Com Esta Voz Me Visto - O Fado e A Moda

Page 1



FADO AND FASHION


FADO




Arte da música e dos sons que a fazem, o Fado é também a imagem com que se mostra e nos fascina. Escutamos a voz ritmada de Marceneiro e lembramo-nos da boina e do cachené que se lhe tornaram inseparáveis e distintivos. Ouvimos Amália e o voo da sua voz dá-nos a ver um perfil negro afirmado sobre o mundo. Mas o contrário também é verdade: olhamos um longo vestido preto com o xaile que o acrescenta e ele traz-nos, intacto, o canto de Amália. É por saberem isto que as fadistas e os fadistas das novas gerações procuram na roupa que os veste uma confirmação das suas vozes e uma projecção nos nossos sentidos.

Fado is the art of music and the sounds that it makes. But it is also the imagery it conveys to us and which fascinates us. We hear Marceneiro’s rhythmic voice and remember his distinctive cap and neck scarf which became almost inseparable from him. We listen to Amália and her soaring voice conveys the image of a black profile silhouetted against the world. But it also works the other way around: we see a long black dress with a shawl on top and this recalls the songs of Amália for us. It is because they know this that Fado singers and the Fado singers of recent generations seek to confirm their voices and project them into our senses through the clothes that they wear.

Esta exposição é como que uma história do Fado feita através dos trajes que o vestiram e vestem. Nela, podemos encontrar, descobrir ou rever os figurinos usados pelos seus grandes intérpretes nos palcos em que o cantaram. Dos teatros às casas de Fado, da televisão ao cinema, vemos aqui desfilarem, passando por nós quando nós passamos por eles, os modelos que deram imagens ao som e corpo às vozes. Vemos como esta iconografia, que é uma outra biografia do Fado, se foi apurando e sofisticando, aliando a cultura popular à moda contemporânea, o tradicionalismo à irreverência, o casticismo ao cosmopolitismo, o carácter à diversidade, a elegância à ousadia. Nos melhores momentos desta história, a estética musical e a estética visual foram espelho uma da outra.

This exhibition is like a history of Fado through the clothes that they wore and wear. In it we can find, discover or recall the costumes used by its great artists on the stages where they sang. From theatres to Fado houses, from television to the cinema, here we see the clothes that lent an image to the sound and body to the voices parading before us as we walk past them. We see how this iconography, which is another biography of Fado, became more refined and sophisticated, blending popular culture with contemporary fashion, traditionalism with irreverence, the vernacular and the cosmopolitan, character with diversity, elegance with daring. In the best moments of this history, the musical aesthetic and the visual aesthetic came to mirror each other. Some of these costumes are icons of an era. Many are insignias of a style. Others are landmarks in a career and symbols of an artistic personality. All are memories of an art that lives its past in the future. We visit this exhibition and capture a condensed image of Fado, one which, with it, became universal.

Alguns destes figurinos são ícones de uma época. Muitos são insígnias de um estilo. Outros são marcas de uma carreira e símbolos de uma personalidade artística. Todos são memórias de uma arte que vive o seu passado no futuro. Visitamos esta exposição e captamos uma imagem-síntese do Fado, aquela que, com ele, se tornou universal.

Put on in partnership by two of Lisbon City Hall’s museums, the MUDE and the Fado Museum, the exhibition I Wear My Voice on My Sleeve, besides its great cultural and artistic interest, also serves as a valuable example: it shows how cooperation between two museums in the municipal cultural network can be useful and productive. This is, in fact, the path that, in these times, is being followed by cultural institutions throughout the world.

Realizada em parceria por dois museus da Câmara Municipal de Lisboa, o MUDE e o Museu do Fado, a exposição Com Esta Voz Me Visto, para além do seu grande interesse cultural e artístico, tem também um valor de exemplo: mostra como a cooperação entre dois museus da rede municipal de cultura é útil, proveitosa e produtiva. É esse, aliás, o caminho que, nestes tempos, vem sendo seguido por instituições culturais em todo o mundo. 7


Capa do Disco | Record Cover - Amália Canta Portugal. Folclore, Columbia, s/d | undated Colecção | Colletion - Museu do Fado

8


FADO AND

FASHION

Dispondo os nossos museus municipais de um património riquíssimo que tem Lisboa como centro comum, é muito importante que um tão importante tesouro seja valorizado por aproximações e cruzamentos que o tornem mais visível e conhecido. Assim, trata-se aqui não apenas de uma colaboração ocasional, mas de uma experiência motivadora e fecunda.

Our municipal museums have extremely valuable collections that all have Lisbon as their common core, and as such, it is very important that such a significant asset be further enhanced by approaches and exchanges that make it more visible and better known. So what we have here is not just a one-off collaboration, but an encouraging and fertile experience.

Foi com gosto que estimulei essa colaboração e esse desafio. Ao fazê-lo, quis dizer que o uso dos nossos recursos deve ser sempre pensado tendo em conta as missões das instituições culturais e os públicos a que se destinam.

I enjoyed driving this collaboration and this challenge. In doing so, I wanted to show that the use of our recourses should always take into account the cultural institutions’ missions and the public they are aimed at.

A exposição Com Esta Voz Me Visto integra-se no programa das comemorações da atribuição ao Fado, pela UNESCO, da classificação de Património da Humanidade. Tal como a candidatura que preparámos e apresentámos com rigorosos critérios científicos e musicológicos, quisemos que estas comemorações tivessem os mesmos atributos de excelência cultural e de exigência artística. Esta exposição é, também desse ponto de vista, modelar.

