Campanha Chega de Omissão! Queremos Habitação!

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AS BANDEIRAS NÃO FALAM Se as bandeiras falassem, Bradariam em alta voz tristes palavras de lamento. A pátria que simbolizam EĞŐĂ Ž ƐŽůŽ ĂŽƐ ĮůŚŽƐ ƋƵĞ ǀŝƵ ŶĂƐĐĞƌ͘ “A comunidade construirá casas e nelas habitarão; plantarão Intruso na própria terra é morrer. do seu fruto” Isaías 65, 21 vinhas e comerão &ĂůŽ ƉŽƌ Ɵ͕ ďĂŶĚĞŝƌĂ͕ As pessoas que moram nas ruas é uma realidade entrede nós. Nesses anos de caminhada, conhecemos Pelo teu verde inspiração, muitas histórias de vida. Lutamos junto com o povo da Teu azul de esplendor,rua por mais vida e dignidade. Muitos questionamentos brotam nessa convivência. Entre eles, a ausência de uma casa, de um lugar onde cada um e cada uma possam descansar comdĞƵ ĂŵĂƌĞůŽ ĞŶƌŝƋƵĞĐŝĚŽ segurança e tranquilidade. A moradia é o desejo imediato da E o estrelado que é tua nação. maioria. Que o teu plano é amparar, bandeira, Este livreto que ora apresentamos nos levaQuero a refletir mutirão. de em novo morar.Novas propostas de ação e reflexão que se entrelaçam e convidam a avançar em torno da construção da campanha: Chega de omissão! Queremos morem irmãos, habitação! Moradia definitiva para pessoasQue que vivem nameus rua. São reflexões que nasceram da experiência e da DŝŶŚĂ ŵƵƐĂ ŵĞŶƐĂŐĞŝƌĂ articulação entre pessoas, grupos e movimentos que lutam pela moradia para todos e todas. Da frase mais bela do amor. O Movimento Nacional do Povo de Rua, adĞƵƐ ĮůŚŽƐ ŝŵƉůŽƌĂŵ Ƶŵ ƚĞƚŽ ƉĂƌĂ ƋƵĞ Coordenadoria de Inclusão e Mobilização Sociais do Ministério Público do Estado de Minas Gerais – CIMOS, o Fórum Nacional da População de Rua estão entre os ǀĞŶŚĂ pelo direito à habitação para o povo da rua. Ter uma parceiros de primeira ordem. Juntos, apostamos “Ordem e Progresso” casa para morar proporciona suporte, ponto de apoio e orienta a pessoa em sua trajetória de vida. Traz autonomia e dignidade. WŽƌƋƵĞ ŵŽƌĂƌ Ġ ƉĂnj͕ Ġ ƚƌĂďĂůŚŽ͕ Ġ ƐĂƷĚĞ͘ Vivemos numa sociedade em que as relações de mercado individualizam os interesses e não prioriza o bem estar comum. O povo da rua é excluído dessa sociedade e é constantemente criminalizado por sua condição Ɛ ďĂŶĚĞŝƌĂƐ ƐĞ ĐĂůĂŵ͘​͘​͘ social. No entanto, querem escrever uma história diferenciada de reconhecimento e visibilidade social. Lutar pelo direito à moradia é garantir direitos. Propor política pública de habitação para a população em situação de rua é caminhar para superar o estigma que mascara situações sociais de exclusão. Convidamos você, leitor(a), para o comprometimento com essa causa e com a campanha que aqui apresentamos. Colabore você também! Maria Elisabete de Lima Mota DŽƌŽƵ ŶĂƐ ƌƵĂƐ ĚĂ ĐŝĚĂĚĞ ĚĞ ^ĆŽ WĂƵůŽ ĞĐůĂƌŽ ƋƵĞ ĞƐƚŽƵ Ğŵ dŽƌŵĞŶƚŽ͖ ƉŽĞƐŝĂƐ ĚĂ ƐĂƌũĞƚĂ 1987, Editora Espaço e Tempo - RJ Mota, Maria Elisabete Lima


