Trabalho e amor por brasileia

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Uma vida de trabalho e amor por Brasiléia

ilho de família humilde e marcada pelo trabalho nos barracões de seringais de Brasiléia, aos 43 anos, o vereador Joãozinho já é um exemplo de superação ao conquistar formação superior em universidade pública e acumular duas especializações nas áreas de desenvolvimento sustentável e gestão pública. Brasiléia, município onde nasceu e pelo qual trabalha incansavelmente, Joãozinho do PT, já no terceiro mandato, é um homem simples, pacato, dedicado à família e aos amigos. Ele admite que tem outras duas grandes paixões: Brasiléia e o trabalho na gestão pública. Além de sua atuação política, Joãozinho não deixa a sala de aula. Como professor há mais de 20 anos da rede pública, acredita que é pela educação que a mudança acontece na vida das pessoas e da sociedade. “Só consigo viver feliz estando aqui”, diz o vereador ao relembrar os tempos em que se mudou para Rio Branco, a capital do Estado, a fim de estudar, mas não conseguiu se adaptar à “cidade grande”. O menino de alma interiorana ficou feliz e aliviado ao mesmo tempo quando soube que a Universidade Fe-

deral do Acre (Ufac) decidira criar um núcleo em Brasiléia. Afinal, ele, como centenas de conterrâneos, não precisaria mais se deslocar para a capital a fim de concluir os estudos. “Passei quatro vezes no vestibular da Ufac, mas não fiquei em Rio Branco”, conta, como se fosse a coisa mais natural do mundo ser aprovado em quatro edições de um dos mais afunilados exames escolares. De uma família de 10 irmãos, dos quais sete nasceram em seringais localizados às margens do rio Acre, apenas Joãozinho e outros dois nasceram na cidade de Brasiléia, na fronteira com a Bolívia. Município fundado em 1910 por Luiz Barreto de Menezes, Brasiléia foi de fato um dos municípios que viveu o auge econômico do Estado a partir da exploração da castanha e da borracha, numa época em que o meio de transporte só se efetivava por via fluvial. Hoje, a cidade vizinha, Epitaciolândia, uma vila desmembrada da própria Brasiléia, tem na BR-317 seu principal eixo viário.

Fotos: Divulgação

A política como fator de mobilidade social Essa é a terra de Joãozinho do PT. O atual vereador, com pouco mais de 24 anos de idade, filiou-se ao Partido dos Trabalhadores. A partir daí, ao lado de companheiros de militância, deflagrou uma luta incansável em busca da melhoria na qualidade de vida de seus conterrâneos. “Eu sempre entendi que quando a gente gosta de um lugar, tem também que gostar das pessoas. E a forma de demonstrar esse amor é trabalhando, e lutando para melhorar a vida de todos”, diz. “E sempre compreendi que é na política, feita com ética e responsabilidade, que está o grande fator de mobilidade social capaz de melhorar e transformar a vida das pessoas. Por isso, procurei me aperfeiçoar na gestão pública”, acrescentou. Mas não é só com os brasileenses que ele está preocupado. Um de seus irmãos, Damião Borges, foi recentemente homenageado pelo trabalho que desenvolve junto aos haitianos que

chegam à cidade a partir da Bolívia e do Peru, e para os quais a Prefeitura de Brasiléia e o Governo do Estado prestam grande assistência humanitária. Damião reconhece que a situação é dramática porque falta estrutura para dar conta de tanta gente – e Joãozinho pediu providências ao Governo Federal, a partir do Ministério das Relações Exteriores, reafirmando que a cidade está com dificuldade de ajudar os haitianos e que a União precisa intervir na situação. “O que me preocupa é que Brasiléia é uma cidade pequena e os problemas já começaram a aparecer”, disse. Além disso, ele propõe criar um canal de comunicação com os gestores do departamento boliviano do Pando, cuja capital é Cobija, fronteira com Brasiléia, em busca de soluções para problemas comuns às duas regiões. Seria, segundo ele, algo como um grupo técnico binacional que se reuniria a cada 45 dias para debater as questões mais relevantes para as duas cidades.