The exhibition I Wear My Voice on My Sleeve is part of the program to commemorate the classification of Fado, by UNESCO, as Heritage of Humanity. Just as the candidature we prepared and presented used rigorous scientific and musicological criteria, we wanted these commemorations to have the same attributes of cultural excellence and high artistic standards. From this point of view, this exhibition is also exemplary.

Como Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, é-me muito grato felicitar as directoras do Museu do Fado e do MUDE – comissárias também desta exposição – por este projecto comum, agradecendo a todos os que nele colaboram, contribuindo para a sua grande qualidade: às equipas de ambos os museus, fadistas e designers de moda, outros museus e colecções.

As Mayor of Lisbon City Hall, I am very pleased to congratulate the directors of the Fado Museum and of the MUDE – who were also the curators of this exhibition – for this common project, and to thank everyone who worked on it, adding to its high quality: the teams from both museums, Fado singers and Fashion Designers, other museums and collections.

Canção de Lisboa, o Fado tornou-se canção de Portugal inteiro. Hoje, mais do que nunca, é uma canção universal, que nos é bilhete de identidade e passaporte para o mundo. Estou, por isso, certo de que esta exposição vai interessar e encantar todos os que gostam de Moda e todos os que gostam de Fado, descobrindo, nas notas da sua música e no timbre das suas vozes, aquela intensidade humana em que nos reconhecemos e reencontramos.

Music of Lisbon, Fado became the music of all Portugal. Today, more than ever, it is a universal music, which is our identity card and passport to the world. I am, therefore, certain that this exhibition will interest and enchant everyone who likes Fashion and everyone who likes Fado, discovering, in the notes of its music and in the timbre of their voices, that human intensity in which we recognise and rediscover ourselves. António Costa Mayor of Lisbon City Hall

António Costa Presidente da Câmara Municipal de Lisboa 9



COM ESTA VOZ ME VISTO, COM ESTAS ROUPAS ME CANTO

I WEAR MY VOICE ON MY SLEEVE, I SING THE BODY ADORNED

I. “Todos Nós temos Amália na Voz e temos na sua Voz a Voz de Todos Nós” António Variações

I. “We all have Amália in our Voice and in her Voice is the Voice of Everyone” António Variações

“Com esta voz me visto” olha para o Fado pela perspectiva da Moda, criando um palco privilegiado para o encontro entre a voz (um dos instrumentos do Fado) e o vestuário (importante contributo para a evolução e divulgação da sua imagem). Omnipresente, a alma universal do Fado expressa nos corpos que dão forma ao canto. Sobretudo, através dos corpos femininos, bem evidentes no projecto museográfico, nas fotografias que integram o catálogo, nos 60 coordenados apresentados e nas mais de 15 peças expostas (xailes e mantoons, acessórios e joalharia). O resultado é uma pequena amostra do Fado e da sua imagem, através de vozes e interpretes que se preocuparam com a sua estilização, colaborando assim com alguns dos melhores designers da moda portuguesa. Falamos de Amália Rodrigues, Anita Guerreiro, Alexandra, Ana Sofia Varela, Ana Moura, Aldina Duarte, Cuca Roseta, Cristina Branco, Carminho, Hermínia Silva e Katia Guerreiro, Lenita Gentil e Lucília do Carmo, Maria Alice, Maria Amélia Proença, Maria da Fé, Mariza, Mafalda Arnauth, Mísia, Márcia Condessa e Raquel Tavares. Não menos exigentes que estas mulheres fadistas, de diferentes gerações e estilos, os homens fadistas também investiram na sua imagem de marca. Nesta exposição, apresentamos peças de alguns deles: A boina e o cachené de Alfredo Marceneiro, o cordão de ouro de Rodrigo ou o lenço comprido que envolvia o tronco nu de Paulo Bragança.

“I Wear My Voice on My Sleeve” looks at Fado from the perspective of Fashion, creating a main stage for an encounter between the voice (one of the instruments of Fado) and clothes (an important contribution towards the evolution and dissemination of its image). Omnipresent, the universal soul of Fado is expressed on the bodies that give shape to song. Especially through women’s bodies, which is patently clear in this museographic project, in the photographs in the catalogue, in the 60 outfits presented and more than 15 items displayed (shawls and mantons, accessories and jewellery). The result is a small sample of Fado and its image, through voices and singers who were concerned with their style, and who therefore collaborated with some of the best Portuguese fashion designers. We are speaking of Amália Rodrigues, Anita Guerreiro, Alexandra, Ana Sofia Varela, Ana Moura, Aldina Duarte, Cuca Roseta, Cristina Branco, Carminho, Hermínia Silva and Katia Guerreiro, Lenita Gentil and Lucília do Carmo, Maria Alice, Maria Amélia Proença, Maria da Fé, Mariza, Mafalda Arnauth, Mísia, Márcia Condessa and Raquel Tavares. No less demanding than these female Fado singers, of different generations and styles, male Fado singers also invested in their brand image. In this exhibition we present some of their clothes: Alfredo Marceneiro’s cap and neckerchief, Rodrigo’s gold cord or the long scarf that was wrapped around Paulo Bragança’s naked body.

