Referencial Teórico

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REFERENCIAL TEÓRICO Educação em Direitos Humanos


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Província Marista Brasil Centro-Norte

Ir. Wellington Mousinho de Medeiros – Superior Provincial Ir. José Wagner Rodrigues da Cruz – Vice-Provincial Ir. Adalberto Batista Amaral – Conselheiro Ir. Ataide José de Lima – Conselheiro Ir. Renato Augusto da Silva – Conselheiro Superintendência Socioeducacional Dilma Alves Superintendência de Operações Centrais Artur Nappo Dalla Libera Superintendência de Organismos Provinciais Ir. Humberto Gondim Gerente Educacional Jaqueline de Jesus Gerente Social Cláudia Laureth Coordenadora Pedagógica Ireneuda Nogueira Coordenador Administrativo Arthur Gomes Neto Assessores Ir. Eduardo D´Amorim Ir. Iranilson Lima Equipe de Analistas Carla Floriana Martins Elaine Sampaio Thiago Araújo Wilson Martins C. Junior Equipe de Elaboração do Projeto Carla Floriana Martins Ireneuda Nogueira Jaqueline de Jesus Lauriene Ayres Queiróz Paulo de Tarso Motta Ferreira Tereza C. Cahu Brotherhood Oliveira Thiago Araújo Equipe de Elaboração do Texto Diogo Lúcio P. Vieira Lauriene Ayres Queiróz Brasília, 2012 3


Sumário

Capítulo I - A Trajetória Histórica dos Direitos Humanos 06

1. INTRODUÇÃO

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2. O PROCESSO HISTÓRICO DE CRIAÇÃO, LEGALIZAÇÃO E UNIVERSALIZAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS

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3. OS DIREITOS FUNDAMENTAIS NO BRASIL APÓS A CONSTITUIÇÃO DE 1988

Capítulo II - Direitos Humanos

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1. O SISTEMA INTERNACIONAL DE PROTEÇAO DOS DIREITOS HUMANOS

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2. ORGANIZAÇÃO DAS NAÇOES UNIDAS

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3. CÔRTE DE HAIA - TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL

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4. ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS

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5. DA CÔRTE INTERAMERICANA DOS DIREITOS HUMANOS

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6. DIREITOS HUMANOS NO BRASIL

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7. DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

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8. SEGURANÇA PÚBLICA E DIREITOS HUMANOS

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9. DO IDOSO

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10. DA MULHER

DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS

DIREITOS FUNDAMENTAIS PREVISTOS DO ART. 5º DA CONSTITUICAO FEDERAL


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11. DA PESSOA PORTADORA DE NECESSIDADE ESPECIAL

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12. DO MEIO AMBIENTE

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13. DO PORTADOR DE HIV

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14. DA PESSOA PORTADORA DE SOFRIMENTO PSÍQUICO

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15. DO TRATAMENTO PARA DEPENDÊNCIA QUÍMICA

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16. CONVENÇÃO CONTRA A TORTURA E OUTROS TRATAMENTOS OU PENAS CRUÉIS, DESUMANAS E DEGRADANTES

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17. DA DEFESA DOS ÍNDIOS

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18. DA DOUTRINA SOCIAL DA IGREJA - DSI

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DECLARAÇÃO ISLÂMICA UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS

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LEI Nº 7.853, DE 24 DE OUTUBRO DE 1989

LEI No 10.216, DE 6 DE ABRIL DE 2001.

REFERÊNCIAS

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Capítulo I - A Trajetória Histórica dos Direitos Humanos “Os direitos do homem, por mais fundamentais que sejam, são direitos históricos, ou seja, nascidos em certas circunstâncias, caracterizados por lutas em defesa de novas liberdades contra velhos poderes, e nascidos de modo gradual, não todos de uma vez e nem de uma vez por todas.” 1 Norberto Bobbio

1. INTRODUÇÃO Como podemos pensar os direitos humanos em um mundo marcado por diferentes sociedades, formadas a partir de diferentes contextos históricos, culturais e morais? Além disso, como podemos avaliar a presença dos direitos humanos em nosso país? Para responder a essas perguntas intrigantes, fazse necessário, inicialmente, definirmos um conceito sólido para a expressão Direitos Humanos. Seguindo o pensamento de Norberto Bobbio, os Direitos Humanos não representam apenas as necessidades básicas fundamentais para que os indivíduos sobrevivam em nosso planeta. Para o autor, as pessoas devem ser compreendidas como seres sociais, que possuem uma série de direitos políticos, econômicos e sociais, conquistados a partir de lutas evidenciadas ao longo da história das civilizações. Para Ruy Barbedo Antunes, os Direitos Humanos representam a proteção da pessoa, não apenas de suas particularidades individuais, mas também de sua inserção na sociedade, que é formada, em grande medida, por convenções universais. Pode-se considerar, portanto, que os Direitos Humanos não estão vinculados a uma sociedade específica, são universais, isto é, resultam das conquistas históricas alcançadas a partir das relações sociais, obtidas por grupos humanos socialmente menos privilegiados. Sendo assim, os Direitos Humanos, ao serem conquistados, passam a ser transmitidos para as gerações seguintes, tratando-se de sociedades constituídas e interligadas. Para que, então, possamos compreender em que ponto os Direitos Humanos avançaram e de que maneira podemos contribuir para novos progressos, faremos uma análise das conquistas históricas evidenciadas pela humanidade ao longo do tempo. Para isso, iremos abordar, neste texto, os avanços obtidos a partir da formação dos Estados Nacionais europeus na transição da Baixa Idade Média para a Idade Moderna. Essa escolha se deve ao fato desse período marcar o início do processo de formação das sociedades modernas capitalistas e da cultura ocidental em que estamos inseridos. Para analisarmos o caso específico do Brasil, iremos transitar entre dois conceitos diferentes: o de Direitos Humanos e o de Direitos Fundamentais. Para Dirceu Pereira Siqueira e Miguel Belinati Piccirillo, os Direitos Humanos seriam decorrentes das conquistas históricas das sociedades, independente das fronteiras políticas existentes entre as nações. Por outro lado, os Direitos Fundamentais estariam relacionados a um contexto político constitucional específico, isto é, representariam as leis existentes em um determinado país, tendo como fundamento os Direitos Humanos. Dessa forma, a partir da Constituição de 1988, iremos analisar os avanços e os limites das atuais leis brasileiras relacionadas aos Direitos Humanos.

1 BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. 1 ed. 12. tir. Rio de Janeiro: Campus, 1992

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2. O PROCESSO HISTÓRICO DE CRIAÇÃO, LEGALIZAÇÃO E UNIVERSALIZAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS 2.1 A importância da Constituição e a crise do absolutismo monárquico no século XVIII A passagem da Baixa Idade Média para a Idade Moderna marca a formação dos Estados Nacionais na Europa. Durante o período medieval, observou-se a fragmentação do poder político nas mãos de membros da nobreza europeia, comumente denominados de senhores feudais, pois governavam os feudos, grandes latifúndios protegidos, nos quais estes senhores impunham a lei sobre a comunidade local, formada por nobres guerreiros, membros do clero e servos camponeses. Os monarcas, nesse período, dependiam do apoio político dos senhores feudais para governar, assumindo a função de comandantes do exército em períodos de guerra, devido ao pacto de suserania e vassalagem, juramento de honra e fidelidade entre nobres guerreiros, no qual o rei era considerado o suserano de todos os suseranos. A crise da Baixa Idade Média está relacionada a uma série de eventos que contribuíram para a retomada da vida urbana e o surgimento de uma nova classe social, a burguesia, que se tornou parte da elite econômica europeia, por desenvolver o lucrativo comércio de especiarias do Oriente para o Ocidente. Dentre esses eventos, destacam-se as Cruzadas (séculos XI ao XIII), o deslocamento de exércitos formados por nobres cristãos em direção a Jerusalém, respondendo à convocação feita pelo papa Urbano II, com o objetivo de “libertar” a cidade de Jerusalém do controle islâmico. O deslocamento de tropas em território europeu contribuiu para a reativação e proteção de antigas estradas romanas, além da construção de novos caminhos, o que favoreceu a circulação de pessoas e mercadorias, bem como o surgimento dos burgos, núcleos urbanos voltados para o comércio. Muitos reis, como Ricardo Coração de Leão, da Inglaterra; Felipe Augusto, da França; e Frederico Barbarruiva, do Sacro Império Romano Germânico, comandaram cruzadas contra os “infiéis” islâmicos. Tratando dos ingleses, o fracasso da cruzada liderada pelo rei Ricardo gerou uma grande perda para os cofres reais. Seu irmão e sucessor, rei João I, visando a ampliar os ganhos reais, aumentou os impostos, o que gerou a reação dos barões ingleses, título atribuído aos senhores locais. Em 1215, a pressão dos barões, que invadiram Londres, sobre o rei fez com que este se visse obrigado a assinar a Carta Magna, um documento com sessenta e três artigos, que tinham como objetivo limitar o poder real, submetendo-o a um comitê de barões, evitando assim medidas autoritárias do monarca contra seus súditos. Após os barões deixarem Londres, o rei João I negou muitos dos artigos presentes na Carta Magna, como o 61, que submetia sua autoridade ao comitê de barões. Esse fato não diminui a importância da Carta Magna como conquista para os Direitos Humanos, por ter sido o primeiro documento do período moderno a limitar, na Europa, a autoridade real, além de assegurar a propriedade privada, o direito de ir e vir, a autonomia da Igreja sobre as suas práticas, garantindo também o julgamento do réu mediante uma acusação. A Carta Magna representou, então, um importante passo para o constitucionalismo moderno, isto é, a criação de leis escritas por uma assembleia, com validade em um determinado território nacional, independente da vontade de um monarca ou de qualquer outro poder executivo. Ao longo da história inglesa, os princípios da Carta Magna foram negados por inúmeros monarcas. Este foi um dos fatores que contribuíram para o início da Revolução Inglesa no século XVII, uma guerra civil travada entre anglicanos, católicos e calvinistas, envolvendo interesses políticos, econômicos e religiosos. O fim desse conflito se deu com a Revolução Gloriosa, que ocorreu entre os anos de 1688 e 1689. Nesse período, a burguesia e os bispos anglicanos pressionaram o monarca Jaime II a renunciar em nome de sua filha Maria Stuart, casada com o príncipe holandês Guilherme de Orange. O motivo da reação desses membros da sociedade inglesa contra o então rei devia-se ao desejo de Jaime II de ignorar a Carta Magna e afirmar-se como monarca absolutista, impondo, mais uma vez, o catolicismo em seu reino. Essa reação recebeu o nome de “Gloriosa”, pelo fato de não terem ocorrido ações violentas e derramamento de sangue.

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A vitória burguesa, nesse período, garantiu a assinatura do Bill of Rights, em 1689, por Maria Stuart e Guilherme de Orange, um documento que reafirmava os princípios da Magna Carta e submetia a autoridade do rei à vontade de um Parlamento, que passaria também a controlar o poder executivo ao escolher um Primeiro-Ministro. A Revolução Gloriosa representou um importante passo para a legitimação e legalização de Direitos Humanos, pois assegurou, definitivamente, na Inglaterra, os limites impostos ao poder real, acabando com o Absolutismo no reino. Além disso, garantiu a propriedade privada e assegurou que as leis passariam a representar os interesses de uma parcela maior da sociedade, capaz de escolher seus representantes no Parlamento, já que o voto era censitário (direito de voto baseado na renda). Apesar de tais conquistas, não se pode afirmar que o Bill of Rights estabeleceu a igualdade de direitos e deveres na Inglaterra, nem que respeitou por completo a liberdade de expressão. Vale lembrar que garantir a propriedade privada, em uma sociedade desigual, legitima as desigualdades já existentes, mantendo os mais pobres no mesmo estado em que se encontravam antes da Revolução. Além disso, o sistema de votação para o Parlamento era censitário, o que impedia que os membros das camadas mais baixas votassem. Nesse sentido, tal movimento não foi de fato uma revolução, mas sim uma reforma, já que apenas alterou as elites no poder, não gerando grandes transformações sociais. Tratando da liberdade de expressão, o Anglicanismo foi mantido como religião oficial, fato que levou muitos calvinistas a partirem para as Treze Colônias inglesas (atual EUA), com o objetivo de conquistar a liberdade de culto na colônia. As contradições estiveram presentes em outros documentos importantes para a história dos Direitos Humanos. Dentre estes, podemos destacar: a Declaração de Independência dos EUA, de 4 de julho de 1776, que representou um grande marco para os defensores do liberalismo, seja ele político, econômico ou social. Esse documento não só defendeu o fim da submissão política das Treze Colônias perante a metrópole inglesa, que impunha aos colonos pesados impostos desde 1765, mas também apresentou princípios do liberalismo político formulados por importantes nomes do Iluminismo, como Rousseau e Montesquieu. A Declaração de Independência é inspirada no contrato social formulado por Rousseau, no qual se afirma que seria função dos líderes do Estado representar os interesses da nação, pois, do contrário, estes seriam retirados do poder. Além disso, baseia-se na teoria dos três poderes de Montesquieu, defendendo a divisão do poder político em três esferas autônomas, mas que se fiscalizariam, sendo estas o executivo, o legislativo e o judiciário, o que evitaria a centralização do poder e o surgimento de uma tirania. No documento também se afirma que todos os homens são iguais perante Deus e possuidores de direitos inalienáveis, isto é, direitos que não poderiam ser deles retirados, como a liberdade, a vida e a busca pela felicidade. Todas as garantias acima descritas representaram conquistas para os Direitos Humanos, pois se tornaram constitucionais entre os anos de 1787 e 1791. Apesar disso, a Declaração de Independência não defendeu o fim da escravidão no país que estava sendo formado. Além do preconceito, um importante fator para tal decisão foi a necessidade de unificar os colonos do norte com os do sul contra a Inglaterra, entendendo que muitos sulistas desejavam a manutenção da escravidão. A escravidão vai contra todos os princípios dos Direitos Humanos, pois “coisifica” o escravo, isto é, transforma um ser humano em uma mercadoria, retirando dele aquilo que é mais sagrado, sua humanidade. Na França, também temos exemplos do preconceito contra negros presentes em importantes documentos constitucionalistas. Em sua obra, O Espírito das Leis, de 1748, Charles Secondat Montesquieu, nobre francês, não só desenvolveu a teoria dos três poderes, descrita anteriormente, bem como defendeu os direitos inalienáveis dos seres humanos. Afirmava que os homens, em seu estado de natureza, isto é, antes de se tornarem seres sociais e se submeterem às leis de uma sociedade, seriam iguais, com os mesmos direitos e deveres. Por outro lado, mesmo criticando a escravidão de negros na América portuguesa, afirmando ser uma ação irracional de bárbaros, não negava a inferioridade dos negros perante os brancos, utilizando, como justificativa para seus argumentos, apenas critérios raciais.

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A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão representou mais um avanço na garantia dos Direitos Humanos sem, contudo, deixar de ser contraditória. Conjunto de princípios criados em 1789, na primeira fase da Revolução Francesa, a Declaração tinha, como principal objetivo, garantir interesses da burguesia à frente da Revolução. Os princípios presentes nesse documento foram utilizados pela Assembleia Nacional Constituinte francesa, como referência para a criação de uma nova constituição para o país, que ficou pronta no ano de 1791. Os princípios da Declaração defendiam a liberdade de expressão, o fim do absolutismo monárquico e dos privilégios feudais, acabando com a divisão da sociedade em classes baseadas na origem de nascimento, transformando todos em cidadãos iguais perante as leis; “[...] afirma solenemente que qualquer sociedade em que não esteja assegurada a garantia dos direitos fundamentais nem estabelecida a separação dos poderes não tem constituição”2. Como no caso do Bill of Rights inglês, a Declaração garantiu a posse sobre a propriedade privada, um avanço inquestionável para os Direitos Humanos, tratando de sociedades que até então estavam sob controle de monarcas absolutistas, os quais, se desejassem, poderiam tomar a propriedade de um súdito. Por outro lado, esses documentos não combateram as desigualdades sociais, por terem sido produzidos por uma maioria de membros da elite burguesa. Tanto a Declaração dos Direitos, quanto a Constituição francesa de 1791, não acabaram com a escravidão negra nas colônias francesas e nem garantiram um sistema de votação baseado no sufrágio universal (voto independente da renda), optando pelo voto censitário. Siqueira e Piccirillo destacam que a Declaração dos Direitos defendeu um fortalecimento do legislativo sobre os demais poderes propostos por Montesquieu, o que deu origem, em 1791, a um sistema de monarquia parlamentar, que submetia a autoridade do rei ao parlamento. Esse fato diferenciou a Declaração dos Direitos francesa da Declaração de Independência dos EUA, pois esta última fortaleceu o poder executivo perante o legislativo, devido ao descontentamento dos antigos colonos perante a atuação do parlamento inglês durante o período de colonização. Seguindo a reflexão dos autores, pode-se concluir que, apesar das diferenças e contradições existentes entre o Bill of Rights, a Declaração de Independência dos EUA e a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, não se pode negar a importância desses documentos para a “constitucionalização dos direitos inerentes à pessoa”, dando origem ao Estado de Direito, em que todos, na sociedade, passaram a ser submetidos às leis, desde um simples indivíduo até os representantes máximos do Estado, legalizando as conquistas dos Direitos Humanos.

2.2 As conquistas das minorias no contexto mundial do século XIX Os desafios enfrentados para a consolidação dos Direitos Humanos também foram vivenciados no contexto político Latino Americano. A colonização portuguesa na América foi marcada pela escravidão de indígenas e de negros africanos, situação não muito diferente da evidenciada na América espanhola, onde se pode observar a utilização de mão de obra escrava negra africana e a servidão imposta às populações indígenas. A construção da identidade nacional em países marcados por um passado colonial, em que esteve presente a servidão e a escravidão, tem, no preconceito, um dos maiores desafios a serem enfrentados no processo de reconhecimento dos direitos das minorias. O processo de independência da América espanhola foi marcado por uma série de projetos que tinham como objetivo garantir a unidade políticoterritoral das antigas colônias hispânicas, vista por muitos como fundamental para assegurar as liberdades conquistadas e, ao mesmo tempo, possibilitar o desenvolvimento econômico. Esse ideal de unidade deu origem ao pan-americanismo, por defender a associação e a cooperação entre as nações americanas. Entre os defensores desse projeto, destacou-se Símon Bolivar, político e militar venezuelano, líder atuante no processo de independência da América espanhola, que teve papel importante no Congresso do Panamá.

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Artigo 16 da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 26 de agosto de 1789.

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O Congresso do Panamá reuniu, em 1826, representantes do México, Peru, Grã - Colômbia (atuais repúblicas da Colômbia, Panamá, Venezuela e Equador) e Províncias Unidas de Centro - América (atuais Costa Rica, El Salvador, Guatemala, Honduras e Nicarágua). Entre os objetivos do Congresso, destacava-se a concretização de uma unidade política entre os países hispano-americanos independentes, a constituição de uma força conjunta militar visando a evitar tentativas de reconquista territorial na América por nações europeias, além do fim da escravidão. Bolívar idealizou uma comunidade de Estados baseada em leis comuns e universais que tratavam da cidadania e deveriam garantir a aplicação dos princípios da liberdade, da autodeterminação dos povos, da igualdade, do equilíbrio dos Estados e do poder de inserção dessa Comunidade nas decisões da Sociedade Internacional. Dessa maneira, o Código de Bolívar, adotado temporariamente na Bolívia, representou um importante passo para a garantia das liberdades individuais na América. O Brasil não participou deste encontro, apesar de Dom Pedro I ter escolhido, como seu representante, o conselheiro Theodoro José Biancardi, que não chegou a fazer a viagem. O mesmo ocorreu com os EUA. É importante ressaltar que o sistema político adotado no Brasil, após sua independência, em 1822, não foi a República, adotada nas antigas colônias hispano-americanas, mas o Império, regido inicialmente por Dom Pedro I, o que distanciava, politicamente, o país das demais nações latino-americanas. Essa situação foi agravada devido ao fato de Carlota Joaquina, mãe de Dom Pedro, fazer parte da nobreza espanhola. Além disso, a aristocracia brasileira, à frente do processo de independência, dando destaque para as elites do sudeste, temia que as diferenças regionais existentes no país gerassem a fragmentação do território nacional, dando origem a pequenas repúblicas, como havia ocorrido na América espanhola. Em relação aos Direitos Humanos, os avanços propostos por Simon Bolívar foram ignorados em parte pelos EUA e pelo Brasil, nações que se mantiveram escravocratas até a segunda metade do século XIX. A lei que determinou o fim da escravidão entrou em vigor nos EUA em 1863. A eleição do nortista e abolicionista, Abraham Lincoln, em 1860, à presidência dos EUA, deu início à Guerra de Secessão (1861 a 1865), uma guerra civil envolvendo estados nortistas abolicionistas e sulistas escravocratas. Mesmo com a vitória dos nortistas, políticas de segregação racial continuaram a vigorar em muitos estados norte-americanos até meados do século XX. Nesse contexto, destacou-se a luta não violenta de Martin Luther King, um pastor protestante que se tornou ativista político ao defender, na década de 1960, o fim da segregação racial nos EUA, recebendo, por isso, o Premio Nobel da Paz em 1964. Ao defender o direito ao voto, o fim da segregação, o fim das discriminações no trabalho e outros direitos civis básicos aos afrodescendentes norte-americanos, deu importante contribuição para a incorporação dessas garantias à lei de Direitos Civis de 1964 e à lei de Direitos Eleitorais de 1965. A luta pelo fim da escravidão no Brasil também percorreu o século XIX, tendo que enfrentar os interesses da tradicional aristocracia cafeeira brasileira, cuja produção era desenvolvida a partir de mão de obra escrava negra. Entre os fatores que contribuíram para o fim da escravidão no país, destaca-se a pressão do Estado inglês sobre o brasileiro, visando a transformar os escravos em trabalhadores assalariados e a ampliar o mercado consumidor para os produtos ingleses industrializados. Além disso, havia a pressão da opinião pública, no Brasil e na Inglaterra, contrária à escravidão, formada por parcelas da elite intelectual, influenciadas pela ética positivista proposta por Augusto Comte (1798-1857), que classificava a escravidão como uma prática bárbara e irracional. A defesa do fim da escravidão, do positivismo e do republicanismo esteve presente na Academia Militar da Praia Vermelha, centro de formação de cadetes do Exército brasileiro que, a partir de 1872, teve, no professor Benjamim Constant Botelho de Magalhães, um dos seus principais ícones. O republicanismo e a defesa do fim da escravidão também estiveram presentes no Partido Republicano Paulista, fundado em 1873, por membros da elite cafeeira do oeste paulista, influenciados pelo republicanismo norte-americano. Tanto militares positivistas quanto republicanos da elite cafeeira foram fundamentais para a assinatura da lei Áurea, em 13 de maio de 1888, pela Princesa Isabel, que oficializou o fim da escravatura no Brasil. Esse fato gerou o enfraquecimento político da monarquia, que perdeu o apoio da aristocracia escravocrata, o que possibilitou a queda do sistema imperial e a proclamação da República, conduzida pelo Marechal Deodoro da Fonseca em 15 de novembro de 1889.

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Ao analisar os Direitos Humanos e as conquistas das minorias no século XIX, também deve-se destacar o contexto de luta do proletariado europeu contra a opressão do capital, responsável pela superexploração do trabalho, a partir de baixos salários, longas jornadas de trabalho em ambientes insalubres, marcados, muitas das vezes, pelo trabalho infantil. Nesse sentido, deve-se destacar o Manifesto Comunista, obra de autoria de Karl Marx, publicada em 1848. No Manifesto, pode-se observar uma perspectiva política de Marx, inserida no contexto de lutas socialistas, em que o autor apresenta seu pensamento, mas também sua expectativa de prática visando a alcançar o comunismo. É interessante perceber que, no Manifesto, Marx adota a postura de defender a união entre burgueses revolucionários e operariados, na luta contra a monarquia absolutista, a propriedade fundiária feudal e a pequena burguesia. A defesa da união entre burguesia e proletariado foi deixada de lado pelo autor em seus textos posteriores ao Manifesto. Uma das contribuições dadas pelo Manifesto Comunista à luta pelos direitos do operariado deve-se à defesa da força política e social do proletariado a partir de sua união, dando destaque à força da maioria, entendendo que os movimentos sociais existentes até então haviam mobilizado apenas minorias. Além disso, defende o processo de democratização marcado pela luta contra a classe burguesa, dando origem a um Estado controlado pelo proletariado. Ao analisar o Manifesto, Ruy Fausto demonstra que a concepção de democracia formulada por Marx, nessa obra, abre margem para a concentração de poderes nas mãos do proletariado revolucionário, podendo dar origem a um sistema antidemocrático. Para Ruy Fausto, a obra não trata de uma “ditadura” do proletariado, mas de uma “dominação” do proletariado, o que não permite dizer que Marx defendia um partido único, mas que este poderia ser formado, como foi observado em revoluções socialistas do século XX, como na China. Por outro lado, o filósofo chama a atenção para o radicalismo na concepção de revolução permanente presente no Manifesto. Tal concepção não resguardaria os direitos dos grupos não revolucionários e defenderia uma transição violenta entre o capitalismo e o socialismo. Pode-se concluir que o Manifesto Comunista representou, em seu contexto de produção e para as gerações seguintes, um importante texto em defesa da luta do proletariado. Marcado pelas contradições e pelas ambiguidades próprias das teorias socialistas, contribuiu para a globalização da importância da luta de classe e para a consolidação de garantias trabalhistas, redefinindo as relações de trabalho e de salário.

2.3 Os direitos humanos no século XX Como garantir que as nações do planeta apliquem, em seus territórios, as conquistas alcançadas pelos direitos humanos? Paulo César Manduca desenvolveu um interessante estudo em que relacionou o Direito Internacional aos Direitos Humanos. Em seu artigo, demonstrou que um dos fatores responsáveis pela universalização dos Direitos Humanos seria a sociabilidade entre as nações, o que garantiria a propagação de valores que se tornariam comuns aos diferentes povos. Nesse sentido, o século XX representou um período marcado pelo despertar de uma “consciência coletiva” no mundo moderno, movimento iniciado após os terríveis cenários de destruição promovidos pela Primeira Guerra e pela Segunda Guerra Mundial. Para o autor, “A história recente dos Direitos Humanos está intimamente ligada às tragédias humanitárias do século XX”. A primeira Guerra Mundial ocorreu entre os anos de 1914 e 1918. Esse conflito foi marcado por um intenso desenvolvimento tecnológico, fruto da Corrida Armamentista, iniciada no século XIX, momento em que as nações europeias industrializadas investiram no aperfeiçoamento bélico, como forma de desenvolver suas indústrias e de se prepararem para um possível conflito com as nações concorrentes. Dessa forma, foram criadas metralhadoras, granadas, aviões bombardeiros, entre outros inventos que contribuíram para a ampliação do número de mortos, devido aos combates, dando destaque ao grande número de civis mortos (não combatentes). Estima-se que nove milhões de pessoas tenham morrido na Primeira Guerra Mundial. A tragédia humanitária despertou na Europa um estado de consciência, tratando da importância de se criar mecanismos que pudessem evitar que novos conflitos dessa magnitude assolassem o continente.

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Woodow Wilson, presidente dos Estados Unidos, entre os anos de 1912 e 1920, apresentou para a comunidade internacional um conjunto de princípios que ficaram conhecidos como os 14 Pontos de Wilson. Estes eram: 1) abolição da diplomacia secreta; 2) liberdade dos mares; 3) eliminação das barreiras econômicas entre as nações; 4) limitação dos armamentos nacionais ao nível mínimo compatível com a segurança; 5) ajuste imparcial das pretensões coloniais, tendo em vista os interesses dos povos atingidos por elas; 6) evacuação da Rússia; 7) restauração da independência da Bélgica; 8) restituição da Alsácia e da Lorena à França; 9) reajustamento das fronteiras italianas, seguindo linhas divisórias de nacionalidade claramente reconhecíveis; 10) desenvolvimento autônomo dos povos da Áustria-Hungria; 11) restauração da Romênia, da Sérvia e do Montenegro, com acesso ao mar para Sérvia; 12) desenvolvimento autônomo dos povos da Turquia, sendo os estreitos que ligam o Mar Negro ao Mediterrâneo abertos permanentemente; 13) uma Polônia independente, habitada por populações indiscutivelmente polonesas e com acesso para o mar; 14) uma Liga das Nações, órgão Internacional que evitaria novos conflitos, atuando como árbitro nas contendas entre os países. Ao propor a criação da Liga das Nações, em 1920, o presidente Wilson visava a consolidar um cenário de estabilidade no continente europeu após o término da Guerra, evitando retaliações radicais às nações derrotadas, no sentido de garantir a retomada de relações internacionais harmônicas no continente. A França, membro da Tríplice Entente, vencedora do conflito, não acatou parte das propostas apresentadas por Wilson. Sob influência do revanchismo francês, a Alemanha, nação derrotada na Guerra, foi considerada a responsável pelo início do conflito. As sanções e as indenizações impostas à Alemanha, a partir do Tratado de Versalhes (1919), contribuíram para a crise econômica e política evidenciada nesta nação nos anos seguintes, o que favoreceu a ascensão de Adolf Hitler ao poder no país no ano de 1933. O presidente Wilson almejava levar os conflitos entre as nações para a esfera do Direito Internacional, isto é, por meio de uma agência internacional formada por representantes das nações mundiais, acima da soberania nacional, que seria capaz de atuar na conciliação de conflitos internacionais. O fracasso da Liga das Nações ocorreu devido às dificuldades impostas pelo Tratado de Versalhes e às suas consequências para o contexto alemão. A entrada da Alemanha, em 1925, na Liga das Nações, também não foi suficiente para evitar um novo conflito generalizado, iniciado em 1939, com as violações internacionais geradas por Hitler. A Segunda Guerra foi marcada por genocídios e demais atrocidades em uma proporção que a humanidade nunca havia visto. Iniciada com a invasão da Alemanha à Polônia, em primeiro de setembro de 1939, teve, no holocausto judeu, o maior atentado aos Direitos Humanos. O holocausto representou uma série de medidas adotadas pelo Estado nazista para perseguir, aprisionar, escravizar e exterminar a população judaica, tendo, como justificativa, argumentos racistas, e sendo uma clara ação estatal contra uma minoria étnico-religiosa. Em sete de dezembro, os Estados Unidos entraram na Guerra contra o Eixo (Alemanha, Itália e Japão), após terem sido atacados por aviões japoneses em Pearl Harbor. No ano de 1945, a Segunda Grande Guerra chegou ao fim, com a invasão das tropas aliadas a Berlim e os ataques nucleares norte americanos às cidades japonesas de Hiroshima e Nagazaki, marcando o fim do conflito no Pacífico.

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Com o término da Guerra, a necessidade de gerar uma nova estabilidade para o cenário internacional assolou as nações pelo mundo. Os Direitos Humanos assumiram papel de destaque nos debates que se seguiram na busca pela universalização de valores éticos, que deveriam tornar se comuns a todas as nações. Nesse contexto, foi criada a Organização das Nações Unidas (ONU), em 1945, com o objetivo de se tornar a interlocutora das relações internacionais travadas entre as nações, visando a garantir a paz mundial e o respeito aos Direitos Humanos. A ONU é composta por uma Assembleia Geral aberta aos representantes das nações participantes por uma Côrte Internacional de Justiça, por um Conselho Econômico e Social e por um Conselho de Segurança, órgão com o objetivo de definir as ações da Organização diante dos conflitos internacionais. O Conselho de Segurança é formado por cinco países que possuem assentos permanentes, sendo estes os Estados Unidos, a Inglaterra, a China, a França e a Rússia. Além disso, possui dez assentos temporários, ocupados por nações escolhidas por meio de votação pela Assembleia Geral. A concentração de poderes nas mãos das cinco nações à frente do Conselho de Segurança é apontada, por Paulo César Manduca, como um dos principais motivos para as dificuldades enfrentadas pela ONU para solucionar conflitos internacionais. Os membros permanentes do Conselho de Segurança são os únicos com poder de veto, isto é, o voto negativo de uma dessas nações representa o veto diante de uma resolução debatida pelos quinze membros do Conselho. Esse fato abre margem para posicionamentos baseados em interesses políticos ou econômicos e não necessariamente humanitários. Tratando de sua atuação em defesa dos Direitos Humanos, a ONU criou, no ano de 1948, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, documento composto por trinta artigos que se dedicaram a reafirmar princípios presentes na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, como a defesa da liberdade de expressão e da livre circulação de pessoas. Esse documento também traçou diretrizes acerca da atuação da ONU, ao tratar de crimes de genocídio, status dos refugiados, discriminação racial e contra a mulher, escravidão e torturas de todo o tipo, além dos direitos da criança. Dawisson Belém Lopes destaca que a Assembleia Geral não tem capacidade de legislar no cenário internacional, isto é, determinar leis mundiais para as nações a partir das concepções da ONU sobre temas por ela debatidos, como por exemplo, os Direitos Humanos. Por outro lado, o autor afirma que as determinações ou recomendações apresentadas pela Assembleia Geral, como nos artigos da Declaração de 1948, tornam-se referências a serem seguidas pelas nações membros, principalmente em se tratando dos Direitos Humanos. Isso se deve ao fato da ONU possuir importante influência política no cenário internacional, e por propagar, entre seus objetivos, os princípios universalistas. O não cumprimento dessas recomendações por nações membros pode gerar sanções por parte da ONU, isto é, decisões punitivas, determinadas pelo Conselho de Segurança, o órgão responsável por essas medidas, que inclusive pode recorrer ao uso da força. Demétrio Magnoli lembra que os Direitos Humanos foram proclamados inicialmente no Ocidente, mas que estes não seriam “ocidentais”. O processo de consolidação dos Direitos Humanos garantiu, no Ocidente, a separação entre política e religião, entre indivíduo e comunidade, além da formação do Estado-Nação e do sistema democrático. Com a Declaração Universal de 1948, tais direitos foram aceitos pela comunidade internacional, sendo adotados, progressivamente, por diferentes países a partir de tratados assinados após o processo de descolonização afro-asiática (segunda metade do século XIX). Apesar disso, não se pode negar o fato de muitas nações Ocidentais e Orientais terem ignorado, nas últimas décadas, direitos básicos a seus cidadãos, como por exemplo, o Brasil, durante a Ditadura Militar (1964 a 1985); governos autoritários contestados recentemente durante a Primavera Árabe; além de uma série de protestos e revoluções ocorridas em países de maioria islâmica no Oriente Médio e no norte da África, que derrubaram ditadores como Muamar Kadafi na Líbia. A Convenção de Genebra de 1949 também trouxe importantes contribuições para a garantia dos Direitos Humanos no cenário internacional, voltando-se para a manutenção de tais direitos durante períodos de guerra. Inicialmente assinada por potências europeias em 22 de agosto de 1864, a Convenção foi proposta pelo comerciante de Genebra, Henri Dunant, que havia atuado, por meio de atendimentos de pronto-socorro a soldados feridos de ambos os lados, na batalha de Solferino, ocorrida em 1859, envolvendo tropas austríacas e franco-piemonteses. Dunant fundou o Comitê Internacional da Cruz Vermelha, organização humanitária para socorrer vítimas de guerras.

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Os princípios da Convenção de Genebra foram retomados na Convenção de Haia, de 1907, sendo aplicados também aos conflitos marítimos, e na Convenção de Genebra, de 1929, alcançando os prisioneiros de guerra. Em 1925, ainda em Genebra, foi definida a proibição da utilização, durante períodos de guerra, de gases tóxicos e de armas bacteriológicas. A Convenção de Genebra, de 1949, tratou do Direito Internacional Humanitário, definindo a proteção aos feridos e aos prisioneiros de guerra, doentes e civis, além de garantir a proteção aos funcionários de operações de paz e humanitárias, a partir de Protocolos Adicionais criados em 1977. As determinações da Convenção de Genebra contribuíram para a definição de crimes de guerra, norteando a confecção do Estatuto de Roma, tratado que deu origem à Côrte Penal Internacional, criada pela ONU no ano de 1998.

3. OS DIREITOS FUNDAMENTAIS NO BRASIL APÓS A CONSTITUIÇÃO DE 1988 Com o fim da Ditadura Militar no Brasil, no ano de 1985, teve início no país um processo de redemocratização, marcado inicialmente pela eleição do civil, Tancredo Neves, para a presidência da República. Com a morte de Tancredo, o vice-presidente José Sarney assumiu a presidência, dando início, no ano de 1986, à formação de uma Assembleia Nacional Constituinte. Entre os anos de 1987 e 1988, os parlamentares eleitos para a Assembleia Nacional desenvolveram a nova Constituição, que foi oficializada e promulgada no dia 5 de outubro de 1988, por Ulysses Guimarães, então presidente da Câmara. A Constituição de 1988 foi denominada por Ulysses Guimarães como a “constituição cidadã”, devido ao fato de apresentar, em seu texto, conquistas tratando dos direitos individuais, sociais e políticos dos cidadãos brasileiros. Em relação aos Direitos Humanos, baseando-se no sufrágio universal, garantiu o direito de voto para todos os brasileiros, incluindo analfabetos e adolescentes entre 16 e 18 anos. Após anos de censura e repressão promovidas pela Ditadura Militar, a Constituição garantiu o retorno do habeas corpus, direito de liberdade atribuído ao cidadão quando detido ilegalmente pelo poder público, e criou o habeas data, que permite acesso às informações individuais armazenadas por órgãos públicos. Além disso, transformou a tortura em um crime inafiançável. Garantiu também o direito à cidadania e à dignidade da pessoa, defendeu a erradicação da pobreza, da marginalização e das desigualdades sociais, rompendo com os preconceitos de origem, raça, sexo, idade e cor, além de defender a igualdade entre os gêneros e considerar o racismo como crime inafiançável. Em se tratando dos avanços internacionais no campo dos Direitos Humanos, a Constituição de 1988 garante, através do artigo 5º, que os direitos definidos pela Constituição não excluam os direitos provenientes dos tratados internacionais a que o Brasil esteja vinculado. Com isso, os direitos fundamentais dos cidadãos brasileiros ultrapassam os limites da Constituição em vigor no país, alcançando as conquistas dos Direitos Humanos obtidas no cenário internacional, como por exemplo, aquelas presentes na Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948. Os avanços dos direitos fundamentais obtidos no Brasil após a promulgação da Constituição de 1988 foram inquestionáveis. Os desafios estão voltados no presente para o cumprimento das determinações constitucionais, no que diz respeito a um contexto social marcado por tantas desigualdades. Um dos principais entraves, para a aplicação das leis relacionadas aos Direitos Humanos no país, está no custo financeiro das medidas necessárias para garantir o acesso de todos os cidadãos brasileiros aos direitos previstos na Constituição. Nesse sentido, o crescimento econômico do país não pode ser considerado como garantia de desenvolvimento social das classes menos favorecidas. É necessário que haja ações efetivas do poder público que possibilitem o acesso de fato desses grupos aos direitos fundamentais.

