Revista PARQUES E VIDA SELVAGEM n.º 47

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66 MIGRAÇÕES

Truta-marisca Salmo trutta Linnaeus, 1758

o mar no horizonte “Criticamente em perigo”, lê-se no “Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal” sobre esta espécie que, no nosso país, na forma migradora apenas ainda existe nos rios Minho e Lima

É

caso para dizer que há trutas e trutas. Aparentada com o salmão do Atlântico, nesta espécie de truta há tendências divergentes: se bem que todas nasçam nos rios, nem todas ali permanecem – há as que não hesitam em procurar o mar para ali crescer. Estas, no que diz respeito a voltar à mesma água doce, só mesmo para procriar... Imagino que para os manuais isto não venha de feição, mas como os peixes não os leem, apesar da grave crise que esta variação apresenta no mapa da biodiversidade, a tendência existe e deseja-se que seja para perdurar. O caso ainda está na penumbra, e requer muita investigação, mas não é de admirar que numa mesma espécie haja tendências variadas mediante as vantagens de adaptação a diferentes meios e à sobrevivência, com oportunidade de aproveitamento reprodutivo. A vida de qualquer truta-marisca começa de forma larvar quando da eclosão do ovo, num rio com águas pouco profundas e bem oxigenadas, correntes de velocidade moderada a deslizarem sobre gravilha ou cascalho. As margens estarão vestidas de amieiros, freixos ou salgueiros. Os juvenis permanecem nestes afluentes durante um ou dois anos. Assim que atravessam as transformações orgânicas que lhes vão permitir crescer e amadurecer sexualmente no oceano Atlântico, vivem no mar.

66 • Parques e Vida Selvagem verão 2014

A migração reprodutiva dá-se no período da primavera/verão e a maturidade sexual ocorrerá por volta dos quatro anos de idade. A truta-marisca, como o salmão, tem um comportamento conhecido por “homing”. Quer isso dizer que tendem a voltar ao afluente em que nasceram. Imagine se pelo caminho encontram obstáculos como uma barragem sem dispositivo que lhes permita ultrapassá-la? Ou, se conseguindo avançar na direção da nascente, encontra água poluída ou pouco oxigenada? Pode ocorrer a extinção local. Portugal é um país com um interesse particular para esta espécie porque é o limite sudoeste da sua distribuição. Entre as medidas de proteção situa-se a legislação nacional de defeso, o que impede durante esse período que este peixe seja objeto de pesca. Ajuda, mas não salvará por si só a forma migradora de uma provável extinção, se se observar que “a redução da população nos últimos 10 a 15 anos pode ter atingido 98% do número de indivíduos maduros e prevê-se que possa continuar a verificar-se nos próximos 10 a 15 anos ou em qualquer outro período com a mesma amplitude que abarque o passado e o futuro. As causas da redução, embora geralmente compreendidas, não são reversíveis nem cessaram”.* Os fatores de ameaça a esta forma migradora de truta – e a outros peixes com evidente valor comercial como o sável e o salmão, entre outros – juntam poluição, obstáculos impeditivos de acesso aos locais de desova, a extração de inertes, a alteração do regime natural de caudais e a sobrepesca. O tamanho máximo desta truta assinala 140 cm e 50 kg de peso.

Texto Jorge Gomes

* “Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal”, edição ICNF


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