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“Brasiléia tem que ser zona estratégica n Joãozinho do PT, mesmo sendo um político com atuação no interior, tem os olhos voltados para o Acre, o Brasil e o mundo. Assim, ele defende que a gestão municipal não pode ser feita de forma isolada e o Estado e o governo federal precisam voltar seus olhos para interior, para as pequenas cidades, para o município. É no município que mora o cidadão; é no município que estabelecemos as relações familiares e econômicas. Por isso, a gestão pública, a meu ver, tem que usar seus principais instrumentos para assegurar o desenvolvimento e melhorar a qualidade de vida no município, disse o vereador na entrevista seguir:

po Sabala como referência dessa luta quase quixotesca dos meus tempos de jovem. Era a luta por dias melhores na educação rural. A escola, localizada no Km 26 da estrada de Assis Brasil, era um amontoado de madeira velha deixada pelo Incra, num acampamento para projetos de assentamento. Fiz tudo o que estava a meu alcance para dotar a escola de estrutura. E deu certo. Hoje, com 500 alunos, temos uma escola com estrutura moderna, completa e confortável para estudar. Me sinto muito feliz por ter contribuído diretamente para esta realização. Que avaliação o senhor faz da missão de ser um gestor público? Joãozinho - Penso que ser gestor público é, a um só tempo, estar conectado com o presente e o futuro, utilizando as coisas boas do passado para melhorar a sociedade e a vida das pessoas. Além disso, o gestor tem que pensar como um cidadão comprometido com o coletivo, buscando meios para fazer com que, através de políticas públicas, as pessoas possam ser mais felizes, terem seus problemas solucionados, de forma coletiva, igualitária e democrática.

O senhor tem uma trajetória ligada ao sonho de uma sociedade mais justa. Conte como isso o ajuda na política. Joãozinho – Isso começou há mais de 20 anos. Nos idos de 1980, eu e vários amigos montamos um grupo de teatro que encenou peças-denúncias e libelos à liberdade. Fizemos, por exemplo, a montagem da peça que batizamos de A Escola do Templo. Percorremos o Acre com esta peça denunciando as péssimas condições das escolas rurais daquela época. Eu fazia o papel de aluno. Essa peça Qual é a base de luta de me trouxe a reflexão sobre a necessidade de mudança da Joãozinho do PT? Joãozinho - Luto para educação no meio rural. consolidar Brasiléia como Isso tem a ver com o zona estratégica no contexmovimento criado por Chi- to da Estrada do Pacífico. co Mendes e pelo então Como político, vou fazer de professor Binho Marques tudo para que Brasiléia não na implantação do Projeto seja apenas um corredor, mas consolidar essa posição estraSeringueiro? Joãozinho - Mais ou me- tégica para o Estado do Acre. nos. Na mesma época, outro Quero também avançar na degrupo de jovens trabalhava mocratização da gestão com no interior de Xapuri implan- maior participação dos partitando escolas e fomentando o dos que compõem a Frente cooperativismo. Era a turma Popular do Acre e intensificar do Projeto Seringueiro, coorde- o diálogo com a sociedade, nado então por mobilizado- inclusive com lideranças que res como Binho Marques e não são partidárias, mas que Marina Silva, além do sindi- devem ser ouvidas. Trabalho pelo fortalecicalista Chico Mendes. Mesmo sem conexão direta, o nosso mento do meio rural usando trabalho e o deles tinham liga- as ferramentas do novo Códições. Mais tarde, já na gestão go Florestal. O senador Jorge de Leila Galvão como prefei- Viana foi fundamental para ta de Brasiléia, a gente veria os avanços proporcionados no novo Código. Precisamos como isso é fato. produzir preservando o meio Qual o resultado con- ambiente. Também atuo pela ampliacreto deste trabalho? Joãozinho - Desde então, ção da infraestrutura urbana tenho a Escola Valéria Bis- com a implantação definitiva

