Revista GEMInIS | ano 4 | n. 2 | v. 2 • jul./dez. 2013

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Ch a m a da d e Tr a b a l h os A Comissão Organizadora da I Jornada Internacional GEMInIS (JIG2014), convida estudantes, pesquisadores, profissionais do mercado e demais interessados a submeterem trabalhos científicos para publicação e apresentação oral durante a I Jornada Internacional GEMInIS, a ser realizada entre 13 a 15 de Maio de 2014.

Download do edital de chamada de trabalhos Dat as im por t antes

Início da Submissão de Resumos

15/12/2013

Prazo final para Submissão de Resumos

05/03/2014

Comunicado de Aceite dos Resumos

17/03/2014

Prazo final para envio dos artigos completos e pôsteres

28/04/2014

www.jig2014.com.br jig.geminis@gmail.com


E x p e d i e nte Revista GEMInIS | ano 4 | n. 2 | v. 2 • jul./dez. 2013 Universidade Federal de São Carlos ISSN: 2179-1465 www.revistageminis.ufscar.br revista.geminisufscar@gmail.com Poítica Editorial Editor Responsável João Carlos Massarolo Universidade Federal de São Carlos - UFSCar Editor Executivo Dario Mesquita Universidade Federal de São Carlos - UFSCar Conselho Editorial (Copo de Pareceristas): André Lemos Universidade Federal da Bahia – UFBA Antônio Carlos Amâncio Universidade Federal Fluminense – UFF Arthur Autran Universidade Federal de São Carlos - UFSCar Carlos A. Scolari Universitat Pompeu Fabra – Espanha Bruno Campanella Universidade Federal Fluminense – UFF Derek Johnson University of North Texas – Estados Unidos Erick Felinto Universidade Estadual do Rio de Janeiro - UERJ Francisco Belda Universidade Estadual Paulista - UNESP Gilberto Alexandre Sobrinho Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP Héctor Navarro Güere Universidade de Vic – Espanha Hermes Renato Hildebrand Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP João de Lima Gomes Universidade Federal da Paraíba - UFPB Marcos “Tuca” Américo Universidade Estadual Paulista - UNESP Maria Immacolata Vassalo Lopes Universidade de São Paulo - USP Maria Dora Mourão Universidade de São Paulo - USP Pedro Nunes Filhos Universidade Federal da Paraíba - UFPB Pedro Varoni de Carvalho Laboratório de Estudos do Discurso (Labor) - UFSCar Ruth S. Contreras Espinosa Universidade de Vic – Espanha Sheron Neves Escola Superior de Publicidade e Marketing - ESPM

Capa Original Gi Milanetto


Sumário

Apresentação.................................................................................................................................................. 4

S eparata - I J ornada I nternacional GEMI n IS .............................................................................. 7 D ossiê E special - M anifestações

de

Rua

Agenciamentos e anonimato: sobre a experiência do Anonymous Erick Felinto • Ramon Bezerra Costa ............................................................................... 19 As manifestações de 2013: revendo Doméstica, O som ao Redor e A Febre do Rato Cezar Migliorin ......................................................................................................................... 35 Educação Política: da rede para as ruas Leandro Grôppo • Gerson de Sousa ................................................................................ 48 Comunicación Electoral e Internet – cuestiones sobre la participación ciudadana Luciana Panke • Edgar Esquivel ........................................................................................ 65 O intelectual público na internet: o caso do vlogueiro Felipe Neto Ademir Luiz da Silva ............................................................................................................... 75 A b o r d a ge n s M u lt i p l a t a f o r m a s Gamificação: abordagem e construção conceitual para aplicativosem TV Digital Interativa Marcos Américo • Shelley Costa Navari ......................................................................... 87


Integraciones entre lo Físico y lo Digital en la Estética de las Nuevas Tecnologías Alejandro Lozano Muñoz ................................................................................................... 106 Reflexões sobre as novas formas de conteúdo narrativo interativo para os games na TV Digital Patrícia Margarida Farias Coelho .................................................................................... 125 Até onde vai a convergência?: assistindo à tv norte-americana no brasil Pedro Peixoto Curi ................................................................................................................. 135 As Ferramentas de Interatividade no Webjornalismo Interiorano: um retrato da participação do leitor no extremo sul do Brasil Jandré Corrêa Batista • Aline Reinhardt da Silveira • Larissa Rilho Munhoz • Beatriz Corrêa Pires Dornelles ........................................................................................... 152

E s p a ço C o n v e r ge n t e ensaio

Materialidade e memória do Rio de Janeiro nas fotografias de Augusto Malta e do projeto Rio 365 Débora Gauziski • Fausto Amaro • Fernando do Nascimento Gonçalves ..... 168 ensaio

Imagens, Tempo, Escrita: invenções ressoam por twittes Elenise Cristina Pires de Andrade • Érica Speglich ................................................. 190


A p r ese n t a ç ã o

E

stá nas nuvens a sétima edição da Revista GEMInIS, uma publicação do Grupo de Estudos sobre Mídias Interativas em Imagem e Som – PPGIS/UFSCar. Excepcionalmente, este número é composto por dois volumes de trabalho. O volume

I, dedicado ao tema Internet pós-web: a internet das coisas, dialoga com o atual mo-

mento e as tendências para o campo da Comunicação enquanto o volume II, aborda as Manifestações de Rua, que tiveram lugar em junho/2013 no Brasil, compartilhando experiências geradas pelas novas redes e canais de mobilização e resistência social. Os artigos reunidos para o dossiê sobre a Internet pós-web dialogam com a ‘comunicação das coisas’: a pesquisadora Lucia Santaella (PUC-SP), Adelino Gala, doutorando em Tecnologias da Inteligência e Design Digital (PUC-SP), Clayton Policarpo e Ricardo Gazoni, mestrandos em Tecnologias da Inteligência e Design Digital (PUC-SP), discutem a origem da internet das coisas; Deisy Fernanda Feitosa, doutoranda da ECA-USP e Sérgio Bairon (ECA-USP), analisam as mudanças no estilo de vida decorrentes da ubiquidade do mundo digital; Maria Cristina Gobbi (Unesp-Bauru) e Gleice Bernardini, mestranda do Programa Pós-Graduação Televisão Digital da Unesp-Bauru, focam o estudo na interatividade e uso dos recursos geolocativos; Talyta Singer, Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Cultura Contemporâneas da UFBA, revela o enquadramento midiático do termo na imprensa nacional e estrangeira; Alan César Belo Angeluci, da The University of Texas at Austin (USA), analisa o aplicativo para ‘segunda tela’ utilizado na série Hannibal; Arlete Eni Granero (UFF) e Tatiane Cione Couto, mestranda em Mídia e Cotidiano pela Universidade Federal Fluminense (UFF), descrevem a crescente onda de aplicativos para dispositivos móveis, enquanto Gabriela Borges (UFJF) e Daiana Maria Veiga Sigiliano, discutem em seu artigo a emergência da ‘nova’ TV Social. Por outro lado, os artigos do volume II analisam as Manifestações de Rua no mês de junho/2013 no Brasil: Erik Felinto (UERJ) e Ramon Bezerra Costa, doutorando do Programa de Pós-Graduação em Comunicação (UERJ), refletem sobre a experiência do Anonymous, problematizando seu funcionamento, a criação de vínculos e a forma de atuação; Cezar Migliorin, pesquisador do Programa de Pós-graduação em Comunicação da Universidade Federal Fluminense (UFF), analisa na perspectiva dos aconteci-


mentos de junho/2013, o recente cinema político feito no Brasil (Doméstica, 2012), de Gabriel Mascaro, O som ao Redor (2013), de Kleber Mendonça e a Febre do Rato (2012), de Cláudio Assis. Gerson de Souza (UFU) e Leandro Grôppo, mestrando do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Sociedade (UFU), analisam no seu artigo a educação política: das redes para as ruas; Luciana Panke, pós-doutoranda na Universidad Autónoma Metropolitana-Unidad Cuajimalpa (UMA-México) e Edgar Esquivel (UMA-México), discutem o papel da internet nas democracias modernas, e Ademir Luiz da Silva, da Universidade Estadual de Goiás (UEG), faz um estudo de caso do vlogueiro Felipe Neto. Além dos temas centrais que fazem parte dos dois volumes deste número, gostaríamos de destacar os artigos que foram reunidos especialmente para cada uma das seções da revista: “Abordagens Multiplataformas” e “Espaço Convergente”. A Revista GEMInIS apresenta uma Separata especial de pré-lançamento da I Jornada Internacional GEMInIS (JIG 2014), que irá ocorrer entre 13 a 15 de Maio de 2014, na Universidade Federal de São Carlos - UFSCar. A I Jornada Internacional GEMInIS pretende reunir pesquisadores oriundos da academia, assim como profissionais do mercado, a fim estimular um amplo diálogo sobre as novas formas de entretenimento para o audiovisual brasileiro no campo da comunicação, cultura midiática, marketing, design e artes. Para saber mais sobre a I Jornada Internacional GEMInIS, acesse seu website, curta a página de facebook e siga o twitter do evento. Esta edição está nas nuvens graças ao trabalho generoso e árduo realizado pela Equipe de Editores. O agradecimento é extensivo a todos os autores que participaram deste número e também aos pareceristas e colaboradores pela leitura atenta e minuciosa, ajudando-nos na seleção dos artigos a serem publicados. A equipe editorial deseja a todos uma boa leitura! João Massarolo – Editor Responsável


Separata da Revista GEMInIS ano 4 - n. 2


Apresentação -9Comitê Científico - 10 Chamada de Trabalhos - 11 Inscrições - 14 Programação Resumida - 15 Expediente e Contato - 18 -

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Apresentação

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I Jornada Internacional GEMInIS (JIG/2014) terá como tema central os processos da convergência midiática que transformam o “entretenimento transmídia” na base da economia criativa. O

‘entretenimento transmídia’ ocupa um lugar central na esfera da produção e consumo, porém, é uma noção que permanece relativamente inédita no campo acadêmico. Historicamente, entretenimento é um conceito que aparece associado ao que é ‘alegre, divertido, emocionante e prazeroso’. Na I Jornada Internacional GEMInIS, pretende-se debater os processos de compartilhamento da propriedade intelectual e comercial das marcas, visando um maior entendimento sobre o modo como o conteúdo audiovisual é concebido e distribuído nas redes culturais e comunicacionais. A partir da discussão dessa temática, busca-se promover intercâmbios entre os produtores de ‘entretenimento transmídia’ e os pesquisadores oriundos da academia, visando estimular um amplo diálogo no campo da cultura midiática, marketing, design e artes. Configurando um ambiente de análise sobre os atuais desdobramentos desse tema nas plataformas de mídias audiovisuais (Cinema, TV, Internet, HQs, Videogames, Smartphones, entre outras), com o objetivo de estimular novas formas de produção de conteúdo para o audiovisual brasileiro. Deste modo, a I Jornada Internacional GEMInIS (JIG/2014) procura debater as relações entre o mainstream e as culturas periféricas; as novas plataformas da produção audiovisual seriada e o caráter lúdico do conteúdo das TVs públicas, na busca de aglutinar e sistematizar os estudos acadêmicos nesta área; estabelecer um amplo diálogo sobre os novos paradigmas do entretenimento; estimular o desenvolvimento de novos formatos de entretenimento para o audiovisual brasileiro, envolvendo alunos dos cursos de graduação e pós-graduação em cinema e audiovisual, publicidade, design e marketing, além de proporcionar o intercâmbio entre pesquisadores e empresas de conteúdo, tanto no âmbito nacional quanto internacional.


Alessandra Meleiro Universidade Federal Fluminense - UFF

Gilberto Alexandre Sobrinho Universidade Estadual de Campinas – Unicamp

André Lemos Universidade Federal da Bahia - UFBA

Héctor Ivan Navarro Güere Universitat de Vic (Espanha)

Andre Piero Gatti Fundação Armando Álvares Penteado - FAAP

Hermes Renato Hildebrand Universidade Estadual de Campinas - Unicamp

Arthur Autran Universidade Federal de São Carlos - UFSCar

Ivana Bentes Oliveira Universidade Federal do Rio De Janeiro - UFRJ

Antônio Carlos Amâncio da Silva Universidade Federal Fluminense - UFF

João Carlos Massarolo Universidade Federal De São Carlos - UFSCar

Bruno Roberto Campanella Universidade Federal Fluminense - UFF

João de Lima Gomes Universidade Federal da Paraíba - UFPB

Carlos Alberto Scolari Universitat Pompeu Fabra (Espanha)

João Luiz Vieira Universidade Federal Fluminense - UFF

Dario de Souza Mesquita Júnior Universidade Federal de São Carlos – UFSCar

Marcos Américo Universidade Est. Paulista Júlio de Mesquita Filho – UNESP

Derek Ronald Johnson University of Wisconsin (Estados Unidos)

Maria Dora Genis Mourão Universidade de São Paulo - USP

Eduardo Campos Pellanda Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUC-RS

Maria Immacolata Vassallo de Lopes Universidade de São Paulo - USP

Erick Felinto de Oliveira Universidade do Estado do Rio De Janeiro - UERJ

Maria Lucia Santaella Braga Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP

Flavia Cesarino Costa Universidade Federal de São Carlos - UFSCar

Paulo Fernando de Carvalho Lopes Universidade Federal do Piauí - UFPI

Francisco Rolfsen Belda Universidade Est. Paulista Júlio de Mesquita Filho – UNESP

Ruth S. Contreras Espinosa Universitat de Vic (Espanha)

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Comitê Científico

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estudantes de graduação e pós-graduação, docentes, pesquisadores, profissionais do mercado e demais interessados a submeterem trabalhos científicos para publicação e

apresentação oral durante a I Jornada Internacional GEMInIS, a ser realizada entre 13 a 15 de Maio de 2014. Baixe o PDF com o Edital aqui Datas Importantes 15/12/2013 - Início da Submissão de Resumos 05/03/2014 - Prazo final para Submissão de Resumos 17/03/2014 - Comunicado de Aceite dos Resumos 28/04/2014 - Prazo final para envio dos artigos completos e pôsteres Envio de Trabalhos Serão aceitos trabalhos científicos cuja temática esteja relacionada ao tema do evento: ‘entretenimento transmídia’, dentro das seguintes linhas de estudos: 1) Mercado Audiovisual e Indústrias Criativas Franquias de entretenimento; a indústria audiovisual e os novos modelos de negócios; indústrias criativas e plataformas colaborativas; plataformas de distribuição de conteúdos audiovisuais; fomento de políticas públicas para produção audiovisual multiplataforma. 2) Narrativa transmídia e a Cultura Participativa Canais de reassistência; recepção transmidiática; mídias colaborativas; construção de mundos de histórias; processos sinérgicos entre mídias; cultura da convergência; jogos de realidade alternada; produção de fãs; comunidades online; redes sociais; ativismo digital. 3) Ficção seriada audiovisual para multiplataformas Complexidade narrativa: serialidades, estrutura episódica e novelesca; TV de Qualidade; hibridação de gêneros; telenovelas; web séries; novos formatos de ficção seriada para multiplataformas; aplicativos para Segunda Tela: plataformas de reassistência. 4) Ecossistema midiático contemporâneo Cinema expandido; motion graphics; design audiovisual; narrativas locativas; territórios informacionais; arte mídia; serviços de geolocalização; cartografias afetivas; espaços urbanos híbridos; cibercidades; realidade aumentada; internet das coisas; cibercultura.

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Comissão Organizadora da I Jornada Internacional GEMInIS (JIG2014), convida

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Chamada de Trabalhos


aprendizagem em ambientes digitais; conteúdo de entretenimento e as TVs Públicas; habilidades de storytellers nos processos de compartilhamento e interação de fan fiction. 6) Marketing transmídia Estratégias do marketing digital; crossmídia; propaganda e comunicação interativa; construção de lovemark; publicidade viral; marketing transmídia e a cultura em rede; recontextualização das marcas como universos narrativos expandidos. Categorias de Trabalhos Os trabalhos são classificados em duas categorias: - Painel: voltado para estudantes de Graduação, com apresentação de pôster; - Grupo de Trabalho (GT): voltado para pesquisadores com apresentação oral da pesquisa e envio do artigo completo para publicação em anais. As propostas de pesquisa para Grupo de Trabalho e Painel deverão ser submetidas mediante o envio de resumo através do sistema de submissões, disponível neste endereço: inscricoes.jig2014.com.br. A apresentação oral em Grupo de Trabalho estará sujeita ao envio do artigo completo, que deve ser encaminhado após o comunicado de aceite da proposta e pagamento da taxa de inscrição. Os trabalhos que forem efetivamente expostos nas sessões serão publicados nos anais eletrônicos da Jornada. Trabalhos aceitos para Painel terão seus resumos publicados em anais eletrônicos do evento. A apresentação da pesquisa estará sujeita ao envio do pôster em formato digital, após comunicação de aceite, e pagamento da inscrição. Critérios de Seleção Os resumos submetidos serão avaliados de forma anônima, por no mínimo dois avaliadores. Os critérios para aceitação dos resumos serão: - Qualidade e relevância social/acadêmica da temática; - Adequação do trabalho ao tema da I Jornada Internacional GEMInIS; - Consistência na abordagem teórico-metodológica da pesquisa; - Originalidade do trabalho; - Redação e ortografia adequada. Serão automaticamente excluídos os trabalhos que não obedecerem às normas de formatação previamente estabelecidas. Os autores que tiverem seus trabalhos aceitos serão notificados através do e-mail fornecido no ato da submissão. Após a confirmação do aceite, o interessado deverá enviar artigo completo ou pôster, dentro do prazo estabelecido, e providenciar a inscrição e o pagamento da respectiva taxa.

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Letramento midiático; edutainment; ‘gamificação’ do campo educacional; ensino-

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5) Entretenimento e a Educação


O resumo deverá conter no máximo 2.000 caracteres com espaço, apresentar informações essenciais acerca do trabalho (objetivos, metodologia, resultados, conclusões), acompanhado de 3 a 5 palavras-chaves. A proposta deverá ser enviada através sistema de submissão do evento, disponível no endereço: inscrições.jig2014.com.br. O texto da proposta não poderá apresentar identificação de autoria. Os autores devem preencher seus dados pessoais e minicurrículo ao efetuar o cadastro no sistema de submissão. O minicurrículo deve possuir até 5 linhas, indicando formação acadêmica, instituição à qual é filiado, e e-mail para contato. Formatação do Artigo Completo O material deverá ser entregue em arquivo digital no formato .DOC ou RTF, contendo, no mínimo 07 páginas, e no máximo 15 páginas, em tamanho A4, com margens superior e à esquerda de 3 cm, e inferior e à direita de 2 cm. Corpo do texto: deverá está em fonte Times New Roman, tamanho 12, espaçamento 1,5, recuo de 1,5cm na 1ª linha de cada parágrafo. Resumo: abaixo do nome do(s) autor(es), entre 300 e 500 palavras em Times New Roman, corpo 12, com alinhamento justificado e espaço entrelinhas simples (1,0); Palavras-chave: de três a cinco, separadas por ponto, abaixo do resumo, em Times New Roman, corpo 12, alinhado à esquerda; Nota de rodapé: na primeira página, com um breve currículo de, no máximo, cinco linhas por autor ou co-autor, em Times New Roman, corpo 10, entrelinhas simples (1,0), justificado; Subtítulos (ou títulos de capítulos e seções): Times New Roman, corpo 12, em negrito, alinhados junto à margem esquerda, com uma linha de espaço antes e depois; Referências Bibliográficas: Times New Roman, corpo 12, entrelinhas simples (1,0), espaço antes do parágrafo de 10 pontos, seguindo as normas da ABNT. Formatação do Pôster 1. O pôster deverá ser confeccionado com cordão para pendurar. 2. Dimensões do pôster: - largura: mínima 50cm e máxima 75cm; - altura: mínima 80cm e máxima 100cm; 3. Conteúdo: título idêntico ao do resumo aceito; nome do autor/autores e instituição vinculada; sugestão de estrutura: introdução; métodos; resultados e discussão; conclusões; referências principais; informar a instituição de fomento, se houver; identificar “Trabalho de Iniciação Científica” ou “Trabalho de Conclusão de Curso”, se for o caso.

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Formatação do Resumo

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Normas de Formatação


Inscrições Início: 18 de março de 2014 • Inscrições para modalidade “sem apresentação de trabalho” Início: 15 de dezembro de 2013 Confira abaixo as taxas de inscrição para participação na I Jornada Internacional GEMInIS: Até 06/05/2014

Após 06/05/2014

Professores, Pesquisadores e Profissionais Com apresentação de trabalho

R$ 100,00

R$ 130,00

Professores, Pesquisadores e Profissionais Sem apresentação de trabalho

R$ 85,00

R$ 110,00

Estudantes de Pós-Graduação

Com apresentação de trabalho

R$ 70,00

R$ 90,00

Estudantes de Pós-Graduação

Sem apresentação de trabalho

R$ 45,00

R$ 60,00

Graduados e Estudantes de Graduação

Com apresentação de trabalho

R$ 55,00

R$ 70,00

Graduados e Estudantes de Graduação

Sem apresentação de trabalho

R$ 30,00

R$ 50,00

Níveis

Modalidades

1) Efetuar o pagamento da taxa de inscrição através de depósito no Banco do Brasil, agência 4780-5, conta 5570-0, em nome de João Carlos Massarolo, CPF 578.533.399-68. 2) Preencha o formulário de inscrição presente no link: http://www.jig2014.com.br/formulariode-inscricao, e anexe o comprovante de inscrição.

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• Inscrições para modalidade “com apresentação de trabalho”

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Programação Resumida

O III Colóquio de Imagem e Som ocorrerá juntamente com a I Jornada Internacional GEMInIS. O Colóquio tem como objetivo fomentar as pesquisas e o diálogo entre pesquisadores e estudantes da área do audiovisual. Sobretudo, o Colóquio contará com a apresentação das pesquisas em desenvolvimento do Programa de Pós-graduação de Imagem e Som da UFSCar. Apresentação das pesquisas em desenvolvimento – alunos ingressantes dos anos 2012/2013. Total: 25 alunos. Inscrição: http://www.jig2014.com.br/formulario-de-inscricao Programação do III Colóquio de Imagem e Som Dia 13/05/2014 (ter.) 9h - 10h30

Mesa Discente 1

10h30 - 10h50

Mesa Discente 2 Intervalo

11h - 12h30

Mesa Discente 3

14h - 15h30

Mesa Discente 5

Mesa Discente 4 14h-16h30

Apresentação Discente Banners

15h30 - 16h 16h - 18h

Intervalo Mesa Discente 6

16h30-18h

Exposição Banners

Grupos de Trabalho Destinados para apresentação oral de trabalhos inéditos de pesquisadores de PósGraduação (mestrado, doutorado e pós-doutorado) que investiguem assuntos relacionados ao tema do evento: ‘entretenimento transmídia’, provenientes das seguintes linhas de pesquisa: Novos arranjos do Mercado Audiovisual na era da Economia Digital; Narrativa transmídia e a Cultura Participativa; Ficção seriada audiovisual para multiplataformas; Ecossistema midiático contemporâneo; Processos tecnológicos e artísticos em Imagem e Som; e Marketing transmídia. Painéis Voltados para apresentação de pôsteres de trabalhos inéditos de pesquisadores de Graduação que investiguem assuntos relacionados ao tema do evento: “Entretenimento Transmídia”, provenientes das seguintes linhas de pesquisa: Novos arranjos do Mercado

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III Colóquio de Imagem e Som

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tecnológicos e artísticos em Imagem e Som; e Marketing transmídia. Mesas Redondas Debates temáticos em torno de questões pertinentes ao atual contexto do “Entretenimento Transmídia”, contando a presença de pesquisadores nacionais e estrangeiros, além de profissionais do mercado brasileiro de entretenimento. 14/05/2014 - Mesa Redonda 1 “Arte, Mídia e Entretenimento: o dragão do mainstream contra a produção alternativa” Nesta mesa pretende-se discutir a produção midiática alternativa e popular e os produtos midiáticos gerados pelo mercado hegemônico das indústrias criativas do entretenimento. 15/05/2014 - Mesa Redonda 2 “Entretenimento inteligente: produção seriada para multiplataformas” Nesta mesa busca-se debater o potencial criativo das produções seriadas; a complexidade narrativa e a interação com o público através de estratégias de multiplataformas; conteúdos que migram entre diversas telas (televisão, internet, redes sociais, dispositivos móveis, etc.). 16/05/2014 - Mesa Redonda 3 “Entretenimento e Educação: O caso da TV pública brasileira” Nesta mesa serão abordadas as estratégicas utilizadas pela televisão brasileira na realização de projetos que aliem criativamente a educação e o entretenimento na produção de conteúdos, tendo como foco os processos de convergências midiáticas utilizados entre diversas plataformas de comunicação. Conferências 13/05/2014 - Conferência de Abertura ´Meu Herói? As Franquias de Mídia e a Negociação do Compartilhamento do Mundo Ficcional da Marvel Entertainment´ Ministrante: Ph.D. Derek R. Johnson (University of Wisconsin-Madison – Estados Unidos) A partir da análise do mundo ficcional de super-heróis da Marvel Entertainment nos cinemas, busca-se o entendimento das franquias de mídia não somente a partir de uma lógica economicista que governa a produção colaborativa nas indústrias de mídia contemporâneas, mas também os embates culturais que as instituições de mídia e seus funcionários têm de negociar, reenquadrar e até mesmo ir contra a ideia de uma colaboração compartilhada.

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seriada audiovisual para multiplataformas; Ecossistema midiático contemporâneo; Processos

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Audiovisual na era da Economia Digital; Narrativa transmídia e a Cultura Participativa; Ficção


Ministrante: Eduardo Hulsof (Lead Event Scripter na Ubisoft Toronto) O desenvolvimento tecnológico e a convergência midiática oferecem novas formas de imersão e participação em mundos ficcionais interativos - através de ambientes virtuais ou multiplataformas de comunicação. As narrativas interativas contemporâneas reconfiguram novos formatos de entretenimento que viabilizam experiências estéticas, cognitivas e imersivas para um público participativo na construção de mundos ficcionais complexos. 15/05/2014 – Conferência de Encerramento Audiovisual Latino-Americano nas Multiplataformas Ministrantes: Manoel Rangel (Diretor-Presidente da ANCINE); Eva Piwowarski (Coordenadora do Programa Polos Audiviovisuales - Argentina) Com as leis de incentivo a produção audiovisual e o crescente número de produções televisivas do Mercosul, é preciso encontrar possibilidades para a circulação dos conteúdos educativos produzidos na região entre os vários países, fenômeno ainda quase inexistente no país. Inclusive é necessário fomentar essa circulação para as emissoras de televisão brasileira de televisão pública, abrindo possibilidades para um maior intercâmbio cultural entre os países do grupo Mercosul. Minicursos Cursos de curta duração voltados para alunos de graduação e pós-graduação, pesquisadores, profissionais do mercado e interessados, abordando questões práticas e teóricas de diferentes campos das indústrias criativas do audiovisual. Os minicursos serão realizados entre os dias 14 e 15 de maio de 2014, no período da manhã e da tarde, com carga horária de 12hs. GEMInIS Game Jam, do conceito ao protótipo Ministrante: Eduardo Hulsof (Ubsoft Toronto) Construindo a Franquia: Estratégias e Desafios da Colaboração Ministrante: Ph.D. Derek R. Johnson (University of Wisconsin-Madison) Desenvolvimento e formatação de projetos e negócios criativos (abordagem instrumental) Ministrante: Profa. Dra. Alessandra Meleiro (UFSCar)

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O presente e o futuro das narrativas interativas

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14/05/2014 – Conferência


Oficinas

campos específicos da indústria criativa. As oficinas serão realizadas durante os dias 14 e 15 de maio de 2014, às 17h, com carga horária de 2h. Maiores informações em breve. Oficina 01: Jogos de Representação (RPG) Oficina 02: Narrativa Transmídia Oficina 03: Jogos para dispositivos móveis Oficina 04: Criação e Desenvolvimento de HQs para multiplataformas

Expediente e Contato Para acompanhar as notícias sobre o I Jornada Internacional GEMInIS, acesse nosso Website (www.jig2014.com.br), curta nossa página no Facebook (http://facebook.com/jig2014) e nos siga no Twitter (http://www.twitter.com/jig2014). Você também pode enviar um e-mail para jig.geminis@gmail.com com suas dúvidas, sugestões, reclamações ou elogios.

Realização

Apoio

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Espaço para atividades práticas que proporcionam novos conhecimentos técnicos sobre

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A genciamentos

e anonimato:

sobre a experiência do

A nonymous E rick Felinto Pesquisador do CNPq e professor do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. E-mail: erickfelinto@gmail.com

Ramon B ezerra Costa Mestre e Doutorando pelo Programa de PósGraduação em Comunicação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Bolsista da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj). E-mail: ramonbzc@gmail.com

Revista GEMI n IS

ano

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Resumo O objetivo deste trabalho é refletir sobre a experiência do Anonymous, problematizando seu funcionamento, a criação de vínculos e a forma de atuação. O Anonymous é uma espécie de grupo político, sem liderança predeterminada, que foi responsável por diversas ações e protestos nos últimos anos, tanto no ambiente digital quanto fora dele. Primeiramente, trata-se do contexto de surgimento e de algumas ações do Anonymous, que ajudem a discutir sua atuação, refletindo sobre os agenciamentos que o configuram. Em seguida, discute-se a participação dos sujeitos e a questão do anonimato. Palavras-Chave: Anonymous; agenciamento; anonimato.

Abstract The aim of this paper is to reflect on the hacker collective known as “Anonymous”, by discussing their modus operandi, the creation of bonds inside the group and how they tend to behave. “Anonymous” can be defined as a political group devoid of defined leadership, which was responsible for several actions and protests in recent years, both within the World Wide Web as well as outside of it. The paper initially describes the conditions for the emergence of Anonymous, as well as some of its first organized actions, in order to facilitate the analysis of its performance and the assemblages that shape it. Afterwards, it discusses the role of the subjects within the collective and the question of anonymity. Keywords: “Anonymous”; assemblage; anonymity.


Introdução

O

“grupo de hackers conhecido como Anonymous”. Embora prefiram ser chamados de hacktivistas, assim os meios de comunicação costumam se referir ao que ficou conhecido no mundo inteiro por organizar protestos contra

grandes empresas e alguns governos. Entre as ações pelas quais receberam o crédito estão: “derrubar”1 sites dos governos do Egito, Turquia, Zimbábue, Itália, EUA, entre

outros, assim como os de empresas como PayPal, Visa e Mastercard; e auxiliar nos levantes na África e sudoeste da Ásia, para ficar somente em alguns exemplos. O início do que veio a ser chamado de Anonymous está no ano de 2003, em um lugar estranho para um grupo que ficou conhecido por ações que visavam defender direitos humanos e liberdades individuais: um fórum do 4chan, especificamente a seção “/b/ - Random”, um lugar repleto de pornografia, insultos raciais e humor “politicamente incorreto”. O 4chan2 é um imageboard, uma espécie de fórum de discussão baseado na postagem de imagens e pequenos textos, no qual os usuários podem publicar os conteúdos que quiserem sem filtro e anonimamente. Quando um conteúdo é postado sem identificação, aparece ao lado “anonymous”, por isso o nome. Ao contrário da maioria das chamadas redes sociais, o 4chan possui uma interface simples (que lembra os primeiros sites do início da década de 1990) e não mantém o histórico de discussão/postagem por muito tempo, sua longevidade é proporcional ao grau de interação/postagem que existirá nele. No 4chan, os conteúdos estão agrupados por temas, mas a seção “/b/ - Random” serve para qualquer tipo de conteúdo. No “/b/”, se quiséssemos definir uma ação comum, que acontece a partir de diversas temáticas, seria a “trollagem” – uma espécie de piada, que busca irritar ou fazer troça de alguém ou algo. As imagens são postadas no fórum e, não raro, ganham outras versões e/ou pequenas frases, que depois são dis-

1 Os sites são “tirados do ar” utilizando uma técnica conhecida como “ataque de negação de serviço” (DDoS - Denial of Service), que consiste em criar, artificialmente, um número elevado de solicitações simultâneas a um servidor, tonando as páginas hospedadas nele indisponíveis na Internet. Não é uma invasão do sistema, mas a sua invalidação por sobrecarga. 2 http://www.4chan.org/.


ponibilizadas e “saem” do 4chan, ganhando outros sites, como o Facebook. Devido a esse funcionamento, muitos “memes” surgiram no “/b/”. 3

outros lugares. Exemplo disso foi quando entraram em um site chamado Habbo Hotel4 (muito parecido com o famoso Second Life), no qual as pessoas criam avatares e inteavatares iguais (um homem negro usando terno preto), enchendo a cidade e impedindo que as pessoas realmente interessadas usassem os serviços, como a piscina, por exemplo. A organização de ações como essa era muito simples: um usuário qualquer, anônimo, informava no “/b/” que faria determinada ação e convidava outros. Assim, existia um grupo que acessava regularmente o “/b/ - Random” e que parecia ter algo em comum. Ações como a do Habbo Hotel talvez tenham contribuído para que as pessoas no 4chan tivessem o sentimento de que não estão sozinhas, pois não se conheciam ou trocavam mensagens particulares, toda interação era feita no /b/, Foi nesse ambiente de trollagem que surgiu o Anonymous, um grupo ou uma ideia que acabou se tornando responsável por hábeis ações políticas.

A nonymous

do sujeito ao site, e voltada a ações que gerassem o riso, ridicularizando algo ou alguém.

e anonimato: sobre a experiência do

ragem em uma cidade. Vários usuários do 4chan entraram no site e criaram inúmeros

A genciamentos

Com o tempo, as ações de “trollagem” desses usuários do 4chan ganharam

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Aliar “trollagem” e crítica não é uma particularidade do Anonymous ou uma novidade contemporânea. Conforme diz Coleman (2012)5, os hippies, os situacionistas, o grupo Yes Men6, entre outros, já faziam isso. Talvez, uma possível diferença, ou novidade, seja o fato do Anonymous fazer isso a partir de uma forma de organização diferente, que é fluida, sem centro predefinido ou hierarquia, e a partir das redes digitais. Assim, foi em torno de uma espécie de espontaneidade que surgiu e se desenvolveu o Anonymous. É importante remontar alguns aspectos dessa trajetória para observar isto. A partir do início de 2007, o “/b/” do 4chan deixou de ser apenas um lugar no 3 O meme pode ser entendido como uma ideia que se espalha via Internet, podendo estar na forma de imagem, vídeo, ou mesmo uma palavra ou frase. O meme se espalha de pessoa para pessoa nas chamadas redes sociais, blogs, e-mail, entre outros. Para uma análise crítica da noção de meme, ver Felinto, E. “Grumpy Cat, Grande Mestre Zen da Geração Digital: Afetos e Materialidades da Imagem Memética”, disponível em http://www.academia.edu/3879345/ Grumpy_Cat_Grande_Mestre_Zen_da_Geracao_Digital_Afetos_e_Materialidades_da_Imagem_Memetica. 4 Brasil: https://www.habbo.com.br/. EUA: https://www.habbo.com/. 5 Disponível online em: http://canopycanopycanopy.com/15/our_weirdness_is_free. 6 Esse grupo utiliza paródias e piadas como forma de crítica e ação política. Um exemplo famoso de suas ações aconteceu em 2004: um dos integrantes do grupo deu uma entrevista à BBC dizendo ser o porta-voz da empresa Dow Chemical, que tinha acabado de comprar a Union Carbide (empresa responsável por um desastre químico que matou milhares de pessoas). O ativista disse que a Dow Chemical iria acabar com a Union Carbide e custear as despesas médicas dos sobreviventes, a limpeza do local do acidente e investigar os riscos dos produtos da empresa. Isso gerou uma enorme cobertura de outros meios de comunicação e uma nota da empresa desmentindo as afirmações, o que repercutiu mais ainda. Como resultado, as ações da Dow Chemical caíram mais de 20%.

E rick Felinto - Ramon B ezerra Costa

Mudanças e agenciamentos


qual eram postadas imagens consideradas engraçadas e organizadas “trollagens” para começar a fomentar a emergência de experiências mais organizadas. Isso aconteceu cano, que defende a supremacia branca, afirmando que os negros ainda deveriam ser escravizados nos EUA por serem uma raça inferior, entre outras ideias preconceituosas. Turner, em seu programa de rádio, criticou certo usuário do 4chan, motivando vários

fórum, para que todos tivessem acesso e pudessem “trollar” o radialista, seu site na internet foi derrubado e pizzas (que ele precisou pagar) foram enviadas para sua casa, além de acompanhantes (escort girls) terem sido contratadas em seu nome. Além disso, também acessaram seus emails e descobriram que ele era um informante do FBI, o que prejudicou enormemente sua credibilidade. Após isso, seu programa saiu da Internet e ele foi processado por ameaçar juízes. O funcionamento, ou modo de organização de uma ação como essa, era relativamente simples, por exemplo: um sujeito qualquer podia escrever um pequeno texto criticando o Turner, insultando-o e dizendo que merecia uma “lição”; outros faziam postagens concordando; alguém sugeria “derrubar” o site dele e enviava um tutorial ensinando como fazer isto; outros sugeriam que se passasse trotes, mas qual o número do telefone? Então alguém descobria e postava o número para todos usarem. E assim acontecia. Alguns somente lendo as publicações e outros oferecendo orientações de como agir, sem se saber quem era o outro que colaborava e agia junto. Após esse caso, o Anonymous começou a ser percebido (tanto externa quanto internamente, pela própria comunidade) como um tipo de ativismo digital. É interessante notar que as ações contra Turner parecem ter surgido, principalmente, por uma “motivação pessoal”. Provavelmente todos já conheciam o blogueiro e suas ideias preconceituosas, mas foi a partir das críticas feitas contra alguém do 4chan que os usuários se sentiram motivados a agir. Talvez o primeiro grande ato de ativismo do Anonymous tenha acontecido em 2008, contra a Igreja da Cientologia7, ação que ficou conhecida como “Projeto Chanology”. Nesse ano, começou a circular na Internet um vídeo no qual o ator Tom Cruise falava da Igreja, o que foi considerado engraçado por muitos e logo se alastrou. Em resposta, a Igreja ameaçou processar os sites se eles não retirassem o vídeo. As pessoas por trás do Anonymous encararam isso como uma censura da Internet e iniciaram uma 7 Essa Igreja foi fundada na década de 1950 nos Estados Unidos (atualmente existe em vários países) e atribui-se a fundação ao escritor L. Ron Hubbard. As ideias defendidas pela Igreja misturam elementos de várias religiões, como o budismo, o hinduísmo e o cristianismo, além de aspectos da psicoterapia.

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2012). Os números de telefone de Turner foram obtidos pelo coletivo e postados no

ano

membros da comunidade a sair em sua defesa (Cf. O documentário “We are Legion”,

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quando iniciaram as piadas e críticas contra Hal Turner, radialista e blogueiro ameri-

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mobilização contra a Igreja. Gabriella Coleman (ver “We are Legion”, 2012) afirma que a seita é como um oposto perfeito do Anonymous, pois é repleta de segredos, enquanto valor fundamental, que se manifesta por meio da livre circulação, apropriação e mudança dos conteúdos, dentre outras formas. Sendo assim, nada melhor do que atacar Inicialmente, as pessoas por trás do Anonymous lançaram um vídeo8 no qual “declararam guerra” contra a Igreja da Cientologia e falaram, pela primeira vez, como um grupo/movimento. Após isso, começaram a postar o vídeo em vários sites, porém, com mais rapidez, os vídeos eram “derrubados”. As outras estratégias empreendidas contra a Igreja foram parecidas com as utilizadas contra Hal Turner: congestionar os telefones, enviar pizzas para serem pagas, enviar faxes em branco e “derrubar” seu site. Foram as ações contra a Igreja da Cientologia que levaram o Anonymous pela primeira vez às ruas. Foram feitos vídeos afirmando que eles iriam às ruas das maiores convocar para o protesto, os vídeos também sugeriam normas de conduta como “não leve arma” e “cubra o rosto”, a partir da qual surgiu a ideia de utilizar a máscara de Guy

Apesar de terem convocado as manifestações, os membros do Anonymous não acreditavam que realmente as pessoas sairiam da sua zona de conforto e iriam às ruas, contam alguns participantes (“We are Legion”, 2012). Porém, em diversas cidades, como Nova Iorque, Sydney, Tel Aviv, Londres, Berlin e Los Angeles, centenas de pessoas participaram dos protestos. Até esse momento, as pessoas que compunham o Anonymous não sabiam quantos eram ou em quais cidades estavam. Alguns integrantes contam como se sentiram com as manifestações (“We are Legion”, 2012): alguns dizem que foi uma surpresa, mas também um estímulo ver que por trás das postagens existiam pessoas; outros contam que era como se todos se conhecessem, já que por anos riram das mesmas piadas, tinham os mesmos gostos e interesses; era uma curiosa mescla de homens, mulheres, não somente adolescentes do sexo masculino e nerds que nunca saiam de casa, como eles imaginavam. A Igreja da Cientologia revidou. Divulgaram informações afirmando que en8 O vídeo está disponível nesse link: https://www.youtube.com/watch?v=JCbKv9yiLiQ. Acesso em 23/07/2013. 9 Guy Fawkes foi um soldado inglês que participou de uma conspiração no século XVII com o objetivo de assassinar o rei da Inglaterra e os membros do parlamento. A conspiração foi descoberta e Fawkes executado. O personagem ficou famoso quando, em 2006, o filme V de Vingança, adaptado de uma série de quadrinhos, mostra um personagem defensor da liberdade, que usa a máscara do Fawkes e tenta se vingar.

E rick Felinto - Ramon B ezerra Costa

anonimato fora da Internet.

Fawkes9, bastante conhecida e que foi entendida como uma maneira de representar o

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cidades do mundo onde houvesse sedes da Igreja e convocando mais pessoas. Além de

e anonimato: sobre a experiência do

seu oposto perfeito, afirma Coleman.

A genciamentos

os jovens por trás daquela ideia cresceram na Internet, para quem a liberdade é um

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quanto eles eram pacíficos o Anonymous estava realizando ou incitando ameaças e assédios por telefone e emails contra pessoas da Igreja. Além disso, alguns membros do que seriam processados. Mas isso não parece os ter assustado. Alguns até colocaram as cartas em molduras e penduraram-nas na parede. Quando o Anonymous iniciou ações mais organizadas, começaram a usar me-

planejamento e discussão parecem coincidir com o momento em que o Anonymous passa a agir com mais intensidade na defesa de questões de caráter político. Exemplo disso foi quando saíram em defesa do WikiLeaks e do seu fundador, Julian Assange11. Este site divulgou inúmeros documentos confidenciais do governo dos EUA, como informações sobre a guerra do Iraque, o que teve grande repercussão. Diante disso, empresas como PayPal, Mastercard e Amazon cortaram os serviços para o WikiLeaks, o que o impediu de receber doações, sua principal fonte de renda. Irritados com isto, membros do Anonymous realizaram um “ataque de negação de serviço” (ver nota de rodapé 1) naqueles sites, tirando-os do ar e causando prejuízo. Após esse episódio, as ações de cunho político empreendidas pelo Anonymous só aumentaram. Em 2010, por ocasião das manifestações que culminaram com a deposição do ditador Zine El Abidine Ben Ali da Tunísia, o governo censurou a Internet e roubou a senha do Facebook de algumas pessoas. Diante disso, alguns hackers do país pediram ajuda ao Anonymous, dizendo-se Anons12, sendo que os integrantes dos EUA dizem que não sabiam da existência de membros naquele país (“We are Legion”, 2012). Os Anons ajudaram, especialmente, extraindo arquivos e enviando ao WikiLeaks para divulgação e “derrubando” alguns sites do governo. Cerca de um ano depois, os manifestantes agradeceram ao Anonymous pelo auxílio em um vídeo, dizendo que foram os únicos que ficaram ao seu lado. O ponto alto da participação do Anonymous nas manifestações políticas talvez tenha sido quando auxiliaram os egípcios, também no contexto das manifestações que ficaram conhecidas como “Primavera Árabe”. Quando o governo do Egito “desligou” a Internet do país, o Anonymous ensinou como religá-la: coordenaram e fizeram funcionar centenas de linhas discadas. Também pesquisaram tratamento contra a ação de gás 10 Protocolo de comunicação utilizado na Internet para bate-papo e troca de arquivos, podendo a conversa ser em grupo ou privada. 11 O WikiLeaks é uma organização sem fins lucrativos, com sede na Suécia, que divulga em sua página, de fontes anônimas, documentos e informações confidenciais de governos ou empresas, sobre assuntos de interesse público. O site foi fundado por Julian Paul Assange, jornalista, escritor e ciberativista australiano. 12 Como se chamam os membros do Anonymous.

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(Internet Relay Chat)10. A utilização dessa plataforma e o início de atividades com maior

ano

nos o 4chan e mais outros espaços para discutir, decidir e trocar arquivos, como o IRC

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Anonymous, que foram identificados, começaram a ser seguidos e a receber ameaças de

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lacrimogêneo e outros usados pela polícia, elaboraram uma espécie de cartilha e conseguiram pessoas que traduzissem para o árabe. Colocaram tudo isso em uma página de ajudaram a divulgar informações sobre o que acontecia no país. É importante enfatizar como esse poder de contribuição e intervenção política cimento de como funcionam os softwares, hardwares e toda a estrutura em torno que permitiu religar a Internet no Egito e “derrubar” os sites. Ainda que o movimento tenha chegado às ruas, nasceu, ganhou forma e se organiza via redes digitais. Sendo assim, o domínio das linguagens desse ambiente é fundamental, seja em nível básico, que permite a troca e o compartilhamento de mensagens, ou em nível avançado, que cria softwares e desobstrui a Internet em um país. A própria defesa da livre circulação de informação, que é fundamental ao Anonymous, passa pela dimensão técnica. E quanto mais os sujeitos conhecerem o funcionamento da “máquina”, de modo a criar com ela, No discurso de vários Anons é comum a afirmação de que se sentem poderosos, tanto quanto grandes corporações e governos, pois conseguem causar prejuízos e

permite isso, o que parece oferecer a quem usa, nesse contexto, o poder de se sentir “igual aos poderosos”. Diante disso, é possível perceber que a experiência do Anonymous é marcada por uma relação complexa entre os desejos de trollar, de intervir politicamente e de domínio tecnológico. E essa experiência parece se desenvolver em “agenciamentos”, que Deleuze e Guattari (1977) entendem como uma teia de elementos heterogêneos ligados por desejos. É uma noção mais ampla que a de sistema, estrutura, processo ou montagem e admite componentes de natureza diversa, tanto de ordem biológica, quanto social, maquínica e imaginária. Nesses agenciamentos, todos os elementos estão relacionados e se afetam mutuamente. Por exemplo, quando o desejo que prevalecia era o de trollar, de maneira desorganizada, espontânea e sem preocupação com o resultado, o fórum do 4chan era suficiente. Porém, quando se interessaram por ações mais organizadas, buscaram outras plataformas técnicas para isso, no caso o espaço privado do IRC. Assim, o Anonymous, de uma plataforma de entretenimento, povoada por trollagens (muitas preconceituosas), passa a um movimento político, mas não por uma sugestão ou imposição externa e sim possivelmente pelos afetos envolvidos. As intervenções começaram por um incômodo, praticamente pessoal, e foram adquirindo a dimensão de crítica política. A motivação dos sujeitos para as mobilizações pareceu

E rick Felinto - Ramon B ezerra Costa

ram” os sites de grandes empresas do mercado financeiro. É o domínio da técnica que

intervir significativamente, como quando foram em defesa do WikiLeaks e “derruba-

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mais efetiva poderá ser sua ação.

e anonimato: sobre a experiência do

do Anonymous tem relação com a “dimensão técnica” das redes digitais. Foi o conhe-

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fax e enviaram. Além disso, também “derrubaram” alguns sites do governo do Egito e

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passar menos por um aspecto racional/semântico e mais pela dimensão sensível/afetiva. Como diz Sampson (2012, p.86), o que nos move são os afetos, que se espalham de E esses afetos são vários. Inicialmente, as ações do Anonymous podem ter começado como uma brincadeira, um passatempo divertido, pois mesmo no momento em que se investia contra a Igreja da Cientologia ou contra empresas em defesa do Wiki-

que não significa que outras pessoas não pudessem estar motivadas por esses últimos. Desse modo, são vários afetos envolvidos, mas que podem convergir para a mesma finalidade. A facilidade para expressão, possibilitada pelas redes digitais, que faz parte da “atmosfera favorável”, contribui para essa manifestação, que pode ir ganhando outras dimensões e criando expressões novas de acordo com os afetos envolvidos. Terranova (2004, p.53-63) afirma que um sistema aberto permite a emergência do novo, pois possibilita criar e inovar. O fórum do 4chan pode ser considerado como aberto, já que não tem filtro ou a necessidade de criar um perfil para existir nele. Sendo assim, ele vai adquirindo diferentes sentidos de acordo com as intenções dos atores envolvidos. Nesse espaço aberto de circulação de afetos, a rede está sempre produzindo diferença (TERRANOVA, 2004, p.53-63), isto é, sempre surgem novas expressões e conexões, que emergem de acordo com os afetos envolvidos e são imprevisíveis. E essas novas expressões vão desde as práticas de trollagem até as intervenções de cunho político. Contudo, é difícil discernir o que é ação política e o que é trollagem na experiência do Anonymous, pois essas ações se misturam e existem juntas. Assim, a experiência do Anonymous precisa ser encarada como um agenciamento entre os afetos, os sujeitos, as plataformas técnicas, a ambiência que existe, entre outros elementos, que configuram as expressões e que parecem se aproximar da ordem do imprevisto e do afeto. A participação dos sujeitos Nesses agenciamentos, os sujeitos atuam em cooperação. Sennett (2012, p.6061), ao falar da experiência da esquerda no início do século XX, percebe dois tipos de cooperação: um tipo que enfatiza a necessidade de chegar a conclusões comuns, o que demonstra um objetivo dialético, e outro que prioriza o processo dialógico, isto é, a troca e a reciprocidade, podendo não chegar a objetivo nenhum. No primeiro tipo, a cooperação se assemelha a uma ferramenta, um meio, para se chegar a um lugar ou

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e não porque estavam movidas por sentimentos como solidariedade ou indignação – o

ano

Leaks, muitas pessoas podem ter se envolvido e “derrubado” sites por achar engraçado,

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pessoa para pessoa, quando existe uma atmosfera social favorável.

