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A nova fase da Cultura brasileira

A retomada e reconstrução das políticas culturais têm por trás mulheres em cargos estratégicos, como a ministra da Cultura, Margareth Menezes, e a secretaria Nacional de Cidadania e Diversidade Cultural, Márcia Rollemberg

Por: Adriana Vasconcelos

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Arecriação do Ministério da Cultura, após quatro anos de retrocessos, assegurou uma nova dinâmica a partir da nomeação de mulheres para a condução das novas políticas públicas do setor. A convite da ministra Margareth Menezes, a mineira e candanga, Márcia Rollemberg, voltou a ocupar o cargo de secretária Nacional de Cidadania e Diversidade Cultural.

O resultado disso já pode ser comprovado em números: este ano o setor cultural já recebeu R$ 3,8 bilhões da Lei Paulo Gustavo, com a adesão de todos estados e do DF. E nos próximos cinco anos, as políticas públicas do setor poderão contar com o aporte de mais de R$ 3 bilhões.

Trazendo na bagagem novas experiências, como a de primeira-dama do governo do Distrito Federal de 2015 a 2018 e após criar com a filha, Gabriela Rollemberg, a startup Quero Você Eleita , com o objetivo de ampliar a presença feminina em espaços de poder, na sua volta ao Ministério da Cultura, Márcia Rollemberg recebeu como missão colocar em prática a Política Cultura Viva , através da qual pretende reativar a colaboração federativa e promover a municipalização da cultura.

Confira aqui sua entrevista à revista Plano B!

Como é ter retornado, depois de quase 10 anos, para a Secretaria Nacional de Cidadania e Diversidade

Cultural, neste importante momento de recriação do Ministério da Cultura?

Como diz a nossa querida Ministra Margareth Menezes: o Ministério da Cultura voltou. E uma das pautas prioritárias do Governo Lula é a ampliação da rede de Pontos de Cultura. Então é uma grata e desafiadora missão estar de volta a Secretaria Nacional de Cidadania e Diversidade Cultural, uma vez que participamos da consolidação do Cultura Viva, que foi criado em 2004, como um programa, e passou a ser uma política de estado, com a aprovação da lei no 13.018/2014.

E agora retomo ao mesmo lugar, oito anos depois, com novos desafios, depois de um ciclo de recrudescimento e desmonte das políticas culturais no país, inclusive com a extinção do Ministério da Cultura, que simbolizaram retrocessos e paralisações que prejudicaram a implementação do Cultura Viva, bem como a expansão do Sistema Nacional de Cultura.

O momento é de reconstrução e retomada das políticas culturais, tendo a Política Cultura Viva como um dos principais eixos para reativar a colaboração federativa e promover a municipalização da cultura, sempre com o compromisso na promoção dos direitos culturais e no respeito à diversidade cultural, priorizando os povos, grupos, comunidades e populações, e valorizando a sua capacidade e potência cultural, mesmo vivendo, em sua maioria, à margem do conjunto das políticas públicas, em especial de cultura.

Este ano o setor cultural já recebeu R$ 3,8 bilhões da Lei Paulo Gustavo, com adesão de todos os estados e DF. Uma lei emergencial, que está reativando o fomento à cultura, e todos os arranjos produtivos que envolve. Mas a grande transformação será o aporte de R$ 3 bilhões, por pelo menos cinco anos, nas políticas de cultura. A Política

Nacional Aldir Blanc possibilitará que o Ministério da Cultura pactue com estados, municípios e sociedade civil, e de forma gradativa, consolide a política cultural de base comunitária, que é a Política Nacional Cultura Viva - a PNCV, dentre outras, nacionais e setoriais, de grande relevância para o desenvolvimento país.

O que é a Política Cultura Viva e qual é a sua importância?

A Política Cultura Viva reconhece, conecta e fomenta os fazedores de cultura, agentes e núcleos culturais que tradicionalmente realizam em suas comunidades, uma formação cidadã, ações educativas, artísticas, práticas identitárias, de celebração, de modos de vida e de ofícios, de pertencimento, de transmissão de saberes entre as gerações. Que desenham o Brasil de raiz, profundo, popular e tradicional, das cidades, do campo, das florestas e das águas.

