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Chegou a hora da Tarifa Zero?
De repente parece que todo mundo descobriu a Tarifa Zero, mas não foi sempre assim. Quando a então prefeita Luíza Erundina a propôs para a cidade de São Paulo pouco mais de trinta anos atrás, não conseguiu nem o apoio integral de seu partido, na época o PT, quanto mais a aprovação da Câmara de Vereadores. Podíamos tentar listar as críticas que a proposta sofreu mas, a rigor, quase não cabe chamá-las de críticas, porque a reação mais comum era não levar a ideia a sério.
Com o tempo o tempo e a perseverança dos formuladores do projeto, a ideia foi ganhando defensores, principalmente entre os movimentos populares contra os aumentos de tarifa e pelo passe estudantil. A partir de meados da primeira década dos anos 2000, consolida-se o MPL, Movimento Passe Livre, que abraça definitivamente a bandeira, não apenas erguendo-a em todas as manifestações que promove e de que participa, mas também debatendo-a em eventos, audiências públicas nos parlamentos etc.
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As chamadas Jornadas de Junho de 2013 deram visibilidade extra à proposta, especialmente quando o MPL foi chamado a conversar no Palácio do Planalto, embora o episódio tenha se revelado muito mais um lance midiático destinado a reduzir as tensões nas ruas do que uma iniciativa genuína de colocá-la na agenda do governo. De todo modo, uma cidade aqui e outra ali foram implantando a Tarifa Zero em seus territórios e a experiência quase isolada de Agudos, em São Paulo, com menos de 40 mil habitantes, espalhou-se por quatro dezenas de cidades brasileiras, incluindo algumas do porte de Maricá, no Rio de Janeiro, com mais de 200 mil moradores.
O que mudou nessas três décadas? Por que é tão significativo o número de municípios que banca a gratuidade do uso do transporte coletivo para suas populações? E por que mais e mais administrações têm trabalhado para implementá-la, inclusive as gigantes paulistana e carioca?
Primeiro é preciso lembrar que não se observa esse mo- vimento apenas no Brasil. O crescimento da experiência da Tarifa Zero tem acontecido em países de todos os continentes. Segundo, as mudanças climáticas deixaram de ser uma ameaça do futuro para ser uma realidade presente e de proporções catastróficas. E, por mais que se desenvolvam carros movidos a energia renovável, a mobilidade baseada em veículos individuais nunca será sustentável. Terceiro, a recente crise sanitária desnudou a lógica cruel de maximizar lucros lotando ônibus e demonstrou a inviabilidade de um negócio pago por clientes cada vez mais pobres.

Em resumo, podemos estar assistindo a uma alteração no modelo de financiamento como alternativa para salvar o próprio negócio. Se é isso, cabe usar a oportunidade para qualificar a mudança de paradigma, de maneira que ela não se resuma a um mero ajuste na forma de acumulação do capital. Nesse sentido, é muito bem-vinda a inciativa da Coalizão Mobilidade Triplo Zero, uma rede de movimentos, entidades, pesquisadores e gestores que se articula com os objetivos de zerar a tarifa cobrada dos passageiros, as emissões de poluentes produzidos pelos veículos e as mortes provocadas por sinistros nos sistemas de transporte. Ainda havemos de ouvir falar muito disso, mas por ora vale consultar o site mobilidadetriplozero.org.
Possui graduação em Engenharia Mecânica pela Universidade Federal da Bahia (1983), mestrado em Engenharia de Transportes pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1992) e doutorado em Transport Studies pela University of London (University College London) (2001).











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