Decisão sobre o Central

EXPEDIENTE Nº 5836-15/000004-8 INTERDIÇÃO DO PRESÍDIO CENTRAL REQUERIMENTO DO GOVERNO DO RS PARA COLOCAÇÃO DE MAIS PRESOS

Vistos em decisão.

O governo do Estado do Rio Grande do Sul, por intermédio do ofício nº 493/2015, datado de 08/07/15, do Secretário Estadual da Segurança Pública , requer “autorização para o recebimento de presos condenados por cento e vinte dias no Presídio Central de Porto Alegre, quando não houver vaga disponível no Complexo Prisional de Charqueadas”.

Foram

solicitadas

informações

complementares

e

oportunizada a manifestação do Ministério Público.

Brevemente relatado, decido.

O Presídio Central de Porto Alegre foi interditado, para todos os fins (presos condenados e provisórios), no dia 04/08/1995, pelos Juízes Fernando Flores Cabral Júnior e Marco Antônio Bandeira Scapini.

Acolhendo parcialmente agravo interposto pelo Ministério Público (agravo nº 695127639), julgado em 27/09/1995, a 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul restringiu a interdição aos condenados: “proibindo-se o ingresso no Presídio Central de novos presos para o cumprimento de penas”, deixando livre o ingresso de presos provisórios, sob o fundamento de que não caberia aos juízes da execução deliberar sobre presos não condenados.

Constou do julgamento do agravo que: “é fato notório, por outro

lado, propagado livremente pela imprensa, que o Estado do Rio Grande do Sul pretende desativar definitivamente o Presídio Central e alienar a área onde ele se encontra”.

Faz pelo menos duas décadas, portanto, que os sucessivos governos estaduais prometem resolver o problema do Presídio Central de Porto Alegre. Recupero, a propósito, que a SUSEPE, no ofício 019/2000, datado de 20/07/2000 (há quinze anos), asseverou que assim que concluídas as Penitenciárias Moduladas de Osório e Charqueadas, “poder-se-á definitivamente destinar e manter no Presídio Central apenas os presos provisórios”. A promessa da vez, agora, é a ocupação do Complexo prisional de Canoas, no prazo de 120 dias, apontado como solução para o caos do PCPA, conforme mencionado no ofício do Sr. Secretário da Segurança Pública.

Refiro “promessa da vez” porque o Secretário de Estado da Segurança Pública, no ofício 230/14, datado de 17/04/14, endereçado ao Presidente do Tribunal de Justiça, referiu que a ocupação do complexo prisional de Canoas tinha previsão para dezembro de 2014.

Oportuno lembrar que, de acordo com o cronograma de retirada de presos do PCPA, conforme documento da SUSEPE (fls. 1541/1542), a transferência de presos do Presídio Central para o complexo prisional de Canoas deveria ter sido concluída em 15/03/15, com a remoção de 2.693 presos para aquele local.

Aliás, foi nesse contexto de promessas envolvendo o complexo de Canoas que o Estado do Rio Grande do Sul demoliu o pavilhão “C” do Presídio Central, o que acabou agravando o problema da superlotação.

Por muitos anos este juízo tentou fazer o Estado cumprir a decisão de interdição, acima referida.

Entre 1995 e 2010 buscou-se o

cumprimento da decisão judicial com a intimação da SUSEPE para a remoção dos presos condenados do Presídio Central, pela via da transferência de

presos. O caminho adotado, da transferência de presos, não se mostrou adequado, pois o efetivo do Presídio Central passou de 1.773 presos em agosto 1995 (época da interdição) para 5.300 presos em novembro de 2.010. Ou seja, o número de presos triplicou durante 15 anos de interdição, sendo a maioria de condenados.

A partir de novembro de 2010 a VEC POA parou de expedir mandados de intimação para a transferência de condenados do Presídio Central, uma vez que infrutíferos. Porém, nova ordem foi enviada à Brigada Militar, cuja instituição administra o PCPA, para barrar os condenados na entrada, impedindo-os de subirem para as galerias.

A medida de bloqueio no ingresso dos condenados surtiu melhor efeito, estancando a elevação no número de presos, bem como provocou uma relativa diminuição do efetivo, que chegou a baixar para 4.000 presos.

Pela determinação em vigor, os presos condenados são recebidos no Presídio Central e identificados,

permanecendo em celas

chamadas de “jumbos”, que ficam situadas no térreo do prédio da administração, pelo prazo de 24 horas. Durante esse período a SUSEPE tem que removê-los para outros estabelecimentos prisionais.

Atualmente,

entre

10

e

20

presos

condenados,

aproximadamente, todos os dias, são entregues pelas polícias no Presídio Central, sendo incluídos no contingente da interdição para transferência em 24 horas.