“Não havia lugar para eles na cidade” Lc 2, 7 A moradia é um direito social reconhecido tanto pela Constituição Federal de 1988, no seu artigo 6°, quanto pela Declaração Universal dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas. É dever do poder público a promoção das condições que são necessárias para a efetivação desse direito, independentemente da situação das pessoas. No Brasil, o direito à moradia não é completamente garantido. A Pesquisa Nacional sobre a População de Rua, promovida pelo MDS, mostra que 50 mil pessoas viviam em situação de rua no Brasil entre agosto de 2007 e março de 2008, somado o contingente de cidades em que já havia pesquisas semelhantes. São pessoas que possuem um histórico de perdas de casa, de família, de trabalho, que não estão na rua por que querem ou por opção. Entretanto, quando se pensa em programas de moradia digna, essas pessoas quase nunca são consideradas. O déficit habitacional é resultado da histórica exclusão social que acomete o país. Embora haja imóveis ociosos, principalmente no espaço urbano, estes são mercantilizados à revelia do direito de muitos, principalmente os mais pobres. A moradia digna se transforma em uma mercadoria, cujo acesso depende da capacidade de renda das pessoas. Dessa forma, quanto melhor o imóvel e a sua localização, mais inacessível será para a população em situação de rua. As ações do poder público para a população em situação de rua costumam criminalizar e reprimir essas pessoas através de programas higienistas, que afastam a pobreza dos grandes centros urbanos, isso somado à culpabilização desses indivíduos por morarem nas ruas. Ou mesmo na simples omissão do Estado.


O Estatuto da Cidade, de 2001, é considerado uma conquista importante para a regulamentação da função social da propriedade. No entanto, é importante destacar as dificuldades de implementação do Estatuto em todas as cidades brasileiras, principalmente porque não efetiva políticas públicas concretas de moradia e de democratização do solo urbano. Entretanto, mesmo com as determinações do Estatuto da Cidade, a ocupação do solo urbano segue sobre a lógica do sistema de apropriação e acumulação de capital, que exclui os que têm menos capacidade financeira. Isso porque são as relações de mercado que imperam, não a garantia do direito à moradia para todos e todas. Em 2009, é sancionada a Política Nacional para a População em Situação de Rua, que garante o acesso amplo, simplificado e seguro aos serviços e programas que integram as políticas públicas de saúde, educação, previdência, assistência social, moradia, segurança, cultura, esporte, lazer, trabalho e renda (Decreto nº 7.053, de 23 de dezembro de 2009 - artigo 7°, inciso 1). No que tange à moradia, no entanto, compreendemos que temos que avançar da perspectiva puramente imobiliária do conjunto de políticas que envolvem a habitação. Programas como o Minha Casa, Minha Vida, formulado para enfrentar a crise econômica internacional e assegurar o crescimento econômico e emprego, não incluem a população em situação de rua. É preciso romper com o caráter provisório concretizado nos albergues e abrigos e partir para a construção de programas de moradia com segurança, infraestrutura urbana consolidada e serviços públicos acessíveis, tais como o transporte coletivo e o ambiente saudável.


“Habitarão em segurança; construirão casas e plantarão vinhas; sim, eles habitarão lá com segurança” Ezequiel 28:26 De acordo com o Terceiro Censo de População em Situação de Rua e Migrantes de Belo Horizonte (CRR-UFMG, 2014), uma das maiores cidades do país, o acesso à moradia é apontado como solução por 70% da população em situação de rua (PSR). Outros 40% alegam a falta de moradia como a principal causa de estarem nas ruas. No entanto, a produção pública de habitação social nas grandes cidades do Brasil tem se caracterizado pela propriedade privada individual, além de ser localizada nas distantes periferias sem infraestrutura. Um modelo que apresenta contradições e limites e que tem gerado a segregação territorial.

O problema é que a habitação no Brasil nunca foi tratada como direito social, ainda que haja a determinação constitucional. Até mesmo o Minha Casa, Minha Vida não superou o caráter individualista da política urbana. O programa realiza um planejamento meramente mercadológico e fortaleceu a segregação ao jogar para as periferias a população beneficiada, geralmente a mais pobre. Ou seja, estamos tratando de um programa imobiliário, não habitacional!