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Capítulo II - Direitos Humanos 1. O SISTEMA INTERNACIONAL DE PROTEÇAO DOS DIREITOS HUMANOS Embora desconhecida, a origem da concepção dos Direitos Humanos, conceitos e práticas isoladas existe mesmo antes do Cristianismo. Filósofos como Aristóteles e Platão defendiam a ideia de que os homens já nasciam com determinados direitos inerentes à sua condição humana. Na História, a proteção dos Direitos Humanos evoluiu na medida da evolução civilizatória, com maiores referências a partir do Iluminismo. No entanto, foram os atentados contra a humanidade praticados, durante a Segunda Guerra Mundial, que chamaram a atenção do mundo para a necessidade da criação de um Sistema Internacional de Proteção dos Direitos Humanos. A ideia de internacionalização dos direitos humanos decorre da concepção de que a violação aos direitos humanos inerentes a qualquer ser humano representa um crime contra a dignidade de toda comunidade humana. Assim, proteção dos direitos humanos não se reduz apenas ao âmbito interno de um país, pois são valores universais e, por isso, admitem-se intervenções de natureza econômicas e militares para sua preservação. O sistema internacional de direitos humanos ganhou especial proteção a partir da criação da Organização das Nações Unidas, ONU, em 1945, e da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, quando foram estabelecidos valores universais e órgãos de proteção aos Direitos Humanos a serem respeitados por todas as nações. O sistema internacional é constituído por um conjunto de órgãos, e instrumentos de proteção de Direitos Humanos validados por inúmeros países. Há um sistema global ONU e Sistemas Regionais de promoção dos Direitos Humanos: o Sistema Interamericano de Direitos Humanos, o Sistema Europeu, A União Africana e a Liga dos Estados Árabes. Com o início do processo de redemocratização no final da Ditadura Militar, o Brasil começou a ratificar os tratados internacionais de proteção de Direitos Humanos, passando assim a se inserir no cenário internacional de proteção a esses direitos. Nesse cenário, Direitos Humanos passaram a ser uma garantia do cidadão frente ao arbítrio do poder estatal. Hoje, o Brasil se submete à jurisdição da Côrte Interamericana de Direitos Humanos desde 1998, e do Tribunal Penal Internacional desde 2002.

2. ORGANIZAÇÃO DAS NAÇOES UNIDAS A Organização das Nações Unidas - ONU - tem caráter internacional por ser formada por países que se reuniram, voluntariamente, para buscarem a paz e o desenvolvimento mundial. Curiosidade: A ONU foi precedida pela Liga das Nações, instituição que foi criada durante a I Guerra Mundial, em 1919, com objetivos semelhantes ao da ONU. No entanto, tal Organização Internacional não conseguiu evitar a II Guerra Mundial. Assim, deixou de existir. É possível iniciar os estudos sobre a ONU lendo, atentamente, o preâmbulo da Carta das Nações Unidas, na qual podemos identificar as finalidades e os objetivos da criação dessa Organização, além de indicar os seus princípios norteadores: “Nós, os povos das Nações Unidas, resolvidos a preservar as gerações vindouras do flagelo da guerra, que, por duas vezes no espaço da nossa vida, (faz-se referência à I e II Guerra Mundial) trouxe sofrimentos indizíveis à humanidade, e a reafirmar a fé nos direitos fundamentais do homem, na dignidade e no valor do ser humano, na igualdade de direitos dos homens e das mulheres, (princípios

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presentes e norteadores da ONU) assim como das nações grandes e pequenas, e a estabelecer condições sob as quais a justiça e o respeito às obrigações decorrentes de tratados e de outras fontes de direito internacional possam ser mantidos, e a promover o progresso social e melhores condições de vida dentro de uma liberdade mais ampla (objetivo da Organização).” “E, para tais fins, praticar a tolerância e viver em paz uns com os outros, como bons vizinhos, unir nossas forças para manter a paz e a segurança internacionais, garantir, pela aceitação de princípios e a instituição de métodos, que a força armada não será usada a não ser no interesse comum, e empregar um mecanismo internacional para promover o progresso econômico e social de todos os povos (Compromisso assumido por aqueles Estados que, por ventura, assinarem a Carta).” “Resolvemos conjugar nossos esforços para a consecução desses objetivos. Em vista disso, nossos respectivos governos, por intermédio de representantes reunidos na cidade de São Francisco, depois de exibirem seus plenos poderes, que foram achados em boa e devida forma, concordaram com a presente Carta das Nações Unidas e estabelecem, por meio dela, uma organização internacional que será conhecida pelo nome de ‘Organização das Nações Unidas.” Curiosidade: A Carta das Nações Unidas foi elaborada por representantes de 50 países na Conferência sobre a Organização Internacional, reunida em São Francisco pelo período de 25 de abril a 26 de junho de 1945. As Nações Unidas começaram a existir, oficialmente, em 24 de outubro de 1945. Em 1946, definiu-se que a Sede da Organização das Nações Unidas seria nos Estados Unidos da América, em Nova York.

2.1 Países membros e organização da ONU Atualmente, temos 193 países signatários da ONU, que, em conjunto, buscam a cooperação internacional, a segurança internacional, o desenvolvimento econômico, o progresso social, os direitos humanos e a paz mundial. Para se tornar um país membro, basta aceitar os critérios descritos na Carta, ser amante da paz e estar, a critério da Organização, apto e disposto a cumprir tais obrigações. Administrativamente, a ONU possui órgãos principais e outros complementares. Dentre os principais, temos: • Assembleia Geral (tem função deliberativa); • Conselho de Segurança (decide sobre questões de paz e segurança); • Conselho Econômico e Social (promove a cooperação econômica e social); • Secretariado (fornece estudos, informações necessárias para a ONU); • Tribunal Internacional de Justiça (é o principal órgão judicial); • Conselho de Tutela. Curiosidade: A maioria dos órgãos principais estão localizados na sede principal das Nações Unidas, em Nova York. Apenas o Tribunal Internacional de Justiça se encontra em Haia, nos Países Baixos. A ONU é financiada por contribuições voluntárias dos seus Estados membros e tem seis idiomas oficiais: Árabe, Chinês, Inglês, Francês, Russo e Espanhol.

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Assembleia Geral A Assembleia Geral é o principal órgão deliberativo da ONU, sendo composta por todos os Estados – Membros, que se reúnem em sessão ordinária anual. Para a aprovação das questões importantes discutidas por essa Assembleia, deve-se ter a maioria de 2/3 (dois terços) dos presentes e votantes. Os demais temas são aprovados pela maioria dos votos. O que são consideradas questões importantes? • Questões orçamentárias; • Eleições de membros dos Órgãos; • Admissão, suspensão e expulsão de membros. Conselho de Segurança É o órgão responsável por manter a paz e a segurança entre os países do mundo. Tem o poder de tomar decisões vinculativas, conhecidas como Resoluções do Conselho de Segurança das Nações Unidas. É composto por 15 (quinze) Estados - Membros, dentre eles, 5 (cinco) são permanentes e possuem o poder do veto sobre as resoluções do Conselho e 10 (dez) são membros temporários, escolhidos em Assembleia Geral, com mandatos de 2 anos.

MEMBROS PERMANENTES DO CONSELHO DE SEGURANÇA

CHINA FRANÇA RÚSSIA REINO UNIDO ESTADOS UNIDOS

Este Conselho tem como função aprovar o envio das forças de manutenção de paz aos locais em que foram cessados ou pausados os conflitos armados, que buscam fazer valer o acordo de paz firmado, além de evitar que os combates retornem. Curiosidade: A ONU não possui forças armadas. Assim, as forças de paz são oferecidas, voluntariamente, pelos Estados - Membros.

Conselho Econômico e Social Conhecido pela sigla ECOSOC, este Conselho tem como função a promoção da cooperação econômica e social e do desenvolvimento internacional. Possui 54 membros que são eleitos pela Assembleia Geral com mandatos de três anos. As reuniões deste Conselho ocorrem anualmente no mês de julho por quatro semanas. Curiosidade: Desde 1998, ocorre outra reunião do ECOSOC em abril, com os principais Ministros das Finanças do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional (FMI).

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Secretariado Este órgão é chefiado pelo Secretário-Geral que tem auxílio de funcionários espalhados por todo o mundo. O secretário possui diversas funções. Dentre as principais estão: dirigir o Conselho de Segurança das Nações Unidas, a Assembleia Geral da ONU e o Conselho Econômico e Social das Nações Unidas. O secretário é nomeado pela Assembleia Geral após ter sido recomendado pelo Conselho de Segurança. Tribunal Internacional de Justiça Surgiu em 1945, como sucessor da Côrte Permanente de Justiça Internacional e deu início aos trabalhos apenas em 1946. Tem como função, anular, impedir, extinguir, decidir litígios entre os Estados. Além disso, analisa casos de crimes de guerra, de interferência estatal, de limpeza étnica, entre outros. Tem um tribunal permanente, denominado de Tribunal Penal Internacional (TPI), constituído desde 2002, que se encarrega de analisar os crimes mais graves dentro do direito internacional, como por exemplo, os crimes de guerra, genocídio, contra a humanidade e de agressão. Conselho de Tutela Atualmente, com suas atividades suspensas, o Conselho de Tutela tinha como objetivo supervisionar a administração dos territórios sob tutela internacional. Seus princípios giravam em torno do desenvolvimento das condições para a independência e o estabelecimento de um governo próprio e, consequentemente, o progresso dos habitantes. Esse Conselho alcançou suas metas e objetivos, obtendo assim a independência dos territórios sob esse regime, em sua grande maioria, territórios africanos. Após meio século de luta em favor da autodeterminação dos povos (essa autodeterminação faz com que as minorias étnicas, religiosas e etc. ajudem a governar), teve seu fim em 19 de novembro de 1994. Órgãos Complementares ou Instituições especializadas Essas Instituições têm funções específicas e, por meio delas, a ONU tem capacidade de realizar os trabalhos humanitários. AGÊNCIAS ESPECIALIZADAS DAS NAÇÕES UNIDAS

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SIGLA

AGÊNCIA

SEDE

FUNDAÇÃO

FMI

Fundo Monetário Internacional

Washington, EUA

1944

FAO

Organização das Nações Unidas para a Alimentação e para a Agricultura

Roma, Itália

1945

WB

Banco Mundial

Washington, EUA

1945

UNESCO

Organização para a Educação, a Ciência e a Cultura

Paris, França

1946

OIT

Organização Internacional do Trabalho

Genebra, Suíça

1946

OACI

Organização da Aviação Civil Internacional

Montreal, Canadá

1947

UIT

União Internacional de Telecomunicações

Genebra, Suíça

1947

UPU

União Postal Universal

Berna, Suíça

1947

OMS

Organização Mundial de Saúde

Genebra, Suíça

1948

OMI

Organização Marítima Internacional

Londres, Reino Unido

1948

OMM

Organização Meteorológica Mundial

Genebra, Suíça

1950

AIEA

Agência Internacional de Energia Atômica

Viena, Áustria

1957


PAM

Programa Alimentar Mundial

Roma, Itália

1963

UNIDO OMT

Organização para o Desenvolvimento Industrial

Viena, Áustria

1967

Organização Mundial de Turismo

Madrid, Espanha

1974

OMPI

Organização Mundial da Propriedade Intelectual

Genebra, Suíça

1974

IFAD

Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola

Roma, Itália

1977

Existem outras agências que auxiliam a ONU a atingir seus objetivos, sejam estes humanitários, econômicos, sociais, culturais etc. Direitos Humanos e Assistência humanitária Tendo em vista todos os efeitos da II Guerra Mundial, os países mundiais, concluíram que seria viável uma organização que tivesse, como função primordial, a garantia da paz, para que evitasse tragédias desse porte no futuro. Assim, criaram a ONU, que teve razão de ser nos direitos humanos. A Carta das Nações Unidas determina que os países membros promovam o “respeito universal e a observância dos direitos humanos” e tenham “ação conjunta e separada” para esse fim. Em 1948, a Assembleia Geral aprovou, como norma comum a todos os membros, a Declaração Universal dos Direitos Humanos. Criou-se, em 2006, o Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, sucessor da Comissão das Nações Unidas sobre Direitos Humanos. Este possui 47 membros com mandatos de 3 (três) anos e com o impedimento de exercerem 3 (três) mandatos consecutivos. Curiosidade: Organizações como a Cruz Vermelha oferecem comida, água potável, abrigos e outros serviços humanitários para regiões que sofrem com as consequências das guerras. Os principais programas da ONU são “Programa Alimentar Mundial” e “Alto Comissariado para os refugiados”, além de projetos de manutenção da paz.

Metas de desenvolvimento do milênio As metas foram assinadas em setembro de 2000, pelos Estados - Membros que buscam alcançá-las até 2015. São elas: • Erradicar a pobreza extrema e a fome; • atingir o ensino básico universal; • promover a igualdade entre os sexos e a autonomia das mulheres; • reduzir a mortalidade infantil; • melhorar a saúde materna; • combater o HIV/AIDS, a malária e outras doenças; • garantir a sustentabilidade ambiental e • estabelecer uma parceria mundial para o desenvolvimento.

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Princípios e propósitos da ONU Os países membros da ONU devem aderir aos princípios e propósitos descritos na Carta de 1945. Dentre eles, temos, como principais, os seguintes: Propósitos: • Manutenção da paz e da segurança, em âmbito internacional; • desenvolvimento das relações entre os países de forma amistosa; • solução dos conflitos econômicos, sociais, humanitários e culturais em cooperação; • promoção, em todas as ações, do respeito ao Direito humano e das liberdades fundamentais; • busca da harmonia entre os povos para alcançar os objetivos comuns; • preservação da humanidade. Princípios: • A base da ONU está voltada ao princípio da igualdade soberana de todos os países membros. • Os compromissos da Carta devem ser cumpridos, segundo o princípio da boa-fé. • As controvérsias internacionais devem ser cumpridas por meio dos meios pacíficos, meios que não comprometam a segurança, a paz e a justiça. • Os Estados-Membros devem abster-se de recorrer à ameaça ou ao emprego de força uns contra os outros. • Os Estados-Membros devem prestar assistência à ONU quando esta tomar medidas em conformidade com os preceitos da Carta; • As Nações Unidas devem fazer com que os Estados que não são signatários ajam de acordo com os princípios norteadores para a necessária manutenção da paz e da segurança internacional; • A Carta não autoriza que a ONU intervenha em assuntos essencialmente nacionais dos países membros.

2.2. Declararação Universal dos Direitos Humanos A Declaração Universal dos Direitos Humanos foi aprovada em 1948 na Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), em reação às atrocidades cometidas durante a II Guerra Mundial. O documento representa uma luta universal contra a opressão e a discriminação, defende a igualdade e a dignidade das pessoas e reconhece que os direitos humanos e as liberdades fundamentais devem ser aplicados a toda pessoa humana. A Declaração Universal de Direitos Humanos estabelece um conjunto de direitos individuais, coletivos, civis, políticos, econômicos, sociais e culturais que visam à preservação da dignidade humana. A declaração nasceu, originalmente, como Declaração de Direitos e Liberdades Fundamentais e sua intenção era acrescer ao estatuto da recém-criada Organização das Nações Unidas, servindo-lhe como norte nas ações da entidade. Na primeira Assembleia Geral, o rascunho dessa declaração foi enviado ao comitê socioeconômico e, mais tarde, foi criado um comitê próprio para a redação do que seria a Declaração Universal dos Direitos Humanos. Oito membros de países diferentes compuseram o comitê, tendo sido escolhidos considerando sua localização no globo, no intuito de assegurar que as filosofias do mundo inteiro fossem incorporadas num mesmo documento. Assim, os membros foram dos seguintes países: Estados Unidos da América e Chile – representando as Américas; Grã-Bretanha e França – representando a Europa; União Soviética e China – representando a Ásia; Austrália – representando a Oceania e o Líbano, representando o Oriente Médio e África. Cabe ressaltar que a Declaração, apesar de toda a sua importância, não obriga os Estados a vincularem - na em sua determinação jurídica. Ao assinarem a Declaração, os estados apenas reconhecem formalmente o seu conteúdo. Essa medida foi tomada, à época, no intuito de descomplicar sua aceitação em cada país membro da ONU, pois, se fossem obrigados a incorporar a declaração em seus regimes políticos, o documento teria de ser muito mais complexo e a resistência dos países teria sido muito superior. Foi uma medida que surtiu o efeito esperado, uma vez que, quando de sua apresentação à Assembleia Geral das Nações Unidas, a Declaração foi aprovada com apenas oito

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abstenções na votação, mas nenhum indeferimento. As abstenções foram dos seguintes países: Arábia Saudita, Bielorússia, Tchecoslováquia, Polônia, Iugoslávia, Ucrânia, África do Sul e União Soviética. Em linhas gerais, os países que se abstiveram eram do Bloco Comunista regido pela União Soviética; a Arábia Saudita, provavelmente em protesto por entender que a Declaração não levava em consideração aspectos culturais e religiosos do Islamismo e África do Sul, que, à época, vivia sob o regime jurídico do APERTHAIDE. Curiosidade: Em 2002, vários países muçulmanos assinaram a Carta de Cairo, também chamada de Declaração dos Direitos Humanos do Islã. A Declaração Islâmica Universal dos Direitos Humanos é de 1981.

DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS Adotada e proclamada pela resolução 217 A (III) da Assembléia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948 Preâmbulo Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo, Considerando que o desprezo e o desrespeito pelos direitos humanos resultaram em atos bárbaros que ultrajaram a consciência da Humanidade e que o advento de um mundo em que todos gozem de liberdade de palavra, de crença e da liberdade de viverem a salvo do temor e da necessidade foi proclamado como a mais alta aspiração do ser humano comum, Considerando ser essencial que os direitos humanos sejam protegidos pelo império da lei, para que o ser humano não seja compelido, como último recurso, à rebelião contra a tirania e a opressão, Considerando ser essencial promover o desenvolvimento de relações amistosas entre as nações, Considerando que os povos das Nações Unidas reafirmaram, na Carta da ONU, sua fé nos direitos humanos fundamentais, na dignidade e no valor do ser humano e na igualdade de direitos entre homens e mulheres, e que decidiram promover o progresso social e melhores condições de vida em uma liberdade mais ampla, Considerando que os Estados-Membros se comprometeram a promover, em cooperação com as Nações Unidas, o respeito universal aos direitos e liberdades humanas fundamentais e a observância desses direitos e liberdades, Considerando que uma compreensão comum desses direitos e liberdades é da mais alta importância para o pleno cumprimento desse compromisso,

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A ASSEMBLEIA GERAL proclama A presente Declaração Universal dos Direitos Humanos como o ideal comum a ser atingido por todos os povos e todas as nações, com o objetivo de que cada indivíduo e cada órgão da sociedade, tendo sempre em mente esta Declaração, se esforcem, através do ensino e da educação, por promover o respeito a esses direitos e liberdades e, pela adoção de medidas progressivas de caráter nacional e internacional, por assegurar o seu reconhecimento e a sua observância universal e efetiva, tanto entre os povos dos próprios Estados-Membros, quanto entre os povos dos territórios sob sua jurisdição. Artigo I Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade. Artigo II 1 - Todo ser humano tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, idioma, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição. 2 - Não será também feita nenhuma distinção fundada na condição política, jurídica ou internacional do país ou território a que pertença uma pessoa, quer se trate de um território independente, sob tutela, sem governo próprio, quer sujeito a qualquer outra limitação de soberania. Artigo III Todo ser humano tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal. Artigo IV Ninguém será mantido em escravidão ou servidão; a escravidão e o tráfico de escravos serão proibidos em todas as suas formas. Artigo V Ninguém será submetido à tortura nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante. Artigo VI Todo ser humano tem o direito de ser, em todos os lugares, reconhecido como pessoa perante a lei. Artigo VII Todos são iguais perante a lei e têm direito, sem qualquer distinção, a igual proteção da lei. Todos têm direito a igual proteção contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação. Artigo VIII Todo ser humano tem direito a receber dos tribunais nacionais competentes remédio efetivo para os atos que violem os direitos fundamentais que lhe sejam reconhecidos pela Constituição ou pela lei. Artigo IX Ninguém será arbitrariamente preso, detido ou exilado. Artigo X Todo ser humano tem direito, em plena igualdade, a uma justa e pública audiência por parte de um tribunal independente e imparcial, para decidir sobre seus direitos e deveres ou do fundamento de qualquer acusação criminal contra ele.

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Artigo XI 1. Todo ser humano acusado de um ato delituoso tem o direito de ser presumido inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público, no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa. 2. Ninguém poderá ser culpado por qualquer ação ou omissão que, no momento, não constituíam delito perante o direito nacional ou internacional. Também não será imposta pena mais forte do que aquela que, no momento da prática, era aplicável ao ato delituoso. Artigo XII Ninguém será sujeito à interferência em sua vida privada, em sua família, em seu lar ou em sua correspondência, nem a ataque à sua honra e reputação. Todo ser humano tem direito à proteção da lei contra tais interferências ou ataques. Artigo XIII 1. Todo ser humano tem direito à liberdade de locomoção e residência dentro das fronteiras de cada Estado. 2. Todo ser humano tem o direito de deixar qualquer país, inclusive o próprio, e a este regressar. Artigo XIV 1. Todo ser humano, vítima de perseguição, tem o direito de procurar e de gozar asilo em outros países. 2. Este direito não pode ser invocado em caso de perseguição legitimamente motivada por crimes de direito comum ou por atos contrários aos objetivos e princípios das Nações Unidas. Artigo XV 1. Todo homem tem direito a uma nacionalidade. 2. Ninguém será arbitrariamente privado de sua nacionalidade, nem do direito de mudar de nacionalidade. Artigo XVI 1. Os homens e mulheres de maior idade, sem qualquer restrição de raça, nacionalidade ou religião, têm o direito de contrair matrimônio e fundar uma família. Gozam de iguais direitos em relação ao casamento, sua duração e sua dissolução. 2. O casamento não será válido senão com o livre e pleno consentimento dos nubentes. 3. A família é o núcleo natural e fundamental da sociedade e tem direito à proteção da sociedade e do Estado. Artigo XVII Todo ser humano tem direito à propriedade, só ou em sociedade com outros. Ninguém será arbitrariamente privado de sua propriedade. Artigo XVIII Todo ser humano tem direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião; este direito inclui a liberdade de mudar de religião ou crença e a liberdade de manifestar essa religião ou crença, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pela observância, em público ou em particular. Artigo XIX Todo ser humano tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras. Artigo XX 1. Todo ser humano tem direito à liberdade de reunião e associação pacífica. 2. Ninguém pode ser obrigado a fazer parte de uma associação.

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Artigo XXI 1. Todo ser humano tem o direito de fazer parte no governo de seu país diretamente ou por intermédio de representantes livremente escolhidos. 2. Todo ser humano tem igual direito de acesso ao serviço público do seu país. 3. A vontade do povo será a base da autoridade do governo; esta vontade será expressa em eleições periódicas e legítimas, por sufrágio universal, por voto secreto ou processo equivalente que assegure a liberdade de voto. Artigo XXII Todo ser humano, como membro da sociedade, tem direito à segurança social, à realização pelo esforço nacional, pela cooperação internacional e de acordo com a organização e recursos de cada Estado, dos direitos econômicos, sociais e culturais indispensáveis à sua dignidade e ao livre desenvolvimento da sua personalidade. Artigo XXIII 1.Todo ser humano tem direito ao trabalho, à livre escolha de emprego, a condições justas e favoráveis de trabalho e à proteção contra o desemprego. 2. Todo ser humano, sem qualquer distinção, tem direito a igual remuneração por igual trabalho. 3. Todo ser humano que trabalha tem direito a uma remuneração justa e satisfatória, que lhe assegure, assim como à sua família, uma existência compatível com a dignidade humana e a que se acrescentarão, se necessário, outros meios de proteção social. 4. Todo ser humano tem direito a organizar sindicatos e a neles ingressar para proteção de seus interesses. Artigo XXIV Todo ser humano tem direito a repouso e lazer, inclusive a limitação razoável das horas de trabalho e a férias remuneradas periódicas. Artigo XXV 1. Todo ser humano tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar-lhe, e a sua família, saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência em circunstâncias fora de seu controle. 2. A maternidade e a infância têm direito a cuidados e assistência especiais. Todas as crianças, nascidas dentro ou fora do matrimônio gozarão da mesma proteção social. Artigo XXVI 1. Todo ser humano tem direito à instrução. A instrução será gratuita, pelo menos nos graus elementares e fundamentais. A instrução elementar será obrigatória. A instrução técnico-profissional será acessível a todos, bem como a instrução superior, esta baseada no mérito. 2. A instrução será orientada no sentido do pleno desenvolvimento da personalidade humana e do fortalecimento do respeito pelos direitos humanos e pelas liberdades fundamentais. A instrução promoverá a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e grupos raciais ou religiosos, e coadjuvará as atividades das Nações Unidas em prol da manutenção da paz. 3. Os pais têm prioridade de direito na escolha do gênero de instrução que será ministrada a seus filhos. Artigo XXVII 1. Todo ser humano tem o direito de participar livremente da vida cultural da comunidade, de fruir das artes e de participar do progresso científico e de seus benefícios. 2. Todo ser humano tem direito à proteção dos interesses morais e materiais decorrentes de qualquer produção científica literária ou artística da qual seja autor. Artigo XXVIII Todo ser humano tem direito a uma ordem social e internacional em que os direitos e liberdades estabelecidos na presente Declaração possam ser plenamente realizados.

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Artigo XXIX 1. Todo ser humano tem deveres para com a comunidade, na qual o livre e pleno desenvolvimento de sua personalidade é possível. 2. No exercício de seus direitos e liberdades, todo ser humano estará sujeito apenas às limitações determinadas pela lei, exclusivamente com o fim de assegurar o devido reconhecimento e respeito dos direitos e liberdades de outrem e de satisfazer as justas exigências da moral, da ordem pública e do bem-estar de uma sociedade democrática. 3. Esses direitos e liberdades não podem, em hipótese alguma, ser exercidos contrariamente aos objetivos e princípios das Nações Unidas. Artigo XXX Nenhuma disposição da presente Declaração pode ser interpretada como o reconhecimento a qualquer Estado, grupo ou pessoa, do direito de exercer qualquer atividade ou praticar qualquer ato destinado à destruição de quaisquer dos direitos e liberdades aqui estabelecidos.

3. CÔRTE DE HAIA - TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL O Estatuto de Roma, que criou o TPI, foi adotado em 17 de julho de 1998, durante a Conferência das Nações Unidas, sobre o estabelecimento do Tribunal Penal Internacional, e entrou em vigor em 1º de julho de 2002. O Tribunal Penal Internacional, ou TPI, é também conhecido por Côrte Penal Internacional, tem sede em Haia, nos Países Baixos e é um Tribunal Permanente do Tribunal Internacional de Justiça. Tem como objetivo punir os sujeitos ativos de crimes contra a humanidade, ou seja, punem os indivíduos e não os Estados-Membros. Como todos os órgãos da ONU, o Tribunal Penal Internacional visa, a priori, a manutenção dos direitos humanos, da paz e da segurança. Assim, ele é competente para julgar os indivíduos que praticam crimes considerados gravíssimos, tais como genocídio, crimes de guerra, contra a humanidade e agressões. Este Tribunal garante que esses crimes não saiam impunes em caso de falhas do sistema nacional. O Estatuto de Roma descreve os crimes de competência do TPI, após enfrentar dificuldades em listá-los: • Genocídio: matar membros de um grupo ou comunidade étnica; provocar lesões a membros do mesmo grupo; submeter a maus tratos que comportam a destruição física total, ou parcial, do grupo étnico; impor medidas anticoncepcionais ou capazes de causar a esterilidade; transferir forçadamente grupos de crianças para um grupo diferente; • Crimes contra a humanidade: homicídio; extermínio; escravidão; deportação; aprisionamento com violação das normas do direito internacional; torturas; estupro, escravidão sexual, prostituição forçada, violência sexual; perseguição de grupos ou comunidades por motivos políticos, raciais, culturais, religiosos; desaparecimento forçado de uma ou mais pessoas; apartheid; atos inumanos que provocam graves sofrimentos. • Crimes de guerra: utilizaram-se os instrumentos jurídicos de Direito Internacional Humanitário, pois existiam controvérsias para essa definição. Diversas delegações visavam evitar que a prática isolada dos crimes de guerra fosse punida pelo TPI e as demais não desejavam um retrocesso quanto aos direitos humanos. Assim, criaram o “Dispositivo Transitório”, de forma que os Estados que ratificarem o Estatuto podem declarar que não aceitam a competência do TPI para julgar crimes de guerra pelo período de 7 anos. • Crimes de agressão: estes crimes não foram precisamente definidos pelo Estatuto, tendo em vista que são considerados crimes de natureza política e a inclusão desses crimes poderia causar riscos a sua independência. O próprio Estatuto de Roma estabelece competência para o Tribunal julgar crimes diversos daqueles previstos no artigo 5º. São crimes contra a administração da justiça dispostos pelo artigo 70: • Aquele que estiver obrigado a dizer a verdade e prestar falso testemunho;

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• Apresentar provas sabendo que estas são falsas; • Prejudicar o testemunho de terceiro, obstruir o comparecimento de testemunhas, adotar represálias contra testemunha em virtude de seu depoimento, destruir provas ou interferir nas diligências destinadas à coleta destas; • Adotar represálias contra funcionário do Tribunal; • Solicitar ou aceitar suborno. O Estatuto prevê ainda as penas que serão aplicadas no caso de condenação e comprovação da prática dos crimes do artigo 5º (crime de guerra, genocídio, agressão e contra a humanidade), pena privativa de liberdade não superior a 30 anos ou prisão perpétua a depender da gravidade do crime cometido e das circunstâncias pessoais do acusado; multa; os bens provenientes da prática do crime podem ser confiscados, além de permitir a fixação de reparação às vítimas; nos casos dos crimes contra a administração da justiça, a pena aplicada será de reclusão por até 5 (cinco) anos ou multa de até 2 (dois) mil euros. As sanções aplicadas pelo Tribunal Penal Internacional não poderão ser contrárias às leis internas do Estado Membro a que o indivíduo julgado pertença. 3.1 Artigo 80 Não Interferência no Regime de Aplicação de Penas Nacionais e nos Direitos Internos: “Nada no presente Capítulo prejudicará a aplicação, pelos Estados, das penas previstas nos respectivos direitos internos, ou a aplicação da legislação de Estados que não preveja as penas referidas neste capítulo.”. A primeira notícia de um tribunal penal internacional é datada de 1474, quando o Sacro Império Romano aplicava as leis “divinas e humanas”. A jurisdição internacional começou a ser pensada em 1919, a partir do Tratado de Versalhes, em virtude das atrocidades cometidas em conflitos internacionais e na impunidade de seus autores, visando a um Tribunal livre de interesses políticos. Alguns tribunais “ad hoc” (com fim específico) foram criados e os mais importantes foram: • Tribunal Penal Internacional “ad hoc” para a ex-Iugoslávia: durante a guerra na ex Iugoslávia (1991), vários crimes contra os direitos humanos foram cometidos, houve registros de massacres, “limpeza étnica”, tratamentos desumanos. Calculam-se, em média, 150 mil homicídios. Diante dessa situação, em 1993, o Conselho de Segurança da ONU estabeleceu o Tribunal “ad hoc”. O Tribunal, então, reafirmou sua responsabilidade penal individual por violações ao direito humanitário, o que contribuiu para o processo de ampliação das violações. • Tribunal Penal Internacional “ad hoc” para Ruanda: adaptando o estatuto utilizado para o Tribunal Penal para ex-Iugoslávia, em 1994, o Conselho de Segurança criou o estatuto para punir e conter os excessos praticados em Ruanda, onde, aproximadamente, 3 mil pessoas foram mortas na Igreja Paroquial de Mukarange e, em média, 1 milhão de pessoas mortas no país entre abril e julho de 1994. Com esse Tribunal, foi possível definir o crime de genocídio. Curiosidade: O Brasil ratificou (aprovou) o Estatuto de Roma em 25 de setembro de 2002.

3.2 Dos meios de acesso ao Tribunal Penal Internacional O Tribunal Penal Internacional julgará indivíduos pela prática de crimes de guerra contra a humanidade, agressão e genocídio, conforme determinação do artigo 5º do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional.

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O Estado que ratifica o Estatuto aceitará a jurisdição do Tribunal Penal para julgar os crimes acima relacionados. As possibilidades de exercício da jurisdição são: • Um Estado Membro poderá denunciar ao Procurador a prática de qualquer destes crimes e solicitar investigação. Tal denúncia deverá ter especificação das circunstâncias relevantes. • O Conselho de Segurança, agindo conforme as determinações da Carta das Nações Unidas, poderá denunciar ao Procurador situações em que haja indícios da prática dos crimes previstos. • Se o Procurador tiver iniciado inquérito sobre tais crimes, conforme o artigo 15 do Estatuto. Artigo 15: “1- O Procurador poderá, por sua própria iniciativa, abrir um inquérito com base em informações sobre a prática de crimes da competência do Tribunal. 2. O Procurador apreciará a seriedade da informação recebida. Para tal, poderá recolher informações suplementares junto aos Estados, aos órgãos da Organização das Nações Unidas, às Organizações Intergovernamentais ou Não Governamentais ou outras fontes fidedignas que considere apropriadas, bem como recolher depoimentos escritos ou orais na sede do Tribunal. 3. Se concluir que existe fundamento suficiente para abrir um inquérito, o Procurador apresentará um pedido de autorização nesse sentido ao Juízo de Instrução, acompanhado da documentação de apoio que tiver reunido. As vítimas poderão apresentar representações no Juízo de Instrução, de acordo com o Regulamento Processual. 4. Se, após examinar o pedido e a documentação que o acompanha, o Juízo de Instrução considerar que há fundamento suficiente para abrir um Inquérito e que o caso parece caber na jurisdição do Tribunal, autorizará a abertura do inquérito, sem prejuízo das decisões que o Tribunal vier a tomar posteriormente em matéria de competência e de admissibilidade. 5. A recusa do Juízo de Instrução em autorizar a abertura do inquérito não impedirá o Procurador de formular ulteriormente outro pedido com base em novos fatos ou provas respeitantes à mesma situação. 6. Se, depois da análise preliminar a que se referem os parágrafos 1º e 2º, o Procurador concluir que a informação apresentada não constitui fundamento suficiente para um inquérito, o Procurador informará quem a tiver apresentado de tal entendimento. Tal não impede que o Procurador examine, à luz de novos fatos ou provas, qualquer outra informação que lhe venha a ser comunicada sobre o mesmo caso.” É necessário avaliar as questões de admissibilidade, conforme o artigo 17 do Estatuto de Roma, quando: 1. “Tendo em consideração o décimo parágrafo do preâmbulo e o artigo 1º, o Tribunal decidirá sobre a não admissibilidade de um caso se:” • “O caso objeto de inquérito ou procedimento criminal por parte de um Estado que tenha jurisdição sobre o mesmo, salvo se este não tiver vontade de levar a cabo o inquérito ou o procedimento ou, não tenha capacidade para fazer;” • “O caso tiver sido objeto de inquérito por um Estado com jurisdição sobre ele e tal Estado tenha decidido não dar seguimento ao procedimento criminal contra a pessoa em causa, a menos que esta decisão resulte do fato de esse Estado não ter vontade de proceder criminalmente ou da sua incapacidade real para fazer;” • “A pessoa em causa já tiver sido julgada pela conduta a que se refere à denúncia, e não puder ser julgada pelo Tribunal em virtude do disposto no parágrafo 3º do artigo 20;” • “O caso não for suficientemente grave para justificar a ulterior intervenção do Tribunal.” 2. A fim de determinar se há ou não vontade de agir num determinado caso, o Tribunal, tendo em consideração as garantias de um processo equitativo reconhecidas pelo direito internacional, verificará a existência de uma ou mais das seguintes circunstâncias: • O processo ter sido instaurado ou estar pendente ou a decisão ter sido proferida no Estado com o propósito de subtrair a pessoa em causa à sua responsabilidade criminal por crimes da competência do Tribunal, nos termos do disposto no artigo 5º; • Ter havido demora injustificada no processamento, a qual, dadas as circunstâncias, se mostra incompatível com a intenção de fazer responder a pessoa em causa perante a justiça; • O processo não ter sido ou não estar sendo conduzido de maneira independente ou imparcial, e ter estado ou estar sendo conduzido de uma maneira que, dadas as circunstâncias, seja incompatível com a intenção de levar a pessoa em causa perante a justiça;

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3. “A fim de determinar se há incapacidade de agir num determinado caso, o Tribunal verificará se o Estado, por colapso total ou substancial da respectiva administração da justiça ou por indisponibilidade desta, não estará em condições de fazer comparecer o acusado, de reunir os meios de prova e depoimentos necessários ou não estará, por outros motivos, em condições de concluir o processo.”

4. ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS A OEA é a mais antiga organização regional do mundo. A Primeira Conferência Internacional Americana foi realizada em Washington, de outubro de 1889 a abril de 1890. Objetivava a discussão de um plano de arbitragem para a solução de controvérsias e de disputas entre os países, a avaliação de questões referentes ao intercâmbio comercial e dos meios de comunicações, dentre outros itens?. Nessa Conferência, 18 (dezoito) Estados Americanos estiveram presentes e constituíram a “União Internacional das Repúblicas Americanas para a pronta coleta e distribuição de informações comerciais”, determinando Washington a sede desta União. Nela também se determinaram os princípios e orientações basilares do que depois se tornaria o Sistema Interamericano, delimitando-se os interesses comerciais (buscando, com isso, a maior integração entre Estados), verificando as questões jurídicas, para que fossem criados ambientes pacíficos de cooperação e de segurança regional e o estabelecimento de instituições especializadas em diversas áreas. A União formada na Primeira Conferência transformou-se na “União Pan-Americana”, que teve suas funções expandidas até que, em 1970, formou-se a Secretaria Geral da OEA (Organização dos Estados Americanos). Neste mesmo período, entrou em vigor o Protocolo de Reforma da Carta da Organização dos Estados Americanos. A Carta da Organização dos Estados Americanos é resultado de diversas reuniões e conferências ocorridas desde 1945, visando à união entre os países, às relações comerciais e sobretudo à paz e à segurança, assim como determina a Organização das Nações Unidas. Atualmente, a OEA congrega 35 Estados Independentes das Américas, constituindo o principal fórum governamental político, jurídico e social do Hemisfério. Curiosidade: A OEA concedeu a 67 Estados e à União Européia o estatuto de observador permanente.

5. DA CÔRTE INTERAMERICANA DOS DIREITOS HUMANOS A Côrte Interamericana dos Direitos Humanos tem sede em São José da Costa Rica. É um órgão autônomo do Sistema da Organização dos Estados Americanos (OEA) que tem competência de caráter contencioso e consultivo. A Côrte é composta por 7 (sete) juízes, escolhidos a título pessoal entre juristas com autoridade moral, reconhecidos pela competência destinada aos Direitos Humanos. Os juízes escolhidos são nacionais dos Estados Membros da Côrte Interamericana e, conforme as leis internas de seus países, devem estar capacitados para exercer funções judiciais. Curiosidade: Não é permitido que seja candidato mais de um juiz da mesma nacionalidade.

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Cada Estado indica o juiz candidato e o mesmo, caso eleito, passa a ter mandato de 6 (seis) anos e só podem ser reeleitos uma vez. Se houver necessidade de substituição de um juiz que não terminou seu mandato, o substituto será responsável por completar o mandato de seis anos. 5.1 Da competência da Côrte Interamericana dos Direitos Humanos Tem competência para conhecer qualquer caso relativo à interpretação e à aplicação dos dispositivos da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, desde que o Estado tenha ratificado esta Convenção. Em resumo, apenas a Comissão Interamericana e os Estados Membros da Convenção Americana dos Direitos Humanos podem encaminhar situações a serem submetidas à decisão desta Côrte. • Competência Consultiva A Côrte desenvolve análises tendo em vista o impacto e o alcance dos dispositivos previstos na Convenção Americana sobre Direitos Humanos. As opiniões da Côrte facilitam a compreensão dos dispositivos da Convenção e contribuem para a evolução dos Direitos Humanos em? âmbito da America Latina. É possível ainda a Côrte emitir, a pedido de algum Estado Membro da OEA, parecer sobre a compatibilidade entre leis internas e a Convenção, ou os demais tratados sobre Direitos Humanos. • Competência Contenciosa Para que a Côrte exerça suas funções, faz-se necessário que o Estado tenha ratificado a Convenção Americana sobre Direitos Humanos. Nesse caso, a Côrte terá competência para analisar casos concretos de denuncia à violação aos Direitos Humanos pelo Estado - Membro. Ao julgar o caso e se for comprovada a violação estatal de Direitos Humanos previstos na Convenção, a Côrte pode determinar a adoção de medidas que sejam suficientes e necessárias para a restauração do direito violado e inclusive condenar ao pagamento de uma justa compensação à vítima. Apenas o Estado Membro tem capacidade postulatória perante a Côrte Interamericana de Direitos Humanos. Nesse caso, como ficam as pessoas e os grupos que sofrem violações aos direitos humanos? Essas pessoas, grupos ou entidades podem recorrer à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, que possui, assim como os Estados, capacidade postulatória junto à Côrte. A Comissão estará presente em todos os casos a serem solucionados pela Côrte, ainda que ela não tenha exercido sua capacidade postulatória. Curiosidade: Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH): entidade que integra o Sistema Interamericanos de Proteção dos Direitos Humanos. Tem sua sede em Washington. É composta por juristas que representam os países membros da OEA.

Os procedimentos contenciosos da Côrte devem ser extintos com uma sentença judicial motivada, obrigatória, definitiva e inapelável. Em caso de desacordo sobre o sentido ou alcance da decisão, a parte pode solicitar “nova” interpretação, desde que esta seja feita em até 90 dias a contar da notificação da sentença.

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5.2 Dos meios de acesso à Côrte Interamericana de Direitos Humanos Conforme ensinado, apenas a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e os Estados Membros podem postular na Côrte Interamericana. As pessoas, entidades e grupos não possuem essa capacidade. Ocorre que os excluídos de postularem na Côrte possuem acesso à Comissão que também é um órgão do Sistema Interamericano de proteção aos Direitos Humanos e têm capacidade de levar o acontecido para ser analisado e julgado pela Côrte. Como acessar a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH)? O regulamento da CIDH, em seu artigo 28, esclarece tal situação, orientando o indivíduo sobre a maneira correta de peticionar, qual seja: (www.cidh.oas.org – formulários de queixa). • O nome, a nacionalidade e a assinatura do denunciante ou denunciantes ou, no caso de o peticionário ser uma entidade não governamental, o nome e a assinatura de seu representante ou seus representantes legais; • Se o peticionário deseja que sua identidade seja mantida em reserva frente ao Estado; • O endereço para o recebimento de correspondência da Comissão e, se for o caso, número de telefone e fax e endereço de correio eletrônico; • Uma relação do fato ou situação denunciada, com especificação do lugar e data das violações alegadas; • Se possível, o nome da vítima, bem como de qualquer autoridade pública que tenha tomado conhecimento do fato ou situação denunciada; • A indicação do Estado que o peticionário considera responsável, por ação ou omissão, pela violação de algum dos direitos humanos consagrados na Convenção Americana sobre Direitos Humanos e outros instrumentos aplicáveis, embora não se faça referência específica ao artigo supostamente violado; • O cumprimento do prazo previsto no artigo 32 deste Regulamento; • As providências tomadas para esgotar os recursos da jurisdição interna ou a impossibilidade de fazê-lo de acordo com o artigo 31 deste Regulamento; • A indicação de se a denúncia foi submetida a outro procedimento internacional de conciliação de acordo com o artigo 33 deste Regulamento. - Casos em que o Brasil foi julgado pela Côrte Em 3 de novembro de 1995, a Comissão Americana recebeu denúncia do CEJIL (Centro pela Justiça e Direito Internacional) contra o Brasil. A petição relata a violação de Direitos Humanos contra Cosme Rosa Genoveva e outras treze pessoas, cujos cadáveres não foram identificados, mortos na Favela Nova Brasília, no Rio de Janeiro, durante operação policial estadual, em 8 de maio de 1995. Durante visita ao Brasil, em 7 de dezembro de 1995, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, recebeu denúncia do Centro de Defesa D. Luciano Mendes (Associação Beneficente São Marinho), contra o Estado brasileiro, por suspeita da execução de Jailton Neri da Fonseca. A criança fora levada a efeito por policiais militares do Estado do Rio de Janeiro. A Comissão entendeu que o Brasil é responsável por garantir o direito à liberdade pessoal, à integridade pessoal, às medidas especiais de proteção da infância, à proteção judicial e às garantias judiciais consagradas, respectivamente, nos artigos 7, 5, 4, 19, 25 e 8 da Convenção e deveria ter agido conforme suas responsabilidades. Em 6 de outubro de 1995, o Centro de Defesa dos Direitos Humanos da Arquidiocese de Porto Velho (capital do Estado de Rondônia), a Comissão Teotônio Vilela, o Movimento dos Trabalhadores sem Terra (MST), o Centro pela Justiça e o Direito Internacional (CEJIL) e o Human Rights Wacht denunciaram o Brasil, diante da Comissão, por fatos relacionados com homicídios e agressões (pelo menos 50 pessoas agredidas) por policiais que tentavam retirar invasores (trabalhadores rurais) de uma Propriedade rural no município de Corumbiara, em Rondônia. Um dos casos que mais chamou a atenção diz respeito à Casa de Detenção José Mário Alves, mais conhecida como “Urso Branco”, do Estado de Rondônia, local que tinha elevado número de mortes dos internos. Cerca de nove pessoas foram assassinadas por outros internos, alguns publicamente; outros cadáveres foram esquartejados e houve exibição de partes dos cadáveres. Aparentemente, mais de 160 pessoas foram mantidas como reféns. A Côrte Interamericana de Direitos Humanos, a pedido da Comissão Interamericana, em decorrência de numerosas mortes ocorridas no ano de 2002, estabeleceu (em 18 de junho desse mesmo ano) algumas medidas provisórias e solicitou ao Estado brasileiro, dentre outras providências, que “adotasse

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todas as medidas que fossem necessárias para proteger a vida e a integridade pessoal de todas as pessoas reclusas na Penitenciária Urso Branco, sendo uma delas a apreensão das armas que se encontravam em poder dos internos”. Em primeiro de outubro de 2004, a Comissão encaminhou à Côrte caso contra a República Federativa do Brasil pelas condições inumanas e degradantes em que foi hospitalizado o senhor Damião Ximenes Lopes (que sofria de deficiência mental) em um centro de saúde que funcionava à base do Sistema Único de Saúde (SUS), chamado Casa de Repouso Guararapes. A vítima sofreu golpes e ataques contra sua integridade pessoal por parte dos funcionários da Casa de Repouso, enquanto ali se encontrava submetido a tratamento psiquiátrico. A falta de investigação e de garantias judiciais acabou então caracterizando a violação de Direitos Humanos com a manutenção da impunidade. Em 11 de agosto de 1999, o Centro de Defesa, Garantia e Promoção de Direitos Humanos do Instituto Brasileiro de Inovações em Saúde Social (IBISS), submeteu à Comissão Interamericana de Direitos Humanos petição contra o Brasil, alegando que os garotos, Robson William da Silva Cassiano, Jorge Wellington da Silva Cassiano e Leonardo Cunha de Souza, foram assassinados em 1994, na cidade do Rio de Janeiro, por agentes policiais estatais. A Comissão declarou a admissibilidade da petição no que tange às pretensas violações. No dia 5 de setembro de 2000, o Centro pela Justiça e o Direito Internacional (CEJIL) apresentou à Comissão Interamericana denúncia de violação ao direito à vida, direito à integridade física, direito à proteção especial à infância, direito às garantias judiciais e direito a recurso judicial, em prejuízo dos adolescentes acusados de cometerem infrações penais, custodiados nas unidades da Fundação do Bem Estar do Menor (FEBEM), tendo a Comissão declarado a admissibilidade da petição.

6. DIREITOS HUMANOS NO BRASIL 6.1 Direitos e Garantias Fundamentais Os direitos fundamentais e garantias fundamentais constituem um núcleo da proteção à dignidade da pessoa. Compreendem os direitos e garantias fundamentais descritos no Título II da Constituição Federal de 1988, as seguintes espécies: • Direitos Individuais. • Direitos Coletivos. • Direitos Sociais. • Direitos à Nacionalidade. • Direitos Políticos. - Direitos Individuais: Têm por base a liberdade. São aqueles que se caracterizam pela autonomia (atributo pessoal relativo à faculdade e aos bens das pessoas) e oponibilidade ao Estado (este, não pode interferir nas esferas próprias dessas liberdades). Possuem status de negativos, pois seu núcleo está na proibição de interferência imediata do Estado. Configuram uma pretensão de resistência à intervenção estatal. - Direitos Coletivos: O exercício de tais direitos cabe à pluralidade de sujeitos e não isoladamente a cada indivíduo. Temos, como exemplos, a garantia de reunião e de associação previstas no artigo 5º da Constituição.

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- Direitos Sociais: Estão previstos no artigo 6º da Constituição e compreendem educação, saúde, trabalho, previdência social, segurança, lazer, moradia, proteção à maternidade, à infância e assistência aos desamparados. São direitos de status positivos, pois permitem aos seres humanos exigirem atuação do Estado, garantindo melhoria nas condições de existência. - Direitos à Nacionalidade: Estes direitos nos levam a conhecer o significado de nacionalidade, assim nos ensina Kildare Gonçalves Carvalho: “A nacionalidade, no sentido sociológico, é conceito que se vincula à ideia de nação. Juridicamente, a nacionalidade constitui o vínculo que une a pessoa a um determinado Estado. Trata-se de um elo de subordinação direta, permanente e de natureza política do indivíduo ao Estado.” Ao nacional, o Estado reconhece direitos civis e políticos. - Direitos Políticos: Este direito permite que o indivíduo exerça a liberdade e a participação no processo político, votando e sendo votado e participando dos partidos políticos. Curiosidade: De acordo com o Supremo Tribunal Federal, os direitos individuais e coletivos não se restringem apenas ao artigo 5º da Constituição. É possível encontrá-los ao longo de todo o texto Constitucional.

6.2 Diferença entre direitos e garantias fundamentais Rui Barbosa foi o primeiro a fazer a distinção entre direitos e garantias fundamentais, interpretando a Constituição Brasileira de 1891. Para ele, “as disposições meramente declaratórias, que são as que imprimem existência legal aos direitos reconhecidos, e as disposições assecuratórias, que são as que, em defesa dos direitos, limitam o poder. Aquelas instituem os direitos, estas as garantias.”. Os direitos fundamentais significam bens e vantagens reconhecidos legalmente, enquanto as garantias asseguram o direito e limitam o poder do Estado, podendo reparar direitos que foram violados. Por exemplo, o Direito à Liberdade possui a garantia do Habeas Corpus. O Professo Pedro Lenza distingue ainda garantias fundamentais de remédios constitucionais. Ele classifica os remédios constitucionais como gênero das garantias, em virtude de que o direito, uma vez consagrado, nem sempre terá, em regras definidas, constitucionalmente, as suas garantias como remédios constitucionais (Habeas Corpus, Habeas Data e etc.). 6.3 Titulares dos Direitos e Garantias Fundamentais O artigo 5º, em seu caput, utiliza-se do principio da igualdade e garante aos brasileiros e aos estrangeiros que residem, no Brasil, os direitos e as garantias fundamentais, tais como a vida, a liberdade etc.. Assim, além dos brasileiros, os estrangeiros não residentes em território brasileiro, os apátridas e os que estiverem em trânsito, no Brasil, são sujeitos de direitos e garantias fundamentais. Assim, um turista que for preso ilegalmente pode impetrar Habeas Corpus para cessar a violação de seu direito de ir e vir. A Pessoa Jurídica também pode ser titular de direitos fundamentais, conforme se observa do art. 5º, quando veda no inciso XVIII, a interferência estatal no funcionamento das associações e cooperativas e as protege da dissolução compulsória no inciso XIX. O STJ sumulou o assunto, permitindo que a pessoa jurídica venha a sofrer dano moral (Súmula 227 do STJ). 6.4 Evolução ou Gerações dos Direitos Fundamentais As gerações dos Direitos Fundamentais são tidas como perspectiva histórica em virtude de reconhecerem as etapas atravessadas pelo Direito Fundamental. O lema da Revolução Francesa “liberdade, igualdade e fraternidade” resumiu, no século XVIII, os princípios norteadores dos direitos fundamentais. Os direitos fundamentais passaram a se manifestar em três gerações sucessivas. São elas: 32


• Direitos Humanos de Primeira Geração São os direitos da liberdade, que têm o indivíduo como titular. São direitos dos indivíduos perante o Estado, considerados como direitos de resistência ou oposição ao Estado. São direitos civis e políticos, são aqueles que traduzem o valor de liberdade. Curiosidade: Documentos históricos importantes para tais direitos de primeira geração, compreendida nos séculos XVII a XIX: • Magna Carta de 1215, assinada pelo Rei João Sem Terra; • Paz de Westifália de 1648; • Habeas Corpus Act de 1679; • Bill of Rights de 1688; • Declarações: americana de 1776 e francesa de 1789.

• Direitos Humanos de Segunda Geração Durante a Revolução Industrial, os operários (homens, mulheres, crianças) eram tratados de formas desumanas, sofriam explorações de mão de obra e, em alguns casos, sexuais. Alguns movimentos surgiram com o intuito de reivindicar os direitos e as péssimas condições de trabalho (Cartistas na Inglaterra e Comuna de Paris- 1848). São os direitos que exigem uma prestação do Estado perante os indivíduos, são direitos sociais, econômicos e culturais. Tais direitos, conforme ensinamento de Paulo Bonavides, “nasceram abraçados com o princípio da igualdade”. • Direitos Humanos de Terceira Geração Os direitos de terceira geração não se destinam especificamente à proteção dos interesses dos indivíduos, de um grupo ou do Estado. São direitos ligados à fraternidade ou, para outros, à solidariedade e se destinam, em primeiro lugar, ao gênero humano. Surgem do desenvolvimento humano mundial, da importância da paz, do meio ambiente, do patrimônio comum da humanidade. São direitos coletivos: meio ambiente, defesa do consumidor, infância e juventude. • Direitos Humanos de Quarta Geração Conforme leciona Pedro Lenza, os direitos de Quarta Geração “decorrem dos avanços no campo da engenharia genética, ao colocarem em risco a própria existência humana, através da manipulação do patrimônio genético”. Dizem respeito ainda à eutanásia, à criação de alimentos transgênicos, à clonagem, à inseminação artificial. Características dos Direitos e Garantias Fundamentais É possível apontar as seguintes características dos direitos e garantias fundamentais: • Historicidade Os direitos e garantias fundamentais surgiram com o Cristianismo e foram evoluindo com o decorrer dos tempos. Não são considerados obras naturais (da natureza), mas sim das necessidades humanas. • Universalidade Não discriminam aqueles que serão beneficiados, atingem a todos os seres humanos de forma a não observar cor, raça, crença, sexo. Tem-se que tais direitos e garantias ultrapassam os limites territoriais de um lugar específico para benefício geral, de todos.

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• Limitabilidade ou Relatividade Os direitos e garantias fundamentais não são considerados absolutos, pois permitem, em algumas situações, os conflitos de interesses. Assevera Pedro Lenza que “a solução (destes conflitos) ou vem discriminada na própria Constituição (ex: direito de propriedade versus desapropriação), ou caberá ao intérprete, ou magistrado, no caso concreto, decidir qual direito deverá prevalecer, levando em consideração a regra da máxima observância dos direitos fundamentais envolvidos, conjugando-a com a sua mínima intervenção. • Concorrência, Concorrentes ou Cumuláveis Os direitos e garantias previstos na Constituição Federal de 1988 podem ser exercidos ao mesmo tempo, ou seja, são cumuláveis. Tem, como exemplo, o jornalista que transmite informação e emite opinião. • Irrenunciabilidade Os seres humanos podem não exercer os direitos previstos na Carta Magna (exemplo: ajuizamento de Mandado de Segurança), mas não é possível que tais destinatários renunciem a esses direitos. • Inalienabilidade Como não possuem conteúdo econômico ou patrimonial, os direitos e as garantias fundamentais são indisponíveis. Assim, não é possível realizar a venda, a alienação, ou atribuir caráter comercial a tais direitos e garantias. • Imprescritividade A prescrição é instituto que, com o decurso do tempo, sem “movimentação ou manifestação” do titular do direito, ocorre a inexigibilidade daquilo que se pretendia. Assim, conclui-se que os direitos e garantias fundamentais, mesmo quando não exercidas, não geram os efeitos da prescrição. 6.6 Princípio do não retrocesso A vedação do retrocesso significa que aquilo que já foi conquistado em termo de proteção e de concretização dos Direitos Fundamentais não pode deixar de existir. O núcleo essencial dos direitos fundamentais já conquistados deve considerar-se um patrimônio jurídico inalienável do indivíduo. 6.7 Amplitude dos Direitos Fundamentais Os direitos contidos no caput do artigo 5º são considerados fundamentais básicos, enquanto os demais, elencados ao longo do artigo, são considerados como desdobramentos daqueles. Os direitos denominados de fundamentais são aqueles essenciais aos seres humanos, direitos que fundamentam a forma como estes merecem ser tratados e aquilo que devem exigir quando se sentirem ofendidos ou violados. Podemos classificar os direitos fundamentais sob duas vertentes: temos a mais limitada, que classifica os direitos fundamentais como sendo aqueles expressamente designados pela Constituição Federal (Artigos. 5º ao 17 da CF/88), e a classificação que nos permite ampliar o rol dos direitos fundamentais. Conforme parágrafo 2º do artigo 5º, podemos concluir que o legislador preferiu por adotar a forma mais extensiva: “Parágrafo 2º: Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes de regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais que a República Federativa do Brasil seja parte.” Curiosidade: No Brasil, os tratados internacionais sobre Direitos Humanos têm status de norma constitucional, desde que aprovados em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros.

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DIREITOS FUNDAMENTAIS PREVISTOS DO ART. 5º DA CONSTITUICAO FEDERAL Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: Em análise ao caput desse artigo, pode-se destacar a presença do Princípio da Igualdade Formal, ou, como é mais conhecido, Princípio da Isonomia. Segundo esse princípio, as pessoas devem ser tratadas de forma diferenciada na medida de suas diferenças, uma vez que o tratamento a todas as pessoas não pode ser absolutamente igual. I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição; A igualdade prevista neste inciso entre homens e mulheres é relativa, uma vez que, ao longo do Texto Constitucional, percebemos tratamentos diferenciados em virtude das necessidades de cada um dos seres. (Ex. prazos de licença maternidade e paternidade). Vale ressaltar que a Constituição Federal é o único meio capaz de determinar tais distinções. II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei; Cuida-se do Princípio da Legalidade, que nos ensina que apenas as leis, devidamente aprovadas, são capazes de gerar obrigações às pessoas, sejam obrigações de fazer, de não fazer, de dar etc. III - ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante; O impedimento à tortura e tratamentos desumanos e degradantes nos permite ressaltar o Princípio da Dignidade da Pessoa, contido no artigo 1º, inciso III da Constituição Federal. Ao utilizar-se da palavra “ninguém”, o legislador quis abordar tanto os brasileiros quanto os estrangeiros residentes ou não em território nacional. IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato; Esse inciso permite que as pessoas, desde que identificadas, expressem, de forma livre, os seus pensamentos. A identificação permite ainda àquele que se sentiu ofendido com a manifestação exercer o direito de resposta, garantido pela Constituição Federal. Esse direito também se encontra na Declaração Universal dos Direitos do Homem, no artigo 19: “Todo o homem tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferências, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios, independentemente de fronteiras.”. V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem; Esse inciso assegura, conforme anteriormente exposto, o direito de resposta daquele que se sentiu ofendido. Ao ofendido ainda é possível ajuizar ação cível, para ser indenizado pelos danos materiais, morais ou à sua imagem. VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;

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Temos, nesse inciso, três direitos: o de “ter liberdade de consciência e de crença”, o de ter “livre exercício de culto religioso” e, por último, “a proteção aos locais de culto e suas liturgias”. Consciência é orientação filosófica. Então, é possível que uma consciência livre não tenha crença alguma. É importante afirmar que os ateus (aqueles que não acreditam em Deus) são também protegidos pela Constituição, visto que possuem o direito individual. Esse inciso garante ainda a proteção ao local dos cultos, o que impossibilita que pessoas contrárias a determinadas crenças sejam hostis e prejudiquem os seus participantes, devendo o Poder Público garantir essa proteção. VII - é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva; Entende-se por entidades civis, hospitais, presídios, asilos (...); e por entidades militares, os quartéis. Àqueles que estiverem, por qualquer motivo, internados nestas entidades, por não terem livre acesso aos templos que frequentavam, podem exercer a prática de seus cultos. “Artigo. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles, ou seus representantes, relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público.”. Com essa vedação, o legislador visa a restringir que determinadas religiões sejam exaltadas e recebam, de forma desproporcional, ajuda governamental em virtude de representantes políticos no poder. VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei; Como os seres humanos são dotados de liberdade para escolherem suas crenças, não é permitido que haja violações aos demais direitos constitucionais e humanos em virtude da religião escolhida e adotada. A única forma de direitos serem violados, ocorrendo a sua privação em função da religião ou crença é quando a pessoa religiosa deixa de cumprir com suas obrigações estabelecidas ou com as obrigações alternativas previstas em leis. É possível exemplificar tal situação: Todo jovem do sexo masculino deve alistar-se aos 18 (dezoito) anos, prestando assim serviços militares. Aquele que se recusa, justificando ser pacifista e a Marinha, Aeronáutica ou Exército são instrumentos de guerras, por ser livre o direito de manifestação e consciência, não poderá ser o jovem obrigado a alistar-se, mas deverá prestar obrigação alternativa prevista em lei. Caso se recusar-se à prestação alternativa, será punido com a privação de direitos. IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença; A Constituição não permite o exercício da censura e admite ser livre o direito à expressão. Assim, não é possível o controle pelo Poder Público dos teatros, das produções de filmes, dos livros e músicas etc., sendo autorizada a este apenas a classificação para efeito indicativo. “Artigo. 21. Compete à União: XVI - exercer a classificação, para efeito indicativo, de diversões públicas e de programas de rádio e televisão.” Tal classificação é como se fosse um conselho e não uma obrigação. Diante disso, se os pais ou responsáveis quiserem, podem levar seus filhos a espetáculos, desrespeitando a classificação de idade indicada. 36


X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação; • Intimidade: é inerente a todos os seres humanos, refere-se à esfera subjetiva, na qual encontramos as concepções pessoais, os segredos, os desejos, os gostos, os problemas. • Vida privada: é a forma encontrada pelos seres humanos de externar suas intimidades. Normalmente, ocorrem em locais em que as pessoas sentem-se protegidas, seguras, longe de estranhos. • Honra: característica capaz de revestir a imagem do ser humano. Com isso, alcança respeito, família, além de, intimamente, ter consciência de sua dignidade; • Imagem: é a figura física ou material, pessoal ou através de fotos, pinturas, televisão, charge, etc. da pessoa titular de direitos e garantias. A Constituição protege todos os tipos de imagem. A doutrina e a jurisprudência advertem que, quando as pessoas possuem imagem pública (exemplo: políticos), ou quando estão em locais públicos (como ruas, estádios de futebol), e são fotografadas de forma coletiva, não possuem violados tais direitos, pois é como se renunciassem a esse direito. XI - a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial; Essa garantia encontra-se respaldada desde a Constituição de 1824. Os seres humanos possuem, em suas casas, total proteção à intimidade e à vida privada. Em virtude disso, só é permitido que pessoas entrem umas nas casas das outras se houver permissão e consentimento. Ao mesmo tempo em que proíbe a invasão domiciliar, excepciona situações em que, mesmo sem consentimento, é permitida a entrada de pessoas em domicílio alheios, tais como para prestar socorro em caso de desastre, ou em flagrante delito (qualquer pessoa pode prender quem se encontre em situação de flagrante). É permitido, ainda, entrar durante o dia em casos de ordens judiciais. XII - é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal; Esse inciso refere-se à proteção dos sigilos relacionados à comunicação. O Supremo Tribunal Federal não considera que as garantias individuais sejam absolutas. Assim, decide no sentido de que, apesar do inciso XII excepcionar apenas a interceptação telefônica, é possível que a administração do presídio intercepte correspondências e comunicações telegráficas, visando a combater as atividades ilícitas. XIII - é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer; Nesse inciso, o legislador buscou ampliar e regularizar o rol de profissões que não necessitam de extrema qualificação, como completar o ensino médio, cursar um bom ensino superior, especializar-se, fazer provas para compor determinada classe etc.. Com isso, profissões simples e cotidianas ainda podem ser passadas de pai para filho. Percebemos que, se não há lei exigindo qualificação, qualquer pessoa pode exercer tais profissões, por exemplo: secretaria, artesão, vendedor, marceneiro, pintor, servente de pedreiro, padeiro, mecânico etc. Alguns profissionais desses ramos escolhem por livre vontade se especializarem, realizando cursos técnicos, mas o que a Constituição prevê é que, sem lei, não há a obrigatoriedade desses cursos de formação específica. Em contrapartida, existem, no Brasil, mais de 70 (setenta) profissões regulamentadas em lei, por exemplo: medicina, advocacia, engenharias etc. Assim, aqueles que desejam exercer tais cargos devem conhecer as exigências legislativas. XIV - é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional; Significa que tanto aquele que informa, quanto aquele que é informado, são protegidos.

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Aquele que informa, em alguns casos, não pode revelar sua fonte, para que não haja seu comprometimento, em virtude da importância do assunto, da sensibilidade dos interesses etc.. XV - é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens; O direito de ir e vir é garantido nesse inciso e no mesmo artigo 5° encontramos o remédio constitucional, Habeas Corpus, para solucionar questões em que esse direito foi ou está sendo violado. O direito de locomoção só será restrito ou violado, sem graves consequências, em casos de guerra e de Estado de sítio, em tempos de paz, ou seja, na normalidade do território nacional. É vedada a restrição ao direito de locomoção. XVI - todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente; É um direito público subjetivo e compreende os atos de organizar, convocar e participar de reuniões. O inciso faz ressalvas quanto ao respeito a outras reuniões que já estiverem marcadas para o mesmo dia e local, quanto à exigência de serem reuniões pacíficas e sem arma, realizadas em locais abertos ao público, reforçando o direito de ir e vir. Nesses casos, é necessário prévio aviso às autoridades competentes, o que possui a finalidade de evitar que sejam marcadas reuniões no mesmo dia e local, causando ausência em uma delas das autoridades, e também para que, caso seja necessário, providencie-se a segurança do local e dos participantes. Vale salientar que o prévio aviso não é pedido de autorização, e sim uma simples comunicação. XVII - é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar; É possível encontrarmos associações de diversos tipos (políticas, empresarial, religiosa, de proteção a determinada classe, esportiva etc.), que devem ter fins lícitos. O inciso em análise veda a associação com caráter paramilitar, que é caracterizado pelo uso de armas, treinamentos marciais, uso de uniformes e de palavras de ordem, hierarquia interna etc. Atualmente, é possível classificar algumas torcidas organizadas de associações com caráter paramilitar, em virtude das barbáries que vêm cometendo. Nelas, identificamos algumas das características apontadas, organizando-se com um objetivo comum, de forma permanente, possuindo um líder, que expressa palavras de ordem, utilizando de armas (nem sempre de fogo) e com hierarquia entre os participantes XVIII - a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento; A associação é uma liberdade garantida pelo inciso XVII do artigo 5° da Constituição Federal. Assim, faz sentido que ela seja criada sem prévia autorização. Esse inciso abrange ainda a criação de cooperativas. Assim, temos que associações e cooperativas podem ser criadas sem autorização e não podem sofrer interferências estatais, determinando seu funcionamento, sua composição, seus objetivos e etc.. XIX - as associações só poderão ser compulsoriamente dissolvidas ou ter suas atividades suspensas por decisão judicial, exigindo-se, no primeiro caso, o trânsito em julgado; As associações podem ser dissolvidas de duas formas, uma delas acontece quando os associados decidem, voluntariamente, pela dissolução, respeitando o regimento interno e a outra maneira ocorre de forma compulsória, ou seja, independe da vontade dos associados.

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A Constituição prevê que, para que a dissolução compulsória ocorra ou para que as atividades da associação sejam suspensas, faz-se necessário decisão judicial, ordem de um juiz competente para julgar a causa, o que impede que ordens policiais tenham esta finalidade. Para que haja apenas a suspensão das atividades, basta ordem judicial, mesmo quando esta é passível de recurso, enquanto a dissolução, que põe fim à associação exige que a ordem esteja transitada em julgado, ou seja, que não haja mais a possibilidade de recorrer e modificar a decisão de dissolver a associação. XX - ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado; É óbvio que, para associar-se, a pessoa deve ter em seu íntimo tal desejo, não há possibilidades de ser obrigatória a associação em determinada entidade. XXI - as entidades associativas, quando expressamente autorizadas, têm legitimidade para representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente; Esse inciso aborda a possibilidade de representação processual, autoriza que as entidades associativas, desde que autorizadas por seus filiados, os representem em juízo (em questões judiciais) ou fora dele (em questões extrajudiciais). As entidades associativas não estão substituindo seus filiados em juízo, apenas atuam em defesa dos interesses destes e, para isso, devem comprovar a autorização, que pode ser dada por cada um dos associados ou estar inserido no estatuto da associação. Apesar de ser uma entidade associativa, o sindicato não necessita de apresentar autorização de seu filiado para defender seus interesses, conforme nos ensina o artigo 8°, III, da Constituição Federal. “Artigo. 8º É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte: III - ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas;” A defesa dos filiados de um sindicato é inerente à sua criação, sendo assim presumida como atividade lícita do sindicato. XXII - é garantido o direito de propriedade; Todos os seres humanos, protegidos por essa Carta Constitucional possuem o direito de ser proprietários de algo. Ao utilizar-se do termo propriedade, o legislador desejava garantir o direito de qualquer tipo de propriedade, seja ela imobiliária, intelectual, de marcas ou de bens móveis etc. O proprietário detém o monopólio de explorar seus bens e de exercer tal poder quando alguém se opõe a este monopólio. XXIII - a propriedade atenderá a sua função social; A função social da propriedade é determinada, em suma, pelo direito constitucional e pelo direito administrativo. Tal função social distribui, à propriedade, atributo coletivo, sendo possível afirmar que o dono de algo não é o único a exercer o direito de propriedade deste bem. Inclui ainda o exercício desse direito pelo dono do bem em relação a terceiros, ou seja, a propriedade gera um direito e um encargo ao dono do bem, que fica responsável por contribuir de alguma forma com o grupo social. A própria Constituição define a função social da propriedade urbana e rural.

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“Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem - estar de seus habitantes. § 1º - O plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório para cidades com mais de vinte mil habitantes, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana. § 2º - A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor.” XXIV - a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta Constituição; Existem várias formas de aquisição de bens realizadas legalmente pelo Poder Público, uma delas é a desapropriação. O Estado, portanto, é autorizado a retirar a propriedade de alguém sob determinado bem, por motivos concretos e reais para que esse bem seja incorporado ao patrimônio estatal. Normalmente, tal aquisição ocorre quando o Estado planeja a realização de grandes obras com o intuito de melhoria para a cidade e para a população. Para que exerça tal poder, é necessário que o proprietário seja indenizado em dinheiro e de forma justa, dando a ele a oportunidade de adquirir outro bem semelhante ao que foi desapropriado e o valor que receberia, caso vendesse, de livre e espontânea vontade, o bem. É importante destacar que a indenização deve, ainda, ser prévia, antes que o Estado acrescente tal bem a seu patrimônio. É possível que a indenização seja realizada em títulos e não em dinheiro, no caso de imóveis rurais, conforme os artigos abaixo: XXV - no caso de iminente perigo público, a autoridade competente poderá usar de propriedade particular, assegurada ao proprietário indenização ulterior, se houver dano; Ao contrário do inciso anterior, em que o proprietário perde o bem para o Estado, recebendo as indenizações devidas em cada caso, esse inciso garante ao Estado a possibilidade de utilizar-se dos bens de um particular, sem que este perca seus bens. A requisição administrativa ocorre em virtude de situação de iminente perigo público e não tem tempo determinado. XXVI - a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família, não será objeto de penhora para pagamento de débitos decorrentes de sua atividade produtiva, dispondo a lei sobre os meios de financiar o seu desenvolvimento; O dono de pequena propriedade rural, normalmente, retira desta seu sustento, ou seja, planta, colhe aquilo que irá consumir. Assim, o legislador achou, por bem, proteger esse proprietário da penhora por falta de pagamento de suas dívidas em razão da atividade exercida, evitando, com isso, que o mesmo passe fome e necessidades. Com a simples leitura desse inciso, podemos destacar quatro itens necessários para que esse direito seja válido. São eles: • A propriedade deve ser pequena e rural, respeitando a definição legal; • A propriedade deve ser produtiva; • A atividade deve ser exercida de forma familiar; • A dívida deve ser em virtude da atividade exercida. XXVII - aos autores pertence o direito exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas obras, transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar;

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Trata-se do direito autoral que é uma forma de propriedade. Os resultados provenientes da exploração dos materiais produzidos pelo autor são auferidos de forma vitalícia, quando o autor falece. Os direitos são transferidos a seus herdeiros, permanecendo a vitaliciedade. Caso os herdeiros sejam distantes, os direitos serão transferidos a esses por 60 anos, a contar do próximo ano (1 de janeiro) da morte do autor. XXVIII - são assegurados, nos termos da lei: a) a proteção às participações individuais em obras coletivas e à reprodução da imagem e da voz humanas, inclusive nas atividades desportivas; b) o direito de fiscalização do aproveitamento econômico das obras que criarem ou de que participarem aos criadores, aos intérpretes e às respectivas representações sindicais e associativas; Obras coletivas, diz respeito à realização de atividade coletiva a fim de exprimir a arte, seja ela uma peça teatral, uma novela, um filme, ou atividade desportiva. Aqueles que fazem parte desse elenco têm garantido o direito de remuneração, conforme sua participação, sendo estendido tal direito à reprodução da imagem e da voz humana. Os participantes podem, ainda, fiscalizar os rendimentos econômicos para que não haja fraude ao valor a ser pago em virtude do direito autoral. XXIX - a lei assegurará aos autores de inventos industriais privilégio temporário para sua utilização, bem como proteção às criações industriais, à propriedade das marcas, aos nomes de empresas e a outros signos distintivos, tendo em vista o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País; A Constituição prevê proteção aos inventos industriais. Tais inventos devem ser determinados por lei específica, sendo a função da Carta Magna apenas determinar essa proteção, que não é vitalícia como a remetida aos direitos autorais. Essa proteção nasceu em virtude dos avanços tecnológicos e pela importância deste para a humanidade. Aquele que inventa recebe temporariamente pelo talento e pela atividade intelectual, sendo após o decurso do prazo, uma invenção que pode ser acessada por qualquer pessoa, passando, assim, a pertencer ao domínio comum. As criações industriais, as marcas, os símbolos e os nomes das empresas são propriedades vitalícias de seus detentores, por estarem diretamente ligados a seus produtos e a qualidade destes. XXX - é garantido o direito de herança; Com a morte de um ser humano detentor de direitos e deveres, ocorre a transferência de seu patrimônio aos herdeiros legítimos e testamentários. Essa transferência é denominada de sucessão e pode ocorrer conforme testamento realizado pelo falecido, desde que estejam de acordo com a legislação competente ou conforme determinação legal para os casos em que não há instrumento testamentário. XXXI - a sucessão de bens de estrangeiros situados no País será regulada pela lei brasileira em benefício do cônjuge ou dos filhos brasileiros, sempre que não lhes seja mais favorável à lei pessoal do de cujus; Os bens que compõem o patrimônio de uma pessoa, situados em território nacional, ainda que o proprietário não seja brasileiro, deverão seguir as normas nacionais, inclusive quando se tratar de sucessão ou transferência de propriedade em virtude da morte, desde que a lei brasileira seja mais favorável ao cônjuge e aos filhos (herdeiros). Conclui-se que, se a lei estrangeira (lei nacional do falecido) for mais benéfica ao cônjuge e ao filho brasileiro, esta poderá ser aplicada. XXXII - o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor; O Estado garante a defesa do consumidor, mas, para que tal defesa fosse efetiva, fazia-se necessária lei específica, que surgiu apenas em 1990. O Código de Defesa do Consumidor surgiu para assegurar que, apesar da posição de inferioridade perante produto ou vendedor, os consumidores serão protegidos quando tiverem seus direitos violados.