Com esta exposição, queremos fazer uma justa homenagem a todos aqueles que, directa ou indirectamente, se deixaram abraçar pela alma do Fado, vestindo-lhe a voz ao longo dos tempos, contribuindo para a divulgação de uma das maiores formas de expressão dos sentimentos de um colectivo humano que, sem fronteiras, não é apenas português, é do mundo e é de cada um de nós. Transversal a todas as classes sociais, o Fado sempre se reclamou como propriedade de todos os que, de alguma forma, o interpretam, o ouvem e sentem, divulgando-o e mantendo-o vivo, dinâmico. Por isso, ao percorrer esta

With this exhibition, we want to pay a fair tribute to all of those who, directly or indirectly, have been touched by the soul of Fado, wearing its voice over the years, helping to divulge one of the greatest forms of expression of the sentiments of a human collective that, without boundaries, is not only Portuguese, it is of the world and of each one of us. Cutting across all social classes, Fado always claimed to belong to everyone who, in some way, sang or played it, listened to it and felt it, disseminating it and keeping it alive and dynamic. Therefore, on passing through this small gallery of names and voices, we should 11


pequena galeria de nomes e vozes, devemos manter sempre presente, em cada um de nós, as sua origens. Nascido numa cultura popular operária e laboral, era cantado pelo povo, em tom dolente e magoado, num qualquer recanto bairrista de Lisboa, como um lamento de uma vida dura e difícil. À época, envergavam-se as roupas de trabalho, daí o tradicional xaile de franjas, saia rodada e chinelo no pé.

each of us always bear its origins in mind. Born of a popular working class culture, it was sung by the people, dolefully and melancholically, in any neighbourhood of Lisbon, as a lament to a tough and gruelling life. At the time, people wore their working clothes, hence the traditional fringed shawl, flared skirt and slippers on their feet.

Lugar de destaque cabe inteiramente a Amália. Absolutamente revolucionária e transgressora quando introduz o negro integral como cor maior da sua “estranha forma de ser”, por entre notas de cor e padrões de grande irreverência ou quando decide quebrar com os estereótipos mais populares, criando para si própria uma imagem cosmopolita, sofisticada, elegante e mais internacional.

Pride of place belongs entirely to Amália. She was absolutely revolutionary and a transgressor when she introduced her completely black attire as the main colour of her “strange way of being”, among colourful notes and highly irreverent patterns or when she decided to break with the more popular stereotypes, creating a cosmopolitan, sophisticated, elegant and more international image for herself.

Os focos da exposição direccionam-se para os coordenados de moda e para os costureiros, figurinistas e designers de moda que os criaram. Esta é pois uma oportunidade singular de relembrar ou de dar a conhecer alguns dos nomes que muito contribuíram para a moda em Portugal, nomeadamente Anna Maravilhas e Maria-Thereza Mimoso; Augustus, Paulo Matos e José Carlos; Pinto de Campos e José Manuel Costa Reis. A diversidade da linguagem contemporânea é também evidenciada através das propostas de Ana Salazar e Aleksandar Protic, Filipe Faísca, José António Tenente e João Rôlo, Luís Buchinho e Lidija Kolovrat, Nuno Baltazar, Ricardo Preto e os Storytailors.

The focal groups of the exhibition are aimed at the fashion outfits and the seamstresses, costume designers and fashion designers who created them. This is therefore a unique opportunity to recall or discover some of the names who most contributed towards fashion in Portugal, namely Anna Maravilhas and Maria-Thereza Mimoso; Augustus, Paulo Matos and José Carlos; Pinto de Campos and José Manuel Costa Reis. The diversity of contemporary language is also shown through the proposals of Ana Salazar and Aleksandar Protic, Filipe Faísca, José António Tenente and João Rôlo, Luís Buchinho and Lidija Kolovrat, Nuno Baltazar, Ricardo Preto and the Storytailors.

Sempre presente, o Fado cuja voz vai ganhando corpo perante os nossos olhos, revelando algumas das formas como se pode vive-lo e interpretá-lo. “Com esta voz me visto” percorre assim mais de 60 anos da história do Fado e da história da Moda em Portugal, apresentando coordenados e acessórios desde a década de 1940 até aos nossos dias.

Always present, the voice of Fado takes shape before our very eyes, revealing some of ways it can be experienced, sung and played. “I Wear My Voice on My Sleeve” therefore covers over 60 years of the history of Fado and of the history of Fashion in Portugal, presenting outfits and accessories dating from the 1940’s up to the present day.

12


II.

II.

“Se a cultura de massas está imersa na moda, é também por gravitar em torno de figuras de encanto cujo êxito prodigioso arrasta adorações e entusiasmos extremos: estrelas e ídolos.(...) Com as estrelas, a forma moda brilha em todo o seu esplendor e a sedução está no zénite da sua magia.(...) O que a caracteriza é o encanto insubstituível da sua aparência, e o star-system pode definir-se como a fábrica encantada de imagens de sedução. (...) Tal como a moda, a estrela é construção artificial, e se a moda é estetização do vestuário, o star-system é estetização do actor, do seu rosto, de toda a sua individualidade” Gilles Lipovetsky, 19871

“If mass culture is immersed in fashion, it is also because it gravitates around enchanting figures whose prodigious success attracts extreme adoration and enthusiasm: stars and idols. (...) With the stars, the way fashion shines in all of its splendour and seduction is at the height of its magic (...) What characterises it is the irreplaceable enchantment of their appearance, and the star system can be defined as the enchanted factory of images of seduction. (...) As with fashion, a star is an artificial construction, and is fashion is the aesthetization of clothing, the star system is the aesthetization of the actor, of his or her face, of the whole of their individuality” Gilles Lipovetsky, 19871

Olhar para o Fado pela perspectiva da Moda é, à partida, uma leitura linear. Mas se atendermos com mais atenção a estas duas palavras – Fado e Moda – e aos universos e significações que encerram, esta abordagem adquire múltiplas cambiantes, podendo tomar uma perspectiva histórica, cultural, antropológica e sociológica ou um olhar estético, psicológico e comunicacional.

Looking at Fado from the perspective of Fashion is, from the outset, a linear interpretation. But if we pay a little more attention to both of these words – Fado and Fashion – and to the universes and meanings they imply, this approach takes on multiple variants, such as taking a historical, cultural, anthropological and sociological perspective or a an aesthetic, psychological and communicational viewpoint.