Iniciou-se como o Programa Arte, Educação e Cidadania, instituído em 6 de julho de 2004. Foi um Programa criado pelo Ministro Gilberto Gil, em um período de transformação das políticas públicas de cultura, durante a institucionalização do Sistema Nacional de Cultura.

Nos últimos anos, após retrocessos e paralisações que afetaram sua implementação e expansão, a Secretaria de Cidadania e Diversidade Cultural vai atuar como indutora na rede nacional de pontos de cultura, em parceria com a Comissão Nacional de Pontos de Cultura, reconstruir as instâncias de gestão compartilhadas com estados e municípios, para definir responsabilidades, qualificar os instrumentos e integrar o Cadastro Nacional de Pontos e Pontões de Cultura.

A retomada dos investimentos diretos do Ministério, com os dois editais, em curso, que somam R$ 61,5 milhões, com as políticas de descentralização de recursos para estados e municípios, com a implementação da Lei Aldir Blanc 2, que definirá em sua regulamentação um piso nacional de investimentos para a Cultura Viva, podemos afirmar que temos uma oportunidade única de efetivar uma inédita pactuação federativa, garantindo a continuidade e fortalecimento dessa política e permitindo que alcance a totalidade dos municípios do Brasil.

Pode explicar o que é o Edital de Premiação Sérgio Mamberti e o Edital para termos de compromisso cultural com Pontões de Cultura, e qual é o seu impacto nas políticas culturais?

O Edital de Premiação Sérgio Mamberti, no valor de R$ 33,5 milhões, é uma iniciativa que promove e valoriza a diversidade cultural no Brasil. Fazemos uma homenagem a Sérgio Mamberti, que foi um Mestre das Artes Cênicas, mas sobretudo um defensor incansável da inclusão e da diversidade cultural em suas diversas formas na macropolítica da cultura. Esse edital terá um impacto significativo, reconhecendo, certificando e premiando as diversas expressões culturais: Culturas Populares e Tradicionais; Culturas Indígenas; Diversidade: pessoas idosas, com deficiência, LGBTQIA+, pessoas em sofrimento psíquico; e os Pontos de Cultura Viva. Isso contribui para uma sociedade mais inclusiva e plural, fortalecendo a luta pela igualdade de direitos.

Além disso, lançamos o Edital de fomento à Pontões de Cultura, no valor de R$ 28 milhões, que mediante um plano de trabalho anual, celebrará Termos de Compromisso Cultural - um instrumento de parceria específico do Cultura Viva, com 46 Organizações da Sociedade Civil reconhecidas como Pontões de Cultura, sendo 31 territoriais e 15 temáticos, no sentido de realizar atividades formativas, de reconhecimento dos grupos culturais , garantindo o DNA da política e a ação em rede.

Uma ação que mobiliza e forma no mínimo 610 Agentes Cultura Viva, que tem Comitês Gestores em cada Pontão, com no mínimo cinco pontos de Cultura. A proposta é ativar e ampliar as redes territoriais, temáticas, setoriais, identitárias de Pontos de Cultura, visando uma gestão compartilhada com os governos estaduais e municipais da Política Cultura Viva no período de 12 (doze) meses.

Como você vê a liderança da Ministra Margareth Menezes, uma mulher negra, na formulação de políticas culturais públicas que promovem a diversidade cultural e a igualdade de gênero?

Estou muito feliz e honrada por trabalhar sob a liderança da Ministra Margareth Menezes, uma mulher negra com uma trajetória tão extraordinária e singular. A presença dela como Ministra da Cultura representa um marco histórico, pela primeira vez essa voz, esse lugar de fala acontece nesta posição e espaço de poder e decisão. Margareth traz consigo uma experiência que é profundamente enraizada em suas origens, em sua ancestralidade e em sua vivência como filha de uma família oriunda da pesca artesanal. Ela superou desafios e criou sua própria marca, como artista e produtora independente, o que a torna uma voz autêntica e que representa tantas vozes no cenário cultural brasileiro.