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XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado; A priori, tal garantia pode ser confundida com o direito à informação, mas o legislador visou a garantir a publicidade dos atos de governo, impedindo assim a realização de administrações sigilosas e secretas. Assim, em conjunto com o direito à informação, o cidadão pode requerer informações ao Estado, quando tiver interesse particular ou quando forem de interesse coletivo, visando à sociedade. O Estado não será obrigado a prestar informações quando estas forem de natureza sigilosa, ou seja, forem relativas às ações das Forças Armadas (Marinha, Exército, Aeronáutica), referentes à segurança nacional, às reservas energéticas e à matéria radioativa. É possível solucionar a falta da prestação de informações através de Habeas Data (quando a informação for de via particular, referente ao requerente) ou por mandado de segurança (quando for referente à coletividade). XXXIV - são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas: a) o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direito ou contra ilegalidade ou abuso de poder; b) a obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimento de situações de interesse pessoal; O termo utilizado na alínea “a”, ‘em defesa de direito’ permite a utilização da petição para defender direitos coletivos e individuais. O direito de peticionar possibilita a participação individual no Estado e o exercício de prerrogativas destinadas à prática da cidadania, podendo ser exercido por pessoa física ou jurídica. As certidões podem ser obtidas por qualquer pessoa, inclusive por estrangeiros, para que assim exerçam o direito de defesa e de esclarecimento de situações pessoais. Tanto o direito de peticionar quanto o direito de obter certidões deverão ser exercidos sem que para isso o cidadão seja compelido a pagar taxas (espécie do gênero tributo). XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito; Este inciso representa o Princípio da Inafastabilidade da Jurisdição, também conhecido como Direito de Ação, que não permite ao Poder Judiciário se recusar a apreciar lesão ou ameaça de direito. O Poder Judiciário deve analisar lesão a direito, ou ameaça de lesão, sendo a decisão proferida em observância às partes, não possibilitando a rediscussão do assunto em qualquer dos Poderes. XXXVI - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada; Direito adquirido é aquele que já se incorporou ao patrimônio e não pode ser retirado de seu domínio (exemplo: após decurso de tempo estabelecido, o servidor concursado passa a ter estabilidade). Ato jurídico perfeito reúne sujeito com capacidade civil plena, objeto lícito, ou seja, permitido por lei, e forma não proibida em lei. A coisa julgada ocorre quando não há mais possibilidade de recorrer de uma demanda judicial, tornando-se imodificável a decisão.

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O inciso protege essas instituições para que não seja retroagido um direito adquirido, desfeito um ato jurídico ou imponha julgamento de coisa julgada. A exceção conhecida no meio jurídico para a retroatividade da lei ocorre apenas no direito penal quando beneficiar o réu. XXXVII - não haverá juízo ou tribunal de exceção; Juízo ou Tribunal de exceção são criados para solução de casos excepcionais e duram apenas até a solução destes. Ocorre que tais não são permitidos no Brasil, pois a Constituição os veda, expressamente. Assim concluímos que o Judiciário não pode ser substituído por juízo ou tribunal de exceção. Caso criem um juízo ou tribunal de exceção, este será considerado inconstitucional. A lei não nos permite confundir tribunal de exceção com foro privilegiado, que ocorre quando alguém, em razão da função exercida, como presidente, prefeito, governador, senador etc., de interesse público tem por determinação legal privilégios. XXXVIII - é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados: a) A plenitude de defesa; b) O sigilo das votações; c) A soberania dos veredictos; d) A competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida; O Tribunal do Júri é de primeira instância e compete ao direito penal. Esse tribunal julga crimes dolosos (em que o agente tem intenção de cometer o delito) contra a vida e os conexos a este crime, tentados ou consumados. O julgamento daquele que supostamente cometeu crime doloso será feito por pessoas comuns do povo e presidido por juiz de carreira, que transforma as decisões dos jurados nos termos técnicos e jurídicos, devendo respeitar a decisão dos jurados, ressaltando a soberania dos veredictos. Rege, neste Tribunal, a plenitude de defesa, que garante ao acusado utilizar os meios legais para provar a inocência que é presumida. Os votos dos jurados devem ser realizados de forma sigilosa e os mesmos não devem se comunicar enquanto dure o júri. Alguns casos duram 4 dias e os jurados ficam nas dependências do Fórum, sem comunicação externa ou interna. O Código Penal determina como crime doloso contra a vida, o homicídio, o aborto, o induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio, o infanticídio, nos casos em que for possível, o cometimento do crime por culpa, o julgamento não será de competência do Tribunal do Júri, e sim do juiz singular. XXXIX - não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal; O crime consiste em conduta humana punível, ou seja, conduta contrária à determinação legal ou proibida por lei, com punição descrita. A Constituição prevê o princípio da legalidade, em que nenhuma conduta humana será considerada crime, sem que haja lei anterior ao determinando. Vale ressaltar que a competência para legislar sobre o Direito Penal é privativa da União. “Artigo. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho;” XL - a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu;

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Esse inciso nos leva a compreender três importantes princípios que regem a legislação penal. São eles: • Retroatividade da Lei mais benéfica. A lei penal só retroage para beneficiar o réu, ou seja, só será aplicada após edição de nova lei, quando for para beneficiar o réu. • Irretroatividade da Lei mais gravosa. A nova lei, quando for gravosa ao réu, não pode retroagir, ou seja, não é possível que seja aplicada a casos julgados anteriormente. • Ultratividade da Lei mais benéfica. A lei mais benéfica deve ser aplicada em favor do réu, mesmo quando esta tiver sido revogada. Ressaltamos que a relação jurídica, em âmbito penal, é definida pela lei vigente à época do fato, salvo quando lei posterior ou anterior seja mais benéfica. Pode-se questionar com qual tipo de benefício o réu pode ser agraciado em razão da retroatividade, da irretroatividade e da ultratividade da lei, sendo esta apontada pela melhor doutrina que é possível, desde a extinção do tipo penal até a diminuição da pena ou modificação do tipo penal, como criação de penas alternativas, além do estabelecimento de condições diversas da punibilidade. XLI - a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais; As condutas de cunho discriminatório devem ser rigorosamente punidas. Este inciso reforça a importância dos direitos e das liberdades fundamentais inerentes aos seres humanos e exige punição para atos que violem essas prerrogativas (direitos e liberdades fundamentais). Percebe-se que não há determinação de punição apenas ao particular ou ao Estado. Dessa forma, concluímos que ambos devem ser punidos ao praticarem atos discriminatórios. XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei; A lei 7.716 de 1989 foi criada para combater preconceitos e discriminações de raça, cor, etnia, religião e procedência nacional. Em observância à data da promulgação desta lei e da Constituição, pode-se dizer que a regulamentação do crime previsto nesse inciso é posterior à sua menção. A fiança é um instituto que permite ao acusado responder ao processo em liberdade, mediante pagamento de quantia certa, por ordem constitucional. O crime de racismo não permitirá a ocorrência deste instituto. A prescrição delimita a ação do Estado por um período de tempo, ou seja, o Estado deve agir dentro do prazo determinado por lei. Caso seja omisso, ocorre a prescrição. O crime imprescritível é aquele em que a lei não estabeleceu prazo para a ação estatal, o que significa que o Estado pode demorar a agir e, quando o fizer, estará garantido pelo direito, não perderá jamais o poder de punir. XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem; É possível afirmar, a partir desse inciso, que crimes hediondos (homicídio qualificado; latrocínio; extorsão mediante sequestro e na forma qualificada; extorsão qualificada pela morte; estupro; epidemia com resultado morte; falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produtos destinados a fins terapêuticos ou medicinais; genocídio) e os crimes equiparados a hediondos (tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e terrorismo), não permitem ao acusado o instituto da fiança (que permite responder ao processo em liberdade, mediante pagamento de quantia certa), impossibilitando ainda ao condenado o instituto da graça (que avalia condição pessoal daquele que cumpre pena – exemplo: o comportamento) e da anistia (que avalia pressuposto objetivo – exemplo: o tempo de condenação). XLIV - constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático;

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Entende-se por “ação de grupos armados, civis ou militares, contra ordem constitucional e o Estado Democrático”, o golpe de estado, a tomada do poder, de forma a contrariar a democracia, as leis e as disposições estabelecidas. Esse ato é considerado crime e não permite ao acusado o pagamento de fiança e permite ao Estado punir e sancionar esse fato sem que haja tempo determinado. O crime é imprescritível. XLV - nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido; Incide, nesse inciso, a individualização da pena ou a responsabilidade pessoal, que significa que aquele que cometeu o crime é o único responsável por cumprir a punição estatal e se redimir perante a sociedade, no que tange ao cumprimento de pena aplicada, ou seja, a execução da pena determinada pelo Poder Judiciário, independentemente de ser de multa restritiva de direito, ou privativa de liberdade, será cumprida exclusivamente por quem de fato cometeu o crime. A sentença penal pode gerar efeitos civis, o que significa dizer que a vítima ou seu cônjuge, ascendente, descendente ou irmão podem requerer indenização por reparação dos danos sofridos e, caso advenha condenação em âmbito cível, o agente do ato criminoso deve realizar o pagamento. Quando o agente vem a falecer, sem cumprir essa condenação cível, os herdeiros devem realizar o pagamento com o montante da herança recebida, respeitando esse valor, ou seja, nenhum herdeiro pode ter seu patrimônio atingido. As dívidas são pagas com o patrimônio deixado pelo responsável. XLVI – a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: a) privação ou restrição da liberdade; b) perda de bens; c) multa; d) prestação social alternativa; e) suspensão ou interdição de direitos Estabelecem-se, nesse inciso, as penas adotadas pelo direito brasileiro, permitindo que sejam aplicadas penas diversas às previstas, desde que respeitadas as proibições presentes nesta Constituição. As penas descritas nesse inciso são: • Privação: é a perda total do direito à liberdade. • Restrição: é a perda parcial do direito à liberdade. O direito à liberdade é restringido, diminuído, há um cerceamento a esse direito. • Perda de bens: o Estado retira da propriedade do acusado bens para que, assim, repare os danos causados. • Multa: é a imposição de pagamento pecuniário (dinheiro), com valor determinado pelo Judiciário, respeitando os limites legais estabelecidos. • Prestação Social Alternativa: o acusado é condenado a fazer algo em benefício da sociedade, para que assim repare seu erro. Exemplo: é possível que seja estabelecido ao condenado que pinte as paredes de determinada creche, realize trabalhos no setor administrativo etc. • Suspensão de direito: o condenado passa a ter determinados direitos suspensos, por exemplo, aquele que atropelou e matou um pedestre, em virtude de dirigir em alta velocidade, embriagado, pode ser condenado pelo homicídio e ter o direito de dirigir suspenso. A pena deve ser individualizada, respeitando as características pessoais de cada agente e não ultrapassando o autor do delito. XLVII – não haverá penas: a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84 XIX; b) de caráter perpétuo; c) de trabalhos forçados; d) de banimento; e) cruéis.

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As penas previstas, nesse inciso, são tratadas pelo ordenamento jurídico brasileiro como inconstitucionais, proibidas e vedadas pela Constituição Federal de 1988. A única exceção apresentada a esse rol de penas proibidas é a pena de morte, quando o Brasil estiver oficialmente em guerra. A pena de banimento significa condenar o acusado brasileiro a viver fora do seu país, ou seja, determinar que, em virtude do crime cometido, o acusado terá que viver fora do Brasil. As penas cruéis ainda dependem de regulamentação no ordenamento jurídico brasileiro. XLVIII - a pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado; Ao proferir a sentença, o juiz deve avaliar as características pessoais do acusado e, no momento de cumprir a pena imposta, tais características devem ser avaliadas. O condenado deve ser respeitado na medida de suas condições, determina a lei, que sejam separados homens e mulheres, que aqueles que praticaram crimes distintos não convivam e que seja respeitada a idade dos sentenciados. XLIX - é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral; A condenação penal por si só não retira do condenado o direito à dignidade e os demais. Estes direitos são conservados, sendo retirados apenas o direito à liberdade. Com isso, o Estado não está autorizado a dispensar tratamento violento e desumano àqueles que estão presos, independentemente de serem provisórios ou não. L - às presidiárias serão asseguradas condições para que possam permanecer com seus filhos durante o período de amamentação; As presidiárias têm garantido, constitucionalmente, o direito de permanecerem com seus filhos pelo período de amamentação. Assim, as crianças não são prejudicadas no início de suas vidas. Cabe ao Estado proporcionar as condições necessárias para que esse direito seja garantido às gestantes. LI - nenhum brasileiro será extraditado, salvo o naturalizado, em caso de crime comum, praticado antes da naturalização, ou de comprovado envolvimento em tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, na forma da lei; O instituto da extradição compreende a transferência de uma pessoa a outro país em razão de cometimento de um delito. A transferência da pessoa é um ato de soberania estatal, em que o Estado autoriza, se quiser, levando em consideração os tratados de extradições ou de compromissos de reciprocidade existentes. A Constituição veda a extradição de brasileiro nato. Caso esse brasileiro cometa crime em outro país e a conduta praticada seja crime no território brasileiro, cabe ao Brasil processar, julgar e, em caso de condenação, permitir o cumprimento de sua pena. A possibilidade de julgamento de crime cometido fora do território brasileiro com base nas leis brasileiras só ocorre se o agente não for preso ou julgado no local do crime.

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A naturalização de estrangeiro ocorre a pedido do mesmo, tornando-se brasileiro naturalizado. O brasileiro naturalizado, conforme esse inciso será extraditado nas seguintes situações: • Através da prática de crime considerado, pelo Brasil, como crime comum antes de ser naturalizado; • Através de comprovada prática de envolvimento com o tráfico ilícito de drogas. Nesse caso, não é levado em consideração se a naturalização ocorreu antes ou depois da prática do ato criminoso. A extradição ocorre após o cumprimento de pena em território brasileiro, imposta por esta Nação. LII - não será concedida extradição de estrangeiro por crime político ou de opinião; O Brasil pode, após decisão soberana de o Supremo Tribunal Federal, extraditar estrangeiro que esteja em seu território. Para tanto, cabe avaliar se o suposto crime cometido no País que solicita a transferência do estrangeiro do território brasileiro é considerado crime de opinião ou político pela legislação vigente no Brasil. Em caso positivo, o estrangeiro será protegido pelo asilo político. “Artigo. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios: X - concessão de asilo político.” Ressalta-se que não há, no Brasil, legislação específica delimitando quais são os crimes políticos. Nesse caso, cabe ao Supremo Tribunal Federal avaliar cada caso e julgar o caráter político do fato. LIII - ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente; As autoridades judiciárias precisam ser competentes para julgar determinada causa. Isto traduz o princípio do juiz natural. A competência deve ser analisada em razão do fato, da pessoa, do local do crime. Caso não sejam observados os requisitos da competência, é possível requerer a nulidade do processo. Assim, não é possível que juiz estadual julgue crime federal, que juiz do Rio Grande do Sul julgue causa do Maranhão etc. LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal; • O princípio do devido processo legal determina que os juízes, ao julgarem as causas, observem e respeitem os direitos das partes, agindo de forma imparcial e igualitária com as partes envolvidas (exemplo: a parte pode arrolar testemunhas e o juiz proíbe). LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes; Dá a oportunidade das partes envolvidas no processo de se manifestarem em todos os atos processuais, bem como a possibilidade de responderem e de produzirem provas adequadas à demonstração do direito que alegam. LVI - são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos; A prova é algo fundamental ao processo, pois é capaz de convencer o responsável pelo julgamento a adotar determinada posição, ir a favor ou desfavor do autor ou do réu. O direito à utilização das provas, sejam elas testemunhais, periciais ou documentais, constitui desdobramento do princípio do contraditório. A prova ilícita é aquela adquirida de forma contrária às disposições determinadas pelo Direito, por meio de violações legais, sendo considerada, portanto, inexistentes.

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Como a prova é considerada inexistente, os atos gerados, a partir de sua utilização, são também assim considerados e devem ser nulos. As provas derivadas da prova ilícita são também consideradas nulas e inexistentes ao processo (teoria dos frutos da árvore envenenada) LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória; Rege o ordenamento jurídico brasileiro a presunção da inocência. Assim, uma pessoa só pode ser julgada culpada após sentença condenatória transitada em julgado, ou seja, sentença em que não há possibilidade de recurso, de ser modificada. Em virtude disso, o réu é chamado de acusado durante as investigações e o trâmite processual e não de condenado, uma vez que até a sentença final (transitada em julgado) o mesmo, pelo princípio da não culpabilidade, é considerado inocente. LVIII - o civilmente identificado não será submetido à identificação criminal, salvo nas hipóteses previstas em lei; Identificação civil é aquela em que qualquer documento civil comprove que a pessoa é quem diz ser. Temos como exemplo a identidade, expedida por órgão competente, o passaporte etc. A identificação criminal é aquela realizada por meio da análise das impressões digitais, colhidas em papel. Esse procedimento é denominado de dactiloscópica. Alguns doutrinadores entendem que a fotografia policial é um tipo de identificação criminal. Esse inciso garante que a pessoa identificada civilmente, por meio de documento hábil, não se submeterá à identificação criminal. A autoridade policial poderá exigir a identificação penal quando a identificação civil não for apresentada ou quando for falsa. LIX - será admitida ação privada nos crimes de ação pública, se esta não for intentada no prazo legal; O ordenamento jurídico brasileiro traz três tipos de ações, a ação incondicionada, a condicionada e a privada, sendo as duas primeiras de competência do promotor de justiça ou do procurador da república, a ser determinada pelo crime cometido, e o terceiro tipo sendo de responsabilidade da vítima ou de seus representantes legais. Em regra, os crimes descritos no Código Penal são de ação pública incondicionada. Outro tipo penal será admitido somente quando estiver expressamente no texto legal. Nos casos em que a ação for pública, ou seja, de competência do promotor ou procurador e estes se mantiverem inertes, a vítima ou seus representantes legais, poderão ajuizar ação privada subsidiária da pública. LX - a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem; Tendo em vista os o artigo 5º, LX e o artigo 93, IX, os atos processuais, as audiências, julgamentos (...) serão sempre públicos, permitindo, assim, que qualquer pessoa do povo os presencie, conforme assevera o princípio da publicidade. Apesar do princípio da publicidade, existe a possibilidade de alguns processos tramitarem em segredo de justiça. O sigilo é permitido quando a intimidade das partes ou o interesse social exigirem a participação apenas das partes e seus advogados. Normalmente, o sigilo ocorre nas questões de divórcio, investigação de paternidade, separação judicial e alimentos.

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LXI - ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei; Importante destacar a esfera militar, que obedecem às regras do Código Penal Militar, que não sofrem influência das regras gerais destinadas aos civis. Nos casos de transgressão militar ou de crimes propriamente militar, é possível a prisão sem que seja em flagrante ou por ordem escrita e fundamentada. LXII - a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente e à família do preso ou à pessoa por ele indicada; A prisão deve ser comunicada à autoridade judicial, para que esta possa avaliar se os requisitos foram cumpridos, tornando assim a prisão um ato legal. É necessária ainda a comunicação à família ou à pessoa diversa indicada por aquele que foi preso. Essas comunicações devem conter o fato que motivou a prisão e o local em que este se encontra recluso, permitindo assim, que as pessoas avisadas verifiquem o estado psíquico e físico daquele que foi preso. LXIII - o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado; No momento da prisão, o preso será informado pela autoridade policial de todos os seus direitos, inclusive o de permanecer calado, reservando-se ao direito de falar somente em juízo, o da não obrigatoriedade de prestar provas contra si mesmo, além de alguns direitos fundamentais como a dignidade, a integridade física etc. LXIV - o preso tem direito à identificação dos responsáveis por sua prisão ou por seu interrogatório policial; A autoridade policial que realizar a prisão ou o interrogatório deverá identificar-se, para que o mesmo evite cometer excessos em seus atos, podendo ser responsabilizado por esses excessos, sendo processado por abuso de autoridade. LXV - a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária; A prisão ilegal é aquela que não respeita os requisitos necessários dispostos nas legislações vigentes e na própria Constituição, tais como a obrigatoriedade da ordem judicial ser escrita e fundamentada ou da prisão ser em flagrante delito. O preso deverá ser liberado, tendo sua prisão relaxada em nome dessa ilegalidade. LXVI - ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança; Aquele que estiver preso será liberado, quando a lei permitir a fiança (pagamento de quantia certa) ou a liberdade provisória (requisitos expressos no Código de Processo Penal), para que responda o processo em liberdade até que seja decretada prisão preventiva, temporária ou até a sentença penal condenatória. LXVII - não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel; Esse inciso aborda a prisão civil que é diferente da prisão penal, por não possuir caráter punitivo. Essa prisão possui natureza coercitiva, ou seja, a pessoa tem sua liberdade privada, para que seja compelida a cumprir a obrigação que não fez.

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A regra constitucional é de que ninguém será preso civilmente por dívida, mas esta regra admitia duas exceções. São elas: • A prisão civil daquele que, podendo, decide não pagar a pensão alimentícia. • A prisão civil do depositário infiel, que é aquele que recebe algo para guardar (para particular ou para a Justiça) e, no momento de devolver os bens, não os tem e não possui justificativa hábil. Atualmente, conforme Súmula 419 do Superior Tribunal de Justiça, o depositário infiel não pode ser preso civilmente.

Súmula 419/STJ: “Descabe a prisão civil do depositário judicial infiel”.

Admite-se, assim, apenas a exceção daquele que escolhe não pagar a pensão alimentícia, situação em que ficará preso até que pague a dívida ou volte a pagar a pensão. Essa prisão é requerida por quem recebia a pensão. LXVIII - conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder; O Habeas Corpus surgiu na Inglaterra, na Magna Carta editada pelo Rei João Sem Terra em 1215. É uma ação que tem por objeto disciplinar a liberdade física de locomoção do indivíduo. O Habeas Corpus pode ser impetrado por qualquer pessoa (brasileiro, estrangeiro, com ou sem capacidade civil etc.) em seu benefício, ou em benefício de terceiros, independentemente de advogado, contra ato de qualquer pessoa (particular ou autoridade pública), que esteja coagindo a liberdade de locomoção. “Artigo. 654. CPP - O habeas corpus poderá ser impetrado por qualquer pessoa, em seu favor ou de outrem, bem como pelo Ministério Público.” LXIX - conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público; O mandado de Segurança objetiva a proteção dos direitos líquidos e certos de uma pessoa. Pode ser utilizado por pessoa física, jurídica, privada ou pública ou ainda por qualquer entidade que detenha capacidade processual, desde que comprovada a titularidade de direito líquido e certo (quando é possível demonstrar a titularidade do direito por aquele que pretende impetrar o mandado de segurança). LXX - o mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por: a) partido político com representação no Congresso Nacional; b) organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros ou associados; Possui os mesmos pressupostos do Mandado de Segurança estudado no inciso anterior. A diferença é que, no mandado de segurança acima, o impetrante era o titular do direito violado, enquanto no mandado coletivo, o impetrante não é o dono do direito líquido e certo. LXXI - conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania; Em algumas passagens da Constituição, o legislador determinou que houvesse a criação de leis específicas capazes de regulamentar o assunto abordado

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por esta Carta Constitucional. Assim, alguns direitos estão condicionados à criação dessas leis e nem todas as leis foram criadas. Com essa situação, algumas garantias previstas na Constituição não têm aplicabilidade. Assim, surge o instrumento do mandado de injunção que permite ao interessado recorrer ao judiciário, para que o mesmo avalie o caso concreto e determine condições que permitam o exercício do direito previsto na Constituição. LXXII - conceder-se-á habeas data: a) para assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de registros ou bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter público; b) para a retificação de dados, quando não se prefira fazê-lo por processo sigiloso, judicial ou administrativo; É ação adequada para que o impetrante obtenha informações a seu respeito constante em bancos de dados oficiais ou públicos, possibilitando ao mesmo o direito de retificação dos dados. Assim, pode-se dizer que o Habeas Data possui duas funções, seja a de conhecimento daquilo que está nos bancos de dados, seja a de retificação. É importante afirmar que só tem legitimidade para atuar como impetrante aquele que deseja obter informações a seu respeito (podendo ser pessoa física ou jurídica), não sendo possível o impetrante requerer informações de terceiros. LXXIII - qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência; A Constituição de 1988 permite a ação popular civil, o poder emana do povo e, quando houver ato lesivo ao patrimônio público, surgirá o direito do cidadão de protegê-lo. O legislador teve como objetivo, ao constituir a ação popular, anular ato que decorra lesão a bem protegido, qual seja o patrimônio público. São sujeitos ativos para proporem a ação popular aqueles brasileiros que detenham direitos políticos, de capacidade eleitoral ativa e o poder de votar. “Súmula 365/STF: Pessoa jurídica não tem legitimidade para propor ação popular.” LXXIV - o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos; Para que esse direito seja efetivo, criou-se a Defensoria Pública, prevista no artigo 134 da Constituição, que visa a garantir a assistência jurídica integral a quem não possua recursos. “Artigo. 134. A Defensoria Pública é instituição essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos necessitados, na forma do art. 5º, LXXIV.” Os doutrinadores entendem que “insuficiência de recurso” não significa apenas situação de miserabilidade, mas sim aqueles que, apesar de possuírem recursos para seu sustento, não podem dispensar verba orçamentária para trabalho advocatício. LXXV - o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença;

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O Estado pode ser compelido a pagar indenização por danos a pessoas que se afetarem em função de seus erros. As situações previstas pela Constituição abrangem a condenação por erro judiciário (ocorre quando uma pessoa é presa no lugar de outra), e a prisão além do tempo determinado pela sentença penal condenatória transitada em julgado. LXXVI – são gratuitos para os reconhecidamente pobres, na forma da lei: a) o registro civil de nascimento; b) a certidão de óbito; Nesse inciso, o Estado se obriga a emitir, gratuitamente, para aqueles que sejam reconhecidamente pobres, a certidão de nascimento e a certidão de óbito. O reconhecidamente pobre não possui renda suficiente para o seu sustento e o sustento de sua família. LXXVII - são gratuitas as ações de habeas corpus e habeas data, e, na forma da lei, os atos necessários ao exercício da cidadania. O Poder Judiciário, por meio desse inciso, fica proibido de cobrar custas judiciais das ações referentes à Habeas Corpus ou Habeas Data. Tal vedação não é estendida ao advogado escolhido para impetrar a ação. Os atos necessários à cidadania se resumem à emissão de carteira de identidade, de trabalho, de título de eleitor e ao ato de votar, que não podem ser cobrados dos cidadãos. LXXVIII- a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação. § 1º - As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata. § 2º - Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte. § 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais. § 4º O Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha manifestado adesão.

7. DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE “Internacionalizemos as crianças tratando-as, todas elas, não importando o país onde nasceram, como patrimônio que merece cuidado e respeito do mundo inteiro (…). Quando os dirigentes tratarem as crianças pobres do mundo como um patrimônio da Humanidade, eles não deixarão que elas trabalhem quando deveriam estudar, que morram quando deveriam viver” (Cristóvão Buarque) 7.1 A ONU e a Criança As guerras mundiais trouxeram grandes devastações para a humanidade. Mulheres, crianças e idosos eram torturados, trabalhavam nos campos de concentração e, por fraqueza, fragilidade ou até mesmo por inexperiência eram alvos fáceis. As crianças, certamente, cresceriam, seriam soldados em potencial e, para isso, era necessário o treinamento que ocorria direto no campo de combate. Assim, aquele que sobrevivia ganhava destaque e se transformaria em um excelente soldado. Acontece que isso era algo raro. O tempo passava, a guerra aumentava e as crianças morriam. Com o fim da II Guerra Mundial, com os pensamentos voltados à paz, à segurança e aos direitos humanos, a ONU criou uma agência especializada para amenizar o sofrimento e modificar o cenário das crianças sobreviventes, a UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a Infância). 52


Em 1953, esta agência tornou-se permanente, com o intuito de salvaguardar as crianças que viviam em condições miseráveis, sobretudo nos países em desenvolvimento. O objetivo final da ONU e da UNICEF é garantir a sobrevivência, a proteção e o desenvolvimento das crianças e dos adolescentes. Todo o trabalho da UNICEF é baseado pela Convenção sobre os Direitos da Criança e em conjunto com a OIT (Organização Internacional do Trabalho), que busca abolir o trabalho infantil; da UNESCO (Organização para a Educação, Ciência e Cultura), que cuida da educação; com a PAM (Programa Mundial de Alimentos) e com a OMS (Organização Mundial da Saúde), que cuida da erradicação das doenças. As necessidades e os direitos das crianças estão presentes nas metas do Milênio ou Objetivos de Desenvolvimento do Milênio e nos planos das Conferências das Nações Unidas. “O recrutamento forçado e o uso de crianças como soldados é um dos mais assustadores abusos aos direitos humanos no mundo de hoje. Milhares de crianças estão sendo exploradas. Todos os dias, elas são forçadas a suportar e a provocar violência, algo que nenhuma criança deve experimentar. Isto é inaceitável! O recrutamento e o uso de crianças em guerras é uma violação ao direito internacional. Também é uma violação aos nossos mais básicos padrões de decência humana.” Secretário Geral, Ban Ki-moon Nova York (EUA), 12 de fevereiro de 2009

7.2 Da Criança e do Adolescente no Brasil O movimento de redemocratização política que antecedeu a promulgação da Constituição da República de 1988, tendo como premissa o Estado Democrático de Direito, teve como especial atenção o compromisso nacional com a política de atenção à criança e ao adolescente. Nesse sentido, a CR/88 consagrou a Doutrina da Proteção Integral, compartilhando com o Estado, com a sociedade e com a família, o dever de assegurar o desenvolvimento integral a toda criança e ao adolescente. A referida doutrina se contrapõe à Doutrina da Situação Irregular ao reconhecer a condição de sujeitos de direitos às crianças e aos adolescentes A Doutrina da Proteção Integral tem como fundamento a Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948, a Declaração dos Direitos da Criança de 1959 e a Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança, de 1989. Em 1990, foi promulgado o Estatuto da Criança e do Adolescente, lei 8069/90, cuja elaboração contou com ampla participação popular. O ECA adotou, integralmente, a Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança. Segundo esse Estatuto, considera-se criança a pessoa até doze anos de idade incompletos, e o adolescente entre doze e dezoito anos de idade. O ECA, em consonância com a CR/88, rompeu com a doutrina da situação irregular, vigente desde 1927, que dispensava igual tratamento às crianças e aos adolescentes vítimas de abandono, de exploração, de violência, e aquelas a quem se atribuía a autoria de atos infracionais e, como a Constituição, adotou a Doutrina da Proteção Integral que reconhece a criança e o adolescente como sujeitos de direitos. O Estatuto se divide em 2 livros: o primeiro trata da proteção dos direitos fundamentais à pessoa em desenvolvimento; e o segundo trata dos órgãos e procedimentos protetivos. Segundo o ECA, a criança e o adolescente são destinatários de prioridade absoluta, o que compreende a primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias, a precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública, a preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas e a destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude. 53


7.3 Direitos Fundamentais das Crianças e dos Adolescentes • Direito à vida e à saúde (artigos 7 ao 14 ) As políticas sociais públicas devem garantir o nascimento e o desenvolvimento sadio em condições de dignidade. As mães possuem atendimento pré e perinatal durante a gestação. Após o nascimento, os filhos detêm atendimento integral à saúde por meio do Sistema Único de Saúde (SUS), onde deverão ser vacinados nos casos recomendados pelas autoridades. O SUS deve promover programas de assistência médica e odontológica para a prevenção de enfermidades e de orientações de educação sanitária aos pais, educadores e alunos. • Direito à liberdade, ao respeito e à dignidade (artigos 15 ao 18) Devem-se respeitar os direitos acima expressos das crianças e dos adolescentes como pessoas que são, ou seja, pessoas em desenvolvimento, portadoras de direitos civis e protegidos, acima de tudo, pela Constituição Federal de 1988. Assim como os adultos, as crianças podem ir e vir, se expressarem, possuírem crenças, buscarem orientações e refúgio e terem o direito de brincar, se divertirem e praticarem esportes. Todos devem zelar pelos direitos das crianças. • Direito à convivência familiar e comunitária (artigos 19 a 52D) As crianças e os adolescentes têm o direito de se desenvolverem e de serem educadas em seu seio familiar. Excepcionalmente serão “auxiliados” por família substituta, que se responsabilizará pela manutenção de todos os seus direitos. Os filhos serão iguais entre eles, independentemente de serem adotados ou de terem sido concebidos na constância do casamento. Os deveres e cuidados prestados aos filhos, bem como as responsabilidades por sustento, educação, lazer, saúde etc. serão exercidos, de forma igualitária, pelos pais. Assim, pode-se dizer que o poder familiar deve ser exercido pelo pai e pela mãe em isonomia. A perda do poder familiar ou a suspensão deste deverá ser motivada por ordem judicial, respeitando o contraditório e a ampla defesa dos pais. • Direito à educação, à cultura, ao esporte e ao lazer (artigos 53 a 59) Tais direitos são exigidos para a garantia do desenvolvimento pessoal, para o preparo do exercício da cidadania e para a qualificação para o trabalho. O Estado, portanto, deve assegurar o ensino médio e fundamental, o atendimento educacional aos portadores de deficiência, as creches e préescola, enquanto os pais têm a obrigatoriedade em matricular seus filhos nas escolas. • Direito à profissionalização e à proteção no trabalho (artigos 60 a 69) Os menores de 14 (catorze) anos só podem trabalhar na condição de aprendizes, sendo regulado por lei o trabalho dos adolescentes. Aqueles que desejam a formação técnica profissional deverão respeitar a obrigatoriedade de acesso e frequência no ensino regular bem como exercer atividade compatível ao desenvolvimento do adolescente. • Direitos individuais (artigos 106 a 109) As garantias individuais estão diretamente ligadas à prática de ato infracional. Assim, determina a lei que nenhum adolescente terá sua liberdade privada, salvo em flagrante de ato infracional ou por ordem judicial escrita e fundamentada. A internação anterior à sentença tem prazo máximo de 45 (quarenta e cinco dias).

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• Da Política de Proteção O Estatuto da Criança e do Adolescente definiu a política de proteção a partir de dois eixos de intervenção: o primeiro diz respeito às medidas protetivas, reservadas às crianças em situação de risco pessoal e social; o segundo diz respeito às medidas socioeducativas, destinadas a situações de prática de atos infracionais. • Das Medidas Protetivas O artigo 98 do ECA estabelece que as medidas de proteção serão aplicadas sempre que houver violação dos direitos estabelecidos no próprio ECA por “ação ou omissão da sociedade ou do Estado”, ou “por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável”. Sendo as seguintes: ▪▪O encaminhamento aos pais ou responsável: é uma medida adequada àquelas hipóteses nas quais não ocorre maior gravidade. Um bom exemplo seria o caso de uma fuga da criança ou do adolescente. ▪▪A matrícula e a frequência obrigatórias: estão diretamente ligadas à evasão e à infrequência escolar. Normalmente, está relacionada ao trabalho infantil e à omissão dos pais. A infrequência escolar diz respeito às faltas injustificadas e reiteradas à escola. ▪▪A inclusão em programas sociais e de auxílio: violações dos direitos das crianças e adolescentes resultam de situação econômico-financeiras de dificuldade. ▪▪Os incisos V e VI do artigo 101: tratam de hipóteses nas quais estão envolvidas, direta ou indiretamente, questões de saúde, ou de dependência química ou psíquica a drogas e álcool, que não deixam de ser problemas de saúde. ▪▪A colocação em abrigo ou entidade: é medida que se pauta pelo vetor da excepcionalidade e da brevidade. Reservada para situações extremas, quando a permanência da criança em um determinado ambiente familiar lhe seja visivelmente mais prejudicial. Ex.: crianças vítima de abuso sexual. ▪▪A colocação em família substituta: é medida extrema, condicionada à constatação de situações de especial gravidade, e, segundo o artigo 28 do ECA, “far-se-á mediante guarda, tutela ou adoção”. 7.4 Das Medidas Socioeducativas Segundo o ECA, o adolescente que comete atos infracionais deve ser responsabilizado e sofrer a aplicação das medidas socioeducativas previstas como forma de garantir a socialização e a integração desse jovem à sociedade, sem que volte a cometer novas infrações. Para tanto, o Estatuto da Criança e do Adolescente fez a previsão das seguintes medidas socioeducativas: Advertência: é a primeira medida elencada pelo Estatuto, sendo reservada aos casos de menor gravidade, cometidos sem violência ou grave ameaça. Obrigação de reparar o dano destina-se a adolescentes que praticaram atos infracionais com reflexos patrimoniais. Deve-se sempre avaliar a possibilidade de o adolescente cumprir a medida as suas expensas. A prestação de serviços à comunidade consiste na realização de tarefas gratuitas de interesse geral, por período não excedente a seis meses, junto a entidades assistenciais, hospitais, escolas e outros estabelecimentos congêneres, bem como em programas comunitários ou governamentais. A liberdade assistida, via de regra, é reservada aos casos residuais, mais adequadas em situações em que, sendo grave ou não o ato cometido, o adolescente seja capaz de compreender o caráter ilícito do ato e se proponha a receber acompanhamento. A semiliberdade pode ser aplicada como regime de transição posteriormente a uma internação (considerada como um benefício), ou como medida autônoma. É necessário que o adolescente exerça atividades externas, tais como escolarização e profissionalização.