Comecemos pela Moda.

Let us start with Fashion.

Ligada às noções de originalidade, inovação e criatividade, a moda é, por natureza, efémera, transitória, mutável e de rápido consumo, sendo um dos elementos constituintes da Modernidade2. Muda em cada nova colecção, valorizando sobretudo o instante presente, também ele iminente e veloz. Porém, quando capta o “ar do tempo”, a moda revela (ou antevê) a identidade colectiva de cada momento e as grandes transformações socioculturais de cada tempo histórico. Fortemente motivada pelas alterações sociais, económicas ou políticas e pelos movimentos culturais e artísticos, a moda é um fenómeno sociocultural que nos permite conhecer a transformação das mentalidades, códigos sociais, valores e atitudes, através das suas silhuetas e estilos, materiais, técnicas e cortes. Socialmente,

Related to notions of originality, innovation and creativity, fashion is, by nature, ephemeral, transitory, mutable and quickly consumed, being one of the elements that comprise Modernity2. It changes with each new collection, above all emphasising the present moment, and is also imminent and fast. However, when it captures the “mood of the times”, fashion reveals (or predicts) the collective identity of each moment and the great socio-cultural transformations of each historic period. Heavily motivated by social, economic and political change and by cultural and artistic movements, fashion is a socio-cultural phenomenon that allows us to perceive a transformation of mentalities, social codes, values and attitudes, through their silhouettes and styles,

1 - LIPOVETSKY, Gilles (1987), O Império do Efémero. A moda e o seu destino nas sociedades modernas. Lisboa: D. Quixote. pp.286-287.

1 - LIPOVETSKY, Gilles (1987), O Império do Efémero. A moda e o seu destino nas sociedades modernas. Lisbon: D. Quixote. pp.286-287.

2 - BAUDELAIRE, Charles (1863), O pintor da vida moderna. Lisboa: Vega.1993.

2 - BAUDELAIRE, Charles (1863), O pintor da vida moderna. Lisbon: Vega.1993.

13


Alfredo Marceneiro, Amália Rodrigues, Fernando Farinha Tivoli, 1962 Colecção | Collection - Museu do Fado

14


ela distingue e integra quem está “na moda” de quem está “fora de moda”, desencadeando, em paralelo, um sentimento de pertença (ou exclusão), reconhecimento e identificação (ou distância)3. Hoje em dia, é também uma importante indústria criativa com implicações na economia, turismo cultural, comunicação, marketing e publicidade. Mas a moda é também uma das formas mais importantes de comunicação individual, expressão e relação do eu com o outro. O vestuário e a maquilhagem, o penteado e os acessórios que usamos são uma linguagem não verbal que permite a construção de uma imagem, imagem essa que espelha a própria identidade e os diferentes estados de espírito. A moda relaciona-se assim, sobretudo, com os diferentes papéis desempenhados no espaço público, com a nossa aparência e individualidade. A moda oferece também uma constante possibilidade de nos reinventarmos, dando asas à nossa imaginação, criatividade e vontade de assumir outros papéis. A moda permite assim compreender tanto a identidade do individuo, como a do colectivo onde está inserido.

materials, techniques and cuts. Socially, it distinguishes and includes who is “in fashion” from those who are “out of fashion”, at the same time setting off a feeling of belonging (or exclusion), recognition and identification (or distance)3. Nowadays, it is also an important creative industry with implications for the economy, cultural tourism, communication, marketing and advertising. But fashion is also one of the most important forms of individual communication, expression and relationship of I with the other. The clothing and makeup, hairstyles and accessories we wear and use are a non-verbal language that helps to construct an image; an image which reflects one’s very identity and different states of mind. Fashion is therefore related, above all, with the different roles played in the public arena, with our appearance and individuality. Fashion also offers the constant possibility for us to reinvent ourselves, giving flight to our imagination, creativity and desire to assume other roles. Fashion therefore helps us to understand both the identity of the individual and of the collective it is a part of. And Fado?

E o Fado? Canção de Lisboa, miscigenada desde a sua origem, com sangue mouro e africano a correr-lhe nas veias, o Fado tem feito uma longa trajectória, desde que nasceu na segunda metade de Oitocentos até ao seu muito recente reconhecimento nos circuitos da world music e da cultura pop internacional. De origem popular, boémia e, de certo modo, marginal, a dolência do Fado sempre se conjugou com destino e desamor, tragédia, fatalismo e saudade. Difundido através da rádio, do teatro de revista, do cinema e da televisão, cedo se foi transfigurando, para se assumir como a expressão da identidade de um povo. Determinantes para esta transformação, os poemas que Amália decide incluir no seu reportório, com músicas de Alain Oulman, por sentir nos seus versos a simplicidade popular do Fado, a identidade e a espiritualidade da alma portuguesa. Relembremo-la a cantar Luís de Camões, David Mourão-Ferreira, Pedro Homem de Mello, Alexandre O’Neill, José Régio, Luís de Macedo ou Natália

Song of Lisbon, mixed and merged from birth, with Moorish and African blood running through its veins, Fado has come a long way since it was born in the second half of the eighteen hundreds to its very recent recognition in world music circuits and by international culture pop. Of popular origin, bohemian and, in a way, marginal, Fado’s melancholy always went hand in hand with destiny and lack of love, tragedy, fatalism and longing. Broadcast over the radio, through theatrical revues, the cinema and television, it soon started to change on its path to becoming the expression of the identity of a people. Decisive to this transformation were the poems that Amália decided to include in her repertoire, with songs by Alain Oulman, as in their verses she felt the popular simplicity of Fado, the identity and spirituality of the Portuguese soul. We recall her singing Luís de Camões, David Mourão-Ferreira, Pedro Homem de Mello, Alexandre O’Neill, José Régio, Luís de Macedo or Natália Correia. But, we also remember Carlos do Carmo interpreting José Carlos Ary dos Santos,