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atingir um objetivo, no segundo, ela é mais um fim em si mesma, sem se preocupar com objetivos finalistas. faces. Em ações como no caso da Igreja da Cientologia existem objetivos claros e várias medidas foram coordenadas para atingi-los. Embora o resultado esteja sujeito ao ines“pura trollagem”, como no caso do Habbo Hotel, não parece existir uma preocupação com os resultados, a situação que emerge a partir da cooperação entre os sujeitos pode acontecer ou não, e com resultados inesperados. Os fenômenos que se dão nesses agenciamentos estão sempre em um “vir a ser”, podendo alterar sua configuração e fazer emergir outra face. Um dos fatores que contribui para isso é a ausência de líderes ou de um centro que seja referência. Os sujeitos funcionam a partir de uma espécie de capacidade de auto-organização que emerge e não precisa esperar pelo chamado de entidades/organizações. Os descontentamentos e espontânea. É mais o afeto e a emoção que os move, e menos a vinculação orgânica, sistemática e idealista a uma causa. Assim, são mobilizações que partem de elementos

É possível notar isso nas ações do Anonymous, pois elas não têm um líder e não há hierarquia formal. Ainda que alguns sujeitos sejam mais ativos e influentes que outros, ou seja, ainda que alguém tome a frente de uma determinada ação, sugerindo algo ou explicando como fazer, trata-se de um processo fluido e a “liderança” costuma variar. Sendo assim, as pessoas parecem se vincular às ações mais por identificação com a causa ou por envolvimento na atmosfera afetiva (seja de trollagem ou solidariedade), sem ideia de quem seja o outro com o qual estão cooperando. Pois, ao contrário de outras formas de organização política, os envolvidos não precisam preencher formulários, doar dinheiro, nem mesmo dar seu nome. Apesar disso, o sujeito se sente fazendo parte de algo maior, construindo junto, criando vínculos e confiando no anônimo. A confiança é fundamental para a realização das ações e parece ser construída sem passar pelo conhecimento do outro; é, talvez, um processo mais afetivo, sensível, emocional. No caso do auxílio aos egípcios, por exemplo, os Anons tiveram grande trabalho para religar a Internet, fazer cartilha e enviar tudo. Foi tempo pessoal gasto com pessoas que eles não conheciam e que poderiam até não existir, pois alguém poderia se passar por elas. Apesar disso, eles agiram e confiaram. Um exemplo de como esses laços e relações se constroem é o caso de Brian Met-

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“macrocomportamentos”.

“micro” e “moleculares”, pela dimensão afetiva, sem regras prescritivas e que geram

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dos sujeitos (desorganizados) podem se encontrar e gerar ação de forma “emergente”

e anonimato: sobre a experiência do

perado, tenta-se construir determinados fins em comum. Por outro lado, nas ações de

A genciamentos

É interessante notar que no caso do Anonymous a cooperação assume essas duas

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tenbrink, morador da cidade de Grand Island, no estado de Nebraska/EUA, que diz ter chegado no 4chan por acaso, viu um post sobre a Igreja da Cientologia, pesquisou sobre bilização. Bastava seguir as instruções: instalar um software chamado “Low Orbit Ion Cannon”13, que podia ser baixado por qualquer pessoa, digitar www.scientology.org e apertar “go”, o que feito diversas vezes torna o sistema inutilizável. Mettenbrink disse

Esse é o caso de muitas adesões, que podem ser pontuais e não orgânicas. Porém, existem inúmeros perfis e tipos de participação, como diz Coleman (2012)14, alguns são hackers, isto é, programadores qualificados que dominam as linguagens de computador e de sua rede mundial, outros têm conhecimento médio desse ambiente e alguns não dominam esses códigos, mas são motivados pelo pensamento de que a informação deve ser livre. Esses sujeitos interagem de diversas formas de acordo com seus conhecimentos e interesses. Existem aqueles que contribuem na edição de vídeos, que escrevem textos e manifestos. Há outros, como Brian Mettenbrink, que não podem passar horas em salas de bate-papo deliberando sobre ações, mas que costumam se juntar aos ataques DDoS para “derrubar” sites, replicar mensagens e participar das manifestações públicas (COLEMAN, 2012). Mesmo diante dessa variedade de vínculos, construídos nas condições citadas anteriormente, eles não parecem frágeis. Por conta das ações empreendidas pelo Anonymous, que foram descritas no item anterior, mais de 10 pessoas foram presas em diversas cidades dos EUA. A acusação principal foram os ataques contra as empresas que impediram as doações ao WikiLeaks (“We are Legion”, 2012). Dentre os casos, há o de uma jovem de 19 anos, de quem o FBI apreendeu não só o seu computador, mas também o de seus pais. A maioria dessas pessoas já está em liberdade, aguardam julgamento, e dizem não estar arrependidas de suas ações. Um exemplo interessante é o de Brian Mettenbrink, preso pelos ataques de DDoS contra a Igreja da Cientologia. Cerca de seis meses após instalar o software e apertar o botão um sem número de vezes, policiais do FBI foram à casa de seus pais, armados, procurando por Brian, que morava em outro lugar. Em seguida, foram à casa de Brian, que, assustado e sem entender o motivo da visita, só percebeu o que tinha acontecido quando o questionaram sobre o Anonymous. Ele foi uma das pessoas que mais utilizou o programa para “derrubar o site”, por isso chegaram até ele. Brian foi 13 É um tipo de DDoS (distributed denial of service), processo que foi citado anteriormente na “nota 1”, que é utilizado para tornar um site indisponível a partir de milhares de pedidos de visualização ao mesmo tempo. 14 Disponível online em: http://canopycanopycanopy.com/15/our_weirdness_is_free.

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casa (“We are Legion”, 2012).

ano

que se sentiu parte do processo, levantou sua voz e foi ouvido sem nem precisar sair de

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o assunto e viu que era uma boa causa. E ainda parecia muito simples participar da mo-

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condenado a um ano de prisão e um ano de condicional, período no qual não poderia se aproximar de um computador. Apesar disso, ele diz que faria tudo novamente (“We Após esses casos de perseguições e prisões, teve início uma discussão no Anonymous com alguns propondo o retorno às trollagens simples e outros defendendo membros que se afastaram e criaram o “LulzSec”15, enquanto outros continuaram com as ações. A ética do anonimato Embora tenha se caracterizado como um grupo político, o Anonymous não tem um programa definido, mas possui algumas regras: os Anons não podem se autopromover; não devem “atacar” os meios de comunicação; nem promover a violência (COA primeira é uma regra que demonstra sua tendência “antilíder” e “anticelebridade” (COLEMAN, 2012). Essa regra parece tentar modular a concentração de poder. Coleman

O antipersonalismo, além de tentar minimizar as relações de poder, é uma estratégia que vai ao encontro de uma característica fundamental do Anonymous, o anonimato. Alguns membros dizem que seu poder está na habilidade de ser qualquer um. Embora esse anonimato já tenha sido quebrado algumas vezes, ele tem sua parcela de contribuição e é um aspecto importante. É interessante observar o ocultamento da identidade em um momento de grande exposição da vida pessoal nas chamadas redes sociais e quando as empresas e o Estado utilizam ferramentas para coletar, monitorar e vender essas informações (guardadas as devidas proporções nos diferentes lugares do mundo). Talvez por esse lugar que a exposição ocupe é que subverter requer esconder. Foucault (2010) entende que as noções de liberdade e ética estão relacionadas. Para ele, “a liberdade é a condição ontológica da ética. Mas a ética é a forma refletida assumida pela liberdade” (FOUCAULT, 2010, p. 267). A ética, nessa perspectiva, é entendida como prática racional, como escolha, por isso é uma forma de liberdade. Nesse sentido, talvez seja possível considerar que o Anonymous possui uma “ética do 15 O “LulzSec” foi um grupo com alguns Anons, mas que se juntaram para realizar ações fora do que vinha fazendo o Anonymous. Eles hackeavam e liberavam o que queriam, sem regras ou motivo aparente. Praticaram ações como roubar números de cartão de crédito e hacker sites de empresas de mídia. 16 Disponível online em: http://canopycanopycanopy.com/15/our_weirdness_is_free.

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devem se comportar como um líder, nem procurar atendimento pessoal na mídia.

(2012) afirma que os participantes lembram uns aos outros o tempo todo de que não

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LEMAN, 2012)16. Quem descumprir essas normas pode ser expulso do fórum do IRC.

e anonimato: sobre a experiência do

as intervenções políticas. Com isso, até houve uma espécie de dissidência entre alguns

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are Legion”, 2012).

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anonimato”, pois ocultar sua identidade foi uma escolha para exercer a liberdade e que implica em se constituir e funcionar de certa maneira. mento da identidade é em favor da elaboração de uma espécie de sujeito coletivo. Sendo assim, o anonimato não suprime as singularidades, os diferentes interesses e leituras sociais, por exemplo, mas elas colaboram e compõem um comum, que se manifesta na

Não se pode esquecer a dimensão do afeto ali envolvida. É frequente entre os Anons a afirmação de que são uma só voz, por isso não mostram seu nomes e rostos. Dessa forma, há uma espécie de unidade na diversidade de pessoas que não se conhecem, mas que estão unidas em determinados momentos por afetos, interesses e que parecem confiar umas nas outras. Uma dimensão importante dessa ética do anonimato é que ela transcende as leis. Eles possuem um conjunto de valores (“a informação é um direito e deve circular livremente”; “não deve existir censura”; “liberdade de expressão é fundamental”; entre outros) e os defendem independente das sanções. Parece que dizem: “tudo bem, posso ser preso (a), mas farei o que acho certo”. É um conjunto de regras oriundas da sua liberdade de escolher e de se constituir eticamente, uma ética própria, que se manifesta em uma determina forma de estar no mundo. O anonimato permite aos Anons agirem sem filtro e fortalece o exercício da sua ética que transcende as leis. O anonimato é uma condição de possibilidade da transparência, da franqueza e da ação, tal como eles desenvolvem. Isso lembra a noção de “parrhesía” que Foucault (2006) retoma ao estudar os processos de constituição do sujeito na filosofia antiga. Parrhesía diz respeito a uma técnica de franqueza, falar a verdade, que pressupõe uma liberdade. Porém, não é qualquer franqueza, mas sim aquela que modifica e busca uma melhoria do sujeito. O anonimato permite ser quem se é, defender as causas que se acredita, minimizando, ou atrasando, as sanções. Com o Anonymous, o anonimato deixa de ser apenas uma forma de ocultamento e proteção individual para se tornar a arma de um grupo, uma forma de organização sem líder. Ocultar o sujeito é também uma forma de resistir que caminha na contramão dos processos de subjetivação atuais, que incitam a exposição e mapeiam rastros, facilitando o controle. Então, é uma resistência porque induz a criação de outro sujeito menos personalista e anônimo, que pode circular e agir com mais facilidade. Os sujeitos que fazem o Anonymous agem de suas casas, seus quartos, suas vidas privadas. É desses lugares que “derrubam” sites, circulam informações e organi-

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do WikiLeaks, ou na defesa dos direitos humanos contra as ditaduras do mundo árabe.

ano

defesa da liberdade de expressão frente às empresas que tentam inibi-las, como no caso

Revista GEMI n IS |

O Anonymous propõe praticar o anonimato em nome da coletividade. O oculta-

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zam as trollagens. Essa é uma forma de ação política que ganha dimensão macro, pública, mas que é administrada na vida íntima. Essa ética do anonimato pressupõe uma esses dois campos na política não é uma novidade, conforme mostra Fabián Ludueña Romandini (2012), mas na experiência do Anonymous isso é evidenciado, além de ser Assim, o Anonymous traz uma experiência política que mostra uma reunião da vida pública, comum, com a vida íntima, particular. São pessoas que se recusam a usar as tecnologias de uma determinada maneira e a viver de certa forma, que preferem inventar, resistir e criar. São sujeitos que parecem investir parte da sua vida na resistência, buscando linhas de fuga. Últimas considerações A partir das ideias sugeridas, e ainda que algumas questões tenham sido mais e caminhos para a reflexão sobre um fenômeno que parece bastante rico e diverso. De trollagens ao apoio às revoluções árabes, o Anonymous é, sem dúvida, um fenômeno de

de alcançar mudanças ou expressões macro. Apesar das ações de cunho político, o Anonymous não se tornou um “observatório de direitos humanos” ou algo parecido, e as intervenções políticas não eliminaram a trollagem (COLEMAN, 2012)17. Essas duas dimensões estão sempre presente, os próprios protestos figuram entre o sério e o jocoso. Protestos esses que atingem grande visibilidade, ao mesmo tempo em que o sujeito particular é invisibilizado. Porém, ocultar o sujeito pessoal só é possível por se tratar de uma ação política que não tem como meta a legitimação em um quadro político já existente, seu objetivo parece ser questionar, mudar fluxos de poder, protestar, enfraquecer o outro, mas não oferecer uma sugestão ou alternativa a algum problema. É uma ação que parece visar a crítica, a intervenção, que não busca outro lugar além do que já é seu, e que parece sempre vigiar à espera de um erro para “corrigi-lo”, pois, como diz o conhecido adágio do grupo: “We are Anonymous. We are Legion. We do not forgive. We do not forget. Expect us”.

17 Disponível online em: http://canopycanopycanopy.com/15/our_weirdness_is_free.

E rick Felinto - Ramon B ezerra Costa

podendo mudar sempre, e operando na dimensão micro, mas nem por isso deixando

difícil definição, parece mais uma ideia que está acontecendo e se construindo na ação,

A nonymous

apontadas do que propriamente esclarecidas, este trabalho apresentou algumas pistas

e anonimato: sobre a experiência do

uma condição de possibilidade da sua ação.

A genciamentos

escolha que envolve, inclusive, a doação de parte da vida privada. A coexistência entre

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Referências

JENKINS, Henri. Confessions of an Aca/Fan. 2008. Disponível em: http:// henryjenkins.org/2008/04/anon.html. Acesso em: 03 jul. 2010 COLEMAN, Gabriella. Anonymous: from the Lulz to Collective Action. NYU. 6

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4 - n . 2 - v. 2

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ano

de abril de 2011. Disponível online em: http://mediacommons.futureofthebook.

Revista GEMI n IS |

ANONYMOUS. Hi, The following post is [about] anonymous. In:

33


TERRANOVA, Tiziana. Network Dynamics. In: Network culture: politics for the information age. London: Pluto Press, 2004.

Knappenberger. FilmBuff, 2012. Online. 93 min.

A genciamentos

WE ARE LEGION: the story of the hacktivists. Direção: Brian

34

e anonimato: sobre a experiência do

A nonymous •

E rick Felinto - Ramon B ezerra Costa


As

2013: Doméstica , O som ao A Febre do Rato

manifestações de

revendo

Redor

e

Cezar Migliorin Pesquisador ligado ao Programa de Pós-graduação em Comunicação da Universidade Federal Fluminense e Chefe do departamento de Cinema e Vídeo da mesma universidade. Doutor em Comunicação e Cinema (UFRJ/Sorbonne Nouvelle). Email: migliorin@gmail.com

Revista GEMI n IS

ano

4 - n . 2 - v. 2 | p. 35 - 47


Resumo Para chegarmos ao recente cinema político feito no Brasil, percorremos as manifestações de Junho e seus desdobramentos. Apresentamos a relação entre processos subjetivos e as manifestações, destacando a noção de acontecimento para pensar as crises existentes entre processos subjetivos e modos de produção. Em um segundo momento, retomamos três filmes realizados em Pernambuco, Doméstica (2012), de Gabriel Mascaro, O som ao Redor (2013), de Kleber Mendonça e a Febre do Rato (2012), de Cláudio Assis, todos eles atravessados por um desejo de refletir sobre a comunidade. Com as marcas das manifestações, nos colocamos novas questões às representações e dispositivos das obras. Palavras-chave: Manifestações; Brasil; Cinema; política.

Abstract In order to reflect about recent political films made ​​in Brazil, we go through the protests that were present in the whole country in 2013. We bring up the relationship between subjective processes and protests, highlighting the notion of event to think the crisis between subjective processes and modes of production. In a second moment, we review three films made ​​in Pernambuco, Housemaids (2012), Gabriel Mascaro, Neighboring Sounds (2013), Kleber Mendonça and Rat Fever (2012), Cláudio Assis, they are all crossed by the desire of thinking the community, and, with the marks of the demonstrations, we put new questions to the representations in those films and its dispositives. Keywords: Protests; Brazil; Film; politics.


Introdução

U

m evento que toca a todos de maneira tão intensa, como foram as manifestações em tantas cidades brasileiras em Junho de 2013, nos poupa da necessidade de descreve-las em detalhes. Todos conhecem os fatos, sabem das dimensões, das ações, da

violência policial, dos vídeos na internet e dos lugares da grande mídia. Podemos assim partir para a reflexões específicas sobre o que se passou - e se passa - e os rastros desse movimento. Nesse artigo farei dois movimentos. O primeiro, mais amplo, refletindo sobre a possibilidade de traçarmos características comuns entre aqueles que estavam na rua e fizeram as manifestações ganharem as proporções e a importância política que ganharam. O segundo, olhando para três filmes do cinema que se faz no Brasil hoje e as eventuais relações que os processos subjetivos engajados e representados nos filmes podem ter com os eventos de junho. Diferentemente da Europa e dos países árabes, regiões do mundo onde grandes mani-

festações estiveram nas ruas nos dois últimos anos, no caso brasileiro, não vivemos uma crise econômica, como na Europa, nem uma crise institucional, como nas ditaduras árabes. Pelo contrário, a última década foi marcada por uma economia estável com importantes ganhos de renda para a população mais pobre. Institucionalmente, sabemos que a maioria daqueles que estão nas ruas não tinham mais que 5 anos quando Fernando Henrique Cardoso foi eleito e o que essa população viveu foi uma troca de poderes organizada dentro de uma certo consenso global de democracia e separação de poderes. Mas, mesmo sem crise econômica ou institucional, poderíamos, ainda assim, afirmar que as manifestações exprimem uma crise. Gostaríamos de pensar essa crise a partir de duas linhas complementares, uma que aponta para uma crise provocada por desacordos em relação às riquezas que se produz na comunidade e as riquezas que nela se almeja produzir. Complementar a esse ponto é uma crise entre os processos subjetivos e os processos produtivos forjados na comunidade. Crise 1 - Desacordos da riqueza O primeiro desacordo se expressa como uma crise na comunidade em relação à riqueza que se produz. Uma enormidade de pautas presentes nas manifestações foi


frequentemente perturbadora para os que tentavam entender o que se passava, para entender os motivos das ruas estarem lotadas, como há muito não se via. Essa multipli-

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cidade de pautas, antes de tudo, nos colocava na dificuldade de vermos em um só mo-

As

vimento uma tantos de atores sociais, o que não estamos acostumados. Por vezes essa

manifestações de

dificuldade em considerar as manifestações como algo sobre o qual deveríamos nos debruçar, uma vez que pareciam excessivamente confusas, - diversas demais - levava alguns ao cinismo, como no início do artigo do escritor Guilherme Fiuza, publicado no

entre o tipo de riqueza que a comunidade é estimulada a produzir e o a riqueza desejável. As manifestações identificam um país que alcança um “sucesso mundial”, um país que se insere no mundo como um player importante, como dizem no business – expressão especialmente irônica quando as manifestações acontecem durante a Copa das Confederações. Mas, é nas manifestações que se questiona esse sucesso com uma pluralidade de pautas em que se explicita um desacordo em relação ao modo dessa riqueza estar no país. Como era explícito nas jornadas de junho, as ilegalidades do sistema estavam longe de estar na centralidade da agenda, diferentemente do que fazia crer grande parte das matérias da grande mídia nos dias de manifestação. Mais que ser contra o que há de desvio nesse processo global em que o país se encontra, se manifestava contra o lugar mesmo que o país se colocava. A distribuição de renda dos últimos anos não é suficiente – como veremos, a questão econômica não explica os processos subjetivos – e a Copa do Mundo não exprimia o tipo de inserção global almejada.

Cezar Migliorin

O primeiro aspecto da crise pode então ser apresentado como um desacordo

pública e não uma riqueza privada.

Rato

geral. Nesse acúmulo de pautas, há algo em comum. Todas elas reclamam uma riqueza

do

claro, de todas as manifestações contra a elitização dos estádios, metáfora do mal estar

A Febre

ções de moradia em que o espaço urbano não fosse pautado pela gentrificação, além, é

e

demandavam saúde e educação de qualidade, transporte efetivamente público, condi-

Redor

aquelas que eram expressas de maneira discursiva. As principais pautas, como vimos,

som ao

cabido traçar uma linha comum entre a grande maioria das reivindicações, pelo menos

D oméstica , O

Mesmo não acreditando em gigantes atentos ou sonados, não nos parece des-

revendo

“O Brasil deu para dizer a si mesmo que mudou. Que nada mais será como antes das manifestações de rua, que agora vai. Que se os governantes e os políticos em geral não entenderem o recado das ruas, estão fritos. É um fanfarrão, esse Brasil. Qual é mesmo o recado das ruas? Vamos falar a verdade: ninguém sabe. Nem as ruas sabem. Ou melhor: não há recado. O gigante continua adormecido em berço esplêndido — o que se ouviu foi um ronco barulhento, misturado com palavras desconexas. Esse gigante fala dormindo.” (FIUZA, 2013)

2013:

O Globo do dia 06.07.13


Copa do Mundo – metáfora da crise das riquezas.

da Copa das confederações, evento teste para a Copa do Mundo de 2014, receberam também grandes manifestações em torno dos estádios. De alguma forma a Copa se tornou o símbolo de um país que, apesar de todas as melhoras econômicas e dos índices

das capacidades inventivas e criativas é preciso ser rico, é preciso pertencer a uma elite. E, mesmo em cidades em que a pobreza guarda fortes interações com os espaços mais ricos, a sensação geral é que esses espaços de convivência vem sendo eliminados. Nesse sentido, o futebol, marca constituinte do país, foi furtado daqueles que o apreciam e colocado como moeda de troca para justificar esse tipo de organização da riqueza, rejeitada nas manifestações. Para se ter direito ao que nos constitui - o futebol - é preciso entrar em um sistema que não é amplamente compartilhado na comunidade. Se é possível poder falar em crise de representação, essa é sem dúvida uma importante. Aquilo que nos representa não nos pertence e para retomarmos o que é o nosso mundo é preciso compartilhar um modo de organização da sociedade, fundado nas riquezas individuais, que não nos interessam. Nesse dias de manifestações, muitas delas em torno de estádios, como no Rio de janeiro, Fortaleza, Recife e Belo Horizonte, foi como se a Copa explicitasse a operação de todo o estado associado ao capital e à grande mídia. A Copa materializava a forma como a população foi alijada do que lhe pertence, o forma como há uma desconexão entre consumo de bens básicos e participação efetiva no que constitui a elite: tempo, lazer, saúde, entretenimento. A crise é evidente. A Copa, de espetáculo virou metáfora. O primeiro aspecto da crise pode ser resumido da seguinte maneira: enquanto o Brasil entra na centralidade do jogo mundial – e a Copa é o prêmio maior para essa centralidade - a riqueza que se estimula nesse jogo é a riqueza individual e não coletiva. A crise é um desacordo entre a riqueza que se deseja e a riqueza que se apresenta como possível. Crise 2 - Descordo entre processos de produção e processos subjetivos É também um desacordo que marca o segundo aspecto da crise que se desdobra desse primeiro aspecto. Se a riqueza individual é compulsória e esse não é o futuro que se imagina e que se deseja; a crise se faz. Como colocou Maurizio Lazzarato, em

4 - n . 2 - v. 2

ter direito àquilo que constitui o direito à cidade ou direito ao pleno uso do tempo e

ano

sociais dos últimos anos, não transformou um princípio de organização social: para se

Revista GEMI n IS |

Durante o mês de junho, em todas as cidades que receberam jogos de futebol

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encontro no Rio de Janeiro: “há crise quando se intensifica o descompasso entre o modelo produtivo e a produção de subjetividade.” 

Pois talvez esse seja um bom resumo 1

mento de 20 centavos na passagem do ônibus em São Paulo, as manifestações ganharam proporções gigantescas. Os 20 centavos no preço da passagem, ou as demandas por um transporte de qualidade poderiam ser lidas como mais uma demanda de con-

citado nosso preconceito de classe dizendo que os pobres querem apenas mais e mais aos processos subjetivos. Todos querem o direito de ir, não sabemos para onde nem por quais motivos. Tal conexão com a cidade é parte essencial das possibilidades de agenciamentos dos sujeitos e comunidades com o que os espaços urbanos tem de potência;

maioria das cidades brasileiras, o transporte é hoje muito mais um agente de esquadri-

Novamente, quando nos perguntamos o que querem os que manifestam ou

ocupações, como aconteceu durante mais de dois meses na entrada a câmara do Rio de Janeiro, explicita esse espaço de articulação e produção. Diferentemente do Fora Collor ou da Campanha das Diretas, se constitui nessas manifestações muito mais como um espaço em que uma inquietude em relação aos futuros possíveis se expressa e, antes de qualquer futuro delineável, é a mobilidade que se faz essencial. Se concordamos com esse gap entre as formas de vida aceitáveis e as formas de vida desejáveis, faz todo sentido que as demandas sejam enormes, uma vez que é próprio a todo processo subjetivo um agenciamento de muitas ideias, forças, desejos 1 Em Junho de 2013 Maurízio Lazzarato fez uma série de encontros no Rio de Janeiro e essa formulação foi construída de maneira informal na casa de Tatiana Roque. 2 Matéria de O Globo em 29.09.2013, explicita essa relação em que tudo se explica pelo desejo de consumo: http:// oglobo.globo.com/tecnologia/a-classe-vai-ao-paraiso-do-smartphone-10196238 - Última consulta: 27.10.2013. 3 Ver: DEBORD, Guy. Teoria da deriva. Texto publicado no no. 2 da revista Internacional Situacionista em dezembro de 1958. http://teoriadoespacourbano.files.wordpress.com/2013/03/guy-debord-teoria-da-deriva.pdf

Cezar Migliorin

são ocupadas para que elas se tornem o lugar da sociabilidade – a própria prática das

exatamente o que querem antes de ir para a rua. Pois, não é isso que vemos: as ruas

Rato

devem ser o ponto final de uma elaboração política. Ou seja, as pessoas devem pensar

do

quando lemos que há demandas demais, o que está colocado é que as manifestações

A Febre

que potencializador de derivas e desvios, como imaginado pelos situacionistas.3

e

nhamento da cidade e organizador dos espaços de uso por estes ou aqueles grupos do

Redor

elemento fundamental dos processos subjetivos no meio urbano, mas, ao contrário, na

som ao

seus espaços de cultura, lazer, consumo, encontro, religião, etc. O transporte é, antes,

D oméstica , O

consumo2. Pois, o que nos parece relevante é que o transporte está diretamente ligado

revendo

Esse resumo simplório não dá conta do que viria depois. Vale lembrar que temos exer-

2013:

sumo: a nova “classe C” deseja consumir transporte como os ricos, poderíamos dizer.

manifestações de

Nesse sentido, a pauta dos transportes é exemplar: mobilizados contra um au-

As

do que vivemos:

Um descompasso entre os processos subjetivos e o sucesso do capital.

40


e poderes ou como escreveu Antonio Negri, “A produção de subjetividade atravessa sempre o múltiplo: ela não o exclui nem o anula, mas ao contrário, o desenvolve através comum” (Negri, 2006:219) Um acontecimento

rado de uma variedade de processos. Esses processos econômicos, históricos, culturais e subjetivos, em um determinado momento, motivados por elementos mínimos, produzem uma faísca que opera como um grande desvio em cada um deles, em cada um dos processo. “Atenção, a menor linha de fuga pode fazer explodir tudo”, (GUATTARI, 1981:56) escreveu o Guattari. “O acontecimento seria assim uma fagulha desviante, um shifter que não propõe ainda uma nova ordem.” (MIGLIORIN & BRUNO, 2013:07) Por que isso importa? Importa entender o que é um acontecimento uma vez que ele não pode ser julgado. Ele não é nem bom nem ruim, ele apenas funciona como um refrator de raios. Como se houvesse um curso para todos os processos andando em comunhão – econômicos, sociais, políticos, subjetivos - mesmo que pleno de problemas, de repente esse facho que luz encontra um prisma, um cristal que inviabiliza as continuidades homogêneas. Como coloca Lazzarato, “O modo do acontecimento é a problematização. Um acontecimento não é a solução de problemas, mas a abertura a abertura de possíveis” (LAZZARATO, 2006:14). Não sabemos o futuro das manifestações, mas é certo que elas marcaram de forma definitiva as formas de pensar e agir sobre o futuro da comunidade, pois, é próprio ao acontecimento uma transformação nas formas de percepção e novas associações constitutivas do que é o comum se fazem possíveis. Três filmes: diagnósticos, fracassos e desacordos Se o nos concentrarmos para importantes obras recentes que narram e se interrogam sobre questões políticas, problemas ligados à organização da cidade ou dos processos subjetivos, até que ponto identificamos nessas obras linhas de continuidade possível com as crises que narramos? Ou, colocada de outra forma, de que maneira o cinema explicitou essas crises ou as antecipou? Podemos identificar na recente produção brasileira uma série de filmes que retomam um desejo de pensar o país. Distante de uma forma mais alegórica que marcou os anos 60, importantes produções recentes reto-

4 - n . 2 - v. 2

esse acontecimento? Digamos assim: um acontecimento é um entrecruzamento inespe-

ano

A soma das crises faz das manifestações um acontecimento, mas o que seria

Revista GEMI n IS |

das relações que ela instaura, isto é, na construção de componentes e de linguagem

41


maram questões de classe, de organização da cidade, de embates no campo do trabalho. Meu esforço aqui se concentra em três obras do recente cinema feito em Pernambuco; A

42

febre do Rato, de Claudio Assis; O som ao redor, Kleber Mendonça filho; Doméstica,

As

de Gabriel Mascaro. O fato de serem pernambucanos é mais uma coincidência do que

manifestações de

um elemento relevante nessa reflexão. Com esses filmes, tento colocar questões que são amplamente motivadas pelo contexto que descrevi e que se explicitou com as manifestações. Não se trata aqui se organizar ou criticar os filme à luz dos recentes movimentos

O som ao redor, talvez guarde uma forte relação com um outro filme muito debatido do inicio dos anos 2000, Cronicamente Inviável (2000), de Sérgio Bian-

Bianchi e não se encontra presente no de Mendonça, os dois filmes representam um

de exploração continuados. Nos dois casos ainda, há a tentativa de identificar uma rede

Em O som ao redor, a elite das novas gerações fazem uma reprodução crítica dos sistemas de exploração. Ao mesmo tempo em que o jovem é “descolado”, moderno, global ele é também o reprodutor de uma sistema familiar que migrou do canavial para a cidade e se instaurou na especulação imobiliária. Os outros jovens do filme são pequenos bandidos, empregados violentos ou apenas passivos, como a namorada do rapaz que transita entre Berlin e a especulação imobiliária em Recife com naturalidade. Perspicaz e bem humorado, o filme se apresenta como um sintoma preciso dos modos de vida cotidianos estarem atravessados por um legado histórico e que hoje encontra outras formas de exploração e de tensões sócias, trazendo inclusive a arquitetura e o urbanismo como operadores fundamentais nessas continuidades excludentes, entretanto, nada no filme indica um desacordo substancial entre os modos de vida e os modos como a cidade se organiza. Tal afirmação não tornaria o filme inverossímil se o mesmo rapaz que faz corretagem estivesse também nas manifestações e quebrasse

Cezar Migliorin

se reatualizar.

Padilha, são os micropoderes, locais e horizontalmente distribuídos, que não cessam de

Rato

uma ênfase em macropoderes ou um sistema, como em Tropa de Elite 2 (2011), de José

do

de poderes e explorações subjacentes ao cotidiano, à banalidade da vida. Mais do que

A Febre

inalterado, apesar das mudanças de superfície, possibilitando a existência de circuitos

e

estado de coisas na comunidade – Pernambuco/Brasil - que se mantém essencialmente

Redor

aspectos estilísticos, sobretudo pelo tratamento sarcástico que acompanha o filme de

som ao

chi. Mesmo que haja uma distância bastante significativa entre os dois filmes em seus

D oméstica , O

O som ao redor

revendo

acontecimento suscita em relação ao mundo que habitamos.

2013:

políticos, mas de refletir sobre o lugar mesmo do pesquisador e das perguntas que um


caixas de banco, mas não é o que vemos nesse retrato urbano. Talvez apenas o próprio lugar do filme seja a instância que garanta uma empatia com o espectador, uma vez miniaturização do fascismo, como dizia Guattari (GUATTARI, 1981), explicitados nas cenas em que a classe média faz questão de bem colocar os pobres “nos seus devidos lugares”, como na reunião de condomínio em que há uma indignação de classe com a

manutenção dos poderes e do ethos urbano, é justamente na sua impossibilidade em apontar para processos subjetivos dissonantes àquele universo que o filme parece, pelo menos em parte, fracassar em diagnosticar o país que vemos em 2013, ou talvez, pelo contrário, seja muito bem sucedido em demarcar um terreno em que uma linha de fuga pode fazer tudo explodir. A febre do Rato A febre do Rato narra a história de um poeta revoltado com os caminhos da cidade, das vidas em comum, libertário e, de alguma forma, fracassado. – Zizo, interpretado por Irandhir Santos, é o personagem que tudo pode e nada pode. Sua liberdade é intensa, mas o desejo de um território – com a amante, com a cidade – é algo que lhe corrói. Como ele mesmo diz, tenho medo de mim mesmo. “Protect me from what I want”, como dizia o trabalho de Jenny Holzer. Proteger-se onde? No mundo. O rio é sujo, mas a sujeira é anticorpo, diz ele, isso dá força aos corpos. Proteger-se de si é um mergulho nas intensidades e experiências do mundo; essa parece ser a encantadora potência e fragilidade de Zizo, o poeta. O filme encontra nesse personagem uma forma de percorrer uma cidade que não se revela em sua superfície, e é com ele que entramos em espaços e vidas que constituem camadas do espaço urbano que apenas nas suas bordas dialoga com o esquadrinhamento do estado ou com o capital. Na última sequência do filme, o que vemos é o rio e os ratos, a casa vazia, a mãe sozinha, a amante velha sozinha, Eneida a mulher por quem foi apaixonado, sozinha e o poeta morto depois que uma manifestação de 50 pessoas que é interceptada violentamente pela polícia. Se o ataque policial violento se repete hoje, a manifestação é muito diferente. Anárquica e erotizada, ela é dependente de uma líder frágil, o poeta que acaba desaparecendo no Capiberibe. Os jovens retratados são vitimados pela cidade, pelos poderes e, no final destruídos por eles; despotencializados. Não seria justo cobrar de A febre do Rato uma manifestação com as características das jornadas de junho, mas não deixa de ser marcante que o filme se encerre em

4 - n . 2 - v. 2

gar sem o saco plático. Se O som ao redor é tão preciso no diagnóstico das práticas de

ano

falta de engajamento do porteiro com seu trabalho ou com o fato da Revista Veja che-

Revista GEMI n IS |

que há no filme/realizador um nítido incômodo com os microfascismos cotidianos, ou

43


uma manifestação, algo extraordinário no cinema recente brasileiro, mas que ao mesmo tempo seja tão diversa do que vimos em 2013. Diferentemente de O Som ao redor, não se trata aqui

44

de um diagnóstico, mas de uma narrativa de um herói trágico, que em seu paixão e revolta pelo

As

mundo que o cerca, fracassa em sua mobilização.

manifestações de

Doméstica

seu dispositivo, Gabriel Mascaro trabalhou com treze duplas de adolescente e domésas “suas” domésticas, pautados por certas regras, como a obrigatoriedade de filmar a autorização de uso de imagem, por exemplo. Cada adolescentes e cada domésticas receberam 600 reais pelo filme. Mascaro jamais encontra seus personagens.

o imbricamento entre exploração e afeto compõe um quadro que transcende as histó-

tes estratos sociais é eficaz na forma como deixamos a sala de cinema conectandos às

te essas árvores genealógicas até a época da escravidão.” (COUTO, 2013) Nesse sistema, atravessado pelo afeto, o patrão trata o empregado como alguém de casa, mas não da casa toda. Toda uma dimensão da organização espacial como definidora das possibilidades sensíveis e dos direitos se explicita na divisão do espaço da casa entre patrões e empregado que “até comem na mesa com os patrões”. A organização espacial como operador político é anterior à relação. Uma dimensão trágica, apesar dos afetos e da apresentação de múltiplas formas de vida, atravessa o filme. O processos subjetivos dos filhos–patrões encontram, nas várias histórias, uma linha comum em continuidade com as forças que dividem a casa e limitam as potências e afetos das domésticas. É frequente no filme a história de domésticas que tem a vida apartada de suas família e filhos, além de múltiplas tragédias pessoais e afetivas. A dúvida central, enfatizada pelas jornadas de junho, aparece na eficácia do dispositivo que não é problematizado pelos adolescentes. Não sabemos se esse questio-

Cezar Migliorin

patrão/empregado entre gerações, dizendo que “Seria possível traçar retrospectivamen-

dos traços mais duros de Doméstica, chama a atenção para a continuidade do sistema

Rato

própria história do país. José Geraldo Couto, em artigo sobre o filme, ao comentar um

do

histórias e, com elas, encontramos linhas de continuidade entre diferentes famílias e a

A Febre

país”. Esse esforço em expressar o todo através da escolha de muitas cidades e diferen-

e

rias privadas compondo um ethos maior que a classe média, desenhando uma “cara de

Redor

explicitar uma tensão entre a cena afetiva e a relação de classe e exploração. No filme,

som ao

A primeira marca de Doméstica é a forma como o dispositivo foi eficiente em

D oméstica , O

ticas e sete entram na montagem final. Cada adolescente deveria filmar a relação com

revendo

dos por uma câmera, empregadas domésticas e jovens patrões - filhos de patrões. Em

2013:

Formalmente Doméstica traz um dispositivo que coloca frente a frente, media-


namento do dispositivo por parte dos jovens efetivamente não aconteceu ou se ele foi obliterado na montagem. Entre as diferentes relações, encontramos situações de maior o trabalho doméstico como uma pedagogia da exploração, com frequência objetifica os adolescentes, uma vez que eles estão colocado em lugares em que seus processos subjetivos são fortemente atravessados por uma marca histórica e social do país, o que não

Se um acontecimento nos obriga a colocar novas questões ao que nos afeta, não impressiona que tão pouca resistência exista nesses jovens em relação à continuação de suas vidas com os mundos que seus pais lhes apresentaram? Até onde o dispositivo encerra um limite para os processos subjetivos e corrobora os pressupostos do filme, acabando por distancia-lo de outros processos subjetivos, como os que vimos aparecer nos últimos meses? No final de Doméstica uma sequência traz novamente, pela montagem, a forma como o filme toma posição, explicitando seu lugar de crítico à uma situação de continuidade entre gerações de exploração racial e social. Depois da patroa contar como sua emprega e amiga de infância foi parar na sua casa como doméstica, há um corte para Lucimar, a doméstica, sentada em um espaço exíguo, provavelmente seu quarto, com a filha pequena da patroa ao seu lado. Lucimar é negra a patroa branca, a patroa veste uma camisa branca de botões, Lucimar uma camiseta com os dizeres I (coração) NY, provavelmente herdada de uma viagem da família. Na sequência seguinte, ao som de Bob Dylan, o filme continua com o filho da patroa, esse que deve seguir as regras do dispositivo de Mascaro. Acompanhamos um antigo álbum em que Lucimar e sua mãe aparecem juntas quando crianças, o filme continua em uma entrevista do jovem com Lucimar, esta em seu quarto, mas com mais luz e outra roupa. A entrevista é não é feita sem tensão e longos silêncios, Lucimar diz que começou a trabalhar com 14 anos e enquanto não explicita em palavras nenhum incômodo com sua posição, nem com a história que a trouxe ali, é o jovem que parece desejar trazer a questão social à tona. – Você fica incomodada em usar uniforme? Não, diz Lucimar. – Sua relação com a minha mãe não ficou meia estranha depois que virou uma relação meio de trabalho e não só de amizade? – Acho que não, diz Lucimar depois de um longo silêncio, a relação vai amadurecendo... vai amadurecendo... O filme se encerra com esse bloco e com a história em que a continuidade de relações patrões/empregadas entre gerações é mais explicita, mas em que também, parece haver o mal

4 - n . 2 - v. 2

apenas de um trabalho, mas de uma pedagogia e os jovens são bons alunos.

ano

poderia ser diferente. Entretanto, Doméstica, no singular, como no título, não é o nome

Revista GEMI n IS |

ou menor tensão, de maior ou menor afeto, mas, a legítima necessidade de apresentar

45


estar mais flagrante entre o jovem que filma e a situação em que está colocado – fílmica e doméstica. Em todo esse bloco, apesar do funcionamento do dispositivo, algo parece estar fora do

46 As

cam e são atravessados pelo afeto, mas é o próprio jovem que parece vacilar, como se naquele

seu incômodo com toda uma ordem, da casa e do filme.

manifestações de

Concluindo

2013:

momento, seu lugar mesmo de “cineasta” não estivesse realmente seguro. Como se ali estivesse uma dúvida, interna ao filme, sobre o que ali se produzia. Quase a sua revelia, o jovem explicita

terísticas, discursos e processos presentes nas manifestações que afetaram o país em 2013. Para tal, nos concentramos nos processos subjetivos e nas formas desses processos entrarem em crise com os modos de produção da comunidade. A partir desse acontecimentos, abordamos

filmes algumas marcas que, junto às manifestações, redimensionam as formas dos cineastas re-

permanecerem inalteradas. Cabe-nos desdobrar o trabalho aqui presente, analisado os filmes

Rato

Ricardo Targino ou o documentário Com vandalismo (2013), do Coletivo Nigéria.

do

que já começam a trazer as manifestações em suas narrativas, como Quase-Samba (2013), de

A Febre

a atravessa. A força de um acontecimento aparece na própria impossibilidade de nossas leituras

e

presentarem e construírem uma relação com o país, a comunidade e os processos subjetivos que

Redor

questões acompanhadas dos movimentos de 2013. Esse procedimento nos autorizou ver nos

som ao

três filmes que trazem a cidade e o país como questão central, nos permitindo revermos essas

D oméstica , O

A guisa de conclusão, esse ensaio fez dois esforços, um primeiro identificando carac-

revendo

lugar, não apenas o retrato do país e das continuidades dos sistemas de exploração que convo-

COUTO, José Geraldo. O país das domésticas. Blog IMS, 2013. Disponível em: http:// www.blogdoims.com.br/ims/o-pais-das-domesticas. Última Acesso: 12.09.2013 DEBORD, Guy. Teoria da deriva. In. no. 2 da Revista Internacional Situacionista em dezembro de 1958. Disponível em: http://teoriadoespacourbano.files.wordpress. com/2013/03/guy-debord-teoria-da-deriva.pdf - Último acesso em: 22.10.2013. FIUZA, Guilherme. O gigante fala dormindo. In Blog do Noblat, 06.07.2013. Disponível em: http://oglobo.globo.com/pais/noblat/posts/2013/07/06/ogigante-fala-dormindo-502542.asp - Última Acesso 22.10.2013 GUATTARI, Félix. A revolução Molecular. São Paulo, Editora Brasiliense, 1981.

Cezar Migliorin

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4 - n . 2 - v. 2

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ano

pensar um acontecimento? IN. Revista Atual, Editora Azougue, 2013.

Revista GEMI n IS |

LAZZARATO, Maurízio. Revoluções do Capitalismo.

47


Educação Política: da rede para as ruas Leandro G rôppo Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Sociedade, da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Uberlândia. Graduado em Ciências Econômicas pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Email: lbgroppo@yahoo.com

Gerson

de

Sousa

Doutor e Mestre em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo. Graduado em Comunicação Social pela Universidade Metodista de Piracicaba. Professor adjunto do Curso de Comunicação Social: habilitação em Jornalismo da Universidade Federal de Uberlândia nas disciplinas de Fotojornalismo e Projeto Interdisciplinar em Comunicação. Email: gerson@faced.ufu.br

Revista GEMI n IS

ano

4 - n . 2 v. 2 | p. 48 - 64


Resumo O estudo apresenta o movimento vivenciado pela sociedade brasileira em junho de 2013, resultado da mobilização de parcela da população que, movida por demandas diversas, compartilhou narrativas por meio das novas tecnologias de comunicação e informação. Em um ambiente de relações que remeteram a educação política, informal e temporária, gerando conseqüências levadas à cabo nas ruas dos centros urbanos. Utilizando de pesquisa exploratória em dados primários e secundários, objetivou observar a influência da rede para as ruas. Evidenciando a auto-alimentando do ciclo de demandas e o debate político, refletido sobre mensagens criativas que facilitaram a mobilização real através da virtual. Palavras-Chave: Internet; Mídias sociais; Mobilização; Política; Sociedade.

Abstract This study represents the movements that Brazilian Society has been lived since June 2013, it’s a result from part of Brazilian Citizens mobilization, who pushed for several demands, had shared narrative using the new communication, technologies and information. Between an ambient of relations that remitted a Political education, informally and temporarily, creating high consequences taken to downtown streets. Using an exploratory research based on primary and secondary data’s, with the purpose of influence and taking the network to the streets. Showing a “self-feeding” from political speeches and demand cycle, reflected with creative messages that assisted the real mobilization trough virtual. Keywords: Internet; Social medias; Mobilization; Politics; Society.


1 Introdução

O

Brasil vivenciou no mês de junho de 2013 um dos maiores movimentos populares de sua jovem democracia. Milhares de pessoas saíram às ruas, inicialmente nas grandes cidades, em ato contínuo que se alastrou por todo o país,

e também fora dele, reivindicando qualidade dos serviços públicos e transparência nos gastos dos governos em todas as esferas. Inicialmente idealizado por um movimento que defende o passe livre no trans-

porte público da cidade de São Paulo, a manifestação nasceu com o objetivo de protestar pela revogação do aumento das passagens de ônibus daquele município, que recentemente havia elevado em vinte centavos de real a tarifa da passagem. Acabando por desencadear uma grande onda de manifestações em diversos outros locais que possuíam, ou não, a mesma demanda. Se a princípio os protestos se restringiam às grandes cidades que haviam passado por reajustes tarifários nos transportes públicos urbanos, após serem rechaçados com violência desproporcional pelas forças policias, com grande cobertura e repercussão das redes nacionais de televisão, o movimento tomou outro rumo, contando com maior mobilização, força e quantidade de pessoas dispostas a saírem às ruas. A partir daquele momento, a motivação não era mais apenas o aumento das passagens, mas também pela melhoria dos serviços públicos e outras diversas demandas, conforme comprovado por pesquisas. Aliada a tendência de processos semelhantes e repetitivos, estudado e descrito por Tarde (1907 apud VARGAS, 2000), em sua análise das correntes de crenças e desejos no campo social1, o movimento ganhou ainda mais força com as comparações de gastos efetuados pelos governos do país com a realização de eventos esportivos no país como a Copa do Mundo de Futebol de 2014 e as Olimpíadas na cidade do Rio de Janeiro em 2016. Em meio ao evento preparatório para o campeonato mundial de futebol a ser 1 Segundo o autor, os seres têm tendência a se imitarem em uma tendência à uniformização, posto que todas as semelhanças de origem social percebidas, são fruto da imitação sob todas as formas, imitação-costume ou imitação-moda, imitação-simpatia, imitação-obediência, imitação-instrução imitação-educação, imitação-espontânea ou imitação-refletida (VARGAS, 2000).


realizado no Brasil, a Copa das Confederações, organizada pela Federação Internacional de Futebol (FIFA) como teste para os jogos, foi mais um dos estopins que levou a vintes centavos”, mas com uma multiplicidade de temas (MALINI, 2013). Em que as mídias sociais tiveram papel fundamental ao alimentar, repercutir e transformar os atos e suas bandeiras, que eram inicialmente locais, em demandas e anseios nacionais.

ciais, em meio a revolução das tecnologias da comunicação e informação, na sociedade informacional e em rede descrita por Castells (1999). De acordo com Harvey et. al. (2012), movimentos de tal natureza, apesar de apresentarem características e origens multifacetadas, não deixam de articular com causas comuns como a crise econômica, o desemprego e a flagrante desigualdade social. Além do auxílio expressivo das mídias sociais no sucesso das mobilizações, o fenômeno, tão complexo quanto os conseqüentes movimentos sociais decorrentes, regem-se pela proposição inicial pacífica, o que faz com que os manifestantes utilizem outras “armas”, como o bom humor e a exposição massiva dos acontecimentos por meio da internet. Apesar de mudarem-se os contextos, em entrevista, Castells afirma ser possível observar padrões de dinâmica própria aos movimentos, sendo horizontais e não hierarquizados, em redes de indivíduos empoderados pela informação multiplicada, não dispostos a ter um programa delimitado, mas sim a mudança de todo um status quo (MANUEL CASTELLS..., 2013). No Brasil, a internet contribuiu especialmente por meio da efetivação de um ativismo real até então “adormecido”, utilizando-se da criatividade transposta da rede para as ruas, como recurso de comunicação na forma de manifestar. Um movimento sem lideranças legitimadas e sem entidades partidárias, articulado pelas mídias sociais, que contribui com o processo político-educativo, ainda que informal, estabelecendo um novo patamar na comunicação e discussão política nacional. 2 Novas tecnologias de comunicação e informação As novas tecnologias de comunicação e informação marcaram grandes eras na história da humanidade, a saber: a fala, a escrita, o livro, os meios de comunicação de massa e, agora, a internet e suas múltiplas possibilidades. De acontecimentos que demoravam dias, ou por vezes anos, para alcançar pontos mais longínquos, a realidade atual é instantânea, passando a ser construída principalmente pelo que os veículos

4 - n . 2 - v. 2

sociais e suas redes, trouxeram um elemento novo para a análise dos movimentos so-

ano

Semelhante ao que já havia ocorrido em outros países, o fenômeno das mídias

Revista GEMI n IS |

população brasileira a demonstrar sua indignação nas ruas, agora “não apenas pelos

51


de comunicação expressam como notícia de forma quase imediata ao fato acontecido (BURKE, 2004). potencialidades dos novos meios. Assim, Castells (2005) constata que as mudanças na comunicação e informação são agentes condicionantes das alterações políticas e sociais, gerando na relação do homem transformador com a nova técnica, um jeito diferente de curto espaço de tempo, na “sociedade em rede”, potencializada com o advento da internet (CASTELLS, 2005). Desde então, a nova tecnologia cresceu em proporções gigantescas em armazenamento de dados e número de usuários (IBOPE, 2012). Proporcionando, segundo Castells (2005), um novo paradigma tecnológico, baseado nas tecnologias de comunicação e informação, condição necessária para a emer-

de performance superiores em relação aos anteriores sistemas tecnológicos, a “sociedade em rede” transforma a experiência de vida da “Era da Informação” e, conseqüentemente, os processos econômicos, sociais e culturais, manifestada na transformação da sociabilidade. De acordo com Graeff (2009), a grande mudança instituída pela internet na

descentralização da informação, e a possibilidade, inédita, de maior proximidade da sociedade com a discussão política por meio dos canais diretos de interação. Atingindo 83,4 milhões de brasileiros, em julho de 2012, segundo o IBOPE (2012), especialmente entre moradores das zonas urbanas - que correspondem a 96,9% dos domicílios brasileiros (IBGE, 2013) -, a internet tem cada vez mais importante papel na sociedade ao promover profundas modificações nas mensagens, e entre transmissores e receptores, por meio da convergência de mídias e reconfiguração do espaço e dos hábitos de socialização (RECUERO, 2000).