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A internação é uma medida cuja aplicação se orienta pela excepcionalidade e brevidade. É reservada para os casos de maior gravidade. O período de execução da medida pode ser de, no mínimo, seis meses até três anos. 7.5 Do Abuso Sexual Infanto Juvenil A Constituição da República de 1988, ao consagrar a doutrina da proteção integral estabeleceu o dever da família, da sociedade e do Estado de colocar toda criança e adolescente a salvo de qualquer forma de exploração, negligência, violência, crueldade e opressão. Art. 227 A materialização dos princípios da prioridade absoluta e da proteção integral dos direitos da criança e do adolescente pressupõe, portanto, que a comunicação, em caso de abuso sexual infantil, é dever de qualquer pessoal que é testemunha ou tome conhecimento de qualquer situação de violação dos direitos de crianças e adolescentes, como forma de conscientização social e responsabilidade coletiva Essa comunicação pode ser realizada de várias maneiras, admitindo-se inclusive a forma anônima. São vários os serviços de proteção aos quais pode ser dirigida uma denúncia de abuso sexual: Conselho Tutelar, Disque Denúncia- Dique 100, Delegacias Especializadas, Ministério Público e Poder Judiciário. Disque 100 é um serviço de recebimento, encaminhamento e monitoramento de denúncias de violência contra crianças e adolescentes, criado pelo Programa Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual contra Crianças como resposta às demandas do Plano Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual Infanto-Juvenil. O Código Penal Brasileiro de 1940 sofreu alterações em decorrência da lei 12.015 de 07 de agosto de 2009, que visou à proteção daqueles considerados vulneráveis. Com o advento desta lei, os crimes até então tipificados como crimes contra os costumes, passaram a se chamar “crimes contra a Dignidade Sexual”, demonstrando, assim, a busca pela proteção da dignidade da pessoa, garantia constitucional, prevista no artigo 1o, inciso III da Constituição Federal de 1988. A Constituição da República determina que o abuso, a violência e a exploração sexual da criança e do adolescente sejam punidos de forma severa. Diante disso, a reserva de um capítulo específico aos crimes contra os vulneráveis é um reflexo de tal orientação constitucional, objetivando a proteção da intangibilidade sexual de um grupo de pessoas, os vulneráveis, em virtude de suas fragilidades, punindo, no entanto, apenas a sexualidade exercida com coerção ou explorada de forma abusiva. Entende-se por vulneráveis os menores de 18 anos à época da conduta delitiva; aqueles que, por enfermidade ou deficiência mental, não possuem discernimento para a prática dos atos sexuais ou que não possam oferecer resistência a tais atos. Ressalta-se que, em alguns dispositivos, a lei conferiu tratamento diferenciado ao menor de 14 anos, por entender que o maior de 14 anos e menor de 18, apesar da vulnerabilidade, possui alguma liberdade sexual. Assim, pune-se com mais rigor os crimes cometidos contra os menores de 14 anos. A doutrina atenta para a equiparação legal de vulnerável, que é aquele que por qualquer causa, não é capaz de oferecer resistência. Se o grau de resistência do ofendido for nulo, estamos diante do crime previsto no artigo 217-A, qual seja, estupro de vulnerável. Se for reduzida, o crime será contra a liberdade sexual, previsto no artigo 215 do Código Penal, violação sexual mediante fraude. Essa lei causou grandes mudanças no mundo penalista: a ação passou a ser incondicionada. O Ministério Público é o responsável por oferecer denúncia, quando toma conhecimento dos fatos, não mais dependendo de representação por parte da vítima ou do cônjuge, ascendentes, descendentes e irmão. 7.6 Dos meios de acesso e proteção da Criança e do Adolescente O Conselho Tutelar tem como missão zelar pelo cumprimento dos direitos das crianças e dos adolescentes. Os Conselhos Tutelares são órgãos autônomos, permanentes e não jurisdicionais. 56


Suas tarefas possuem caráter administrativo vinculado ao Poder Executivo Municipal e não ao Judiciário. Não é possível que esse Conselho realize julgamento de interesses. O ECA ainda dispõe que toda criança e adolescente terá acesso à Defensoria Pública, ao Ministério Público e ao Poder Judiciário, por qualquer de seus órgãos. Os Estados e o Distrito Federal poderão criar Varas especializadas e exclusivas para a infância e a juventude. As crianças e os adolescentes podem buscar apoio nas delegacias especializadas existentes nos Estados brasileiros.

8. SEGURANÇA PÚBLICA E DIREITOS HUMANOS “[...] Comenta-se que ninguém de fato conhece uma nação até que se veja numa de suas prisões[...]” Nelson Mandela. Durante a Ditadura Militar, Segurança Pública e Direitos Humanos eram considerados conceitos antagônicos. Naquela época, Segurança Pública representava apenas repressão à criminalidade pelo Poder Público; enquanto Direitos Humanos seriam o ‘abuso’ de direitos individuais destinados a ‘proteger’ aqueles em conflito com a lei. O governo ditatorial militar basicamente tomou por si o papel de acusador, julgador e executor, exercendo um verdadeiro tribunal de exceção, em que se admitia a prisão para averiguação, as mais cruéis práticas de tortura e execuções sumárias. Com o final da Ditadura e o fortalecimento dos movimentos de Direitos Humanos, os conceitos, tanto deste, quanto de Segurança Pública, começaram a se aproximar da exatidão que merecem. Em meados dos anos de 1980, com o início do processo de democratização, o Brasil começa a ratificar os tratados internacionais de proteção de direitos humanos, passando assim a se inserir no cenário internacional de proteção a esses direitos. Nesse cenário, Direitos Humanos passaram a ser uma garantia do cidadão frente ao arbítrio do poder estatal. No Brasil da atualidade, a Segurança Pública figura entre as principais preocupações da população. A escalada de violência em praticamente todo território nacional tem alarmado e remodelado as atitudes e a forma de vida do povo brasileiro. A expressão Direitos Humanos ficou estigmatizada, reduzida apenas ao aspecto criminal. O fenômeno da criminalidade tem grande relação com a ausência da garantia dos direitos sociais básicos, tidos direitos de segunda geração. São os direitos previstos no artigo 6º da Constituição e compreendem educação, saúde, trabalho, previdência social, segurança, lazer, moradia, proteção à maternidade, à infância e assistência aos desamparados. São direitos de status positivos, pois permitem a exigência de uma atuação positiva do Estado, garantindo melhoria nas condições de existência. Portanto, é um grande equívoco acreditar que punições mais severas são a solução para o aumento do fenômeno da criminalidade. Reduziria este fenômeno à atuação do Estado no sentido de garantir maior acesso à educação, ao trabalho, às condições dignas de moradia... Exigem-se, por parte da população, a edição de leis mais severas para conter a criminalidade. Contudo, no Brasil, temos um sistema de justiça punitivo falido. Além disso, o sistema prisional brasileiro é marcado pela corrupção, pela superlotação e pela violência. O Brasil possui atualmente mais de 500 mil pessoas presas. É a terceira maior população prisional do mundo depois da China e dos EUA. Em casos de atos ilícitos, cuja pena seja a prisão, somente o direito à liberdade pode ser retirado – não o direito à integridade física, à vida, à dignidade, o direito à ampla defesa, de ser julgado por um tribunal previamente constituído como ocorre dentro de nossas prisões. Situações dessa natureza configuram uma exacerbação da pena. Na prática, um verdadeiro Tribunal de Exceção, não muito diferente do que ocorria durante a Ditadura Militar. 57


Quando admitimos o tribunal de exceção contra a pessoa presa, por meio da exacerbação de sua pena, também o admitimos e o legitimamos contra qualquer outro individuo. Em última instância, isto significa que estamos renunciando aos direitos e garantias historicamente conquistados. A maior repressão, a maior suspensão de direitos, a maior violação de garantias do indivíduo enquanto cidadão e ser humano não geram, sob hipótese nenhuma, maior segurança para a sociedade. Muito pelo contrário – sociedades em que as garantias fundamentais dos cidadãos não são respeitadas são onde há maior insegurança pública, pois, nesses sistemas, a punição é seletiva. O exemplo mais próximo dos brasileiros nos remete novamente ao período de ditadura militar, com o Ato Institucional Nº 5 (AI5) de 1968, que revogou os direitos fundamentais dos brasileiros ‘a bem da segurança nacional’. Com este ato, o governo ditatorial militar basicamente tomou por si o papel de acusador, julgador e executor. ▪▪É possível combater a criminalidade respeitando os direitos fundamentais de criminosos? Essa questão, que parece complexa, na verdade, não é. A punição de um indivíduo pelo ato ilícito que cometeu deve ter, por objetivo, a retribuição e a ressocialização, estimulando o indivíduo a não mais delinquir. Mas é possível punir, com rigor, sem ferir os direitos humanos? Sim, é perfeitamente possível. Temos, como exemplos, os sistemas protetivos de vários países, onde a garantia dos Direitos Humanos é o limite de atuação repressiva do Estado. Países como Inglaterra, França, Canadá, dentre outros, seguem perfeitamente esses moldes de manutenção severa dos direitos humanos, sem comprometer a segurança pública de seus cidadãos. Havendo a compreensão de que a punição deve ser ater a somente o que está previsto na legislação; de que o devido processo legal deve ser seguido à risca, de que, mesmo durante e após a punição, o cidadão infrator é e sempre será visto como um ser humano cujos direitos inerentes a essa existência são invioláveis, teremos um sistema de Segurança Pública eficaz que não atenta contra os Direitos Humanos, mas sim o preserva. ▪▪No Brasil, há exemplos de que Direitos Humanos e Segurança Pública não são expressões antagônicas? Na realidade brasileira, temos alguns exemplos dessa prática. Citaremos aqui a Associação de Proteção e Assistência aos Condenados – APAC. A APAC é uma associação civil sem fins lucrativos que desenvolveu uma metodologia de valorização humana na execução da pena. Em traços breves, a APAC administra presídios, utilizando sua metodologia, na maioria das vezes, sem a participação da polícia. Um presídio que não conta com força policial para manter sua segurança soa como uma ameaça à Segurança Pública. Mas, na prática, é o oposto. O sistema APAC parte da premissa que, na responsabilidade pela reabilitação do preso, a sociedade tem uma parcela grande a contribuir. No sistema prisional comum, essa parcela caberia unicamente ao Estado. Um equívoco que mostra seus efeitos nas rebeliões, nas fugas frequentes, no altíssimo índice de reincidência e em outros fatores. Assim, na APAC, a punição do preso está restrita àquilo que está previsto em sua sentença condenatória. Nenhum outro direito ou garantia é violado. A dignidade do homem, o respeito e a consideração por sua família, as garantias legais de acompanhamento processual, a comunicabilidade com familiares e o meio social – ainda que restrito – são todos amplamente defendidos. Conscientiza-se o preso de que deve pagar pelo que fez, mas pagar somente no montante que a lei indica e não mais – como é comum no sistema penitenciário comum. Os níveis de reincidência, de fuga e de evasão, de uso de entorpecentes e cometimento de outros crimes, enquanto encarcerados, são acentuadamente menores do que os níveis encontrados no sistema repressivo tradicional penitenciário. A título de exemplo, o nível de reincidência criminal (ou seja, o número de ex-presos que cometem novo delito) no sistema prisional administrado pelo Estado ultrapassa 85% no Brasil. Na APAC, em seus quase 40 anos de existência, esses níveis são pouco mais que 10%. Nunca houve rebelião num presídio administrado por uma APAC.

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São essas estatísticas que chamaram a atenção internacional sobre a metodologia, que hoje já é ‘exportada’ a vários países, como Irlanda, Estados Unidos, Chile, Costa Rica dentre outros. A metodologia APAC é reconhecida como uma das melhores experiências mundiais de promoção dos Direitos Humanos pela Prison Fellowship International - PFI, órgão consultivo da ONU para assuntos econômicos e sociais. No exemplo da APAC, temos a fiel garantia dos Direitos Humanos atuando pari passu com as metas de Segurança Pública, demonstrando assim a realidade positiva que se desdobra quando essa parceria – entre Direitos Humanos e Segurança Pública - é feita com seriedade harmônica. A APAC dá exemplo de que Segurança Pública e Direitos Humanos não são expressões antagônicas e que promover Direitos Humanos é também promover Segurança Pública. 8.1 A Onu e o Preso Existem algumas regras denominadas de mínimas para o tratamento dos presos, adotadas pelo Primeiro Congresso das Nações Unidas sobre Prevenção do Crime e tratamento dos delinquentes. Tais regras enfatizam a necessidade de efetiva fiscalização e de fiscalização independente e objetiva. Isto para evitar os abusos cometidos nas penitenciárias. A primeira parte desse documento trata das matérias referentes à administração dos estabelecimentos destinados ao cumprimento de pena; a segunda parte se refere aos presos, que serão divididos por classes (condenados e provisórios). As regras devem ser aplicadas, de forma igualitária, sem que haja distinção entre os presos, por cor, sexo, classe social, crime cometido etc. Dentre as regras administrativas, cita-se: • Para que alguém seja privado de sua liberdade, deve-lhe ser informado o motivo e deve haver ordem judicial. • O estabelecimento deve anotar hora e data da entrada dos presos, bem como separá-los por classes (condenados, provisórios, homens e mulheres). • Deve-se cuidar da higiene, das celas arejadas, com vestuários decentes e roupas de cama. • Deve-se fornecer alimentação com valor nutritivo suficiente para a manutenção da saúde e água potável, sempre que necessário. • É necessária a presença de um médico qualificado. • A disciplina deve ser rígida, sem desrespeitar os direitos humanos. • Devem-se construir bibliotecas para que os presos tenham acesso aos livros e ao conhecimento. • O direito à religião deve ser garantido e, quando o número de presos, em uma única religião, for considerável, deve-se “eleger” um representante. • Os funcionários serão escolhidos com cautela pela administração, buscando analisar o perfil para a prática das tarefas (...). Em relação aos direitos dos encarcerados cita-se: • O estabelecimento penal não pode gerar maior sofrimento do que ser privado da autodeterminação da liberdade, salvo por razões justificáveis de disciplina. • Para garantir a reinserção dos presos à sociedade, é necessário que lhes possibilitem meios educativos, que estimulem a moral, fornecendo-lhes assistências necessárias. • O tratamento dado aos presos deve ser individualizado. • Os presos devem ser tratados com respeito para o desenvolvimento do senso de responsabilidade. • O trabalho deve ser de acordo com as condições físicas e habilidades do preso, sendo vedado o trabalho penoso. • A educação deve ser garantida.

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Dos Direitos da pessoa presa O Estado, ao processar e julgar culpada uma pessoa, deve exercer o poder de sanção, ou seja, na grande maioria, o homem é privado de sua liberdade e passa a cumprir pena. Para o exercício desse poder, deve o Estado garantir os direitos fundamentais do homem, quais sejam saúde, educação, condições mínimas de sobrevivência, condições dignas (...) e, em virtude disso, deve manter os locais destinados ao cumprimento de pena em estado condizente com os estabelecidos pela Constituição Federal. Ressalta-se que, no momento da prisão, o Estado passa a ser o garantidor e o responsável por aquele cidadão e que, ao perder a liberdade, o preso não perde seus demais direitos e deve usar o tempo em que se encontra recluso para se reabilitar. O Estado deve fornecer ao preso assistência à saúde (medico, dentista, psicóloga, psiquiatra), religiosa (liberdade de culto, instrução), jurídica (defensor público), material (alimentação, vestuário, higiênica e habitacional) e social (assistência durante e após o cumprimento de pena). A Lei de Execuções Penais enumera, em seu artigo 41, os direitos dos presos. São eles: • Alimentação suficiente e vestuário; • atribuição de trabalho e sua remuneração; • previdência Social; • constituição de pecúlio; • proporcionalidade na distribuição do tempo para o trabalho, para o descanso e para a recreação; • exercício das atividades profissionais, intelectuais, artísticas e desportivas anteriores, desde que compatíveis com a execução da pena; • assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa; • proteção contra qualquer forma de sensacionalismo; • entrevista pessoal e reservada com o advogado; • visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias determinados; • chamamento nominal; • igualdade de tratamento salvo quanto às exigências da individualização da pena; • audiência especial com o diretor do estabelecimento; • representação e petição a qualquer autoridade, em defesa de direito; • contato com o mundo exterior por meio de correspondência escrita, da leitura e de outros meios de informação que não comprometam a moral e os bons costumes. • atestado de pena a cumprir, emitido anualmente, sob pena da responsabilidade da autoridade judiciária competente.

9. DO IDOSO 9.1 A ONU e o Idoso As pessoas mais velhas são vistas como contribuintes para o desenvolvimento das sociedades. Normalmente, essas pessoas participaram de grandes mudanças no mundo, viram as guerras, o surgimento da televisão, a invenção do telefone, o primeiro computador. De certa forma, participaram da evolução mundial e, por isso, a opinião destas deve ser sempre levada em consideração. Estudos indicam que o mundo está no centro de uma transição do processo demográfico o que ocasionará populações mais velhas em todos os lugares. À medida que as taxas de fertilidade diminuem, a proporção de pessoas com 60 anos ou mais deve duplicar e os maiores de 80 anos quadruplicará de 2007 a 2050.

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Em 1982, o envelhecimento das pessoas já chamava a atenção da ONU e, em virtude disso, a Assembleia Geral convocou a Assembleia Mundial sobre o Envelhecimento, que discutiu assuntos ligados à saúde, à habitação, à nutrição, à proteção (inclusive como consumidores), ao bem-estar social, à família, à segurança de renda e ao emprego, à educação etc. Em 1991, enumeraram 18 direitos em benefício do idoso e, em 1999, a Assembleia Geral da ONU declarou o Ano Internacional do Idoso. Curiosidade: O Princípio das Nações Unidas em favor das Pessoas Idosas enumerou 18 direitos que versavam sobre: • Independência; • cuidado; • dignidade; • participação; • autorrealização, dentre outros.

9.2 Do Idoso no Brasil Assim como a criança, as pessoas, ao envelhecerem, requerem cuidados especiais, tornam-se frágeis por perderem o total vigor que tinham na adolescência. Essas pessoas receberam atenção especial dos legisladores. O Brasil, em 1º de outubro de 2003, editou a Lei 10.741, que objetiva regular os direitos assegurados às pessoas de 60 (sessenta) anos ou mais. Curiosidade: A Organização Mundial de Saúde (OMS) classifica como idoso aquele maior de 65 (sessenta e cinco anos) nos países desenvolvidos e maiores de 60 (sessenta) anos nos países em desenvolvimento.

9.3 Dos Direitos do Idoso Além dos direitos fundamentais inerentes a todos os seres humanos, o idoso goza ainda de todos os meios, oportunidades e facilidades para a preservação de sua saúde mental, física, intelectual, social, espiritual. São direitos regulados pelo Estatuto do Idoso: • Direito à vida (artigos 8 ao 9) Sabe-se que o envelhecimento é algo natural, ocorre com o passar dos tempos e isto é um direito personalíssimo e que deve ser protegido. Assim, o Estado deve, através de políticas sociais, permitir o envelhecimento saudável e em condições dignas. • Direito à liberdade, ao respeito e à dignidade (artigo 10) É dever do Estado e da sociedade zelar pela dignidade e pela sobrevivência do idoso, devendo respeitar o direito de ir e vir, de se expressar, de opinar pela crença religiosa, de conviver e participar da comunidade e do seio familiar, de praticar esporte e ter lazer, garantindo assim sua liberdade. Além disso, deve-se respeitar e não violar ou atentar contra a integridade moral, intelectual, física ou psíquica do idoso. • Direito aos alimentos (artigo 11 a 14) O idoso e sua família devem criar condições para sua alimentação. Caso isto não seja possível, o Estado, através da assistência social, deve prover tal alimentação.

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• Direito à saúde (artigo 15 a 25) O Sistema Único de Saúde deve assegurar atenção integral ao idoso, permitindo-lhes acesso igualitário e universal, promovendo a prevenção, recuperação e proteção à saúde dos idosos. O idoso que necessitar de internação terá direito a acompanhante. • Direito à educação, cultura, esporte e lazer (artigos 20 a 28) O Poder Público deve adequar o acesso do idoso às escolas, permitindo a ele a educação. Para isso, fazem-se necessários materiais didáticos, metodologias e programas educacionais diferenciados, além de apoio à criação de universidades para idosos. As atividades culturais e de lazer serão proporcionadas mediante descontos de pelo menos 50%. • Direito à profissionalização e trabalho (artigos 26 a 28) Trabalhar e se profissionalizar é direito do idoso. Assim, devem ser respeitadas as condições físicas, psíquicas e intelectuais desta “classe”. Não é permitida qualquer discriminação ao idoso contratado em virtude de sua idade nem tampouco fixação de limite máximo de idade. Para que tal direito seja exercido, o Poder Público criará e estimulará programas de profissionalização especializada, preparará os trabalhadores para a aposentadoria, com antecedência mínima de 1 (um) ano e estimulará a contratação pelas empresas privadas. • Direito à previdência social (artigos 29 a 31) Para a concessão do benefício da previdência social, deve se observar a legislação vigente. • Direito à assistência social (artigos 33 a 36) Essa assistência deve ser prestada, de forma articulada, entre o Sistema Único de Saúde, as previsões da Lei Orgânica da Assistência Social e a Política Nacional do Idoso. Os idosos acima de 65 (sessenta e cinco) anos de idade que comprovarem que nem eles nem a família têm condições para manter sua subsistência receberão auxílio de 1 salário mínimo. • Direito à habitação (artigos 37 e 38) A moradia é um direito previsto para o idoso, que deverá ter moradia digna, no seio familiar (ainda que em família substituta) ou desacompanhado, quando assim o desejar, ou ainda em instituições públicas ou privadas. Nos programas públicos habitacionais, os idosos terão prioridade para adquirir imóvel para moradia própria (reserva de 3% das unidades para atendimento dos idosos, implantação de equipamentos urbanos comunitários voltados ao idoso, garantia de acesso com eliminação de barreiras arquitetônicas e urbanísticas, e critério de financiamento compatível com o rendimento do idoso). • Direito ao transporte (artigos 39 a 42) Aos maiores de 65 (sessenta e cinco) anos é garantida a gratuidade nos transportes públicos urbanos e semiurbanos. A gratuidade para aqueles entre 60 (sessenta) e 65 (sessenta e cinco) anos está a critério da legislação local. Devem-lhes ser garantidos lugares nos transportes e nos estacionamentos públicos e privados. Quanto aos transportes coletivos interestaduais, deve-se reservar 2 (duas) vagas gratuitas por veículo e desconto de, pelo menos, 50% no valor, para idosos que não possuam renda maior que 2 (dois) salários mínimos.

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9.4 Dos meios de acesso e proteção do Idoso Os idosos ou terceiros que perceberem a violação aos direitos garantidos na Constituição e no Estatuto podem acessar as delegacias especializadas para que estas iniciem investigação. Devem procurar o Ministério Público, a Defensoria Pública, a Ordem dos Advogados do Brasil ou o Poder Judiciário, além de realizarem denúncias através dos Conselhos Municipais, Estaduais e Nacional do Idoso e do disque idoso (o número deste serviço varia de acordo com o Estado).

10. DA MULHER 10.1 A ONU e as mulheres Em 02 de julho de 2010, a Assembleia Geral votou, por unanimidade, pela criação de uma entidade que visa a acelerar o progresso e o atendimento das demandas das mulheres e meninas em todo o mundo. Criou-se então um órgão único, a ONU Mulheres, que iniciou seu funcionamento em 1o de janeiro de 2011. Esse órgão reúne agências e escritórios da ONU. São elas: Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para Mulheres (UNIFEM), a Divisão para o Avanço das Mulheres (DAW), o Escritório de Assessoria Especial em Questões de Gênero e o Instituto Internacional de Treinamento e Pesquisa para a Promoção da Mulher (INSTRAW). Curiosidade: O dia internacional da Mulher é 8 de março e o dia internacional para a eliminação da violência contra a mulher é lembrado em 25 de novembro.

A ONU Mulher tem como fundamento principal que as mulheres e meninas possuem o direito de viverem sem discriminação, pobreza, violência, exploração e que, para o desenvolvimento mundial contra o preconceito, faz-se necessária a igualdade de gênero. Para essa Organização, a mulher precisa e deve estar nos centros das decisões, ser líder e defensora das mudanças. A igualdade entre homens e mulheres deve ser alcançada em todos os aspectos, mas foram traçadas áreas de prioridades. Estas são: • Aumentar a liderança e a participação das mulheres; • eliminar a violência contra as mulheres e meninas; • engajar as mulheres em todos os aspectos dos processos de paz e de segurança; • aprimorar o empoderamento econômico das mulheres; • colocar a igualdade de gênero no centro do planejamento e dos orçamentos de desenvolvimento nacional. A ONU Mulheres busca a igualdade de gênero e trabalha em conjunto com os governos dos Estados Membros da ONU na formulação de leis, programas, serviços e implementações de programas. 10.2 Da mulher no Brasil As mulheres brasileiras, assim como todas as outras mulheres do mundo, sofreram e ainda sofrem diversas formas de preconceito e discriminação, mas, nos últimos anos, notam-se avanços rumo à equidade das raças e gêneros. Curiosidade: Apenas em 1932, a mulher alcançou o direito de participar da vida política com o exercício do voto.

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Com a Constituição de 1988, observaram diversas alterações nos campos referentes à mulher, seus direitos, proteções e garantias. Essa Constituição impôs o respeito e a adequação às normas de direitos humanos e determinou o princípio da isonomia em que homens e mulheres são constitucionalmente iguais. Em 1985, criou-se o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM), órgão vinculado ao Ministério da Justiça, com o intuito que tal Conselho desenvolvesse políticas de não discriminação e assegurasse o exercício de atividades políticas, econômicas e culturais pelas mulheres. Surgiu, em 2003, a Secretaria de Políticas para as mulheres, que deve trabalhar com, para e pelas mulheres. Esta visa contribuir para a melhoria de vida das mulheres e para a incorporação das especificidades das mulheres nas políticas públicas e para o estabelecimento das condições necessárias ao exercício de sua cidadania. O Conselho Nacional dos Direitos da Mulher passou a ser integrante da Secretaria de Políticas para Mulheres e a ser composto por representantes da sociedade civil e do governo, tendo assim a ampliação do processo de controle social sobre as políticas públicas para as mulheres. Compete à Secretaria de Políticas para Mulheres: • Assessorar o Presidente da República nas articulações para políticas em favor das mulheres; • elaborar e implementar campanhas contra a discriminação; • promover a igualdade de gênero; • promover a fiscalização da implementação das legislações, dentre outras funções. A evolução dos tempos também causou alterações nos perfis das mulheres. As mulheres que trabalhavam eram, no final dos anos 70, jovens, solteiras e sem filhos; hoje são mais velhas, casadas e mães. Apesar das mudanças e das atenções governamentais, os obstáculos ainda existem e não permitem o pleno exercício da cidadania das mulheres brasileiras. Estudos apontam que dentre as dificuldades encontradas pelas mulheres brasileiras, destacam-se: • Desigualdade de gênero no campo dos direitos civis; • sexualidade e reprodução; • redução da pobreza; • acesso ao mercado de trabalho; • segurança das mulheres ameaçadas pela violência de gênero É possível afirmar que os direitos humanos das mulheres influenciaram grandes modificações no Brasil, desencadearam políticas públicas, em especial nos campos da saúde sexual, dos direitos trabalhistas e previdenciários, dos direitos políticos e civis, da violência e dos abusos. As desigualdades diminuíram, mas ainda encontramos resquícios delas em diversos pontos. Atualmente, as mulheres estão se qualificando, estudando, ingressando em cargos de prestígios, mas continuam recebendo honorários menores, além de serem responsáveis pelas ocupações domésticas. As ações públicas e governamentais devem agir de acordo com o desenvolvimento mercadológico e social das famílias brasileiras, em busca de dirimir a desigualdade de gênero existente no país. 10.3 A Violência sofrida pela Mulher Violência é ato de agressão ou omissão que causa sofrimento físico ou psíquico. A violência pode ser realizada de diversas formas: física, moral, psíquica e etc.. A exploração sexual e os abusos contra a mulher podem ocasionar gravidezes indesejadas e o contágio de doenças sexualmente transmissíveis. • A cada 15 segundos, uma mulher é agredida no Brasil. • O Brasil é o país que mais sofre com a violência doméstica (em média, 23% das mulheres estão nessas situações). • Uma em cada três mulheres sofre violência no mundo. • A violência doméstica é a principal causa de morte e de deficiência entre mulheres de 13 a 44 anos. • A violência doméstica mata mais do que o câncer e os acidentes de trânsito.

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• Cerca de 70% das vítimas de assassinato do sexo feminino foram mortas por seus maridos ou companheiros. • A violência atinge mulheres de todas as classes sociais bem como de todas as cores, raças ou crenças. • Cerca de mais de 40% das ações violentas contra as mulheres resultam em lesões corporais graves. Quando a violência contra a mulher ocorre na rua, ela estará amparada, como todo cidadão, pela lei penal. Quando a agressão ocorrer em casa e for praticada por pessoas que convivem no ambiente doméstico (familiares, companheiros, hóspedes, agregados etc.), a mulher será protegida pela Lei Maria da Penha – Lei 11.340, sendo possível o acontecimento de violência física, sexual, psicológica, moral e até mesmo patrimonial. Quando a mulher for vítima de violência doméstica, pode requerer, no momento em que for se apresentar na delegacia, medidas protetivas. Ao manifestar o desejo de proteção, o delegado deverá pedir ao juiz a determinação de alguma das medidas expostas: • que proíba ou restrinja o agressor de usar arma; • que afaste o agressor da casa, sem que a mulher perca, com isso, seus direitos; • que proíba o agressor de se aproximar da vítima; • que restrinja ou suspenda as visitas do agressor aos dependentes menores; • que o agressor realize prestação de alimentos provisórios; • que o agressor restitua à vítima bens indevidamente subtraídos; • que o agressor não venda ou alugue imóvel da família, sem autorização judicial; • que o agressor deposite valor correspondente aos danos causados pelo agressor. 10.4 Dos Direitos da Mulher A Constituição de 1988 dispõe, em favor das mulheres, direitos fundamentais, para que a igualdade entre homens e mulheres ocorra em âmbito familiar, educacional, reprodutivo, da saúde, do acesso ao trabalho e à previdência, além de proteger e ser contrária à violência e aos abusos. A ONU estabelece 12 (doze) direitos básicos das mulheres. São eles: • Direito à vida; • direito à liberdade e segurança pessoal; • direito à igualdade e a estar livre de todas as formas de discriminação; • direito à liberdade de pensamento; • direito à informação e à educação; • direito à privacidade; • direito à saúde e à proteção desta; • direito a construir relacionamento conjugal e a planejar sua família; • direito a decidir ter ou não ter filhos e quando tê-los; • direito aos benefícios do progresso científico; • direito à liberdade de reunião e à participação política; • direito a não ser submetida à tortura e aos maus tratos. 10.5 Dos meios de acesso e proteção da mulher A mulher, vítima de violência, deve procurar as delegacias especializadas (Delegacias de Polícia da Mulher) ou qualquer delegacia policial, o Ministério Público, a Defensoria Pública, a Ordem dos Advogados do Brasil. Conta ainda com a ouvidoria da Secretaria de Políticas para as Mulheres, que é um canal estratégico de diálogo entre a Secretaria e a Mulher. Nesse canal de diálogo, é possível apresentar demandas, contribuindo para a promoção, a defesa e a valorização dos direitos humanos, o combate à exclusão e à desigualdade, a denúncia de crimes etc.

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11. DA PESSOA PORTADORA DE NECESSIDADE ESPECIAL 11.1 A ONU e as pessoas com deficiência Estudos apontam que a maioria das pessoas com deficiência vive em países em desenvolvimento e que, mundialmente, temos uma população de aproximadamente 650 milhões de pessoas portadoras de necessidades especiais. Essas pessoas são apontadas como vítimas fáceis da violência e do abuso sexual, não obtendo, na grande maioria das vezes, ajuda policial, proteção jurídica e cuidados preventivos. Curiosidade: • 10% da população mundial possui alguma deficiência. • 80% dessas pessoas vivem em países em desenvolvimento. • Entre as pessoas mais pobres do mundo, 20% têm alguma deficiência. • 30% de meninos e meninas de rua possuem alguma deficiência. • Nos países em desenvolvimento, 90% das crianças com deficiência não frequentam escolas. As pessoas com necessidades especiais enfrentam diversas dificuldades. Dentre elas, estão presentes: atendimento médico adequado, acesso a escolas, proteção estatal etc. Quando enfrentam todas essas barreiras, encontram mais dificuldade ao entrarem para o mercado de trabalho. Isto porque parte dos empregadores não acredita que pessoas com deficiência possam, efetivamente, realizar as tarefas do trabalho exigido, e em virtude do elevado custo para as instalações especiais nas empresas e escritórios. A Convenção das Nações Unidas sobre Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo foi adotada em 2006 e entrou em vigor em 3 de maio de 2008, “deixando de lado o fato de as pessoas com deficiência serem vistas como objetos de caridade, para visualizá-las como portadoras de direitos. E, como tal, são capazes de reivindicar os direitos e a tomada de decisões para as suas vidas com base em seu consentimento livre e esclarecido, bem como de serem membros ativos da sociedade.”. Curiosidade: Alguns direitos do portador de necessidade especial declarados pela ONU: • Respeito à dignidade humana. • Direitos fundamentais, civis, políticos iguais aos outros seres humanos. • Tratamento médico, psicológico e funcional; • Obter e manter o emprego ou se engajar em uma ocupação útil, produtiva e remunerada; • Serem protegidos contra toda exploração, tratamentos abusivos, degradantes ou de natureza discriminante, dentre outros.

A Convenção é um instrumento de direitos humanos, que reafirma e garante que todas as pessoas com deficiência devem gozar de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais. Curiosidade: O dia internacional das pessoas com deficiência é 03 de dezembro.

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11.2 Do portador de necessidade especial no Brasil Entende-se por pessoas deficientes, segundo a Declaração dos Direitos da Pessoa com Deficiência, aprovada pela Assembleia Geral: “aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas”. A Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência (Corde) foi elevada a Subsecretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência (SNPD). Essa Secretaria tem como função coordenar e supervisionar o Programa Nacional de Acessibilidade e o Programa de Promoção e Defesa da Pessoa com Deficiência. A maioria dos portadores de deficiências não conhece seus direitos. Com isso, os Programas governamentais (citados acima) buscam estimular setores públicos e privados para promover a defesa, a proteção dessas pessoas, visando a que todos tenham acesso aos seus direitos e a vidas melhores, conforme determina a Constituição, ao priorizar a vida digna de todos os seres humanos. A realidade brasileira ainda é de desrespeito aos direitos das pessoas diferenciadas, como os idosos, os que sofrem transtornos mentais, os homossexuais etc., e não seria diferente com os deficientes. As empresas se recusam a contratá-los, os ônibus não são adaptados para eles, os prédios e estabelecimentos não sofreram mudanças, as calçadas são desniveladas e repletas de obstáculos dentre outras dificuldades que enfrenta esse grupo. A Lei 7853 que dispõe sobre direitos, integração social dos deficientes, foi editada em outubro de 1989. No entanto, apenas em 2007, o Brasil ratificou a Convenção sobre Direitos das Pessoas com Deficiência. 11.3 Dos Direitos do portador de necessidade especiais A Lei 7853 garante, aos portadores de necessidades especiais, todos os direitos básicos, tais como os individuais, os sociais e os da efetiva integração social, determinando a igualdade de oportunidades e de tratamento. Eles devem ser tratados como todo ser humano, sem discriminação ou preconceito por sua deficiência, respeitando sua dignidade e seu bem estar. Educação, saúde, lazer, previdência social, trabalho, amparo à maternidade e à infância regem os direitos dos portadores de necessidades especiais. O Governo deve garantir e manter a educação, com gratuidade, com oferecimento de materiais e facilidades de acesso; a saúde, de forma a realizar programas de planejamento familiar, redes qualificadas de reabilitação, atendimento domiciliar para aquele portador de deficiência grave que não se encontra internado; o trabalho, apoiando a formação profissional, a inserção do deficiente nos setores públicos e privados, pois a Lei 8213 de 1991 dista que as empresas com 100 ou mais funcionários devem preencher de 2% a 5% de suas vagas com pessoas reabilitadas ou portadores de deficiências; os recursos humanos, com intuito de formar professores e incentivar pesquisas científicas; além de verificar as normas de edificações, permitindo acesso a edifícios, logradouros e aos meios de transportes.