3 - SIMMEL, Georg (1905), Filosofia da Moda e Outros Escritos. Lisboa: Texto & Grafia. 2008. (Compilação de 3 textos dos primeiros anos do século XX - “Filosofia da moda”, “Psicologia do adorno” e “Psicologia da coqueteria”)

3 - SIMMEL, Georg (1905), Filosofia da Moda e Outros Escritos. Lisboa: Texto & Grafia. 2008. (Compilation of 3 texts from the early years of the 20th century - “Filosofia da moda”, “Psicologia do adorno” and “Psicologia da coqueteria”)

15


Correia. Mas, recordemos também Carlos do Carmo a interpretar José Carlos Ary dos Santos, Manuel Alegre ou José Luís Tinoco e Mísia a interpretar Sérgio Godinho, José Saramago, Jorge Palma ou António Lobo Antunes; ou, ainda, Aldina Duarte e Camané a cantarem poemas de Manuela de Freitas ou José Mário Branco...

Manuel Alegre and José Luís Tinoco, and Mísia singing Sérgio Godinho, José Saramago, Jorge Palma or António Lobo Antunes; or even Aldina Duarte and Camané singing poems by Manuela de Freitas or José Mário Branco... There were many attempts to embroil Fado in ideological issues, and was even marginalised in the post-revolution period for being connoted with the Estado Novo. However, it was this same Estado Novo that always tried to make a correspondence between the national identity and fatalism, the acceptance of destiny, modesty, “the joy of poverty”, and rural and catholic values, so characteristic of many fados of the time, imposing prior censorship on their words. But, in fact, Fado has managed to recreate itself through discourse, image and the positioning of its singers, musicians and composers without ever losing its essence, or rather, always continuing to sing the human soul and, for that very reason, belonging to the heritage of the whole of Humanity. When it includes new melodies, enriches its poetry, incorporates other sounds or transforms aspects of its performance, it demonstrates vitality, a capacity for recreation and profound contemporaneity, at the same time as it remains faithful to its cultural and historic origins.

Muitas foram as tentativas de enredar o Fado em questões ideológicas, tendo sido mesmo marginalizado no período pós-revolução por ser conotado com o Estado Novo. Porém, é este mesmo Estado Novo que sempre procurou fazer uma correspondência entre a identidade nacional e o fatalismo, a aceitação do destino, a modéstia, “a alegria da pobreza”, e os valores rurais e católicos, tão característicos de muitos fados da época, impondo sobre as suas letras uma censura prévia. Mas, na verdade, o Fado tem sabido recriar-se através do discurso, imagem e posicionamento dos seus interpretes e compositores, sem nunca perder a sua essência, ou seja, continuando sempre a cantar a alma humana e, por isso mesmo, pertencendo ao património de toda a Humanidade. Quando integra novas melodias, enriquece a sua poética, incorpora outras sonoridades ou transforma a sua performatividade, demonstra uma vitalidade, capacidade de recriação e profunda contemporaneidade, ao mesmo tempo que se mantém fiel às suas origens culturais e históricas.

Because of all of this, the dialogue between Fashion and Fado broadens the different dimensions of both of these expressions, adding fresh meaning. Let us focus our attention on only two main aspects.

Por tudo isto, o diálogo entre a Moda e o Fado amplia as diferentes dimensões destas duas expressões, acrescentando renovadas significações. Foquemos a nossa atenção apenas em dois aspectos principais.

The great majority of the outfits presented were intended for shows or different means of diffusion and dissemination. We are seeing “stage dress”, essential items in the construction of the artist’s image, in the personification of Fado and in the global conception of spectacle. What is therefore on display, with particular evidence, is fashion’s capacity for metamorphosis and the absolute need for it to reflect the personality, the voice and the attitude of the artist it is intended for. These conditions gain greater significance when we speak of someone with the status of Diva, or rather, of Amália. In this case, we would emphasise that fashion gains increased symbolic value as dressing Amália is, simultaneously, dressing the woman, the singer, the image that lives in the collective imagination, the Portuguese essence and

A grande maioria dos coordenados apresentados destinaram-se a espectáculos ou a diferentes meios de difusão e divulgação. Estamos perante “trajes de cena”, peças essenciais na construção da imagem, na personificação do fado e na concepção global do espectáculo. Manifesta-se assim, com particular evidência, a capacidade de metamorfose da moda e a absoluta necessidade de ela ser capaz de espelhar a personalidade, a voz e a atitude da interprete a quem se destina. Estas condições ganham maior amplitude quando falamos de alguém com um estatuto de Diva, ou seja, de Amália. Neste caso, a moda tem um acrescido valor simbólico pois vestir Amália é, 16


simultaneamente, vestir a mulher, a interprete, a imagem que vive no imaginário colectivo, a Portugalidade e a própria encarnação do Fado.

the very incarnation of Fado. On the other hand, it is possible to dress Fado itself? To create a visual identity for an expression that has become synonymous with Portugal and with which thousands of people identify, even if they do not understand the Portuguese language? How do you dress “saudade”* and silence? How do you lend form to the sentiment of destiny or embody melancholy and sadness? How do you materialise the mystery and nostalgia that Fado contains? Let us see how these, and other questions, have been dealt with for more than 60 years by dressmakers, seamstresses, costume designers and fashion designers.