Sua liderança traz uma perspectiva que enriquece imensamente a formulação de políticas culturais e públicas. Representa não apenas a classe de artistas e as mulheres negras, mas também todas as comunidades e grupos que não são ouvidos ou tocados pela política de cultura. Margareth contribui de maneira significativa para nossa capacidade de tomar decisões mais assertivas, é uma inspiração para todas nós na busca por uma sociedade mais inclusiva e igualitária, e que traz a cultura de paz, a capacidade de mediação e o respeito em seu jeito de fazer política.

Com sua experiência de primeira-dama do DF e seu protagonismo em cargos estratégicos dentro da gestão pública, como você enxerga os desafios enfrentados pelas mulheres nos espaços de poder atualmente e que medidas você considera essenciais para superar esses desafios?

É inegável que nosso país, como muitos outros, ainda enfrenta estruturas profundamente machistas, o que se reflete na sub-representação das mulheres em diversos espaços de decisão, seja no Parlamento, Executivo, Judiciário, e também na iniciativa privada. A luta por representatividade é uma batalha contínua e fundamental. As mulheres que já ocupam esses espaços têm um papel crucial como portas de abertura para novas lideranças femini- nas, possibilitando que outras mulheres alcancem posições de destaque.

Minha trajetória de retorno à Secretaria de Cidadania e Diversidade Cultural, agora sob a liderança de Margareth Menezes, é marcada por uma perspectiva de sororidade e colaboração. Acredito que, nesse momento, estamos vivendo um ciclo feminino, uma conjunção astral que nos inspira a retomar e reativar nossos esforços com confiança.

É importante reconhecer que enfrentamos desafios complexos e que muitas vezes a sociedade civil expressa uma demanda intensa e ansiosa por soluções. Respeito profundamente as demandas, e também reconheço o papel do gestor público na busca por soluções que sejam implementadas com segurança jurídica e efetividade. Ouvir as pessoas é fundamental, afinal, temos de construir políticas públicas tendo como princípio «Nada sobre nós, sem nós». Essa abordagem inclusiva é o lema das pessoas com deficiência, mas vale para todos os segmentos da sociedade.

A sororidade e a dororidade (que trata das dores que unem as mulheres negras para além do machismo), desempenham um papel crucial nesse contexto. As mulheres precisam se apoiar mutuamente, compartilhar experiências e conhecimentos, e unir esforços para superar os desafios que enfrentam. A união das mulheres é uma força transformadora que contribui para construir uma sociedade mais igualitária e justa.

Poderia nos contar mais sobre a iniciativa que você e sua filha criaram, a startup que incentiva as mulheres a alcançarem cargos de poder? Como isso se relaciona com a importância da participação feminina na política e nas políticas públicas?

A iniciativa é uma resposta à necessidade de incentivar e apoiar as mulheres em sua jornada para ocupar cargos de poder, especialmente na esfera política. Reconhecemos que o Brasil ainda enfrenta desafios significativos em termos de representação feminina na política, e estamos em uma posição única para promover mudanças nessa área. Começamos nossa iniciativa durante a pandemia, trabalhando com mais de 200 candidatas a vereadoras para entender as barreiras que as mulheres enfrentam ao entrar na política.

Neste último ciclo, nosso trabalho se estendeu a uma pesquisa mais ampla sobre inovação política promovida por mulheres. Sabemos que as mulheres têm desempenhado um papel fundamental na política brasileira, como evidenciado pela bancada feminina, que completou 10 anos de existência. No entanto, enfrentamos o desafio de não apenas conquistar esses espaços, mas também de mantê-los. A manutenção do poder feminino é fundamental, e projeto é um laboratório de inovação política que promove a criação de redes para estabelecer conexões entre mulheres em diferentes áreas como o judiciário, executivo, parlamento e sociedade civil.

Desde que assumi a Secretaria de Cidadania e Diversidade que não estou mais envolvida na iniciativa, mas a Quero Você Eleita continua comprometida em ampliar e manter a participação feminina na política, como evidenciado no trabalho em torno da PEC da Anistia. Ajudando para que as mulheres estejam envolvidas na esfera pública para garantir que as políticas públicas atendam às suas necessidades e as da sociedade como um todo. Quando investimos nas mulheres, investimos em toda a sociedade, e estamos comprometidas em ampliar essa polifonia e promover a equidade de gênero em todos os setores.

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