A SUSEPE vem enfrentando sérias dificuldades para encontrar local para o envio de tais condenados. O desvio dos presos do Central, que já são chamados de “presos da interdição”, provocou uma superlotação nas demais casas prisionais do regime fechado da VEC de Porto

Alegre.

Quando o Presídio Central recusou presos, pela desobediência da

ordem de retirada, os detentos ficaram nas delegacias de polícia, sem espaço para receber familiares, sem pátio, banho ou até mesmo sem alimentação.

Segundo informado pelo Delegado de Polícia Diretor do Departamento de Polícia Metropolitana (fl. 1698), “não há condições mínimas para manter os indivíduos presos nas Delegacias de Polícia”.

Some-se a isso tudo o fato de que, em 30/12/13, a Comissão de Direitos Humanos da OEA determinou ao Brasil que tome “ações imediatas para reduzir substancialmente a lotação no interior do PCPA” ; bem como que o Conselho Nacional de Justiça – CNJ, em junho de 2014, aprovou o relatório do mutirão carcerário do Presídio Central, com a seguinte recomendação “Recomenda-se instar o Poder Judiciário do Estado do Rio Grande do Sul a usar de suas atribuições constitucionais para fazer valer integralmente a decisão de interdição exarada pelo Juízo da Execução Penal – pois em vigor desde 1995”.

Neste cenário, o pedido feito pelo Governo do Estado do Rio Grande do Sul - para o recebimento de presos condenados por cento e vinte dias no Presídio Central de Porto Alegre, quando não houver vaga disponível no Complexo Prisional de Charqueadas - não pode ser acolhido, razão pela qual INDEFIRO-O. Esta decisão poderia terminar por aqui. Afinal, o requerimento formulado foi absolutamente singelo, desconsiderando abertamente a história do Presídio Central, os vinte anos de descumprimento da ordem de interdição, a recomendação do CNJ e a decisão da comissão de Direitos Humanos da OEA. Não obstante, embora a decisão judicial de interdição do Presídio Central tenha 20 anos, para que não se alegue falta de bom senso do Poder Judiciário, sensível à grave crise pela qual passa a segurança Pública do Estado do Rio Grande do Sul, em cujo contexto está inserido no sistema penitenciário gaúcho, onde somente nas VECs de Porto Alegre existem cerca

de 2.300 apenados soltos, condenados por crimes graves e de penas variadas, integrantes dos regimes semiaberto e aberto, os quais estão nessa situação – soltos – por absoluta falta de vagas, para evitar também a soltura de presos do regime fechado, bem como para que os detentos não fiquem em condições ainda piores que as do Presídio Central, nas Delegacias de Polícia, AUTORIZO que, durante os meses de agosto e setembro de 2015, o Presídio Central receba, na condição de presos em trânsito, novos condenados, limitado o período de trânsito em 30 (trinta) dias.

Os presos em trânsito (novos condenados) deverão ser listados em separado, como se não pertencentes ao efetivo do Presídio Central, com anotação no sistema do “Consultas integradas”,

os quais deverão ser

removidos por ordem de antiguidade para outras casas prisionais, vedada a permanência no PCPA por prazo superior a 30 (trinta) dias.

A contar de outubro de 2015, ou antes disso, caso a SUSEPE descumpra e não observe o prazo máximo de 30 dias, o prazo dos presos em trânsito voltará a ser de 24 horas.

Forçoso reconhecer, por último, que esta decisão impactará no aumento do efetivo da população carcerária do Presídio Central, com possibilidade de que se ultrapasse o percentual histórico de superlotação, superando 250% (duzentos e cinquenta por cento) de ocupação, considerando a atual capacidade de engenharia da casa prisional. Assim, embora o Sr. Secretário

da

Segurança

ainda

não

tenha

respondido

as

questões

complementares, conforme ofício da fl. 1712, deixando, dentre outros itens, de informar quantos policiais militares a mais serão lotados no PCPA, durante o período de vigência desta decisão, o quadro funcional dos policiais militares que atuam no estabelecimento penal deverá ser aumentado de, no mínimo, 5% (cinco por cento).

Justifico a exigência do aumento do efetivo funcional de

policiais miliares porque o Presídio Central já opera com déficit de servidores militares, não vingando aqui eventual argumento de falta de efetivo para suprir o percentual módico exigido de 5%. Afinal, se é sincera a promessa do governo de ocupar em curto espaço de tempo o complexo de Canoas, o que exigirá o remanejo de dezenas de policiais militares para a guarda externa do complexo, justo que eles já comecem a trabalhar desde logo no PCPA, onde estarão os presos que serão removidos para Canoas.

Intimem-se e comunique-se.

Porto Alegre, 22 de julho de 2015.

SIDINEI JOSÉ BRZUSKA Juiz de Direito