões do país. Este emparcelamento tanto pode ser estrutural, com mudança da propriedade, ou funcional. Os recursos financeiros são escassos, e o emparcelamento estrutural é exigente do ponto de vista financeiro. Sem descurar essa alternativa, também aqui temos que ter imaginação. O que foi referido para Alqueva, tem aqui todo o cabimento.

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“OS RECURSOS FINANCEIROS SÃO ESCASSOS, E O EMPARCELAMENTO ESTRUTURAL É EXIGENTE DO PONTO DE VISTA FINANCEIRO”

Santarém

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AGRICULTURA E ECONOMIA

LIGAR O MUNDO RURAL AO TURISMO Sara Pelicano Jornalista

A AGRICULTURA PODE CONTRIBUIR PARA A EXPORTAÇÃO SE SERVIR PARA ATRAIR TURISTAS AO TERRITÓRIO. «O QUE VIAJA NÃO SÃO OS PRODUTOS, SÃO AS PESSOAS», DEFENDE O ECONOMISTA AUGUSTO MATEUS QUANDO QUESTIONADO SOBRE O PAPEL DA AGRICULTURA NO TECIDO ECONÓMICO. ENVOLVEMOS NA CONVERSA MAIS DOIS ECONOMISTAS E UM AGRÓNOMO. CONCLUIU-SE QUE É PRECISO FOCAR EM PRODUTOS DIFERENCIADOS, MAIS EMPREENDEDORISMO E ASSOCIATIVISMO E UMA PAC MAIS FLEXÍVEL COM MEDIDAS GERAIS MAS QUE POSSAM SER ADAPTADAS À REALIDADE DE CADA PAÍS.

Ao inserir a agricultura numa definição mais ampla, ou seja, do mundo rural, abrem-se novas portas para a exportação e sustentabilidade financeira do sector porque pode aqui associar-se o turismo.

defende o economista Augusto Mateus. Em entrevista à AGROTEJO comenta que «PELAS CARACTERÍSTICAS DAS EXPLORAÇÕES, A AGRICULTURA NÃO PODE SER UMA DE PRODUÇÃO DE MASSA. MAS PODE DAR UM FORTE CONTRIBUTO PARA O DESENVOLVIMENTO DO TURISMO NO PAÍS».

Augusto Mateus salienta que já muito se tem feito nesta área, mas é preciso uma associação do mundo rural com o turismo muito mais abrangente. «Não é apenas fazer pequenas iniciativas de base rural é ligar globalmente o mundo rural e a actividade primária ao maior sector de actividade à escala mundial que são Augusto Mateus as viagens e turismo». «Neste caso o que viaja não são os produtos, O especialista remata o seu raciocínio sobre são as pessoas», a ligação turismo e agricultura como factor de

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desenvolvimento afirmando que «o desenvolvimento interno pode converter-se em exportação se o país decidir apostar seriamente no turismo e não tiver esta lógica de uns dias gostar do turismo, noutro tem dúvidas e depois não sabe bem o que faz. Portugal pode ter um turismo muito melhor do que aquele que já produziu, muito mais sustentável, muito mais articulado com o desenvolvimento económico. Em vez de oferecer campo ao território para fazer turismo é chamar o turismo para ajudar a desenvolver os territórios, incluindo os nossos territórios rurais». Tendo em consideração a dimensão reduzida da maioria das explorações agrícolas portuguesas, impossibilitando a massificação, Augusto Mateus considera que «seremos sempre um país mais especializado, mais colocado no terreno da pequena produção do que da grande dimensão. Desse ponto de vista o nosso sector primário pode ter um papel muito importante em termos de qualificação do território». Defende-se assim uma agricultura de qualidade aplicada a nichos de mercado.

e desenvolvimento do sector primário em Portugal se fazem muito mais numa lógica de inovação, numa lógica de qualidade, numa lógica de especialização, e não com grandes miragens de auto-abastecimento das necessidades». E nesta perspectiva, diz, «os nichos de mercado são importantes do ponto de vista de poder fornecer mercados mais sofisticados e compensar melhor a inovação e qualidade». Contudo relembra que para se atingir esta inovação e sofisticação agrícola «são necessárias políticas que não declarem uma espécie de deficiência do mundo rural para a inovação».