do Anel Viário de Brasiléia e a construção da 2ª Ponte sobre o rio Acre. Nos finais de semana, Brasiléia supera Cruzeiro do Sul em número de veículos circulando na cidade, o que traz problemas que merecem atenção. Como parlamentar, em qual área o senhor mais se destacou? Joãozinho - Como já disse, sou um político eclético e

procuro trabalhar nas várias áreas de interesse da sociedade. Para entender melhor essa questão é bom a gente lembrar a minha trajetória nos movimentos sociais. Como presidente do núcleo do Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Acre (Sinteac), participei das principais lutas da categoria e, na condição de desportista. Além de líder classista fui jogador de futebol de campo e de futsal. Sou

formado em geografia, e, enquanto estudante, militei no Diretório Central dos Estudantes (DCE) e estou como vereador há onze anos, agora no terceiro mandato. Sou também professor da rede estadual de ensino há 22 anos. Também tenho fortes ligações com o meio rural. Como é sua relação com a FPA, os aliados e a oposição? Joãozinho - Entre 2005 e

EM encontro com o presidente da Amac, Raimundo Angelim, Joãozinho do PT discute gestão pública


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o desenvolvimento do Acre”, diz vereador 2008, fui presidente do Diretório Municipal do PT e assumi como desafio trabalhar e dar atenção para os problemas de todas as áreas. Com minha atuação política, apoiei e consegui fortalecer organizações ligadas à luta dos trabalhadores rurais, como a Capeb e a Amaproeb. E tudo isso me fez aprender a distinguir as situações e a manter um diálogo franco e honesto com meus companheiros da FPA, sempre na defesa dos interesses do município. Dessa forma, também conquistei o respeito dos oposicionistas. Na última votação do orçamento do município, por exemplo, em vários pontos a oposição votou com a base aliada. Minha relação com o governo é das mais respeitosas e promissoras, desde os tempos dos governadores Jorge Viana e Binho Marques. Quero estreitá-la ainda mais com Tião Viana, uma vez que o atual governador tem mantido Brasiléia na agenda de trabalho, batendo o recorde de visitas ao meu município.

Hoje, a realidade é bem diferente. Ainda temos muitos problemas para resolver, mas só não vê quem não quer: o Acre mudou muito e para melhor. Na sua avaliação, como é a atual gestão municipal? Joãozinho- A prefeita Leila Galvão está fazendo, como todos vêem, um grande trabalho. A cidade melhorou muito com sua gestão e, também, na administração do companheiro Alvani. Não é fácil cuidar da administração de uma cidade contando com poucos recursos financeiros. Fazer investimentos na saúde, na educação, nas ruas e praças, escolas, calçadas e investir na área rural da cidade, com poucos recursos, exige capacidade técnica e política muito refinada. Essa é marca que diferencia o PT e a Frente Popular dos demais partidos. Isso me estimula a seguir lutando para melhorar ainda mais nosso município.

O que o senhor destacaria como sendo essenA Frente Popular está há cial em curto prazo para o mais de 12 anos conduzin- desenvolvimento de Brado a aplicação das políti- siléia? Joãozinho- Entre outras cas públicas no Acre. Qual avaliação o senhor faz des- ações, a construção de um hospital regional, que tenha se período? Joãozinho – A avaliação estrutura para suportar a atual é muito positiva. É inegável demanda, deve ser prioridade. que existe um Acre antes e Isso, inclusive, é prioridade do depois da administração da governador Tião Viana, que Frente Popular, que tem o anunciou um projeto de R$ meu partido, o PT, como 17 milhões para alcançar esse principal pilar de sustenta- objetivo. Outra questão imção. É só ver o volume de portante é a consolidação do investimentos que foram campus da Ufac em Brasiléia, o feitos nos últimos anos. que será um divisor de águas Hoje, o Acre está pratica- no Ensino Superior do municímente interligado de ponta pio. Considero, também, que a a ponta pela BR 364, que industrialização do município, ganhou novas pontes e em que já está em processo basbreve terá sua pavimentação tante evoluído com a gestão totalmente concluída. Sem da prefeita Leila e é um comcontar os investimentos que promisso do governador Tião foram feitos para melhorar a Viana, deve ser intensificado saúde, a educação, seguran- ainda mais para trazer emprego ça pública e, principalmente, e renda para a juventude que no setor produtivo, com a sai do banco escolar e ingressa geração de emprego e renda no mercado de trabalho. Além disso, a posição geográfica do para nossa população. As mudanças são muitas município exige uma relação que até esquecemos que há institucional mais intensa com 13 anos a situação do Acre a capital do departamento boera de completo abandono, liviano de Pando visando, com com salários de servidores trabalho em parceria, desenvolatrasados, prédios públicos ver a região no contexto da Esdestruídos e com grupos de trada do Pacífico. extermínios decidindo quem O senhor tem pretensão vivia e quem morria. Naquela época o povo estava infeliz e ser candidato a prefeito de Brasiléia? sem autoestima.