Sousa

ramentas pelo sistema político, mas sim com seu uso pelos cidadãos. Representando a

de

comunicação e na política, provém não apenas do uso das mídias sociais e demais fer-

Leandro G rôppo - Gerson

em todos os aspectos de atividades na base da comunicação digital. Com capacidades

gência de uma nova forma de organização social baseada em redes, ou seja, na difusão

da rede para as ruas

se olhar para o mundo, que permite a resolução de problemas antes insolúveis, e em

E ducação Política:

Nesse processo de rupturas evolutivas, o ser humano se aproveita das diversas

52


cracia eletrônica” de Lévy (1997). De acordo com a autora, à medida que o cidadão comum torna-se capaz de se articular com outras pessoas através de campos de interesse, observa-se uma nova forma de estabelecer laços sociais. Uma modificação que derruba paradigmas geográficos e re-configura o espaço, colocando a internet como centro de uma nova revolução na comunicação mundial (RECUERO, 2000). A inserção da internet ao grande público e a interface com o mercado, conforme Castells (2005), possibilitou o surgimento de várias aplicações, recursos, serviços e empreendimentos que fazem do meio mais do que uma grande rede de computadores, dando-lhe movimento e possibilidades infinitas de crescimento e visibilidade de oportunidades e compreensões. Seja como uma grande biblioteca de alcance mundial de produção coletiva e interativa, conectora de pessoas, ou ainda, um enorme banco de dados de acesso mundial, contribuindo para a comunicação socializável, na era da informação e do conhecimento em seus diversos âmbitos, inclusive o da mobilização política (CASTELLS, 2005). O uso da internet, por meio das mídias sociais, na mobilização de ações, debate de idéias e no impulso popular ao tornar um movimento virtual (online) em realidade (offline) de grandes proporções, a ponto de tornar-se impossível de ser ignorada, já havia ocorrido anteriormente em outros países. Exemplos como os do Occupy2 e a as revoluções da Primavera Árabe3, em que a internet foi crucial para a mobilização política e social, reverberaram em todo o mundo (HARVEY et. al., 2012). 2 Movimento popular em que manifestantes ocuparam as imediações de Wall Street, onde se localiza a Bolsa de Valores de Nova York, um ícone do sistema capitalista, batizado de “Occupy Wall Street”, que posteriormente se alastrou para outros países sob o termo "Occupy" (HARVEY et. al., 2012). 3 Fenômeno popular que surgiu inicialmente no norte da África em 2011, em países como Tunísia e Líbia, contra governos instituídos, e que ficou conhecido como a “Primavera Árabe” (HARVEY et. al., 2012).

4 - n . 2 - v. 2

e para muitos, ao possibilitar a interação, compactuando com a idéia de uma “demo-

ano

Recuero (2000) destaca que a internet possibilita a comunicação entre muitos

53 Revista GEMI n IS |

[...] a Internet. O primeiro meio a conjugar duas características dos meios anteriores: a interatividade e a massividade. O primeiro meio a ser, ao mesmo tempo, com o alcance da televisão, mas com a possibilidade de que todos sejam, ao mesmo tempo, emissores e receptores da mensagem. É a aldeia global de McLuhan concretizada muito além do que ele havia previsto. Uma aldeia repletas de vias duplas de comunicação, onde todos pode construir, dizer, escrever, falar e serem ouvidos, vistos, lidos. Com o surgimento deste novo meio, diversos paradigmas começam a ser modificados e nossa sociedade depara-se com uma nova revolução, tanto ou mais importante do que a invenção da escrita. O paradigma do pensamento linear está sendo superado por um novo paradigma: o pensamento hipertextual, que organiza-se sob a forma de associações complexas, considerado muito mais apto e completo para descrever e explicar os fenômenos do que o linear. (RECUERO, 2000, p.1)


3 O movimento #VemPraRua

mento das passagens de ônibus na cidade de São Paulo, acabou por desencadear uma série de manifestações em diversas outras localidades. Malini (2013, p.1) relata que os movimentos de protesto ocorridos no Brasil durante o mês de junho de 2013 foram arsocial no país”. Segundo Malini (2013), a dinâmica do Facebook ilustra a articulação entre a rede e a rua, onde há pessoas que enunciam e as que anunciam. Em que os primeiros, de dentro das mobilizações, relatam, e os segundos, de dentro da rede, espalham e comovem. O IBOPE (2013), em pesquisa agregada, demonstrou que 62% dos participan-

de protesto pelo país, Malini (2013) destaca que, em geral, as postagens de convocação e mobilização possuíam mais de duas linhas de texto, algo incomum no ambiente ágil, prático e por vezes “preguiçoso” da internet, significando que as pessoas que o faziam estavam emocionalmente engajadas. Enquanto as manifestações ocorriam, também pelo Twitter5e outras mídias so-

ro momento, foi divulgado e classificado pela grande mídia como “baderna praticada por vândalos”. O fato, aliado ao relato das ações policiais, potencializou o sentimento contestador de parcela da sociedade brasileira, conforme apontado por Recuero (2013), em especial a classe média urbana, que passou a demonstrar interesse pelo assunto acima da média até então observada (IBOPE, 2013). Narrados “ao vivo nas e pelas redes sociais dos manifestantes”, os vídeos, fotografias e mensagens tornaram-se “a faísca que faltava para criar uma mobilização de grandes proporções” (RECUERO, 2013, p.1). Resultando na ampliação das manifestações em diversas cidades do Brasil e, até mesmo fora, por brasileiros residentes no exterior (GOÉS, 2013). 4 O Facebook, mídia social mais utilizada no mundo, atingiu 1 bilhão de contas ativas em 14 de setembro de 2012. O Brasil ocupa o segundo lugar na lista de usuários, com 54 milhões (até o mês de junho de 2012), atrás apenas dos Estados Unidos, que tinha 160 milhões. Criado em 2004, levou seis anos para chegar a meio milhão de usuários, mas apenas dois para dobrar a quantidade de pessoas conectadas. Em 2011 o crescimento total foi de 30%, mas o número de brasileiros aumentou 146%, o maior percentual do mundo (AMARAL, 2012). 5 Rede de microblogs que possibilita o envio de mensagens com até 140 caracteres. O Brasil ocupava, em outubro de 2012, o 4º lugar no ranking de maior número de usuários ativos, com 19,6 milhões. A China ocupava o primeiro lugar, com 35,5 milhões de usuários, seguido por Índia, com 33 milhões, e Estados Unidos, com 22,9 milhões (AMARAL, 2012).

Sousa

as ações dos protestos e da força policial, desmistificando o movimento que, no primei-

de

ciais, várias pessoas acompanhavam ao vivo a cobertura da mídia televisiva, narrando

Leandro G rôppo - Gerson

entre amigos e colegas, e 14% pela televisão. Em análise sobre a marcação dos eventos

tes tomaram conhecimento das manifestações pelo Facebook, 29% pela “internet”, 28%

da rede para as ruas

ticulados, principalmente, via Facebook4, “site que se tornou padrão de relacionamento

E ducação Política:

Surgido como movimento em defesa do passe livre, e pela revogação do au-

54


A partir desse momento, o evento que era difundido em defesa da redução das passagens de ônibus urbanos, passou a contar com demandas diversas e um “título”, cantor de renome especialmente entre os mais jovens, e exibida exaustivamente durante a Copa das Confederações da FIFA nos principais canais televisivos do país6. O “#VemPraRua”, título da música e do comercial7, virou canção característica que embato diferenciado de grande audiência internacional, advinda do campeonato de futebol disputado por seleções de todo o mundo no Brasil (NISZ, 2013). De fato, o público dos movimentos, segundo o IBOPE (2013), era predominantemente de jovens e dividido igualmente entre homens e mulheres. Desses, 43% tinham idade entre 14 a 24 anos, 20% entre 25 a 29 anos, 18% entre 30 a 39 anos e 19% tinham 40

salários e 23% que recebiam mais de 10 salários. A ausência de causa única transformou o movimento em “potência”. Malini (2013) e Recuero (2013) demonstram a descentralização da organização do movimento a partir da cartografia das mensagens que circularam nas mídias sociais enquanto os protestos aconteciam nas ruas. Fica claro que a conversa não tinha apenas um foco,

Confirmando a difusão de temáticas que passaram a serem apresentadas na rede como demandas sociais urgentes, relatadas por Malini (2013), o IBOPE (2013) demonstrou que os principais problemas questionado nas ruas eram: a saúde, com 37%, a segurança pública, com 22%, a educação, com 15%, as drogas, com 6% e o combate a corrupção com 6%. Enquanto que a percepção dos entrevistados quanto ao motivo das manifestações era para 59%, contra o aumento das tarifas de transporte público, para 32%, contra a corrupção, para 31%, por mais investimentos em saúde e educação, e para 18%, contra políticos em geral. Apoiando a associação relativa de más condições de serviços públicos a uma crise de legitimidade dos representantes políticos, alertada muito antes por Novaro (1995), 89% responderam não se sentirem representados politicamente, enquanto 83% não se sentiam representado pelos partidos (IBOPE, 2013). Fato que baseou ações de repulsa dos manifestantes a grupos políticos que tentaram fazer parte das manifestações. 6 Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=SxMIwZZPlcM. Acesso em: 20 jul. 2013. 7 "Com letra composta por Falcão, do grupo ‘O Rappa’, a música tinha o objetivo de convocar o brasileiro a torcer pela seleção brasileira de futebol durante a Copa das Confederações da FIFA. O refrão da música diz: “porque a rua é a maior arquibancada do Brasil” (NISZ, 2013).

Sousa

drões de dinâmica dos movimentos populares elencados por Manuel Castells... (2013).

de

nem circulava em torno de líderes com programas delimitados, corroborando aos pa-

Leandro G rôppo - Gerson

da amostra, recebia de 2 a 5 salários mínimos, seguido de 26% que recebiam de 5 a 10

anos ou mais. Sendo que 52% estudavam e 76% trabalhavam, e a maior parcela, ou 30%

da rede para as ruas

lou o movimento e agregou as pessoas à mensagem central transmitida em um momen-

E ducação Política:

caracterizado pela música tema de uma propaganda comercial, interpretada por um

55


4 Da rede para as ruas, da rua para a rede

entre os dias 16 e 22 de junho, apresentou-se como razões principais: o preço das passagens (27,6%), contra a corrupção (24,2%), melhorar a saúde e a educação (17,4%), contra a PEC 37 8 (5,5%), e o gastos nas Copas 2013/2014 (4,5%). No mesmo levantamento, 78% dos

movimentos, 75,1% convidou outras pessoas pela internet, enquanto 71,1% respondeu que a mídia social mais utilizada foi o Facebook (TRANSPORTE..., 2013). A importância do movimento e da mobilização social em torno das causas é sustentada pelos dados do IBOPE (2013) que demonstrou o interesse por política ser “muito” para 61% das pessoas, “médio” para 28%, e “pouco ou nenhum” apenas 11%. Um dado extremamente relevante, haja vista o baixo interesse social pelas questões políticas apresentado pelo histórico da relativa recente democracia brasileira (TORQUATO, 2010). Em pesquisa, a CNT (2013) confirma que a internet cumpriu função essencial para o movimento, sendo considerada como o principal meio de articulação da sociedade para a realização das manifestações populares que ocorreram no país. A maioria das pessoas que participou das manifestações, ou 60,7%, tomou conhecimento através do Facebook, a frente dos sites de notícias, com 38,5%, WhatsApp9, 3,3%, E-mail, 2,5%, mensagens instantâneas, 2,5%, e outras mídias sociais, como Twitter, 2,5%. Outro número relevante é que, segundo a CNT (2013), 79,2% consideram as mídias sociais “muito influentes” para a formação da opinião pública, enquanto 9,8% acham que são “pouco influentes” e 2,9% pensam que “não influenciam”. Em observância aos dados apresentados, a ferramenta Google Trends, disponibilizada pela maior plataforma de buscas na internet, afere a quantidade de pesquisas de determinada palavra na ferramenta, com quantitativo de 0 a 100, em que o 100 representa o interesse máximo das pesquisas. Este indicador de interesse social digital, demonstra que em relação aos últimos 12 meses, iniciado em julho de 2012, o termo “política” esteve em forte evidência em dois momentos distintos. O primeiro, com pico de 100, entre 30 de setembro e 06 de outubro de 2012, e anteriores, refletem o período de eleições municipais do país, quando toda a população brasileira teve a obrigação de votar em primeiro turno para Prefeito e Vereador. Já o segundo, correspondente a se-

8 Proposta de Emenda à Constituição de autoria do deputado Lourival Mendes (PTdoB-MA), que atribui exclusividade às polícias Federal e Civil a competência para a investigação criminal (CÂMARA..., 2013). 9 WhatsApp Messenger é um aplicativo de mensagens multiplataforma que permite a troca de mensagens pelo celular com imagens, vídeos e áudio (WHATSAPP, 2013).

4 - n . 2 - v. 2

afirmaram terem ido sozinhos. Para 79,2% as mídias sociais foram muito influentes nos

ano

entrevistados responderam terem ido acompanhados às manifestações, enquanto 22%

Revista GEMI n IS |

Em levantamento realizado na semana de pico das manifestações populares,

56


mana entre 16 e 22 de junho de 2013, aponta para as semanas das maiores mobilizações populares em todo o país (Figura 1).

E ducação Política:

Figura 1 – Pesquisas no Google com o termo “política”10.

57

da rede para as ruas •

quantidade de buscas realizadas pelo Google no mesmo período de 12 meses. Observa-se que os dados sobre o termo começam a serem registrados entre 12 e 18 de maio, data de início da veiculação da propaganda comercial que posteriormente intitulou o movimento popular no país, conforme relatado por Nisz (2013). Após este período, e em

Figura 2 – Pesquisas no Google com o termo “vem pra rua”11.

10 Disponível em: http://www.google.com.br/trends/explore?hl=pt-BR#q=pol%C3%ADtica&geo=BR&date=today%20 12-m&cmpt=q. Acesso em: 22 jul. 2013. 11 Disponível em: http://www.google.com.br/trends/explore?hl=pt-BR#q=vem%20pra%20rua&geo=BR&date=today%20 12-m&cmpt=q. Acesso em: 22 jul. 2013.

Sousa

entre 16 e 22 de junho de 2013.

de

concomitância ao dado anterior referente ao termo “política”, novamente o pico se dá

Leandro G rôppo - Gerson

Em outra Figura (2), a pesquisa se dá para o termo “vem pra rua” em relação a


Da mesma forma que os termos “preço das passagens”12 e “corrupção”, elencados como as principais demandas das pesquisas de opinião analisadas, também aprena das observações anteriores, conforme Figuras 3 e 4. Figura 3 – Pesquisas no Google com o termo “preço das passagens”13.

Revista GEMI n IS |

sentaram acréscimos relevantes, com os picos de interesse destacados na mesma sema-

58

ano

4 - n . 2 - v. 2

Figura 4 – Pesquisas no Google com o termo “corrupção”14.

Confirmando, portanto, a íntima ligação entre o interesse e discussão social sobre temas políticos na internet e as manifestações populares desencadeadas, discutidas e amplificadas pela própria internet no período em análise. Um processo de educação política, ainda que informal, comprovado na profusão de cartazes criativos utilizados pelos manifestantes, levados às ruas com termos, palavras e temáticas que remetiam à cultura virtual (Figuras 5 a 7) 15. 12 Resultado semelhante também é encontrado por Malini (2013) para o termo "tarifas ônibus". 13 Disponível em: http://www.google.com.br/trends/explore?hl=pt-BR#q=pre%C3%A7o%20 passagens&geo=BR&date=today%2012-m&cmpt=q. Acesso em: 23 jul. 2013. 14 Disponível em: http://www.google.com.br/trends/explore?hl=pt-BR#q=corrup%C3%A7%C3%A3o&geo=BR&date=today%2012-m&cmpt=q. Acesso em: 23 jul. 2013. 15 Montagens elaboradas pelo autor com fotos disponíveis em: http://www.google.com.br. Acesso em: 20 jul. 2013.


Figura 5 – Fotos de cartazes das manifestações com menções a termos utilizados na internet (1). as no Google com o termo “corrupção (1).

59 E ducação Política: da rede para as ruas •

Leandro G rôppo - Gerson de

Figura 6 – Fotos de cartazes das manifestações com menções a termos utilizados na internet (2).

Sousa


Figura 7 – Fotos de cartazes das manifestações com menções a termos utilizados na internet (3).

60 Revista GEMI n IS | ano

4 - n . 2 - v. 2

Considerações Finais As manifestações vivenciadas pelos brasileiros confirmam os padrões estabelecidos por Manuel Castells... (2013), ao terem se demonstrado horizontais e não hierarquizadas, construídas e difundidas em redes de indivíduos empoderados por informações multiplicadas especialmente pelas novas tecnologias de informação e comunicação, apresentando demandas não restritas a programas delimitados, mas sim a expectativa de mudança do status quo aparente. Compartilhando narrativas por meio de fotos, vídeos e mensagens, os brasileiros, em especial a classe média urbanizada, utilizou as mídias sociais em um ambiente de relações que remeteram a educação política, ainda que informal e temporária, com conseqüências levadas à cabo nas ruas dos diversos centros. Motivados por pessoas que demandam serviços públicos de melhor qualidade e instituições políticas mais transparentes, a sociedade brasileira vivenciou a experiência inédita de mobilizar-se sem interferências de entidades e lideranças políticas, e de forma praticamente instantânea por meio da internet. Em um movimento que passou da rede para as ruas, e vice-versa, auto-alimentando o ciclo de demandas e o debate político, refletindo nas vias a timeline do


Facebook, com temas diversos em mensagens criativas, utilizando por vezes do humor tão comum ao meio virtual, e que facilita a mobilização no ambiente online, e agora Os dados demonstrados pelas pesquisas analisadas, demonstram que a internet é mobilizadora, principalmente por pessoas próximas, que iniciam a “conversação” que gera o efeito multiplicador. E, apesar do aumento de interesse dos brasileiros por ções, o que, por experiência vivenciada em casos semelhantes apresenta ressalvas a serem feitas, o alto grau de participação, o uso das mídias sociais, e o amplo apoio popular ao movimento, pode indicar uma tendência, a ser confirmada pelo nível de ativismo nas próximas eleições. Percebe-se que o aumento de interesse condiz com a constatação e revolta con-

seios e agregando apoios para as demandas. Nesse sentido, a elevação do interesse por temas políticos, e considerando a aparente rejeição à representação atual, leva a crer que o público participante se sente como ator político, embora sem referências de lideranças constituídas. Com efeito, os representantes eleitos passaram a reagir ao movimento das mas-

longo prazo, de modo a satisfazer no curto prazo o movimento e, por fim, esmorecer seu poder de mobilização. Inerente à complexidade social, cabem ainda algumas indagações quanto ao espectro do movimento e seus resultantes futuros: i) As manifestações fazem parte de um modismo ou vieram para ficar; ii) Os brasileiros manterão o interesse pela política; iii) Haverão reflexos nos resultados das próximas eleições no país; i) Velhas respostas responderão às novas demandas; e, v) Caberá à internet o papel preponderante na representação política futura de uma “democracia eletrônica”? Ao que tudo indica, passamos por momentos de grandes mudanças, em que, ainda que sem respostas imediatas e definitivas, resgatou-se a esperança e o sentimento de mobilização de uma parcela significativa da população. Caberá à sociedade a opção de oferecer as réplicas.

Sousa

palavras de ordem lançadas são transformadas em decisões políticas, gradativas e de

de

sas, entretanto, ainda de forma tradicional, legislando, como indicador de resposta. As

Leandro G rôppo - Gerson

o poder de mobilização que gera voz e vez perante a agenda política, amplificando an-

tra a má qualidade de serviços públicos proporcionados pelos governos, despertando

da rede para as ruas

política ter sido realizada em período correspondido e influenciado pelas manifesta-

E ducação Política:

comprovadamente, também no chamado “offline”.

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4 - n . 2 - v. 2

VARGAS, Eduardo Viana. Antes Tarde do que nunca: Gabriel Tarde e a


Comunicación Electoral e Internet – cuestiones sobre participación ciudadana Luciana Panke Actualmente se encuentra en estancia pos-doctoral en la UAM – Universidad Autónoma Metropolitana-Unidad Cuajimalpa – México, con beca CAPES/Brasil. Es profesora del Departamento de Comunicación Social de la Universidad Federal del Paraná, líder del Grupo de Pesquisa “Comunicación Electoral” y Vice-Presidente de la Sociedad Brasileña de Profesionales e Investigadores del Marketing Político (Politicom). Email: lupanke@gmail.com

E dgar Esquivel Profesor-investigador de Tiempo Completo de la Universidad Autónoma Metropolitana-Cuajimalpa, México. Coordinador del Cuerpo Académico de Comunicación Institucional y Política del Departamento de Comunicación. Email: eesquive1@yahoo.com.mx

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ano

4 - n . 2 v. 2 | p. 65 - 74

la


Resumen El artículo se propone discutir respecto del papel de la Internet en las democracias modernas donde la participación política se confunde con la manifestación de opiniones en las redes sociales. Cuestionamos qué significa hoy la e-participación y, hasta qué punto podemos decir que la Internet es la responsable por una “nueva” democracia. En especial, buscamos reflexionar sobre la influencia de la e-participación online de los electores en el momento electoral. Palabras-clave: Comunicación política; Internet; elecciones; actores colectivos; e-participación.

Abstract The paper is intented to discuss the role of the internet in the modern democracies, where the public participation is confused with the expression of opinions on the social medias. We question, in fact, what e-participation means, and how far we can say the internet is responsable for a “new” democracy. In particular, we reflect the influence of the voters online participation in the election time. Keywords: Political Communication; Internet; elections; e-participation.


Introducción

L

a comunicación electoral puede ser conceptuada como el proceso de información y persuasión que ocurre durante el momento de las elecciones en las sociedades democráticas. En ese período están en acción diversos actores sociales entre los

cuales se destacan: los medios, los electores, los políticos, los candidatos, los grupos de presión y los formadores de opinión. Es importante destacar que al hablar de comunicación electoral no nos limitamos a las cuestiones de la propaganda electoral, sino de todos los elementos envueltos en la divulgación y evaluación de datos que tocan ese periodo. Hace poco tiempo, la participación de los electores estuvo restringida las esferas sociales próximas (el barrio, la escuela e iglesias), a la participación en los mítines y, claro, al voto. Por su parte, las informaciones, en general, llegaban por los medios convencionales. Como la participación popular puede ser considerada un espacio fundamental en la comunicación política, los aparatos tecnológicos cambiaron las posibilidades de intervenir en la realidad. Más que simples espectadores, a los ciudadanos no comprometidos con procesos políticos se les posibilitó un medio para conocer otras informaciones no oficiales y también de expresar su propia opinión. La comunicación empieza a tener como posibilidad cambiar el modelo vertical y arbitrario, para un modelo horizontal, donde la producción del contenido ya no es únicamente función de los periodistas o de los grandes medios. Efectivamente, estas redes horizontales posibilitan la aparición de lo que yo llamo de ‘autocomunicación de masas’, que incrementa de forma decisiva la autonomía de los sujetos comunicantes respecto a las empresas de comunicación en la medida en que los usuarios se convierten en emisores y receptores de mensajes. (Castells, 2012, p. 25)

Así, vemos que varios sectores de la sociedad acaban afectados por la manera horizontal de comunicar. Por ejemplo, en los medios empresariales, el consumidor pasa a ser considerado una voz activa en las decisiones sobre los productos, esto a


veces incluso sólo de manera reactiva frente a boicots ciudadanos. Las quejas, antes restringidas al aspecto privado, cambian para lo público, donde los consumidores cambia pues el aspecto horizontal de la comunicación influye en las acciones de la población y de la clase política. El aspecto quizás más destacable de la comunicación horizontal es que posibilita

tanto ciudadano y miembro de la demos, pero ante la posibilidad de que su crítica se haga “viral”, es decir sea reproducida rápidamente por cientos o miles de seguidores de manera cada vez más frecuente e impacte en las decisiones de los representantes políticos, elites que de otra manera se muestran impermeables a las quejas y demandas de la sociedad. El universo simbólico que articula el discurso, ya no responde sólo a las exigencias de los grupos empresariales y políticos que financian a los medios de comunicación tradicional, ahora aparecen regímenes de la verdad, tecnologías de emancipación del yo, que entronizan la subjetividad social de la rebelión, la crítica y la propuesta (Ramírez; Vidaña. 2012, p. 50).

Por supuesto, aunque haya la posibilidad de e-participación, eso no significa que la gente participe necesariamente de discusiones políticas en la web. “Cuanta más autonomía proporcionen las tecnologías de la comunicación a los usuarios, más oportunidades habrá de que los nuevos valores e intereses entren en el campo de la comunicación socializada y lleguen a la mente colectiva” (Castells, 2012, p. 29). Para el autor, “en las redes sociales y organizativas los actores sociales, promoviendo sus valores e intereses e interactuando con otros actores sociales, están en el origen de la creación y programación de las redes” (Castells, 2012, p. 45). De hecho, concordamos con Sánchez, al afirmar que: Aún no está claro que desde la Internet social se esté configurando un nuevo espacio público que dé a luz una democracia deliberativa; hasta ahora esas versiones propagandísticas sólo han quedado como una promesa de los grupos que han sido los más entusiastas con las nuevas tecnologías. (Sánchez, 2012, p. 33)

4 - n . 2 - v. 2

-así sea virtual-, se conservan los anonimatos, el sujeto se empodera y se expresa en

ano

la e-participación y amplía el número de actores que debaten en la arena pública

Revista GEMI n IS |

comentan las experiencias con las marcas. Del mismo modo, la forma de hacer política

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Por ejemplo, en las modernas sociedades democráticas hay la suposición de que la participación popular es un sinónimo de buenas gestiones públicas . Los foros 1

ciudadana, en ocasiones construyen simulacros de vínculos, ya que de cuando en cuando se le convoca a los ciudadanos a “decidir” sobre lo que ya otros previamente han elegido: esto es, yo como elite, te muestro las opciones A y B para que tú como miembro de la demos “elijas” entre las dos opciones que yo anticipadamente te seleccioné. Un ejemplo lo encontramos en lo ocurrido durante los años noventa cuando en campañas de bienes estatales o de recursos naturales. El debate no es entre A (privatizar) o B (no

influyen a mediano o corto plazo en la participación convencional al interior de las instituciones.” (Ramírez; Vidaña. 2012, p. 26) no hay como crear una ilusión de que la Internet es una solución para evitar la exclusión de diversos sectores en las decisiones políticas. Desde las elites la participación de la demos buscará ser mediatizada y funcional, incluso en la protesta se corre el riesgo de justificar lo contrario a lo que se defiende o reclama, al respecto Slavoj Žižek plantea que:

¿O sólo es un eco catártico? Esto último, especialmente ante una realidad que se nos ofrece día a día compleja y llena de retos. Por otro lado, también hay que estar alerta pues “tanto para el Estado liberal moderno como para los regímenes autoritarios – y aprendices de dictador -, la cuestión está en cómo se emplea la potentísima herramienta de comunicación en la que se ha convertido Internet” (Beas, 2010, p. 192). Internet y e-participación El tema de la web y la e-participación es uno de los más discutidos hoy en alguna prensa y con sumo interés en las ciencias sociales.

Para entender el binomio; web/

1 Así lo plantea el informe, Nuestra Democracia, especialmente el capítulo 2, elaborado por el PNUD et al. (2010), para la región de América Latina, sugiere que el binomio mayor participación (>p) es igual a mejor representación política (>p=mrp), una ecuación muy ideal.

Luciana Panke - E dgar Esquivel

¿Es hoy internet la arena pública para alzar la voz? ¿Es ya el lugar de los debates?

la verdadera lucha política, como explica Rancière contrastando a Habermas, no consiste en una discusión racional entre intereses múltiples, sino que es la lucha paralela por conseguir hacer oír la propia voz y que sea reconocida como la voz de un interlocutor legítimo (2010, p. 26-7)

cuestiones sobre la participación ciudadana

Coincidimos en que “los caminos de la participación fuera de las instituciones,

privatizar), sino porqué esas eran las opciones y no otras.

e I nternet

de propaganda gubernamental se promovían las “necesarias” privatizaciones ya sea

Comunicación E lectoral

realizados entre gobernantes y ciudadanos, incluso algunos esquemas de participación

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e-participación es necesario primero construir una tipología no exhaustiva sobre la e-participación que en ella se registra, con propósitos de identificar la colaboración que Quizás lo primero sea identificar en esta clasificación la constante actividad que se registra en los sitios de videos que registran una afluencia inaudita2. Los anteriores consumidores hoy se asumen como prosumidores, es decir, como productores-

tecnológicas hacen posible que estalle la “creatividad” e ingenio de los prosumidores que esta plataforma potencia en su difusión. Es necesario este apostille, ya que un conjunto de los denominados “ciber-evangelistas”, promueven que la web por si sola nos ha llevado a un inusitado ejercicio de libertad, como nunca antes en la historia de la humanidad, para nosotros no hay nada más falso. La web es una poderosa plataforma de comunicación, pero por si sola no hace de la comunicación una e-participación política. En todo caso sólo reflejará el espontáneo ingenio y /o talento de los nuevos prosumidores en un sinfín de temas. La e-participación del prosumidor lleva también un ángulo político. De manera concreta las campañas políticas consideran con mayor frecuencia la web como una plataforma en la cual se dan debates y se difunden videos de apoyo o denostación de las diversas opciones políticas. Actores de la sociedad civil utilizan con mucha frecuencia esta plataforma para difundir acciones y llevar a cabo también sus propias campañas. En la web circula, al igual que en otras plataformas, un sinfín de informaciones. Diversos estudios sobre el consumo en la web, destacan que la mayor parte de los usuarios acceden a ella para actividades vinculadas con el ocio. En el extremo, en internet también existen abundantes sitios, que promueven actividades que pueden ser identificadas como de delincuencia organizada, en resumen, es un espacio que oscila entre luces y sombras. Al igual que ocurre con otras plataformas mediáticas. Otra categoría que surge muy vinculada a la del prosumer es la del artivista. Esta denominación surge de la fusión entre arte y activista. En los antecedentes de dicha e-participación hay quienes lo ubican hace una década escasamente. Consideramos que en realidad el vínculo entre arte y protesta política se localiza varios siglos atrás. Lo podemos ubicar en la literatura, la pintura y el teatro entre otras expresiones. Lo distintivo ahora es que utiliza el potencial de la web, nuevamente la plataforma no hace la protesta, sólo la difunde. El artivismo roza incluso mucho con la idea sobre 2 Según el director del sitio youtube, de la empresa Google, para el mes de mayo de 2013 superaron los mil millones de visitas mensuales. Agrega que incluso el sector de entre 18 a 34 años dedica más tiempo al sitio que el que destinan a ver la televisión en los sistemas de cable, con información de la agencia AP.

4 - n . 2 - v. 2

antes de festinar, hay que advertir, que la web en conjunto con otras innovaciones

ano

consumidores-productores, cerrando el ciclo de la comunicación horizontal. Sólo que

Revista GEMI n IS |

en ella se registra.

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la “espectacularización de la protesta”3, que en conjunto definen el despliegue de actividades de corte “artístico” como los “performances”, los desnudos públicos y el ambientalistas, que en el extremo también recurren a las persecuciones de barcos y transportes terrestres intentando frenar sus rutas, en las que en algunas casos los artivistas llegan incluso a arriesgar su vida o integridad física como una forma de colocar en la agenda de la opinión pública sus denuncias (sobre contaminación o especies amenazadas de extinguirse), todo ello difundido en la web en “tiempo real” la estrategia de hacer “espectacular la protesta” los entrecruzamientos entre una y otra

real y/o testimoniado en videos colocados a través de la web. Otra categoría que se registra en la e-participación es la de los denominados hactivistas, esta surge de la fusión entre el concepto “hacker” y activista, los ejemplos más claros de esta participación se localiza a partir del 2010 en Wikileaks y en 2013 el controvertido caso Snowden, en particular este último ha permanecido a lo largo del año en la esfera pública global. A diferencia de las otras dos categorías esbozadas líneas atrás, la controversia acompaña desde su surgimiento al hacker, esto es así porque son considerados “piratas” que se aprovechan indebidamente de los desarrollos informáticos creados por empresas,

en ordenadores ajenos que a menudo se asume que es, sino más bien una manera de ver al mundo” (2011, p. 43). Posee incluso un fundamento de la filosofía política moderna: toda la información debe ser libre bajo dos premisas básicas; la libertad de información permitirá al sujeto (ciudadano), como miembro de la demos, a partir del conocimiento de la misma tener las herramientas para transformar la realidad. Lo segundo, es que si la información gubernamental es secreta es siempre en perjuicio de la sociedad. De los tres tipos de e-participación hasta ahora descritos es quizás la menos idealista, más pragmática, tal vez raye incluso en el cinismo. A su favor tienen justamente lo que el hactivismo ha desnudado: en la web no hay privacidad ninguna, toda actividad puede ser vigilada o monitoreada, probablemente estos tres tipos de e-participación son los más vigilados en el “big brother global”. 3 Al respecto véase el artículo de Donatella dela Porta y Lorenzo Mosca (2005), “Globalización, movimientos sociales y protesta”, en La sociedad civil en la encrucijada, Edgar Esquivel e Israel Covarrubias (coords.), México, M.A. Porrúa 4 Este último autor de un libro sobre el caso wikileaks.

Luciana Panke - E dgar Esquivel

o su traducción, el hactivismo, “no es ninguna actividad turbia asociada a introducirse

universidades o gobiernos. David House, según David Leigh4 apunta que el “hacking”

cuestiones sobre la participación ciudadana

el prosumidor es por lo menos muy delgada. Obviamente todo esto difundido en tiempo

estrategia de e-participación son evidentes. Al igual que la línea que separa al artivista y

e I nternet

a sus seguidores y agencias de noticias. Si bien puede no ser lo mismo el artivismo que

Comunicación E lectoral

pintar los cuerpos simulando sangre por ejemplo, como los que realizan organizaciones

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Participación ciudadana y elecciones

es importante destacar dos aspectos: el punto de vista del elector y el punto de vista del candidato. Si por un lado las redes sociales se tornaron un espacio de articulación social, por otro, las estrategias de campaña deben cambiar delante un nuevo escenario donde los perfiles falsos, los rumores y las campañas negativas aumentan de manera exponencial. que configuran el nuevo espacio público de la acción ciudadana, detonan posibilidades

de demandas sociales o son organizados por la sociedad civil, como las ONGs. Las acciones de las categorías mencionadas anteriormente pueden intervenir en el momento electoral pues, si durante ese período empiezan manifestaciones contra una candidatura o una situación tal, es probable que los candidatos tomen en cuenta y cambien su pauta de acuerdo con sus ganancias. ¿Hasta qué punto los grupos organizados o comentarios que se propagan por las redes pueden afectar una elección? No hay como generalizar una única respuesta para todos los casos. Hay que verificar la coyuntura, pero no hay como ser indiferente cuando las manifestaciones en las redes se quedan en constante crecimiento. En ese

políticos y electorales. Así, entre más una democracia posibilita que los ciudadanos, además de elegir a sus representantes, puedan sancionarlos, vigilarlos, controlarlos y exigirles que tomen decisiones acordes a sus necesidades y demandas. (Cansino; Galicia in Galicia, 2013, p. 22)

Justamente porque hay la posibilidad de reacción del electorado, las candidaturas deben tener preparo para actuar delante una realidad donde la opinión es expuesta y donde los rumores son tan fáciles de tomar vida. En las dos más grandes redes sociales del mundo, Facebook y Twitter, existen formas de multiplicación del mensaje y de manifestación de apoyos o rechazos que no pueden ser ignoradas. “Los políticos profesionales se han dado cuenta por la irrupción en la sociedad en Twitter, que ya no pueden apropiarse arbitrariamente de la política, pues la política está hoy más que nunca en todas partes” (Cansino, In Galicia, 2013, p. 144)

Luciana Panke - E dgar Esquivel

encuentre informaciones y resulten en una nueva forma de fiscalización en los procesos

sentido, podemos afirmar que la Internet crea la oportunidad de que la población

cuestiones sobre la participación ciudadana

juego de la política”. Esos grupos, además a veces, se forman espontáneamente a partir

reales para el empoderamiento de sectores y grupos tradicionalmente excluidos del

e I nternet

Para Ramírez y Vidaña (2012, p. 52), “mediante la participación, las redes sociales

Comunicación E lectoral

En cuestión de la participación ciudadana durante los procesos electorales,

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Si consideramos las redes sociales cómo una herramienta a más durante una campaña electoral, hemos de ponderar, también, que es necesario tener un equipo escuchar antes de participar, y estar en un constante proceso de aprendizaje, para saber qué tono es el idóneo y cuándo se debe aportar valor.” (Gutiérrez, in Galicia, 2013, p. 265). De nada vale haber la herramienta, si no hay quien pueda manejarla correctamente.

solo alimenta quien busca asunto para denigrar la imagen de aquel candidato. Consideraciones finales La comunicación electoral es un proceso donde están involucrados actores distintos, con sus respectivos intereses y es un periodo especial que cuenta con el apoyo de herramientas con potencial para informar o persuadir los electores. La presencia de la Internet y las redes sociales como medios para diseminar contenidos es una configuración que toma cuenta de estudios en varias áreas. La cuestión es mensurar los impactos y tener que cada momento electoral es distinto. Por lo tanto, no hay como generalizar a respecto de eficacia o de los efectos de las redes en las campañas electorales. La participación ciudadana en campañas electorales, gañó, sin duda, una nueva herramienta de busca de información a partir de la popularización de la Internet. Hay cómo mantenerse informado sin necesitar de los medios tradicionales, hay como compartir datos y hay como oír la opinión de otros electores. ¿Si eso favorece el proceso electoral? Creemos que sí. Pero, no podemos nos olvidar que esperar una participación integral es algo utópico y depende de cada quien. Para Castells, la cuestión de la participación en las redes también está relacionada a la identificación. “Si las personas encuentran actitudes con las que coinciden en su red social, son más activas políticamente, mientras que las ideas contradictorias reducen la participación” (Castells, 2012, p. 207) Quizás ese punto de vista optimista también pueda ser aplicado a política y a las elecciones. La e-participación presupone, por lo tanto, herramientas, ganas y articulación de grupos con fines en común, pero no hay fórmulas que garanticen su éxito. Las controversias a respecto de la captura y circulación de información afectan, sin duda, los temas políticos y a las elecciones dependen de cada caso para averiguar el reflejo. Al igual que en otras estrategias políticas el éxito de la e-participación dependerá del momento (tiempo) y los canales de difusión (espacio) con que sean difundidas dichas

4 - n . 2 - v. 2

compatible con la realidad. También, que subir contenidos sin sentido o promesas falsas

ano

¿Y qué eso quiere decir? Es que es necesario escuchar a la gente y darle una respuesta

Revista GEMI n IS |

preparado para la retroalimentación de la comunicación. “Se tendrá que aprender a

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acciones. Lo cierto es que incorporan un nuevo ítem para pensar la participación política, especialmente en jóvenes que se distancian de las formas y figuras tradicionales de la

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Comunicación E lectoral

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74


O

intelectual público na

internet: o caso do vlogueiro

Felipe Neto A demir Luiz

da

S ilva

Doutor em História pela Universidade Federal de Goiás (UFG) e professor na Universidade Estadual de Goiás (UEG). Docente no programa de mestrado interdisciplinar Territórios e Expressões Culturais no Cerrado. Pós-doutor em Poéticas Visuais e Processos de Criação pela UFG. Email: ademir.hist@bol.com.br

Revista GEMI n IS

ano

4 - n . 2 v. 2 | p. 75 - 86


Resumo Uma nova geração de intelectuais públicos surgiu com o advento das mídias digitais. Ele atua em sua própria casa, envolvido em debates culturais e políticos centrais para as novas comunidades do ciberespaço. Usamos como estudo de caso o vlogueiro carioca Felipe Neto. Ele tornou-se muito popular e influente a partir de vídeos que postou no site de compartilhamento de vídeos youtube. Suas falas tratam de temas diversos, indo de política tributária, música até filmes pop. Palavras-Chave: internet; intelectuais; Felipe Neto.

Abstract A new generation of public intellectuals has emerged, at home with digital media, engaged in cultural and political debates central to the new communities of cyberspace. We use as a case study the vlogueiro Felipe Neto. He became very popular and influential from videos posted in website YouTube. Their speeches cover several issues, ranging from tax policy, music to pop movies. Keywords: internet; intellectuals; Felipe Neto.


“Se sou um elitista? Sou, sempre fui e sempre serei. O julgamento da maioria está sempre errado. O único jeito de consertar a sociedade é a pau. É preciso manter a cultura, o que resta, acima da canaille”. (Paulo Francis)

Introdução: Atuação intelectual na internet

E

m 2008, foi publicada na edição de agosto da revista Playboy, estrelada pela atriz Carol Castro, uma curiosa entrevista com o escritor Paulo Coelho. A chamada de capa é intrigante: “Sou o intelectual brasileiro mais importante”. Sensacio-

nalismo, mas nem tanto. No recheio da revista, o leitor fica conhecendo a fala completa do “Mago”: “Sem dúvida, sou o intelectual brasileiro mais importante. Mas não queria dizer isso porque pode parecer arrogância. Refaz a frase aí de uma maneira que eu não pareça arrogante”. De alguma forma, ainda que tangencialmente, Paulo Coelho, o mesmo homem capaz de afirmar que James Joyce é nocivo para literatura, demonstrou possuir alguma mínima consciência do absurdo de sua declaração. Era e é inconcebível que ele seja sequer candidato ao título de intelectual bra-

sileiro mais importante. Sua produção, embora composta de uma lista de Best-sellers, é, conforme compreendida pela crítica especializada, culturalmente desimportante. O Brasil já gerou pensadores dignos de figurar no primeiro escalão mundial, como Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda, Joaquim Nabuco, Mário Ferreira dos Santos, Euclides da Cunha etc. Também tivemos divulgadores de altíssimo nível, como o exportado Paulo Francis e o adotado Otto Maria Carpeaux. Dentre os vivos, a coroa é disputada por nomes do porte de Antonio Candido, Roberto Machado e Ferreira Gullar. Autores de obras fundamentais, já integradas ao cânone. Contudo, é preciso ser justo. É possível conceber que Paulo Coelho, apesar de seus alegados poderes mágicos, apenas tenha escolhido mal a palavra. Se tivesse usado “popular”, ou “famoso”, no lugar de “importante” seria difícil contestá-lo. Seria admissível até mesmo a palavra “influente”. Não resta dúvida que no auge da fama sua literatura mística influenciava muito mais leitores do que a crítica elegante de Candido,


as refinadas análises históricas de Flamarion, a filosofia estética de Roberto Machado, a arquitetura/escultura de Niemeyer ou a multifacetada poesia de Gullar. Quantidade Seja como for, o tempo de Paulo Coelho passou. Sua fama, pelo menos no Brasil, se mantém por inércia. Percebo isso no contato diário com estudantes universitários. Pouquíssimos leram Paulo Coelho. A faixa etária média que ele atingia nas décadas de

conforme preconizou Marshall McLuhan. Até mesmo a autoajuda que celebrizou Coelho atualmente é embalada e vendida como psicologia e neurociência, como se percebe nos manuais que ensinam a ser feliz, rico e saudável de autores como Lair Ribeiro e Augusto Cury. Esse estilo de obras domina a cultura atualmente. Se no século XIX, antes do advento das mídias de massa, Balzac era um best-seller, sendo que Thomas Mann representava o mesmo para meados do século XX, nesse início de século XXI não há nada que se assemelhe em termos de artista popular. Contudo, é preciso contemporizar, conforme propõe o intelectual francês Alan Finkielkraut: Sejamos claros: essa dissolução da cultura no todo cultural não acaba com o pensamento nem com a arte. É preciso não ceder ao lamento nostálgico pela idade do ouro, onde as obras-primas existiam aos montes. Velho como o ressentimento, desde suas origens, esse lugar-comum acompanha a vida espiritual da humanidade. O problema com o qual nos confrontamos é diferente e mais grave: as obras existem, mas, uma vez que as fronteiras entre a cultura e o divertimento não são mais claras, não há lugar para acolhê-las e dar-lhes sentido. (1988, p. 139).

O fato é que nesses novos tempos de internet 2.0 e da geração Y, é complicado perguntar quem seria o intelectual mais importante do Brasil. Até mesmo o conceito clássico de intelectual precisa ser revisado. Quando muito, é possível refletir sobre quem seria o “intelectual” mais famoso, mais popular, quiçá mais influente. O primeiro e mais importante critério de avaliação é o alcance, o tamanho potencial da plateia. Pois, “o intelectual contemporâneo inclina-se diante da vontade de potência do show-biz (...) e a transformação extremamente rápida de ministros da Cultura em gerentes da diversão” (Finkielkraut, 1988, p. 142). Sendo a internet um ambiente regido por espetáculos rápidos, seu intelectual modelo precisa ser também um show man capaz de atrair para si atenção. E um show man precisa ser convincente dentro da temática na qual atua, por mais burlesca, grotesca e absurda que pareça a primeira vista. Nesse quesito o vlogueiro carioca Felipe Neto

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Cabana etc. Os tempos são outros, o século virou. O mundo foi dominado pela internet,

ano

1980 e 1990 agora lê Harry Potter, Crepúsculo, Caçador de Pipas, A Batalha do Apocalipse, A

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nunca foi sinônimo de qualidade.

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Rodrigues Vieira, nascido em 21 de janeiro de 1988, parece ser o nome mais popular da internet brasileira e, por extensão, o intelectual mais influente do país entre os jovens

nhou programas em redes de televisão fechadas, participações em programas da TV aberta e lançou, recentemente, livro. Como compreender essa trajetória, aparentemente surreal para os parâmetros anteriores a popularização da internet? Muitos duvidar da verossimilhança de tal atuação. Coincidentemente, “Não faz sentido” é justamente o nome do Canal no YouTube de Felipe Neto. Dentre seus pares (fenômenos de popularidade na Internet), Felipe Neto possui uma atuação intelectual mais consistente do que, digamos, Rafinha Bastos e PC Siqueira. O comediante Rafinha Bastos, que chegou a ter o twitter com o maior número de seguidores do mundo, posta basicamente pílulas humorísticas. Para ler, rir, talvez repassar e esquecer. O colorista PC Siqueira, provavelmente o maior rival de Felipe Neto, tendo seguido trajetória semelhante, não desenvolve ideias e conceitos nos vídeos tas, muitas vezes sem temas-chave que tornem seus vídeos reconhecíveis. Sua persona física inusitada é o foco, não os assuntos abordados em específico. Felipe Neto trabalha

enquanto crítico cultural e de comportamento, a despeito de atuar num cenário “virtual”, obedece a uma lógica consagrada. Conceito de Intelectual público Entendo o conceito de intelectual, para utilização nesse artigo, a partir da perspectiva moderna do usa da palavra, que remonta ao célebre Caso Dreyfus, ocorrido na França no final do século XIX, onde, incitados pelo escritor Émile Zola, um grupo de artistas, professores, jornalistas etc, se manifestaram publicamente pela reabertura do processo contra o oficial judeu Dreyfus, condenado injustamente à prisão perpetua na Ilha do Diabo. Para Zola, que publicou um compêndio das cartas e artigos que escreveu sobre o caso em um volume que intitulou de Eu acuso, a função do homem de cultura, do intelectual, é ser uma espécie de vigilante das instituições, um tipo de arauto da justiça. O escritor deixou claro, já em seu primeiro texto sobre o tema, que

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é uma metralhadora giratória. Felipe Neto é um sniper, um franco atirador. Sua atuação

numa linha diferente. Em cada vídeo desenvolve uma tese, procura atingir um alvo. PC

Felipe Neto

do “Mas Poxa Vida”, seu canal no YouTube. Basicamente faz comentários e críticas sol-

intelectual público na internet: o caso do vlogueiro

uma figura multimídia: expandido sua área de atuação, saiu no nicho da internet, ga-

O

usuários da Rede Mundial de Computadores. Atuando com o Felipe Neto, tornou-se

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Portanto, Zola acreditava que era obrigação do intelectual tornar impossível de

fo grego Sócrates que, segundo seus apologistas, afirmava que era “uma mosca que ferroa o traseiro grande da vaca apática que Atenas”. O intelectual, nesse sentido, precisa incomodar com a “verdade” nua e crua. Ou a sua “verdade”, que seja. Na definição de Michel Winock, autor do livro O Século dos Intelectuais, essa atuação intelectual “assenta no princípio de uma vontade de agir, para além de qualquer consideração política” (2000, p. 26). O intelectual seria quem expõe publicamente seus conhecimentos e opiniões, defendendo ideias que consideram justas, visando movimentar e informar a opinião pública. Por esses termos, nem todo letrado é um intelectual. A erudição guardada para si não qualifica ninguém como tal. O estatuto intelectual está ligado à atuação pública. Para quem acredita que um verdadeiro intelectual só atua no sagrado palco proporcionado pelos livros, cito o editor Lindsay Waters, autor de Inimigos da Esperança – publicar, perecer e o eclipse da erudição: “Desde Gutenberg temos registros financeiros contínuos sobre publicações no Ocidente, e está provado que os livros são um negócio ruim. As novidades mecânicas e eletrônicas foram, e sempre serão, uma aposta melhor” (2006, P. 11). Se no tempo de Zola, o maior fórum de debate público encontrava-se nos jornais, onde publicou o manifesto Eu Acuso em defesa de Dreyfus, na atualidade ele migrou para internet, um meio rápido, simples e barato de fazer a informação circular. Exatamente pelo fato de ser rápido, simples e barato a internet é acessível a, virtualmente, qualquer pessoa. Representa o extremo da democratização do direito de dar opinião. Felipe Neto, certamente não sendo um erudito refinado, com algumas perspectivas e gostos pessoais ingênuos, também pode ser visto como encarnação desse fenômeno. O jornalista e historiador inglês Paul Johnson, autor de Os Intelectuais, opondo-se ao papel desempenhado pelos intelectuais engajados, que propuseram e impuseram modelos de gestão feitos à sua imagem e semelhança, escreveu que: “Uma dezena de pessoas escolhidas ao acaso na rua tem tanta probabilidade de externar pontos de vista sensatos sobre questões morais e políticas quanto um plantel selecionado da intelligentsia” (1990, p. 374). Se isso for verdade, podemos considerar Felipe Neto como um desses dez.

