Flávio Siqueira - O Éden

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••ÉDEN••

As pessoas se levantam todos os dias e seguem em direção a seus compromissos sem sentir que estão dentro de um ininterrupto processo de transformação. Vivem como se fossem somente parte da massa, mais um entre tantos que tentam sobreviver para pagar suas contas, seu lazer e ter alguma paz. Sem que percebam abrem mão da condição de seres únicos, capazes de se recriar a partir do olhar. De alguma maneira abafam a chama do eterno que nunca se apaga e vive no coração, enquanto tentam desesperadamente se entreter, esquecendo-se do infinito potencial de vida que invariavelmente carregam dentro de si. Agora mesmo na Terra existem várias histórias se desenrolando. Olhando de longe não é possível identificá-las. Somente seus protagonistas a conhecem. •

No meio da madrugada um homem caminha sobre o linóleo polido da unidade de tratamento intensivo em um hospital de subúrbio. Mesmo enquanto sai de um quarto e entra no outro, seus passos – amaciados por sapatos brancos de couro - mal podem ser ouvidos. Com olhar atento observa os monitores gráficos, frascos de soro, luzes pulsantes, e os rostos abatidos dos homens e mulheres sedados. Passa pelo corredor pouco iluminado por algumas lâmpadas amarelas penduradas no teto, cruza por uma enfermeira com cabelos alinhados, aparência cansada. Cumprimentam-se apenas com um sorriso profissional e prosseguem sua rotina. Tem sido assim no último ano. Vitor Mingot, o jovem médico, é mais uma alma entre tantas que habitam a Terra, tentando ocupar seu espaço, procurando sua função no mundo.

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