Catalogo a q u a r u m

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“Tudo vem da água” Fernando Pessoa Professor de Filosofia da Ufes O coletivo Duodreno, formado pelos artistas Júlio Tigre e Piatan Lube, apresenta, na exposição Aquarum, a água como obra de arte. Ocupando a Galeria de Arte e Pesquisa da Ufes (GAP) como site specific, o duo perfura um poço semiartesiano, de dezesseis metros de profundidade, dentro da galeria, no qual instala uma bomba manual, do tipo picota, para que o público possa interagir retirando água para beber. Ao abrir um poço de água dentro de uma galeria de arte, o Duodreno propõe com essa instalação pensar as características físicas e metafísicas da água: mostrar o subsolo da arte, revelando o fundo da criação e a proveniência da vida. A obra começa com a perfuração do poço que, registrada em filme, é apresentada em uma tela de vídeo. O propósito de cavar o subsolo de uma galeria de arte é tornar visível o oculto de seu subterrâneo, revelar o seu fundo original, descobrindo os mistérios de sua constituição. Por ser solvente universal e, assim, diluir o material orgânico da terra, a água quando se infiltra no subsolo transporta grande quantidade de sedimentos em seus lençóis freáticos. A deposição desses sedimentos formam diversas estruturas geológicas, que compõem um registro da história da terra. Com a perfuração do poço dentro da GAP, o Duodreno propõe estudar a composição desse território artístico, a fim de conhecer a sua história. De que é feito o fundo de uma galeria de arte? Quantas estórias estão infiltradas neste terreno? Quais são seus sedimentos, seus resíduos, sua composição? Como ler esses vestígios, compreender suas características e

conhecer seus nutrientes? Com esta instalação, além de reorganizar o espaço da galeria de arte com a exposição de seu subsolo, Júlio e Piatan querem contar a história da Universidade Federal do Espírito Santo escondida na memória de sua terra para, assim, conhecer o saber que tem no sabor de suas águas: “A ação proposta é acessar o imaginário através desta perfuração, buscando no subsolo esta memória da cidade e brindando este encontro com a ingestão desta água”. * Em oceanos, mares, fontes, rios, lagos e lagoas, a água cobre 70% da superfície da terra, sendo a fonte geradora e nutriente de tudo o que é vivo. A água é o princípio da vida, o seu alimento elementar; ela é a mãe de todo ser vivo, a matrix mundi. Como seu princípio elementar, a água não só é a origem da vida, mas também a sua provedora, o que possibilita a sua manutenção; ela promove a geração e regeneração do que é vivo. Em seus ciclos hidrológicos, a água alimenta, hidrata, limpa e purifica o homem e o mundo em uma permanente renovação da vida. Seja para saciar a sede e hidratar, seja para cozinhar os alimentos, digerir ou transportar seus nutrientes pelas correntes sanguíneas do organismo, seja na regulação da temperatura pelo suor ou na expulsão das toxinas pela urina, seja para limpar o corpo ou purificar a alma, seja para lavar o céu ou irrigar a terra, a água é a seiva da vida. Por essa característica de ser princípio gerador de vida, em todas as religiões, de todas as épocas e regiões, a água sempre foi associada ao feminino – aqua femina –, sendo sacralizada como deusa da fertilidade. Para os vedas é chamada de mâtrimâh, “a mais materna”. Na mitologia Celta, Sulis é a deusa das nascentes. Em diversas religiões asiáticas, a água é símbolo da fertilidade, da pureza, da sabedoria, de graça e virtude, elemento da regeneração corporal e espiritual. No Hindu-


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