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os interesses imediatos dos donos do poder. Algo muito próximo da máxima do filóso-

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ser ignorado àquilo que já é evidente, mas que é, eventualmente, descartado mediante

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minha intenção não é falar do caso. Se as circunstâncias me permitirem estudá-lo e estabelecer uma opinião formal, não esqueço que um inquérito está aberto e que é de esperar que a justiça e a simples honestidade se imponham, desvencilhando-se dos abomináveis mexericos com que se obstrui um caso tão claro e simples (2009, p. 29).


Nesse sentido convêm lembrar o diagnóstico feito pelo pensador norte-americano Russell Jacoby, em O Fim da Utopia – política e cultura na Era da Apatia. Para ele, a

utopias, enquanto a juventude idealista era o combustível que alimentava o movimento do conjunto. Com o idealismo fora de moda, eclipsado pelas facilidades do mundo moderno, a juventude tornou-se cada vez mais fútil e perdida. Em tal conjuntura, ser alertados por um membro da própria tribo, aos gritos e xingamentos, falando sua própria língua em sua própria arena, surte mais efeito do que sermões complexos e moralizantes dirigidos por figuras paternalistas e professorais. Ou, se for o caso, por jovens emulando essas figuras paternalistas e professorais. De modo cognoscível para sua plateia, Felipe Neto “rechaçava a ideia, hoje mais disseminada do que nunca, de que a razão subjetiva é o argumento definitivo, de que aquilo que um indivíduo sente, deseja ou quer não admite contestação” (Jacoby, 2001, p. 131). Cumpre o papel de vulgarizador, no sentido de disseminador, de noções complexas. Se exige consciência pessoal. Nessa escala de valores, um voto ou o ato de jogar ou não papel na rua são pensados a partir dos mesmos critérios de julgamento.

Felipe Neto

não exige engajamento político de seu público, como faziam os intelectuais utopistas,

intelectual público na internet: o caso do vlogueiro

historicamente era exercida pelos intelectuais. O intelectual era o motor da busca por

O

crise do socialismo na década de 1990 dinamitou a função de consciência crítica que

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Vejamos um exemplo da atuação do vlogueiro. Quantos professores, críticos, irmãos mais velhos, nerds da turma etc, tentaram sem sucesso convencer aluna(o)s, leitora(e)s, amiga(o)s, namorada(o)s, esposa(o)s, tias solteironas etc, que os livros e filmes da série Crepúsculo são terrivelmente ruins, sexistas, conservadores e antifeministas? No momento em que escrevo esse trecho do artigo, o vídeo de Felipe Neto sobre esse assunto conta com 12.299.505 acessos, e crescendo. O vídeo é demolidor, não deixa pedra sobre pedra da “saga” de Stephenie Meyer. É usado sarcasmo, ironia, humor negro e grosseria explícita para ridicularizar não apenas o livro em si, mas, sobretudo, seu fã. É hilário e, tenho certeza, eficaz. Não tenho dúvidas que converteu muita(o)s apaixonada(o)s pelo vampiro Edward em detratores do sanguessuga emo. Algo que críticos gabaritados como Rubens Ewald Filho, Ana Maria Bahiana, Pablo Vilaça e Isabela Boscov teriam muitas dificuldades para conseguir, devido ao alcance de seus artigos e perfil de seu público médio. Supõe-se que quem possui o saudável hábito de ler crítica de literatura e cinema é um espectador mais sofisticado e maduro, que não cai nas armadilhas da indústria da mídia de massa com tanta facilidade.

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Atuação e influência de Felipe Neto


Por outro lado, como observou Osman Lins no clássico Do ideal e da forma: problemas inculturais brasileiros,

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Ou seja, o discurso crítico baseado na ideia de que seu portador pode falar porque é moralmente superior, seja em função da idade ou da formação acadêmica, é refratário. Sobretudo para o jovem contemporâneo, acostumando a dar suas opiniões na internet, em fóruns de debate onde não existe diferença entre os debatedores, uma vez que todos estão nivelados pela distância física. Felipe Neto não se utiliza de recursos de autoridade moral para alicerçar seu discurso. Pelo contrário. Coloca-se na mesma altura de seu espectador, dando-se a liberdade de ridicularizá-lo uma vez que no espaço de vultosas. Trava seus discursos como quem discute em uma mesa de bar ou numa roda de amigos no recreio da escola.

mínimo, questionável. Dentre os cem mais votados apareceram figuras pop como Luan Santana, Joelma e Tiririca. Considerando que a indicação de Tiririca também seja fruto de votos de protesto, como ocorreu em sua eleição para Câmara Federal, certamente os outros foram homenageados por admiradores reais. Felipe Neto mostrou como isso simplesmente “não faz sentido”, apresentando suas perspectivas sobre a importância de possuir algum senso de proporções. O vídeo, que é bastante recente, já conta com 2.258.715 visualizações. Com certeza, muitos dos votantes assistiram ou vão assistir ao vídeo e é possível que alguns se arrependam dos votos que deram. Uma aula de educação, moral e cívica. E existem outras, como àquela em que ridiculariza as práticas carnavalescas, com 1.861.601visualizações. O vídeo desancando o que chamou de “Cultura da Bunda”, com 2.303.598 visitas. Também tem lugar para a autorreflexão, analisando o papel das mídias sociais no mundo contemporâneo, com 2.976.020 espectadores. Outro ainda discute o crescente fenômeno da adolescência tardia, com 2.517.658 visualizações. E a lista segue barra abaixo. Uma pergunta legitima seria: por que tratar de temas aparentemente vazios e superficiais que pouco ou nada contribuem para o desenvolvimento do espectador dos

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vida pelo SBT para escolher O Maior Brasileiro de Todos os Tempos. O resultado foi, no

Um exemplo interessante dessa atuação está no vídeo sobre a enquete promo-

Felipe Neto

comentários do vídeo pode receber o “troco” na mesma moeda, ou em moedas mais

intelectual público na internet: o caso do vlogueiro

Espanta e faz medo que as pessoas ligadas à cultura e das quais, por isso mesmo, esperamos diante de assuntos culturais, uma atitude cultural, venham engrossando as águas de correntes não culturais com os seus pronunciamentos e atitudes. Como se fossem portadoras de autoridade, e não portadoras de cultura (1977, p. 159).


vídeos? Talvez porque “para remediar parcialmente a fragilidade humana, o intelectual tem que seguir a trilha que leva ao malfeito” (Fuller, 2006, p. 29). Outra resposta posdesses mesmos espectadores. Se são vazios ou não, trata-se de juízo que valor que não é o caso de discutir nesse espaço. Diferentemente do rapper Gabriel, o Pensador, que fez sucesso na década de

sonagens retratados nas músicas, os vídeos de Felipe Neto não deixam espaço para dúvidas. Não há concessões. São quase bullying virtuais contra “Pipocas de Micareta”, funkeiros, viciados em Orkut, “filhinhos de papai criados por avó” etc, para ver se tomam vergonha. Com a peculiaridade de que o próprio bullyinado procura-o. E não foram poucas as ocasiões em que Felipe Neto literalmente expulsou espectadores que não alcançassem seu raciocínio, exigindo que Pipocas, Funkeiros e congêneres saíssem de seu canal. Duvido que tenham obedecido, como prova os inflacionados números de visitas e respostas que recebe. A curiosidade mórbida é um eficiente chamariz de público. Sua atuação na internet é, essencialmente, de caráter audiovisual. Seus vídeos, editados de forma ágil e com subtexto visual fortemente irônico, dialogam primeiramente com os sentidos, para depois chegar ao racional. É uma característica da mídia pós-moderna. Pouco importa que a inteligência desenvolvida pela brincadeira com a máquina seja de ordem da manipulação e não do pensamento: entre o know-how cada vez mais eficiente e um consumo cada vez mais variado, a forma de discernimento necessária para pensar o mundo não faz uso nem mesmo, como já foi visto, da palavra para expressá-lo, uma vez que a palavra cultura lhe foi definitivamente confiscada. (Finkielkraut, 1988, p. 149).

O grande diferencial de Felipe Neto enquanto figura pública é conseguir falar para quem, em tese, precisa ouvir: àqueles a o qual o jornalista Paulo Francis chamava de a canaille, a arraia miúda, a burguesia inculta etc. Simplificando, seria o grande público. Seus vídeos são memes culturais conforme teorizou o biólogo inglês Richard Dawkins. Multiplicam-se pela internet como vírus. Em alguns casos é até difícil evitá-los, tornando-o um verdadeiro catequizador missão pedagógica. Catequizador, mas não um mártir abnegado. Com ele, bateu, levou. O combate aos barbarismos ocorre porque essas práticas o irritam, não porque deseja salvar almas. Jorge Listopad, autor de Tristão ou A Traição do Intelectual, destaca que “o intelectual não é um educador nem, obrigatoriamente, um missionário. Trata-se de uma concepção total, absoluta, do des-

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Loiras Burras e Playboys, que seduzidos pelo ritmo não percebiam que eram os per-

ano

1990 criticando “Loiras Burras” e “Playboys”, em músicas que faziam sucesso entre

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sível seria: porque esses temas representam parte considerável dos interesses pessoais

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tino livre (...) não pode preocupar-se com mais nada além de si próprio” (1994, p. 67). Enfrenta terreno inimigo por orgulho e desejo de aventura. Nota-se que não

hábitos em perspectivas. Isso é raro entre intelectuais brasileiros, acostumados que são em discursar para grupos específicos, geralmente de opinião prévia convergente. Dois casos exemplares, aparentemente antagônicos, mas curiosamente similares. Quando a filósofa Marilena Chauí, conhecido por suas posições políticas de esquerda, aparece na mídia virtual ou televisiva seu público é composto basicamente por estudantes engajados e membros da esquerda delirante em geral. Quando o filósofo conservador Olavo de Carvalho aparece nessa mesma mídia seu público é composto basicamente por membros da minoria conservadora letrada brasileira e certas facções da Igreja católica. Parecem viver em universos paralelos. Chauí nega o Mensalão. Olavo de Carvalho coleciona documentos contra o Foro de São Paulo. Chauí defende que a imprensa é golpista, elitista e gerida pelos interesses macroeconômicos da Direita. membros são majoritariamente esquerdistas antipatriotas. Se a ideologia afasta-os, o senso de espetáculo os aproxima. Suas performances brechtinianas e posições dogmá-

tro lado para deliberadamente se chocar e, calhando, brigar um pouco para desopilar o fígado, protegidos pelo ambiente asséptico e potencialmente anônimo da internet, onde um xingamento, um “curtir” ou um “compartilhar” vale o mesmo que longas réplicas e treplicas. Conclusões: os limites da atuação intelectual na internet e além Os mais cínicos dirão: um vlogueiro é só alguém que, por não saber escrever, fala diante de uma câmera e se exibe na internet. Nunca poderia ser qualificado como intelectual. Certamente essa é a regra. Estando claro que não pretendo fazer apologia nem da atividade vlogueira nem ao vlogueiro em particular que adotei como tema desse artigo, parece-me que seus vídeos seguem nitidamente um roteiro, não são feitos no improviso. Representam o resultado final da junção de texto, atuação, direção de arte e edição. Se são esteticamente bons ou ruins, ou ainda superficiais ou profundos, é outra discussão. Mas comunicam, cumprindo seu objetivo fundamental. Usando inclusive a língua do público alvo, o que pode envolver muitas gírias e mesmo palavras de baixo calão.

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públicos, que se colocam como adversários, já chegam convencidos. Só procuram o ou-

ticas amealham plateias consideráveis. Mas são personagens de nicho. Seus respectivos

Felipe Neto

Olavo de Carvalho denuncia que a imprensa está aparelhada pelo Estado e que seus

intelectual público na internet: o caso do vlogueiro

conquistada sugere que consegue senão domá-lo, ao menos os leva a colocar gostos e

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prega para plateias conquistadas, seu público é eminentemente hostil. A ampla difusão

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É possível pensar em comunicações intelectuais recheadas de grosserias? O baixo calão pode servir ao ministério das altas reflexões? Olavo de Carvalho usa desaudiovisuais, incluindo divulgados na vlogs na internet. Marilena Chauí também não se furta em praticá-la. De resto, até Shakespeare utilizou recursos como flatulência e baixaria para desenvolver suas peças. Portanto, a resposta é sim. Lembrando que o ter-

Em função da fama adquirida na internet, Felipe Neto foi convidado para atuar dentro de grandes corporações de mídia de massa. Primeiro no canal fechado Multishow e depois na Rede Globo, produzindo quadros de humor, em parceria com Fábio Nunes, para o programa dominical Esporte Espetacular. Não foi muito bem sucedido. A dinâmica industrial da produção televisiva e massacrante. Basta ver os nomes dos talentosos comediantes que atuam nos lamentáveis programas Praça é Nossa e Zorra Total. Mas, pensando em termos de construção de figura pública, essas atividades são irrelevantes. São basicamente empregos onde o elemento criativo, embora faça parte do produto oferecido ao público desses programas, é controlada por elementos corporativos que estão além da alçada da figura que aparece na tela. A persona reconhecível de Felipe Neto está circunscrita ao YouTube. Fora dali, por enquanto, não existe. O livro Não faz sentido – atrás das câmaras, que lançou recentemente pela editora Casa da Palavra, não alcança o público com o mesmo impacto dos vídeos na internet. Suas atividades enquanto escritor e ator representam sombras de persona de vloguer. Esse Felipe Neto banalizado na TV aberta, utilizando a célebre imagem concebida por Walter Benjamin, “perdeu a aura” (1994, p. 170). Os limites impostos pela dinâmica da TV aberta cerceiam sua possibilidade de extravasar opiniões, justamente a característica que lhe deu ressonância na internet. Ao mesmo tempo, no campo da escrita, por mais divertido que possa ser o livro, Felipe Neto não se destaca, nem pelo estilo nem pelo conteúdo. Fruto da internet, mestre da comunicação com a Geração Y, o tradicional objeto livro, enquanto representação do “antigo” modelo de intelectual, se torna uma quebra em sua proposta estética e cultural, essencialmente ligada ao audiovisual de escopo independente.

Chegando ao final dessa reflexão, reconheço o inusitado de apontar Fe-

lipe Neto como o intelectual mais influente do Brasil. Mas se pararmos para pensar e, analisando o atual contexto cultural, veremos que os outros candidatos ao título são figuras como o jornalista Pedro Bial e ex-cineasta Arnaldo Jabor. Nesse cenário, apostar no jovem vlogueiro não parece tão absurdo assim. Faz algum sentido.

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funkeiro Mr. Catra são mais sutis do que parece.

ano

reno é pantanoso. A diferença entre os palavrões usados pela banda de rock Titãs e pelo

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sa estratégia constantemente, tanto em textos escritos quanto em aparições em mídias

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BENJAMIN, Walter. Magia e técnica, arte e política.

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Obras escolhidas I. São Paulo: Brasiliense, 1994. FINKIELKRAUT, Alan. A derrota do pensamento. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988. FULLER, Steve. O intelectual. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2006. JACOBY, Russell. O fim da utopia. Rio de Janeiro: Record, 2001. JOHNSON, Paul. Os intelectuais. Rio de Janeiro: Imago, 1990. LINS, Osman. Do ideal e da glória. Problemas inculturais brasileiros. São Paulo: Summus, 1977. LISTOPAD, Jorge. Tristão ou a traição de um intelectual. Lisboa: Quetzal editores, 1994.

WINOCK, Michel. O século dos intelectuais. Lisboa: Terramar, 2000.

ZOLA, Émile. Eu acuso. Porto Alegre: L&M, 2009.

Felipe Neto

WATERS, Lindsay. Inimigos da esperança. São Paulo: Editora da Unesp, 2006.

intelectual público na internet: o caso do vlogueiro

Referências

A lan César B elo A ngeluci


G amificação:

abordagem e

construção conceitual para aplicativosem

TV D igital

Interativa M arcos A mérico Docente do Programa de Pós-graduação em Televisão Digital: Informação e Conhecimento da UNESP/Bauru, SP. E-mail: tuca@faac.unesp.br

S helley Costa N avari Mestranda do Programa de Pós-graduação em Televisão Digital: Informação e Conhecimento da UNESP/Bauru, SP. E-mail: scostanavari@yahoo.com.br

Revista GEMI n IS

ano

4 - n . 2 v. 2 | p. 87 - 105


Resumo A implantação da TV Digital no Brasil abre espaço para o desenvolvimento de conteúdos educativos baseados nos conceitos de t-learning e edutretenimento. O estudo propõe a aplicação da gamificação como elo comunicacional para incentivar e modificar o comportamento dos usuários. No entanto, esbarra-se na problemática conceitual do termo, uma vez que a literatura traz diversas e amplas definições, que variam de acordo com o contexto de aplicação. O objetivo deste trabalho, de caráter exploratório, é propor uma abordagem conceitual, a fim de construir um conceito delimitado e que fundamente o sistema de gamificação em TV Digital Interativa. Palavras-Chave: Gamificação; Interatividade; T-learning; TV Digital; Edutretenimento.

Abstract The deployment of Digital TV in Brazil opens up space for the development of educative content based on the concepts of t-learning and edutertainment. The study proposes the application of the gamification as a link of communication to encourage and modify the users’ behavior. However, bumps into itself on the conceptual problem, once the literature brings several definitions that vary according to the application context. The objective this study, exploratory, is to propose a conceptual approach, in order to build a delimited concept that substantiates the gamification system in Interactive Digital TV. Keywords: Gamification; Interactivity; T-learning; Digital TV; Edutertainment.


1 Introdução

O

mercado das mídias digitais tem oportunizado o desenvolvimento de novos conteúdos que atendam o gosto do público consumidor, principalmente produtos que ofereçam informação, interatividade e entretenimento.

Com a popularização da internet, as TIC têm modificado os sistemas de comu-

nicação, ampliando as possibilidades de interação em um formato cada vez mais atual, que se utiliza das linguagens digitais, inclusive através dos jogos. Nesse cenário, a convergência da TV Digital com outras mídias, vem enriquecer o processo de aquisição do conhecimento, principalmente na produção de programas televisivos com propósitos ou intenções educativas, baseados em t-learning. Nesse sentido, a produção de conteúdos interativos, com intenções educativas, vem agregar um grande valor à educação, principalmente se a aquisição do conhecimento é favorecida através do entretenimento. A partir do crescimento da indústria de games, acompanha-se, recentemente, o uso de estratégias da gamificação, com princípios e elementos dos jogos, para impulsionar e aumentar os negócios sociais e digitais. Essa estratégia tem sido aplicada em plataformas na internet, celulares, redes sociais e em áreas como artes, comércio, educação, empresas, entretenimento, governo, marketing, saúde, fitness, entre outros. Os princípios do design dos games têm colaborado para o desenvolvimento de uma nova cultura de comportamento, indo além do entretenimento e incentivando a conquista de recompensas e superação dos obstáculos para alcançar determinadas metas e objetivos. Considerando o ambiente interativo da televisão, com a implantação do SBTVD-t – Sistema Brasileiro de Televisão Digital Terrestre, a gamificação é uma estratégia com possibilidades de alavancar a audiência dos públicos televisivos, engajar o comportamento do usuário para a interação e consumo do conteúdo e contribuir para a aprendizagem, visto que a linguagem dos games não visa apenas o entretenimento, mas tem sido um meio de pensar e resolver problemas através da sua lógica e fortalecer


os laços entre comunicação e educação. Dessa forma, a construção conceitual do termo gamificação abre caminhos conteúdos e aplicativos que se utilizam de diversas linguagens e mídias, no ambiente da televisão digital interativa.

cação1, aparenta complexidade mediante a grande diversidade de conceituações, usos e aplicações. Em 0,22 segundos, o site de buscas Google localiza aproximadamente 3.870.000 resultados2 para “gamification” e 42.800, em 0,23 segundos, para o termo “gamificação”. É notável a enorme quantidade de buscas em língua inglesa, evidentemente pelo grande desenvolvimento da indústria estrangeira de games, inclusive pelo aumento de estudos de casos e pesquisas de instituições de consultoria que subsidiam com informações importantes as decisões de grupos empresariais. Pode-se verificar que tais números são expressivos, uma vez que a utilização desses termos é recente. A ferramenta Google Trends3 registra a primeira busca do termo Gamification, em setembro de 2010, e do termo Gamificação, apenas em agosto de 2012.

Figura 1 - Ocorrência de busca dos termos Gamification e Gamificação, em janeiro de 2011

Fonte: Capturado do GoogleTrends (http://goo.gl/bhiLFd).

1 Há uma discussão interessante sobre a questão terminológica em português. Disponível em: http://opusphere. com/ludificacao-ou-gamificacao/. Acesso em: 03 out. 2013. 2 Pesquisa realizada no site Google http://www.google.com.br. Acesso em 03 out. 2013. 3 Ferramenta do Google que mostra os termos mais populares utilizados em um determinado período, em diversas regiões do mundo, a partir de gráficos que permitem visualizar o tempo e a frequência de busca do termo, podendo ainda compará-lo ao volume de busca entre duas ou mais palavras. In: http://www.google.com.br/trends. Acesso em: 03 out. 2013.

4 - n . 2 - v. 2

Compreender o termo gamification, traduzido para o português como gamifi-

ano

2 Gamificação: origens

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para o entendimento e aprofundamento do tema, antecedendo o desenvolvimento de

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Desta forma, é possível verificar o volume de pesquisas feitas por região do globo. Cingapura se destaca em pesquisas sobre o termo “gamification”, com 100%, se33%; Alemanha e Espanha, 24%; Itália, 18%; e, por último, o Brasil, com 14%. Cingapura é considerado o país com maior interesse em negócios de mídia deverá crescer para US$ 70, 1 bilhões em 20155. O país abriga os maiores players do setor, tais como Ubisoft Cingapura, Gumi Ásia, Garena Interativo e Gameloft Cingapura. No entanto, ainda que as buscas apresentem datas recentes, o termo foi utilizado pela primeira vez, em seu sentido atual, em 2003, pelo pesquisador britânico e desenvolvedor de jogos, Nick Pelling6, enquanto realizava uma consultoria de criação de interfaces de jogos para dispositivos eletrônicos. Somente em 2010, o termo Gamification, tornou-se conhecido como “the hot new business concept” 7, em revistas sobre negócios e entre reuniões de empresários. É nesse contexto que a gamificação surge como mecanismo para solucionar problemas e alavancar grandes projetos empresariais. Com a finalidade de se compreender os contextos em que a gamificação começou a ser empregada, Werbach & Hunter (2012) descrevem três tipos comuns: (1) portamento. O primeiro uso está relacionado ao interesse das empresas em melhorar a produtividade e o engajamento dos empregados com a intenção de obter resultados cada vez mais positivos nos negócios. A segunda situação envolve o interesse das empresas em alcançar e fidelizar os clientes ou potenciais clientes, principalmente através

de comportamento nos hábitos das pessoas, permitindo que elas façam escolhas ou atinjam determinados objetivos ou metas, em diversas áreas como educação, saúde, finanças etc. As redes sociais, aplicativos móveis e demais plataformas Web foram os primeiros exemplos de casos em que foram utilizadas técnicas de gamificação com a finalidade de envolver os usuários e pode-se tomar como exemplos: Fourquare (localização), 4 Em Cingapura, o Media Development Authority (MDA) é o órgão responsável pela co-regulação do mercado de mídia digital. In: http://www.mda.gov.sg/Pages/Home.aspx. Acesso em: 04 out. 2013. 5 Dados obtidos no site do MDA: http://www.mda.gov.sg/Industry/Video/IndustryOverview/Pages/

Overview.aspx# com referência à pesquisa feita pelo DFC Intelligence: http://www.dfcint.com/index.php. 6 Werbach & Hunter (2012, p.25), no livro For the Win: how game thinking can revolutionize your business, afirmam que o termo Gamification caiu em desuso, logo após ter sido utilizado pela primeira vez por Nick Pelling, vindo a ser utilizado novamente nos anos seguintes por conhecidos designers de games como Amy Joe King, Nicole Lazzaro, Jane McGonigal e Bem Saywer, inclusive por pesquisadores da área de games como Ian Bogost, James Paul Gee e Byron Reeves. 7 Traduzido como “o novo conceito quente de negócio”.

M arcos A mérico - S helley Costa N avari

e menos específico, aplicável a qualquer situação, tem o intuito de provocar a mudança

do marketing, para alavancar a venda dos seus produtos. E por fim, o uso mais amplo

TV D igital Interativa

gamificação interna (2) gamificação externa e (3) gamificação para a mudança de com-

abordagem e construção conceitual para aplicativosem

digital e lidera o setor da indústria de games4, que está estimado em US$ 59,5 bilhões e

G amificação:

guido da Holanda, 50%; Austrália, 46%; Índia, 44%; Estados Unidos, 42%; Reino Unido,

91


Getglue (shows, filmes, programas de TV), Duolingo (idiomas), Khan Academy (educação), LinguaLeo (idiomas), Fitocracy (fitness), Nike Plus (corrida), etc. Da mesma forma, as engajar os empregados e também seus consumidores, através de um sistema de recompensas para incentivar a qualidade e quantidade de suas interações. A gamificação, no âmbito de marcas e produtos, influencia as pessoas para a interação e o consumo, além

Em junho de 2012, foi lançado o Degrassi, um programa canadense de TV ao vivo, baseado em Gamificação que tem como objetivo atrair os telespectadores para assisti-lo ao vivo e não por outras formas (gravado ou por download ilegal, p.ex.). A Much Music Awards, produtora do programa, criou um programa de fidelidade para os telespectadores, chamado MuchCloser8, a partir de uma plataforma de gamificação na internet, desenvolvida pela empresa Badgeville. O MuchCloser permite que os telespectadores possam ganhar pontos e recompensas ao interagir ao vivo nas redes sociais, lendo posts, compartilhando e comentando conteúdos, a fim de ganhar emblemas virtuais, ingressos para os shows etc. Como em outros sistemas de gamificação, o canal televisivo procurou incentivar as pessoas a se envolver com o programa, através da conquista dessas metas. Devido ao fato de apresentarem elementos de jogos de forma desafiadora e motivacional, os sistemas de gamificação são reconhecidamente utilizados como estratégias para melhorar o envolvimento dos usuários em determinada ação ou tarefa em contexto de “não jogo”, com recompensas atingíveis, modificando o comportamento para a superação, competição positiva e desenvolvimento de habilidades como a atenção, a motivação e o impulso necessário para alcançar uma meta ou objetivo. 3 O estado da arte Em artigos apresentados recentemente no Brasil, alguns pesquisadores9 (Tenório & Araújo, 2012; p.13; Lemos, 2013, p. 9; Tsutsumi & Petry, 2013, p. 68) remetem-se, ainda, ao termo Gamification, na língua de origem em suas pesquisas. No entanto, com efeito de torná-lo mais popular no Brasil, inclusive, o conhecimento e a aplicação de suas técnicas, adota-se, neste trabalho, o termo Gamificação. 8 Disponível em: http://www.muchmusic.com/muchcloser/. Acesso em 05 set. 2013. 9 Tenório & Araújo (2012, p.13). Disponível em: http://sbgames.org/sbgames2012/proceedings/papers/gamesforchange/g4c-03.pdf. Acesso em: 05 out. 2013; Lemos, L. (2013, p.9). Disponível em: http://www.sbgames.org/sbgames2013/proceedings/cultura/Culture-2_full.pdf. Acesso em: 05 out. 2013; Tsutsumi & Petry (2013, p. 68). Disponível em: http://www.sbgames.org/sbgames2013/proceedings/cultura/Culture-10_full.pdf. Acesso em: 05 out. 2013.

4 - n . 2 - v. 2

gias móveis.

ano

de permitir a expansão de forma viral de qualquer negócio, em redes sociais e tecnolo-

Revista GEMI n IS |

empresas começaram a empregar essas mesmas técnicas em seus processos, a fim de

92


Apesar de não existir uma definição única, a mais conhecida e utilizada é a

proposta a partir das pesquisas de Deterting et al. (2011), que define gamificação como Praticamente com o mesmo sentido, Werbach & Hunter (2012) utilizam o conceito como “o uso de elementos de jogos e técnicas do design de game em contexto de não e a amplitude dos seus usos e aplicações, é proposto o seguinte quadro conceitual (Quadro 1), com algumas das definições encontradas: Quadro 1– Levantamento conceitual sobre Gamificação. Fonte/Ano

Definição

THE OXFORD DICTIONARY 11 2013

“A aplicação de conceitos e técnicas dos jogos para outras áreas de atividade.” (tradução nossa).

BUNCHBALL 12 2013

“A integração dinâmica do jogo em seu site, serviço, comunidade, conteúdo ou campanha.” (tradução nossa).

DETERTING et al., 2011

“O uso de elementos do design de jogos em contextos não jogo". (tradução nossa).

GAMIFICATION WIKI 13 2013

“Gamificação é o conceito de aplicar o pensamento do design de jogo em aplicações não jogo para torná-las mais divertidas e envolventes.” (tradução nossa).

MCGONIGAL 2011

“O recente fenômeno do uso dos jogosdigitais para solucionar problemas sociais e envolver o público é conhecido como Gamificação.” (tradução nossa).

ABT, C. 1970

“Os jogos que têm uma finalidade educacional explícita ou cuidadosamente planejada e não se destinam para serem jogados, principalmente, para diversão.” (tradução nossa). Para alguns autores, o termo Gamificação evoluiu a partir do conceito dos Serious Games (Jogos Sérios), proposto por Abt (1970).

“Gamificação é a habilidade de aplicar os elementos de jogo e as técnicas do game design em contexto não jogo. Essencialmente pensar fora da caixa, o que nos permite usar as habilidades dos jogos em situações da vida real.” (tradução nossa).

TV D igital Interativa

WIKIPEDIA (em inglês) 10 2013

abordagem e construção conceitual para aplicativosem

jogo” (tradução nossa). A fim de se compreender o estado da arte sobre gamificação

G amificação:

“o uso de elementos do design de games em contextos de não jogo” (tradução nossa).

93

M arcos A mérico - S helley Costa N avari

10 Disponível em: http://en.wikipedia.org/wiki/Gamification.Acesso em: 03 out. 2013. 11 Disponível em: http://goo.gl/hXvWpo (Adaptado). Acesso em: 03 out. 2013. 12 Bunchball é uma das maiores empresas de tecnologia especializadas em Gamification que oferece serviços de gamificação para plataformas através de softwares baseado na nuvem, a fim de fidelizar clientes e empresas, através do engajamento online com a mecânica de games. In: http://www.bunchball.com/ 13 Portal que reúne a maior comunidade de discussões sobre Gamification. In: http://gamification.org/wiki/Gamification. Acesso em 06 out. 2013.


Fonte/Ano

Definição

MACMILLAN, D. 15 2011

“Gamificação: exerce uma forte influência psicológica sobre os consumidores.” (tradução nossa). Uso comercial.

LOVEL, N. 2011

“Gamificação: incentiva comportamentos entre seus clientes.” (tradução nossa). Uso comercial.

GORDON, B. 16

“Gamificação é tão importante quanto social e móvel.” (tradução nossa).

SMALL BUSINESS LABS 17 2011

“Gamificação é uma das palavras de moda mais quentes no Vale do Silício nestes dias. Simplificando, o termo refere-se à incorporação dos elementos e mecânica de jogo em sites e softwares não jogos.” (tradução nossa).

ZICHERMAN, G. 2011

(1) “Gamificação é a inclusão de mecânica, estilo, pensamento e/ou técnicas de design de jogos para envolver pessoas na solução de um problema.” (2) “Processo de uso de mecânicas de jogos para engajar audiências e resolver problemas”. (tradução nossa).

HUOTARI, K.; HAMARI, J. 2012

“Um processo de melhoria de um serviço com affordances18 para experiências gameful19, a fim de apoiar a criação de valor global do usuário.” (tradução nossa).

M arcos A mérico - S helley Costa N avari

14 Pesquisadores em Game Studies como Deterting, Mcgonigal e Bogost criticam o uso da Gamificação para o uso ou estratégia comercial. 15 Disponível em: <http://www.businessweek.com/magazine/content/11_05/b4213035403146.htm>. Acesso em: 05 out. 2013. 16 A definição defendida por Bing Gordon, parceiro na Kleiner Perkins, pode ser encontrada em: http://gamification.org/wiki/Gamification. Acesso em 06 out. 2013. 17 What is Gamification? Disponível em: http://www.smallbizlabs.com/2011/02/what-is-gamification.html. Acesso em: 03 out. 2013. 18 Affordance (s/trad.) é a qualidade do objeto, ou de um ambiente, que permite que um indivíduo realize uma ação. É a qualidade de algo funcionar da maneira como ele foi projetado ou pensado para funcionar. O termo é usado em áreas, como em Interação Humano Computador (IHC), Design de Interação, Psicologia de Percepção, entre outras. (Adaptado). Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Affordance. Acesso em: 08 nov. 2013. 19 Gameful (s/trad.) é um termo cunhado pela designer de games, Jane Mcgonigal para se referir às qualidades dos games aplicadas em outros contextos.

“Gamificação: ajuda os trabalhadores a se tornarem mais engajados.” (tradução nossa). Uso comercial14.

TV D igital Interativa

CLARK, T. 2011

abordagem e construção conceitual para aplicativosem

“Jogos são obstáculos desnecessários que nós nos voluntariamos a resolver”. (tradução nossa). McGonigal (2011) usa a definição de Suits (1978) como base para o termo Gamification, visto que os obstáculos têm a função de mobilizar/desafiar os jogadores para a transformação social.

G amificação:

SUITS, B. 1978

94


Fonte/Ano

Definição

“Gamificação usa a mecânica de jogos e as técnicas do design de jogos em contexto não jogo – é uma poderosa ferramenta para envolver funcionários, clientes e o público para a mudança de comportamentos, desenvolver competências e inovação. Nosso Relatório Especial avalia as tendências, sobre como a Gamificação está sendo aplicada em várias indústrias e explora suas oportunidades futuras.” (tradução nossa).

WERBACH, K; HUNTER, D. 2012

“Gamificação é o mesmo que aprender através dos games, a partir do uso de elementos dos games e técnicas de game design, como os pontos, barras de progressão, níveis, troféus, medalhas etc., em contextos que não são games.” (tradução nossa).

WU, M. 21 2011

“Gamificação é o uso da mecânica de jogo para conduzir ao engajamento e ações game-like.13 A lógica é realmente simples. As pessoas gostam de jogar. Mas na vida cotidiana, frequentemente somos apresentados às atividades que odiamos, se elas são tarefas chatas ou trabalhos estressantes. Gamificação é o processo de introdução da mecânica de jogo para estas atividades abominadas tornando-as mais um game-like (ou seja, divertido, gratificante, desejável, etc.), de modo que as pessoas gostariam de participar proativamente nestas tarefas.”

Apesar de inúmeras definições, foram eleitas algumas mais importantes e significativas e pode-se, então, verificar a ampla utilização do termo pela indústria e pela academia. Embora, o foco deste trabalho esteja voltado para a pesquisa acadêmica, é imprescindível articular esses estudos aos avanços da indústria, objetivando o desenvolvimento de produtos para a inovação científica e não apenas para o setor comercial.

20 Disponível em: http://www.gartner.com/technology/research/gamification/. Acesso em 03 out. 2013. 21 Disponível em: http://lithosphere.lithium.com/t5/science-of-social-blog/Gamification-from-a-Company-of-Pro-Gamers/ba-p/19258. Acesso em: 03 out. 2013.

4 - n . 2 - v. 2

GARTNER 20 2011

ano

“o uso de mecânicas de jogos, estética lúdica, e pensamento de jogo para engajar pessoas, motivar ações, promover aprendizado e resolver problemas.” (tradução nossa).

Revista GEMI n IS |

KAPP, K. 2012

95


Gartner22, em relatório de pesquisa de mercado, afirma que até 2015, mais de 50% das organizações que gerenciam os processos de inovação, deverão “gamificar” os mentos e estímulos para a inovação. Através do modelo crowdsourcing23 de produção, as empresas procuram melhorar o desempenho do empregado e a aceitação dos clientes os quatro principais meios para se conseguir esses resultados, utilizando a gamificação: (1) rápido ciclo de feedback, relacionado ao desempenho; (2) objetivos claros e regras bem definidas de jogo; (3) narrativa convincente capaz de envolver os jogadores à participação e alcancedos objetivos propostos; (4) tarefas desafiadoras, porém alcançáveis, a fim de manter o interesse constante na atividade. Apesar do enorme quantitativo de conteúdos relacionados à gamificação na internet, é possível concentrar dois segmentos importantes de pesquisa, de acordo como interesse ou objetivo de aplicação. Na área de indústria e negócios, há um grande destaque para o GSummit 10, cúpula anual que reúne especialistas em Gamificação, de vários setores, como Ian Bogost, Sebastian Deterting, Amy Jo Kim, Nicole Lazzaro, Jane Mcgonigal, Rajat Paharia, Jesse Schell, Kevin Werbach, Michael Wu, além de Gabe Zichermann, presidente da Conferência GSummit,empresário, palestrante e autor de livros Na área acadêmica articulada à indústria, as pesquisas de maior relevância são concentradas em uma rede de pesquisa, conhecida como Gamification Research Network (GRN)11, administrada por Sebastian Deterting, professor do Instituto de Tecnologia de Rochester Magic Lab. A rede conta com mais de 250 pesquisadores e estudantes interessados em pesquisas da área e apresenta um vasto repositório de recursos humanos,

TV D igital Interativa

sobre Gamificação, voltados para a indústria.

abordagem e construção conceitual para aplicativosem

com suas marcas, produtos, serviços ou aplicações. O mesmo documento ainda aponta

G amificação:

seus processos, a fim de alcançar altos níveis de engajamento, mudança de comporta-

96

(GRN) e lista de discussões. Após a abordagem conceitual e bibliográfica, é importante observar a diferença entre jogar (gaming) e brincar/jogar (playing)

24

, a fim de se compreender melhor a gami-

ficação. Como se trata de elementos dos games, ou seja, ludus, o seu enfoque está mais no estabelecimento de regras para se atingir determinados comportamentos, sejam eles lúdicos ou não.

22 A partir da página do GSummit, é possível ter acesso a uma comunidade de pessoas notáveis, proje-

tos, cases e organizações relacionadas à Gamificação. Disponível em: http://www.gamification.co/. Acesso em: 03 out. 2013. 23 Disponível em: http://gamification-research.org/. Acesso em: 03 out. 2013. 24 Há um artigo bastante pertinente sobre o tema: “Playing and Gaming”, de Bo Kampmann Walther, no site da revistacientífica Game Studies – The InternationalJournalof Computer Game Research. Disponível em: http://www.gamestudies.org/0301/walther/. Acesso em: 05 out. 2013.

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projetos e publicações, além do compartilhamento de bibliografia, conteúdos do blog


Enquanto o termo playing está relacionado a jogar e brincar de forma livre, divertida e de improviso, reconhecido por Caillois (1958) como paidia, ou seja, que se ludus, ou seja, ao jogo com regras bem organizadas e definidas e com objetivos determinados. Para Callois, há essa distinção antagônica entre paidia e ludus, porém, entendemos que, mesmo em ludus, a atividade de jogar (gaming) deve ser voluntária, para a

separada (no tempo e no espaço), incerta, improdutiva, governada por regras, fictícia (faz de conta).” (CALLOIS, 1961, p.10-11). Huizinga (1938), em seu livro Homo Ludens, também explicita essa relação de liberdade do sujeito para executar o jogo como (...) uma atividade livre, conscientemente tomada como ‘não-séria’ e exterior à vida habitual, mas ao mesmo tempo capaz de absorver o jogador de maneira intensa e total. É uma atividade desligada de todo e qualquer interesse material, com a qual não se pode obter qualquer lucro, praticada dentro dos limites espaciais e temporais próprios, segundo uma ordem e certas regras. Promove a formação de grupos sociais com tendência a rodearem-se de segredos e a sublinharem sua diferença em relação ao resto do mundo por meio de disfarces ou outros meios semelhantes. (HUIZINGA, 1950, p.13).

E, ainda, para definir a atividade de jogar (gaming), Salen & Zimmerman (2003, p. 96) afirmam que “um jogo é um sistema no qual jogadores engajam-se em um conflito artificial, definido por regras, que resultam em um resultado quantificável”. Dessa forma, os autores Callois, Huizinga, Salen & Zimmerman fazem uma abordagem ludologista para definir o conceito de jogo (ludus), com regras bem definidas e metas atingíveis. No entanto, eles descrevem o jogo completo e não a gamificação. O que importa, em ambos os casos, é o gameful design, ou seja, o desenvolvimento de uma mecânica de jogos para atingir metas, experimentar diferentes estratégias e assumir novos desafios. A palavra gameful é recente e foi cunhada pela desenvolvedora de jogos Jane Mcgonigal25 para se referir ao processo de transferir as qualidades dos jogos a outros contextos, como um complemento para as atividades playful, ou seja, qualquer atividade de interação lúdica que proporcione diversão, entretenimento e engajamento ao usuário ou “jogador”.

25 Jane Mcgonigal. Disponível em: http://janemcgonigal.com/. Acesso em: 05 out. 2013.

4 - n . 2 - v. 2

usuário ou jogador. “[O jogo] é uma atividade que é essencialmente: livre (voluntária),

ano

adesão ou não das regras, dependendo da forma como se estabelece o engajamento do

Revista GEMI n IS |

remete às brincadeiras livres e menos organizadas, o termo gaming está relacionado ao

97


Na Figura 2, Deterting et al. (2011) descrevem a relação entre jogar e brincar e entre game e brinquedo, evidenciando os polos antagônicos propostos por Callois. O a toy/playing/brincar (paidia). Enquanto os Serious Games26 (Jogos Sérios) são completos, a gamificação faz uso apenas dos elementos dos games. Em relação ao polo oposto, há to, os elementos gameful, que subentendem certo grau de jogabilidade, podem influenciar os comportamentos playful, ou seja, voltados aos aspectos lúdicos. Figura 2 - Diferença entre Game e Play. Proximidades conceituais entre Serious Game, Playful Interaction e Gamification. (DETERTING, 2011).

abordagem e construção conceitual para aplicativosem

uma alusão às interações lúdicas, não associadas aos games necessariamente. No entan-

G amificação:

campo superior da figura está relacionado a game/gaming/jogar (ludus) e o campo inferior

98

TV D igital Interativa •

O termo gamificação apresenta três importantes elementos, são eles: (1) game elements (elementos de games); (2) game design techniques (técnicas do design de games) e, por último, (3) non-game context (contexto de não jogo). Segundo Kevin & Werbach (2012), para implementar um sistema básico de gamificação, é preciso entender como funcionam os elementos mais comuns, provenientes do games, e como podemos aplicá26 Serious Games, ou Jogos Sérios são games desenvolvidos para um propósito primário diferente de puro entretenimento, como simulações de eventos do mundo real para solucionar problemas. O adjetivo “sério” é utilizado para designar os seus contextos de aplicação, em setores como, defesa, educação, exploração científica, serviços de saúde, gestão de emergência, planejamento urbano, engenharia, religião e política. (Traduzido e adaptado da Wikipedia). Disponível em: http://en.wikipedia.org/wiki/Serious_game. Acesso em: 10 out. 2013.

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4 Conceitos-chaves para a definição de Gamificação


-los em diversos contextos. Em relação aos elementos de games, a maioria dos sistemas de gamificação comas (bagdes) e rankings (leaderboards). Utilizamos como exemplo, o programa canadense Degrassi, sincronizado com a plataforma MuchCloser, que faz uso do sistema (PBL),para fidelizar a participação dos seus telespectadores, como descritos na Figura 3, a seguir:

ma Degrassi, pode conferir também os pontos relativos ao seu desempenho em outras atividades oferecidas pelo programa, através de emblemas que sinalizam as missões, as quais o telespectador vai conquistando, gradativamente, até a realização completa da tarefa. Figura 4 - Sistema de Recompensas (Rewards). Disponível em: http://www.muchmusic.com/muchcloser/. Acesso em: 05 nov. 2013.

4 - n . 2 - v. 2

O telespectador, além de verificar o total dos seus pontos referentes ao progra-

ano

Figura 3 - Points (pontos) e badges (emblemas) no sistema de Tríade PBL. Disponível em: http://www.muchmusic.com/muchcloser/. Acesso em: 05 nov. 2013.

Revista GEMI n IS |

meça basicamente com “A Tríade PBL” (The PBL Triad), ou seja, os pontos (points), emble-

99


O Sistema de Recompensas (Figura 4) faz parte da mecânica do jogo e é resultante dos elementos do sistema PBL, tais como: (1) os pontos (points), que mantém o plaso, levando-o a adquirir suas recompensas, além de mostrar suas recentes realizações (achievements); (2) os emblemas (badges), que mostram essas realizações e podem transrankings (leaderboards), que mostram a pontuação de outros participantes, funcionando como um feedback sobre a concorrência, como mostra na (Figura 5), a seguir. Figura 5 - Ranking (Leaderbord) no sistema de Tríade PBL.Disponível em: http://www.muchmusic.com/muchcloser/. Acesso em: 05 nov. 2013.

TV D igital Interativa

Algumas técnicas empregadas nos games podem ser utilizadas para serem

abordagem e construção conceitual para aplicativosem

mitir um estilo, uma credencial, um símbolo de status ou algum sinal importante; (3) os

G amificação:

car, fornecem feedback, determinam o status do telespectador e exibem o seu progres-

100

em objetivos a serem alcançadosde forma divertida. Em palestras realizadas no TED Talks, Priebatsch (2010) e Chatfield (2010)27 , apresentam algumas técnicas do game design que contribuem para que isso seja significativo para o usuário: (1) a progressão dinâmica por meio de pistas visuais, medindo o progresso e a experiência do usuário; (2) rápido feedback visualizado na dinâmica de progressão; (3) metas e tarefas alcançáveis, de longo e curto prazo; (4) recompensas e símbolos de status sociais, conseguidos através do esforço e conclusão do trabalho que geram motivação para a continuidade da tarefa; (5) dinâmica de participação, envolvimento e de retorno ao

27 PRIEBATSCH, Seth (TED Talk, 2010). The game layer on top of the world. Disponível em: http://www.ted.com/ talks/seth_priebatsch_the_game_layer_on_top_of_the_world.html. Acesso em: 05 out. 2013. CHATFIELD, Tom (TED Talk, 2010). 7 ways games reward the brain. Disponível em:http://www.ted.com/talks/tom_ chatfield_7_ways_games_reward_the_brain.html. Acesso em 05 out. 2013.

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aplicadas em qualquer área e permitem que as tarefas da vida real transformem-se


jogo; (6) elemento de incerteza, em relação aos tipos de recompensas; (7) colaboração e envolvimento com outros usuários. apropriados ao contexto de “não jogo”, é preciso considerar o funcionamento da mecânica e dinâmica do jogo. A mecânica de jogo diz respeito ao uso dos componentes ou elementos de games, associada às regras e técnicas que mobilizam o “jogador”, em um

das tarefas a serem desempenhadas, seguida da gratificação pelo objetivo alcançado, tais como recompensas (rewards), reconhecimento (status), realização (achievement), autoexpressão (self-expression), competição (competition) e altruísmo (altruism).

O terceiro e último conceito que caracteriza a gamificação é o “non-game

context”, ou contexto de não jogo. Nesse aspecto, o desafio principal é utilizar os elementos que figuram dentro do universo do jogo e aplicá-los em situações do mundo real, a fim de se criar novas experiências, com resultados mensuráveis para o usuário.

Os elementos do design de jogos são criados, geralmente, com a finalidade

de entretenimento. No entanto, Deterting et al. (2011), considera que esses elementos não têm essa única funcionalidade em sistemas de gamificação, indo além do puro entretenimento, sendo também usados com outros objetivos específicos e para melhorar outras aplicações já existentes.

Together with serious games, gamification uses games for other purposes than their normal expected use for entertainment (asserting that entertainment constitutes the prevalent expected use of games). We recommend not limiting the term gamification to specific usage contexts, purposes, or scenarios, while noting that joy of use, engagement, or more generally improving the user experience currently serve as popular usage contexts. (DETERTING, et al., 2011, p.3).28

A gamificação tem estreita relação com o entretenimento, porém não se limita apenas a esse contexto. Não seria interessante a restrição do conceito do termo, nem mesmo a utilização do conceito, em um sentido amplo e genérico, considerando-se que há inúmeras variações quanto ao seu uso, intenções, contextos ou mídias de aplicação. A ideia é utilizar, de forma apropriada, os elementos gameful, a serviço, por exemplo, da educação, finanças, saúde, comunicação, entre outros. Dessa forma, é defendida aqui a 28 Juntamente com os jogos sérios, a gamificação utiliza os games para outros fins que não a sua utilização normal esperada para o entretenimento (afirmando que o entretenimento constitui-se como uso predominante e esperado dos jogos). Recomendamos não limitar o termo gamificação para contextos específicos de utilização, propósitos ou cenários, embora salientando que a alegria do uso, engajamento, ou mais geralmente melhorar a experiência do usuário atualmente servem como contextos de uso popular. (tradução nossa).

