Revista Estilo - Dezembro 2017

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RE - Existe uma corrente forte que enxerga algo muito caricato no humor que o cearense mostra no Sul e Sudeste. Como você avalia isso?

Cine Holliudy foi apresentado em diversos festivais internacionais

RE - Você concorda que apesar de os filmes serem campeões de bilheteria no Brasil e no mundo, há muito preconceito com a comédia, com o humor? HG - Às vezes, as pessoas acham que a comédia é um gênero inferior. Mas, muito pelo contrário. Você chora pelo mesmo motivo em qualquer lugar do mundo, a perda de um ente querido pode fazer chorar do Alasca ao Japão, mas a pessoa não ri pelo mesmo motivo. O riso é muito particular, depende da cultura, da sua vivência, para aquilo te tocar e te fazer rir. Ele depende do seu estado de espírito. Então, o humor é muito mais complexo de ser feito, é infinitamente mais difícil de fazer. Ele tem uma coisa muito clara: ou riu ou não riu, sabe? Há essa subjetividade. Se não riu, não funcionou. Ser posto à prova é um jogo muito mais arriscado e desafiador. Acho que as pessoas têm medo de encarar o humor porque ele é direto, não te dá chance, ou é ou não é, e isso faz com que tenha nuances complexas de serem alcançadas. RE - Foi diferente a recepção do filme de acordo com o lugar onde foi apresentado? HG - Olha, tive a oportunidade de vivenciar, com o Cine Holliúdy, festivais no mundo inteiro, da Tailândia à Hollywood, e perceber que as pessoas riem pelos motivos mais diversos ao longo do filme. É a sua vivência cultural que te faz rir ou não daquilo. Essa é a complexidade do humor. Por isso que ao me colocar como realizador para fazer humor, um humor completamente diferente do que é feito no Brasil até então, é um desafio muito maior, principalmente por fazer um humor que não apela, não afeta ninguém, não agride, que não precisa colocar ninguém pra baixo para se sobressair. Ele chega num limite onde você sabe que aquilo ali não está tentando ofender, ele não cruza essa linha muito sutil de saber qual é esse limite do humor, é muito delicado.

HG - Nós temos um humor no Nordeste pontuado por alguns ícones que fazem seus shows em particular: o humor do Tiririca, do Tom Cavalcante, do Renato Aragão, o humor do Chico Anísio. Cada um levava o seu Ceará do seu jeito. Eu acredito que o que aconteceu no Cine Holliúdy foi a materialização dessa coisa abstrata que é a cearensidade. O baiano já conseguiu materializar a baianidade de uma forma mais concreta através da música, de elementos da cultura deles. Já a cearensidade vagava, estava presente no nosso humor, na nossa forma de falar, no nosso quase dialeto, e o filme conseguiu materializar em algo concreto um sentimento cultural que vagava. Na hora que isso bateu, o espectador do Brasil inteiro se perguntou: "Ué? Que país é esse? Que Brasil é esse que não conheço?". Então, Cine Holliúdy levou para esse outro perfil de público, algo muito além da visão estereotipada que eles tinham por meio da cultura televisiva, que nos apresentava de uma forma equivocada. RE - Você acredita na máxima de que é preciso primeiro ser aclamado lá fora para ser reconhecido na sua terra? HG - Na verdade, o Cine Holliúdy também inverteu essa lógica. Eu já tinha uma carreira bem estabelecida, ele é meu quarto longa, mas com esse filme aconteceu um fenômeno inédito, a resposta do público cearense ao filme. O Cine Holliúdy é o filme mais visto em todos os tempos do Ceará. A gente bateu Titanic, Avatar, qualquer outro filme que foi exibido nas telas cearenses. E esse fenômeno fez com que todo mundo quisesse saber o que era esse filme. Foi quando abriram-se esses horizontes, pois ele inverteu a lógica de que santo de casa não faz milagre. Houve um impacto muito grande na autoestima da nossa cultura. A nossa economia criativa passou a compreender que o nosso público está apto para se ver a partir de muitas formas e expressões artísticas.

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