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LEI Nº 7.853, DE 24 DE OUTUBRO DE 1989 (Principais Artigos)

Artigo. 1º Ficam estabelecidas normas gerais que asseguram o pleno exercício dos direitos individuais e sociais das pessoas portadoras de deficiências, e sua efetiva integração social, nos termos desta Lei. § 1º Na aplicação e interpretação desta Lei, serão considerados os valores básicos da igualdade de tratamento e oportunidade, da justiça social, do respeito à dignidade da pessoa, do bem-estar, e outros, indicados na Constituição ou justificados pelos princípios gerais de direito. § 2º As normas desta Lei visam garantir às pessoas portadoras de deficiência as ações governamentais necessárias ao seu cumprimento e das demais disposições constitucionais e legais que lhes concernem, afastadas as discriminações e os preconceitos de qualquer espécie, e entendida a matéria como obrigação nacional a cargo do Poder Público e da sociedade. Artigo. 2º Ao Poder Público e seus órgãos cabe assegurar às pessoas portadoras de deficiência o pleno exercício de seus direitos básicos, inclusive dos direitos à educação, à saúde, ao trabalho, ao lazer, à previdência social, ao amparo à infância e à maternidade, e de outros que, decorrentes da Constituição e das leis, propiciem seu bem-estar pessoal, social e econômico. Parágrafo único. Para o fim estabelecido no caput deste artigo, os órgãos e entidades da administração direta e indireta devem dispensar, no âmbito de sua competência e finalidade, aos assuntos objetos esta Lei, tratamento prioritário e adequado, tendente a viabilizar, sem prejuízo de outras, as seguintes medidas: I - na área da educação: a) a inclusão, no sistema educacional, da Educação Especial como modalidade educativa que abranja a educação precoce, a pré-escolar, as de 1º e 2º graus, a supletiva, a habilitação e reabilitação profissionais, com currículos, etapas e exigências de diplomação próprios; b) a inserção, no referido sistema educacional, das escolas especiais, privadas e públicas; c) a oferta, obrigatória e gratuita, da Educação Especial em estabelecimento público de ensino; d) o oferecimento obrigatório de programas de Educação Especial a nível pré-escolar, em unidades hospitalares e congêneres nas quais estejam internados, por prazo igual ou superior a 1 (um) ano, educandos portadores de deficiência; e) o acesso de alunos portadores de deficiência aos benefícios conferidos aos demais educandos, inclusive material escolar, merenda escolar e bolsas de estudo; f) a matrícula compulsória em cursos regulares de estabelecimentos públicos e particulares de pessoas portadoras de deficiência capazes de se integrarem no sistema regular de ensino. II - na área da saúde: a) a promoção de ações preventivas, como as referentes ao planejamento familiar, ao aconselhamento genético, ao acompanhamento da gravidez, do parto e do puerpério, à nutrição da mulher e da criança, à identificação e ao controle da gestante e do feto de alto risco, à imunização, às doenças do metabolismo e seu diagnóstico e ao encaminhamento precoce de outras doenças causadoras de deficiência; b) o desenvolvimento de programas especiais de prevenção de acidente do trabalho e de trânsito, e de tratamento adequado a suas vítimas; c) a criação de uma rede de serviços especializados em reabilitação e habilitação; d) a garantia de acesso das pessoas portadoras de deficiência aos estabelecimentos de saúde públicos e privados, e de seu adequado tratamento neles, sob normas técnicas e padrões de conduta apropriados; e) a garantia de atendimento domiciliar de saúde ao deficiente grave não internado; f) o desenvolvimento de programas de saúde voltados para as pessoas portadoras de deficiência, desenvolvidos com a participação da sociedade e que lhes ensejem a integração social. III - na área da formação profissional e do trabalho: a) o apoio governamental à formação profissional, e a garantia de acesso aos serviços concernentes, inclusive aos cursos regulares voltados à formação profissional; 68


b) o empenho do Poder Público quanto ao surgimento e à manutenção de empregos, inclusive de tempo parcial, destinados às pessoas portadoras de deficiência que não tenham acesso aos empregos comuns; c) a promoção de ações eficazes que propiciem a inserção, nos setores públicos e privado, de pessoas portadoras de deficiência; d) a adoção de legislação específica que discipline a reserva de mercado de trabalho, em favor das pessoas portadoras de deficiência, nas entidades da Administração Pública e do setor privado, e que regulamente a organização de oficinas e congêneres integradas ao mercado de trabalho, e a situação, nelas, das pessoas portadoras de deficiência. IV - na área de recursos humanos: a) a formação de professores de nível médio para a Educação Especial, de técnicos de nível médio especializados na habilitação e reabilitação, e de instrutores para formação profissional; b) a formação e qualificação de recursos humanos que, nas diversas áreas de conhecimento, inclusive de nível superior, atendam à demanda e às necessidades reais das pessoas portadoras de deficiências; c) o incentivo à pesquisa e ao desenvolvimento tecnológico em todas as áreas do conhecimento relacionadas com a pessoa portadora de deficiência. V - na área das edificações: a) a adoção e a efetiva execução de normas que garantam a funcionalidade das edificações e vias públicas, que evitem ou removam os óbices às pessoas portadoras de deficiência, permitam o acesso destas a edifícios, a logradouros e a meios de transporte. Artigo. 12. Compete à Corde: I. coordenar as ações governamentais e medidas que se refiram às pessoas portadoras de deficiência; II. elaborar os planos, programas e projetos subsumidos na Política Nacional para a Integração de Pessoa Portadora de Deficiência, bem como propor as providências necessárias a sua completa implantação e seu adequado desenvolvimento, inclusive as pertinentes a recursos e as de caráter legislativo; III. acompanhar e orientar a execução, pela Administração Pública Federal, dos planos, programas e projetos mencionados no inciso anterior; IV. manifestar-se sobre a adequação à Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência dos projetos federais a ela conexos, antes da liberação dos recursos respectivos; V. manter, com os Estados, Municípios, Territórios, o Distrito Federal, e o Ministério Público, estreito relacionamento, objetivando a concorrência de ações destinadas à integração social das pessoas portadoras de deficiência; VI. provocar a iniciativa do Ministério Público, ministrando-lhe informações sobre fatos que constituam objeto da ação civil de que trata esta Lei, e indicando-lhe os elementos de convicção; VII. emitir opinião sobre os acordos, contratos ou convênios firmados pelos demais órgãos da Administração Pública Federal, no âmbito da Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência; VIII. promover e incentivar a divulgação e o debate das questões concernentes à pessoa portadora de deficiência, visando à conscientização da sociedade. Parágrafo único. Na elaboração dos planos, programas e projetos a seu cargo, deverá a Corde recolher, sempre que possível, a opinião das pessoas e entidades interessadas, bem como considerar a necessidade de efetivo apoio aos entes particulares voltados para a integração social das pessoas portadoras de deficiência. Artigo 13- revogado § 2º Compete ao Conselho Consultivo: I. opinar sobre o desenvolvimento da Política Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência; II. apresentar sugestões para o encaminhamento dessa política; III. responder a consultas formuladas pela Corde. A Convenção sobre Direitos das Pessoas com Deficiência prevê, ainda, outros direitos, tais como o direito à inclusão social, ao respeito pela diferença e à aceitação da pessoa com deficiência como parte da diversidade humana e da humanidade, à igualdade de oportunidade entre homens e mulheres. Distam

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as funções dos Estados Membros que são: a manutenção do direito à vida; o acesso à justiça, liberdade e segurança; a prevenção contra torturas, penas cruéis, violência e abusos; a garantia de vida independente e da privacidade; a oportunidade de reabilitação. Estes são os principais direitos das pessoas com necessidades especiais no Brasil e nos Estados Membros que ratificaram a Convenção supracitada. 11.4 Dos meios de acesso e proteção do portador de necessidade especial As pessoas com deficiência contam com o apoio dos Ministérios Públicos (Federal, Estadual e Municipal), com as delegacias e polícias militares, com a Ordem dos Advogados do Brasil, além dos disque - denúncias.

12. DO MEIO AMBIENTE 12.1 A ONU e o meio ambiente O alto desenvolvimento das indústrias há séculos foi o marco principal para a preocupação ambiental. Com a II Guerra mundial, surgiram temores de um novo tipo de poluição, oriunda da radiação. O movimento ambientalista ganhou força com a publicação do livro da escritora e cientista, Rachel Carson, que alertou o mundo sobre a necessidade de respeitar o ecossistema em que vivemos, para proteger a saúde humana e o meio ambiente. “Chegamos a um ponto da história em que devemos moldar nossas ações em todo o mundo, com maior atenção para as consequências ambientais. Através da ignorância ou da indiferença, podemos causar danos maciços e irreversíveis ao meio ambiente, do qual nossa vida e bemestar dependem. Poroutro lado, através do maior conhecimento e de ações mais sábias, podemos conquistar uma vida melhor para nós e para a posteridade, com um meio ambiente em sintonia com as necessidades e esperanças humanas. (...)” “Defender e melhorar o meio ambiente para as atuais e futuras gerações se tornou uma meta fundamental para a humanidade.” Trechos da Declaração da Conferência da ONU sobre o Meio Ambiente (Estocolmo, 1972), parágrafo 6 A Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, estabelecida em 1983, fez amplas recomendações e, como consequência, foi realizada a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, que colocou o assunto diretamente na agenda pública. Em 1992, foi realizada no Rio de Janeiro, Brasil, a “Cúpula da Terra”, que adotou um diagrama para a proteção do planeta e seu desenvolvimento sustentável, que ficou conhecido como a “Agenda 21”. Na Agenda 21, os governos delinearam um programa detalhado de ações para afastar o mundo do modelo insustentável de crescimento econômico, direcionando atividades que protejam e renovem os recursos ambientais. Dentre as ações estabelecidas, temos a proteção da atmosfera, o combate ao desmatamento, a perda de solo e a desertificação, a prevenção da poluição da água e do ar, a interrupção da destruição das populações de peixes e a promoção de uma gestão segura dos resíduos tóxicos. Curiosidade: Datas comemorativas declaradas pela Assembleia Geral: • 22 de março: dia mundial da água; • 22 de maio: dia internacional para a diversidade biológica; • 5 de junho: dia mundial do meio ambiente; • 17 de junho: dia mundial de combate à desertificação e à seca; • 16 de setembro: dia internacional para a preservação da camada de ozônio; • 6 de novembro: dia internacional para a preservação da exploração do meio ambiente em tempos de guerra e conflito armado; • 11 de dezembro: dia internacional das montanhas. 70


Em 1997, o protocolo de Kyoto foi adotado e trouxe metas obrigatórias para 37 (trinta e sete) países industrializados. Trouxe ainda metas para a comunidade europeia para reduzirem a emissão de gases estufa. Com o intuito de prosseguir com os trabalhos feitos e de discutirem novas questões ambientais, a comunidade internacional se encontrará em maio de 2012 no Rio de Janeiro, Brasil, na Conferência das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável. O evento será conhecido como RIO + 20. 12.2 Da ECO 92 Em 1972, aconteceu a Conferência de Estocolmo que modificou o pensamento do século XX, ao avaliar a relação do meio ambiente e de todas as atividades humanas. A Declaração de Estocolmo estabeleceu 26 (vinte e seis) princípios que se resumem no desenvolvimento mundial e os impactos no meio ambiente. Entre 1972 e 1992, vários acidentes preocuparam ainda mais as autoridades quanto à manutenção e à proteção do meio ambiente (vazamento de gasolina e óleo que causaram explosão; de gás tóxico, ocasionando mortes e lesões; contaminação da fauna aquática por mercúrio, agrotóxicos etc.). Tais acidentes caracterizaram a necessidade de novas práticas em nome da defesa do meio ambiente. A Assembleia Geral da ONU convocou nova Conferência e estabeleceu, em 1983, a Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento. A Comissão concluiu que o problema era além das questões ambientais. Estavam diretamente envolvidas questões referentes a relações econômicas internacionais, aos direitos humanos, à pobreza e ao aumento populacional. Nela foi realizado um relatório que ficou conhecido como Relatório Brundtlans (nome dado em homenagem à presidente dessa Comissão). Esse relatório foi entregue à ONU em 1987 e ficou conhecido devido à cristalização do princípio do desenvolvimento sustentável, que nada mais é que atender às necessidades atuais, sem prejudicar ou comprometer as necessidades futuras, que também devem ser atendidas. Para implementar esse princípio, é preciso muito esforço governamental e de toda a sociedade, realizando campanhas de conscientização, meios de proteção e defesa da fauna, da flora etc.. Os resultados do Relatório de Brundtland foram discutidos na Conferência do Rio de Janeiro sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, conhecida como ECO-92. A ECO 92 foi uma reunião de cúpula, que teve a participação de representantes dos países participantes, políticos, estudiosos e técnicos envolvidos com o meio ambiente. Nela, decidiram por adotar duas convenções, que são: • Convenção – Quadro sobre Mudança do Clima: O desequilíbrio ambiental afeta em dois principais aspectos: o aquecimento global, decorrente do efeito estufa (excesso de dióxido de carbono emitido por indústrias e veículos automotivos), e a perda da camada de ozônio que protege a Terra dos raios ultravioletas (causado por lançamentos de gases halônios e gases clorofluor-carbonetos). Diante disso, essa Convenção prevê estratégias de combate ao efeito estufa e à destruição da camada de ozônio. Ressalta-se que não foram estabelecidas de forma precisa as obrigações relativas à redução de emissão do dióxido de carbono. Para Granziera, que cita Guido Soares: “o termo correto seria moldura, na medida em que se estabeleceram os contornos das estratégias de combate aos efeitos das mudanças climáticas, sem fixar especificamente as respectivas regras.”.

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Apenas em 1997 que se definiu, com precisão, o compromisso global de redução de emissões de gases que causem o efeito estufa. Nesse compromisso, os países desenvolvidos devem buscar formas alternativas de energia, dentre outras “funções”. A meta global está prevista para ser atingida no período de 2008 a 2012. Curiosidade: Países em desenvolvimento não têm compromissos de redução na emissão de gases.

• Convenção sobre a diversidade biológica: Visa a conservar a diversidade biológica por meio do uso sustentável de seus componentes e da repartição igualitária dos benefícios derivados dos recursos genéticos. A Convenção determina que os Estados tenham “o direito soberano de explorar seus recursos de acordo com suas políticas ambientais e responsabilidade de assegurar que tais atividades sob sua jurisdição ou controle não causem danos ao meio ambiente de outros Estados (...).”. A ECO-92 proporcionou a criação da Agenda 21 e da Declaração do Rio de Janeiro sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Declaração do Rio/92), que estabelece princípios a serem adotados pelos Estados. A Agenda 21 consiste em um programa de proteção do meio ambiente para o século XXI, com descrições de metas a serem alcançadas pelos Estados Membros. Granziera menciona os temas contidos na Agenda 21, em seus 40 capítulos, da seguinte forma: • “Dimensões sociais e econômicas do desenvolvimento: pobreza, produção e consumo, saúde, aglomerações humanas e processos integrados de decisões.” • “Conservação e gerenciamento de recursos naturais: atmosfera, oceanos e mares, solo, florestas, montanhas, diversidade bilógica, ecossistemas. Biotecnologia, água potável, substâncias tóxicas, lixo radioativo e resíduos sólidos.” • “Fortalecimento do papel de grupos: jovens, mulheres, povos indígenas, organizações não governamentais, autoridades locais, sindicatos, negócios, comunidades científicas e tecnológicas e fazendeiros.” • “Meios de Implementação: finanças, transferência de tecnologia, informação, consciência pública, capacidade de construção, educação, instrumentos legais e estruturas institucionais.” A Declaração do Rio apresenta 27 (vinte e sete) princípios que tratam do desenvolvimento sustentável, da responsabilidade, da cooperação, da precaução e da limitação à soberania territorial. Curiosidade: Dos princípios estabelecidos na Declaração do Rio, alguns são cópias da Declaração de Estocolmo. Em resumo, fazem-se necessárias parceria e cooperação entre Estados, sociedades e indivíduos na busca do desenvolvimento e da proteção do meio ambiente.

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12.3 Do meio ambiente no Brasil Conforme nos ensina Paulo Afonso Leme Machado, Direito ambiental é: “Um Direito sistematizador, que faz a articulação da legislação, da doutrina e da jurisprudência concernentes aos elementos que integram o ambiente. Procura evitar o isolamento dos temas ambientais e suas abordagens antagônicas. Não se trata mais de constituir um Direito das águas, um Direito da atmosfera, um Direito do solo, um Direito florestal, um Direito da fauna ou um Direito da biodiversidade. O Direito Ambiental não ignora o que cada matéria tem de específico, mas busca interligar estes temas com a argamassa da identidade dos instrumentos jurídicos de prevenção e de reparação, de informação, de monitoramento e de participação.” Tal direito tem como objetivo o equilíbrio entre os meios físico e biótico, suas relações e processos ecológicos envolvidos. Para Edna Cardozo Dias, “O Direito ambiental é o ramo do Direito que edita normas objetivando a manutenção de um perfeito equilíbrio da vida no Planeta e disciplinando as relações entre o homem e o ambiente que o cerca. Meio ambiente é o conjunto de condições, leis, influências e interações da ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas (Lei 6939, de 31/8/81). Os recursos naturais, a atmosfera, as águas interiores, superficiais e subterrâneas, os estuários, o mar territorial, o solo, o subsolo, os elementos da biosfera, a fauna e a flora têm regime especial para utilização, sujeitando-se às normas e limitações administrativas próprias. São preservados pela entidade estatal competente para sua regulamentação”. O Brasil iniciou sua ordem jurídica voltada ao meio ambiente com a Conferência de Estocolmo, em 1972, e criou, através do Decreto 73.030, de 30 de outubro de 1973, a Secretaria Especial de Meio Ambiente (SEMA). O Brasil enfrentou, entre 1972 e 1992, poluição e degradação ambiental e um governo centralizador que não permitia que os estados normatizassem a proteção ambiental. A Agenda 21, criada na Conferência do Rio de Janeiro, sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento de 1992, desdobrou-se em Agenda 21 Municipal, Estadual e Nacional, cabendo, portanto, a cada local, formular suas metas e planejar ações concretas para alcançar os objetivos estabelecidos pela Agenda 21. As agendas locais dependem de acordo político e recursos financeiros para se realizarem. 12.4 Dos meios de acesso e proteção do meio ambiente A proteção do meio ambiente ocorre por intermédio do poder de polícia do Poder Público. Os principais instrumentos para a proteção do meio ambiente são a obrigatoriedade do estudo de impacto ambiental, o zoneamento ambiental, o licenciamento e o estabelecimento de padrões ambientais. • Estudo de impacto ambiental O Estudo de Impacto Ambiental (EIA) surgiu nos Estados Unidos, em 1969. Foi introduzido no Brasil em 1980, e só foi regulamentado em 1986 pelo Congresso Nacional do Meio Ambiente (Conama). Esse estudo ocorre quando um projeto é proposto (ex: extração de minério; criação de estradas de rodagem, porto, ferrovia, usinas de geração de eletricidade e etc.), para que os órgãos competentes avaliem o impacto e as modificações que essas obras ocasionarão no meio ambiente. O resumo desse estudo é denominado de Relatório de Impacto Ambiental (Rima) e contém síntese do diagnóstico (ambiental, socioeconômico e biológico), as conclusões, além de indicar a alternativa mais favorável ao meio ambiente.

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Curiosidade: As indústrias potencialmente poluidoras, para adquirirem o licenciamento, necessitam que seja realizado o Estudo de Impacto Ambiental e o Relatório de Impacto Ambiental. Para Edna Cardoso, impacto é “qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das atividades humanas que, direta ou indiretamente, afetam: a) a saúde, a segurança e o bem estar da população; b) as atividades socioeconômicas; c) a biota; d) as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente; e) a qualidade dos recursos ambientais.” • Zoneamento É instrumento da Política Nacional de Meio Ambiente. O zoneamento pode ser urbano, ambiental ou industrial. A professora Edna Cardoso nos ensina as diferenças entre os zoneamentos existentes: “O zoneamento urbano consiste no ordenamento de uso e ocupação do solo por um conjunto de normas legais que regulamentam as edificações. O planejamento da cidade, por intermédio do plano diretor, divide o solo em zonas, de acordo com o uso da área, tais como: zona de uso residencial, zona de uso misto, zona de uso comercial, zona de uso especial, zona de uso industrial, zona de saúde, zona de lazer e etc. Esta divisão visa separar as atividades poluidoras ou incômodas de outras áreas, ora proibindo a sua instalação, ora estabelecendo regras para sua implantação e exercício, bem como os níveis máximos de poluição permitidos em cada área. O zoneamento industrial busca uma política de conciliação entre o desenvolvimento, o bem estar da população e a defesa do meio ambiente. A matéria é regida pela lei 6803, de 2 de julho de 1980, que classifica as zonas em zona de uso estritamente industrial, zona de uso predominantemente industrial, zona de uso diversificado. A aprovação da delimitação, classificação e implantação dessas zonas é de competência dos governos estaduais, assim como sua fiscalização. O zoneamento ambiental consiste em instituir zonas de preservação destinadas à melhoria ou recuperação da qualidade ambiental. Foi instituído pela Lei 6938/81, art. 9º, II, e pela Constituição Federal, art.225, § 1º, inciso III. Seu objetivo é a criação de áreas especiais para proteger o meio ambiente. Nas Unidades de Conservação, podem ser limitadas ou proibidas certas atividades.”. • Licenciamento A Constituição Federal prevê que o meio ambiente é de uso comum de toda a população. Assim conclui-se que o meio ambiente não possui um único dono, ou seja, ninguém possui direitos subjetivos sob o meio ambiente. Artigo 225, Constituição Federal: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.”. Diante do exposto, qualquer obra ou empreendimento que cause degradação ao meio ambiente ou que utilize de seus recursos deve ser aprovada e autorizada pelo Poder Público. Existem três tipos de licenciamento previstos na Lei 6938 de 1981, a Licença Prévia (solicitada na fase preliminar do projeto, ou seja, planejamento da atividade), Licença de Instalação (tal licença autoriza a implementação inicial do projeto) e a Licença de Operação (autoriza que se iniciem as atividades).

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• Padrões de Qualidade A Lei 6938/81 estabelece padrões de qualidade do ar, da água, da emissão de sons etc., que devem ser respeitados, visando à proteção do meio ambiente. Para proteger o meio ambiente, a população pode efetuar denúncias de ocorrências criminosas nas polícias especializadas, na Promotoria, buscar apoio nos Órgãos governamentais etc.

13. DO PORTADOR DE HIV 13.1 A ONU e o portador de HIV A Síndrome de Imunodeficiência Adquirida surgiu repentinamente e abalou o mundo em 1981. Com o surgimento dessa doença, iniciaram-se os estudos das suas formas de contágio e combate. A priori, acreditavam que apenas os homossexuais eram atingidos, mas perceberam que as principais formas de contágio se davam pelas relações sexuais desprotegidas, entre os usuários de drogas que compartilhavam a mesma agulha e por meio das transfusões de sangue não filtrada. Normalmente, as vítimas eram mortais, mas os tratamentos que foram surgindo começaram a estender o tempo de vida dos infectados. Em 2007, 25 milhões de pessoas haviam morrido e, neste mesmo ano, houve uma estabilidade das pessoas que conviviam com o vírus. A ONU trabalha contra as mortes oriundas da AIDS e, desde 1996, seus esforços são coordenados pela UNAIDS (Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/AIDS), que conta com o apoio de outras 10 (dez) agências do Sistema ONU. “Eu acredito em um mundo onde existam: Zero novas infecções pelo HIV; discriminação Zero; Zero mortes relacionadas à AIDS. Esta é a nova visão da UNAIDS. Esta é a nossa paixão, nosso compromisso, nossa determinação. Há alguns anos, poderíamos apenas sonhar com um dia como este – mas hoje sabemos que podemos tornar isso uma realidade.” Diretor – Executivo da UNAIDS, Michael Sidibé Carta aos parceiros de 2011

13.2 Do portador de HIV no Brasil O governo disponibiliza diversas cartilhas sobre o assunto, orienta as famílias, os amigos, os enfermeiros, determinando a forma como devem agir com aquele que é portador do vírus HIV. Com esse apoio, é possível obter diversas informações e sanar as dúvidas. Deve-se ressaltar que existem projetos que realizam todo o atendimento necessário ao portador do vírus. Elucida uma das orientações que o portador do vírus deve manter sua vida normalmente, salvo quando o estado físico não mais permitir, em virtude do não tratamento e do avanço da doença. Essas pessoas não podem ser doadoras de sangue e devem manter relações sexuais com preservativo. O vírus do HIV fica alojado em uma célula e é transmitido de formas específicas, no contato direto com a corrente sanguínea. Em função disso, percebe-se que a sociedade, em geral, detém diversas dúvidas quanto ao seu contágio. Assim, julgamos de suma importância esclarecer que as formas de contágio do vírus do HIV são: • Manter relações sexuais (anal, vaginal, oral), sem preservativos, quando um dos parceiros é soropositivo. • Nas transfusões de sangue, quando o sangue estiver contaminado. 75


• Nas práticas de compartilhamento de agulhas e seringas, especialmente no uso de drogas injetáveis, quando um dos usuários estiver contaminado. • Materiais de acupuntura, tatuagens e outros materiais perfurantes e cortantes podem representar risco. • Da mãe para o filho durante a gravidez, no parto e na amamentação, se a mãe estiver contaminada. As pessoas NÃO SE CONTAMINAM com o vírus do HIV: • por manterem relações amigáveis; • por dividirem o mesmo local (escolas, transporte, piscinas, banheiro); • por meio do beijo no rosto; • por conversarem; • por meio do aperto de mão ou do abraço; • pelo convívio; • pelas picadas de insetos. 13.3 Do tratamento do portador de HIV Ao ser diagnosticado com o vírus HIV, é necessário consulta com médico especialista no Serviço de Assistência Especializada (SAE). Com base nessa consulta e nos exames clínicos e laboratoriais, é possível que o paciente seja encaminhado à realização de tratamento com medicamentos, ou seja, que inicie a terapia antirretroviral. É importante informar ao paciente que o uso irregular dos medicamentos aumenta a resistência do vírus aos remédios, sendo necessário informar ao médico responsável qualquer alteração de remédio ou a sua interrupção. O Serviço de Assistência Especializada disponibiliza ainda atendimento com assistentes sociais, enfermeiros, farmacêuticos, nutricionistas e psicólogos. Curiosidade: O acompanhamento médico é essencial para aquele que iniciou o tratamento com medicamentos, e também para aqueles que não apresentam sintomas e que não tomam remédios (essa fase é denominada de assintomática). O paciente terá que realizar diversos exames que poderão ser feitos no próprio SEA e serão enviados para unidades públicas de saúde que realizam exames especializados, denominados de Laboratórios Centrais (LACEN). - O tratamento com idosos e crianças Para as pessoas idosas, em virtude das dificuldades típicas da faixa etária, o Serviço de Assistência Especializada realiza um acolhimento com planos terapêuticos, visando à superação das dificuldades apresentadas. Assim, sugere-se: • O uso de letras de tamanho visível nas prescrições em geral, de preferência de forma, e, sempre que necessário, encaminhar o paciente para avaliação oftalmológica. • Identificar se as informações foram bem compreendidas e memorizadas. • Valorizar estratégias para evitar os esquecimentos no uso da medicação (despertadores, lembretes no celular, tabelas com horários e doses em locais estratégicos da casa etc.). • As crianças e adolescentes devem ser analisadas de forma diferenciada. Os médicos devem atentar-se para a combinação “perfeita” dos medicamentos, já que, em virtude da idade, conviveram por muito tempo com a doença. Assim, deve-se considerar: ▪▪Possibilidade de adesão (adaptação ao medicamento) em longo prazo, assim como seu monitoramento. ▪▪Impacto sobre o bem-estar e a qualidade de vida do paciente, com a escolha de remédios indicados para crianças e adolescentes. ▪▪Integração dos pais e irmãos infectados ao tratamento.

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As crianças e adolescentes que não utilizam os medicamentos devem realizar exames a cada dois meses. Precisam fazer exames físicos e laboratoriais com frequência. - O tratamento com gestantes As mulheres grávidas devem realizar o pré-natal e, durante tal período, o médico deve determinar que seja realizado o exame de HIV. A gestante que realiza todo o tratamento, conforme indicação médica, reduz a 1% a chance de transmitir a seu filho o vírus HIV. Caso não venha a observar as recomendações, a transmissão do vírus pode chegar a quase 20% de chance. As recomendações médicas são: o uso do medicamento, combinados na grávida e no recém-nascido, o parto deve ser cesariano e a mãe não pode amamentar a criança. - Os medicamentos Foram criados com o intuito de impedir a multiplicação do vírus no organismo e surgiram na década de 80. Esses remédios ajudam a evitar o enfraquecimento do sistema imunológico, não matam o vírus e, em virtude disso, são fundamentais para o aumento da vida útil e da qualidade de vida daqueles que convivem com a doença. O Brasil distribui, desde 1996, de forma gratuita, os medicamentos necessários para o tratamento do portador do vírus HIV. Normalmente, a distribuição dos remédios é feita nos próprios Serviços de Assistência Especializada (SEA). Quando não ocorrer a distribuição nesses locais, o paciente deve remeter-se às Unidades Dispensadoras de Medicamentos (UDM). O consumo de álcool e outros medicamentos podem causar mal estar aos pacientes e prejudicar o tratamento. Cuidados Importantes destacados pelos médicos: • Sempre lavar as mãos antes de manipular e tomar medicamentos. • Observar toda mudança no corpo e qualquer efeito relacionado ao uso do medicamento, relatando-o ao médico e ao farmacêutico. • Não indicar o uso nem dar sobras de medicamentos a outras pessoas. É preciso devolver o medicamento que não for mais necessário. • Em caso de vômito, entrar em contato com o médico e o farmacêutico. • Não tomar qualquer medicamento sem prescrição médica. 13.4 Dos direitos do portador de HIV Dentre diversos direitos, ressaltam-se os direitos atribuídos pela Constituição Federal, tidos como Direitos fundamentais: o direito a não discriminação; prioridade na justiça; “vantagens” financeiras; benefícios no trabalho e no transporte (a depender da legislação interna de cada estado e município). - Direitos Fundamentais A Constituição brasileira garante a todos os cidadãos direitos e atribui a eles deveres, o que não é diferente com os portadores de HIV. Assim como para todos os brasileiros, são garantidos, aos portadores de AIDS, a dignidade, a saúde, a educação, o trabalho, a moradia, a segurança, o lazer etc. Existem, no Brasil, legislações que amparam e cuidam daqueles propensos a discriminações. São eles: os homossexuais, os portadores de doenças infecciosas, os idosos, os negros etc.

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O ano de 1989 foi marcado pela aprovação da Declaração dos Direitos Fundamentais da Pessoa Portadora do Vírus da AIDS, que ocorreu no Encontro Nacional de ONG`s que trabalham com AIDS (ENONG). Constam, nesse documento, os seguintes dispositivos: I. Todas as pessoas têm direito à informação clara, exata, sobre a AIDS. II. Os portadores do vírus têm direito a informações específicas sobre sua condição. III. Todo portador do vírus da AIDS tem direito à assistência e ao tratamento, dados sem qualquer restrição, garantindo sua melhor qualidade de vida. IV. Nenhum portador do vírus será submetido a isolamento, quarentena ou qualquer tipo de discriminação. V. Ninguém tem o direito de restringir a liberdade ou os direitos das pessoas pelo único motivo de serem portadoras do HIV/AIDS, qualquer que seja sua raça, nacionalidade, religião, sexo ou orientação sexual. VI. Todo portador do vírus da AIDS tem direito à participação em todos os aspectos da vida social. Toda ação que visar a recusar aos portadores do HIV/AIDS um emprego, um alojamento, uma assistência ou a privá-los disso, ou que tenda a restringi-los à participação em atividades coletivas, escolares e militares, deve ser considerada discriminatória e ser punida por lei. VII. Todas as pessoas têm direito de receber sangue e hemoderivados, órgãos ou tecidos que tenham sido rigorosamente testados para o HIV. VIII. Ninguém poderá fazer referência à doença de alguém, passada ou futura, ou ao resultado de seus testes para o HIV/AIDS, sem o consentimento da pessoa envolvida. A privacidade do portador do vírus deverá ser assegurada por todos os serviços médicos e assistenciais. IX. Ninguém será submetido aos testes de HIV/AIDS compulsoriamente, em caso algum. Os testes de AIDS deverão ser usados exclusivamente para fins diagnósticos, controle de transfusões e transplantes, estudos epidemiológicos e nunca qualquer tipo de controle de pessoas ou populações. Em todos os casos de testes, os interessados deverão ser informados. Os resultados deverão ser transmitidos por um profissional competente. X. Todo portador do vírus tem direito a comunicar apenas às pessoas que deseja seu estado de saúde e o resultado dos seus testes. XI. Toda pessoa com HIV/AIDS tem direito à continuação de sua vida civil, profissional, sexual e afetiva. Nenhuma ação poderá restringir seus direitos completos à cidadania.”. - Direito a não discriminação O artigo 5º da Constituição Federal garante a igualdade entre os brasileiros, não permitindo a distinção entre cor, raça, sexo, religião, cultura etc. Diante do que foi acima explicado, conclui-se que os portadores do vírus HIV não podem sofrer discriminação por terem contraído tal doença. Curiosidade: Estados que reafirmam a não discriminação em razão da AIDS: Minas Gerais; São Paulo; Distrito Federal; Espírito Santo; Goiás; Paraná; Rio de Janeiro.

- Direitos em âmbito judicial Organizações de Sociedade civil, com o apoio do Departamento DST, AIDS e Hepatites Virais, recebem denúncias, assessoram vítimas de preconceito em razão da doença contraída (AIDS), fornecem informações necessárias sobre as leis brasileiras e as proteções conferidas aos soropositivos e acompanham ações judiciais gratuitamente. Como a pessoa portadora do vírus pode conviver com a doença e manter uma qualidade de vida, as legislações não estabelecem prioridade nos julgamentos, mas é possível a parte processual, portadora do vírus, requerer urgência na solução do processo. 13.5 Do apoio financeiro Em razão de doença grave, é possível que seja realizado o saque integral do Fundo de Garantia por tempo de Serviço (FGTS), fato este permitido também para os soropositivos.

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Aquele que possui a doença em questão pode receber, em razão de aposentadoria, reforma ou pensão, isentos de imposto de renda. A comprovação da doença deve ser feita mediante laudo pericial emitido por serviço médico oficial da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios. 13.6 Do apoio no trabalho Aquele que é portador do vírus HIV tem o direito de manter essa situação em sigilo, ainda que seja necessária a realização de exames admissionais e demissionais, sendo raras as situações em que se faz necessária a declaração de soropositivo, quais sejam transfusão de sangue, doação de órgãos, esperma e sangue. 13.7 Da Previdência Social • Terá direito ao auxílio doença se a incapacidade para trabalhar for superior ao período de 15 dias e inferior a 12 meses. • Será aposentado por invalidez, se contribuinte do INSS e a incapacidade para o trabalho perdurar por mais de 12 meses. • Receberá o benefício de prestação continuada, se for considerada incapacitada para a vida independente e para o trabalho, não é necessário que seja contribuinte do INSS. 13.8 Do auxílio nos transportes Esse auxílio não ocorre em todos os estados e municípios do Brasil. Alguns estados conferem aos portadores de HIV gratuidade nos transportes intermunicipais e alguns municípios conferem a gratuidade em transportes urbanos. 13.9 Dos meios de acesso e proteção dos portadores de HIV Existem unidades de saúde que oferecem o diagnóstico sorológico da infecção pelo HIV e orientações, como o Centro de Testagem e Aconselhamento (CTA) e o Centro de Orientação e Aconselhamento Sorológico (COAS). É possível ainda entrar em contato com o Disque saúde ou Disque AIDS: 0800611997 ou 0800162550. Os portadores de HIV nem sempre conhecem seus direitos e, para que detenham tais informações, contam com projetos de assessoria jurídica gratuita, além de contar com os Núcleos de Prática Jurídica das Faculdades, com a Ordem dos Advogados do Brasil, com a Defensoria Pública e com serviços dos Balcões de Direito e Centro de Referência em Direitos Humanos. Em caso de denúncia, é importante ter testemunhas e documentos que comprovem a situação.

14. DA PESSOA PORTADORA DE SOFRIMENTO PSÍQUICO 14.1 Do portador de sofrimento psíquico no Brasil A psiquiatria surgiu para ser a principal opção do tratamento dos que sofriam de doenças mentais, pois observaram que a internação, nas famosas Pineis de Paris, não era humana. Os “loucos” eram discriminados e sofriam diversas formas de preconceito. Em virtude disso, sempre se buscaram avanços e reformas capazes de alterar esse cenário de preconceitos. No Brasil, busca-se a reforma psiquiátrica para a promoção da cidadania de sujeitos tutelados, que sofrem com a doença que possuem e com a discriminação alheia, para que sejam garantidos cidadania, respeito aos seus direitos e individualidade, além de outras diretrizes.