4 - n . 2 - v. 2

des que geram motivação nas pessoas, por meio de uma narrativa persuasiva acerca

ano

ambiente altamente motivacional. A dinâmica do jogo é a identificação das necessida-

Revista GEMI n IS |

Para se criar experiências de engajamento, através de elementos de games,

101


necessidade de se utilizar o conceito-base da gamificação para a construção de um novo conceito, que seja útil e facilmente identificável em um contexto non-game.

tencial para contribuir para os processos de inovação e pesquisas no ambiente da televisão digital. Freeman (1986) destaca que “inovação é o processo que inclui as atividades técnicas, concepção, desenvolvimento, gestão e que resulta na comercialização de novos (ou melhorados) produtos, ou na primeira utilização de novos (ou melhorados) processos”. A televisão digital interativa é um exemplo de inovação, na medida em que se distancia dos padrões anteriores e se aproxima das novas ideias, métodos e objetos, ampliando as possibilidades de experimentação de conteúdos em um ambiente multiplataforma e de convergência. A mecânica de jogos contribui para agregar valor ao entretenimento televisivo, principalmente para o edutretenimento, pois traz embutida a linguagem dos games, muito comum, principalmente, para os jovens, que estão cada vez mais inseridos no sidade de se compreender o jogo para além do entretenimento estrito, como ferramenta dialógica presente em diversas relações sociais. A gamificação tem sido utilizada como alternativa para as abordagens tradicionais, sobretudo no que se refere à mudança de comportamentos, à familiarização com as novas tecnologias e à melhoria dos processos de aprendizagem, além do desenvol-

processos de inovação. Os conteúdos educativos interativos para a televisão digital podem ser acessados a partir da camada de software, conhecida como middleware, Ginga ou a partir da internet, em dispositivos móveis e de segunda tela. Essa convergência das Tecnologias da Televisão, Ciências da Computação e Internet, é definida por Lytras (2002) e Aarraniemi-Jokipelto (documento eletrônico), como T-learning, pois favorece as oportunidades de aprendizagem devido à utilização de mais de uma mídia. Assim sendo, o T-learning pode agregar os elementos, a mecânica e a dinâmica dos jogos digitais, objetivando a educação por métodos de entretenimento, mais conhecido como Edutretenimento definida por Walldén (2004) como “programas que utilizam diversas mídias para incorporar mensagens educativas em formatos de entre-

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digitais emergentes, como a TVDI, a gamificação pode contribuir efetivamente para os

vimento das habilidades pessoais. Se combinada com outras tendências e tecnologias

TV D igital Interativa

contexto das mídias e das tecnologias digitais. Huizinga (1938) já preconizava a neces-

abordagem e construção conceitual para aplicativosem

A indústria de conteúdos digitais, em específico a indústria de games, tem po-

G amificação:

5 O conceito de gamificação para a TVDI

102


tenimento, ou seja, educam com métodos de entretenimento”. A partir do conceito-base da Gamificação, que vem a ser “o uso de elementos amplo e genérico e não traz no bojo de sua definição, as suas principais características e possibilidades de aplicação em dado contexto. Para a construção de um novo conceito, que seja útil e facilmente identificável

-se à essência do objeto; (2) não ser circular; (3) ser afirmativa; (4) ser clara e objetiva. Desta forma, é proposta no quadro, abaixo, uma definição da relação gamificação-TVDI: Gamificação-TVDI: é o uso da mecânica de jogos e técnicas do design de games em contexto de não jogos a fim de envolver e engajar os usuários para a mudança de comportamento, visando à participação e à interação, frente à oferta de conteúdos interativos, de programas de entretenimento informativo ou educativo que tem por plataforma a TV Digital Interativa. Tem por características principais: • Opções de escolha e participação voluntária; • Engajamento do telespectador; • Sistema de fidelização da audiência; • Solução interativa para aumentar as possibilidades de aprendizagem no ambiente da televisão; • Agregação de pontos, níveis, emblemas, rankings e recompensas, na interação do telespectador com os aplicativos e conteúdos televisivos; • Permitir a interação e a competitividade de jogo, a partir das plataformas sociais; • Aplicação conjunta em múltiplas plataformas, em mídia primária (TV) e mídias secundárias (dispositivos móveis, como os smartphones e tablets); • Rápido ciclo de feedback relacionado ao desempenho, a fim de melhorar a experiência do usuário; • Incorporação da narrativa como contexto dos objetivos, de forma convincente para envolver os telespectadores à participação e alcance das metas; • Incentivo à progressão; • Objetivos claros e regras bem definidas; • Atividades desafiadoras e alcançáveis; • Atrair o público consumidor de mídias digitais; • Linguagem e estética visual dos elementos dos games; • Entretenimento televisivo mais lúdico, divertido e participativo;

4 - n . 2 - v. 2

para construir a definição de um verbete que atenda os seguintes princípios: (1) referir-

ano

no contexto non-game da TVDI, é utilizada a metodologia proposta por Hegenberg (1974),

Revista GEMI n IS |

do design de games em contextos de não jogo”, verificamos que o mesmo é bastante

103


6 Considerações finais

de aplicações e não está restrito apenas para o uso esperado de entretenimento. Segundo Deterting et al. (2011), não é aconselhável limitar o termo, tendo em vista os vários lidade de contribuir para os processos de inovação e pesquisa, a partir das tecnologias digitais dos games, toma-se, nesse trabalho, o conceito-base de gamificação como ponto de partida para o desenvolvimento de um verbete (Gamificação-TVDI) com definição e características próprias, voltadas para o contexto da TVDI. Tendo em vista a utilização do termo, no desenvolvimento da pesquisa em andamento no Programa de Pós-graduação em TV Digital: Informação e Conhecimento da UNESP e visando o desenvolvimento de conteúdos e aplicativos interativos educativos baseados em Gamificação, justifica-se a necessidade dessa abordagem e construção conceitual, com base nos princípios descritos por Hegenberg (1974), a fim de explicitar a descrição do processo de pesquisa nessa área, podendo, pois, servir de base para futuros estudos que se utilizem da mecânica de jogos como objeto de pesquisa em Televisão Digital Interativa.

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TV D igital Interativa

Referências

abordagem e construção conceitual para aplicativosem

contextos específicos de uso, propósitos ou cenários distintos. Dessa forma, com a fina-

G amificação:

O conceito de gamificação, além de novo e promissor, apresenta uma difusão

104


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ano

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Revista GEMI n IS |

FREEMAN, Christopher. Economics of Industrial Innovation. Cambridge, MIT, 1986.


Integraciones entre lo Físico y lo D igital en la Estética de las N uevas Tecnologías A lejandro Lozano Muñoz Estudiante de Doctorado en Filosofía por la Universidad de Salamanca. Máster en Filosofía y Licenciado en Filosofía por la Universidad de Salamanca. Especialidad en Estética y Teoría de las Artes. Co-Fundador de Imalogo, plataforma 2.0 para el pensamiento y la formación en imágenes. E-Mail: Alejandro.lm1804@gmail.com

Revista GEMI n IS

ano

4 - n . 2 v. 2 | p. 106 - 124


Resumen El presente artículo analiza las relaciones entre lo físico y lo digital tal y como se dan en la estética de las nuevas tecnologías. A partir de prácticas artísticas realizadas en los últimos años, así como de innovaciones recientes en la tecnología de consumo, pueden constatarse transformaciones estéticas que apuntan a una integración de lo material y lo electrónico. Dado que las características de los nuevos dispositivos como smartphones y tabletas piden una revisión del lenguaje teórico-filosófico empleado, proponemos de manera provisional el término “realidad integrada” para referirnos a este espacio híbrido que plantea un continuo entre estos dos entornos. Palabras clave: estética; nuevas tecnologías; realidad; híbridos; sociedad.

Abstract The following paper analyzes the relationship between the physical and the digital, focusing in the aesthetic of new technologies. We study recent artworks and the latest innovations in consumer technology in order to show aesthetical transformations which indicate integration between the material and the electronic. The features of new devices such as smartphones or tablets demand a revision of the theoretical language. We propose the term “integrated reality” to refer to a hybrid space which poses a continuum between these two environments. Keywords: aesthetic; new technologies; reality hybrids; society.


1 Introducción

L

a velocidad con que se implementan innovaciones tecnológicas en productos que utilizamos a diario conlleva implicaciones filosóficas que es necesario investigar. Factores como la conectividad online en pequeños dispositivos móviles o

aplicaciones que interactúan en tiempo real con el entorno que rodea al usuario suponen cambios en la experiencia de uso de estas herramientas. En este sentido, parece legítimo estudiar las transformaciones estéticas que están teniendo lugar. Prácticas artísticas recientes realizadas con nuevos medios y el uso que distintos grupos sociales dan a sus dispositivos muestran que se está produciendo una integración de los entornos físico y digital, en el sentido de que hay continuidad entre las actividades online y lo que se hace en lugares físicos. A lo largo de las líneas siguientes mostraremos algunas de las iniciativas y estrategias más interesantes que están surgiendo en este espacio híbrido. Hemos dividido el texto en dos grandes bloques. En primer lugar profundizaremos en la estética de la realidad aumentada, un tipo de imagen digital presente tanto en el ámbito doméstico como en el artístico. Comenzaremos señalando una serie de prácticas de actualidad valiosas por su carácter anticipador y crítico. A continuación opondremos la estética de la realidad virtual, estudiada exhaustivamente por autores como Manovich, a la estética de la realidad aumentada, señalando cambios significativos a nivel icónico y cognitivo. Estas transformaciones nos ponen en la necesidad de revisar los modelos empleados para pensar las relaciones entre entornos electrónicos y espacio físico. En el segundo bloque abordaremos prácticas sociales basadas en esta concepción híbrida del espacio, que no separa lo que se hace en las redes digitales de lo que sucede en la esfera pública. La banda ancha y la creciente necesidad de tener un sitio online ha transformado la dinámica de trabajo de jóvenes artistas y empresarios. El entramado de anuncios en redes sociales sobre conciertos, exposiciones y otros eventos es ya inseparable de las actividades que tienen lugar en la calle, sean establecimientos privados o lugares públicos, por lo que podría hablarse de una digitalización de los


acontecimientos. Es también conocida la relación entre la actividad en redes como Facebook o Twitter y algunos movimientos sociales recientes. Aunque hay polémica estos colectivos, parece claro que se han tenido en cuenta como herramientas de apoyo en la configuración de espacios de acción ciudadana.

aumentada Desde hace varios años la realidad aumentada goza de una gran popularidad. Se utiliza en arte, libros y aplicaciones móviles. Su inclusión en prototipos de nuevos dispositivos electrónicos apunta a una entrada progresiva en el mercado de consumo, y es posible que terminen convirtiéndose en un estándar como lo son las pantallas táctiles en la actualidad. Centrándonos en el momento presente, el interés por la realidad aumentada merece nuestra atención porque la estética de este tipo de imagen digital es muy diferente de la de la realidad virtual y el ciberespacio, modelos icónicos y metafóricos centrales para las nuevas tecnologías hasta la década de los 90. La realidad aumentada superpone imágenes digitales que muestran datos en tiempo real acerca del mundo, aunque también pueden usarse para ver a través de una pantalla imágenes en movimiento. Por ejemplo, algunas páginas del libro de arte del videojuego Journey tienen iconos que una aplicación móvil puede reconocer para mostrar en la tableta o el teléfono los primeros modelos en 3D del juego, algo que no logra el papel y que enriquece significativamente el contenido del libro. Las posibilidades de combinar imágenes digitales con espacios físicos no se han escapado a los artistas de los nuevos medios, entre los que se ha popularizado el grupo Nueva Estética, cuyas prácticas consisten en combinar aspectos propios de la estética digital (pixelado, mapas interactivos) con imágenes del mundo físico. James Bridle, figura visible del grupo, se centra en la transformación de la percepción a raíz de los enfoques que posibilitan las nuevas tecnologías. Para él, “nuevas formas de ver (/pensar) producen, si no nuevos mundos, sí nuevas sensaciones que son el medio para comprender un nuevo mundo” (2012). Su texto va acompañado de imágenes en perspectiva cenital o collages, por ejemplo uno en el que una fotografía urbana va acompañada de un pequeño recuadro que muestra la vista desde Google Maps. En 2012 Bruce Sterling dedicó una entrada extensa en su blog de Wired a la “Nueva Estética”. Para él las prácticas del grupo muestran la emergencia de lo digital en lo

4 - n . 2 - v. 2

2.1. De sombras aumentadas y robocops domésticos. El furor por la realidad

ano

2 Poblando de datos el espacio físico. La estética de la realidad aumentada

Revista GEMI n IS |

sobre el grado de relevancia que han tenido las redes digitales en la organización de

109


físico. Compartiendo el enfoque de Bridle, dice que su trabajo “se ve más o menos como una Weltanschauung”. Aunque estas palabras son elogiosas, Sterling también “la Nueva Estética es un movimiento estético genuino con una metafísica débil”. Si quieren transformar la manera de percibir el mundo necesitan ir más allá de la “caza de o la mirada de las máquinas. La clave es que “la Nueva Estética está intentando hackear Aparte del grupo Nueva Estética, la serie Talk to me del MoMA, que reúne

Físico

una estética moderna en lugar de pensar y trabajar para crear una”.

entre lo

glitches”, además de superar las metáforas relacionadas con el pensamiento, la memoria

Integraciones

realiza una valoración crítica centrándose en el planteamiento del grupo. Afirma que

110

trabajos sobre comunicación y nuevos medios, incluye varias prácticas que utilizan

y lo

la realidad aumentada. Algunas integran la participación en directo del usuario con

D igital

soportes que reproducen simultáneamente imágenes digitales y físicas. Es el caso

sombra natural producida por el cubo se complementa con las sombras digitales que y lo digital. Otra práctica incluida en la serie del MoMA es Augmented (hyper)Reality: protagonizado por un “robocop doméstico” que comienza con decenas de logotipos y voces llenando la pantalla. Con un gesto similar al que se hace cuando se baja el volumen, el protagonista atenúa la oleada publicitaria y se prepara un té. La taza, la jarra de agua y el resto de utensilios despliegan menús informativos cuando se los

Si no se establecen buenos objetivos y usos, la realidad aumentada puede generar un indeseable caos informativo que no aporte nada. Los teléfonos inteligentes cuentan ya con aplicaciones de realidad aumentada funcionales. Una de las más famosas es Layar, que puede agregar varias capas de información, como tweets cercanos o restaurantes próximos. En uno de sus videos promocionales los creadores la presentan como una aplicación que permite al usuario “crear su propio mundo”, aunque siempre dentro de la pantalla del smartphone. Aparte de Layar y otros programas que podríamos denominar de navegación aumentada hay otros que utilizan mapas online para convertir la ciudad en campo de juego. PacManhattan, realizado en 2004, fue de los primeros1. Llevado a cabo por estudiantes de la Universidad de Nueva York, utilizaba una zona de Manhattan en la que una 1 http://pacmanhattan.com/about.php

A lejandro Lozano Muñoz

El trabajo crítico de Matsuda apunta al lado menos amable de las nuevas tecnologías.

utiliza, aunque el sistema no es perfecto y de vez en cuando aparecen fallos gráficos.

Nuevas Tecnologías

Domestic Robocop (2010), de Keiichi Matsuda. Se trata de un video en primera persona

de las

proyecta el panel al detectar el movimiento, acentuándose la integración entre lo físico

Estética

sensores que se desplaza sobre un panel iluminado que reacciona al movimiento. La

en la

de Augmented shadow (2010) de Joon Y. Moon, que consiste en un pequeño cubo con


persona disfrazada de Pac-Man y con un teléfono recorría las calles para conseguir “puntos” que quedaban registrados en un servidor. Más reciente es Ingress, un juego de PacManhattan, ya que se les señala a los jugadores puntos específicos de la ciudad que deben escanear con sus teléfonos. Hay una larga lista de trabajos en los que se practica el traslado de píxeles y

suelen tener las cámaras de juegos de acción en tercera persona. La imagen incorpora la típica deformación en los bordes de esta clase de títulos, además de un filtro de desenfoque o motion blur muy utilizado en la actualidad. Lo llamativo es que, según el texto explicativo, la persona que se mueve no ve a través de sus ojos, sino que lleva un caso que transmite en streaming lo que registra la cámara acoplada a su espalda. En lugar de jugar en una realidad virtual, Avatar machine explora lo que Owens denomina “vida real en tercera persona”2. Sin llegar al extremo de la ubicuidad, este trabajo sirve para plantear el tema de las transformaciones que provocan las nuevas tecnologías no sólo en la percepción del espacio, sino también en la percepción del propio sujeto situado físicamente en un lugar. 2.2 Un modelo integrador para una realidad integrada Podríamos continuar añadiendo casos, pero conviene hacer algunas indicaciones generales sobre la estética de la realidad aumentada. Es especialmente interesante compararla con la estética de la realidad virtual tal y como la estudió Manovich en su libro El lenguaje de los nuevos medios de comunicación (2001). La estética de la realidad virtual ha dominado las nuevas tecnologías hasta la popularización reciente de otros sistemas de imagen digital. En 1995 Derrick de Kerckhove escribía que “si alguna vez hubo una dirección definida y más teleológica que fortuita en la dirección del desarrollo de las tecnologías electrónicas, la RV bien podría representar su síntesis actual” (1999, p. 117). Manovich (2005) conecta los entornos de realidad virtual con la tradición de la pantalla, cuyo rasgo característico es que separan dos espacios: el físico y el virtual (165). Pero a diferencia de seguir la corriente de las representaciones, de la que bebe la pintura figurativa, la realidad virtual habría nacido de una “tradición alternativa”, la de la simulación. Si la tendencia a la representación es propia, por ejemplo, de la pintura 2 Owens lo explica de la siguiente manera en la descripción del video colgado en Youtube: «The super wide camera mounted to the body harness is pointed at the user. The video is streamed live to a head mounted display worn by the user. The effect is real life in third person. This is genuinely the experience that the user would have».

4 - n . 2 - v. 2

por Marc Owens en 2008. Se trata de una grabación que adopta el punto de vista que

ano

polígonos al espacio físico. Uno de los más interesantes es Avatar machine, realizado

Revista GEMI n IS |

2012 apoyado por Google. Aunque todavía está en beta cerrada, la idea es parecida a

111


renacentista, la búsqueda de simulación es lo que caracteriza a los frescos y los mosaicos: “El hecho de que el fresco y el mosaico estén “pegados” a su marco arquitectónico una pintura se puede poner en un entorno arbitrario y, por tanto, esa continuidad ya no se puede garantizar” (p. 166). De la tradición de la pantalla la realidad virtual toma la la máquina, o bien dentro del espacio en el que se produce la experiencia de inmersión. moverse dentro de los límites de la instalación.

no hay conexión entre los dos espacios o, al revés, los dos coinciden por completo. En

que Couchot extiende a la imagen digital en su conjunto debido a su “translocalidad”: lugar o soporte –fijo o móvil-, la imagen digital (en su forma electrónica) no aparece mantiene ilocalizable y relocalizable” (Couchot, 1997, p. 81). Resulta especialmente llamativo que pese a la ausencia de conexiones entre imagen digital y espacio físico, muchas realidades virtuales simulen entornos urbanos o naturales. Continuando con el análisis de Couchot, se trata de un fenómeno vinculado al entorno virtual en tanto

matemáticos- directa y frecuentemente basados en la realidad misma. Estos modelos son interpretaciones formalizadas de lo real” (82). En ficciones como eXistenZ o Matrix este recurso ha servido para plantear las consabidas preguntas acerca de cómo saber lo que es real y lo que es virtual en una recuperación del problema de la vigilia y el sueño. Manovich defiende una postura fuerte a la hora de distinguir simulación de representación. Para él, la escultura de Los burgueses de Calais (1884) de Rodin no es una reproducción en piedra de ciudadanos medievales: “Pensamos en esas esculturas como algo que forma parte del humanismo posrenacentista, que sitúa al hombre en el centro del universo, cuando en realidad se trata de extraterrestres, de agujeros negros que unifican nuestro mundo con otro universo” (p. 166). Esta ambigüedad quizá pueda explicarse porque al adoptar el modelo de la realidad virtual se producen dificultades a la hora de situarse en la compleja red de

A lejandro Lozano Muñoz

[…] La simulación se inspira en unos modelos lógicos –además de algunos modelos

que simulación: “La simulación permite, efectivamente, acercarse y alejarse de lo real

Nuevas Tecnologías

asignada a un lugar exclusivamente reservado del que pueda escaparse, sino que se

de las

“Mientras que la imagen tradicional es un fenómeno localizado, siempre asociado a un

Estética

abandona” (166). La posibilidad de independizarse del espacio físico es una cualidad

en la

cualquiera de ambos casos, la realidad física no se tiene en cuenta: se la desecha y

D igital

el que Manovich llama la atención y que es significativo. Para él “en la realidad virtual

y lo

Hay un detalle interesante sobre las imágenes simuladas por ordenador sobre

Físico

Pero por otra parte, uno no tiene por qué estar completamente quieto, sino que puede

entre lo

idea de inmovilidad del usuario, que tiene que permanecer agarrado a los controles de

Integraciones

permite al artista crear una continuidad entre el espacio físico y el virtual. En cambio,

112


relaciones entre lo físico y lo digital. Es como si en las películas mencionadas o en el hiperrealismo de videojuegos que amenazan con salir de la pantalla del televisor de creaciones digitales que no tienen por qué imitar objetos y espacios físicos. La realidad aumentada parece apuntar en otra dirección. En lugar de desechar común al que cabe añadir algo o modificarlo. De lo que se trata en estos momentos es es crucial si queremos controlar el inmenso caudal de información en tiempo real para

Físico

producir un saber duradero y nuevo.

y lo

de determinar si esa información puede transformarse en conocimiento, y cómo. Esto

entre lo

la realidad física o imitarla se incorpora a ella. No plantea una oposición, sino un entorno

Integraciones

hubiese un déficit de realidad que hay que compensar de algún modo, cuando se tratan

113

artista multidisciplinar se está sirviendo de una aplicación para smartphone que usa

cambio climático, y son conocidas las visualizaciones que permiten ver el incremento durante años. Pero en caso de no disponer de ese material, podemos valernos de la que hace Shafer es tomar como referencia carteles que indican el lugar hasta el que se extendía el glaciar años atrás. En la actualidad su longitud ha disminuido, pero si llevamos instalada su aplicación podemos poner el teléfono delante de nosotros para ver el modelo de un glaciar en 3D que se superpone al paisaje del momento presente.

Nuevas Tecnologías

realidad aumentada para transformar información en tiempo real en conocimiento. Lo

de las

del agujero de la capa de ozono. Se han podido hacer gracias a datos recopilados

Estética

Alaska. A veces tenemos la suerte de contar con fotografías que muestran los efectos del

en la

la realidad aumentada con el fin de explicar los cambios que ha sufrido un glaciar de

D igital

Sobre esto nos puede servir de referencia el trabajo de Nathan Shafer (2011). Este

A lejandro Lozano Muñoz


Ilustración 1 - EXIT GLACIER Augmented Reality Terminus Project

114 Revista GEMI n IS | ano

4 - n . 2 - v. 2

Fuente: Shafer (2011)

La diferencia entre el conocimiento del cartel que indica dónde estaba la masa de hielo antes y la imagen digital que nos lo muestra en tiempo real es cualitativa, aunque los dos casos quieran explicar lo mismo. Si la observamos desde este enfoque, la realidad aumentada puede considerarse como un caso de estética cognitiva diferente del de la realidad virtual. Al menos, puede modificar nuestra percepción del espacio. Como dice Juan Martín Prada (2012), se podría afirmar que, a lo largo de la última década, se ha problematizado intensamente el concepto de “espacio” resaltando su hibridez entre lo tangible del ámbito físico y lo intangible de las capas de datos añadidas a él […] Es más que probable que el modelo espacial predominante en el futuro se fundamente en espacios sensibles, reactivos agentes de acogida del habitante al que acompañaran en todo momento […] Del reaccionar del sujeto ante el ambiente a la reacción de éste frente a aquél, como un nuevo modo de configurar otra identidad espacial, otra forma de experiencia del lugar (p. 223).

La realidad aumentada, de nombre quizá tan desafortunado como la realidad virtual, es únicamente un modelo diferente al que dominó en décadas anteriores. No


se trata de la respuesta definitiva a los interrogantes que han planteado las nuevas tecnologías a propósito de la relación entre humano y máquina, físico y digital. Sin y la posición del sujeto en él. La variante social y política de esta integración de digital y material se encuentra en la estrecha conexión que han tenido las redes digitales y los

3.1. La digitalización de los acontecimientos

Físico

3 Geolocalización móvil y espacios híbridos

entre lo

espacios públicos físicos en los últimos movimientos sociales.

Integraciones

embargo, su estética apunta a una transformación en la manera de concebir el espacio

115

y lo

para su uso en contextos de gran movilidad. Además de la posibilidad de conectarse

Google Maps o Maps de Apple. Esta triple relación entre movilidad, conectividad y digital. Se trata de un proceso complejo que opera en diversos planos, como el artístico

La conectividad a Internet y el trabajo en la nube están transformando la

forma de trabajar en ámbitos como el musical. El estudio antropológico Jóvenes, culturas urbanas y redes digitales (2012) realizó una serie de entrevistas y cuestionarios a un grupo de jóvenes madrileños y mexicanos de entre 20 y 35 años. El objetivo era tomar el pulso a

de tecnologías digitales es clave para la forma de trabajo de los entrevistados. Uno de los estudios madrileños dedicados a jóvenes músicos señala cómo discos físicos y conciertos han intercambiado los papeles debido a factores como la distribución digital o la variedad de la oferta: En el viejo modelo, los conciertos eran actividades promocionales para lograr vender más discos. Ahora, a la vista de que las ventas de soportes son en muchos casos insignificantes, el disco es un fetiche que proclama la fidelidad a un grupo o un artista (Fouce, 2012, p. 174).

El estudio también se detiene en cómo conciben los entrevistados un concierto. 3 En el caso mexicano los autores afirman que «poco más de la mitad de los jóvenes mexicanos (58’6%) está recibiendo educación media superior», aunque indican que «los jóvenes con menos recursos económicos también están familiarizados con tecnologías digitales a través de los cibercafés, la escuela y la sociabilidad generacional. Quienes dicen que saben usar los medios informáticos son más del doble de los que tienen» (García Canclini, 2012: 7-8).

A lejandro Lozano Muñoz

aunque la muestra no representa al total del conjunto de la juventud3. La presencia

las estrategias que iniciaban las nuevas generaciones de artistas, empresarios y editores,

Nuevas Tecnologías

y el social.

de las

mapeado está dando lugar a una estética que replantea las relaciones entre lo físico y lo

Estética

localización y cuentan con numerosas aplicaciones basadas en servicios de mapas como

en la

de manera inalámbrica mediante WiFi o Bluetooth, algunos incorporan sistemas de

D igital

En el momento actual hay numerosos dispositivos electrónicos diseñados


Hay afirmaciones muy interesantes, como que el directo, “más allá de su función económica, es el espacio en el que los músicos ponen en juego sus habilidades, oyentes consultados dicen que “los conciertos molan aunque no te guste la música”, que a veces “es más el ambiente que hay” que lo que toca el grupo. Sin profundizar en la idea del gran estadio como centro de reunión social masiva, lo cierto es que la presencia

otros anteriores como cámaras compactas, sino del hecho de que los aparatos que ahora capturan imágenes suelen estar conectados a Internet, bien para publicar la fotografía al instante en las redes sociales, bien para emitir un streaming de baja calidad. No es nuevo recibir la llamada de un amigo en la que sólo suena el ruido enlatado del concierto de fondo, pero sí lo es ver un goteo de tweets con comentarios e imágenes antes de que el grupo salga a escena o durante la misma actuación. A veces, si el usuario lo permite, esos comentarios van acompañados de la ubicación física del evento, que podemos consultar en los servicios de mapas online. En este sentido podríamos hablar de una digitalización de los acontecimientos. Se trata de un fenómeno híbrido, en el que la presencia física de personas que se han desplazado a congresos o teatros se comparte digitalmente mediante texto y contenido audiovisual, completando la experiencia. La difusión online de las actividades en espacios físicos se ha convertido en un elemento fundamental del éxito para los jóvenes músicos: Al haberse convertido los conciertos en piedra angular el negocio musical, los grupos necesitan de una plétora de fans dispuestos a moverse para llenar salas en diferentes lugares […] Se necesita mantener perfiles en redes sociales como Tuenti o Facebook, espacios en los que interactuar con el público, responder a sus demandas y cuestiones: “Antes la música guiaba a la gente, ahora la gente guía a la música”, resume la bloguera Elena Macías (Fouce, 2012, p. 180).

Al igual que sucede con el cuerpo, el smartphone y otros dispositivos comunican lo que pasa en los espacios físicos en los que se llevan a cabo las actividades. Es un fenómeno distinto de las ciber quedadas o de las reuniones en entornos virtuales del tipo de los juegos de rol multijugador masivo online (MMORPG) como World of Warcraft (Blizzard Entertaiment, 2004). En la misma dinámica se sitúan las conocidas como flashmobs, que consisten en reuniones en lugares físicos organizadas a través de redes sociales y listas de correo electrónico. Las convocatorias, que duran apenas unos minutos, agrupan a personas para realizar coreografías o juegos previamente ensayados que luego ejecutan en la calle.

4 - n . 2 - v. 2

una imagen inédita hasta 2007. No se trata de la sustitución de nuevos dispositivos por

ano

de smartphones y tabletas con cámaras potentes sobre las manos del público forma

Revista GEMI n IS |

competencias y valores. Es el espacio de la autenticidad” (Fouce, 2012, p. 174). Los

116


Dentro de la variedad de estos eventos, las Augmented Reality Flash Mob organizadas por Sander Veenhof, Johannes la Poutre y Tobias Domhan a partir de 2010 tienen la 4

en el suelo papel inscrito con código QR, un patrón que el teléfono puede reconocer si lleva instalado el software apropiado. Los usuarios pueden ver a través de la pantalla integración entre la capacidad de movilización de las redes digitales y una tecnología En líneas generales, los gestos de la denominada Nueva Estética (inspirados

Físico

que utiliza como soporte una combinación de espacio físico e imagen digital.

entre lo

figuras tridimensionales de personajes como Superman o Darth Vader. Se trata de una

Integraciones

peculiaridad de servirse de sistemas de realidad aumentada. Lo que hacen es colocar

117

claramente en la estética pixelada de los videojuegos retro), las actividades con realidad

y lo

aumentada o convocatorias como las flashmobs componen un grupo de prácticas que

D igital

experimentan con las relaciones entre entornos físicos e imagen digital en términos

que se recupera tras el papel secundario que jugaba en el modelo de la realidad virtual.

el uso de redes sociales digitales como Facebook y Twitter y movimientos de protesta ciudadana acaecidos en los últimos años en varios países. Aunque por sí solas las redes digitales no desencadenan movimientos sociales (Gladwell, 2011), su integración en un

Manuel Castells realiza una aproximación teórica a las motivaciones y desencadenantes de los movimientos que han surgido en países como Túnez, Islandia, España o Estados Unidos. Uno de los temas centrales del texto es la hibridación entre los espacios digitales y físicos, en línea y en la calle. Al relatar el caso de los movimientos en Túnez, Castells afirma que “la conexión libre en Facebook, Youtube y Twitter y la ocupación del espacio urbano creó un espacio público híbrido de libertad” (40). Precisamente, una de las primeras acciones que llevó a cabo el gobierno egipcio para responder a las protestas en su país fue bloquear el acceso a Internet. Este gesto debe mantenernos alerta sobre la fragilidad de los espacios híbridos en los que se ejerce la libertad ciudadana de nuestros días, ya que las redes de comunicaciones están administradas por compañías cuyos intereses no tienen por qué coincidir con las iniciativas de sus usuarios. 4 http://www.moma.org/interactives/exhibitions/2011/talktome/objects/146407/

A lejandro Lozano Muñoz

actividades de reivindicación y denuncia. En su libro Redes de indignación y esperanza (2012),

complejo mayor de relaciones sociales ha contribuido a la difusión y organización de

Nuevas Tecnologías

Recientemente han surgido textos que establecen conexiones estrechas entre

de las

3.2. Espacios híbridos de acción ciudadana

Estética

resumida, la acción tiene lugar: no se produce un abandono del espacio material, sino

en la

integradores, produciendo imágenes híbridas del presente. Por decirlo en una fórmula


En páginas posteriores Castells (2012) continua diciendo que

de protesta exclusivamente electrónicas, que siguen operativas5. Las nuevas tecnologías ya no se conciben tanto como portales de acceso a espacios virtuales donde realizar la ciberdemocracia, sino que más bien funcionan como instrumentos para mejorar la única democracia disponible, que no circula por el ciberespacio. En este sentido se habría producido un enfriamiento de las expectativas puestas en las comunidades online. La posibilidad de una participación comunicativa abierta, directa y sin mediadores en la red ha sido desplazada por la “megalización” que las compañías más potentes han provocado en Internet. José Luis Brea ya identificó en 2004 los retos a los que se tenían que enfrentar estas iniciativas: Todo discurso o producción que escape a las corrientes principales, toda producción disensual, es segregado a las periferias y las zonas umbrías. La gran estrategia del capitalismo avanzado frente a Internet no ha sido la censura o el control minimizador del medio, sino su megalización para someterle la lógica implacable de la mass-mediatización. Los viejos intentos de construir la “comunidad de productores de medios” se enfrentan ahora a una disyuntiva que el título de una obra de Alexei Shulgin expresa a la perfección: “compra, vende… o permanece invisible” (Brea, 2004).

El resultado es que “las nacientes comunidades de “productores de medios” se transforman rápidamente en meras comunidades de “usuarios de medios”: ya no producen sus propios instrumentos de emisión, puesto que los alojamientos y acceso se ofrecen gratuitos desde los portales”. Sin embargo, los movimientos recientes muestran que aun trabajando en plataformas administradas por terceros es posible la disensión y una organización eficaz, aunque ésta ha de ir en paralelo a acciones en la calle. Por este motivo es precisamente más necesario el trabajo crítico que ponga de relieve las condiciones que se aceptan tácitamente cuando se accede a utilizar una de estas redes 5 Una de las últimas iniciativas de protesta electrónica de mayor envergadura fue la oleada de ataques de denegación de servicio iniciada por el colectivo Anonymous a principios de 2012 tras el cierre de Megaupload. Queda para otro trabajo el análisis de esta clase de grupos, cuya estética bien merece un estudio detenido.

4 - n . 2 - v. 2

físico para lograr sus objetivos. Se trata de una estrategia diferente a la de las acciones

ano

Los últimos movimientos sociales apuntan a una integración de lo digital y lo

Revista GEMI n IS |

La autonomía sólo se puede garantizar mediante la capacidad de organización en el espacio de libertad de las redes de comunicación, pero al mismo tiempo únicamente se puede ejercer como fuerza transformadora si se desafía el orden institucional disciplinario, recuperando el espacio de la ciudad para sus ciudadanos (p. 213).

118


digitales de gran visibilidad. Precisamente Prada señala que la intención principal de la mayoría de las prácticas artísticas centradas en las redes sociales dominantes consiste juegos de lenguaje y de las interacciones comunicativas y afectivas en general”, así como en determinar “cómo se lleva a cabo la apropiación económica de la comunicación y de Por otra parte, hay que valorar en su justa medida el papel de las nuevas para la organización, las redes digitales no suponen hitos sin parangón en la historia

Físico

de los movimientos sociales. Charles Tilly, en su obra de 2004 Los movimientos sociales

y lo

1768-2004 ampliada tras su fallecimiento por Lesley Wood, sitúa a redes como Facebook

D igital

tecnologías en las iniciativas ciudadanas. Sin negar que hayan incrementado las vías

entre lo

los deseos de cooperación” (Prada, 2012, p. 146).

Integraciones

en “tematizar las formas en las que se opera en estas redes la normalización de los

119

en el conjunto de medios de comunicación utilizados para la movilización a lo largo de

en la

la historia reciente:

futuro próximo, que los movimientos sociales se coordinen” (p. 206). Entre los contenidos que difunden estas nuevas tecnologías ciudadanas destacan imágenes y videos. Castells hace énfasis en que “el poder de las imágenes es primordial. You Tube ha sido probablemente una de las herramientas de movilización más poderosas en las primeras fases del movimiento. Especialmente significativas son las imágenes de represión violenta por parte de la policía o de matones a sueldo” (214). Aparte de Facebook, Twitter y Youtube, la plataforma Tumblr, cuyos usuarios la utilizan para subir imágenes, videos o textos breves, jugó un papel relevante en el movimiento Occupy Wall Street. El Tumblr “We are the 99%”6, que recibe su nombre del motivo de un 99% de la población que se enfrenta al 1% que toma las decisiones y se beneficia de 6 wearethe99percent.tumblr.com

A lejandro Lozano Muñoz

los canales de comunicación echa por tierra la fantasía de que Internet permitirá, en un

dato importante porque, como explica, “un rápido vistazo a la distribución mundial de

Nuevas Tecnologías

entre países en el número de conexiones de Internet y móvil (206-207). Se trata de un

de las

Tilly también aporta información desde el 2000 al 2006 que muestra la disparidad

Estética

Aunque Howard Rheingold y muchos otros entusiastas de la tecnología aseguran que estas tecnologías están cambiando totalmente la organización y la estrategia del movimiento social, es útil admitir que, desde el principio, los activistas del movimiento social han respondido a los medios de comunicación de masas. Ya hemos visto el impulso que, para los movimientos sociales, supuso el extraordinario incremento de los medios impresos durante los siglos XIX y XX antes de la aparición de Facebook. La radio y la televisión desempeñaron un papel similar durante el siglo XX (Tilly y Wood, 2009, p. 202).


la convulsión económica, fue un espacio común para integrantes o simpatizantes de Occupy en el que podían compartir vivencias de forma anónima:

joven bloguero que formó parte del personal de la campaña presidencial de Obama en 2008: Tumblr no ha servido para los fines de Occupy Wall Street, un movimiento difuso y sin líderes con un objetivo deliberadamente indefinido. Sin embargo, Tumblr ha humanizado el movimiento. Tumblr es un poderoso medio narrativo, y este movimiento trata de narraciones […] “We are the 99%” es lo más parecido al trabajo de la Farm Secutiry Administration –que pagó a periodistas gráficos para que documentaran la grave situación de los granjeros durante la gran depresión- (p. 172)8.

El carácter fuertemente emocional de los movimientos sociales, en los que confluyen sentimientos de “indignación y esperanza”, encuentra un complemento en el smartphone, que puede actuar como un canal de bolsillo para difundir las emociones digitalizadas. Fuera del ámbito de los movimientos sociales hay otras iniciativas que se sirven de las relaciones en tiempo real entre entornos digitales y espacio físico para informar y concienciar a la ciudadanía. Cabe destacar dos casos que han aprovechado las posibilidades que ofrecen la geolocalización y la información disponible en Internet para elaborar mapas críticos. La primera es Trash track, de 2009, una colaboración entre el SENSEable City Lab y el MIT. Consiste en un video que muestra el viaje físico de la basura estadounidense gracias a la implantación de chips y sensores dotados de sistemas 7 Una respuesta a «We are the 99%» fue «We are the 53%», un Tumblr que se refiere al teórico 53% de estadounidenses que pagan impuestos federales sobre la renta frente al 47% que no lo hace, según los datos manejados por el grupo. Las vivencias de ese Tumblr, sin actualizar desde principios de 2012, se centran en historias de personas que trabajan desde edades muy tempranas, a veces pluriempleadas o con un elevado número de horas a la semana, que no se sienten representadas por el movimiento Occupy o quieren criticar sus planteamientos. Ambos porcentajes, el 99% y el 53%, tienen su sitio en Tumblr, que no ha discriminado ninguno de los contenidos. Si se aceptan las condiciones de servicio de la web es posible articular diferentes relatos sobre el mismo fenómeno. La disputa entre las partes se juega entonces en el terreno de la visibilidad, donde rigen no sólo los argumentos políticos de los que se hacen eco los medios de comunicación, sino también mecanismos informáticos relacionados con el posicionamiento en motores de búsqueda. 8 La cita original es de Graham-Felsen, 2011.

4 - n . 2 - v. 2

narraciones personales. Castells se hace eco de las palabras se Sam Graham-Felsen, un

ano

Lo interesante es el uso de Tumblr como sitio en el que poner en común

Revista GEMI n IS |

La gente ocultaba el rostro en el video pero contaba su drama personal de lucha en una sociedad injusta. En octubre de 2011, el sitio del grupo recibía 100 entradas nuevas cada día. En febrero de 2012 ya había 225 páginas de posts” (Castells, 2012, p. 172)7.

120


de geolocalización. Los creadores explican que querían revelar la infraestructura del sistema de recogida de basuras . Se trata de un trabajo interesante porque uno de los 9

limpias de las zonas céntricas, el casco antiguo, etc. y los pestilentes desechos que circulan bajo nuestros pies, de los que apenas tenemos noticia. for Civic Media del MIT que gira en torno a las cadenas de suministros. Concebido siguen las distintas partes de un producto antes de que el embalaje final llegue a casa

Físico

del usuario. Al igual que Trash track, puede servir para iluminar procesos de los que

y lo

formamos parte en tanto que consumidores. Su uso como herramienta crítica también

D igital

como una red social, los usuarios pueden crear mapas en los que detallan la ruta que

entre lo

La segunda iniciativa es Sourcemap10, un sitio web desarrollado por el Center

Integraciones

contrastes más llamativos de la estética urbana es el que se produce entre las calles

121

es claro ya que, como dicen un mapa sobre las televisiones de pantalla plana, “conocer

Estética

Ilustración 2 - Mapa creado en 2011 por el usuario abadlovesong con la localización de los distintos componentes que forman un iPhone 4.

en la

de dónde vienen te ayudará a decidir qué hacer con ellas”.

de las

Nuevas Tecnologías •

Conclusiones Una conclusión que se extrae de las prácticas con realidad aumentada y los últimos movimientos sociales es que la separación de lo virtual y lo real es en estos 9 http://www.moma.org/interactives/exhibitions/2011/talktome/objects/146209/ 10 https://sourcemap.com/

A lejandro Lozano Muñoz

Fuente: Sourcemap.


momentos inoperativa porque no puede explicar las experiencias actuales con nuevas tecnologías. Es habitual leer y escuchar acerca de la distinción entre el mundo material aparatos de consumo recientes revelan que con esta separación se disocia teóricamente lo que en la práctica está integrado. La prueba es que los últimos movimientos sociales han utilizado redes como Twitter o Facebook para coordinar acciones de protesta y ocu-

Las características de los nuevos dispositivos piden una revisión del lenguaje y las metáforas que empleamos en estética de las nuevas tecnologías para determinar si siguen siendo eficaces. En nuestra opinión, las nociones asociadas al modelo de la realidad virtual y a las imágenes del ciberespacio necesitan un relevo puesto que ya circulan entre nosotros otros aparatos, programas y tecnologías de imagen digital. Al integrarse los entornos electrónicos y el espacio físico aparecen categorías y términos como nueva estética o expresiones como las utilizadas de manera provisional en este trabajo: digitalización de los acontecimientos, realidad integrada y otros. En este sentido se trata de una tarea ya emprendida, pero todavía queda lejos un ajuste exhaustivo de nuestros modelos teóricos para abordar las transformaciones producidas por los dispositivos tecnológicos recientes y su experiencia de uso. En nuestro caso, la adición de complementos al concepto de realidad es siempre problemática, y hablar de una realidad integrada es arriesgado, ya que se corre el riesgo de olvidar a los que no disponen de conexión a Internet o dispositivos electrónicos. Sucede lo mismo con la noción de tiempo real, puesto que incluso el tiempo cronológico es ambiguo en nuevas tecnologías: una noticia influyente publicada en un blog de Nueva York puede tardar una noche o 2 días en llegar hasta mis fuentes, por no mencionar a quienes no se informan online sino a través de la prensa en papel, la televisión u otros medios. En ese sentido, quizá sea más apropiado rescatar el término “tiempo multicrónico” propuesto por Javier Echeverría (1999): Además de desbordar las circunscripciones territoriales, la telemática trasciende los límites temporales. Internet permite la interacción en directo y en tiempo real, pero asimismo funciona cuando transcurren lapsos temporales más o menos largos entre las acciones de unos y las respuestas de otros. Por eso hay que considerarlo como un medio multicrónico (p. 81).

4 - n . 2 - v. 2

autistas a favor de la de tecnologías ciudadanas.

ano

pación de espacios públicos físicos. Estas prácticas contradicen la idea de tecnologías

Revista GEMI n IS |

y el digital como si fuesen realidades oponibles. El uso de herramientas digitales y los

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ano

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Revista GEMI n IS |

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Reflexões

sobre as novas

formas de conteúdo narrativo interativo para os games na

TV D igital Patrícia M argarida Farias Coelho Pós-doutoranda TIDD/PUC-SP. Bolsista FAPESP. E-mail: patriciafariascoelho@gmail.com

Revista GEMI n IS

ano

4 - n . 2 v. 2 | p. 125 - 134


Resumo Esta pesquisa é o resultado parcial de minha pesquisa de pós-doutoramento, em desenvolvimento, no Programa de pós-graduação do TIDD (Tecnologia da Inteligência e Design Digital), na PUC-SP, com o auxílio de fomenta da FAPESP. Este artigo busca refletir: a) sobre as novas formas de conteúdo narrativo interativo criado para os games na TV Digital, b) sobre o comportamento do telespectador do século XXI e c) desenvolvimento do meio de comunicação – TV Digital. Dentre as novas formas de conteúdo desenvolvido para TV Digital destacamos os jogos por suas características lúdicas e interativas que são as que nos interessam compreender nesta pesquisa. Como arcabouço teórico nos ancoraremos em pesquisadores das mídias como: Jenkins (2009), Coelho (2012, 2011), Machado (2005), Medula (2006), Vilches, (2009, 2003), Cannito (2010), Santaella (2008) e Squirra e Fechine (2009). Dessa forma, este estudo tem como objetivo principal compreender como o conteúdo narrativo desses jogos estão sendo criados para seduzirem os telespectadores através das novas possibilidades lúdicas e interativas da TV Digital. Palavras-chave: Narrativas interativas; TV Digital; Games; Mídia; Comunicação.

Resumen Esta investigación es parte de mi investigación post doctoral en desarrollo del programa de postgrado TIDD (Tecnologías de la Inteligencia y Diseño Digital) en la PUC-SP, con la ayuda de la una beca FAPESP. Este artículo busca reflexionar: a) sobre las nuevas formas de narrativas interactivas creadas como contenido para los videojuegos de la TV Digital, b) sobre el comportamiento del espectador del siglo XXI y c) el desarrollo de medios de comunicación - TV Digital. Entre las nuevas formas de contenido desarrollado para la televisión digital interesa los videojuegos por sus características lúdicas e interactivas que son él interés de nuestra investigación. Usaremos las investigaciones de los teóricos de los medios digitales como Jenkins (2009), Conejo (2012, 2011), Machado (2005), Bone (2006), Vilches, (2009, 2003), Cannito (2010), Santaella (2008) y Squirra y Fechine (2009). Por lo tanto, este estudio tiene como objetivo principal comprender cómo se están creando el contenido narrativo de estos juegos para seducir a los espectadores a través de nuevas posibilidades lúdicas e interactivas de la televisión digital. Palabras clave: Narrativas Interactivas, TV digital, juegos, medios de digitales, comunicación.


1 Introdução Os limites do meu mundo são os limites da minha linguagem”. (Wittegeinstein, filósofo alemão).

A

maneira de pensar a comunicação foi totalmente transformada a partir da evo-

lução da internet. Conforme Coelho (2012, p. 1) nos explica o “modelo emissor-canal-receptor desenvolvido por Abraham Moles, em 1940, apud Miège

(2000, p. 25), foi rompido e substituído por novo modelo emissor-emissor-emissor”, no qual todos passaram a ter voz. Dessa forma, os conceitos da comunicação de massa – de um ou poucos para muitos – e completamente transformado e substituído por uma nova e complexa forma de compreender e fazer (criar) comunicação. Dentre os pesquisadores da comunicação (e das novas mídias) destacamos os

estudos de Jenkins (2009). O autor a partir de seu livro A cultura da Convergência faz um mapeamento no qual nos explica sobre os três conceitos emergentes das novas formas de refletir sobre os meios comunicacionais a partir das transformações e avanços da internet, a saber: a) convergência dos meios de comunicação, b) cultura participativa e c) inteligência coletiva. O pesquisador nomeou tais conceitos como: economia afetiva, narrativa transmídia e cultura participativa. Dessa forma, Jenkins (2009) nos explica detalhadamente sobre as rupturas e modificações de paradigmas comunicacionais, uma vez que, de acordo com o autor as velhas mídias não estavam e nem iria ou irão morrer o que está mudando é à maneira de como nós – consumidores - nos relacionarmos com elas. Assim, verificamos que as pesquisas de Jenkins (2009) anteciparam as transformações relacionais entre mídia e usuário (receptor) e evidenciaram, ainda, que as mesmas, também influenciariam em diferentes esferas da cultura contemporânea. Neste estudo escolhemos a televisão como corpus dentre as diversas mídias que estão se transformando. A escolha por essa mídia deve-se ao fato da mesma alcançar milhões de usuários (telespectadores-receptores) ao mesmo tempo e por possuir um


grande poder e força comunicacional. Como nos explica Machado (2005) à televisão é um grande potencial catalisador de público, conteúdos e valores diversos. Entre essas de conteúdo criado para o game na e da TV Digital. A TV Digital passa a permitir uma maior interação entre conteúdo e usuário, pois rompe com o modelo tradicional analógico no qual o usuário (receptor-telespecta-

com o lançamento do site da central de conteúdo de vídeo Globo Media Center, do portal e provedor Globo.com que o telespectador pode pela primeira vez na história da televisão brasileira influenciar no conteúdo narrativo ali apresentado. Assim, concluímos como nos explica Cannito (2010, p. 219) que “A TV Digital deverá ser ‘mais interativa’, mas não como costuma ser a interatividade na internet, baseada na informação e no raciocínio, e sim na brincadeira e no lúdico”. O lúdico e interatividade são aspectos encontrados, principalmente, nos games (COELHO, 2012, 2011). Logo, verificamos que neste novo contexto da TV Digital os games se tornam um forte atrativo, pois se apresentam como uma nova forma de conteúdo narrativo interativo e lúdico para os telespectadores. Assim, a TV Digital se torna mais dialógica e traz dentre os seus conteúdos os jogos interativos como uma estratégia de aproximação e sedução com o telespectador-receptor. Assim sendo, pretendemos com esse artigo refletir sobre o conteúdo narrativo lúdico interativo desenvolvido para os games na e da TV Digital compreendendo, dessa maneira, como esses jogos seduzem os telespectadores. Buscaremos, também, observar o comportamento do telespectador-consumidor do século XXI e o avanço-desenvolvimento do meio de comunicação, em destaque para TV Digital. Para tanto, nos ancoraremos em pesquisadores que analisam as mídias, em destaque, para os que estudiosos da televisão digital, sem que se perca o foco principal de nosso estudo: refletir sobre conteúdos narrativos interativos - games – nessa mídia televisão digital. 2 As transformações comunicacionais do século XXI. O século XXI é marcado pelas mudanças advindas da evolução da Web 2.0. Na atual conjuntura o receptor-usuário (telespectador) se tornou consciente de seu poder diante das possibilidades que esse possui de falar e ser ouvido através dos novos meios de comunicação: redes sociais (COELHO, 2012). O consumidor a partir das evoluções das redes sociais, também, assumem outras atitudes: buscam experiências e vivências

4 - n . 2 - v. 2

de expressar suas opiniões. Médola (2006) evidencia que foi somente no ano de 2004

ano

dor) podia apenas receber a mensagem tendo pouca ou quase nenhuma oportunidade

Revista GEMI n IS |

características descritas pelo autor nos interessa, nesse artigo, refletir sobre a produção

128


interativas (lúdicas) com as mídias. Hoje fazemos parte de um mundo no qual todos passam a poder interagir indebook, tablets dentre outros. O receptor-usuário reconhece e faz uso de seu poder diante comunicação. Temos, assim, uma conscientização do usuário e consequentemente uma transformação no tipo de usuário-consumidor e de seu comportamento. Os novos aparatos de comunicação permitiram uma nova relação sinestesica entre usuário e mídia. Verificamos, portanto, como nos explica Vilches (2003, p. 181) que: “Os novos meios exigem novos usos cujos efeitos produzirão uma diversificação radical que dependerá da variação das distâncias frentes às telas, do compromisso entre o caráter portátil e funcional dos terminais telefônicos, assim como de seu caráter coletivo e individual”. Ainda amparados nas ideias do autor (VILCHES, 2009) verificamos que o mesmo nos direciona a refletir sobre o comportamento migratório do consumidor-usuário para o universo digital, principal, característica dos usuários-receptores século XXI. Logo, depreendemos que o consumidor-usuário da atualidade incorpora a cada dia, em suas ações, esses pequenos aparatos digitais. Dessa forma, seus atos comunicativos se tornam indissociáveis desses aparelhos (SANTAELLA, 2007). Na atual conjuntura se torna impossível, a qualquer consumidor-receptor, imaginar sua vida sem esses aparelhos de comunicação que representam verdadeiras extensões de nossas capacidades comunicacionais e de nossas ideias (SANTAELLA, 2007). tamento dos usuários-consumidores como de suas relações com os novos aparelhos de comunicação advindos da era Web 2.0. Mas estamos atentos às mudanças e transforma-

Vilches (2003, p. 176) nos explica que a televisão tradicional (analógica)

é “a televisão que tende a aprisionar o espectador em seu próprio mundo” enquanto Becker e Zuffo (apud SQUIRRA; FECHINE, 2009, p. 47-48, grifo nosso) pontuam que a “TV interativa consiste em aplicações de software executando em servidores multimídia e de vídeo, set-top boxes avançados, computadores pessoais e telefones móveis”. Temos assim, a mesma mídia que passa a possuir ações e características distintas. Conforme Cannito (2010) ressalta que a TV Digital deve ser mais interativa

Patrícia M argarida Farias Coelho

3 A TV Analógica e interatividade da TV Digital

ções não somente do usuário mas também das mídias.