Por outro lado, será possível vestir o próprio fado? Criar uma identidade visual para uma expressão que passou a ser sinónimo de Portugal e com a qual milhares de pessoas se identifica, mesmo que não entenda a língua portuguesa? Como se veste a saudade e o silêncio? Como se dá corpo ao sentimento de destino ou corporaliza a melancolia e a tristeza? Como se materializa o mistério e a nostalgia que o fado contém? Vejamos como estas, e outras questões, foram sendo equacionadas ao longo de mais de 60 anos por modistas, costureiras, figurinistas e designers de moda. III.

III.

“Sou mulher e sou muito feminina. Sempre fui tida e falada por muito feminina. Se vou para o palco, gosto de me ver bonita, bem arranjada, bem penteada. Se me enfeito, gosto de me ver enfeitada, gosto de pôr pulseiras, brincos, coisas que brilhem. Desde miúda sempre tive uma ideia de espectáculo. Mas não criei uma figura de palco. Ela nasceu em mim. (...) Achei que o xaile preto só ficava bem com o vestido preto. Por cima de um vestido às flores ou aos quadrados, como todas as fadistas usavam, não ligava bem. E fiz isto também por timidez, porque o preto está sempre certo, nunca ninguém diz que é feio. O preto é uma cor mais segura, mais bonita, disfarça muito o corpo, dá elegância, quando a pessoa tem alguma. O preto e o branco são cores lindas, mas o branco não é para o fado. Não há dúvida que o vestido preto com xaile preto, que eu comecei a usar, deu uma presença mais agradável ao fado. (...) Para mim, a moda funciona muito pouco, tenho a minha moda (...) Acho até que invento umas coisas que só anos depois é que se usam. Como aqueles vestidos soltos, tipo balandrau, que usava há mais de vinte e cinco anos.” Amália Rodrigues4.

“I’m a woman and I am very feminine. I was always looked on and spoken of as being very feminine. If I go on stage, I like to be pretty, well dressed, with my hair well done. If I dress up, I like to see myself adorned, I like to wear bracelets, earrings, things that shine. Since I was a girl I always had an idea of spectacle. But I didn’t create a stage figure. That was born in me. (...) I thought that the black shawl only went well with a black dress. It just didn’t match on top of a dress with flowers or a chequered dress, like all of the Fado singers used to wear. And I also did this out of timidity, because black always looks good, people never say that it is ugly. Black is a safer colour, prettier, it disguises the body well, and makes you even more elegant. Black and white are beautiful colours but white is not for Fado. There can be no doubt that a black dress with a black shawl, that I started to wear, made Fado more agreeable. (...) For me, fashion doesn’t work too much, I have my own fashion (...) I even think that I invent some things that I wear only years later. Like those loose tunic-like dresses that I used to wear more than twenty five years ago.” Amália Rodrigues4.

4 - PAVÃO DOS SANTOS, Vitor (2005), Amália, Uma Biografia. Lisboa: Editorial Presença., pp.173-177.

4 - PAVÃO DOS SANTOS, Vitor (2005), Amália, Uma Biografia. Lisbon: Edirial Presença., pp. 173-177.

17


“A imagem foi um factor fundamental no percurso e consagração de Amália Rodrigues. Uma voz absolutamente fora do comum, uma grande fotogenia, uma intuição apuradíssima, um sentido inato de elegância e uma manifesta inteligência e capacidade de aprendizagem foram os factores determinantes na construção da sua própria imagem, absolutamente icónica, na qual o traje e a joalharia desempenharam um papel fundamental. Dir-se-ia que existe um ‘antes’ e ‘depois’ de Amália”5. Amália é um marco determinante na tomada de consciência da importância da imagem e da sua construção para a mais completa expressão da sua voz. Esta tomada de consciência, e consequente mudança de imagem, ocorre em paralelo com o início da colaboração com Alain Oulman e com a sua decisão de cantar os grandes poetas portugueses. De facto, tanto na sonoridade como na imagem, Amália derruba uma série de estereótipos, enquanto afirma-se como uma mulher independente e emancipada, moderna e segura de si, atenta às novas modas e detentora de uma sensibilidade inata, elegante e sofisticada, plena de feminilidade. A força desta imagem (que muito contribuirá para a consolidação da sua carreira e para a sua excepcional projecção mediática internacional) reside na própria fragilidade de Amália e na plena consciência dos seus medos, tristezas e inseguranças. Para a construção do seu próprio estilo, contará com três mulheres, Anna Maravilhas, Maria-Thereza Mimoso (duas pioneiras da moda em Portugal) e Ilda Aleixo.

“The image was a fundamental factor in Amália Rodrigues’ career and consecration. An absolutely unusual voice, highly photogenic, a very keen intuition, an innate sense of elegance and manifest intelligence and capacity for learning were the decisive factors in the construction of her own image, absolutely iconic, in which one’s clothes and jewellery played a fundamental role. One could say that there is a ‘before’ and ‘after’ of Amália”5. Amália is a decisive landmark in the awareness of the importance of the image and of its construction for a more complete expression of her voice. This awareness, and consequent change of image, occurs in parallel with the start of her collaboration with Alain Oulman and with her decision to sing the great Portuguese poets. In fact, both in terms of sound and image, Amália knocked down a series of stereotypes, while she affirmed herself as an independent and emancipated woman, modern and sure of herself, aware of the new fashions and possessing an innate, elegant and sophisticated sensitivity, brimming with femininity. The strength of this image (that would contribute greatly towards consolidating her career and towards her exceptional international media projection) resides in Amália’s very fragility and in her complete awareness of her fears, sadness and insecurities. Three women helped her in the construction of her own style, Anna Maravilhas, Maria-Thereza Mimoso (two pioneers of fashion in Portugal) and Ilda Aleixo.

