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Brilho eterno das estrelas juninas

Por Pedro Humberto

Oritmo dos pandeiros, das sanfonas e das zabumbas anuncia a chegada dos quadrilheiros. Em cada passo, um toque, uma coreografia que desenha no ar o retrato da cultura nordestina. No Piauí, a tradição das quadrilhas juninas é forte e cada vez mais popular.

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São inúmeros os grupos que se reúnem para dançar, ensaiar e competir em festivais que celebram a cultura do São João. O figurino é caprichado, com vestidos coloridos, chapéus de palha, bandeirolas e enfeites típicos. Mas a paixão dos quadrilheiros vai além do visual: é a história e a tradição que movem esses artistas.

No coração do Piauí a quadrilha junina “Explosão Estrelar” foi Campeã Estadual em 2018 e 2021, e Vice-campeã Estadual em 2019. O grupo é formado por jovens e adultos que dedicam horas de ensaio para apresentar uma performance impecável nas competições. Um deles é Ronney Oliveira, um jovem jornalista, ex-estudante da UFPI, tão apaixonado por quadrilha que esse foi o tema de seu TCC, um documentário chamado “Por trás do Brilho: Porque olham para fogueira, mas não veem o São João.” “A importância da dança da quadrilha é reafirmar a história. Isso não é algo recente, mas sim uma tradição histórica. Portanto, é crucial manter essa tradição para mostrar às pessoas o resultado da nossa cultura.

A importância está em reafirmar as tradições e formas de se divertir.” Ressalta Ronney.

O documentário, cheio de cor e beleza mostra os bastidores da produção dessa festa gigante, e como ela vai muito além da dança, dependendo de inúmeras pessoas que embora não estejam se apresentando são o esqueleto que fornece a sustentação desse corpo que dança e alegra as noites juninas.

A cada ano, novos grupos surgem, movidos pela paixão pela cultura nordestina e pela vontade de manter viva a tradição das quadrilhas juninas. Eles se dedicam aos ensaios, aos figurinos e às coreografias para encantar o público e mostrar que a dança é uma forma de contar a história do povo brasileiro.

No entanto, nem tudo são flores para os quadrilheiros, como nos conta a fabulosa dama junina Denise Cristal, também estudante da UFPI e membro da pentacampeã estadual Lua de Prata:. “Nós começamos nossos ensaios em fevereiro e, nesse período, ensaiamos somente nos finais de semana (fevereiro, março e abril). No entanto, a partir de abril, os ensaios passam a ser diários à noite e vão até de madrugada. Muitas pessoas que estudam ou trabalham precisam acordar cedo no dia seguinte para ir ao trabalho, faculdade ou escola. Portanto, o maior desafio para o brincante hoje em dia é equilibrar os ensaios e trabalhos de produção com sua vida pessoal, pois requer muita dedicação e tempo. Por isso, as pessoas que dançam quadrilha junina são aquelas que realmente amam a cultura e o movimento, porque é difícil em termos de adaptação e financeiramente. O quadrilheiro gasta muito com produção, figurino, sapatos, arranjos e outras coisas. Mesmo assim, todos esses gastos e dificuldades valem a pena quando começam as apresentações e vemos no rosto do público e dos jurados que eles gostaram do nosso trabalho. Aí, esquecemos de todos os problemas e dificuldades que enfrentamos durante o processo.” Ela fala com a legítima paixão que só quem sua, chora e sangra pela arte conhece.

Além das hercúleas rotinas de trabalho, outra dificuldade enfrentada pelos dançarinos, como para quase tudo no nosso país, é a falta de recursos financeiros. É preciso se dedicar muito à venda de rifas e outros itens para arrecadar fundos e construir todo o enredo, além de ajudar na elaboração das fantasias e em todo o processo de desenvolvimento do grupo. Como bem aponta o jovem quadrilheiro Ronney, ele também ressalta que a dificuldade financeira aponta para várias outras questões, desde a necessidade de aprender a costurar para poder dançar até sair para vender rifas e outros itens para arrecadar dinheiro.

Para os quadrilheiros, dançar a quadrilha junina é uma forma de celebrar a cultura e a tradição do São

João, uma festa que representa a alegria e a diversidade do Nordeste. É também uma forma de manter viva uma herança cultural e de promover inclusão e diversidade. “Hoje a quadrilha é mais do que uma dança.