No caso da PSR, a moradia deve contribuir para a inserção social. Estamos falando de uma parcela da população que está em plena idade produtiva, mas que sofre com a exclusão social. Segundo a Pesquisa Nacional sobre a População em Situação de Rua (BRASIL, 2008), a população em situação de rua é majoritariamente masculina (82%) e mais da metade (53%) está na faixa entre 25 e 44 anos. Os negros são a maior parte deles, com 67% do total. Para essa população, estão disponíveis as políticas de acolhimento social e albergues, que não resolvem o problema da falta de moradia. Na verdade, o sistema assistencialista não direciona para o fim da condição de rua, mas para a sua manutenção. O censo em Belo Horizonte ainda revelou que 26% das pessoas em situação de rua não dormem nos abrigos por falta de segurança e 15% alegam maus-tratos. Apenas 1,2% dos homens que vivem na rua têm acesso aos benefícios da Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS). Se não discutirmos habitação para a PSR, não discutiremos mudanças efetivas na realidade da rua. Tem de haver uma centralidade na discussão da moradia para a PSR, que deve ser multissetorial e voltada para a inclusão social.

Somente a partir de políticas estruturantes, como habitação e trabalho, a população em situação de rua conseguirá superar essa condição. Todos tiveram uma história de vida que incluía uma casa, um lugar para viver, mas que, por diferentes motivos, foi perdido. Oferecer instituições de acolhimento é importante, mas elas devem ter um caráter provisório e emergencial. Abrigos e albergues não trazem garantia de estabilidade e muito menos autonomia. Ao assegurar a habitação, reconhecemos a heterogeneidade das pessoas em situação de rua para que cada um e cada uma possam usufruir do seu direito de morar.


“Eis que vou criar novos céus e nova terra” Isaías 65,17 As pessoas têm direito de estar na rua, mas viver nelas não é ideal nem para elas, nem para a sociedade. No entanto, medidas paliativas, tais como os abrigos, não dão conta do aspecto da inclusão social. Muito menos as ações higienistas, geralmente promovidas com violência, são respostas razoáveis do poder público. A campanha Chega de omissão! Queremos habitação! – Moradia definitiva para as pessoas que vivem na rua quer sensibilizar a população brasileira e o poder público para a necessidade de que a população em situação de rua seja contemplada em programas de habitação, entendendo a moradia como um direito de todos e todas. A PSR integra o grupo que ocupa o espaço público por falta de moradia. Estão em permanente risco social. Por isso, a proposição da moradia definitiva para essa população possibilita o enfrentamento à própria existência de pessoas em situação de rua. É preciso deslocar a centralidade nas ações provisórias para a discussão sobre reforma urbana, a partir de reformulações nas políticas de uso e ocupação do solo. Nesse sentido, é preciso reunir as informações sobre o perfil desse segmento diante da sua heterogeneidade para que as diversas necessidades desse público sejam atendidas. A moradia definitiva vai além da simples entrega de um imóvel. Baseia-se numa concepção de habitação que privilegia o lugar de convivência e de construção de relações sociais. Deve ser um serviço público multissetorial de inclusão, articulado com acompanhamento social e vinculado a outras políticas, tais como a de geração de trabalho e renda, saúde e educação. As novas opções para o debate sobre habitação não podem criar guetos e isolamentos para a população em situação de rua.


A campanha Chega de omissão! Queremos habitação! – Moradia definitiva para as pessoas que vivem na rua deve acontecer em todos os locais em que a Pastoral do Povo da Rua tem incidência. Também é preciso envolver outros setores da Igreja e buscar parcerias para que possamos capilarizar conceitos, formar e mobilizar agentes em torno dessa luta. Rodas de conversa com a população em situação de rua é imprescindível para o debate e construção de propostas. Espaços de seminários, conferências, comitês também são importantes para pautar a temática da habitação para a PSR, fazendo conhecer as experiências exitosas existentes. A cobrança do poder público nas suas três esferas para criação de soluções dignas de moradia para a PSR deve estar no centro da nossa articulação, tal como a sensibilização do tema através dos meios de comunicação.