Joaozinho- Ficaria muito honrado em cuidar da cidade onde nasci, vivo com minha família e crio os meus filhos. Como político e como cida-

dão, luto todos os dias para que minha cidade cresça e se desenvolva e possa oferecer melhores condições de vida para sua gente. No entanto, mesmo

estando feliz por ser lembrado para comandar a minha cidade, a decisão de ser ou não candidato cabe ao meu partido, o PT, e à Frente Popular.


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Família, o pilar de um mandato Joãozinho do PT é uma pessoa profundamente ligada à família. Filho do guarda-livros João Pacífico de Melo, já falecido, e da merendeira aposentada, D. Olgarina Araújo, Joãozinho sempre visita os seringais onde viveram os parentes, como o Porto Carlos e o Sacado, localizado a cerca de 85 quilômetros de Brasiléia. Trabalha muito, mas dedica boa parte do tempo no cuidado da esposa Francisca, assistente social, e dos filhos que moram com ele – Jéssica, de 8 anos, e Murilo, de apenas sete meses. O mais velho, João Vítor, tem vinte anos e mora em Rio Branco, onde cursa Análise de Sistemas na Uninorte.

JOÃOZINHO, a esposa, Francisca Araújo, com os filhos Jéssica e Murilo

Novidade na fronteira A partir da militância partidária – e já influenciado pela gestão nos negócios da borracha feita pelos pais e avós – tomou gosto pela política porque sabia que dela vinham as possibilidades de promover as transformações que a sociedade tanto necessita. Nesse período, difícil até mesmo para os mais experientes, João Raimundo Araújo de Melo passou a ser carinhosamente

conhecido como Joãozinho do PT, e estabeleceu as bases de um processo que desencadearia na eleição de José Alvanir como prefeito de Brasiléia – uma novidade na conservadora política da fronteira – e no início de uma mobilização que incutiu as mais relevantes mudanças no município, especialmente nas áreas de Saúde, Educação, desenvolvimento urbano e rural.

EM reunião familiar, Joãozinho com sua mãe, D. Olga, e irmãos

Estratégia de desenvolvimento Joãozinho diz ser importante a criação de um GT (Grupo de Trabalho) entre Brasiléia e Cobija, em função da Estrada do Pacífico, também conhecida como Rodovia Interoceânica, que é uma estrada binacional ligando o noroeste do Brasil ao litoral sul do Peru, através do Acre. A parte da Estrada do Pacífico que fica dentro do território brasileiro é identificada como BR-317 enquanto no Peru é chamada apenas de Carretera Interoceânica, que corta Brasiléia. “Temos de fazer de tudo para que Brasiléia não se torne apenas um corredor, mas que faça parte do processo”, observa o vereador. Em território

brasileiro, a Estrada do Pacífico começa na BR-364 em Porto Velho e no Acre continua pela BR-317, que passa por Rio Branco e vai até a tríplice fronteira com o Peru e Bolívia, atravessando Assis Brasil e Iñapari. O vereador lembra que a Estrada do Pacífico vai favorecer a integração sulamericana, a circulação de pessoas, o turismo e o comércio bilateral entre o Brasil e o Peru. A estrada representa desenvolvimento e vai garantir principalmente o acesso dos produtos peruanos ao Oceano Atlântico e o acesso dos produtos brasileiros ao Oceano Pacífico.


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