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As diretrizes pretendidas são: • Modificação do sistema de tratamento clínico, eliminando a internação e visando sempre à integração da pessoa que sofre transtornos com a sociedade; • Inclusão, nessa reforma, dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), dos Centros de Convivência e Cultura, da cooperativa de trabalho protegido (Economia Solidária), das oficinas para que se gere renda e locais destinados à terapia, denominadas de “residências terapêuticas”, dentre outras. Em 1989, preocupado com o grande número de manicômios e com a falta de cuidado com os portadores de sofrimentos psíquicos, o Deputado Paulo Delgado propõe o Projeto de Lei que visa a extinguir, de forma progressiva, com os manicômios e regulamentar os direitos dessa “classe”. Contudo, apenas em 2001, a Lei foi promulgada com alterações ao Projeto inicial e sem abordar a extinção progressiva dos manicômios. Surge, portanto, em 06 de abril de 2001, a Lei Federal 10.216 que redireciona a assistência em âmbito da saúde mental, oferecendo tratamentos em serviços de base comunitária e estabelece a proteção e os direitos das pessoas com transtornos mentais. Discutem-se, nas Conferências Nacionais, políticas públicas para melhorarem os serviços prestados nos CAPS e construir novos Centros, bem como residências terapêuticas, conforme as necessidades de cada comunidade. As políticas públicas de Saúde Mental devem atentar-se para os meios de acesso da população às informações sobre as doenças mentais, sobre os tratamentos, além de analisar as demandas de cada comunidade e buscar a melhoria nos serviços para os usuários, permitindo a inclusão e a inserção destes na sociedade. Em setembro de 2009, realizou-se a Marcha dos Usuários- por Reforma Antimanicomial, com o apoio de diversas entidades, incluindo o Conselho Federal de Psicologia para: • defender o cumprimento da lei 10.216 de 2001; • requerer a realização de Nova Conferência Nacional de Saúde Mental, com o intuito de discutir passos fundamentais para a reforma psiquiátrica; • exigir a implantação do programa criado pelo Ministério da Saúde em 2003, “De volta pra Casa”, que objetivava a reintegração social daqueles que tiveram longas internações. 14.2 Dos direitos do portador de sofrimento psíquico A Lei 10.216 de 2001 surgiu para garantir direitos das pessoas com sofrimentos psíquicos e modificar o cenário nacional de descaso e desrespeito com os que possuíam a doença ou necessitavam de internações. Em suma, os direitos dos portadores de transtornos mentais são, entre outros: o direito de serem protegidos contra o preconceito; o acesso ao tratamento que deve ser realizado de forma humana e respeitosa pelos membros da saúde; a proteção contra o abuso; as informações detalhadas sobre a doença; o livre acesso à comunidade; os tratamentos terapêuticos menos invasivos; a reinserção social (...). Em contrapartida, o Estado deve garantir esses direitos e desenvolver políticas de saúde mental; promover as ações com a participação da sociedade e da família; permitir a internação apenas em casos necessários, com laudos médicos; e garantir aos internos os serviços médicos, de assistentes sociais, psicólogos, lazer etc. LEI No 10.216, DE 6 DE ABRIL DE 2001. Dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental. Artigo 1º: Os direitos e a proteção das pessoas acometidas de transtorno mental, de que trata esta Lei, são assegurados sem qualquer forma de discriminação quanto à raça, cor, sexo, orientação sexual, religião, opção política, nacionalidade, idade, família, recursos econômicos e ao grau de gravidade ou tempo de evolução de seu transtorno, ou qualquer outra. 80


Artigo. 2º: Nos atendimentos em saúde mental, de qualquer natureza, a pessoa e seus familiares ou responsáveis serão formalmente cientificados dos direitos enumerados no parágrafo único deste artigo. Parágrafo único. São direitos da pessoa portadora de transtorno mental: I. ter acesso ao melhor tratamento do sistema de saúde, consentâneo às suas necessidades; II. ser tratada com humanidade e respeito e no interesse exclusivo de beneficiar sua saúde, visando a alcançar sua recuperação pela inserção na família, no trabalho e na comunidade; III. ser protegida contra qualquer forma de abuso e exploração; IV. ter garantia de sigilo nas informações prestadas; V. ter direito à presença médica, em qualquer tempo, para esclarecer a necessidade ou não de sua hospitalização involuntária; VI. ter livre acesso aos meios de comunicação disponíveis; VII. receber o maior número de informações a respeito de sua doença e de seu tratamento; VIII. ser tratada em ambiente terapêutico pelos meios menos invasivos possíveis; IX. ser tratada, preferencialmente, em serviços comunitários de saúde mental. Artigo. 3º: É responsabilidade do Estado o desenvolvimento da política de saúde mental, a assistência e a promoção de ações de saúde aos portadores de transtornos mentais, com a devida participação da sociedade e da família, a qual será prestada em estabelecimento de saúde mental, assim entendidas as instituições ou unidades que ofereçam assistência em saúde aos portadores de transtornos mentais. Artigo. 4º: A internação, em qualquer de suas modalidades, só será indicada quando os recursos extra-hospitalares se mostrarem insuficientes. § 1o O tratamento visará, como finalidade permanente, à reinserção social do paciente em seu meio. § 2o O tratamento em regime de internação será estruturado de forma a oferecer assistência integral à pessoa portadora de transtornos mentais, incluindo serviços médicos, de assistência social, psicológicos, ocupacionais, de lazer, e outros. § 3o É vedada a internação de pacientes portadores de transtornos mentais em instituições com características asilares, ou seja, aquelas desprovidas dos recursos mencionados no § 2o e que não assegurem aos pacientes os direitos enumerados no parágrafo único do art. 2o. Artigo. 5º: O paciente há longo tempo hospitalizado ou para o qual se caracterize situação de grave dependência institucional, decorrente de seu quadro clínico ou de ausência de suporte social, será objeto de política específica de alta planejada e reabilitação psicossocial assistida, sob responsabilidade da autoridade sanitária competente e supervisão de instância a ser definida pelo Poder Executivo, assegurada a continuidade do tratamento, quando necessário. Artigo. 6º: A internação psiquiátrica somente será realizada mediante laudo médico circunstanciado que caracterize os seus motivos. Parágrafo único. São considerados os seguintes tipos de internação psiquiátrica: I. internação voluntária: aquela que se dá com o consentimento do usuário; II. internação involuntária: aquela que se dá sem o consentimento do usuário e a pedido de terceiro; e III. internação compulsória: aquela determinada pela Justiça. Artigo. 7º: A pessoa que solicita voluntariamente sua internação, ou que a consente, deve assinar, no momento da admissão, uma declaração de que optou por esse regime de tratamento. Parágrafo único. O término da internação voluntária dar-se-á por solicitação escrita do paciente ou por determinação do médico assistente. Artigo. 8º: A internação voluntária ou involuntária somente será autorizada por médico devidamente registrado no Conselho Regional de Medicina - CRM do Estado onde se localize o estabelecimento.

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§ 1o A internação psiquiátrica involuntária deverá, no prazo de setenta e duas horas, ser comunicada ao Ministério Público Estadual pelo responsável técnico do estabelecimento no qual tenha ocorrido, devendo esse mesmo procedimento ser adotado quando da respectiva alta. § 2o O término da internação involuntária dar-se-á por solicitação escrita do familiar, ou responsável legal, ou quando estabelecido pelo especialista responsável pelo tratamento. Artigo. 9º: A internação compulsória é determinada, de acordo com a legislação vigente, pelo juiz competente, que levará em conta as condições de segurança do estabelecimento, quanto à salvaguarda do paciente, dos demais internados e funcionários. Artigo. 10: Evasão, transferência, acidente, intercorrência clínica grave e falecimento serão comunicados pela direção do estabelecimento de saúde mental aos familiares, ou ao representante legal do paciente, bem como à autoridade sanitária responsável, no prazo máximo de vinte e quatro horas da data da ocorrência. Artigo 11: Pesquisas científicas para fins diagnósticos ou terapêuticos não poderão ser realizadas sem o consentimento expresso do paciente, ou de seu representante legal, e sem a devida comunicação aos conselhos profissionais competentes e ao Conselho Nacional de Saúde. Artigo. 12: O Conselho Nacional de Saúde, no âmbito de sua atuação, criará comissão nacional para acompanhar a implementação desta Lei. Artigo 13: Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. 14.3 Dos meios de acesso e proteção do portador de sofrimento psíquico Os portadores de sofrimento psíquico possuem diversos direitos inseridos nas legislações nacionais e nos tratados internacionais. A violação desses direitos é comumente relatada pela mídia ou por familiares. Para cessar tais abusos e desrespeitos, é necessário que se realizem denúncias aos Órgãos competentes, busquem apoio policial, da Promotoria ou Defensoria Pública, da Ordem dos Advogados do Brasil e, caso a violação tenha ocorrido em hospitais, deve-se denunciar ao Conselho Regional de Medicina ou de Enfermagem, para que as pessoas competentes possam tomar as providências legais e adequadas.

15. DO TRATAMENTO PARA DEPENDÊNCIA QUÍMICA 15.1 A ONU e o dependente químico A ONU possui um escritório próprio para tratar das questões que envolvem as drogas e os crimes, denominado de UNODC. Essa agência abrange duas importantes áreas, a saúde e o Estado de Direito. Como aborda essas áreas, a UNODC trabalha em prol do combate do tráfico de seres humanos, do crime organizado, do terrorismo, da corrupção, da lavagem de dinheiro e do controle das drogas, além de, alternativamente, auxiliar na prevenção da AIDS para os usuários de droga e os encarcerados. A UNODC utiliza-se de três convenções da ONU, com o intuito de ajudar os países a estruturarem suas legislações. São elas: Convenção Única sobre Entorpecentes (1961), emendada pelo protocolo de 1972; Convenção sobre Substâncias Psicotrópicas (1971) e Convenção contra o Tráfico Ilícito e Substâncias Psicotrópicas. O Conselho Econômico e Social da ONU estabeleceu, em 1946, a Comissão dos Narcóticos (CND) como órgão central para as questões relacionadas a drogas. Essa Comissão monitora a implementação das três convenções (citadas anteriormente), podendo atuar em todas as áreas relacionadas a essas convenções. A UNODC publica, anualmente, um relatório mundial sobre drogas. Nesse relatório, há menção quanto à produção, ao tráfico, ao consumo de drogas em todo o mundo. Ele se baseia em um questionário enviado aos Estados-Membros.

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15.2 Do dependente químico no Brasil A droga existe em todos os países do Mundo. Cada país possui a sua legislação e condena determinado tipo de droga. Em alguns países, a maconha é liberada para uso medicinal; em outros, não é ilícita. O Brasil não permitiu o uso de drogas em seu território. Estudos comprovam que o uso constante de drogas leva à dependência, provocando diversas alterações na saúde, além de danos cerebrais que permanecem, mesmo quando o usuário não mais as usa. A droga afeta a memória, o raciocínio, a linguagem, a atenção e as funções executivas. As histórias brasileiras apontam que a uso de drogas está “generalizado”, não há um limite de idade; pelo contrário, crianças são prejudicadas pelo uso de drogas desde a sua gestação no útero materno. Crescem acreditando que este é o melhor prazer, que o estudo não dá futuro e que a vida se resume em cheirar cola, vender crack, fumar maconha, dar um “teco em uma carrerinha” de cocaína, usar “balas e doces” em raves, ser o chefe da boca etc.. Não há classe social específica. Cada vez mais se ouvem relatos de pessoas da classe média e alta envolvidas e internadas pelo uso descontrolado de entorpecentes. A droga tem esse efeito devastador (atinge todas as classes, todas as idades), em virtude da sensação de prazer que ela proporciona, mas, na verdade, o dependente químico encontra-se doente. Pesquisas revelam que, a cada três horas, uma pessoa é afastada do trabalho para realizar tratamento contra a dependência química. Os tratamentos são realizados, em grande escala, em clínicas de reabilitação, e são caros, o que impossibilita o tratamento de pessoas carentes e sem recursos financeiros. Diversas ONG`S e Grupos de apoio realizam trabalhos com os dependentes químicos e seus familiares, auxiliando-os no tratamento, indicando-lhes a melhor forma de agir e como evitar os anseios da ausência da droga. 15.3 Dos direitos para o dependente químico Os dependentes químicos são dotados de direitos fundamentais e devem ser tratados de forma digna. A Lei 11.343, de 23 de agosto de 2006, institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (SISNAD). Esse Sistema tem como finalidade articular, organizar a prevenção do uso de drogas ilícitas, reprimir a produção e o tráfico de drogas, além de cuidar da reinserção do dependente de drogas. Artigo. 3º O Sisnad tem a finalidade de articular, integrar, organizar e coordenar as atividades relacionadas com: I. a prevenção do uso indevido, a atenção e a reinserção social de usuários e dependentes de drogas; II. a repressão da produção não autorizada e do tráfico ilícito de drogas. Artigo. 4º São princípios do Sisnad: I. o respeito aos direitos fundamentais da pessoa, especialmente quanto à sua autonomia e à sua liberdade; II. o respeito à diversidade e às especificidades populacionais existentes; III. a promoção dos valores éticos, culturais e de cidadania do povo brasileiro, reconhecendo-os como fatores de proteção para o uso indevido de drogas e outros comportamentos correlacionados; IV. a promoção de consensos nacionais, de ampla participação social, para o estabelecimento dos fundamentos e estratégias do Sisnad; V. a promoção da responsabilidade compartilhada entre Estado e Sociedade, reconhecendo a importância da participação social nas atividades do Sisnad; VI. o reconhecimento da intersetorialidade dos fatores correlacionados com o uso indevido de drogas, com a sua produção não autorizada e o seu tráfico ilícito; VII. a integração das estratégias nacionais e internacionais de prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas e de repressão à sua produção não autorizada e ao seu tráfico ilícito;

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VIII. a articulação com os órgãos do Ministério Público e dos Poderes Legislativo e Judiciário visando à cooperação mútua nas atividades do Sisnad; IX. a adoção de abordagem multidisciplinar que reconheça a interdependência e a natureza complementar das atividades de prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas, repressão da produção não autorizada e do tráfico ilícito de drogas; X. a observância do equilíbrio entre as atividades de prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas e de repressão à sua produção não autorizada e ao seu tráfico ilícito, visando a garantir a estabilidade e o bem-estar social; XI. a observância às orientações e normas emanadas do Conselho Nacional Antidrogas - Conad. Artigo. 5º O Sisnad tem os seguintes objetivos: I. contribuir para a inclusão social do cidadão, visando a torná-lo menos vulnerável a assumir comportamentos de risco para o uso indevido de drogas, seu tráfico ilícito e outros comportamentos correlacionados; II. promover a construção e a socialização do conhecimento sobre drogas no país; III. promover a integração entre as políticas de prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas e de repressão à sua produção não autorizada e ao tráfico ilícito e às políticas públicas setoriais dos órgãos do Poder Executivo da União, Distrito Federal, Estados e Municípios; IV. assegurar as condições para a coordenação, a integração e a articulação das atividades de que trata o art. 3o desta Lei. 15.4 Dos meios de acesso e proteção do dependente químico O governo utiliza-se de meios de comunicação para alertar a sociedade dos efeitos maléficos das drogas, sejam as entorpecentes ilícitas, sejam as lícitas permitidas (bebidas alcoólicas e cigarros). As famílias e os dependentes devem buscar apoio nas casas de reabilitação, nos Órgãos especializados, nas ONG`S, nos Grupos como Alcoólicos Anônimos (AA), Narcóticos Anônimos (NA) etc..

16. CONVENÇÃO CONTRA A TORTURA E OUTROS TRATAMENTOS OU PENAS CRUÉIS, DESUMANAS E DEGRADANTES Os historiadores apresentam relatos de que a tortura está presente e acompanha o desenvolvimento humano há muito tempo, sendo tratada com cuidado pela comunidade internacional através da Resolução 39/46 da Assembleia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1984. Para muitos, esse ato significou a maior demonstração de preocupação com a proteção dos direitos humanos, uma vez que a prática de tortura, de penas desumanas, cruéis e degradantes ferem os princípios básicos contidos na ONU, que se estruturou com o objetivo de espalhar a paz e a segurança, tratando os seres humanos com igualdade, e punindo, quando necessário, de forma a respeitar as leis internas e internacionais, sempre observando os direitos inerentes à condição de ser humano e de sua dignidade. Curiosidade: O Brasil ratificou (aprovou) esta Convenção em 28 de setembro de 1989.

Esse tratado surgiu com o intuito de proteger os seres humanos de passagens vexatórias e de excessos nas penalidades, sendo protetor, portanto, da dignidade da pessoa e do cumprimento das leis. A Convenção em análise é dividida em partes: a primeira aborda os sujeitos ativos (quem pratica a agressão) e os sujeitos passivos (quem sofre a agressão) da tortura, as ações que competem ao Estado que vierem a aderir a essa convenção e a definição de tortura; a segunda parte estabelece um Comitê contra a tortura e o modo de agir, ou “modus operandi”: membros, mandato, posicionamentos, relatórios etc., enquanto a terceira parte cuida da adesão dos Estados-Membros e das emendas que possam surgir.

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O Comitê contra a tortura tem competência para instaurar inquérito em casos de suspeitas da prática de tortura em territórios dos Estados-Membros, desde que essa suspeita seja fundamentada e pode, ainda, analisar queixas apresentadas por Estados-Membros ou particulares contra o Estado que tenha reconhecido a competência do Comitê. Não encontramos na Convenção um conceito concreto de tortura. A lei tratou apenas de dizer o que entende por crime de tortura: “Artigo 1º: Para os fins desta Convenção, o termo “tortura” designa qualquer ato pelo qual uma violenta dor ou sofrimento, físico ou mental, é infligido intencionalmente a uma pessoa, com o fim de se obter dela ou de uma terceira pessoa informações ou confissão; de puni-la por um ato que ela ou uma terceira pessoa tenha cometido ou seja suspeita de ter cometido; de intimidar ou coagir ela ou uma terceira pessoa; ou por qualquer razão baseada em discriminação de qualquer espécie, quando tal dor ou sofrimento é imposto por um funcionário público ou por outra pessoa atuando no exercício de funções públicas, ou ainda por instigação dele ou com o seu consentimento ou aquiescência. Não se considerará como tortura as dores ou sofrimentos que sejam consequência, inerentes ou decorrentes de sanções legítimas.” Com essa convenção, os Estados passam a ter um parâmetro de ação, uma estratégia de atuação, pois, ao aderirem à Declaração Universal dos Direitos Humanos, são convocados a tratar, com maior seriedade, a violação destes. Consequentemente, o Estado que viola esses direitos sofre um constrangimento político e moral, deve apresentar justificativa e é compelido a demonstrar possíveis reformas internas. 16.1 Da tortura no Brasil Recentemente, em setembro de 2011, a presidente Dilma Rousseff encaminhou, ao Congresso Nacional, o Projeto de Lei que visa à criação de um Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura e de um Comitê Nacional de Combate à Tortura. Esse Sistema contará com peritos e técnicos que poderão entrar nas instituições fechadas do Brasil (penitenciárias, delegacias, instituições de permanência de idoso, pessoas com sofrimento psíquico), enquanto o Comitê será formado por integrantes de diversos ministérios e entidades da sociedade civil que atuam na defesa dos apenados no Brasil. 16.2 Dos meios de acesso e proteção daquele que sofre tortura Existe, no Brasil, o Disque Direitos Humanos, que registra denúncias de diversos atos contrários aos descritos e garantidos na Declaração de Direitos Humanos. Assim, registra também, através do número 100, as queixas referente às práticas de tortura. Esse instrumento é coordenado pela Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos, em conjunto com as coordenações temáticas das áreas, criança, idoso, tortura etc., que desenvolvem as políticas específicas e a promoção dos Direitos Humanos de Grupos Sociais Vulneráveis na Secretaria de Direitos Humanos. O serviço funciona 24 horas, todos os dias da semana.

17. DA DEFESA DOS ÍNDIOS 17.1 Documento em defesa dos índios- Bartolomeu De Las Casas 1550 Frei Bartolomeu de Las Casas (assim conhecido em português), motivado pelo espírito aventureiro e explorador de riquezas, rapidamente se adaptou aos meios dos colonizadores. Assim, participou de ataques contra os indígenas e aceitava a exploração dessa população. Formou-se sacerdote e foi para a Ilha Espanhola como missionário, onde escutou, por volta de 1511, atentamente, o Sermão do Advento de Frei Antônio Montesinos, que defendia a dignidade dos indígenas, momento em que então se converteu e passou a defender as causas indígenas.

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Viajou à Espanha por numerosas vezes, apelando aos oficiais e aos governantes que atentassem aos direitos indígenas, dedicou-se por lutar em favor dos povos indígenas, por seus direitos, pela liberdade e pela dignidade, priorizava a evangelização. Consta da história que Frei Bartolomeu foi perseguido por colonizadores espanhóis. 17.2 Análise do debate entre Las Casas e Sepúlveda - Valladolid, 1550 e 1551 A verdadeira preocupação de Cônego Juan Ginés de Sepúlveda era justificar, perante o direito e a ética, os meios utilizados pelos espanhóis na conquista da América (que não tinham nada de cristãos e que tanto perturbavam sua consciência), lançando mão da doutrina de Santo Tomás de Aquino, exposta na Política, acerca da guerra justa e da teoria aristotélica da escravidão natural. Apesar da importância de Sepúlveda para o seu tempo, ele passou para a história como um homem reacionário, racista, defensor da escravidão e das ações criminosas dos conquistadores espanhóis. No ano de 1548, Bartolomeu de Las Casas entrou em conflito com Juan Ginés de Sepúlveda, ao impedir a publicação do livro Demócrates segundo, o qual considerava muito prejudicial à causa indígena. Em 1551, participou, como opositor de Sepúlveda, do debate de Valladolid, convocado por Carlos V, para discutir a questão do índio. Até o último ano de sua vida, lutou em defesa dos índios, opondo-se ao sistema de encomiendas. Nesse sistema, o trabalho compulsório realizado pelos índios era trocado por catequese. A Igreja não permitia o trabalho escravo para os “não negros”. Assim, a própria instituição dizia que o trabalho não era escravo, tratava-se de troca. Seu principal livro é a Apologética História, no qual descreve os acontecimentos ocorridos na América desde sua descoberta até o ano de 1520. A discussão acerca da conquista do Novo Mundo pode ser resumida à seguinte questão: é lícita a guerra promovida pelo Rei da Espanha contra os índios da América como meio de difundir o cristianismo entre eles? Essa questão, conforme Losada (1975), possui duas faces distintas: uma de direito, que consiste em saber se era justa a guerra movida contra os índios para convertê-los ao cristianismo; e outra, de fato, ou seja, acerca da alegada situação de inferioridade e de barbárie em que se encontravam os índios. É importante ressaltar que a questão, de fato, entrelaça-se com a de direito, pois significa também discutir se tal situação de inferioridade e barbárie era, perante o direito natural, por si só, justificativa para mover guerra contra os índios, como forma de tirá-los desse estado. Os problemas jurídicos decorrentes do descobrimento e da conquista do Novo Mundo não poderiam ser tratados pelos juristas, pois os índios não estavam submetidos aos espanhóis pela lei humana. Assim, diante da magnitude, das peculiaridades, da novidade e do vazio legislativo sobre a questão era necessário extrair, da concepção geral do mundo, princípios que fossem aplicáveis ao ordenamento jurídico. Conforme esclarece Garcia-Pelayo (1941), o direito natural era o responsável por fazer essa articulação entre a concepção geral do mundo e o ordenamento jurídico positivo. Portanto, os problemas decorrentes do descobrimento da América deveriam ser tratados numa dimensão jus naturalista. Sepúlveda entende que a guerra movida pelos espanhóis no Novo Mundo é justa, porque os índios se encontram em um estado tal de barbárie que se torna imperioso dominá-los pela força para libertá-los desse estado. Esse argumento é, indubitavelmente, a principal tese apresentada em Valladolid e constitui uma premissa fundamental para a resolução dos outros nós do debate.

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Las Casas defende que não se pode simplesmente generalizar o argumento de barbárie e, apoiando-se, como Sepúlveda o faz, na autoridade de Aristóteles, aplicá-lo aos índios da América. Antes se deve definir o conceito de barbárie e as diferentes classes de bárbaros e analisar em qual dessas estão os índios, se é que estão em alguma. Las Casas contesta o primeiro argumento de Sepúlveda, elaborando um estudo sobre os diferentes tipos de bárbaro, com o objetivo de verificar a qual classe Aristóteles atribuiu a característica de escravo por natureza e, ainda, se o índio também se enquadra nessa categoria. Sendo a resposta positiva, teria que concordar com Sepúlveda sobre a inferioridade do índio; sendo negativa, a teoria da escravidão natural não seria aplicável ao índio e a argumentação de Sepúlveda perderia seu principal pilar de sustentação. É interessante observar que Las Casas não atacou Aristóteles diretamente. Pelo contrário, logo no início de sua Apologia, ele ressalta ter buscado no filósofo grego, em SãoTomás de Aquino, e em outros doutores, também lembrados por seu opositor, as quatro classes de bárbaros que descreve. Essa tática demonstra o quanto o pensamento lascasiano havia amadurecido desde sua conversão à causa indígena em 1514, o que fica ainda mais claro, comparando a reação de Las Casas aos argumentos aristotélicos levados ao debate de Valladolid e aquela outra reação, em 1519, quando, perquirido por Juan de Quevedo sobre a aplicação da teoria da escravidão natural aos índios, respondeu nos seguintes termos: “Aristóteles é um pagão que brilha no fogo do inferno, cuja doutrina nós não temos necessidade de seguir, exceto no caso que seja conforme a verdade cristã.” (LAS CASAS, apud HANKE, 1958, p.63) (tradução nossa). Conforme Tosi (1998), o Dominicano teve que sair do terreno da polêmica com os encomienderos, com os missionários e simpatizantes da causa dos conquistadores, contra os quais sua formação teológica e sua experiência pessoal nas Índias era resposta suficiente, e entrar em um terreno pouco conhecido por ele, formado por homens cultos, dedicados ao estudo das humanidades. Sepúlveda entende que a guerra contra os índios também se justifica como castigo pelos crimes que eles cometem contra a lei natural com sua idolatria e sacrifício de vítimas humanas aos deuses. O segundo argumento utilizado por Sepúlveda, para justificar a guerra contra os índios, era o argumento mais convincente na defesa da teoria da inferioridade daqueles povos, pois os crimes por eles praticados, principalmente os sacrifícios humanos, constituíam, aos olhos europeus, prova evidente e incontestável dessa inferioridade. Las Casas entende que os príncipes cristãos e a Igreja não têm jurisdição para impor um justo castigo aos índios pelos crimes cometidos contra a lei natural. Ele refuta o segundo argumento de Sepúlveda, elaborando um extenso estudo sobre as formas como a Igreja Católica e os príncipes cristãos podem exercer jurisdição sobre um povo e verificando se alguma delas se aplica aos povos do Novo Mundo. Para que um povo possa castigar outro povo por seus pecados é necessário que este último esteja submetido àquele, isto é, seja súdito daquele, em razão de uma das seguintes causas: domicílio, origem, vassalagem, ou delito cometido. Em razão do domicílio, é súdito todo aquele que habitar em terras cristãs. Incluem-se nessa classe os judeus e mouros que vivem nos reinos dos príncipes cristãos. De acordo com Las Casas, esses povos devem se submeter às mesmas leis temporais que o restante da população. Se não observarem as leis do reino, deverão receber o justo castigo. Quanto às questões religiosas e espirituais, nem judeus, nem mouros, nem os idólatras estão submetidos à Igreja e aos príncipes cristãos; logo, não estão obrigados a observar os preceitos da religião cristã, como também não podem ser castigados por praticar seus ritos religiosos, por mais abomináveis que sejam. Os motivos pelos quais nem a Igreja, nem os príncipes cristãos podem castigar os pagãos por serem idólatras são os seguintes: • As próprias palavras de Cristo, no Evangelho de São Lucas, 10, deixam claro sua recusa em submeter aqueles que não creem em sua palavra. Naquela passagem, ao ser interpelado por uma pessoa que não era seu discípulo, respondeu do seguinte modo: “homem, quem me constituiu

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juiz sobre vós?” Assim, se não compete a Jesus julgar os infiéis, tampouco poderá a Igreja fazê-lo. • A afirmação feita por São Paulo de que não lhe compete julgar aqueles que estão fora. • O testemunho de São Jerônimo segundo o qual a Igreja somente pode julgar os fiéis. • Castigar os pagãos idólatras é uma ofensa ao evangelho, pois Cristo somente deu poder a seus apóstolos e à Igreja para edificar, não para destruir. • Quando o juiz superior reivindica para si uma causa, como Deus reivindicou o julgamento dos pagãos, o juiz inferior não pode pleitear a mesma causa, sendo nulo o julgamento feito por este último, por falta de jurisdição. • Conforme Santo Tomás de Aquino, a Igreja não pode castigar o paganismo daqueles que nunca foram batizados. • Nem a Igreja, nem seus membros, sejam príncipes, reis ou imperadores, podem castigar os idólatras que moram fora dos seus territórios ou distritos, pois não podem exercer jurisdição além de suas fronteiras (devemos considerar como territórios da Igreja somente aqueles em que seus habitantes receberam o batismo e abraçaram a fé em Cristo). • Santo Agostinho afirma, em sua obra, que os crimes cometidos pelos pagãos e idólatras devem ser punidos somente por Deus, pois assim está escrito nas Sagradas Escrituras. • É necessário que aquele que recebe os sacramentos esteja preparado para tal, ou seja, pronto para abraçar a fé cristã. Como os pagãos e infiéis estão fora da Igreja e não possuem a fé, não podem recebê-los, pois não estão preparados. Ora, sendo os sacramentos os atos justificantes da autoridade da Igreja sobre os homens, esta não possui jurisdição sobre os pagãos e infiéis. • A conversão dos infiéis que nunca ouviram a palavra de Cristo e que não se opuseram a escutá-la não deve ser iniciada pelo castigo dos pecados, mas pela oferta da indulgência, pela remissão dos pecados, e pelo incentivo à penitência, segundo ensinou Cristo a seus apóstolos. 17.3 A ONU e os índios A Assembleia Geral das Nações Unidas aprovou a Declaração das Nações Unidas sobre Direitos dos Povos Indígenas em 13 de Setembro de 2007. A Declaração estabelece parâmetros para a melhor relação entre Estados nacionais e os povos indígenas. Notam-se diversos princípios inseridos na Declaração. Dentre eles, estão: o princípio da isonomia (em todos são iguais perante a lei), a autodeterminação e a proibição de discriminação. Curiosidade: A ONU proclamou o ano de 1993 como o Ano Internacional das Populações Indígenas do Mundo.

Em 1993, a Assembleia Geral da ONU proclamou a Primeira Década Internacional dos Povos Indígenas do Mundo durante o período de 1995 a 2004. Nesse lapso temporal, objetivava-se a aprovação da Declaração das Nações Unidas sobre os Povos Indígenas. Contudo, tal Declaração não foi aprovada e, com o impasse nas negociações, em 2004 (último ano da Primeira Década Internacional dos Povos Indígenas do Mundo), os índios fizeram greve de fome em frente ao prédio da ONU, que aprovou a Segunda Década de 2005 até 2014. Apesar da aprovação da Declaração, muitos países não conseguem efetivar sua implementação. Tem-se relato que os povos indígenas, espalhados por diversas partes do mundo, sofrem com a violência e a discriminação. 17.4 Dos índios no Brasil O nome “índio” surgiu quando Cristovão Colombo chegou à América e acreditou ter encontrado uma nova rota, um novo caminho para as Índias. Assim, passou a chamar os nativos destas terras de índios. Quando os exploradores europeus ocuparam as terras brasileiras (por volta do ano 1500), depararam-se com a população indígena. Relatos nos levam a crer que o maior contato entre índios e europeus se deu no litoral brasileiro, onde predominam os tupis-guaranis. Politicamente, as aldeias indígenas não continham nenhuma organização “estatal” ou hierarquia entre os integrantes. Certamente, alguns guerreiros e chefes espirituais tinham maiores prestígios e destaque. 88


As atividades eram divididas entre mulheres, homens e adolescentes. Cada qual possuía sua função na aldeia, entre elas: a caça, os artesanatos, a agricultura etc.. A religião normalmente era invocada por meio de espíritos. Os diferentes grupos indígenas nutriam grande animosidade e, constantemente, guerreavam entre si. Em virtude disso, algumas tribos acreditavam, inclusive, que era possível absorver a força e as habilidades dos inimigos capturados. Os grupos mais desenvolvidos, como Incas, Astecas e Maias, cultivaram grandes impérios por meio da exploração dos menos favorecidos. A princípio, os índios eram vistos como selvagens, que deveriam ser domesticados e, com o passar do tempo, passaram a ser vistos como o “bom selvagem”, dono de uma moral intangível. Muitos índios morreram com a chegada dos europeus, através do processo de exploração, das guerras portuguesas contra as tribos menos desenvolvidas e, em especial, por meio do contágio de doenças trazidas pelos europeus contra as quais os índios não tinham imunidade. A perseguição, a miséria, o abandono e a migração indígena para as cidades (o que ocorreu durante e após a exploração europeia, em virtude do convívio, dos costumes etc.) fizeram com que especialistas acreditassem no fim dos povos indígenas até meados do século XX. Tal fato não ocorreu, mas a redução dessa população é assustadora. Curiosidade: Estima-se que a população indígena, na época dos exploradores europeus, variasse de 3 (três) a 5 (cinco) milhões. Hoje, estudos mostram que os índios brasileiros chegam a 1 (um) milhão.

As tribos indígenas possuem características próprias, que variam de acordo com a região ocupada, com os resquícios culturais deixados pelos exploradores etc. Porém, algumas características ainda são comuns entre as populações indígenas. São elas: • As moradias são coletivas. • Os rituais, as cerimônias e as festas reúnem pessoas de outras aldeias (existem os ritos de passagem dos adolescentes, os rituais de cura, casamentos etc.). • A arte nos artesanatos, no corpo, nas redes etc.. • Educação coletiva para todas as crianças. • As famílias monogâmicas ou poligâmicas. • A alimentação feita com base, principalmente, em milho, mandioca, guaraná, plantas, palmito etc.. Curiosidade: Em 19 de abril, comemora-se o dia do Índio.

17.5 Dos direitos dos Índios Em 1910, foi criado o Serviço de Proteção ao Índio (SPI), com o objetivo de prestar assistência à população indígena. Era um órgão constituinte do Ministério da Agricultura, Indústria e Comercio (MAIC), que foi substituído pela Fundação Nacional do Índio (FUNAI) em 1967. Esse órgão é competente por promover a educação básica, estimular os estudos, demarcar, proteger e assegurar aos índios as terras tradicionalmente ocupadas por eles, gerir seus patrimônios e fiscalizar suas terras, impedindo ações predatórias de posseiros, madeireiros, fazendeiros, garimpeiros, realizar levantamentos sobre os grupos indígenas e defender suas comunidades além de despertar na sociedade, em geral, o interesse pelas causas indígenas.

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Em 1973, foi editado o Estatuto do Índio (Lei 6001). Essa norma dispunha sobre as relações indígenas e o Estado, a sociedade etc., assim como no Código Civil de 1916. O índio era visto como relativamente incapaz, devendo ser tutelado por um órgão estatal. Com o surgimento da Constituição Federal de 1988, o índio passou a ter novo tratamento em diversos aspectos, mas permanece com o direito inerente aos seres humanos, quais sejam, saúde, educação, cultura, lazer etc.. O advento da Constituição veio para ampliar o reconhecimento, o tratamento do povo indígena. Dentre as principais alterações, podemos destacar as seguintes: • As terras ocupadas tradicionalmente pelos índios passam a ser bens da união. Assim, incorporam-se além das áreas de ocupação permanente e de coleta, todos os espaços necessários à manutenção e preservação das particularidades culturais de cada grupo indígena. Artigo 20 CF/88: “São bens da União: Inciso XI - as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios.”. • Apenas a União pode legislar sobre as populações indígenas. Artigo 22 CF/88: “Compete privativamente à União legislar sobre: Inciso XIV – populações indígenas.”. • A exploração e o aproveitamento de recursos das terras indígenas só podem ser autorizados pelo Congresso Nacional. Artigo 49 CF/88: “É de competência exclusiva do Congresso Nacional: Inciso XVI- autorizar, em terras indígenas, a exploração e o aproveitamento de recursos hídricos e a pesquisa e lavra de riquezas naturais”. • Os juízes federais são competentes para julgar as disputas sobre os direitos indígenas, enquanto o Ministério Público tem como função defender os direitos e interesses dessa população. Artigo 109 CF/88: “Aos juízes federais competem processar e julgar: Inciso XI- a disputa sobre direitos indígenas” Artigo 129 CF/88: “São funções institucionais do Ministério Público: Inciso V- defender judicialmente os direitos e interesses das populações indígenas” • O Estado garantirá acesso à cultura. Artigo 215 CF/88: “O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais-. Parágrafo 1º - O Estado protegerá as manifestações das culturas populares, indígenas e afro-brasileiras, e das de outros grupos participantes do processo civilizatório nacional.” • Os artigos 231 e 232 da Constituição estabelecem os direitos dos índios, dos quais destacamos os seguintes: reconhecimento da identidade cultural própria e diferenciada (organização social, costumes, línguas, crenças e tradições), direito às terras demarcadas e protegidas pela União, o direitos de permanecerem como índios (direito que antecede a criação do Estado), o usufruto das riquezas do solo, lagos e rios e a posse permanente das terras que, originalmente, ocupam, as terras indígenas são inalienáveis e indisponíveis e os direitos que os índios exercem sobre elas são imprescritíveis, os grupos não podem ser removidos de suas terras, salvo em casos de catástrofes ou epidemias etc.. Artigo 231 CF/88: “São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens. Parágrafo 1º - São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.

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Parágrafo 2º - As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes. Parágrafo 3º - O aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, a pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas só podem ser efetivados com autorização do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades afetadas, ficando-lhes assegurada participação nos resultados da lavra, na forma da lei. Parágrafo 4º - As terras de que trata este artigo são inalienáveis e indisponíveis, e os direitos sobre elas, imprescritíveis. Parágrafo 5º - É vedada a remoção dos grupos indígenas de suas terras, salvo, “ad referendum” do Congresso Nacional, em caso de catástrofe ou epidemia que ponha em risco sua população, ou no interesse da soberania do País, após deliberação do Congresso Nacional, garantido, em qualquer hipótese, o retorno imediato logo que cesse o risco. Parágrafo 6º - São nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras a que se refere este artigo, ou a exploração das riquezas naturais do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes, ressalvado relevante interesse público da União, segundo o que dispuser lei complementar, não gerando a nulidade e a extinção direito a indenização ou a ações contra a União, salvo, na forma da lei, quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de boa fé. Parágrafo 7º - Não se aplica às terras indígenas o disposto no art. 174, § 3º e § 4º.”. Artigo 232CF/88: “Os índios, suas comunidades e organizações são partes legítimas para ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses, intervindo o Ministério Público em todos os atos do processo.”. Com todas as modificações realizadas pela Constituição Federal, faz-se necessária revisão do Estatuto do índio. Este ainda está em vigor, mas só deve ser aplicado àquilo que não é contrário à determinação constitucional. Até 1993, as terras indígenas deveriam estar demarcadas (a contar da promulgação da Constituição Federal o prazo para a demarcação das terras seria de 5 anos), mas isto não ocorreu. Em resumo, o grande anseio dos índios brasileiros é a demarcação de todas as suas áreas e a revisão do Estatuto. Dos meios de acesso e proteção aos Índios Os índios devem buscar apoio, quando ocorrer violações a seus direitos na FUNAI, nos Órgão de defesa do meio ambiente, nas delegacias e Promotorias, além de contarem com a Ordem dos Advogados do Brasil.