TV D igital

Sabemos que ainda há muito para se refletir tanto sobre a mudança do compor-

sobre as novas formas de conteúdo narrativo interativo para os games na

das novas mídias, ou seja, o mesmo assume uma nova postura diante dos meios de

Reflexões

pendente do local onde estejam. As pessoas se comunicam através de celulares, noot-

129


apresentando conteúdos lúdicos com brincadeiras e jogos que possibilitem a aproximação do consumidor-receptor da televisão. Logo, verificamos que para que aja inteum computador que permita que o usuário-receptor possa interagir com ela (COELHO, 2012). Portanto, conforme, ainda, nos explica Cannito (2010) à televisão digital manterá suas características de TV mesmo sob a influência da internet, pois ambas não e nem

adaptando às diversidades culturais enquanto a internet também preservará as suas características segundo Cannito (2010). Dessa forma, verificamos que as transformações emergentes da Web 2.0 colaboram para elevar ao máximo os conceitos de interatividade, que passam a estarem presentes em quase todos os meios de comunicação. Logo, segundo Coelho (2012, p. 9) nos explica: “a interatividade é consequência da (r)evolução tecnológica, tornando-se um quesito indispensável dentro da arquitetura discursiva das novas mídias; e causa dessa (r)evolução tecnológica”. 4 As novas formas de conteúdo narrativo interativo para a TV Digital: os games. Jenkins (2009) em seu livro A cultura da convergência escreve sobre as mudanças que estavam ocorrendo na cinematografia clássica, séries e nos reality shows televisivos. O autor evidencia que os conteúdos perpassam por múltiplos suportes midiáticos que visam acolher o público que parte em busca de experiências de entretenimento. O pesquisador evidenciou, ainda, o aparecimento de um novo tipo de narrativa: narrativa transmidiática. A narrativa transmidiática se caracteriza como uma extensão da narrativa primeira em distintas plataformas: TV, games, internet e dispositivos móveis. Logo, observamos como pontua Coelho (2012) que a TV digital interativa também se caracteriza como uma dessas plataformas midiáticas, pois permite a extensão da narrativa principal, uma vez que, possibilita uma interação entre o usuário e a narrativa. A narrativa é expandida pela ação participativa de seus interlocutores que passam a poder produzir conteúdo. Cannito (2010) salienta que o importante não é somente refletir sobre o meio de comunicação e seus interlocutores, mas, sim sobre os conteúdos criados para esses meios e como esses se concretizam na mídia. O autor ressalta que os conteúdos produzidos tanto para a televisão como para a internet poderão ocupar o mesmo aparelho receptor, sem necessariamente se tornarem a mesma coisa. Assim, o autor conclui que a TV Digital mesmo tendo a possibilidade

4 - n . 2 - v. 2

prias características que permitem a produção e a distribuição de seus conteúdos se

ano

serão nunca a mesma coisa. Logo, observamos que a televisão digital possui suas pró-

Revista GEMI n IS |

ratividade na TV Digital é necessária à mediação através de um software executado por

130


de interação com game, cinema e internet continuará possuindo as características de televisão. Já para Murray (2003), outra pesquisadora das mídias, seus estudos e afirmações sobre digital se estabelece entre e a partir de dois meios de comunicação – a televisão e a internet –, putador” (MURRAY, 2003, p. 236). Dessa forma, verificamos que casamento entre dois meios de comunicação, de acordo com Murray (2003), possibilita que se criem diferentes formas de conteúdos narrativos para a TV digital (COELHO, 2012). Logo, depreendemos que há diferentes definições a respeito da usabilidade e das características da Televisão Digital, mas, em um ponto os autores, Murrray (2003) e Cannito (2010), concordam que é de que a TV Digital permitirá a criação de outros tipos de conteúdos narrativos interativos, entre eles, o game. Ressaltamos, também, que observamos que o foco de estudo de Murray se dá sobre narrativa digital enquanto que as preocupações de Cannito (2010) se detêm sobre a televisão. Embora aparentemente os autores possam estar refletindo sobre temáticas distintas ambas se encontram intrinsicamente ligadas e conectadas. Murray (2003) defende que a narrativa que encontramos nos games se apresenta como um conteúdo narrativo interativo nomeado pela pesquisadora como narrativa multiforme ou multissequencial. A narrativa multiforme (ou multissequencial) se caracteriza como uma narrativa na qual várias versões podem se estabelecer a partir de uma mesma temática (COELHO, 2012). Gosciola (apud SQUIRRA; FECHINE, 2009, p. 219) complementando as ideias de Murray (2003) explica que conteúdo narrativo desenvolvido para TV Digital além de possibilitar distintas versões ao telespectador deve ser acessível e de fácil uso, de maneira, a estabelecer apud SQUIRRA; FECHINE, 2009, p. 219) essas narrativas se estabelecem de duas formas, a saber: a) “por narrativas em que é oferecida, aos espectadores interativos, a possibilidade de al-

Verificamos, assim, que ambos as formas de narrativas propostas por Gosciola (apud SQUIRRA; FECHINE, 2009, p. 219) se definem como narrativas não lineares, ou seja, um hipertexto, no qual o telespectador pode e deve interagir modificando o rumo da mesma, sem que se perca a temática inicial. Santaella (2008) também defende o conceito de hipertexto e de não linearidade nas narrativas criadas para esses meios comunicacionais. A autora parte de sua reflexão do conceito de hipertexto, evidenciado, que a narrativa nessas mídias aparece dividida em unidades de informação ou fragmentos de texto. Logo, podemos verificar que o conteúdo narrativo criado para os games da TV Digital são formados por diferentes (VILCHES, 2003, p. 131) “Linguagens de simulação presentes nessas novas formas narrativas” que se apresentam sedutoras ao

Patrícia M argarida Farias Coelho

os mais diversos pontos de vista das ações”.

terar a continuidade narrativa ou b) por narrativas em que é oferecida a possibilidade de acessar

TV D igital

uma aproximação entre narrativa e o telespectador-usuário. Assim, para o autor (GOSCIOLA

sobre as novas formas de conteúdo narrativo interativo para os games na

pois “o futuro imediato da narrativa digital é o casamento entre o aparelho de televisão e o com-

Reflexões

a TV Digital são exatamente o oposto das afirmações de Cannito (2010). Para a autora a TV

131


telespectador-consumidor que tem a oportunidade de brincar com a narrativa enquanto interativa e se diverte com a mesma. (2009), Santaella (2008), Squirra e Fechine (2009), Cannito (2010), Coelho (2012), Vilches comunicação. Logo, compreendemos que os diferentes estudos realizados por esses pesquisadores das mídias nos permitem várias leituras e apresentam distintas interpretações a partir de um mesmo objeto, uma vez que, suas definições e opiniões se diferenciam e de alguma maneira se complementam, uma vez que, cada autor parte de uma perspectiva teórica para definir o mesmo conceito: narrativa nas mídias. Assim, todos os autores partem de um conceito e de uma de definição de narrativa, que pode ser nomeada de narrativa não linear (Santaella, 2003), transnarrativa (JENKINS, 2009) e narrativa multiforme (MURRAY, 2003), dentre outras. Verificamos que não importa qual foi à nomenclatura utilizada para definir a narrativa e sim o como esses pesquisadores a definem e a estruturam refletindo sobre seu uso e sua aplicabilidade nos meios de comunicação. Assim, concluímos que as novas formas de narrativas se apresentam como um (COELHO, 2012, p. 11) “sistema complexo, no qual um elemento está intrinsecamente associado a outro e que uma pequena alteração em uma unidade pode modificar a estrutura do todo”. Logo, concluímos que é essa possibilidade de não linearidade da narrativa, que permite o lúdico e a brincadeira entre mídia e telespectador, que torna o jogo atrativo (sedutor) e envolvente para o usuário que acredita que é ele quem está fazendo as escolhas na narrativa sem que saiba que suas ações já foram idealizadas pelo programador do game. assemelha aos conceitos de hipertexto defendidos por Gosciola (apud SQUIRRA; FECHINE, 2009, p. 219) e Santaella (2008), pois o telespectador/usuário da TV Digital pode/deve direcio-

TV Digital. Mas avançamos um passo e estamos ávidos por mais respostas e por outras leituras de pesquisadores que, assim como nós, se atentem sobre essa temática. Considerações finais Este artigo buscou refletir sobre, a saber: a) as novas formas de narrativas lúdicas interativas criadas como conteúdo para TV Digital, b) o comportamento do telespectador-consumidor do século XXI e c) o avanço/desenvolvimento dos meios de comunicação, em destaque para TV Digital. Logo, observamos que os conteúdos narrativos criados para os games da TV Digital podem se caracterizar como lúdicos e interativos, uma vez que, buscam entreter o telespectador.

Patrícia M argarida Farias Coelho

ainda, há para se refletir e pesquisar sobre os conteúdos narrativos interativos produzidos para a

nar o conteúdo narrativo a partir de suas ações interativas. Desse modo, observamos que muito,

TV D igital

Verificamos, portanto, que o conteúdo narrativo interativo criado para a TV digital se

sobre as novas formas de conteúdo narrativo interativo para os games na

(2003) e Murray (2003) sobre o conteúdo narrativo interativo (lúdico) encontrado nos meios de

Reflexões

Sendo assim, nesse estudo nos atentamos a refletir sobre as pesquisas de Jenkins

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Dessa maneira, verificamos que esses conteúdos narrativos encontrados e desenvolvidos para esses jogos seduzem os telespectadores, pois se apresentam como uma qual o usuário-telespectador a partir de suas ações vai alterando a sequência da narrativa sem que se perca a temática inicial. Assim, o telespector-jogador crê que suas ações estão alterando a sequência do conteúdo narrativo sem que observe que suas ações já

estudo (visões) sobre o desenvolvimento de conteúdo narrativo lúdico interativo para os games na TV Digital. Nos ancoramos em vários pesquisadores das mídias para buscar distintas perspectivas teóricas a partir de diferentes olhares sobre os mesmos objetos: narrativa para os meios de comunicação, em destaque para a TV Digital. Verificamos, no decorrer dessa pesquisa, que telespector-usuário dos meios de comunicação tem tido um comportamento migratório para o universo digital, principal, característica desses usuários-receptores século XXI. Observamos, ainda, que a maior contribuição para as mudanças de comportamento do usuário atual foram o desenvolvimento da Web 2.0. Com a evolução da internet foi possível desenvolver os meios de comunicação interativos, que passaram a fazer parte de nossas vidas. Assim, que o receptor-usuário da contemporaneidade se torna a cada dia mais conectado e dependente de seus pequenos aparatos de comunicação. Os avanços dos meios de comunicação e as mudanças do comportamento dos usuários-telespectadores colaboraram para o desenvolvimento e criação do conteúdo narrativo lúdico interativo para a TV Digital, uma vez que, a cada dia o receptor-telespectador se torna mais interativo e participativo. Assim, observamos que os consumidores passam a querer ter experiências e vivências com os produtos e não apenas consumi-los. Concluímos, assim, que conteúdo narrativo-interativo criado para a TV Digital, hipertexto, contribui para realizar os desejos do consumidor contemporâneo, pois as narrativas (não lineares) interativas e lúdicas encontradas nesses jogos possibilitam concretização dos sonhos de consumo do telespectador que é acreditar que é ele quem tem o poder de agir e fazer escolhas nos e sobre os meios de comunicação. Sabemos que muito, ainda, há para se refletir sobre: a) os conteúdos lúdicos narrativos interativos produzidos para o game da TV Digital, b) o comportamento do consumidor do século XXI, e c) os desenvolvimentos dos meios de comunicação. Mas avançamos um passo, abrindo caminho, para futuros estudiosos. Muitas pesquisas, ainda, se farão necessárias para responder aos questionamentos de pesquisadores que assim como nos se debrucem sobre essas temáticas.

4 - n . 2 - v. 2

Nesta pesquisa apresentamos uma das possíveis interpretações (reflexões) de

ano

foram previstas pelo programador desenvolvedor do jogo.

Revista GEMI n IS |

brincadeira (lúdico) em uma narrativa não linear interativa, ou seja, um hipertexto, no

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Referências

e novos modelos de negócio. São Paulo: Summus. 2010.

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TV D igital

SANTAELLA, L. Linguagens líquidas na era da mobilidade. São Paulo: Paulus, 2007.

sobre as novas formas de conteúdo narrativo interativo para os games na

COELHO, P. M. F. Os Games Como Novas Formas de Conteúdo Narrativo

Reflexões

CANNITO, N. G. A televisão na era digital: interatividade, convergência

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para comunicação. Porto Alegre: Sulina, 2009. VILCHES, Lorenzo (2009). Televisión digital: entre la esperanza y el exceptismo. In: SQUIRRA, Sebastião; FECHINE, Yvana (orgs.). Televisão digital: desafios para a comunicação. Livro da COMPÓS.Porto Alegre: Sulina, 2009. _____. Migração Digital. São Paulo: Edições Loyola, 2003.

Patrícia M argarida Farias Coelho

SQUIRRA, S.; FECHINE, Y. (Orgs.). Televisão digital: desafios


Até

onde vai a convergência?:

assistindo à tv norte - americana no brasil

Pedro Peixoto Curi Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal Fluminense – PPGCOM-UFF. E-mail: pedrocuri@gmail.com

Revista GEMI n IS

ano

4 - n . 2 v. 2 | p. 135 - 151


Resumo Programas de TV norte-americanos podem ser assistidos de qualquer lugar enquanto são transmitidos ou baixados pela internet horas depois. Espectadores fazem isso usando diferentes ferramentas e redes sociais, discutindo o que viram. No Brasil, não é diferente, mas esse mercado global não parece tão inclusivo. Alguns programas possuem paratextos que fãs estrangeiros não conseguem alcançar. Sentindo que estão perdendo parte da história, fãs brasileiros tentam criar novas formas de interagir com esses universos e com outros fãs. Este trabalho procura mostrar como espectadores brasileiros interagem com produtos transmidiáticos e entre eles em um consumo global, com elementos locais. Palavras-Chave: fãs; televisão; convergência midiática.

Abstract American TV shows can be watched worldwide while they are broadcasted or downloaded a few hours later. Audiences use download tools and social networks to do it and discuss them later. It isn’t different with Brazilian audiences, but sometimes this global market doesn’t seem so inclusive. Some of these shows have paratexts that foreign fans can’t reach. Feeling that they are losing parts of the story, Brazilian fans create ways to interact with those universes and other fans. This paper aims to investigate how Brazilian fans interact with transmediatic texts and between themselves in a global consumption with local traces. Keywords: fans; television; convergence culture.


Introdução

T

odos os dias, jovens brasileiros – e de outras parte do mundo - consomem produtos audiovisuais norte-americanos pela televisão, nas salas de cinema ou internet. Conectados, discutem esses programas com outros jovens de diferentes

nacionalidades, formando comunidades globais de espectadores. Dentro dessas comunidades, um grupo específico, diretamente ligado à cultu-

ra popular ganha destaque: os fãs. O fã é um consumidor caracterizado pelo excesso e possui modos próprios de consumir e de se relacionar com outros espectadores. O consumo do fã se baseia nesse excesso e na fidelidade a textos e universos narrativos. Com os rápidos avanços nas tecnologias de distribuição, alguns pesquisadores que concentram seus estudos na cultura dos fãs deixam de pensar em alguns produtos como importados e passam a caracterizá-los como globais, com públicos internacionalmente dispersos (Harrington e Bielby, 2007 : 180). No entanto, ao tratar o consumo midiático como “talvez o meio mais imediato, consistente e difundido pelo qual a ‘globalidade’ é experimentada” (Murphy e Kraidy apud Harrington e Bielby, 2007 : 179), tem-se a ideia equivocada de que é possível consumir um produto dito global em sua totalidade de qualquer lugar do mundo. Muitos jovens brasileiros fazem download de séries de televisão e filmes. Criam canais e sistemas de trocas de arquivo e legendagem de produtos audiovisuais para o português. Organizam encontros e grupos de discussão sobre esses produtos, mas dificilmente terão acesso a todo o universo daquele textos convergentes, a todos seus paratextos ou todas as interfaces criadas com o objetivo de criar a interação com o público. Este trabalho, parte inicial de uma pesquisa em andamento, busca privilegiar as práticas participativas de consumidores e fãs brasileiros, tentando entender suas especificidades, para iniciar um pensamento sobre a reconfiguração do campo audiovisual contemporâneo, a partir da dimensão da cultura participativa e da cultura da convergência e se debruça sobre os espectadores brasileiros que assistem programas atualmente veiculados na televisão norte-americana, interagindo entre si e desenvol-


vendo estratégias para alcançar tudo que conseguem desses produtos. Um fenômeno contemporâneo que não era possível antes da internet e que, agora, pode indicar novas Para isso, além de lançar um olhar sobre algumas das práticas participativas criadas pelos fãs brasileiros e sobre a forma como se organizam para acessar o máximo que conseguem dos programas de que gostam - e as estratégias que desenvolvem para

Os jovens e o entretenimento Sunaina Maira e Elisabeth Soep (2005) localizam os jovens no centro da globalização, caracterizando-os como o principal alvo da indústria do entretenimento. Baseando-se mais em uma posição social estruturada por poderes de consumo, criatividade e cidadania do que na idade biológica, apresentam a juventude como um lugar de conflito ideológico que evoca questões relacionadas ao poder em contextos locais, nacionais e globais. Nesse sentido, a cultura jovem teria muito a ensinar sobre a produção de centros e margens da cultura e ajudariam compreender como os jovens estão inseridos em um espaço ambíguo entre mercados globais e práticas locais. Geralmente, quando se fala de globalização, a juventude entra na discussão para se falar apenas de consumidores em um mercado global, mas ela está ajudando a construir e distribuir produtos enquanto negocia sua circulação em sistemas e comunidades complexas (idem : xv-xxxv). A indústria do audiovisual é uma das industrias mais populares do entretenimento. Atualmente, produtos concebidos em todo o mundo podem ser consumidos de qualquer parte do planeta – e nas mais diversas mídias. Certamente, a cultura jovem já se caracterizava pela associação de diferentes textos, de números musicais de artistas consagrados que eram televisionados e depois integravam trilhas sonoras até personalidades a ídolos juvenis que apareciam em diferentes produtos desde a década de 50. No entanto, no fim dos anos 90, os produtos voltados para o público jovem eram uma mistura complexa de diferentes mídias, incluindo filmes, programas de televisão e clipes musicais. A prática de veicular um produto de entretenimento através de múltiplas mídias, para explorar melhor diferentes mercados, destaca uma estratégia importante para a indústria cultural norte-americana no fim do século XX: a sinergia (Davis e Dickinson, 2004 : 88-90). Em Cultura da Convergência (2008), Henry Jenkins apresenta a sinergia como a oportunidade econômica representada pela capacidade de possuir e controlar ma-

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tos fãs brasileiros se organizaram: American Idol e Heroes.

ano

isso -, o presente artigo aproxima esse olhar de dois produtos em torno dos quais mui-

Revista GEMI n IS |

relações entre fãs e com os próprios textos.

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nifestações de um conteúdo por diferentes sistemas de distribuição. Junto à extensão – tentativas de expandir mercados potenciais pelo movimento de conteúdos por esses

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sistemas – e à franquia – “empenho coordenado em imprimir uma marca e um mercado

Até

a conteúdos ficcionais, sob essas condições” -, a sinergia seria uma peça fundamental à

onde vai a convergência?: assistindo à tv norte - americana no brasil

cultura da convergência (idem : 2008). Jonathan Gray, em seu livro Show sold separatey: promos spoilers and other media paratexts (2010), defende a ideia de que filmes e programas de televisão são apenas uma pequena parte da presença massiva e estendida de textos fílmicos e televisivos nos ambientes em que vivemos e é impossível analisar esses textos ou seus impactos culturais sem levar em conta suas mais diversas proliferações (idem : 2). Gray também usa o termo sinergia para falar sobre os materiais periféricos que se constroem e circulam em torno de um texto midiático. Esses materiais têm como objetivo promover esses textos e criam um universo em torno deles. São os trailers, os vídeos promocionais, as informações de bastidores que “vazam” para o público ou são descobertas por eles, assim como brinquedos, livros, jogos de videogame e até novos textos desenvolvidos por consumidores. Se apropriando dos termos de Gerard Gennette, ele opta por chamá-los de paratextos (ibidem : 6-7). Ainda que tenham acesso aos textos em si, os fãs brasileiros não conseguem chegar tão facilmente a alguns paratextos. Alguns deles até podem ser veiculados pela

espectadores brasileiros, ao contrário do que muitos pensam, não tem acesso a todo o universo dos produtos que consomem. Além disso, muitas vezes, não têm entrada fácil em comunidades internacionais e não participam de lógicas criadas pela indústria para consumidores norte-americanos. Se a convergência de diferentes mídias se torna uma estratégia das grandes corporações, isso acontece porque os consumidores aprenderam novas formas de interagir com o conteúdo que encontram. De acordo com Jenkins (2008 : 44), a convergência é “tanto um processo corporativo, de cima para baixo, quanto um processo de consumidor, de baixo para cima”. Para ele, “a convergência corporativa coexiste com a convergência alternativa”. As ferramentas tecnológicas afetam não apenas a disseminação e a recepção, mas também a produção e a interação entre os usuários. A tecnologia é cúmplice na geração de produtos feitos por fãs (Hellekson e Busse, 2006 : 13) e as mesmas tecnologias que possibilitaram a participação dos consumidores no conteúdo midiático também alteraram os padrões de consumo, permitindo a formação dessa cultura participativa, que sustenta essa convergência midiática e cria demandas que alguns estúdios ainda não estão aptos a satisfazer. E os fãs vão atrás do que querem.

Pedro Peixoto Curi

poníveis para venda na internet ou são oferecidos por preços proibitivos. Desta forma,

internet, mas alguns produtos relacionados a textos norte-americanos não estão dis-


Um público que participa

de indivíduos obcecados e histéricos, tratados como vítimas de uma doença (Jenson, 1992). Desviantes, eram considerados perigosos. Aos poucos, o discurso acadêmico passou a permitir que o fã não fosse mais visto como uma vítima da cultura massiva, um

Com o desenvolvimento dos estudos de recepção e uma noção mais aprofundada da ideia de público, a imagem do fã começa a passar por transformações. A partir da segunda metade da década de 70, os Estudos Culturais Britânicos propõem que o processo comunicacional seja concebido como um sistema contínuo, deixando de lado a ideia de que o consumo é menor que a produção, e, a partir de um maior interesse por manifestações que eram consideradas vulgares, trazem às rodas de discussão acadêmicas temas como a música pop e as subculturas juvenis (Freire Filho, 2007 : 32; Monteiro, 2007 : 31; Storey, 1996 : 2). O consumo passa a ser visto como uma etapa fundamental para esses processos e também como uma atividade ativa, a partir do momento em que se percebe que a codificação da mensagem, na produção, está ligada à sua decodificação, na recepção. Um texto não carrega em si todos os sentidos que é capaz de gerar e não pode garantir que efeitos terá. Cada texto trará sentidos diferentes para pessoas diferentes, dependendo de como ele é interpretado e das ferramentas interpretativas de quem o lê (Grossberg, 1992 : 52, 53). Michel de Certeau defende a ideia de que a leitura é uma operação de caça, em que os leitores são apresentados como invasores que “circulam por terras alheias, nômades caçando por conta própria através dos campos que não escreveram” (1994 : 269, 270). O texto seria um imóvel alugado, onde o leitor passaria a viver temporariamente, adaptando-o para seu conforto. De Certeau propõe que, para analisar as representações - imagens que chegam pela televisão, por exemplo - e o comportamento do consumidor, é preciso, também, estudar o que o ele produz com as imagens que recebe durante as horas que fica diante do aparelho (idem : 39). Nesse caso, toda produção corresponderia a uma produção secundária, dispersa e silenciosa, qualificada como consumo, caracterizada não por produtos próprios, mas pelas formas de empregar os produtos consumidos. A existência de códigos e normas de utilização não determinam como um produto será manipulado pelo consumidor. Ao analisar a manipulação desses produtos, é possível notar as dife-

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oferecida (Storey, 1996).

ano

indivíduo sem vontade própria que receberia, sem hesitar, qualquer coisa que lhe fosse

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Desde o surgimento do conceito, o fã era comumente definido por estereótipos

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renças e semelhanças entre uma produção oficial e outra secundária. Henry Jenkins se baseia na obra de De Certeau, para desenvolver a ideia de

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que o fã é um produtor que se apropria dos textos que recebe para criar novos sentidos

Até

e produtos. Influenciado pelas reflexões dos Estudos Culturais, foi um dos primeiros a

onde vai a convergência?: assistindo à tv norte - americana no brasil

dizer que seria um erro pensar nos fãs exclusivamente em termos de consumo, ao invés de produção e, indo de encontro àquele discurso tradicional sobre o fã, definiu-os como “consumidores que também produzem, leitores que também escrevem, espectadores que também participam” (1992 : 208). No entanto, as ideias de Jenkins diferem das apresentadas por De Certeau em dois pontos. Em primeiro lugar, enquanto De Certeau apresenta dos leitores como indivíduos isolados uns dos outros, cujos sentidos são criados de forma silenciosa e dispersa e descartados assim que deixam de ser úteis ou desejáveis, para Jenkins, esse processo é social. Através dele, as interpretações individuais dos fãs são moldadas e reforçadas após a discussão com outros leitores. Essas discussões expandem a experiência do texto além do consumo inicial. Desta forma, os sentidos criados são integrados às vidas dos leitores. Em segundo lugar, não há dentro da tietagem uma noção clara entre leitores e autores, já que fãs não consomem apenas histórias que circulam pelo mercado, criando também suas próprias histórias e colocando-as em circulação nas comunidades de

afirmam como oposição ao que é dominante, se diferenciam e criam, para si, uma nova cultura, ainda que utilizem as normas da lógica dominante para construir essa cultura. A cultura dos fãs faz da produção secundária descrita por De Certeau a fonte para a execução de artefatos próprios (Jenkins, 1992 : 45; Storey, 1996 : 120, 126, 127). Contudo, a relação entre público e cultura não pode ser compreendida somente como a apropriação de textos e consumo ativo. Não é apenas a apropriação do texto que importa, mas a maneira como esse texto é interpretado e utilizado. O consumo opera na criação de estruturas de prazer, que pode se dar de diferentes formas, como quebrar regras, fazer o que esperam de você ou realização de desejos, mesmo que de forma efêmera e artificial. A cultura massiva, por sua vez, proporciona um prazer, que, na maioria dos casos, não é individual, pois trabalha na produção de representações ideológicas em que nos colocamos e por meio das quais experimentamos o mundo. Para Grossberg (1992 : 56), a verdadeira fonte de popularidade da cultura popular não está nos efeitos ideológicos, mas em sua produção pelo consumo. A produção cultural dos fãs acontece na comunidade e é voltada para ela. É

Pedro Peixoto Curi

produzir uma cultura própria, marginal. Ao assumir o gosto pelo que é marginal, se

que fazem parte. Os fãs se diferenciam dos consumidores comuns quando começam a


a criação da cultura dos fãs, que segue sistemas de produção e circulação próprios, diferentes dos utilizados na indústria cultural, contudo, com algumas semelhanças. A

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cultura oficial serve de base para a construção da cultura dos fãs a partir do momento

Até

em que eles se apropriam de certas lógicas de produção e veiculação oficiais para poder

onde vai a convergência?: assistindo à tv norte - americana no brasil

criar e pôr em circulação os objetos culturais desenvolvidos. Os fãs criam relações de autoridade por meio de investimento afetivo em algum objeto. A qualidade e quantidade do investimento conferem a um fã determinado nível de autoridade sobre certo assunto e sua posição na organização social. A partir daí é possível entender por que a relação do fã com seu objeto é caracterizada pelo excesso. Quanto maior o investimento afetivo, maior será a diferenciação, legítima e ideologicamente. O excesso não só caracteriza o investimento, como o justifica. O lugar dos jovens brasileiros Jovens costumam ser vistos como meros consumidores em um mercado global, mas eles também estão ajudando a produzir e distribuir produtos, assim como negociam e facilitam ativamente sua circulação. Atualmente, jovens de qualquer lugar do mundo consomem os mesmos produtos quase simultaneamente: blockbusters são lançados no mesmo fim de semana em diferentes continentes para evitar a pirataria. Álbuns

baixados – talvez, com legendas – poucas horas depois de saírem do ar nos Estados Unidos. Esse público jovem se organiza em grupos, assiste aos programas e discutem entre eles, usando uma serie de ferramentas. Para dar acesso a outros fãs, criam legendas no idioma local e colocam disponíveis para download. Atualmente os fãs tem acesso a quase todos os produtos disponíveis no mundo, mas, como fãs, eles querem mais. A televisão norte-americana – principalmente séries de TV e desenhos animados – fazem parte da programação brasileira há décadas. No entanto, muita coisa mudou desde que a TV por assinatura chegou ao país no inicio da década de 90. Com canais mais segmentados, as pessoas puderam assistir séries norte-americanas durante todo o dia, com som original – algo que parte dos fãs brasileiros aprecia – e legendas. A partir daí, com a TV por assinatura, a lacuna entre a exibição nos Estados Unidos e no Brasil foi diminuindo, ainda que a negociação entre os canais brasileiros e os distribuidores norte-americanos ainda estivessem levando muito tempo. Isso não seria um problema se os espectadores não começassem, anos mais tarde, a usar a internet para procurar informações sobre os programas e a falar com

Pedro Peixoto Curi

de TV norte-americanos podem ser vistos na internet enquanto são transmitidos ou

musicais podem ser baixados por milhares de usuários por todo o mundo. Programas


espectadores norte-americanos e de outras partes do mundo. Eles viram que estavam atrasados e isso lhes parecia vergonhoso. brir o que aconteceu no fim de um episódio do seu programa favorito enquanto ele está sendo licenciado e legendado pelos canais de televisão e no dia seguinte pode fazer o download e ver por você mesmo. A partir daquele momento, não havia mais motivo

eles com legendas – feitas por outros fãs – e discutir o que aconteceu com qualquer um, quando quisessem. Do FTP ao torrent, a prática do download se transformou em algo bastante organizado. A imagem abaixo (Fig. 1) mostra um dos muitos sites de download existentes no Brasil. BaixarTV.com é especializado em series de TV e reality shows e tem cerca de quatrocentos títulos disponíveis, entre séries canceladas e que ainda estão no ar. Figura 1 - Website BaixaTV.com

Fonte: reprodução do autor

4 - n . 2 - v. 2

Desta forma, fãs puderam começar a baixar seus programas favoritos, assistir a

ano

para sentir vergonha.

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Com o rápido desenvolvimento da internet, em um dia você consegue desco-

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Todos os dias, novos episódios são disponibilizados para download e colocados na página principal com um link que leva à área dedicada àquela série, onde há

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mais de uma opção de sites de compartilhamento de dados e também informações

Até

sobre os programas. No BaixarTV.com, todos os episódios são convertidos para um

onde vai a convergência?: assistindo à tv norte - americana no brasil

formato de vídeo RMVB - mais leve que AVI, o que torna o download mais rápido – e já tem legendas em português. Tudo isso criado por fãs para agradar outros fãs e tornar a vida deles mais fácil. Figura 2 - Menu de Tutoriais do BaixarTV.com

Na outra imagem (Fig. 2), podemos ver o menu com alguns tutoriais, como o termo de uso do site; como assistir a um episódio ou filme com legendas que vêm em arquivo separado do vídeo; como abrir um arquivo no formato RMVB; instruções de como usar cada site de compartilhamento de arquivos; e também um guia com o passo-a-passo para mudar seu endereço IP para baixar mais de um episódio por vez sem ter de fazer uma assinatura paga do site para isso. Tudo isso, todas essas instruções garantem que os fãs terão acesso ao programas a que querem assistir e tudo mais que desejam, certo? Errado. Em janeiro deste ano, com o anúncio nos Estados Unidos de dois projetos de lei para combater a pirataria na internet, SOPA (Stop Online Piracy Act) e PIPA (Protect IP Act), alguns sites de compartilhamento de arquivos foram fechados, como o Megaupload, que dizia ter 50 milhões de usuários. Entre eles estavam os fãs brasileiros, que perderam um dos meios de acessar seus programas favoritos, mas que, ainda assim não se deram por vencidos.

Pedro Peixoto Curi

Fonte: reprodução do autor


Alguns sites feitos por fãs, como o próprio BaixarTV.com, que direcionavam para aqueles que haviam sido fechados, procuraram novas alternativas e voltavam a hospe-

Figura 3 - Comunicado aos usuários do BaixarTV.com

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dar os episódios, pedindo paciência aos outros fãs, como na imagem abaixo (Fig. 3).

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ano

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Fonte: reprodução do autor

Outros, como o The Music Dude, também muito popular até sair do ar, lançaram, à época, pedidos para que os fãs passassem a contribuir com dinheiro para que o site pudesse continuar no ar. Nos comunicados que podem ser lido nas imagens abaixo (Figs. 4 e 5), é destacado o esforço feito para manter o site funcionando e a motivação para fazê-lo: os próprios fãs. Figura 4 - Comunicado aos usuários do The Music Dude

Fonte: reprodução do autor


Figura 5 - Comunicado aos usuários do The Music Dude

146 Até onde vai a convergência?: assistindo à tv norte - americana no brasil •

Se fãs brasileiros já conseguiram uma série de conquistas nessa batalha por acesso, a guerra está longe de acabar. Com produtos convergentes e universos cada vez mais e mais complexos – e com as estratégias da indústria para proteger suas propriedades, além de um pequeno problema geográfico – ainda existem muitos lugares aos quais os fãs não conseguem chegar. Mas eles tentam de qualquer jeito. Sentindo que estão perdendo parte da história, os fãs brasileiros tentam criar novas formas de interagir com esses universos e com outros fãs. Dois exemplos Gostaria agora de chamar a atenção para dois produtos diferentes: O primeiro deles é American Idol, um reality show musical baseado na interatividade e na votação popular que escolhe um novo ídolo para os Estados Unidos. Muito popular no Brasil – o que gerou até a criação da versão nacional Ídolos – American

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Fonte: reprodução do autor


Idol é exibido na TV brasileira no canal por assinatura Sony Entertainment Television com legendas em português e editado para tirar as partes em que o apresentador, Ryan Seaesse processo leva tempo e o intervalo entre a exibição nos Estados Unidos e no Brasil deixava alguns fãs impacientes. No caso de American Idol, que tem de ser editado para a exibição local, os fãs brasileiros realmente não conseguem ter acesso ao programa in-

que não gostam de spoilers. Tentando evitar a revolta dos fãs e a migração completa dos espectadores para a internet, a Sony Entertainment diminuiu o intervalo entre a exibição norte-americana e a brasileira de duas para uma semana, em 2010, e para três dias em 2011. Além disso, exibiu a final ao vivo para os espectadores brasileiros. Os fãs de American Idol não usam a internet apenas para assistir ao programa. Existem sites especializados feitos por fãs e comunidades em redes sociais como o Orkut, nos quais é possível encontrar os episódios para download, arquivos das músicas, informações sobre participantes, jurados e bastidores, além de um espaço para que possam conversar sobre aquilo a que assistem. Durante a turnê feita pelos dez primeiros colocados pelos Estados Unidos, os fãs organizam informação e compartilham o repertório do show, vídeos das apresentações, comentários e tudo mais que conseguem encontrar, para criar a sensação de que estão assistindo às apresentações ao vivo e juntos.

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dois anos seguidos, divulgaram o campeão em suas capas, deixando loucos alguns fãs

ano

teiro. E o pior: como o programa é muito popular, alguns sites de notícia no Brasil, por

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crest, diz os números utilizados para a votação e faz outras intervenções “ao vivo”. Todo

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Figura 6 - Imagem publicada por fã do American Idol

148 Até onde vai a convergência?: assistindo à tv norte - americana no brasil •

Essa foto (Fig. 6), por exemplo, foi encontrada e publicada por um fã brasileiro em um fórum, começando uma discussão sobre o quanto o lugar estava mais vazio do que no ano anterior e se o American Idol Tour ainda tinha a mesma força das edições passadas. Sem deixar o Brasil, os fãs não têm, obviamente, como assistir aos shows pessoalmente, fazer os testes para concorrer ao título de ídolo norte-americano ou ir ao local da transmissão ao vivo, mas há uma coisa que eles realmente gostaria de fazer de casa: votar. No site oficial do American Idol, fãs conseguem acessar toda sorte de informações, porém a votação só é permitida para celulares e computadores que estão em território norte-americano. Um outro exemplo de práticas participativas está relacionado com a série de fic-

Pedro Peixoto Curi

Fonte: reprodução do autor


ção Heroes. Concebida como um grande produto convergente, com um universo transmidiático, Heroes foi, em sua primeira temporada, um enorme sucesso. vam produtos e criavam teorias para explicar os eventos da história, mas alguma coisa ainda estava faltando: representação. Heroes era sobre uma nova geração de pessoas que haviam nascido com po-

da América Central, mas dois fãs brasileiros não ficaram completamente satisfeitos e decidiram tomar uma atitude e fizeram um fan film: uma apropriação audiovisual independente de produtos da cultura pop, feita de forma amadora ou semi-profissional, sem necessidade de autorização de uso de personagens e histórias protegidas por lei, realizada por um fã e tendo outros fãs como principal público alvo, sem a intenção de obter lucro com sua comercialização direta (Curi, 2010: 52). Heroes Brazil foi lançado no YouTube em 2008. Baseado na série de TV, o filme de quase três minutos apresenta algo que não foi feito pelos produtores da série: a existência de brasileiros com habilidades semelhantes àquelas da televisão. Fábio Tabah e Fernando Medici, que fizeram o filme sem nunca ter estudado ou trabalhado com cinema, já haviam se arriscado a realizar alguns vídeos curtos baseados dos jogos de vídeo-game e filmes de que gostavam. Heroes Brazil, no entanto, foi o primeiro a receber legendas em inglês, para que fãs de outros países, especialmente dos Estados Unidos, pudessem assistir e entender. Esses são exemplos de como os fãs brasileiros podem, mesmo excluídos da lógica convergente de certos produtos que consomem, criar práticas participativas próprias e específicas que incluem a interação com outros fãs, com os produtos e até mesmo o desenvolvimento de novos textos. Conclusão Num mundo em que as opções de mídia estão em crescente expansão, haverá brigas por espectadores cujos gostos e preferências serão inéditos para a mídia corporativa. As pessoas mais atentas da indústria já sabem disso: algumas estão tremendo, outras estão lutando para renegociar suas relações com consumidores. No fim, os produtores precisam dos fãs tanto quanto os fãs precisam deles (Jenkins, 2008 : 193,226)

Tem-se observado, nos últimos anos, a emergência de trabalhos que procuram acompanhar as mudanças nos mercados e nas lógicas produtivas e de consumo da cul-

4 - n . 2 - v. 2

bilidades especiais foram encontrados nos Estados Unidos, Japão e até alguns países

ano

deres especiais e que estavam, de alguma forma, conectados. Seres humanos com ha-

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Fãs brasileiros assistiam aos episódios, compartilhavam opiniões, coleciona-

149


tura massiva. Em 2006, quando lançou o livro Cultura da Convergência (2008), Henry Jenkins chamou a atenção para os diferentes usos das novas mídias, para o potencial

150

produtivo dos espectadores e o impacto de tudo isso para o mercado. O livro, principal

Até

referência atual para tratar do assunto, é considerado por ele mesmo como uma con-

onde vai a convergência?: assistindo à tv norte - americana no brasil

tinuação do trabalho que começou em 1992 com Textual Poachers: Television Fans and Participatory Culture, “quando os fãs estavam à margem das operações culturais, eram ridicularizados na mídia, ameaçados com processos legais e representados como pouco articulados e desprovidos de raciocínio” (2006 : 1). Inspirado pela tradição dos Estudos Culturais britânicos que ajudaram a reverter a visão negativa que se mantinha das culturas juvenis, ele tentou construir uma nova imagem para a cultura dos fãs, uma que compreendesse os consumidores de produtos midiáticos como indivíduos ativos, engajados e criativos (idem). Já Cultura da Convergência, nas próprias palavras de Jenkins, descreve um momento em que os fãs são centrais para a forma como a cultura opera e o conceito de um público ativo, tão controversa há duas décadas, agora é defendido por todos envolvidos na indústria midiática (ibidem). Apesar de as teorias em torno da cultura participativa terem evoluído bastante nos últimos anos e de temas ligados à convergência midiática serem temas de diversos trabalhos no Brasil, poucas são as iniciativas de pensar essas práticas dentro de um contexto nacional, levando em consideração o consumo de espectadores brasileiros e os

palmente por telenovelas, o público dessas narrativas não costuma criar novos textos ou práticas participativas efetivas, limitando-se aos comentários ou devaneios sobre desfechos e rumos diferentes para uma história, sem, no entanto, querer transpor suas elucubrações para uma nova produção. Os fãs brasileiros podem não ter força de ser fazer ouvir pela indústria norte-americana no cancelamento de séries ou produção de filmes, mas com o uso de novas tecnologias e novos meios, os eles podem ter mais acesso a essas questões, ainda que não sejam totalmente incluídos na lógica convergente da indústria. Apesar disso, consomem esses produtos e estabelecem práticas participativas específicas em relação a elas, reforçando, com isso, a própria lógica convergente. Criando e organizando comunidades complexas, desenvolvendo meios de acessar seus programas favoritos e os paratextos correspondentes a eles – ou ainda escrevendo, eles próprios, novos textos -, os fãs brasileiros têm práticas participativas que os ajudam a chegar o mais perto que podem dos universos que tanto amam e também a dizer do que gostam e o que querem.

Pedro Peixoto Curi

Ainda que o Brasil possua uma sólida produção audiovisual, composta princi-

produtos produzidos no país.


A partir dessas práticas, eles podem assistir aos programas, falar com outros fãs, e consumir universos, mas, mais importante: a partir dessas práticas eles podem se

Referências Bibliográficas:

em Comunicação, Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2010. DAVIS, Glyn; DICKINSON, Kay (orgs.). Teen TV: Genre, Consumption, Identity. London: British Film Institute, 2004. De CERTEAU, Michel. A invenção do cotidiano: Artes de fazer. Petrópolis, RJ: Vozes, 1994. FISKE, John. (1992) “The cultutal economy of fandom”. In: LEWIS, Lisa A. (org.). The adoring audience: fan culture and popular media, p. 30-49. Londres: Routledge, 1992. GRAY, Jonathan. Show sold separately: promos, spoilers and other media paratexts. New York: New York University Press, 2010. HARRINGTON, c. Lee; BIELBY, Denise D.. “Global Fandon/Global Fan Studies”. In: GRAY, Jonathan; SANDVOSS Cornel; HARRINGTON, C. Lee. Fandom: Identities and Communities in a Mediated World, p. 179-197. New York: New York University Press, 2007. HELLEKSON, Karen; BUSSE, Kristina. Fan fiction and fan communities in the age of the internet. Jefferson: McFarland & Company, 2006. JENKINS, Henry. Cultura da convergência: São Paulo: Aleph, 2008. JENSON, Joli. “Fandom as Pathology: the consequences of characterization”. In: LEWIS, Lisa A. (org.). The adoring audience: fan culture and popular media, p. 9-29. Londres: Routledge, 2001 (1992). MAIRA, Sunaina e SOEP, Elisabeth (orgs.). Youthscapes: the popular, the national, the global. Philadelphia: University of Pennsylvania Press, 2005.

4 - n . 2 - v. 2

2010. 142f. Dissertação (Mestrado em Comunicação) - Curso de Pós-graduação

ano

CURI, Pedro P.. Fan films: da produção caseira a um cinema especializado.

Revista GEMI n IS |

expressar.

151


As Ferramentas de Interatividade no Webjornalismo Interiorano: um retrato da participação do leitor no extremo sul do J andré Corrêa B atista Doutorando em Comunicação e Informação – UFRGS. Mestre em Comunicação – PUCRS. Bacharel em Comunicação – Jornalismo – UCPel. Licenciado em Letras – UFPel. E-mail: jandrecb@gmail.com

A line Reinhardt

da

S ilveira

Aluno especial do Programa de Pós-graduação em Comunicação e Informação – UFRGS. Especialista em Administração Pública Contemporânea – UFRGS. Bacharel em Comunicação Social – Jornalismo – UCPel. E-mail: alireinhardt@gmail.com

Larissa Rilho Munhoz Aluna de pós-graduação em Gestão da Moda, Comunicação, Marketing e Estilo – Senac/RS. Bacharel em Comunicação Social – Jornalismo e Publicidade e Propaganda – UCPel. E-mail: larissa.rilhomunhoz@gmail.com

B eatriz Corrêa Pires D ornelles Pós-doutora em Comunicação – UFP (Portugal). Doutora em Comunicação Social – USP. Mestre em Jornalismo Científico – USP. Bacharel em Comunicação Social – PUCRS. E-mail: biacpd@pucrs.br

Revista GEMI n IS

ano

4 - n . 2 v. 2 | p. 152 - 167

B rasil


Resumo O presente trabalho pretende apresentar um retrato preliminar da imprensa on-line do extremo sul do Brasil. Para este momento da pesquisa, foi estudado o website do Jornal Diário Popular (Pelotas/RS). Com base nos pressupostos da análise de conteúdo aplicado ao Jornalismo (HERSCOVITZ, 2008), foram analisadas 288 entradas informativas publicadas no período de uma semana (20 a 26 de junho de 2012). No estudo, perceberam-se os primeiros avanços em termos de interatividade, mas também diversas lacunas para a promoção de uma maior participação do leitor. A discussão está alicerçada nos trabalhos de Dornelles (2011), Primo (2007) e Quadros (2005). Palavras-Chave: Jornalismo Interiorano; Webjornalismo; Interatividade.

Abstract This paper aims to present a preliminary picture of web journalism in southern Brazil. For this moment of the research, we studied the website of the Diário Popular (Pelotas/RS). Based on the assumptions of content analysis applied to Journalism (HERSCOVITZ, 2008), we analyzed 288 informative entries published in the period of one week (20 to June 26, 2012). In this study, we have found the first advances in terms of interactivity, but also many gaps to promote greater participation of the public. The discussion is based on the perspectives of Dornelles (2011), Primo (2007) and Quadros (2005). Keywords: Web journalism; Diário Popular; Interactivity.


Introdução

O

Jornalismo na World Wide Web já completa mais de duas décadas de história. Durante esse período, as rotinas produtivas da mídia jornalística têm passado por diversas transformações. O otimismo em prol da utilização da

Internet para o Jornalismo tem criado muitas expectativas para a transformação na configuração do Jornalismo, especialmente no que tange à participação do leitor. O leitor não é mais visto apenas como leitor passivo, mas como elemento ativo no processo de produção da notícia. Com base nesse cenário, a intenção deste artigo é iniciar uma discussão sobre de que forma a Internet pode qualificar a produção da notícia nos webjornais do interior do Rio Grande do Sul. Discute-se, especificamente, sobre o tipo de participação que esses jornais estão promovendo na produção da notícia. O presente trabalho objetiva realizar um levantamento inicial sobre o Webjor-

nalismo no extremo sul do Rio Grande do Sul, mais especificamente na área territorial denominada Zona Sul. Segundo estatísticas do Sistema de Informações Territoriais do Ministério de Desenvolvimento Agrário1 (MDA), o referido território abrange uma área de aproximadamente 40 mil km². É formado por 25 municípios2, totalizando uma população de cerca de 860 mil habitantes. Para este trabalho, foi selecionada a empresa jornalística Gráfica Diário Popular Ltda., detentora do impresso Diário Popular. Atualmente, a empresa possui sede em Pelotas e uma sucursal em Rio Grande. É o maior veículo jornalístico no formato impresso da Zona Sul do Rio Grande do Sul dedicado proeminentemente ao Jornalismo Interiorano. Tal periódico possui circulação diária em 23 municípios da Zona Sul. A premissa da pesquisa (cf. DORNELLES, 2011) é de que a utilização das novas tecnologias de comunicação e informação pelas empresas jornalísticas do interior, ainda que de forma gradual, tem favorecido a qualificação do Jornalismo. Acredita1 http://sit.mda.gov.br 2 Amaral Ferrador, Arroio Grande, Candiota, Capão do Leão, Aceguá, Arroio do Padre, Canguçu, Cerrito, Herval, Hulha Negra, Morro Redondo, Pedras Altas, Pedro Osório, Pinheiro Machado, Piratini, Chuí, Cristal, Jaguarão, Pelotas, Rio Grande, Santa Vitória do Palmar, Santana da Boa Vista, São José do Norte, São Lourenço do Sul e Turuçu.