“A quadrilha é um ato de protesto. Os grupos têm usado suas apresentações para levantar pautas importantes, como questões políticas, por exemplo”. Explica o brincante.

E para cumprir seu papel social, a atividade dos quadrilheiros precisa de apoio. “O que deve ser feito é aumentar o investimento, afinal os grupos hoje têm um viés social também e acolhem pessoas das periferias, incentivando o uso de seus talentos naquele meio. Portanto, é uma ação social que precisa de investimento.” ele completa pensativo. E Denise concorda plenamente com o posicionamento do colega quadrilheiro: “A quadrilha junina e o São João em si representam inclusão e aceitação. Não é apenas um grupo de dança, mas abrange muitas pessoas e abre portas. Olha só, o São João gera empregos e ajuda as pessoas a descobrirem novas coisas sobre si mesmas.”

Esse “abraço” das causas sociais é apenas mais uma questão que veio com a evolução e modernização dessa arte que convida a tradição e a modernidade a fazerem as pazes. Como a própria vida e o universo a quadrilha foi se modificando, como bem nos conta nossa dama junina: “A evolução da quadrilha junina pode ser percebida muito pela questão visual. As quadrilhas juninas hoje em dia têm muito brilho, glamour, chiqueza e luxo. Os figurinos são bordados e bordados, com fortunas em pedras, cristais e tudo mais. Os figurinos antigos eram feitos de chita, as maquiagens eram mais simples. Então, acho que a maior diferença na evolução do São João de antigamente para o São João de hoje em dia é a questão visual, tanto figurinos quanto cenários.”

“E não é apenas o visual, a dança também evoluiu muito. As marcações que fazíamos antigamente hoje em dia já não são mais feitas. Quando uma quadrilha junina resolve inserir uma marcação antiga dentro de uma coreografia atual, torna-se algo diferente e inovador, pois hoje em dia já não se faz mais isso. Quando colocamos o ‘matuto’ dentro de uma apresentação atual de uma quadrilha junina, torna-se algo diferente e as pessoas gostam porque não é algo que se vê muito hoje em dia.” Ela completa deslumbrada com os próprios pensamentos.

Apesar disso tudo, dessa inevitabilidade da mudança e da atualização, a tradição junina soube se atualizar sem jamais abandonar suas raízes, muito pelo contrário, o são joão é um fator imprescindível para a conservação da cultura do nordeste.

“A cultura junina não pode nunca ser morta! Jamais! Jamais! Ela deve continuar a viver por muitos e muitos anos! Enquanto existir a humanidade!” Exclama a quadrilheira com uma paixão ardente que se iguala às chamas das fogueiras típicas.

Outro elemento onipresente nas quadrilhas é a religiosidade. Afinal de contas, a festa surgiu justamente em homenagem ao santo católico de mesmo nome. Inclusive, foi através da igreja que o ainda infante Ronney entrou no mundo da dança nordestina: “A primeira vez que participei de uma quadrilha grande e profissional foi em 2013, quando eu tinha 13 anos. Eu fazia parte de um grupo da igreja, e a quadrilha era composta justamente por membros da igreja e pessoas do meu bairro. Vendo meus amigos envolvidos, senti vontade de participar também. Foi isso que me incentivou a entrar para o grupo.” Ele relembra com nostalgia.

E quando falamos nessa religiosidade, que a propósito também é um elemento importantíssimo da formação cultural e identitária do nordestino, nossos dois quadrilheiros de grupo rivais concordam plenamente em algo: A dança não pode começar sem antes uma oração, e sem antes entregar toda aquela alegria e energia nas mãos de Deus. E se Ele quiser, ganhar o prêmio da noite.

Lógico que quando todos se dedicam e se esforçam tanto para dar seu melhor, surgem disputas. Lua de prata e explosão estelar são rivais nas disputas piauienses, mas Denise garante que isso ocorre apenas nas competições: A rivalidade existe dentro de quadra. Cada quadrilha luta para apresentar o melhor espetáculo e vencer o festival. No entanto, fora de quadra, todos são amigos, parceiros e se ajudam, pois o movimento é um só.” E assim, dando seu melhor e se esforçando, os quadrilheiros vão convergindo para seu colorido caminho de manter viva a chama da tradição nordestina e fazer a luz da estrela do são joão ser eterna.

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