ficar as políticas de enquadramento, políticas de revitalização dos vários segmentos de mercado, por exemplo, políticas públicas adequadas para os mercados de proximidade, adequadas para o desenvolvimento dos serviços de apoio à agricultura, no sentido de aumentar a produção e a competitividade do sector». O especialista em economia sublinha, contudo, que faz falta mais empreendedores:

«NÓS TEMOS POTENCIAL, FALTAM-NOS EMPREENDEDORES E EMPRESÁRIOS. AS POLÍTICAS PÚBLICAS PODEM AJUDAR MAS SE NÃO TIVERMOS PESSOAS ACTIVAS E EMPREENDEDORAS NO SECMais jovens, mais empreendedorismo TOR NÃO APROVEITAMOS O POTENCIAL. ESTE É Augusto Mateus alerta que o fomento eco- O GRANDE DESAFIO, O EMPREENDEDORISMO NO nómico na agricultura passa ainda por uma SECTOR AGRÍCOLA E FLORESTAL». reestruturação de mentalidades. «É preciso que Por seu turno Augusto Mateus lança o disao nível da nossa camada mais jovem haja formação adequada para perceberem que o futuro curso da competitividade do sector para uma se joga cada vez mais de forma muito parecida escolha correcta daquilo que se produz. O esem todas as actividades económicas e portanto pecialista comenta: «nós continuamos a olhar que o sector primário não fica à margem e que para o sector primário como se ele começasse tem um potencial diferenciador muito superior na produção, quando começa, como qualquer às actividades industriais convencionais ou as outro sector de actividade, na identificação de necessidades, de oportunidades de mercados, e actividades de serviços menos qualificados». O economista, Eduardo Catroga, também fo- capacidade de mobilizar os conhecimentos, as calizou o discurso para este ponto: o rejuvenes- tecnologias, os recursos e também obviamente, cimento do sector. «Precisamos de uma maior as pessoas e as terras para fazer as produções».

José Poça Esteves

O encaminhamento da agricultura para nichos de mercado é aflorado pelo também economista José Poça Esteves. «Temos de mudar os paradigmas do desenvolvimento» e nesse sentido «vamos ter de identificar os recursos que efectivamente temos e que possam ser diferenciados, de valor acrescentado, que externamente possam ser aceitáveis ou então que permitam uma diminuição significativa das importações». E conclui que a agricultura portuguesa «nunca poderá ser entendida numa lógica agrícola de volume e massificação, mas poderá ser dentro Eduardo Catroga de uma lógica agrícola de alto valor acrescentado, como a agricultura biológica, e concentração qualidade e quantidade de empreendedores, de empresários do sector agrícola e de um em focos muito específicos». rejuvenescimento das pessoas que fazem da agricultura a sua profissão», comenta. Para o exAgricultura diferenciada A aposta em nichos de mercado, acrescenta ministro das Finanças (1993-1995) são urgentes Augusto Mateus, «tem a ver também com uma políticas que fomentem a competitividade do consciencialização da população portuguesa, e sector, como adianta: «Não há receitas milagrodos seus responsáveis, de que a especialização sas, é um processo. É, assim, necessário intensi-

Associar para ter dimensão crítica O associativismo aparece também como elemento de peso quando se fala em sustentabilidade da agricultura. Francisco Avillez refere que «a organização dos produtores vai ser um elemento decisivo para aparecerem como um parceiro nas relações com outros agentes. Relações que se têm de intensificar». O coordenar científico da AGRO.GES pormenoriza: «vai ser muito difícil para a transformação contribuir para o valor acrescentado nacional se não tiver matéria-prima. E claro que em muitos casos pode ser importada, mas se for importada o valor acrescentado nacional é mínimo, portanto vai ter de contar com a produção nacional. Esta só vai ser capaz de ter viabilidade económica se para além de contar com a sua capacidade técnica e características naturais, tiver preços que lhe permitam valorizar os seus produtos e ter resultados adequados. É assim preciso capacidade técnica dos agricultores e dimensão das suas estruturas de produção para encetarem um diálogo com a transformação que permita uma valorização mais adequada dos produtos agrícolas».