-se também que a criação de novos cursos de graduação em Jornalismo no interior e o crescimento no número de acessos domiciliares à Internet, conforme indicativos do do Jornalismo Interiorano. A perspectiva idealizada é de fortalecimento dos jornais do interior para os próximos dez anos. O interesse de pesquisa, neste momento, é centrado nos mecanismos de parti-

partir da participação do público – estão transformando as suas práticas jornalísticas. Nesta primeira aproximação de pesquisa, foram analisadas as ferramentas de interatividade no site do Jornal Diário Popular: www.diariopopular.com.br. Dentro da perspectiva da análise de conteúdo aplicada ao Jornalismo (HERSCOVITZ, 2008), também se tomou como base para a análise a totalidade de entradas informativas publicadas durante o período de uma semana – de 20 a 26 de junho de 2012. Atentou-se, neste momento, para elementos como convergência midiática, comentários e hipertextualidade. A discussão está alicerçada, principalmente, nos pressupostos teóricos de Quadros (2005), Primo (2007), Primo e Träsel (2006) e Pavlik (1997). O Jornalismo na Web O surgimento da Word Wide Web trouxe a expectativa de transformação das formas do fazer jornalístico. Em vez de mero receptor, passivo, o leitor poderia se tornar o produtor de notícias. Conforme relatam Primo e Träsel (2006), a noção de hipertexto digital já anunciava o apagamento entre os limites entre autor e leitor. Com a liberação do polo emissor (LEMOS, 2002), o modelo transmissionista (emissor-mensagem-canal-receptor) é parcialmente superado. Antes, poucos se manifestavam perante muitos. A partir do aumento do acesso às tecnologias de comunicação e informação, as audiências também se tornam capazes de ser ouvidas/lidas/assistidas. Se não o são pela mídia tradicional, manifestam-se por outras formas, como os sites de redes sociais (cf. BOYD e ELLISON, 2007) e os weblogs. (...) o jornalismo digital trouxe uma esperança em tornar os meios de comunicação mais democráticos com a proliferação dos diários na web, pois era prometida uma interação plena do internauta que o transformaria em produtor da notícia. Hoje, a troca da comunicação e a inversão de papéis entre consumidores e produtores da notícia raramente ocorre nos jornais digitais, ao contrário do que professavam teóricos do ciberespaço. De 1995 a 2005, contudo, o impacto das tecnologias avançadas da comunicação se refletiu nas rotinas produtivas de todos os

4 - n . 2 - v. 2

-descritivo. Objetiva-se, em longo prazo, discutir de que forma os jornais do interior – a

ano

cipação do leitor no webjornalismo. A abordagem aqui utilizada é de caráter analítico-

Revista GEMI n IS |

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), contribuem para a qualificação

155


impresso e radiofônico, estabelecia uma oposição nítida entre produção e recepção das tes em toda forma de expressão jornalística, o sistema produtivo industrial marcado pela mídia tradicional determina funções e papeis bem definidos sobre quem produz a notícia e quem a recebe. A participação do “receptor” já era prevista nesses veículos, como, por exemplo, por meio de envio de cartas endereças à redação do jornal, presenNo caso do jornal impresso, espaços dedicados à participação do público já existiam. No entanto, essa participação era limitada por questões de espaço e de conteúdo. Além disso, a utilização do leitor não se dava pelo mesmo meio pelo qual este recebia a informação. Um leitor do jornal impresso não podia manifestar-se diretamente; necessitava de um meio de comunicação acessório, como o telefone, por exemplo. Essa dependência de outros meios, discute-se, poderia desestimular a participação do leitor

dos sujeitos, permitindo a livre circulação de informação (LEMOS, 2002; LÉVY, 1999). A lógica do hipertexto tornou real a possibilidade de uma rede aberta e livre, em que toda a informação poderia ser compartilhada. Tudo poderia estar conectado pela criação da World Wide Web, a versão gráfica da Internet, acessível a partir de qualquer navegador (BRIGGS e BURKE, 2002). Por meio do hipertexto, tornou-se possível saltar de um corpo de informação a outro. Esse processo transformaria o paradigma dos modelos de comunicação que se conhecia até então. Primo (2007) estabelece uma dicotomia a respeito das formas de interação mediada por computador. No ambiente digital, conforme o estudo desse autor, existem as (1) interações mútuas e as (2) interações reativas. No primeiro caso, a interação dá-se com base na cooperação, negociação e criação. Por outro lado, as interações reativas definem-se pelas respostas preestabelecidas, sem a possibilidade de interferir nos “caminhos” dispostos pela interação. Uma abrangente, outra limitada: o contraste centra-se, por exemplo, em um usuário que, em um determinado momento, tem a possibilidade de acessar ou não uma notícia, daquele ator que é capaz de escolher editá-la, melhorá-la, ampliá-la e reconstruí-la.

J andré Corrêa B atista - A line Reinhardt da S ilveira Larissa Rilho Munhoz - B eatriz Corrêa Pires D ornelles

transformações. A Internet é capaz de proporcionar maior autonomia à participação

No contexto da comunicação mediada por computador, esse cenário passa por

um

(PRIMO e TRÄSEL, 2006).

Webjornalismo Interiorano: B rasil

cialmente ou por ligações telefônicas.

de I nteratividade no

notícias. Conforme Primo e Träsel (2006), mesmo que diferentes vozes estejam presen-

A s Ferramentas

Até o início da década de 1990, o jornalismo conhecido até então, televisivo,

156 retrato da participação do leitor no extremo sul do

meios de comunicação de massa, e os jornais digitais evoluíram apesar da inaptidão da maioria deles com relação à interatividade (QUADROS, 2005, p.3).


nalismo uma exploração constrangida dos recursos de hipermídia, como, por exemplo, infografias e atualização de notícias. Nessa discussão, Pavlik (1997) estabelece três fases do Jornalismo na Internet. A primeira definiu-se pela transposição de conteúdos produzidos para outros formatos para o meio digital. A segunda é marcada pela adaptação desses conteúdos para o formato digital, por meio de hiperlinks e outras ferramentas de interatividade. Por fim, a terceira é relativa à produção de conteúdos originais para o formato on-line. No entanto, conforme Quadros (2005) são escassos os veículos de comunicação que se dedicam às possibilidades interativas possibilitadas pela Web. A entrada desses veículos, segundo a autora, deve-se ao receio pela perda de leitores/clientes para outras formas de se acessar a informação, como os weblogs, sites de redes sociais etc.. Poucos jornais ou revistas na web interagem com o usuário, pois a interatividade propalada por muitos desses meios não passa de um simulacro. Mas, no ciberespaço, as alternativas disponíveis ao usuário permitem que ele tenha voz ativa, alguém que o escute - ainda que isso signifique uma única pessoa - e um lugar para obter informação relevante do seu ponto de vista. Com isso, os meios de comunicação tradicionais e as suas versões digitais voltam a se preocupar com a possível migração de sua audiência para blogs ou outras experimentações interativas na rede mundial dos computadores. Na tentativa de reconquistar e/ou ampliar o seu público, empresários da comunicação olham com mais seriedade as mudanças em seu entorno, buscando adaptar e até criar algumas idéias que atraiam o usuário/leitor/telespectador/ouvinte. No entanto, a preocupação deles pelo público pode ser resumida em um interesse central: o lucro. (QUADROS, 2005, p.10).

De forma a estabelecer um conceito operacional, adota-se a noção de “webjornalismo participativo”, como idealizada ao Jornalismo na era da web. Segundo definição de Primo e Träsel (2006), por webjornalismo participativo entendem-se as práticas

4 - n . 2 - v. 2

de transposição de conteúdos. Em seguida, conforme Quadros (2005), iniciou-se no jor-

ano

No início da Web, registrou-se uma exploração no jornalismo na perspectiva

157 Revista GEMI n IS |

Em meados dos anos 90 do século XX, com o desenvolvimento da web, as tecnologias que envolvem a Internet passam a ser acessíveis tanto econômica quanto tecnicamente para a sociedade em geral. Em decorrência, ocorre a utilização em larga escala desse ambiente para usos jornalísticos, sendo que, são as versões digitais de jornais já existentes no suporte papel que se tornam mais visíveis diante do público leigo. Porém, antes do surgimento da web, a internet já era utilizada para a disseminação de informações jornalísticas. Na maioria dos casos, os serviços oferecidos eram direcionados para públicos muito específicos e funcionavam através da distribuição de e-mails (MIELNICZUK, 2003, p. 20).


jornalísticas na web que não promovem o apagamento da distância entre leitura e produção, nos casos em que o limite entre os dois extremos não existe ou não é nitida-

“webjornalismo” para abarcar as publicações jornalísticas na web. Jornalismo On-line ou Jornalismo Digital poderiam abranger também a compreensão sobre o Jornalismo

Um quadro do jornalismo do Interior Entende-se como Jornalismo Interiorano aquele que privilegia a atuação regiobase em Mercadé (1992), que o jornalismo interiorano fixa-se quanto à sua importância por estabelecer junto ao leitor a percepção do contexto local acerca dos conteúdos (sendo esta a sua maior vocação). O Jornalismo Interiorano, assim, “parece evidenciar que a imprensa local constrói a sua razão de ser, a sua especificidade e a sua força entre a sua localização territorial e a territorialização dos seus conteúdos” (DORNELLES, 2011, p.3).

Sul. Possui uma popular de mais de 328 mil habitantes, segundo o IBGE/2010. Nessa ci-

dade, também, há ampla presença de instituições universitárias públicas e privadas. A Universidade Católica de Pelotas (UCPel), a Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Sul-Rio-grandense (IF-Sul) são alguns exemplos. O curso de graduação na área de Comunicação Social é oferecido em Pelotas pela Universidade Católica de Pelotas desde 19583. Os cursos de comunicação social – habilitação em Jornalismo e Publicidade e Propaganda estão em funcionamento no Centro de Educação e Comunicação da Universidade Católica de Pelotas (UCPel). Em 2009, criou-se 3 Informações disponíveis no website da instituição: www.ucpel.tche.br

mica, acadêmica e populacional, o município de Pelotas. Pelotas é a maior cidade da Zona

um

Para o recorte desta pesquisa, foi selecionado, por critérios de relevância econô-

J andré Corrêa B atista - A line Reinhardt da S ilveira Larissa Rilho Munhoz - B eatriz Corrêa Pires D ornelles

A bibliografia especializada em “Jornalismo Interiorano”, até onde pudemos pesquisar, é muito pequena e, muitas vezes, equivocada, pois ainda não credita aos jornais do interior a importância que eles de fato possuem para as suas comunidades, bem como não apresenta estudos aprofundados sobre a forma de produção dessas publicações. É bem mais fácil encontrar críticas ao jornalismo interiorano do que propostas para contornar problemas que afetam a qualidade do noticiário (DORNELLES, 2011, p.1).

Webjornalismo Interiorano: B rasil

nal ou especificamente a localidade em que está a sede da empresa. Percebe-se, com

de I nteratividade no

que se utiliza de tecnologias de transmissão de dados (instantânea e em tempo real).

A s Ferramentas

“webjornalismo participativo”. Segundo Mielniczuk (2003), há maior especificidade em

retrato da participação do leitor no extremo sul do

mente esclarecido. Os autores baseiam-se em Mielniczuk (2003) para designar o termo

158


na Universidade Federal de Pelotas (UFPel) – dentro das políticas expansionistas do Programa de Reestruturação das Universidades Federais (REUNI) – a graduação em “Jorna-

do Brasil ainda com circulação ininterrupta. Para a empresa, quatro momentos são considerados marcantes no que se refere à reformulação de seus produtos e serviços: I) em as impressões a cores. Naquele mesmo ano, a empresa lançou o seu primeiro website (colocavam-se on-line os conteúdos produzidos, na íntegra, para o formato impresso, processo conhecido como transposição); III) dez anos depois, em 2007, a empresa expandiu-se, criando a sucursal no município de Rio Grande; IV) em 2009, a empresa apenas à reprodução de conteúdos pensados para o formato impresso5, mas destinado à participação do leitor e à divulgação de conteúdos diretamente/previamente pela Internet. No final de 2012, a terceira geração do site do Diário Popular foi disponibilizada, com a proposta de “além de transpor para a Internet conteúdos do impresso”, ter “uma seção dedicada ao jornalismo on-line, onde o leitor poderá conferir os fatos da região,

Atualmente, o Diário Popular possui tiragem de 20 mil exemplares, com circulação de segunda a sábado. Aos domingos, o montante diário é de 27 mil7. Circula em 23 municípios, tendo o seu foco de atenção os municípios da Zona Sul do Estado. Na redação, quase a totalidade dos repórteres são formados ou estão com o curso em andamento na graduação em Comunicação Social – Habitação em Jornalismo da Universidade Católica de Pelotas (UCPel). No entanto, até o final do primeiro semestre de 2012 não havia aproximações significativas entre o novo curso da Universidade Federal de Pelotas e a redação do Jornal Diário Popular. Até então, não havia sido registrada a inserção dos primeiros estudantes de jornalismo, na condição de estagiários. O site antigo, baseado na transposição, ainda está disponível na rede. As notícias publicadas de 2001 a 2009 podem ser acessadas pelo endereço http://srv-net.diariopopular.com.br/edicoes.html.

4 Informações disponíveis no webiste da instituição: www.ufpel.edu.br 5 Informações disponíveis no website da instituição: www.diariopopular.com.br 6 Informações disponíveis no website da instituição, na seção História http://www.diariopopular.com.br/index. php?n_sistema=3124 7 Informações obtidas junto à coordenação de produção da redação do Jornal Diário Popular.

J andré Corrêa B atista - A line Reinhardt da S ilveira Larissa Rilho Munhoz - B eatriz Corrêa Pires D ornelles

na Zona Sul”6.

a tradição de ser ponto de referência na cobertura de notícias, serviços e entretenimento

um

do Estado, do País e do mundo. Através de um portal em constante atualização, reforça

Webjornalismo Interiorano: B rasil

reformulou as suas atividades na Internet, com o lançamento de um site dedicado não

de I nteratividade no

1981, o Diário Popular passou a circular no formato tabloide; II) em 1997, iniciaram-se

A s Ferramentas

O jornal Diário Popular foi fundando em 1890. É o terceiro diário mais antigo

retrato da participação do leitor no extremo sul do

lismo e Comunicação”, lotada originalmente na Faculdade de Letras daquela instituição4.

159


Figura 1 - primeira versão do site do Jornal Diário Popular, utilizado para a transposição integral conteúdos da versão impressa

160 Revista GEMI n IS | ano

4 - n . 2 - v. 2

Figura 1 - Website BaixaTV.com

Figura 2 - segunda geração do site do Jornal Diário Popular

Um levantamento sobre as Ferramentas de Interatividade A abordagem metodológica pretendida para esta pesquisa centra-se nos pressupostos da análise de conteúdo aplicados ao Jornalismo, conforme sugere Herscovitz


(2008), reunindo, assim, elementos quali e quantitativos. Segundo a autora, a análise de conteúdo no Jornalismo consiste em um

poníveis no site. O segundo refere-se às ferramentas de interatividade presentes nas notícias publicadas.

dessa hiperligação, abre-se um formulário para que o leitor possa entrar em contato com o setor da empresa desejado. Informa-se ao leitor: “se você tem dúvidas ou sugestões, entre em contato com o Diário Popular. Você pode enviar mensagens via e-mail, obter informações por telefone ou na sede do Jornal”. No módulo inferior, após as chamadas para as matérias e o os anúncios publicitários, há uma série de hiperligações que também possibilitam uma interação mais objetiva com a empresa. Compõem tal módulo, intitulado “serviços e ferramentas”, as seguintes hiperligações: “Você Multimídia”, “Foto do Leitor”, “Sugestão de Pauta”, “Mural do Diário”, “Comente o Impresso”, “Sua Opinião no Diário” e “Comente o Impresso”. Por “Você Multimídia”, o leitor pode enviar fotos – de até três megabytes – e vídeos – de até cinco megabytes – para o site. Na descrição do serviço, a empresa sustenta que “se você registrou imagens de um fato que possa virar notícia, envie ao Diário Popular. Suas fotos e vídeos podem ser publicados em nosso site e até mesmo na edição impressa”. As fotos selecionadas também podem ser visualizadas no site (não apenas as publicadas no impresso). Já em “sugestão de pauta”, o leitor que não registrou, mas que “viu ou ouviu algo que possa ser notícia” poderá enviar a sugestão de pauta ao Diário

J andré Corrêa B atista - A line Reinhardt da S ilveira Larissa Rilho Munhoz - B eatriz Corrêa Pires D ornelles

opções como “Assine” e “Anuncie”. Há um hiperlink na opção “Fale Conosco”. Por meio

e o leitor. O primeiro é logo acima da página, no módulo superior (header), ao lado de

um

Na portada do site, há dois espaços que possibilitam a interação entre a empresa

de I nteratividade no

Popular. A intenção é encontrar os meios de participação do leitor imediatamente dis-

A s Ferramentas

to de dados. O primeiro é relativo à portada (página principal) do site do Jornal Diário

Webjornalismo Interiorano: B rasil

Para a presente pesquisa, construíram-se dois focos de atenção no levantamen-

retrato da participação do leitor no extremo sul do

método de pesquisa que recolhe e analisa textos, sons, símbolos e imagens impressas, gravadas ou veiculadas em forma eletrônica ou digital encontrados na mídia a partir de uma amostra ou não dos objetos estudados com o objetivo de fazer inferências sobre seus conteúdos e formatos enquadrando-os em categorias previamente testadas, mutuamente exclusivas e passíveis de replicação. A identificação sistemática de tendências e representações obtém melhores resultados quando emprega ao mesmo tempo a análise quantitativa (contagem de frequências do conteúdo manifesto) e a análise qualitativa (avaliação do conteúdo latente a partir do sentido geral dos textos, do contexto onde aparece, dos meios que o veiculam e/ou dos públicos aos quais se destina) (HERSCOVITZ, 2008, p. 126-127)

161


Popular. Antes, as formas de aproximação do leitor com a redação davam-se via e-mail, pessoalmente na empresa, por telefone ou por meio do envio de cartas. “Foto do Leitor”. Na contracapa do impresso, há um espaço para divulgação de imagens registradas pelos usuários (uma por edição). O envio, não mais apenas por endereço eletrônico, pode ser feito diretamente pelo site. Da mesma forma, por “Mural no

Cadernos, da versão impressa. Na opção “comente o impresso”, o leitor é convidado a enviar dicas, críticas ou elogios à edição impressa. De forma semelhante ao módulo “comente o impresso”, há também a possibilidade de participação pelo hiperlink “sua opinião no Diário”. Abre-se um canal para envio de comentários destinados à publicação de trechos opinativos na versão impressa. Por fim, “Fale com o Pé na Escola” promove a participação do leitor junto ao projeto social da instituição. Na visualização das notícias, encontraram-se vários recursos de interatividade com o leitor, entre os quais estão “Comunique Erros” e “Compartilhe esta notícia”. Nessa segunda opção, facilita-se a divulgação do conteúdo em sites de redes sociais (Facebook8, Orkut9 e o Twitter10) e o serviço de weblogging do Google, o Blogger/Blogspot11. Também há possibilidade de enviar o conteúdo “para um amigo” diretamente do site do Jornal Diário Popular, de aumentar ou diminuir o tamanho da fonte do texto da matéria; de assinar o feed das notícias; de assinar a newsletter, cadastrando o e-mail do leitor; e de comentar o conteúdo publicado online. Os comentários tornam-se públicos, mediante avaliação da empresa; são publicados (com o limite de 500 caracteres) logo abaixo do texto da matéria. Para o levantamento de dados sobre os recursos de interatividade utilizados na veiculação das notícias, acompanharam-se todas as entradas informativas e de opinião publicadas no site do jornal Diário Popular durante o período de uma semana, arbitrado para esta pesquisa durante os dias 20 a 26 de junho de 2012. No período, foram publicadas 334 entradas, entre matérias informativas e textos de opinião. Tomaram-se como base para este estudo as 288 entradas informativas publicadas (excluindo-se os espaços opinativos). Destas, 128 matérias possuem informação de autoria própria (aprox. 44,4%). Quanto à utilização da imagem, percebe-se que a maioria das matérias não é

8 http://www.facebook.com 9 http://www.orkut.com 10 http://www.twitter.com 11 http://www.blogger.com

4 - n . 2 - v. 2

Mural do Diário Popular”. Essa seção está relacionada à página “Bichos”, da editoria de

ano

Diário”, o leitor pode mandar “fotos do seu bichinho de estimação para fazer parte do

Revista GEMI n IS |

Outra possibilidade de enviar matérias digitais à empresa é pelo hiperlink

162


acompanhada por fotografias. Das 288 entradas informativas, 126 possuíam pelo menos uma imagem, fotografia ou ilustração (aprox. 43,7%). No período estudado, quatro

de um mesmo recurso multimídia em quatro ocasiões – um mapa da ferramenta Google Maps – que apresenta as localidades dos casos de homicídio registrados no município ca, a utilização de vídeos foi encontrada em três momentos. Em dois desses, incorporou-se à matéria um vídeo promocional hospedado no site Youtube.com. Em um caso, a empresa apresentou um produto próprio, com a marca da empresa, hospedado no site do Jornal Diário Popular. 63 entradas, o que corresponde a aproximadamente 21,9%. Das matérias comentadas, 88,9% apresentavam mais de uma intervenção do leitor. Os índices mais altos ficaram por conta de uma matéria da editoria de Esportes publicada na quinta-feira, em 20 de junho, com 24 comentários, e de uma entrada da editoria de Polícia que somou 20 comentários. A média de comentários por publicação (considerando 288 como total) é

Em relação à hipertextualidade, o número de matérias com hiperlinks externos (em relação ao site) foi de 22 entradas com pelo menos um hiperlink, o que corresponde a aproximadamente 7,64%. Além disso, em oito vezes proporcionaram-se hiperlinks “internos” ao leitor, isto é, a possibilidade direta de navegação pelo site por matérias relacionadas. Com base nos dados levantados, pode-se perceber que o veículo on-line do Jornal Diário Popular tem conseguido ampliar a participação do leitor nos últimos três anos (desde o lançamento do novo site). No entanto, tal participação ainda é incipiente em face das possibilidades de interação oferecidas pela Internet. A utilização de fotografias, por exemplo, parece ainda replicar a limitação de espaço do Jornal Impresso. Em menos da metade das ocasiões, apenas uma fotografia foi utilizada para acompanhar o texto jornalístico. Em poucos casos, o leitor pôde ter acesso a mais de uma fotografia sobre o mesmo episódio. O acesso à informação de quem lê o Jornal Impresso é pouco diferente daquele que lê o webjornal. No período em análise, percebe-se que os conteúdos não se complementam; um formato concorre com o outro. A hipertextualidade parece também não ser ainda explorada em seu pleno po-

J andré Corrêa B atista - A line Reinhardt da S ilveira Larissa Rilho Munhoz - B eatriz Corrêa Pires D ornelles

futebol) o registro mais elevado de comentários.

mente 38,7% dos comentários totais. É das matérias esportivas (sobre os times locais de

um

de 0,79, sendo que as oito matérias mais comentadas são responsáveis por aproximada-

Webjornalismo Interiorano: B rasil

A incidência da participação do leitor no campo comentários foi registrada em

de I nteratividade no

(“mapa da violência em Pelotas”). Sobre os aspectos referentes à convergência midiáti-

A s Ferramentas

Em relação aos recursos gráficos, em matérias da editoria de polícia utilizou-se

retrato da participação do leitor no extremo sul do

matérias (aprox. 1,39%) disponibilizavam ao leitor mais de uma fotografia.

163


tencial, refletindo a lógica do jornalismo Impresso. São poucos os momentos em que são oferecidos hiperlinks ao leitor. Conforme as perspectivas teóricas do hipertexto , 12

O usuário pode navegar, saltar de um corpo de informação por meio dos hiperlinks, construir uma leitura não linear conforme a sua vontade. Essa liberdade de navegação encontra-se na essência da World Wide Web. A realidade percebida no site do Diário Po-

de conteúdos, o modelo on-line da empresa ainda reproduz a lógica de linearidade do impresso. Quanto à convergência, percebe-se escassez na utilização de recursos multimídia. O foco é na palavra escrita e, em segundo lugar, na fotografia (uma só por matéria, na maioria das vezes). Esse modelo de leitura repete o modelo utilizado no impresso: texto sem hiperligações, acompanhados, quando possível, de uma fotografia ou ilustração. Voz e vídeo ainda não fazem parte, na grande maioria das vezes, do novo produto. A leitura das notícias no website reflete a visualização estática proporcionada pelo impresso. Em relação aos comentários, pode-se afirmar que ainda não se registra expressiva participação dos leitores. Possivelmente, a proximidade do formato on-line com o Jornalismo Impresso praticado pela empresa desencoraje a participação ou, pelo serviço ser novidade naquele contexto, não haja uma cultura de participação estabelecida em relação à imprensa. Com o tempo, espera-se que esse quadro possa ser alterado, tratando-se tanto de uma mudança de postura do público em relação à imprensa quanto a uma transformação na política da empresa acerca da participação de seu público. A popularização crescente de meios alternativos de participação do leitor, com os sites de redes sociais, conforme sugere Quadros (2005), pode forçar com que os meios de comunicação permitam mais espaços de participação com o seu público, na intenção de não perder mais espaço no mercado. De modo geral, não negando os avanços e o esforço da empresa, percebe-se que ainda não há propriamente espaços consistentes de participação do leitor. As possibilidades de colaboração encontram-se mais na ampliação dos meios de participação já existentes. O espaço de sugestão de pauta, agora disponível pela Internet, por exemplo, já existia por outros meios: carta, por telefone, e-mail, presencialmente. Outro exemplo: o envio de fotos para a seção “Fotos do Leitor” é pouco maior em número de imagens que podem ser visualizadas na Internet do que a versão impressa. Reflete-se, assim, no 12 Indicamos sobre o assunto PRIMO (2007), QUADROS (2005), MIELNICZUK (2003), SAMPAIO, R. C.;

BARROS, S. A. R. (2010), RECUERO, R.C. (2009).

4 - n . 2 - v. 2

tenha dado passos significativos a uma maior participação do leitor, quanto à leitura

ano

pular é de incipiência na transformação para esse novo modelo de “leitura”. Ainda que

Revista GEMI n IS |

o leitor na Internet é também coautor. Ele possui um papel mais ativo sobre o que lê.

164


on-line, a limitação de espaço do Jornal Impresso. O envio de vídeos também é consideravelmente limitado (cinco megabytes, o equivalente a uma fotografia de alta resolução).

para que os leitores produzam conteúdos. A participação destes dá-se mais nas seções opinativas do impresso e na utilização de recursos gráficos e na sugestão de pauta. O quem produz a notícia e quem a lê. Para se considerar o webjornalismo ali praticado como participativo, há de considerar mais ferramentas que promovam a interação mútua (PRIMO, 2007).

O presente trabalho buscou contribuir para a compreensão do Jornalismo Interiorano do Rio Grande do Sul na sua dimensão on-line. Para tanto, foi feito estudo do website do jornal Diário Popular durante o período de uma semana, arbitrada para esta pesquisa entre os dias 20 e 26 de junho de 2012. O trabalho é um esforço inicial para

trabalho nesta terceira geração de site que agora se apresenta. Também sites de outras empresas jornalísticas do interior do Rio Grande do Sul, em especial da Metade Sul do Estado, estão sendo analisados de forma a tornar mais nítido o retrato do webjornalismo praticado no interior gaúcho. Com base no levantamento de dados, mostrou-se que, desde 2009, com o lançamento da segunda geração do site do Jornal Diário Popular, o leitor conta com mais ferramentas de interatividade com a notícia; existem mais canais de contato com a empresa. É mais fácil enviar fotos e vídeos, fazer comentários, manifestar-se sobre os conteúdos. No entanto, percebe-se que ainda há lacunas para a aproximação desse modelo de jornalismo em relação à noção de webjornalismo participativo (cf. PRIMO e TRÄSEL, 2006). As fronteiras entre leitor e produtor da notícia ainda são consistentes. Também há a necessidade de investigações mais aprofundadas acerca da postura da empresa em relação ao webjornalismo, por meio de entrevistas in loco, que possam revelar se realmente há mais interação com o público por meio dos canais disponibilizados pela Internet, em comparação aos já existentes. Por fim, há de se levar em conta em futuras pesquisas o papel dos leitores, se o consumidor do Diário Popular

J andré Corrêa B atista - A line Reinhardt da S ilveira Larissa Rilho Munhoz - B eatriz Corrêa Pires D ornelles

feitas para poder averiguar se há transformações dos aspectos observados no presente

a mudança do site para um novo modelo, ao final do ano de 2012, novas coletas serão

um

apresentação de um retrato do webjornalismo praticado no extremo sul do Brasil. Com

Webjornalismo Interiorano: B rasil

Considerações Finais

de I nteratividade no

consumidor ainda não é ativo no processo de produção: há uma nítida separação entre

A s Ferramentas

ção de uma maior participação no tange à produção da notícia. Não há ferramentas

retrato da participação do leitor no extremo sul do

Há ampliação dos canais de contato com o leitor, mas ainda não há a promo-

165


realmente busca uma postura mais ativa, como produtor das notícias ou se sua baixa participação é o reflexo do modelo do Jornalismo Impresso na versão on-line, que iniDa mesma forma, para pensar o futuro do Jornalismo Interiorano no caso em tela, há de se traçar um prognóstico acerca dos impactos econômicos nos próximos anos no município, por meio da consolidação do Porto de Rio Grande, na cidade de Rio Gran-

pulação, as transformações estruturais como a reabilitação da linha férrea para transporte de passageiros entre Rio Grande e Pelotas e a duplicação das BR-392 (Rio Grande-Pelotas) e BR-116 (Pelotas-Porto Alegre) podem acarretar diversas transformações no perfil da população e, por consequência, na relação da sociedade com a imprensa.

Referências BOYD, D. M., & Ellison, N. B. (2007). Social network sites: Definition, history, and scholarship. Journal of Computer-Mediated Communication, 13(1), article 11. http:// jcmc.indiana.edu/vol13/issue1/boyd.ellison.html BRIGGS, Asa y BURKE, Peter. De Gutenberg a Internet. Una historia social de los medios de comunicación. Espanha: Taurus, 2002. DORNELLES, Beatriz. Internet qualifica jornais do interior e aproxima leitores. Anais do Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação, 2011. HERCOVITZ, Heloiza. Análise de conteúdo em Jornalismo. In: LAGO, Cláudia; BENETTI, Márcia. Metodologias de Pesquisa em Jornalismo. Petrópolis: Vozes, 2008. MERCADÉ, J. M. La fuerza del periodismo local em la era de la globalización electrónica. Pontevedra, 1992. MIELNICZUK, Luciana. Jornalismo na Web: uma contribuição para o estudo do formato da notícia na escrita hipertextual. Tese de doutorado. Rio de Janeiro: UFRJ, 2003 PAVLIK, John V. El periodismo y los nuevos medios de comunicación. Barcelona: Paidós, 2005. PRIMO, Alex. Interação mediada por computador. Porto Alegre: Sulina, 2007.

4 - n . 2 - v. 2

circulação (e uma sucursal). A possível instalação de novas empresas, o aumento na po-

ano

de (cerca de 40 km de Pelotas), local em que o Jornal Diário Popular também possui

Revista GEMI n IS |

biria a sua participação.

166


PRIMO, A; TRÄSEL, M. Webjornalismo Participativo e a produção aberta de notícias. In: VIII Congresso Latino-americano de

um estudo dos comentários do folha.com. Revista Intexto, Porto Alegre: seer.ufrgs.br/intexto/article/view/16449/0. Acesso em 20 jun. 2012. QUADROS, Cláudia. A participação do público no webjornalismo. www.compos.com.br/e-compos. Dezembro de 2005 - 2/17

de I nteratividade no

UFRGS, v. 2, n. 23, p. 183-202, julho/dezembro 2010. Disponível em: http://

A s Ferramentas

SAMPAIO, R. C.; BARROS, S. A. R. Deliberação no jornalismo on-line:

Webjornalismo Interiorano: B rasil

retrato da participação do leitor no extremo sul do

Pesquisadores da Comunicação, 2006, São Leopoldo. Anais, 2006.

167

um •

J andré Corrêa B atista - A line Reinhardt da S ilveira Larissa Rilho Munhoz - B eatriz Corrêa Pires D ornelles


M aterialidade e memória do Rio de J aneiro nas fotografias de A ugusto M alta e do projeto Rio 365 D ébora G auziski Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da UERJ, na linha de pesquisa “Tecnologias da Comunicação e Cultura”, com bolsa Capes. Pesquisadora do Grupo de Pesquisa “Regimes de visibilidade: a construção da visualidade da fotografia contemporânea” (FCS/UERJ), cadastrado no CNPq. E-mail: deboragauziski@gmail.com

Fausto A maro Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da UERJ, na linha de pesquisa “Cultura de Massa, Cidade e Representação Social”, com bolsa Capes. Pesquisador do Grupo Esporte e Cultura (FCS/UERJ), cadastrado no CNPq. E-mail: faustoarp@hotmail.com

Fernando

do

N ascimento Gonçalves

Doutor em Comunicação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Professor e pesquisador do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. E-mail: fng@uerj.br

Revista GEMI n IS

ano

4 - n . 2 v. 2 | p. 169 - 189


Resumo Neste artigo investigamos a relação da fotografia com a produção e difusão de imagens da cidade do Rio de Janeiro em dois momentos distintos: durante a modernização de Pereira Passos (início do século XX) e no Rio dos megaeventos (século XXI). Em ambos os períodos históricos, a cidade sofreu profundas transformações urbanísticas e a fotografia atua como importante agente nesse processo. Para analisar o papel que a fotografia tem nesse contexto, trabalhamos com as imagens clicadas pelo fotógrafo Augusto Malta e com aquelas produzidas por usuários do Instagram no contexto do projeto Rio 365. Ao longo do artigo, nossa base teórica concentra-se em autores que trabalham ou tangenciam as questões da memória e da materialidade. Palavras-chave: Fotografia; Memória; Materialidade; Instagram; Rio de Janeiro.

Abstract In this article we investigate the relation of photography in the construction of the memory of the city of Rio de Janeiro in two distinct moments: during the modernization of Pereira Passos (early twentieth century) and in Rio of mega events (twenty-first century). In both historical periods, the city has undergone major urban changes and photography acts as an important agent in this process. To examine the role that photography is in this context, we work with the images clicked by photographer Augusto Malta and with those produced by Instagram users in the context of the project Rio 365. Throughout the article, our theoretical basis focuses on authors who work or tangent issues of memory and materiality. Keywords: Photography; Memory; Materiality; Instagram; Rio de Janeiro.


Introdução

C

idades estão em constante transformação. As paisagens urbanas se remodelam conforme edificações e vias vão sendo erguidas e demolidas, sistemas de transportes e de comunicação são implementados, e também com as vivências

e relações de seus habitantes com os novos espaços. Desde o século XIX, tais mudanças vêm sendo flagradas pela fotografia, tor-

nando possível acompanhar esse processo ao longo da história, mesmo quando o que está registrado nelas já não existe mais. Podemos considerá-las, em princípio, como um suporte mnemônico, uma vez que são “elos documentais e afetivos que perpetuam a memória” (KOSSOY, 2002, p. 139). Contudo, registrar e produzir memória são também uma operação de produção de realidade. Uma realidade que existe a partir de certos olhares e fazeres que organizam nossa experiência sensível e evidenciam, assim, o aspecto de “construção” da fotografia, como bem apontam Dubois (1993), Didi-Huberman (2008) e Rancière (2009, 2012). No caso da moderna cidade do Rio de Janeiro do início do século XX, a tarefa de preservar e difundir a memória das cidades por meio da fotografia contava curiosamente com a ajuda de fotógrafos oficiais, como Augusto Malta, funcionário da prefeitura de Pereira Passos1. Malta legou-nos uma espécie de “biografia imagética” da cidade desse período. Certamente, como parte de um esforço institucional, tal “biografia” deve ser entendida também como um rastro do processo de construção da memória do Rio e de sua difusão por meio de imagens. Problematizamos esta questão por meio da comparação com os usos da fotografia em projetos de construção da memória e da imagem da cidade na atualidade. De fato, um século mais tarde, com a ampla popularização do fazer fotográfico, especialmente após o surgimento das câmeras digitais, produzir e difundir memória se tornou acessível a um maior número de pessoas. O processo é agora mais barato e

1 Natural de São João Marcos do Príncipe, município do Rio de Janeiro extinto na década de 1940 para a construção de uma represa, Francisco Pereira Passos (1836-1913) era engenheiro e foi prefeito do Rio entre 1902 e 1906.


prático. Como consequência, um intenso fluxo de imagens circula em diferentes suportes. A foto impressa passa a dividir cada vez mais espaço com a virtualidade das redes

Alinhado a esse pensamento, o projeto Rio 365 é um exemplo desse incremento de fluxos imagéticos que constroem e difundem memória social dos espaços urbanos neste cenário tecnológico. Proposta em progresso, o Rio 365 tem como objetivo principal ser o primeiro documentário fotográfico colaborativo de uma cidade feito no mundo através do Instagram2. Ao longo de 52 semanas serão lançadas 52 missões3 temáticas que, ao final do projeto, darão origem a um livro com as 365 fotos selecionadas (os curadores escolhem mais de uma foto por missão). De acordo com André Galhardo, seu realizador, a potencialidade do Instagram comparado a outras redes sociais encontra-se partilhar imagens, num processo de ideias circulantes em que um influencia o outro, como se fosse uma grande exposição mesmo”4. A iniciativa teve início em outubro de 2012, com o desafio inicial “arte”. Con-

cleo da Ideia5. Segundo a Light, o projeto busca “incentivar cariocas e turistas a olhar e conhecer mais a fundo as paisagens e cenários do Rio, compartilhando esta experiência nas redes sociais, a partir do Instagram”6. As imagens são republicadas no Tumblr, Facebook e Twitter, bem como geram comentários em blogs e sites culturais, além da repercussão em veículos impressos. Com isto, já é possível perceber que o processo de construção de memória proposto nesta iniciativa apresenta elementos que organizam de forma particular uma imagem da cidade, com continuidades e descontinuidades em relação a processos anteriores. Neste artigo, discutiremos as relações entre as diferentes materialidades da memória fotográfica da cidade do Rio de Janeiro em dois momentos distintos: durante

profundas transformações urbanísticas, e a fotografia, de certa forma, cumpre a função de organizar visualmente os registros dessas mudanças, ao mesmo tempo em que forja 2 Aplicativo de compartilhamento de imagens para plataformas móveis (celulares e tablets). Endereço oficial: <http://www.instagram.com>. 3 Temas variados escolhidos pelos organizadores do projeto reunidos em torno de uma hashtag, à qual os seguidores se embasam para produzir suas fotos semanais. 4 Disponível em: <http://www.cultura.rj.gov.br/materias/rio-de-todos-os-dias>. Acesso em: 14 dez. 2012. 5 Disponível em: < http://www.nucleodaideia.com.br/>. Acesso em: 22 dez. 2012. 6 Disponível em: <http://conexaolight.com.br/10/rio-365-um-documentario-fotografico/ >. Acesso em: 22 dez. 2012.

N ascimento Gonçalves

nha vinculada à cidade pela mídia). Em ambos os períodos históricos, a cidade sofreu

do

a modernização proposta pelo prefeito Pereira Passos e o “Rio dos megaeventos” (alcu-

D ébora G auziski - Fausto A maro - Fernando

tado do Rio de Janeiro e concepção da agência Horto, o Rio 365 é uma realização do Nú-

tando com o patrocínio e apoio da Light e da Secretaria de Cultura do Governo do Es-

nas fotografias

em seu “potencial artístico”: “As pessoas estão mais preocupadas em produzir e com-

M aterialidade e memória do Rio de J aneiro A ugusto M alta e do projeto Rio 365

e modos de construir imagens do cotidiano.

de

sociais, como o Instagram. Essa nova materialidade pressupõe também funções sociais

171


e enaltece uma determinada imagem do Rio de Janeiro. Para analisar os dois cenários, trabalhamos com as imagens clicadas pelo fotógrafo Augusto Malta (1867-1957) e com propomos a problematização da noção de arquivo e memória em meio ao cenário tecnológico contemporâneo e dos usos feitos da fotografia nesse contexto.

A segunda metade do século XIX foi um período de profundas transformações sociopolíticas e tecnológicas na cidade do Rio de Janeiro. O trabalho escravo era progressivamente substituído pelo assalariado e a instalação da República, a partir de 1889, se esforçava para deixar para trás o modelo colonial. A chegada de inovações como iluminação a gás (1854), estradas de ferro (1861) e rede de esgoto (1864) aos poucos transformavam a paisagem urbana e o ritmo de vida dos cidadãos. Na primeira metade do século XX, mais precisamente na década de 1930, conforme Barbero (2009), presenciávamos um novo rumo na constituição dos países latinos enquanto nações independentes, caminhando para uma modernidade peculiar baseada na formação de mercados internos. Nesse processo, o antropólogo destaca o papel “que os meios de comunicação desempenham na nacionalização das massas populares” (2009, p. 226). No contexto brasileiro da cidade do Rio de Janeiro, o clima de crescimento econômico, populacional e de atividades culturais era, desta feita, reflexo de um quadro maior em curso na América Latina, que vivenciava uma “irrupção das massas na cidade” (Ibid., p. 232). A cidade passa a ocupar um lugar central na vida das nações latino-americanas, tanto no campo político quanto cultural – o Rio, como metrópole e então capital do país, desempenha papel ainda mais central nesse sentido. O aumento significativo da população7, entretanto, não acompanhava a infraestrutura do território, incapaz de suprir as necessidades econômicas e dos habitantes. As ruas eram estreitas, sujas de lama e lotadas de carroças, o que dificultava o transporte de mercadorias e o acesso ao porto, que era o mais importante do país à época. As moradias, em grande parte cortiços, eram escassas e degradadas. Epidemias de cólera e febre amarela atribuíam à cidade uma má reputação internacional de ser um local insalubre e sujo. Essas características davam, então, um aspecto de atraso ao país quando comparado ao padrão dos planos de urbanização da Europa. O próprio presidente Rodrigues Alves afirmava com veemência que “os defeitos da capital afetam e perturbam 7 Pechman (1993) apresenta o dado de que a população da cidade, que, em 1838, era de 137 mil habitantes, havia chegado a 811 mil em 1906.

4 - n . 2 - v. 2

documento

ano

1 Produção de memórias urbanas: uma problematização da fotografia como

Revista GEMI n IS |

aquelas produzidas por usuários do Instagram no contexto do Rio 365. Desse modo,

172


todo o desenvolvimento nacional” (apud SANTOS, 2007, p, 115). Foi o prefeito Pereira Passos, gestor entre 1902 e 1906, que instituiu o plano

das, já que o principal objetivo era alinhá-la aos moldes europeus com base nas reformas de Haussman, que Passos havia acompanhado durante sua temporada de estudos em Paris, entre 1857 e 1860. Para tanto, seria preciso desfazer a imagem do Brasil como um país agrário e escravocrata para dar lugar à modernidade e ao progresso. A intenção não era estimular a criação de uma identidade própria para o território, mas transformá-lo numa espécie de “Paris tropical”. Como as principais medidas do plano8 eram a abertura e ampliação de vias e reforma de praças e bulevares, diversos imóveis tiveram de ser derrubados. de “bota abaixo”. Esse período também foi marcante na definição de espaços economicamente distintos dentro da cidade, pois, antes da reforma, diversas classes sociais habitavam a região central. Ao terem que abandonar suas casas, a população buscava

Com o objetivo de introduzir uma nova memória urbana – e, consequentemente, apagar a antiga – foram construídos diversos monumentos arquitetônicos, inspirados no estilo eclético francês, que recaracterizaram a cidade: o Teatro Municipal, o Palácio Monroe e o Aquário do Passeio Público, no Centro, e o Pavilhão Mourisco, em Botafogo. Lilian Vaz (2000, p. 1) aponta que as fotografias retrataram essa transição do Rio de Janeiro de “atrasado” para a moderna capital federal burguesa. As imagens da modernidade carioca tiveram como dois principais expoentes os fotógrafos Marc Ferrez e Augusto Malta9. Nesse trabalho, entretanto, daremos enfoque somente na obra do segundo. Augusto Malta, relativamente bem referenciado pela academia10, produziu um relevante registro das transformações do espaço urbano carioca

que utilizava para fazer as entregas. Sua carreira profissional teve início quando um 8 Para mais informações sobre o plano de urbanização de Pereira Passos, conferir Andreatta (2006). 9 A coleção de fotografias de Malta pode ser acessada em alguns endereços eletrônicos como, por exemplo: o IMS (<http://ims.uol.com.br/Augusto_Malta/D92>), a Biblioteca Nacional (<http://bndigital.bn.br/redememoria/galerias/maltaMHN/index.htm>) e o próprio portal Augusto Malta (<http://portalaugustomalta.rio.rj.gov.br/>). 10 Boni aponta que no meio acadêmico Malta é bastante lembrado: “Muitos já se debruçaram sobre sua vida e obra, o que rendeu alguns trabalhos de conclusão de curso” (2010, p. 215). Dentre as obras que envolveram maior tempo de pesquisa, por serem teses ou dissertações, destacamos: Carrilho (2000), Costa (2007), Sousa (1996), Oliveira Júnior (1994), Moreira (1996) e Hollanda (1995).

N ascimento Gonçalves

do um dos clientes de sua loja de tecidos lhe ofereceu uma câmera em troca da bicicleta

do

entre os anos 1903 e 1936. Malta foi um autodidata: começou a fotografar em 1900, quan-

D ébora G auziski - Fausto A maro - Fernando

riam para as periferias e favelas e as ricas para a Zona Sul.

novos endereços, dando início a uma divisão social territorial: as classes pobres migra-

nas fotografias

Como não eram poupados esforços nas demolições, a política foi apelidada por críticos

M aterialidade e memória do Rio de J aneiro A ugusto M alta e do projeto Rio 365

101). As condições sanitárias da cidade serviram apenas como pretexto para as medi-

de

geral de reformulação da capital, cujo epíteto era “o Rio civiliza-se” (SANTOS, 2007, p.

173


amigo, admirador de seus retratos, o apresentou ao então prefeito Pereira Passos, que o contratou com a função de registrar os imóveis que seriam demolidos para a construção as fotografias serviriam, então, para auxiliar nas indenizações pós-demolição” (BONI, 2010, p. 218). A obra de Malta possui entre 30.000 e 60.000 chapas, considerado um número

pé, carregando uma enorme e pesada câmera fotográfica, um tripé de madeira, um flash de magnésio e, claro, uma maleta com as ‘chapas’ (negativos) de vidro” (Ibid., p. 222). Aqui, pode-se depreender o motivo pelo qual os fotógrafos desse período privilegiavam os retratos, as vistas panorâmicas e os espaços abertos nas imagens produzidas. Vaz (2000, p.6) aponta que, até a virada do século, registros fotográficos de cenas em movimento só eram possíveis em ambientes com suficiência de luz e pouca movimentação, pois o obturador das câmeras era muito lento, e os “objetos em movimento não passavam de borrões nas imagens cuidadosamente programadas” (Ibid., p.7). Além disso, os pesados equipamentos não davam mobilidade ao fotógrafo e podiam tumultuar o cotidiano, afinal despertavam curiosidade nos transeuntes. Ou seja, o tema estava vinculado à técnica, uma vez que a materialidade da máquina influenciava diretamente a forma de produção. Figura 1 – Um trecho da Avenida Central (191-) e Rua do Resende (1906), respectivamente, pelas lentes de Augusto Malta

Fonte: Museu Histórico Nacional. Disponível em: <http://bndigital.bn.br/ redememoria/galerias/maltaMHN/index.htm>. Acesso: 18 jan. 2013.