A partir de meados dos anos 40, numa altura em que ainda persistiam em Lisboa as festas de costureiras, os concursos de vestidos de chita e os cursos de corte e bordados, Amália vai ter coragem de assumir a diferença. Com os seus olhos bem marcados a negro e rubros lábios, cabelos negros e óculos escuros, envergando calça e casaco ou vestidos e saias rodadas New look, Amália iria contrastar, cada vez mais, com a imagem de um país “espécie de paraíso claro e triste” e com uma cidade que “sorria com um sorriso um tanto pálido, como o das mães que não têm quaisquer notícias do filho ausente na guerra e se esforçam por salvá-lo a poder ter confiança”, como expressava Saint-Exupéry na sua passagem por Lisboa em Dezembro de 1940,

As from the mid 1940’s, at a time when there were still dressmakers’ festivals, competitions of printed cotton dresses and cutting and embroidery courses in Lisbon, Amália was brave enough to be different. With her eyes starkly lined in black and red lips, black hair and dark glasses, wearing trousers and a coat or dresses and New Look skirts, Amália would increasingly contrast with the image of a country that was a “kind of clear and sad paradise” and with a city that “smiled a somewhat pallid smile, like that of a mother who has had no news of her son away at war and who wants to save him in order to be confident”, as Saint-Exupéry said while passing through Lisbon in December of 1940 on his way to the United States. During the 1940’s, 50’s and 60’s, the magazines Modas & Bordados, Voga, Eva and Jornal

5 - SANTOS, Rui Afonso (2009), “O traje, as jóias e a moda” in Amália – Coração Independente. Lisboa: Museu Colecção Berardo, p.265.

5 - SANTOS, Rui Afonso (2009), “O traje, as jóias e a moda” in Amália – Coração Independente. Lisbon: Berardo Collection Museum, p.265.

18


Ana Moura - fotografia | photography Rui Correia, s/d

a caminho dos Estados Unidos. Durante as décadas de 40, 50 e 60, os magazines Modas & Bordados, Voga, Eva ou Jornal Feminino iam mostrando como as costureiras, modistas e alfaiates colhiam um grande reconhecimento social e divulgavam as novidades que chegavam de Paris, Londres ou Nova Iorque (esta última, sobretudo depois da Segunda Guerra). Lisboa, apesar de todo o isolamento provocado pela guerra, mantinha-se informada da evolução da moda e confrontava-se com uma maior liberdade no vestir que as refugiadas de uma Europa em guerra iam protagonizando. As várias casas de costura e confecção que iam abrindo as portas realizavam viagens sazonais a Paris, importando os tecidos e trazendo as toiles de alguns dos principais costureiros franceses, como Christian Dior, Jean Patou, Jacques Fath, Jacques Griff, Pierre Balmain, Jean Desses, Cristobal Balenciaga ou Lucien Lelong, para os produzir ou recriar em Lisboa, e os apresentar em passagens de modelos, sobretudo a partir dos anos 406. A pouco e pouco, alguns nomes vão conseguindo criar um mercado próprio, tanto em Lisboa como no Porto. Falamos, por exemplo, de Madame Valle que abrira o seu atelier no Marquês de Pombal ainda na década de 20, e realizara o primeiro desfile em 1929, apresentando criações de estilistas franceses; de Beatriz Chagas que terá dois espaços nos anos 40, um na Rua Castilho, outro na Avenida da Liberdade; da casa Bobone, ao Chiado, fundada por Maria Luisa Teixeira, em 1931; da famosa Candidinha (Cândida Alves), que chega a ter atelier no Porto e em Lisboa, e a quem as senhoras da sociedade encomendavam desde o enxoval da filha até a um vestido para uma ocasião especial; ou de Sérgio Sampaio, com a sua linguagem geométrica e bem estruturada. Lugar de destaque cabe a Anna Maravilhas. Com atelier na rua Marquês de Fronteira e boutique na Rua Serpa Pinto, Anna Maravilhas mantém, durante décadas, um trabalho de grande originalidade, marcado pelo seu gosto por Dior, Balmain e Balenciaga. Vai, pela primeira vez, a Paris ainda em 1939, tendo sido capaz de criar e manter uma clientela fiel que lhe garantiu uma longevidade assinalável (a sua casa fechará só em 1989). Já depois do 25 de Abril, produz peças para a Loja Ayer, Loja das Meias, Último Figurino, Eduardo Martins e Espelho da Moda,