18. DA DOUTRINA SOCIAL DA IGREJA - DSI O contexto social sofreu diversas alterações com o surgimento da sociedade industrial (final do século XIX), uma vez que nascia a massa assalariada e, consequentemente, a organização social se modificava. A Igreja começou a perceber as mudanças causadas pela relação emprego e salário (trabalho e capital), que destoavam daquilo que acreditavam ser a “justa estrutura social”. Muitos Papas passaram a promulgar suas encíclicas desde então. Entretanto, a DSI só foi sistematizada em 2004, fruto de trabalho do Pontifício Conselho de Justiça e Paz. (Exemplos de encíclicas: Em 1891, Leão XIII promulgou a encíclica Rerum Novarumsentindo a urgência dos novos tempos seguindo-se a

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ela a encíclica Quadragesimo anno, de Pio XI em 1931. O papa João XXIII publicou, em 1961, a Mater et magistra e Paulo VI, em 1967 a encíclica Populorum Progressio, e a carta apostólica Octagesima adveniens, em 1971. João Paulo II não foi menos preocupado com o tema da questão social e publicou três encíclicas: Laborens exercens, (1981), Sollicitudo rei socialis (1987) e, finalmente, Centesimus annus em 1991, pouco tempo depois da queda do Muro de Berlim). Os ensinamentos constantes nas encíclicas e pronunciamentos dos Papas, ao longo dos anos, formam a Doutrina Social da Igreja. Essa Doutrina foi enriquecida pelos padres teólogos, canonistas, pensadores católicos desde a Idade Média e visa a adotar princípios, critérios e diretrizes gerais a respeito da organização social e política dos povos e das nações, levando os homens a refletirem sobre sua participação efetiva na construção da sociedade. A Doutrina aborda diversos temas como a dignidade, a importância da família, os direitos humanos, participação na sociedade, a manutenção e a promoção da paz, a comunidade política, a economia, o papel do Estado, o direito ao trabalho, o desenvolvimento dos povos etc.. 18.1 Princípios e Valores da Doutrina Social da Igreja Temos como princípios básicos da DSI, os seguintes: • A dignidade da pessoa, como criatura à imagem e semelhança de Deus e a igual dignidade de todas as pessoas; • o respeito à vida humana; • o princípio de associação; • o princípio da participação; • a opção preferencial pelos pobres; • o princípio da solidariedade; • o princípio da subsidiariedade; • o princípio do bem comum; • o princípio da destinação universal dos bens. A DSI classifica os princípios da ‘’dignidade da pessoa’’ do ‘’bem comum’’, da ‘’subsidiariedade’’ e o da ‘’solidariedade’’, como de caráter geral e fundamental, permanentes e universais. Em relação aos valores que fundamentam e presidem a vida social temos: • Verdade: O homem tende naturalmente pela busca e prática da verdade. Deve honrá-la e testemunhá-la. • Liberdade: Toda pessoa, criada à imagem e semelhança de Deus, tem o direito natural de ser reconhecida como ser livre e responsável. Todos devem a cada um esta obrigação de respeito. O homem não pode, em nome da liberdade, ser egoísta e buscar a satisfação de seu próprio interesse e gozo dos bens terrenos. • Justiça: Para São Tomás de Aquino, consiste na “vontade perpétua e constante de dar a cada um o que lhe é devido”. A justiça, contudo, não é uma simples convenção humana, porque “o que é justo não é originalmente determinado pela lei, mas pela identidade profunda do ser humano”. - Princípio do bem comum É a busca pelas condições de vida social que permite à sociedade como um todo e a cada um de seus membros atingirem a própria perfeição. Para que isto ocorra, todos devem “trabalhar” em prol desse objetivo, de acordo com suas possibilidades e visando ao desenvolvimento. Os governantes devem agir guiados pela busca do bem comum, visando a uma justiça que seja de fato justa e equilibrada, para que os setores da sociedade se unam e convivam de forma harmoniosa apesar dos diversos interesses.

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- Princípio da Destinação final dos bens A propriedade e a posse dos bens devem ser acessíveis e adquiridas de forma produtiva, de modo que cessem as necessidades das pessoas, devendo ser a destinação final dos bens igualitária entre as pessoas, evitando a pobreza. - Princípio da Subsidiariedade Este princípio dista que o Estado não pode intervir no corpo social e na sociedade civil além do necessário. Deve, portanto, respeitar e proteger a família, as ONG`S, as associações, as entidades, os grupos e exercer atividade supletiva para complementar aquilo que foi iniciado por estes entes. - Participação na vida Social e Política A participação é, além de um direito, um dever de todos, que devem agir de forma consciente e responsável. Toda democracia deve ser participativa, contar com a participação de seus destinatários. - Princípio da Solidariedade Com o desenvolvimento mundial, com a interdependência do homem e a globalização, aumentam as possibilidades de relacionamento entre as pessoas. O Papa João Paulo II “conceituou e explicou a solidariedade da seguinte forma: (...) “a solidariedade, portanto, não é um sentimento de compaixão vaga ou de enternecimento superficial pelos males sofridos por tantas pessoas, próximas ou distantes, pelo contrário, é a ‘determinação firme e perseverante’ de se empenhar pelo ‘bem comum’; ou seja, pelo bem de todos e de cada um, porque todos nós somos verdadeiramente responsáveis por todos. Esta determinação está fundada na firme convicção de que as causas que entravam o desenvolvimento integral são aquela avidez do lucro e aquela sede do poder de que se falou. A prática da solidariedade no interior de cada sociedade é válida quando os seus membros se reconhecem uns aos outros como pessoas. Aqueles que contam mais, dispondo de uma parte maior de bens e de serviços comuns, hão de sentir-se responsáveis pelos mais fracos e estar dispostos a compartilhar com eles o que possuem. Por seu lado, os mais fracos, na mesma linha de solidariedade, não devem adotar uma atitude meramente passiva ou destrutiva do tecido social; mas, embora defendendo os seus direitos legítimos, fazer o que lhes compete para o bem de todos. Os grupos intermédios, por sua vez, não deveriam insistir egoisticamente nos seus próprios interesses, mas respeitar os interesses dos outros.”. - A Família A Doutrina Social da Igreja aponta a família como elo importante ao desenvolvimento da pessoa e da sociedade. É considerada a primeira sociedade natural, titular de direitos próprios e originários, que nasce da íntima comunhão de vida e de amor. - O Trabalho Humano O trabalho é algo “inerente” ao ser humano, pertence à sua condição originária, não pode ser entendido como castigo ou punição. É apontado como instrumento capaz de dirimir a pobreza. Deve ser considerado como essencial, mas não como a razão de ser do homem. Por meio do trabalho, o homem passa a criar, a estudar, a buscar inovações, assim acaba por desejar o bem comum, o desenvolvimento social, o que faz com este seja uma obrigação de todos. Afinal, ninguém deve viver à custa do trabalho dos outros. O trabalho é que garante o direito de constituir família, o direito de propriedade etc. Assim, é tido como um direito fundamental. - A Propriedade Privada e a Função Social A Doutrina Social da Igreja sustenta que o direito à propriedade privada está subordinado ao princípio da destinação universal dos bens e não deve constituir um impedimento ao trabalho. Essa doutrina considera indispensável uma reforma agrária justa e eficiente.

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- Direitos do Trabalhador Os direitos do trabalhador se baseiam na natureza da pessoa e na sua dignidade. A Igreja enumera dentre outros, os seguintes direitos: • Justa remuneração; • direito ao repouso; • trabalho em ambiente que não lese a sua saúde e a integridade moral; • respeito à sua consciência; • auxílios aos desempregados e às suas famílias; • direito à aposentadoria e à pensão nos casos de doença; • direito a auxílios e benefícios sociais, no caso da maternidade; • direito de reunião e associação. O salário deve ser digno e suficiente para o sustento da família, não sendo suficiente para essa determinação apenas o acordo entre empregador e empregado. A DSI reconhece a greve como meio justo e legítimo, desde que este seja o último recurso aplicado. O Sindicato deve ser instrumento de solidariedade entre os trabalhadores e significar fatores construtivos da ordem social, sempre agindo de forma a atingir o bem comum. Deve garantir a justiça entre os funcionários e empregadores e buscar a igualdade. - A economia A atividade econômica deve estar à disposição da sociedade, assim como as riquezas devem ser partilhadas. Afinal, esta não é a razão da existência do ser humano (acumular riquezas). A Doutrina social admite uma economia de mercado ou economia livre, uma perspectiva de desenvolvimento integral e solidário. A atividade econômica está submetida não só às suas próprias regras, mas também às da moral e da ética. - A iniciativa privada A liberdade da pessoa no campo econômico é um valor fundamental e um direito inalienável a ser promovido e tutelado. Entretanto, não pode ser a empresa um local apenas destinado à arrecadação de valores. Deve-se levar em consideração que existem pessoas realizando os trabalhos prestados pelas empresas e que essas pessoas são dotadas de dignidade e formam a sociedade civil. A doutrina social reconhece a justa função do lucro, mas o lucro por si só não indica que a empresa esteja servindo adequadamente à sociedade, não sendo lícito obter lucro à custa da dignidade do trabalhador, da sua humilhação e da violação dos seus direitos. - As instituições econômicas • O livre mercado: Os recursos naturais devem ser analisados e utilizados de forma racional e econômica. Assim, a concorrência e o livre mercado são importantes pela capacidade de permitirem a produção de bens e serviços e incentivar a criação e a inovação. • O Estado: O Estado deve atuar de acordo com o princípio da subsidiariedade, para criar condições que facilitem o livre exercício da atividade econômica, devendo, ainda, impor limites nas ações dos grandes empresários, visando à proteção da parte frágil.

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• Os Consumidores: A Doutrina Social da Igreja permite o consumo, mas alerta para que não ocorra o exagero e o esquecimento da caridade, evitando o consumismo e o suprimento da necessidade superficial. A paz do mundo começa em mim, se eu tenho amor, com certeza, sou feliz. Se eu faço o bem ao meu irmão, tenho a grandeza dentro do meu coração. Chegou a hora da gente construir a paz, ninguém suporta mais o desamor. Paz pela paz – pelas crianças; Paz pela paz- pelas florestas Paz pela paz- pela coragem de mudar; Paz pela paz – pela justiça; Paz pela paz- a liberdade; Paz pela paz- pela beleza de amar A paz do mundo começa em mim, se eu tenho amor, com certeza, sou feliz. Se eu faço o bem ao meu irmão, tenho a grandeza dentro do meu coração. Chegou a hora da gente construir a paz, ninguém suporta mais o desamor. Paz pela paz- pro mundo novo; Paz pela paz- a esperança; Paz pela paz- pela coragem de mudar; Paz pela paz- pela justiça; Paz pela paz-a liberdade; Paz pela paz- pela beleza de te amar.

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DECLARAÇÃO ISLÂMICA UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS Índice: I. Direito à Vida II. Direito à Liberdade III. Direito à Igualdade e Proibição de Discriminação Ilícita IV. Direito à Justiça V. Direito a um Julgamento Justo VI. Direito à Proteção contra o Abuso de Poder VII. Direito à Proteção contra a Tortura VIII. Direito à Proteção da Honra e da Reputação IX. Direito ao Asilo X. Direito das Minorias XI. Direito e Obrigação de Participação na Condução e Direção da Coisa Pública XII. Direito à Liberdade de Crença, Pensamento e Expressão XIII. Direito à Liberdade de Religião XIV. Direito à Livre Associação XV. A Ordem Econômica e os Direitos dela decorrentes XVI. Direito à Proteção da Propriedade XVII. Condição e Dignidade dos Trabalhadores XVIII. Direito à Seguridade Social XIX. Direito de Constituir Família e Assuntos Correlatos XX. Direitos das Mulheres Casadas XXI. Direito à Educação XXII. Direito à Privacidade XXIII. Direito à Liberdade de Movimento e de Moradia Esta é uma declaração para a humanidade, uma orientação e instrução para aqueles que temem a Deus. (Alcorão Sagrado, Al-Imran 3:138) Prefácio: Há quatorze séculos, o Islam concedeu à humanidade um código ideal de direitos humanos. Esses direitos têm, por objetivo, conferir honra e dignidade à humanidade, eliminando a exploração, a opressão e a injustiça. Os direitos humanos no Islam estão firmemente enraizados na crença de que Deus, e somente Ele, é o Legislador e a Fonte de todos os direitos humanos. Em razão de sua origem divina, nenhum governante, governo, assembleia ou autoridade pode reduzir ou violar, sob qualquer hipótese, os direitos humanos conferidos por Deus, assim como não podem ser cedidos. Os direitos humanos no Islam são parte integrante de toda a ordem islâmica e se impõem sobre todos os governantes e órgãos da sociedade muçulmana, com o objetivo de implementar, na letra e no espírito, dentro da estrutura daquela ordem. Infelizmente, os direitos humanos estão sendo esmagados impunemente em muitos países do mundo, inclusive em alguns países muçulmanos. Tais violações são objeto de grande preocupação e estão despertando cada vez mais a consciência das pessoas em todo o mundo. Espero, sinceramente, que essa Declaração dos Direitos Humanos seja um poderoso estímulo aos muçulmanos para que se mantenham firmes e defendam, decidida e corajosamente, os direitos conferidos a todos por Deus. Esta Declaração dos Direitos Humanos é o segundo documento fundamental proclamado pelo Conselho Islâmico para marcar o início do 15° século da

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Era Islâmica, sendo o primeiro da Declaração Islâmica Universal, proclamada na Conferência Internacional sobre o Profeta Muhammad (que a Paz e a Bênção de Deus estejam sobre ele), e sua Mensagem, ocorrida em Londres, no período de 12 a 15 de abril de 1980. A Declaração Islâmica Universal dos Direitos Humanos baseia-se no Alcorão e na Sunnah e foi compilada por eminentes estudiosos, juristas e representantes muçulmanos dos movimentos e pensamento islâmicos. Que Deus os recompense por seus esforços e que nos guie na senda reta. Paris, 21 dhul qaidah, 1401- Salem Azzam 19 de setembro de 1981 – Secretaria Geral “Ó humanos, em verdade, Nós vos criamos de macho e fêmea e vos dividimos em povos e tribos para reconhecerdes uns aos outros. Sabei que o mais honrado, dentre vós, ante Deus, é o mais temente. Sabei que Deus é Sapientíssimo e está bem inteirado.” (Alcorão Sagrado, Al Hujjurat 49:13)

Introdução: CONSIDERANDO que a antiga aspiração humana por uma ordem mundial mais justa, onde as pessoas possam viver, crescer e prosperar num ambiente livre do medo, da opressão, da exploração e da privação, ainda não foi alcançada; CONSIDERANDO que a Divina Misericórdia para com a humanidade, revelada na concessão de uma subsistência econômica superabundante, está sendo desperdiçada ou injustamente negada aos habitantes da Terra; CONSIDERANDO que Allah (Deus) deu à humanidade, através de Suas revelações no Sagrado Alcorão e na Sunnah de Seu Abençoado Profeta Muhammad, uma estrutura moral e legal permanente para estabelecer e regulamentar as instituições e relações humanas; CONSIDERANDO que os direitos humanos decretados pela Lei Divina objetivam conferir dignidade e honra à humanidade e que foram elaborados para eliminar a opressão e a injustiça; CONSIDERANDO que em razão de sua fonte e sanção Divinas tais direitos não podem ser diminuídos, abolidos ou desrespeitados pelas autoridades, assembleias e outras instituições, nem podem ser cedidos ou alienados; Por conseguinte, nós, como muçulmanos, que acreditamos: a. em Deus, o Misericordioso e Clemente, o Criador, o Sustentador, o Soberano, o Único Guia da humanidade e a Fonte de todas as leis; b. na vice-gerência (khilafah) do homem, que foi criado para satisfazer a Vontade de Deus na Terra; c. na sabedoria da orientação Divina trazida por Seus Profetas, cuja missão atingiu seu ápice na mensagem Divina final, que foi transmitida pelo Profeta Muhammad (que a Paz e a Benção de Deus estejam sobre ele), a toda a humanidade; d. que a razão por si só, sem a luz da revelação de Deus não pode ser um guia certo nas questões do ser humano nem pode fornecer o alimento espiritual para a alma humana e, sabendo que os ensinamentos do Islam representam a quintessência da orientação Divina em sua forma mais perfeita e acabada, sentimo-nos na obrigação de lembrar ao ser humano de sua condição e dignidade elevadas outorgadas a ele por Deus; e. que a mensagem do Islam é para toda a humanidade; f. que, de acordo com os termos do nosso primeiro pacto com Deus, nossos deveres e obrigações têm prioridade sobre nossos direitos, e que cada um de nós está obrigado a divulgar os ensinamentos do Islam pela palavra, atos e, na verdade, por todos os meios nobres, e torná-los efetivos não só em nossa vida em particular, mas também na sociedade a que pertencemos; g. em nossa obrigação em estabelecer uma ordem islâmica:

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onde todos os seres humanos sejam iguais e que ninguém goze de privilégios ou sofra prejuízo ou discriminação em razão de raça, cor, sexo, origem ou língua; onde todos os seres humanos nasçam livres; onde a escravidão e o trabalho forçado sejam abolidos; onde as condições sejam estabelecidas de tal forma que a instituição da família seja preservada, protegida e honrada como a base de toda a vida social; onde os governantes e governados sejam submissos e iguais perante a Lei; onde a obediência seja prestada somente àqueles mandamentos que estejam em consonância com a Lei; onde todo o poder mundano seja considerado como uma obrigação sagrada a ser exercido dentro dos limites prescritos pela Lei e nos termos aprovados por ela e com o devido respeito às prioridades fixadas nela; onde todos os recursos econômicos sejam tratados como bênçãos divinas outorgadas à humanidade, para usufruto de todos, de acordo com as normas e os valores estabelecidos no Alcorão e na Sunnah; onde todas as questões públicas sejam determinadas e conduzidas, e a autoridade para administrá-las seja exercida após consulta mútua (shura) entre os fiéis qualificados para contribuir na decisão, a qual deverá estar em conformidade com a Lei e o bem público; onde todos cumpram suas obrigações na medida de sua capacidade e que sejam responsáveis por seus atos pro rata; onde, na eventualidade da infringência a seus direitos, todos tenham asseguradas as medidas corretivas adequadas, de acordo com a Lei; onde ninguém seja privado dos direitos assegurados pela Lei, exceto por sua autoridade e nos casos previstos por ela; onde todo o indivíduo tenha o direito de promover ação legal contra aquele que comete um crime contra a sociedade, como um todo, ou contra qualquer de seus membros; onde todo empenho seja feito para a. assegurar que a humanidade se liberte de qualquer tipo de exploração, injustiça e opressão; b. garantir a todos seguridade, dignidade e liberdade nos termos estabelecidos e pelos meios aprovados, e dentro dos limites previstos em lei.

Assim, como servos de Deus e como membros da Fraternidade Universal do Islam, no início do século XV da Era Islâmica, afirmamos nosso compromisso de defender os seguintes direitos invioláveis e inalienáveis, que consideramos ordenados pelo Islam: I – Direito à Vida a. A vida humana é sagrada e inviolável e todo esforço deverá ser feito para protegê-la. Em especial, ninguém será exposto a danos ou à morte, a não ser sob a autoridade da Lei. b. Assim como durante a vida, também depois da morte, a santidade do corpo da pessoa será inviolável. É obrigação dos fiéis providenciar para que o corpo do morto seja tratado com a devida solenidade. II – Direito à Liberdade a. O homem nasce livre. Seu direito à liberdade não deve ser violado, exceto sob a autoridade da Lei, após o devido processo. b. Todo o indivíduo e todos os povos têm o direito inalienável à liberdade em todas as suas formas, física, cultural, econômica e política – e terá o direito de lutar por todos os meios disponíveis contra qualquer infringência a este direito ou a anulação dele; e todo indivíduo ou povo oprimido tem o direito legítimo de apoiar outros indivíduos e/ou povos nesta luta. III – Direito à Igualdade e Proibição Contra a Discriminação Ilícita a. Todas as pessoas são iguais perante a lei e têm direito a oportunidades iguais e proteção da Lei. b. Todas as pessoas têm direito a salário igual para trabalho igual. c. A ninguém será negada a oportunidade de trabalhar ou será discriminado de qualquer forma, ou exposto a risco físico maior, em razão de crença religiosa, cor, raça, origem, sexo ou língua.

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IV – Direito à Justiça a. Toda a pessoa tem o direito de ser tratada de acordo com a Lei e somente na conformidade dela. b. Toda a pessoa tem não só o direito, mas também a obrigação de protestar contra a injustiça, de recorrer a soluções prevista em Lei, com relação a qualquer dano pessoal ou perda injustificada; para a autodefesa contra quaisquer ataques contra ela e para obter apreciação perante um tribunal jurídico independente, em qualquer disputa com as autoridades públicas ou outra pessoa qualquer. c. É direito e obrigação de todos defender os direitos de qualquer pessoa e da comunidade em geral (hisbah). d. Ninguém será discriminado por buscar defender seus direitos públicos e privados. e. É direito e obrigação de todo muçulmano recusar-se a obedecer a qualquer ordem que seja contrária à Lei, não importa de onde ela venha. V – Direito a Julgamento Justo a. Ninguém será considerado culpado de ofensa e sujeito à punição, exceto após a prova de sua culpa perante um tribunal jurídico independente. b. Ninguém será considerado culpado, senão após um julgamento justo e depois que tenha sido dada ampla oportunidade de defesa. c. A punição será estabelecida de acordo com a Lei, na medida da gravidade da ofensa e levadas em conta as circunstâncias sob as quais ela aconteceu. d. Nenhum ato será considerado crime, a menos que esteja estipulado como tal, nos termos da Lei. e. Todo indivíduo é responsável por seus atos. A responsabilidade por um crime não pode ser estendida a outros membros da família ou grupo, que, de outra maneira, não estejam direta ou indiretamente envolvidos no cometimento do crime em questão. VI – Direito de Proteção Contra o Abuso de Poder Toda a pessoa tem o direito de proteção contra embaraços promovidos pelas instituições oficiais. Ela não é responsável por prestar contas de si, exceto quando para fazer a defesa de acusações que pesam contra ela ou onde ela se ache em uma situação em que a suspeita de seu envolvimento em um crime seja razoavelmente levantada. VII – Direito a Proteção Contra a Tortura Ninguém será submetido à tortura de corpo e de mente, ou aviltado, ou ameaçado de dano contra si ou contra qualquer parente ou ente querido, ou será forçado a confessar o cometimento de um crime ou forçado a consentir com um ato que seja prejudicial a seus interesses. VIII – Direito à Proteção da Honra e da Reputação Toda a pessoa tem o direito de proteger sua honra e reputação contra calúnias, ataques sem fundamento ou tentativas deliberadas de difamação e chantagem. IX – Direito de Asilo a. Toda pessoa perseguida ou oprimida tem o direito de buscar refúgio e asilo. Este direito é garantido a todo ser humano, independente de raça, religião, cor ou sexo. b. Al Masjid Al Haram (A Casa Sagrada de Allah) em Makkah é um santuário para todos os muçulmanos. X- Direitos das Minorias a. O princípio alcorânico “não há compulsão na religião” deve governar os direitos religiosos das minorias não muçulmanas. b. Em um país muçulmano, as minorias religiosas, no que se refere às suas questões civis e pessoais, terão o direito de escolher serem regidas pela Lei Islâmica ou por suas próprias leis. XI - Direito e Obrigação de Participação na Condução e Direção da Coisa Pública a. Sujeito à lei, todo indivíduo na comunidade (Ummah) tem o direito de assumir um cargo público. a. O processo de consulta livre (Shura) é a base da relação administrativa entre o governo e o seu povo. De acordo com esse princípio, as pessoas também têm o direito de escolher e exonerar seus governantes.

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XII – Direito de Liberdade de Crença, Pensamento e Expressão a. Toda a pessoa tem o direito de expressar seus pensamentos e crenças desde que permaneça dentro dos limites estabelecidos pela Lei. Ninguém, no entanto, terá autorização para disseminar a discórdia ou circular notícias que afrontem a decência pública ou entregar-se à calúnia ou lançar a difamação sobre outras pessoas. b. A busca do conhecimento e da verdade não só é um direito de todo muçulmano como também uma obrigação. c. É direito e dever de todo muçulmano protestar e lutar (dentro dos limites estabelecidos em Lei) contra a opressão, ainda que implique desafiar a mais alta autoridade do estado. d. Não haverá qualquer obstáculo para a propagação de informação, desde que não prejudique a segurança da sociedade ou do estado e que esteja dentro dos limites impostos pela Lei. e. Ninguém será desprezado ou ridicularizado em razão de suas crenças religiosas ou sofrerá qualquer hostilidade pública; todos os muçulmanos são obrigados a respeitar os sentimentos religiosos das pessoas. XIII – Direito à Liberdade de Religião Toda a pessoa tem o direito à liberdade de consciência e de culto, de acordo com suas crenças religiosas. XIV – Direito de Livre Associação a. Toda a pessoa tem o direito de participar individual ou coletivamente da vida política, social e religiosa de sua comunidade e de criar instituições e escritórios com a finalidade de permitir o que é direito (ma’roof) e impedir o que é errado (munkar). b. Toda a pessoa tem o direito de lutar pelo estabelecimento de instituições onde o gozo desses direitos seja possível. Coletivamente, a comunidade é obrigada a criar tais condições com o fim de permitir a seus membros o desenvolvimento completo de suas personalidades. XV – A Ordem Econômica e os Direitos Dela Decorrentes a. Na sua busca econômica, todas as pessoas têm direito a todos os benefícios da natureza e de seus recursos. Eles são bênçãos concedidas por Deus para o bem da humanidade como um todo. b. Todos os seres humanos têm o direito de ganhar seu sustento de acordo com a Lei. c. Toda a pessoa tem o direito à propriedade privada ou em associação com outras. A propriedade estatal de certos recursos econômicos no interesse público é legítima. d. O pobre tem direito a uma parte prescrita na fortuna do rico, conforme estabelecido pelo Zakat, cobrado e arrecado de acordo com a Lei. e. Todos os meios de produção serão utilizados no interesse da comunidade (Ummah) como um todo e não podem ser descuidados ou malversados. f. A fim de promover o desenvolvimento de uma economia equilibrada e proteger a sociedade da exploração, a Lei islâmica proíbe monopólios, práticas comerciais restritivas desmedidas, usura, o uso da força para fazer contratos e a publicação de propaganda enganosa. g. Todas as atividades econômicas são permitidas, desde que não prejudiquem os interesses da comunidade (Ummah) e não violem as leis e valores islâmicos. XVI – Direito de Proteção da Propriedade Nenhuma propriedade será expropriada, exceto quando no interesse público e mediante o pagamento de uma compensação justa e adequada. XVII – Condição e Dignidade dos Trabalhadores O Islam dignifica o trabalho e o trabalhador e ordena que os muçulmanos tratem o trabalhador justa e generosamente. Não só deve receber seus salários imediatamente como também tem direito ao repouso adequado e ao lazer. XVIII – Direito à Seguridade Social Toda a pessoa tem direito à alimentação, moradia, vestuário, educação e assistência médica, compatível com os recursos da comunidade. Esta obrigação da comunidade se estende em particular a todos os indivíduos sem condições, em razão de alguma incapacidade temporária ou permanente.

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XIX - Direito de Constituir Família e Assuntos Correlatos a. Toda pessoa tem o direito de se casar, constituir família e ter filhos, de acordo com sua religião, tradições e cultura. Todo cônjuge está autorizado a usufruir tais direitos e privilégios e deve cumprir essas obrigações na conformidade do estabelecido na Lei. b. Cada um dos parceiros no casamento tem direito ao respeito e consideração por parte do outro. c. Todo marido é obrigado a manter sua esposa e filhos, de acordo com suas possibilidades. d. Toda criança tem o direito de ser mantida e educada convenientemente por seus pais, sendo proibido o trabalho de crianças novas ou que qualquer ônus seja colocado sobre elas, que possam interromper ou prejudicar seu desenvolvimento natural. e. Se por alguma razão seus pais estiverem impossibilitados de cumprir com suas obrigações para com a criança, torna-se responsabilidade da comunidade a satisfação dessas obrigações à custa do poder público. f. Toda pessoa tem direito ao apoio material, assim como ao cuidado e proteção de sua família durante a infância, na velhice ou na incapacidade. Os pais têm direito ao apoio material, assim como ao cuidado e proteção de seus filhos. g. A maternidade tem direito a respeito especial, cuidado e assistência por parte da família e dos órgãos públicos da comunidade (Ummah). h. Na família, homens e mulheres devem compartilhar suas obrigações e responsabilidades, de acordo com o sexo, dotes naturais, talentos e inclinações, sem perder de vista as responsabilidades comuns para com os filhos e parentes. i. Ninguém deverá se casar contra sua vontade, nem perder ou sofrer diminuição de sua personalidade legal por conta do casamento. XX – Direitos das Mulheres Casadas Toda mulher casada tem direito a a. morar na casa em que seu marido mora; b. receber os meios necessários para a manutenção de um padrão de vida que não seja inferior ao de seu marido e, em caso de divórcio, receber, durante o período legal de espera (iddah), os meios de subsistência compatíveis com os recursos do marido, para si e para os filhos que amamenta ou que cuida, independente de sua própria condição financeira, ganhos ou propriedades que possua; c. procurar e obter a dissolução do casamento (khul’a), na conformidade da Lei. Este direito é cumulativo com o direito de buscar o divórcio através das Côrtes; d. herdar de seu marido, pais, filhos e outros parentes, de acordo com a Lei; e. segredo absoluto de seu marido, ou ex-marido se divorciada, com relação a qualquer informação que ele possa ter obtido sobre ela, e cuja revelação resulte em prejuízo a seus interesses. Idêntica responsabilidade cabe a ela, em relação ao marido ou ao ex-marido. XXI – Direito à Educação a. Toda pessoa tem direito a receber educação de acordo com suas habilidades naturais. b. Toda pessoa tem direito de escolher livremente profissão e carreira e de oportunidade para o pleno desenvolvimento de suas inclinações naturais. XXII – Direito à Privacidade Toda pessoa tem direito à proteção de sua privacidade. XXIII – Direito de Liberdade de Movimento e de Moradia a. Considerando o fato de que o Mundo do Islam é verdadeiramente a Ummah Islâmica, todo muçulmano terá o direito de se mover livremente dentro e fora de qualquer país muçulmano. b. Ninguém será forçado a deixar o país de sua residência ou ser arbitrariamente deportado sem o recurso do devido processo legal. Notas Explicativas: 1. Na Declaração dos Direitos Humanos acima, a menos que o contexto propicie de outra forma: a. O termo “pessoa” refere-se tanto ao homem quanto à mulher. b. O termo “Lei” significa a Chari’ah, ou seja, a totalidade de suas normas provém do Alcorão e da Sunnah e de quaisquer outras leis que tenham sido baseadas nessas duas fontes, através de métodos considerados válidos pela jurisprudência islâmica.

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2. Cada um dos direitos humanos enunciados nesta declaração traz uma obrigação correspondente. 3. No exercício e gozo dos direitos citados acima, toda pessoa se sujeitará apenas aos limites da lei, assim como por ela se obriga a assegurar o devido reconhecimento e respeito pelos direitos e liberdade dos outros, e de satisfazer as justas exigências de moralidade, ordem pública e bem-estar geral da Comunidade (Ummah).

O texto árabe desta Declaração é o original. Glossário dos termos árabes: SUNNAH – O exemplo e o modo de vida do Profeta Muhammad (que a Paz e a Bênção de Deus estejam sobre ele), compreendendo tudo o que ele disse ou concordou. KHALIFAH – A vice-gerência do homem na Terra, ou o sucessor do Profeta, transliterado para Califado. HISBAH - Vigilância Pública, uma instituição do estado islâmico que está autorizado a observar e a facilitar a satisfação das normas corretas do comportamento público. “Hisbah” consiste na vigilância pública e é uma oportunidade para que as pessoas procurem se corrigir. MA’ROOF – Boa ação. MUNKAR – Ato repreensível. ZAKAH – O imposto “purificador” sobre a riqueza, um dos cinco pilares do Islam e que é compulsório aos muçulmanos. ‘IDDAH – O período de espera da mulher viúva ou divorciada, durante o qual ela não pode se casar de novo. KHUL’A – Divórcio obtido por solicitação da mulher. UMMAH ISLAMIA – Comunidade Muçulmana Mundial. CHARI’AH – Lei Islâmica. Referências: Nota: Os algarismos romanos referem-se a tópicos do texto. Os algarismos arábicos referem-se ao Capítulo e ao Versículo do Alcorão, por exemplo, 5:32 significa Capítulo 5, versículo 32. I 1 Alcorão Al-Maidah 5:32 2 Hadith narrado por Muslim, Abu Daud, Tirmidhi, Nasai. 3 Hadith narrado por Bukhari II 4 Hadith narrado por Bukhari, Muslim 5 Ditos do Califa Omar 6 Alcorão As-Shura 42:41 7 Alcorão Al-Hajj 22:41 III 8 Sermão do Profeta 9 Hadith narrado por Bukhari, Muslim, Abu Daud, Tirmidhi, Nasai 10 Do sermão do Califa Abu Bakr 11 Do Sermão da Despedida, do Profeta 12 Alcorão Al-Ahqaf 46:19 13 Hadith narrado por Ahmad 14 Alcorão Al-Mulk 67:15 15 Alcorão Al-Zalzalah 99:7-8 IV 16 Alcorão An-Nisa 4:59 17 Alcorão Al-Maidah 5:49 18 Alcorão An-Nisa 4:148 19 Hadith narrado por Bukhari, Muslim, Tirmidhi 102


20 Hadith narrado por Bukhari, Muslim 2l Hadith narrado por Muslim, Abu Daud, Tirmdhi, Nasai 22 Hadith narrado por Bukhari, Muslim, Abu Daud, Tirmidhi, Nasai 23 Hadith narrado por Abu Daud, Tirmidhi 24 Hadith narrado por Bukhari, Muslim, Abu Daud, Tirmidhi, Nasai 25 Hadith narrado por Bukhari V 26 Hadith narrado por Bukhari, Muslim 27 Alcorão Al-Isra 17:15 28 Alcorão Al-Ahzab 33:5 29 Alcorão Al-Hujurat 49:6 30 Alcorão An-Najm 53:28 31 Alcorão Al Baqarah 2:229 32 Hadith narrado por Al Baihaki, Hakim 33 Alcorão Al-Isra 17:15 34 Alcorão At-Tur 52:21 35 Alcorão Yusuf 12:79 VI 36 Alcorão Al Ahzab 33:58 VII 37 Hadith narrado por Bukhari, Muslim, Abu Daud, Tirmidhi, Nasai 38 Hadith narrado por Ibn Majah VIII 39 Do Sermão da Despedida, do Profeta 40 Alcorão Al-Hujurat 49:12 41 Alcorão Al-Hujurat 49:11 IX 42 Alcorão At-Tawba 9:6 43 Alcorão Al-Imran 3:97 44 Alcorão Al-Baqarah 2:125 45 Alcorão Al-Hajj 22:25 X 46 Alcorão Al Baqarah 2:256 47 Alcorão Al-Maidah 5:42 48 Alcorão Al-Maidah 5:43 49 Alcorão Al-Maidah 5:47 XI 50 Alcorão As-Shura 42:38 51 Hadith narrado por Ahmad 52 Do sermão do Califa Abu Bakr XII 53 Alcorão Al-Ahzab 33:60-61 54 Alcorão Saba 34:46 55 Hadith narrado por Tirmidhi, Nasai 56 Alcorão An-Nisa 4:83 57 Alcorão Al-Anam 6:108 XIII 58 Alcorão Al Kafirun 109:6 XIV 59 Alcorão Yusuf 12:108 60 Alcorão Al-Imran 3:104 61 Alcorão Al-Maidah 5:2 62 Hadith narrado por Abu Daud, Tirmidhi, Nasai, Ibn Majah XV 63 Alcorão Al-Maidah 5:120 64 Alcorão Al-Jathiyah 45:13 65 Alcorão Ash-Shuara 26:183 103


66 Alcorão Al-Isra 17:20 67 Alcorão Hud 11:6 68 Alcorão Al-Mulk 67:15 69 Alcorão An-Najm 53:48 70 Alcorão Al-Hashr 59:9 71 Alcorão Al-Maarij 70:24-25 72 Ditos do Califa Abu Bakr 73 Hadith narrado por Bukhari, Muslim 74 Hadith narrado por Muslim 75 Hadith narrado por Muslim, Abu Daud, Tirmidhi, Nasai 76 Hadith narrado por Bukhari, Muslim, Abu Daud, Tirmidhi, Nasai 77 Alcorão Al-Mutaffifin 83:1-3 78 Hadith narrado por Muslim 79 Alcorão Al-Baqarah 2:275 80 Hadith narrado por Bukhari, Muslim, Abu Daud, Tirmidhi, Nasai XVI 81 Alcorão Al Baqarah 2:188 82 Hadith narrado por Bukhari 83 Hadith narrado por Muslim 84 Hadith narrado por Muslim, Tirmidhi XVII 85 Alcorão At-Tawbah 9:105 86 Hadith narrado por Abu Yala¾ Majma Al Zawaid 87 Hadith narrado por Ibn Majah 88 Alcorão Al-Ahqaf 46:19 89 Alcorão At-Tawbah 9:105 90 Hadith narrado por Tabarani¾ Majma Al Zawaid 91 Hadith narrado por Bukhari XVIII 92 Alcorão Al-Ahzab 33:6 XIX 93 Alcorão An-Nisa 4:1 94 Alcorão Al-Baqarah 2:228 95 Hadith narrado por Bukhari, Muslim,Abu Daud, Tirmidhi,Nasai 96 Alcorão Ar-Rum 30:21 97 Alcorão At-Talaq 65:7 98 Alcorão Al-Isra 17:24 99 Hadith narrado por Bukhari, Muslim,Abu Daud, Tirmidhi 100 Hadith narrado por Abu Daud 101 Hadith narrado por Bukhari, Muslim 102 Hadith narrado por Abu Daud, Tirmidhi 103 Hadith narrado por Ahmad, Abu Daud XX 104 Alcorão At-Talaq 65:6 105 Alcorão An-Nisa 4:34 106 Alcorão At-Talaq 65:6 107 Alcorão AtTalaq 65:6 108 Alcorão Al-Baqarah 2:229 109 Alcorão An-Nisa 4:12 110 Alcorão Al-Baqarah 2:237 XXI 111 Alcorão Al-Isra 17:23-24 112 Hadith narrado por Ibn Majah 104


113 Alcorão Al-Imran 3:187 114 Sermão da Despedida, do Profeta 115 Hadith narrado por Bukhari, Muslim 116 Hadith narrado por Bukhari, Muslim, Abu Daud, Tirmidhi XXII 117 Hadith narrado por Muslim 118 Alcorão Al-Hujurat 49:12 119 Hadith narrado por Abu Daud, Tirmidhi XXIII 120 Alcorão Al-Mulk 67:15 121 Alcorão Al-Anam 6:11 122 Alcorão An-Nisa 4:97 123 Alcorão Al-Baqarah 2:217 124 Alcorão Al-Hashr 59:9 Publicado por: Islamic Council, 16 Grosvenor Crescent, London SW1 Telefone: 01-2359832 Telex: 894240ISLAMI G Cables: ISLAMIAH London, SWI Texto traduzido por Mônica Muniz com colaboração de Maria Moreira. Foi utilizado e traduzido com permissão de seus editores.

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