Revista Convivência n. 3/2013

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detém na expiação da culpa de inspiração “kiergaardiana” em “A tragédia burguesa”? Ou, de “A poética de Carlos Nejar” (1973), coassinado pelo crítico paranaense, Temístocles Linhares (1905-1993), uma rigorosa exegese do fabro do poeta gaúcho, que ressume laivos da angústia do filósofo dinamarquês? Seria, então, como dizer que Kierkegaard o é também, quando é cada vez mais estudado e reverenciado na academia e fora dela, tal qual sua obra traduzida, lida e relida (como neste potente ciclo de conferências luminares da Academia Brasileira de Letras), sempre mais intensa e extensivamente. E mais, raro estudo sobre Kierkegaard no Brasil e na América Latina que não o cite e se derrame em loas pelo seu pioneirismo, ousadia e contundência literária e filosófica, materializada em dezenas de livros que vieram a lume por conta própria, ou pela editora da Universidade Federal do Paraná, onde dava aula de economia política no curso de Ciências Econômicas (e fui seu aluno...). Febre d’alma A própria Dinamarca ficou pasma ao se dar conta que nos longínquos trópicos alguém tentava reproduzir a nebulosa febre d’alma de Kierkegaard, a sua incontornável angústia do existir, o irredutível conflito entre ética e estética, ceticismo e fé, racionalidade e transcendência, o indivíduo e a impessoalidade do coletivo. Como numa gangorra, Reichmann também comprazia-se entre pessimismo e melancolia corrosivos, mas que acabaram por tornar longevos sua vida-e-obra, inesgotável manancial de atualizadas indagações. É, portanto, através da literatura e do comprometimento com a alta subjetividade de Kierkegaard, seu igual-desigual europeu ( “... ousar é perder o equilíbrio momentaneamente, não ousar é perder-se”), que o Brasil urge reverenciar o gaúcho-paranaense Ernani Reichmann, outorgando sobrevida ao seu engenho e à consciência mítica e crítica protagonizada por ele.

Revista Convivência- Ano III – nº 3- 2013

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