Apesar da heterogeneidade do perfil da população em situação de rua, o que os unifica é justamente a falta de moradia definitiva. Por outro lado, a maioria da sociedade não tem conhecimento de como vive esse segmento. Lutar por moradia é lutar por justiça social e é papel da Pastoral do Povo da Rua lutar pela mudança da atual realidade vivida pela PSR e contribuir para a elaboração de políticas públicas. Estamos diante da possibilidade concreta de construção de projeto de vida através da autonomia e estabilização dessa parcela de nossa sociedade. Garantir a moradia digna de forma permanente é a resposta às demandas identificadas em pesquisas já realizadas, além de seguir uma tendência mundial de experiências exitosas em torno da concepção de habitação que propomos.


“Eis que faço novas todas as coisas” Ap. 21,5 A existência de pessoas em situação de rua está longe de ser uma especificidade brasileira. Trata-se de um fenômeno que está presente tanto em países periféricos como nos centrais. Em vários países, a avaliação das políticas sociais voltadas para esse segmento tem demonstrado que assistencialismo e abrigos provisórios apenas colocam essas pessoas em um círculo vicioso, deslocando-as indefinidamente por instituições, sem garantir a sua inclusão social. Por isso, a promoção da moradia definitiva para a população em situação de rua é política adotada em diversas localidades no mundo. Os programas Housing Led e Housing First são exemplos disso¹.

O Housing Led consiste em uma forma de intervenção social em que a habitação permanente é considerada como o principal mecanismo de inclusão social das pessoas em situação de rua. Na Europa, essa abordagem tem sido desenvolvida principalmente na Dinamarca, na Finlândia, mas há também experiências na França, Irlanda, Portugal e Reino Unido. Essa política é inspirada no conceito Housing First, desenvolvido no início dos anos 1990 em Nova York pela organização Pathways. As intervenções baseadas nesse modelo consistem no realojamento de pessoas em situação de rua em apartamentos ou casas autônomas. A partir disso, há o acompanhamento de equipes de trabalho multidisciplinares, que incluem especialistas da área da família, saúde, consumos de droga e álcool, emprego e habitação. As primeiras experiências surgiram nos Estados Unidos, Canadá e na Europa. ¹ As informações a respeito de Housing Led e Housing First foram retiradas de: Diálogos sobre a População em situação de Rua no Brasil e na Europa. Experiências do Distrito Federal, Paris e Londres. Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. Brasília: SDH, 2013.


AS BANDEIRAS NÃO FALAM Se as bandeiras falassem, Bradariam em alta voz tristes palavras de lamento. A pátria que simbolizam EĞŐĂ Ž ƐŽůŽ ĂŽƐ ĮůŚŽƐ ƋƵĞ ǀŝƵ ŶĂƐĐĞƌ͘ Intruso na própria terra é morrer. &ĂůŽ ƉŽƌ Ɵ͕ ďĂŶĚĞŝƌĂ͕ Pelo teu verde de inspiração, Teu azul de esplendor, dĞƵ ĂŵĂƌĞůŽ ĞŶƌŝƋƵĞĐŝĚŽ E o estrelado que é tua nação. Que o teu plano é amparar, bandeira, Quero de novo morar. Que morem meus irmãos, DŝŶŚĂ ŵƵƐĂ ŵĞŶƐĂŐĞŝƌĂ Da frase mais bela do amor. dĞƵƐ ĮůŚŽƐ ŝŵƉůŽƌĂŵ Ƶŵ ƚĞƚŽ ƉĂƌĂ ƋƵĞ ǀĞŶŚĂ “Ordem e Progresso” WŽƌƋƵĞ ŵŽƌĂƌ Ġ ƉĂnj͕ Ġ ƚƌĂďĂůŚŽ͕ Ġ ƐĂƷĚĞ͘ Ɛ ďĂŶĚĞŝƌĂƐ ƐĞ ĐĂůĂŵ͘​͘​͘

Maria Elisabete de Lima Mota DŽƌŽƵ ŶĂƐ ƌƵĂƐ ĚĂ ĐŝĚĂĚĞ ĚĞ ^ĆŽ WĂƵůŽ ĞĐůĂƌŽ ƋƵĞ ĞƐƚŽƵ Ğŵ dŽƌŵĞŶƚŽ͖ ƉŽĞƐŝĂƐ ĚĂ ƐĂƌũĞƚĂ 1987, Editora Espaço e Tempo - RJ Mota, Maria Elisabete Lima


Realização: Apoio: Fotos: Bi Antunes | arteemmovimento.org


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