4 - n . 2 - v. 2

o processo tinha um alto custo: “Malta tinha que deslocar-se de bonde, de bicicleta ou a

ano

elevado, levando em conta que o aparato fotográfico da época não oferecia praticidade e

Revista GEMI n IS |

da Avenida Central (atual Rio Branco): “a prefeitura tinha pressa nas desapropriações e

174


As fotografias dessa época são, então, uma ferramenta para se estudar os processos de construção da memória urbana do Rio de Janeiro. Entretanto, apesar dessas

valor em si mesmas, por mais óbvias que possam parecer. Para contemplar uma foto, seu “leitor” deve mobilizar uma série de referências dentro de uma complexa rede de relações que lhe atribui significações (Cf. RANCIÉRE, 2009). A esse respeito, Rancière afirma que toda imagem só pode ser compreendida a partir da observação da rede de elementos em que está inserida. No caso, seus modos de produção e de circulação e os sistemas de visibilidade, que a torna possível e legítima num determinado momento histórico. É por meio da combinação dos elementos que compõem esse circuito que os sentidos e as funções das imagens são construídos. fotografia como documento. Como afirma Dubois (1993), nesta perspectiva que privilegia o aspecto indicial e de verossimilhança da imagem, a foto é considerada como um “espelho do real”: “A foto é percebida como uma espécie de prova, ao mesmo tempo

lação a outras técnicas, por ser produzida através de um aparelho, que é pretensamente neutro, pois “dizer que ‘a câmera não pode mentir’ é simplesmente sublinhar as múltiplas ilusões que ora se praticam em seu nome” (McLUHAN, 2007, p. 219). Flusser (2011) critica essa visão da fotografia, apontando que ela é acima de tudo uma construção, apesar de ser tomada por alguns observadores como uma janela para o mundo: “A aparente objetividade das imagens técnicas é ilusória, pois na realidade são tão simbólicas quanto o são todas as imagens” (Ibid., p. 31). De acordo com o autor, o que as imagens técnicas nos oferecem não é o mundo, mas conceitos relativos a ele. Não é por outra razão que Dubois (1993), a partir de um diálogo com a arte, propõe pensar a fotografia como “imagem-ato”, na medida em que não seria possível

tação, por exemplo, não poderiam ser tratadas da mesma forma, como se as imagens não estivessem inseridas em situações específicas e não fossem produzidas em certas condições técnicas, culturais e históricas. Se a fotografia constrói mundos, cabe investigar não só como ela os produz, mas também a que conjunto de condições e questões essas construções remetem. Assim, contra um pensamento que considera a fotografia como documento puro e transparente, que liga diretamente mundo e imagem, no que Rouillé chama de uma “relação

N ascimento Gonçalves

linha de raciocínio, Rouillé (2005) argumenta que a questão do registro e da represen-

do

pensá-la desvinculada de suas condições de surgimento e contemplação. Na mesma

D ébora G auziski - Fausto A maro - Fernando

(DUBOIS, 1993, p. 25). Nesta abordagem, a fotografia é pensada como imparcial em re-

necessária e suficiente que atesta indubitavelmente a existência daquilo que mostra”

nas fotografias

Não por acaso, desde suas origens, um discurso de verdade está arraigado na

M aterialidade e memória do Rio de J aneiro A ugusto M alta e do projeto Rio 365

de seus moradores, elas devem sempre ser problematizadas. Isso porque elas não têm

de

imagens serem um suporte para a reconstituição histórica do espaço e do modo de vida

175


binária de aderência”, este autor vai defender que entre mundo e imagens existem uma série de “operantes que se constituem em ordem visual, em prescrições icônicas e em de que, no campo das práticas e das imagens fotográficas, mesmo o documento considerado mais “puro” e “objetivo” é inseparável de uma “expressão” que é construída e, por isso mesmo, denota um “modo de fazer” e uma visão de mundo.

e paisagísticas cariocas (as denúncias cabiam às charges e caricaturas) e eram legitimadas como imagens “oficiais”. Suas fotografias, ao privilegiar o aspecto indicial e de registro, criam para o Rio de Janeiro uma realidade por meio da imagem que reforça e projeta sua condição de modernização. A memória visual que resulta desse esforço é a do efeito parcial das transformações por que passou parte da cidade e que produzirá em nós a sensação de que de fato “saímos de um atraso” e nos “civilizamos”. Apesar de até hoje essa ser uma característica das fotos oficiais, a “intenção” do fotógrafo e o aspecto documental certamente não podem conferir um caráter de verdade a uma imagem, pois o que temos são representações e conceitos, como disse Flusser. As fotografias só têm valor documental porque nós atribuímos essa característica a elas, conforme propõe Rouillé (2009). Por exemplo, nunca teremos a noção exata da dimensão do Palácio Monroe por meio de suas fotografias, apenas uma impressão. No caso das fotos de Malta, há, por exemplo, o modo como ele trabalha o preto e branco, forjando uma ambiência particular para o que é retratado. Por não termos um olhar histórico em relação ao ato fotográfico, quando utilizamos as tecnologias disponíveis hoje, muitas vezes esquecemos como as questões que organizam nossos modos de ver, de produzir e difundir imagens podem continuar a presidir os processos de registro e circulação mesmo na atualidade. Acabamos nos tornando deterministas à medida que tomamos como “virtudes de antemão” as possibilidades de mobilidade e conectividade que os aparatos conferem ao atual cenário de produção de imagens. Sendo tomados como inovadoras em si mesmas, muitas dessas tecnologias nada mais fazem, por vezes, que reproduzir o que já era feito antes, mas apenas de outro modo. Hoje, talvez seria possível tirar em apenas um dia o mesmo número de fotos que Malta produziu em toda a sua carreira11. Mas em que medida isso implica em mudanças nas lógicas que presidem a produção, a circulação e as funções das imagens? 11 Não coube nessa comunicação pelas limitações próprias de espaço adentrar na discussão sobre as diferenças e aproximações entre memória e história nacional. Em relação a essa questão, sugerimos a leitura de Santos (2007, principalmente os capítulos 5 e 7).

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uma ideologia governamental e, por essa razão, enfatizavam as belezas arquitetônicas

ano

Não podemos, portanto, ignorar que as fotos de Malta inseriam-se dentro de

Revista GEMI n IS |

esquemas estéticos” (ROUILLÉ, 2009, p. 136). Interessa-nos aqui justamente sua noção

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2 Pensando a fotografia pela perspectiva da materialidade

focadas na hermenêutica estão tradicionalmente ligadas ao campo das Ciências Humanas e Sociais, e ainda hoje pode-se dizer que é o pensamento predominante nos estudos de Comunicação. Felinto e Andrade (2005) indicam que, nesse modelo, a cultura é pensada através de uma lógica simbólica e imaterial, associada à ideia de engrandecimento espiritual do homem. Nesta tradição, o âmbito material seria apenas um suporte para o sentido dos fenômenos. Os estudos da materialidade remontam aos anos 80, quando um grupo de pesquisadores vindo dos estudos literários, entre eles Hans Ulrich Gumbrecht e Karl Ludautores organizam uma coletânea de ensaios chamada Materialität der Kommunication (Materialidades da Comunicação), em que introduziam “um modelo teórico no qual a determinação dos sentidos dos fenômenos comunicacionais era menos importante

obra de pensadores como Walter Benjamin e Marshall McLuhan já houvesse um determinado enfoque ao plano material nos processos de comunicação e da cultura, esta foi “a primeira tentativa de sistematização de um pensamento inteiramente voltado às materialidades” (Ibid., p. 79). Pode-se dizer que McLuhan foi um dos precursores do pensamento das materialidades. Embora críticos do autor o acusem de ter uma visão tecnodeterminista, sua obra oscila entre uma perspectiva tecnológica e social. Essa constatação fica mais evidente no livro Laws of Media (1988), no qual o teórico da mídia introduz a ideia de que os artefatos humanos (materiais ou imateriais) apresentam estruturas verbais. Estas estruturas, entretanto, não devem ser pensadas genericamente como a linguagem

por isso, é também simbólica. Nesse sentido, existe algo nas imagens que escapa a uma simples tradução interpretativa. Num primeiro momento, uma fotografia causa um arrebatamento ou impacto não traduzível em linguagem, o que Gumbrecht define como “produção de presença”, que é este efeito que os elementos materiais produzem nos corpos dos agentes que estão em comunicação. É por esse motivo que uma foto de conteúdo agressivo/

N ascimento Gonçalves

objetos mediam a relação do homem com o mundo, que é permeada pela linguagem; e,

do

dentro de uma perspectiva hermenêutica, mas sim em uma dimensão sociocultural. Os

D ébora G auziski - Fausto A maro - Fernando

(FELINTO; ANDRADE, 2005, p. 78). Felinto e Andrade (2005) indicam que, embora na

que o estudo dos mecanismos materiais que permitiam a emergência desses sentidos”

nas fotografias

wig Pfeiffer, propõem uma reformulação de teorias e paradigmas. Em 1987, estes dois

M aterialidade e memória do Rio de J aneiro A ugusto M alta e do projeto Rio 365

miótica, que se baseia em um viés interpretativo das imagens. Propostas metodológicas

de

A maioria dos estudos da fotografia utiliza como suporte teórico a análise se-

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violento tende a causar mais espanto, incômodo ou aversão do que um texto descrevendo dado ocorrido, pois produz um impacto físico no sistema visual humano. Não individualmente. O teórico alemão alega que o sentido (hermenêutica) não pode ser separado da sua dimensão material (“coisas do mundo” ou objetos disponíveis “em presença”),

é a de renegar o campo da interpretação, mas, sim, de apontar que o âmbito da materialidade não é “alcançável” pelo mesmo. A análise de Michael Hanke sobre a reflexão de Gumbrecht propõe que: “a materialidade e o sentido desenvolvido a partir dela são considerados inseparáveis” (2006, p. 7). Gumbrecht tenta propor um método não-hermenêutico em seu livro Produção de Presença, embora Felinto e Andrade (2005) critiquem que nesta obra o autor não defina um caminho muito claro para tal: “Gumbrecht está mais preocupado em desenhar os diferentes horizontes intelectuais e filosóficos nos quais se situam as chamadas culturas de presença e culturas de sentido” (Ibid., p 82). Não obstante, seu pensamento pode contribuir para o estudo das imagens fotográficas, ao pensarmos que a mídia na qual as consumimos ou produzimos afetará o seu sentido. Embora seja da área da Arqueologia, Nicole Boivin apresenta no livro Material Cultures, Material Minds (2008) uma abordagem material das culturas. A autora critica o enfoque na interpretação não só em relação ao seu próprio trabalho e ao dos arqueólogos britânicos, mas também no pensamento ocidental em vigor desde o Iluminismo. Segundo a arqueóloga, nesse modelo textual, a cultura material é pensada como meramente simbólica e reflexo direto das realidades sociais. Na perspectiva de Boivin (2008), os objetos evocariam experiências que vão além do verbal, do conceitual e da consciência. Em decorrência, o mundo material não necessariamente simboliza algo, ou seja, pode ser traduzido. Ele faz parte do plano sensorial, da experiência e da emoção, indo além do plano conceitual dos códigos e significados. O mundo material impacta no social não somente por meio de ideias e conceitos, mas porque a materialidade exerce uma força que por meio da ação humana se torna “social”. As emoções teriam, então, um papel essencial na nossa relação com os objetos. Como método, a autora propõe um enfoque na descrição das práticas ao invés de buscar um significado nestas. Nos estudos das materialidades ainda existem muitas lacunas metodológicas. Todavia, esta perspectiva amplia o olhar do pesquisador ao propor uma tentativa de analisar seus objetos também por uma perspectiva material.

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ção é predominantemente “sentido”. A proposta de Gumbrecht (2010), entretanto, não

ano

fazendo uma crítica ao conceito disseminado nas ciências humanas de que a comunica-

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excluímos, no entanto, que a intensidade dessa afetação seja variável culturalmente e

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Fazemos, então, alguns questionamentos: Uma análise com predominância nas teorias da materialidade seria produtiva no caso da fotografia? Seria possível eliminar total-

tória material ou das materialidades”? Não há experiências simbólicas que não demandem um meio material. Mas o simbólico também não é eliminável, conforme teorizado anteriormente por McLuhan (1988). Para uma abordagem fotográfica, acreditamos que ambos os enfoques sejam importantes. De uma forma um pouco diferente, também autores como Rancière (2009) e Bruno Latour (2012) propõem o estudos dos fenômenos estéticos e sociais através da observação dos circuitos e das operações materiais que os constroem. Por isso, passaremos a seguir a abordar a questão da produção da memória urbana através da materia-

3 Projeto Rio 365 e a construção coletiva da memória

das ferramentas técnicas facilitou também novas formas de difusão, como o compartilhamento de imagens pessoais através de redes sociais na internet, como o Instagram12. Deste modo, o celular, “bem típico das culturas urbanas contemporâneas, gera todo um conjunto de comportamentos e de serviços que altera este mesmo ambiente cultural” (PEREIRA, 2006, p. 3). Para alguns autores, essa mudança é concreta e já pode ser observada. André Lemos (2008), por exemplo, compara os usos e funções da fotografia tradicional e da produzida através de celulares. De acordo com o autor, a primeira focava em “eternizar” momentos solenes e formais (fotos posadas), tendo a função social de integração e também de arquivamento de memórias em álbuns fotográficos: “A foto era considerada um meio mnemônico de socialização em um pequeno círculo, basicamente

rização do momento) e a mobilidade (associada à portabilidade), que confeririam a estas imagens um aspecto efêmero: “as fotos são tiradas, vistas e descartadas imediatamente” (Ibid., p. 57).

12 Em princípio, o Instagram é um aplicativo smartphones por meio das quais os usuários partilham suas vidas, construindo narrativas de si mesmos. Com o uso, vem se tornando o que chamamos de redes sociais online (Cf. Recuero, Raquel. Redes sociais na internet. Porto Alegre: Sulina, 2009).

N ascimento Gonçalves

ticas a sociabilidade (integração através dos compartilhamentos), o presenteísmo (valo-

do

familiar” (Ibid., p. 56). Já as fotos tiradas com dispositivos móveis teriam como caracterís-

D ébora G auziski - Fausto A maro - Fernando

a experiência de produzir registro e memória por meio da fotografia. A democratização

O advento das câmeras digitais portáteis tornou ainda mais popular e acessível

nas fotografias

lidade das redes sociais online, especificamente o Instagram.

M aterialidade e memória do Rio de J aneiro A ugusto M alta e do projeto Rio 365

imagem por um viés totalmente não-hermenêutico? Seria possível falar em uma “his-

de

mente uma análise hermenêutica no caso das imagens? É possível compreender uma

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Através dessa oposição, entretanto, Lemos (2008) parece afirmar que a função da fotografia tradicional teria sido substituída pelos novos fazeres fotográficos: “Trataque ambas as funções coexistem hoje, e mesmo as fotos concebidas através de dispositivos móveis também podem ter uma finalidade arquivística e memorialística. A reportagem “Muito além de impressões digitais” (MENEZES; FARAH, 2012), publicada no

dos entrevistados13. No caso do projeto Rio 365, as fotos selecionadas darão origem a um livro-álbum (à semelhança de Malta), o que revela que as fotos produzidas no Instagram extrapolam a materialidade “virtual” da rede social. A proposta do próprio aplicativo é tornar as fotos mais “apreciáveis” esteticamente com a aplicação de filtros14, a fim de “transformá-las em uma memória que será guardada para sempre”, de acordo com o site oficial. Apesar do aspecto “descartável” de algumas imagens (sem preocupações quanto ao enquadramento, excesso de luz etc), muitos usuários optam por imprimi-las para recordação15, o que permite algumas considerações sobre a relevância do suporte impresso nos dias atuais. Talvez elas não possuam mais a função de obrigatoriedade do passado, quando revelar o filme era mandatório para a visualização das fotos, mas agora possuem outros atributos diretamente ligados à materialidade do papel. Quanto à produção de imagens triviais, salientamos que estas também eram geradas através de câmeras analógicas. Aliás, essa foi uma temática da arte, muito antes do desenvolvimento da fotografia. O que são as pinturas de natureza morta senão um registro do banal? Hoje, no entanto, com a facilidade de produção fotográfica digital (não é preciso comprar um filme e não há custo de revelação) e de compartilhamento, essas imagens circulam massivamente através das redes sociais, especialmente no Instagram, cuja praticidade e integração com outras redes (como o Facebook, por exemplo) são maiores que em aplicativos semelhantes. Em relação à questão da memória, destacamos que as fotografias têm o efeito ainda de “gatilhos” em seus consumidores, que seriam instigados a ir além do mero registro, podendo “despertar lembranças intrínsecas e extrínsecas às imagens visíveis” (BONI, 2010, p. 214). Segundo a conceituação de Halbwachs (1990, p. 26), a memória não é um processo de evocação individual, mas sim de construção coletiva: “nossas 13 O artigo jornalístico cita o interessante caso do lavrador Martins, que tem apenas duas fotos suas durante a juventude, e hoje utiliza sua câmera digital para fotografar a família. 14 Os filtros disponíveis no Instagram “imitam” a estética da fotografia analógica. 15 Um exemplo é o site Imãgram, que transforma as fotos dos usuários do Instagram em imãs. Disponível em: <http://imagram.com.br/>.

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as memórias do cotidiano – sendo, inclusive, a primeira câmera digital de grande parte

ano

jornal O Globo, expõe como os telefones celulares estão sendo utilizados para registrar

Revista GEMI n IS |

-se de circular e não memorizar, para reforçar laços sociais” (Ibid., p. 57). Ressaltamos

180


memórias permanecem coletivas, e elas nos são lembradas pelos outros, mesmo que se trate de acontecimentos nos quais só nós estivemos envolvidos, e com objetos que só

são sempre sociais. Memórias são vivas e dinâmicas, não um mero registro. Elas vão sendo reconstruídas todo o tempo em suas relações com o presente. Quando aplicamos essa ideia às imagens fotográficas, podemos dizer que o modo como os indivíduos as interpretam e utilizam também se altera em diferentes épocas e, por essa razão: “Sem apreender as suas relações com os outros meios, velhos e novos, é impossível compreender o meio da fotografia” (McLUHAN, 2007, p. 229). O Rio 365 mobiliza os usuários do Instagram a documentar a cidade carioca oficiais, transmitindo um olhar de certa forma encomendado sobre cenários específicos. Já o projeto Rio 365, por um lado, tem por missão a exploração de áreas pouco enfocadas pelos ângulos das lentes oficiais. Um exemplo é a foto 9916 da usuária @anabran-

conjunto de favelas, é comumente associado à violência e ao crime organizado, só sendo visitado por seus moradores. Com a instalação de uma UPP (Unidade de Polícia Pacificadora) e de um teleférico na comunidade, moradores da cidade e turistas passaram a poder visitar o local e conhecê-lo. Fazemos aqui, entretanto, uma provocação: imaginemos as dificuldades técnicas envolvidas nessa realização (peso da câmera, iluminação, acesso ao local) se Augusto Malta desejasse executar uma foto semelhante. Graças ao celular, o processo de registro é, sem dúvida, facilitado. Contudo, fica a questão: até que ponto muda o sistema de construção de uma imagem positiva do Rio e de sua memória pós-intervenção municipal, como a de Pereira Passos?

D ébora G auziski - Fausto A maro - Fernando

um banho de água no alto de um morro no Complexo do Alemão. Esse local, por ser um

co10, que, para retratar a missão “Calor”, fotografou uma mulher se refrescando com

nas fotografias

“criativamente”. Tradicionalmente, como vimos, esse registro era feito por fotógrafos

M aterialidade e memória do Rio de J aneiro A ugusto M alta e do projeto Rio 365

autor, não existem memórias estritamente individuais, considerando que as lembranças

de

nós vimos. É porque, em realidade, nunca estamos sós”. De acordo com a proposição do

181

do

N ascimento Gonçalves

16 Disponível em: <http://rio365.tumblr.com/image/40522004137>. Acesso em 05 abr. 2013.


182 Revista GEMI n IS | ano

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De certa forma, por serem produzidas por diferentes fotógrafos, amadores e profissionais, as imagens têm diferentes perspectivas, ângulos e temáticas. Isso talvez não ocorresse caso fossem produzidas por poucos fotógrafos contratados. Na missão “Do alto”, foram fotografados cenários distintos como o interior da Confeitaria Colombo17, um entregador de água18, o calçadão de Copacabana19, a Restinga da Marambaia da janela de um avião20, uma rua no Centro vista do alto de um prédio21 e uma mulher segurando um guarda-chuva enquanto caminha na calçada ao lado de bueiros22. As imagens brincam com grafismos e os filtros utilizados dão um toque de embelezamento artístico à “realidade”, fugindo do conceito de documento, que tenta retratá-la “como ela é”. Contudo, a fotografia se pensada como montagem, sempre “fabricada”, independentemente de sua finalidade ou intenção do fotógrafo, nunca foi um espelho do “real”. 17 Disponível em: < http://rio365.tumblr.com/image/41536519244>. Acesso em 05 abr. 2013. 18 Disponível em: < http://rio365.tumblr.com/image/41438966395>. Acesso em 05 abr. 2013. 19 Disponível em: < http://rio365.tumblr.com/image/41359938964>. Acesso em 05 abr. 2013. 20 Disponível em: < http://rio365.tumblr.com/image/41287284350>. Acesso em 05 abr. 2013. 21 Disponível em: <http://rio365.tumblr.com/image/41209182710>. Acesso em 05 abr. 2013. 22 Disponível em: < http://rio365.tumblr.com/image/41784078402>. Acesso em 05 abr. 2013.


Sabemos que ela é uma construção social. Nesse caso, apesar de as imagens não serem encomendadas e as pessoas serem livres para produzi-las, não se pode esquecer que

e vivencias que se deseja construir.

M aterialidade e memória do Rio de J aneiro A ugusto M alta e do projeto Rio 365

certamente atentos a um determinado “conceito” de Rio e de memória de seus espaços

de

para serem aproveitadas no projeto, elas passarão pelo crivo de curadores que estão

183

nas fotografias •

D ébora G auziski - Fausto A maro - Fernando do

N ascimento Gonçalves


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Esse processo de construção de novas memórias visuais do Rio contém várias operações. O Rio 365 realiza bimestralmente um encontro presencial dos usuários do Instagram, chamado de “#instameet”, com o objetivo de promover a integração e o debate de ideias entre a comunidade. McLuhan destaca que: “Ninguém pode desfrutar uma fotografia solitariamente. Ao ler e escrever pode-se ter a ilusão de isolamento, mas a fotografia não favorece uma tal disposição” (2007, p. 215). O próprio consumo de imagens também molda o olhar do fotógrafo, conforme o teórico aponta no seguinte trecho: “o turista que chega diante da Torre de Pisa ou do Grand Canyon, no Arizona, não faz mais do que conferir suas reações ante algo com que já está há muito familiarizado – além de bater algumas fotos...” (Ibid., p. 225). Para estimular ainda mais a participação do público, as melhores fotos de cada missão recebem prêmios23. Ressaltamos que Halbwachs (1990) aponta que a memória é construída na relação com os outros indivíduos. Logo, só lembramos quando nos colocamos na perspectiva de um grupo. O projeto, por meio dessa ação de estimular a interação entre os participantes, reforça, assim, o laço grupal e também o processo de produção de uma memória coletiva. A fotografia é aqui um meio de produzir um laço de relação entre os envolvidos no Rio 365. Há também uma preocupação, senão explícita, ao menos estimulada por esse projeto, com o patrimônio material e imaterial da cidade. Conforme nos revela Santos, essa questão já era prioritária no final dos anos 1980 e tendemos a acreditar que se acentuou nas décadas seguintes:

23 Segundo consta no Tumblr do projeto, o ganhador da melhor foto do bimestre concorre a um iPad.


centralização do processo de construção de imagens e de memória visual da cidade, mas que é tecido e organizado com fins institucionais pela Prefeitura do Rio. Desta forma, curiosamente, do mesmo modo que no período Pereira Passos e das fotos de Malta, as imagens realizadas pelo projeto Rio 365, se não diretamente, constroem uma memória dos processos de mudança e de transformação do espaço urbano na atualidade, “melhorada” e que segue o rumo a seu posto de cidade sede de megaeventos. Uma vez nas redes sociais, essas imagens que poderão circular apoiadas em discursos “oficiais”, tornam-se igualmente oficiais sem sê-lo e forjam um Rio cuja memória será produzida e celebrada provavelmente como no início do século passado.

nas fotografias

difundindo, através das ferramentas do Instagram, imagens de uma cidade bela e feliz,

M aterialidade e memória do Rio de J aneiro A ugusto M alta e do projeto Rio 365

O que chama a atenção nesse projeto é que parece haver uma espécie de des-

185 de

O processo de redemocratização amplia a consciência coletiva na defesa dos bens culturais e ambientais de interesse público [...] A questão da preservação do patrimônio cultural deixa de estar circunscrita ao universo dos técnicos e dos intelectuais para integrar a cultura de massas, ocupando lugar de destaque nos meios de comunicação (2007, p. 97).

Nesse trabalho, apresentamos a noção de documento fotográfico em dois momentos distintos da cidade do Rio de Janeiro: durante as reformas do governo de Pereira Passos, que visavam adequar a capital nacional aos planos urbanísticos europeus, no início do século XX, e, hoje, de cidade sede dos megaeventos esportivos, com obras para adequação aos padrões dos comitês olímpicos e da Copa do Mundo. Os registros do primeiro cenário, feitos por fotógrafos oficiais como Augusto Malta, visavam registrar o processo de “modernização”, período no qual se criava uma memória para a cidade com a construção de prédios inspirados nos parisienses, a fim de deixar para trás a imagem de “atraso” do Brasil colonial.

Instagram. Por ser uma iniciativa aberta ao público, lança-se o olhar sobre áreas pouco exploradas em documentações tradicionais, valorizando pontos excluídos, propositalmente em determinados momentos, pelas lentes oficiais. Contudo, é exatamente aí que se reinstala o uso da fotografia para a construção de uma determinada imagem da cidade e, consequentemente, de um novo legado. Durante o governo de Pereira Passos, como a tecnologia fotográfica ainda não era tão popularizada, a crítica era expressa por

N ascimento Gonçalves

promovendo uma maior integração e engajamento dos envolvidos, através do aplicativo

do

Já o Rio 365 propõe uma forma mais participativa de documentar a cidade,

D ébora G auziski - Fausto A maro - Fernando

Considerações finais


meio de caricaturas e charges. Neste artigo, ao comparar o papel da fotografia de Malta e do projeto Rio 365 aos moldes de Didi-Huberman (2008) para entender esses diferentes processos. Embora os modos de fazer, a intenção e a época dos dois projetos sejam distintas, eles são processos de criação de realidade para a cidade do Rio de Janeiro. Apesar de apresentarem

cional ou não (como no caso da imagem no Complexo do Alemão, no caso do Rio 365). Não podemos esquecer que, embora o Rio 365 seja um projeto colaborativo, ele obedece a um processo de seleção (próximo à lógica de uma curadoria de arte) e as missões são previamente definidas pelos organizadores. Ou seja, não é qualquer foto que será escolhida para integrar as vencedoras da missão. Destacamos, no entanto, que o projeto via Instagram tem como vantagem um número maior de agentes (LATOUR, 2012), representados pelas câmeras, fotógrafos etc, o que possibilita não um maior número de fotos em relação à época de Malta, mas, consequentemente, de diferentes olhares. Algumas destas fotos “inovadoras” podem não ser selecionadas como “vencedoras”, mas, de qualquer forma, circularão dentro do Instagram e poderão ganhar uma visibilidade/ notoriedade paralela. Por outro lado, é curioso perceber que apesar de o Projeto ser patrocinado por uma empresa (a Light) e ter o prefeito Eduardo Paes como um de seus participantes, surpreendentemente há fotos que apresentam mensagens de contestação ao poder público. É o caso das imagens 12024, 17725 e 18026, que nos mostram, respectivamente, a presença de policiais armados em uma praia, uma rua enlameada em Santa Cruz e uma enchente na Lapa. Nesses três casos, não apenas as imagens enviadas pelos usuários dão margem a uma interpretação crítica, como são reforçadas pelas legendas publicadas pelos curadores do projeto “E temos aqui, digamos, um ponto para reflexão: até quando precisaremos de fuzis nas praias?”; “A falta de atenção dispensada àquela área pelo Poder Público provoca frequentemente esse tipo de cena lamentável: moradores têm que meter o pé na lama sempre que chove”; “o Rio está despreparado para grandes chuvas”. Finalmente, procuramos demonstrar que o Rio de Malta e o Rio coletivo do Instagram são dois cenários que explicitam distintas materialidades da fotografia que, no entanto, parecem convergir para uma mesma finalidade, mesmo em se tratando de épocas diferentes. Por um lado, os aspectos materiais influem no processo de produção de imagens, visto que um registro colaborativo da cidade da maneira como foi 24 Disponível em: < http://instagram.com/p/VUiEagSM8_/>. Acesso em 05 abr. 2013. 25 Disponível em: < http://instagram.com/p/XnXvezSM4f/>. Acesso em 05 abr. 2013. 26 Disponível em: < http://instagram.com/p/Xu8MnySM83/>. Acesso em 05 abr. 2013.

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sentar intenções/usos similares, como a perpetuação de uma questão ideológica inten-

ano

continuidades e diferenças em relação um ao outro, em dados momentos parecem apre-

Revista GEMI n IS |

na construção de uma memória imagética da cidade, propomos um olhar anacrônico

186


proposto só é possível em função das características próprias das plataformas móveis, como telefones celulares e tablets, que permitem um deslocamento dos participantes no

tados e construídos socialmente. Ou seja, ambos os fatores têm igual importância nesse processo. Questionamos se o frenético ritmo de produção de imagens e de sua circulação na internet não poderia constituir um campo para uma reflexão sobre a produção documental fotográfica contemporânea. Fazemos, então, algumas indagações: Que tipo de memória está sendo construída através do projeto Rio 365? Para quem e por quem ela está sendo realizada? Seria contraditório constituir um relato documental através de uma rede social predominada por narrativas efêmeras? Qual é o lugar da fotografia da memória coletiva e das identidades regional e nacional através da fotografia? Essas questões tornam-se ainda mais relevantes se pensarmos nas demolições visando a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016. O emblemático caso do an-

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do

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D ébora G auziski - Fausto A maro - Fernando

de políticas públicas para a preservação de elementos da vida e da memória urbana,

tigo Museu do Índio, também conhecido como Aldeia Maracanã, reforça a importância

nas fotografias

documental hoje? Como esse fluxo imagético afetaria hoje os processos de construção

M aterialidade e memória do Rio de J aneiro A ugusto M alta e do projeto Rio 365

das apropriações que delas são feitas, assim como os próprios usos também são fomen-

de

território. No entanto, as tecnologias também são moldadas pelo seu uso social, através

187


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189

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RANCIÉRE, J. O espectador emancipado. São Paulo:


Imagens , Tempo, Escrita: invenções ressoam por twittes

E lenise Cristina Pires

de

A ndrade

Professora doutora do Departamento de Educação da Universidade Estadual de Feira de Santana (Uefs), Bahia. Participante do grupo de pesquisa Multitão. E-mail: nisebara@gmail.com

É rica S peglich Doutora em educação pela Universidade Estadual de Campinas. Participante do grupo de pesquisa Multitão. E-mail: speglich@gmail.com

Revista GEMI n IS

ano

4 - n . 2 v. 2 | p. 191 - 202


Resumo Esse texto é uma proposta de experimentação proporcionada pelo minicurso “Imagens, tempo, escrita (talvez cartas)” desenvolvido no 18º Congresso de Leitura do Brasil, em 2012, para um público de professores da educação básica. Muitas vontades atrave(r)ssadas na criação deste minicurso: o que podem os artefatos culturais (twittes, imagens, 140 caracteres, clipes, conhecimentos, vídeos, músicas, computadores e teclados, internet), seus limites e potencialidades na comunicação/mídias em educação quando tais artefatos não mais explicam o mundo? Que potência seria essa? Como tornar efetiva essa expressão na invenção dos conhecimentos, pensamentos, políticas, memórias através deste movimento? Palavras-chave: imagens; tempo; escrita; Deleuze; Twitter.

Abstract This text is an experimentation ruled by the experiences lived on a course during the 18o. Congresso de Leitura do Brasil. In the course we met with Fundamental School teachers. Our bet was in the questions: what are the potencies of the cultural artefacts (twites, images, 140 characters, videoclips, knowledges, musics, films, computers and keyboards, internet)? What are their limits and potencialities in the communication/media in education when they do not explain the world anymore? What could be this potenciality? How could we, in this movement, effectuate this expression in the invention of the knowledges, thoughts, politics, memories? Keywords: images; time; writing; Deleuze; Twitter.


E

sse texto é uma proposta de experimentação proporcionada pelo minicurso

“Imagens, tempo, escrita (talvez cartas)” desenvolvido no 18º Congresso de Leitura do Brasil, em 2012, para um público de professores da educação básica.

Muitas vontades atrave(r)ssadas na criação deste minicurso: o que podem os artefatos culturais (twittes, imagens, 140 caracteres, clipes, conhecimentos, vídeos, músicas, com-

putadores e teclados, internet), seus limites e potencialidades na comunicação/mídias em educação quando tais artefatos não mais explicam o mundo? Que potência seria essa? Como tornar efetiva essa expressão na invenção dos conhecimentos, pensamentos, políticas, memórias através deste movimento? Animava-nos pensar com as possibilidades de escrita e leitura propostas a partir dos 140 caracteres definidos pelo twitter no encontro com professores e o que chamamos de dispositivos culturais: diversificadas imagens, trecho de filmes, músicas, poesias, junto aos conceitos de escrita, tempo e invenção, para (de)compor (n)esses encontros. Twitter, aqui, entendido como um artifício cultural e não somente um microblog de escritas fixadas em 140 toques e nossa vontade de esgarçar uma “opinião generalizada” sobre leitura, escrita, quantidade e produção de sentidos, já explorados em ANDRADE; SPEGLICH (2012). A conversa ao longo do minicurso foi exclusivamente pelo twitter, em perfis abertos apenas para o momento, sendo que, apenas antes da apresentação de cada artefato cultural, propúnhamos uma pergunta “fora” do twitter. Nossa aposta era a de que tais movimentos poderiam maquinar uma “forma de sair do e fazer fugir o jogo das imagens/escritas representacionais, que fixam o movimento do conhecimento, pensamento e vida. Fugir da e fazer fugir a submissão ao tempo cronológico. Fugir da e fazer fugir a escrita um precisar ser longo, extenso, amplo, infindável” (ANDRADE; SPEGLICH, p. 127, 2012). Traremos, para este artigo, os twittes trocados ao longo do mini curso para movimentar o pensamento. Twittes como ‘objeto’ de análise e, especialmente, usados para (de)compor ressonâncias junto aos conceitos da filosofia da diferença que pretendemos explorar. Twiites que foram acompanhados de risadas, dúvidas, lembranças, esqueci-


mentos, provocações do grupo ao entrar em contato com vários fragmentos de dispositivos culturais tais como: trechos do documentário Life in a Day , o clipe da música 1

por Marc Forster, 2006. Vale ressaltar que traremos para esse texto apenas uma parte das discussões realizadas durante as quatro horas do mini-curso onde, além desses dispositivos culturais, também discutimos com os professores, via twitter, questões provocadoras que lançamos antes de cada dispositivo cultural ser apresentado. Buscamos, com essas escolhas, ressonâncias pela filosofia pós-estruturalista bado, num movimento desafiador das classificações, das explicações, por isso nossas escolhas por materiais tão diversos a inspirar ‘multiálogos’ durante o minicurso: sete contas de twitters em simultaneidade. Conversavam? Com versavam? Que versos continham? Cento e quarenta toques delimitam a sensação dos versos? Toques enovelados que não querem desatar os nós dos momentos de (des)encontros e desassossego na produção de conhecimento, que não se pretendem explicativos, mas intensivos no plano das sensações3.

invenções ressoam por twittes

para explorar pensamentoescritapesquisa ao buscar extrapolações ao já pensado, aca-

Imagens , Tempo, Escrita:

Remind me2 e a introdução da produção cinematográfica Mais estranho que a ficção, dirigido

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a ação política não se funda apenas no estar ou não de acordo com o que se enuncia, com o que (se) escreve ou vê, mas em uma certa forma de lidar com o sentido e com a linguagem, na busca de um dizer/pensar/ver/imaginar que se aproxime do aberto, do imprevisível e do ficcional, fissurando a força da representação que mora na linguagem e na comunicação. Uma poética que manifesta uma força política não sujeita a sentidos

cipantes, juntamente com as duas proponentes do mini curso, assim como o monitor, serão as potências a serem exploradas nesse texto. Um máximo de 140 caracteres grafados em Courier New a per-correr este texto e que se atualizam a cada contato com o movimento dos sentidos produzidos. Em uma tentativa de não perder a intensidade da caoticidade dos pensamentos e dos sentidos dos twitters produzidos entre as apresentações desses dispositivos culturais, escolhemos dividir esse texto em seções onde

1 Life in a Day é um documentário singular de 90 minutos onde mais de 81 mil pessoas enviaram aos produtores (Youtube e Scott Free UK) gravações realizadas em um único dia: 24/07/2010. (Informações obtidas em <http://www. telegraph.co.uk/culture/film/filmmakersonfilm/8552739/Life-in-a-Day-24-hours-in-the-life-of-the-world.html>). 2 Remind me é uma música do grupo Röyksopp. O clipe foi dirigido por Ludovic Houplan & Hervé de Crécy, 2002. (Fonte:< http://royksopp.com/videos/remind-me>). 3 Um des-locar-se que é contínuo em outro trabalhos de nosso grupo de pesquisa multiTÃO, tais como WUNDER et al, 2006; ANDRADE; SPEGLICH, 2006; ANDRADE; SPEGLICH, 2007; ANDRADE; SPEGLICH, 2008; AMORIM et al 2008; ANDRADE et al 2010; ANDRADE; DIAS 2010; ANDRADE; ROMAGUERRA, 2011, ANDRADE; SPEGLICH, 2011.

A ndrade - É rica S peglich

Os twitters produzidos durante o minicurso pelas quatro professoras parti-

de

translúcidos, dados e estabelecidos.

E lenise Cristina Pires

Nesta nossa proposta metodológica, que é também e ao mesmo tempo estética,


apresentaremos em imagens e questões o que escolhemos como disparadores das conversas, alguns dos twitters produzidos e as explorações que realizamos para esse texto.

Revista GEMI n IS |

I like to move, move (ou movimento – atualização – invenção)

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ano

4 - n . 2 - v. 2


As imagens pertencem à produção Life in a Day, um documentário singular de 90 minutos onde mais de 81 mil pessoas enviaram aos produtores (Youtube e Scott preendido entre 2’13’’ e 3’03’’, de onde retiramos os frames desta página: uma voz de mulher pergunta ao simpático moço sentado no banco “Can you speak english?” “Yes”, ele responde rindo muito. “What the day is today?” a voz arrisca saber. A resposta é ainda mais saborosa: “I like to move it move it”. “This is best day of my life”, nos diz o sorridente moço. “No! I’m asking…” emenda a voz feminina, quando o rapaz diz “Oh! rapaz continua, entre risos, “Wait a minute” - olha o celular e ri - “a stupid question: ‘what day is it?’. It’s 24 july!”. A voz feminina, também rindo, questiona “and what the day is it?”. “it’s the best day ever” ele responde!.. Nesse ritmo de risadas e brindes iniciamos nossas provocações junto às professoras com a pergunta: O que está acontecendo? E fomos aos computadores. Quase como o sorridente moço do trecho do filme, por instantes achamos que havíamos proposto a stupid question: o que está acontecendo!

invenções ressoam por twittes

What the day” e ri. “ Yes!”, ela confirma. “Uh” e uma sonora gargalhada irrompe. O

Imagens , Tempo, Escrita:

Free UK) gravações realizadas em um único dia: 24/07/2010.4. Projetamos o trecho com-

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as (im)possibilidades dos 140 caracteres – de investir em um procedimento delirante para a escrita foi inspirado na proposta de Deleuze (2007). Delírio que se movimenta em uma impossibilidade de tradução para os sentidos, as palavras, e não como doença a ser curada. Movimento que pretende colocar em suspensão as certezas sobre o que, comumente, denominamos de comunicação.

(exclusivamente) ao serem comunicadas sobre o “novo” conhecimento, atrave(r)ssando uma escrita em experimentação do (des)encontro. Traçando possibilidades ao escutar o convite de Rosa Maria Fisher (2003) para colocar em debate a questão: “como dar conta da competência de nossas análises da mídia no sentido de falar de dentro dela (...) e não de fora, daquele lugar soberano da interpretação?”. Ao propor uma discussão por meio do twitter passamos à possibilidade de falar desde dentro dessas produções. Eu me remexo muito! Muito, esse movimento está produzindo “coceiras nas idéias”, muito jóia! Propostas que criaram possibilidades de experimentação e de entrelaçamento nos processos de comunicação e, em nosso caso, para o campo da educação, pretendendo deslocar os “entre-lugares da produção (o trabalho dos criadores, roteiristas, atores, técnicos dos diversos níveis) e dos destinatários, daqueles a quem se endereçam os produtos” (Fisher, 4 (Informações obtidas em <http://www.telegraph.co.uk/culture/film/filmmakersonfilm/8552739/Life-in-a-Day-24-hours-in-the-life-of-the-world.html>)

A ndrade - É rica S peglich

exclusivamente) enquanto outras estariam em uma posição hierarquicamente inferior

de

Abandonar a postura de que algumas instâncias seriam produtoras (quase que

E lenise Cristina Pires

A escolha política e estética – nesse texto e na trajetória do mini curso com


2003). Formando IMAGENS, pensando no TEMPO com essas ESCRITAS... aonde chegarei? Não sei... Através da determinação dos 140 caracteres, procuramos provocar uma venções e procuramos deslocar as discussões sobre educação para dimensões e esferas outras daquelas que, tradicionalmente, realizamos em momentos acadêmicos como os minicursos. Chegar a um pensamento em movimento...

como uma fonte de movimentos, de potências de criação, de potências de deformação (e uma deformação compreendida como uma criação de novas formas), de pensamentos sem comparações. Pensamentos que buscam diferenciações e atualizações, fugindo de modelos. Pensamentos que adquirem velocidade, em direções perpendiculares, sem buscar por correlações localizáveis. Idéias que ajudam a fugir da comparação, da referência, de um modelo ideal, tão presentes em pesquisas e ações no campo da educação. Uma proposta de transitar pelo meio, ir e vir e não começar e terminar, em movimentos que provocam, potencializam e criam multiplicidades entre. Já aconteceu, acontece, acontecendo, acontecerá... Tempos a proliferar? E, com essa idéia de entre, pensar em produzir conhecimentos, pensamentos, atos, posturas num movimento de soltura das coisas e não no aprisionamento de forma delimitadas, demarcadas, instransponíveis de como pensar a educação, a escrita. Entre.

4 - n . 2 - v. 2

pensamento entre – imagens, questões, 140 caracteres escritos. Um pensamento entre

ano

Buscamos, ao longo do mini curso (assim como para este texto), provocar um

Revista GEMI n IS |

ampliação em intensidade na duração de tempo e escrita. Experimentamos essas in-

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Remind me (ou dá para lembrar em 140 caracteres?) 5

197 Imagens , Tempo, Escrita: invenções ressoam por twittes •

E lenise Cristina Pires de

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5 As imagens pertencem ao vídeoclip da música Remind me do grupo Röyksopp. O clipe foi dirigido por Ludovic Houplan & Hervé de Crécy, 2002. (Fonte:< http://royksopp.com/videos/remind-me>). Segui-se ao vídeo a questão: quantas vezes o mapa das Ilhas Birtânicas aparece?


Em tempos de quantificações de caracteres (ou número de alunos ou de aprovações ou de mapas das ilhas britânicas) escolhemos pensar com outros tempos. A balho com a definição, sugerida por Bergson, do tempo como “uma contínua criação de novidades inesperadas”... deslocamento do que poderíamos chamar de contexto (condições/espaço) e uma aproximação ao tempo (não o tempo cronológico, mas a duração)...

e sim movimentos de contrações e dilatações, expansões e adensamentos. Assim, sem pressa nem contagens? Com-templação? Assim, sem espaçamentos entre as palavras para ‘economizar’ toques. Depoisdetantaimageninteressanttantossentimentosensaçoesforamdespertadasquenãofaçoideiadequantasvezesotalmapaaparece. Propomos pensar, junto aos twittes, deslocar a educação, propor sua fuga dessa invenção temporal, deste tempo duração que expande e adensa e tenta, a todo instante, a demarcação do tempo como ‘fundamentação’ para a produção de conhecimento. Lembrar é educação? Remind me! (I like to move move...). 38 vezes, 14 minutos, 10 passos (ou escrita e criação) Nosso próximo fragmento foi exibir a abertura da produção cinematográfica Mais estranho que a ficção, dirigido por Marc Forster, 2006, com o questionamento “Seria a escrita um tempo de ex-cre-ver?”. Não mais crer no que (se) escreve? Tempo de liberdade de ex- pressão? A seguir, imagens do início do filme, que apresentam graficamente a rotina do personagem Harold, interpretado por Will Ferrell, lembrando que, entre as características dessa produção cinematográfica está a quantificação exata dos movimentos de Harold: mexer a escova de dentes 38 vezes, andar por 14 minutos até o ponto de ônibus, dar 10 passos para atravessar a rua...

4 - n . 2 - v. 2

lógico e não espacializado podemos pensar em movimentações que não são espaciais,

ano

UAUUUUUUU tb acho, quer dizer, vc tem certeza né? A partir de um tempo não crono-

Revista GEMI n IS |

primeira twitada a gente nunca esquece. Maurizio Lazarato (2007:94) nos propõe o tra-

198


199 Imagens , Tempo, Escrita: invenções ressoam por twittes •

em nossas pesquisas como “uma aposta estética de exploração de pensamentos, conhecimentos, experiências, vidas e(m) ambientes singulares. Não uma metáfora ‘escrever como se escreve uma carta’, mas uma singularização expressa” (ANDRADE; SPEGLICH, p. 124, 2011). Cartas twittadas que desejam explorar notícias, inventar ideias, expor sentimentos, ex-pressões. Tempos desejantes de potências inventivos. Cartas-tuites como uma aposta estética e de criação. Escrita, sentido, registro, educação. Escrita, tempo e invenção movimentados por entre questões e artefatos culturais. O que está acontecendo? Quantas vezes um mapa aparece? Seria a escrita um tempo de ex-cre-ver? Seria a escrita um tempo de experimentar? Tuiter, twitter, 140, cento e quarenta, caracteres, letras, toques. A escrita sobrevive? Não sabemos e nem temos essa in(pre)tenção, mas sim explorar o que está acontecendo, assim como o que não estaria. Ex-cre-ver. Cremos no

A ndrade - É rica S peglich

mundo, sem um destinatário fixo. Talvez até sem destinatário. Temos tratado as cartas

de

as mensagens do mini blog escritas por nós e pelos professores como cartas enviadas ao

E lenise Cristina Pires

Aquecer idéias é tweetar, produzir, é... Para produzir deslocamentos, pensamos


que escrevemos? Vemos o que lemos? Nos desvencilhamos do que lemos e escrevemos como ex-lidos e ex-critos? Questionamentos que querem esgarçar não somente a lineade pensamentos. E no plano educação? Quais fraturas e esvaziamentos esses twitters provocam?

Chamamos, então, Antonio Carlos Amorim “na negativa de serem repre-

pesquisas” (PINAR et all, 2010, p.190). São essas forças que também chamamos no mini curso e procuramos intensificar nesse texto. Outros registros. Outros tempos. As palavras estão aí para serem experimentadas... sabores diferentes a cada linha nova... a cada novo twitte... É muita informação para poucos caracteres... Buscas por experimentar atravessamentos na própria destruição da escrita com sentido “estrito”, “comparativo”, “equivalente”, com referências numa transcendência. Grunhido? Em 1 hora já produzimos quase 200 twittes... isso vai durar? 200 idéias... 200 escritas ou ex-critas? Dá para usar todos os 140 caracteres? Tudo se espalha tanto que não chegamos a usar todos os toques... O que seria ou não curto e/ou rápido? Palavras? Sentidos? Conversas realizadas em sentenças de (bem menos que) 140 caracteres a questionar a escrita, a velocidade, a rapidez, a conversa, os caracteres. Escrever no twitter, novas formas de pensar. Como se escreve? E então? Proliferando? Aos trilhões? Proliferações de sentidos inclusive do que é escrever, de como se escrever. Escrever-ler-cartar. No infinitivo. A escrita hoje, marca o tempo, o tempo e o tempo é registrado por essa interferência gráfica, tudo junto e misturado O tempo sobrevive? Não sabemos e nem temos essa in(pre)tenção, mas sim explorar o que está acontecendo, assim como o que não estaria. Escrever como tempo de criar. Em 140 ou 14000 caracteres. É possível criar sem experimentar? Experimentar e não mais criar? A invenção sobrevive? Não sabemos e nem temos essa in(pre)tenção, mas sim explorar o que está acontecendo, assim como o que não estaria. Eu carrego pensamentos. Em suspensão? Momento de um transformar-se em qualquer coisa-pensamento? Descontrole de criatividade?. Finalizamos com com Aldo Victorio Filho, ao discorrer sobre currículo, corpo e as desconexões entre tempo, criação, tecnologias e educação:

4 - n . 2 - v. 2

e imaginação são as forças conceituais para um outro pensamento que busco tecer em minhas

ano

sentação de realidade, mas criarem artifício, mundos à parte do real, as noções de ficção, verdade

Revista GEMI n IS |

ridade quase imposta às leituras e escritas mas também a linearidade para a produção

200


Aos professores participantes do mini curso no 18o. COLE: Atos Lucas Trevisan, Cleane Santos, Cristina Silveira, Sheila Miguel Moraes, Shirley Melo.

ambientes: desejos, perambulações, fugas, convites. Pesquisa em Educação Ambiental, vol. 6, n. 1, pp. 123-137, 2011 ANDRADE, Elenise Pires de & SPEGLICH, Érica. 140. Leitura:

Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2007. FISHER, Rosa Maria Bueno. Mídia, Imagem, Experiência. Texto apresentado no II Seminário Internacional “As redes do conhecimento e a tecnologia: imagem e cidadania”, 2003. LAZZARATO, Maurizio. Machines to Crystallize Time: Bergson. Teory, Culture & Society, Vol. 24(6): 93-122, 2007 (disponível em http://tcs.sagepub. com/content/24/6/93.extract - acesso em 11 de novembro de 2013). PINAR, Willian; LOPES, Alice Casimiro; AMORIM, Antonio Carlos; MACEDO, Elizabeth; OLIVEIRA, Inês Barbosa & ALVES, Nilda. Revista Teias v. 11, n. 22 , p. 187-208, maio/agosto 2010. VICTORIO FILHO, Aldo. Corpo escola: currículo vibrátil e pedagogia da carne. Currículo sem Fronteiras, v. 12, n. 3, p. 143-152, Set/Dez 2012.

A ndrade - É rica S peglich

DELEUZE, Gilles. Francis Bacon. Lógica da Sensação.

de

Teoria & Prática, Ano 30, número 58, junho de 2012.

E lenise Cristina Pires

ANDRADE, Elenise Pires de & SPEGLICH, Érica. Imagens a fabular

Referências

invenções ressoam por twittes

Agradecimentos

201 Imagens , Tempo, Escrita:

“Não afirmo (...) que a educação escolar tenha perdido sua função e, consequentemente, sua razão de existir. Arrisco afirmar que suas graduais deficiências, decorrentes do crescente afastamento entre o que o mundo adulto lhe imputa e as conjunturas culturais dos jovens, das crianças e da própria cidade múltipla onde se situa, apontam a exigência de investimentos inusitados que permitam o aproveitamento, em maior grau possível, do que ainda ofereceria de indispensável e promissor seus espaços e seus protagonistas, e uns aos outros. Ou seja, o encontro cotidiano das novas gerações em um espaço que se pode considerar vocacionado para a criação. Criação do mundo, das relações, criação de subjetivações diversas e de suas redes alicerçantes da unidade societal necessária aos tempos de agora. Da mesma forma que a criação poética e suas redes de saberes e energias podem corroborar com futuramentos esperançosos e presentes produtivamente favoráveis às novas plasticidades sociais” (Victorio Filho, p. 149, 2012).


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