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Francisco Avillez, agrónomo, conclui assim que «numa agricultura em que são muito pequenos agricultores, muitas e pequenas, médias empresas se elas não estiverem devidamente concentradas e organizadas é muito difícil ter instrumentos de política que permitam enquadrar, estimular e desenvolver essas funções».

Num momento em que a Europa está a renegociar a Política Agrícola Comum (PAC) para o período 2014-2020, os economistas entrevistados defendem uma PAC mais flexível e adaptada a cada realidade. «É importante que Portugal consiga a nível da União Europeia uma reorientação de toda a Política Agrícola Comum, nos segmentos enquadráveis nessa PAC, mas também precisa de olhar para agricultura com uma estratégia de segmentação. É preciso políticas de enquadramento adequadas a esses vários segmentos», defende Eduardo Catroga. O economista considera ainda ser importante ter estratégias concertadas que tomem a agricultura num sentido amplo, ou seja, incluindo a floresta. «Um programa de investimentos de apoio comunitário pós-2013 tem de ser adequado às nossas necessidades. Para isso é preciso desenvolver actividades complementares. Temos de olhar para a agricultura e para a floresta num âmbito de uma estratégia do desenvolvimento

CAPACIDADE DE LIDERAR NAQUILO QUE DEVEM LIDERAR NA EUROPA E FICAM NUMA POSIÇÃO DE SEGUIDISMO OU DE MERA REIVINDICAÇÃO LIMITADA DO ACAUTELAR DOS SEUS INTERESSES PARTICULARES QUANDO ISTO PRESSUPÕE PROPOSTAS GLOBAIS, PROPOSTAS ESTRATÉGICAS E NÃO MERAMENTE PEQUENAS PROPOSTA PONTUAIS».

rural, no sentido de continuarmos a investir na produção vegetal, animal, agro-indústria, indústria florestal, e entrever sempre novos empresários, novos empreendedores para o sector agrícola». Uma PAC flexível e adequada às necessidades de cada território foi defendido também por Augusto Mateus, que alertou ainda para a falta de liderança de Portugal em negociações anteriores. O economista afirma:

desertificação e despovoamento dos territórios rurais, equilibra o ecossistema e pode ser uma «oportunidade para as famílias e empresas», diz Augusto Mateus. O agrónomo Francisco Avillez também refere a importância ambiental, mas relembra que os empresários têm de ser premiados pelos cuidados ecológicos para estes continuem a ser uma realidade. «Quando pensamos na função ambiental e social é preciso identificar o que é que melhor contribui para a fertilidade do solo, para a qualidade das águas, para biodiversidade e promover essas práticas agrícolas. Depois promove-las através de políticas especificas». O entrevistado sublinha em seguida que às políticas adequadas deve seguir-se uma «remuneração» para os que cumprirem o estipulado por lei.

Função ambiental e social A agricultura é normalmente entendida como uma bem económico portador de valor acrescentado para o país. Para o também antigo ministro da Economia (1996-1997), Augusto Mateus, o sector tem hoje outras duas componentes importantes, que fomentam também a economia: importância ambiental e social. «O contributo da agricultura para o desenvolvimento neste século é o de ajudar de forma importante para a sustentabilidade ambiental». A agricultura assumese hoje como elemento capaz de combater a

6 Francisco Avillez

Uma PAC adequada à realidade Eduardo Catroga considera «a agricultura uma actividade estratégica para crescimento económico», não só do ponto de vista da produção de alimentos, mas também como fornecedora da matéria-prima para a indústria de transformação. E relembra ainda a sua importância para a «segurança alimentar do país». Factores relevantes que requerem políticas concertadas e adequadas à realidade de cada território.

«A PAC TEM DE SER MAIS VARIADA, MAS DIFERENCIADA. ISTO É UM DESAFIO PORQUE AO NÍVEL DO SECTOR PRIMÁRIO NÃO POSSO TER POLÍTICAS TÃO UNIFORMES COMO POSSO TER, POR EXEMPLO, AO NÍVEL DO SECTOR INDUSTRIAL. HÁ UM DEFICIT DE CONCEPÇÃO, DE LIDERANÇA. OS PAÍSES COMO PORTUGAL TÊM TIDO POUCA AGROTEJO | UNIÃO AGRICOLA DO NORTE DO VALE DO TEJO


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