Feminino were showing how dressmakers, costume designers and tailors were gaining great social recognition and divulging what was new from Paris, London or New York (the latter especially after the Second World War). Lisbon, in spite of all of its isolation due to the war, kept up-to-date with what was happening in fashion and was enjoying greater freedom in what to wear than the refugees from a Europe at war. The various dress-making houses that were opening up made seasonal trips to Paris, importing fabrics and bringing toile from some of the main French clothes designers like Christian Dior, Jean Patou, Jacques Fath, Jacques Griff, Pierre Balmain, Jean Desses, Cristobal Balenciaga or Lucien Lelong, in order to produce or recreate in Lisbon, and to present their creations in fashion parades, especially as from the 1940’s6. Little by little, some names managed to create their own market, both in Lisbon and in Porto. We are speaking, for example, of Madame Valle who opened her atelier in the Marquês de Pombal in the 1920’s, and held her first parade in 1929, presenting creations by French fashion designers; of Beatriz Chagas who would have two outlets in the 1940’s, one in the Rua Castilho and the other in the Avenida da Liberdade; of the Bobone house, in the Chiado, founded by Maria Luisa Teixeira in 1931; of the famous Candidinha (Cândida Alves), who had an atelier in Porto and in Lisbon, and who society ladies would order anything from their daughters’ trousseau to a dress for a special occasion; or of Sérgio Sampaio, with his geometric, and well-structured language. Pride of place belongs to Anna Maravilhas. With her atelier in the Rua Marquês de Fronteira and boutique in the Rua Serpa Pinto, Anna Maravilhas produced highly original work for decades, marked by her liking for Dior, Balmain and Balenciaga. She went to Paris for the first time in 1939, and was able to create and maintain a faithful clientele which ensured her notable longevity (her house would only close in 1989). Then after the 25th of April, 1974, she produced items for Loja Ayer, Loja das Meias, Último Figurino, Eduardo Martins and Espelho da Moda, and was indissociable from the affirmation and vicissitudes of fashion (or from what might be called haut couture) in Portugal7. Among her many clients, Amália Rodrigues 6 - CARDIM, Valter Carlos (at the press), A Moda em Portugal. 1914-1959. Lisbon: IADE Edições.

6 - CARDIM, Valter Carlos (no prelo), A Moda em Portugal. 1914-1959. Lisboa: IADE Edições.

7 - DUARTE, Cristina (2004), O que é Moda. Lisbon: Quimera Editores, pp. 87-112.

19


ficando indissociável da afirmação e vicissitudes da moda (ou do que poderia ser a alta-costura) em Portugal7. Entre as suas muitas clientes, destaca-se Amália Rodrigues.

stands out. For Amália, Anna Maravilhas created, from the 1940’s, a series of outfits that catered to the desire to find her very own style. Some are in this exhibition. We would draw attention to two dresses, both from the 1960’s, the long, belted black dress, with rhinestone applications on the sleeves with which she performed frequently and the short black velvet dress, with feather applications that Amália used on different social occasions (never on stage), which clearly represent the look of these years. In its own right, a place of eminence goes to the long black dress printed with floral motifs, from 1958, as it is one of the items that Amália wore most on her first international tours. The three are representative of a keen sense of proportion, the adoption of a classic cut and the quality of the materials and details, characteristics that distinguish Anna Maravilhas.

Para Amália, Anna Maravilhas cria, a partir dos anos 40, uma série de coordenados que vão dar resposta à vontade de encontrar um estilo muito próprio. Alguns integram esta exposição. Salientamos, ambos da década de 60, o longo e cintado vestido negro, com aplicação de strass nas mangas com o qual actua frequentemente e o vestido curto de veludo preto, com aplicação de penas, que Amália usa em diferentes ocasiões sociais (nunca em palco), bem representativo da estética destes anos. Lugar de destaque cabe, por direito próprio, ao vestido preto comprido em tecido estampado com motivos florais, de 1958, por ser uma das peças mais usadas por Amália nas suas digressões quando inicia a sua consagração internacional. Os três são representativos de um apurado sentido das proporções, da adopção de um corte clássico e da qualidade dos materiais e detalhes, características que distinguem Anna Maravilhas.

Maria-Tereza Mimoso would have a long and close collaboration with Amália, but it was in the 1960’s that she produced one of her most important proposals: the reinterpretation of one of the icons of Fado – the fringed black shawl. Specifically for the important concert in the Olympia, Mimoso created a long dress with two flounces for Amália, in black figured silk, with a flared skirt. A striking feature is the circular black cape, in the same fabric, inspired by the tradition of Coimbra and which replaced the habitual shawl. Success was immediate and Amália’s image wearing this outfit and “on her left shoulder, a goodluck charm, a star studded with small diamonds and at the centre a diamond radiating light”8, singing with her arms and hands held high, or crossed on her breast, travelled far and wide. The colour black framed her voice and created a space of silence so that the spectator’s gaze could concentrate on her face and on her hands. Amália took on a timeless aura and acquired the status of Diva.

Já Maria-Tereza Mimoso terá com Amália uma estreita e longa colaboração, mas é logo nos anos 60 que assina uma das suas propostas mais importantes: a reinterpretação de um dos ícones do fado – o xaile negro de franjas. Especificamente para o importante concerto no Olympia, Mimoso cria para Amália um vestido longo de dois folhos, em seda preta lavrada, com saia rodada. Elemento marcante é a capa preta circular, com o mesmo tecido, inspirada na tradição de Coimbra e que substitui o habitual xaile. O sucesso foi imediato e a imagem de Amália envergando este coordenado e tendo “no ombro esquerdo, o porter-bonheur, uma estrela cravejada de brilhantes e ao centro um diamante a irradiar luz”8, cantando de braços e mãos erguidas, ou cruzadas sobre o peito, havia de se espelhar pelo mundo fora. O negro emoldurava a voz e criava um espaço de silêncio para que o olhar do espectador se concentrasse no seu rosto e nas suas mãos. Amália ganhava uma aura intemporal e adquiria o estatuto de Diva.

Two other classics which were immortalised with Amália are also on display in this exhibition. Both, completely in black and from the 1960’s: a satin dress, with a hem forming stripes in black velvet in a

7 - DUARTE, Cristina (2004), O que é Moda. Lisboa: Quimera Editores, pp. 87-112. 8 - AA.VV. (1999), Maria-Thereza Mimoso: 40 anos de moda: criação de moda portuguesa desde 1959. Lisboa: Museu Nacional do Traje, p. 202.

8 - AA.VV. (1999), Maria-Thereza Mimoso: 40 anos de moda: criação de moda portuguesa desde 1959. Lisbon: National Costume Museum, p. 202

20


Dois outros clássicos que se imortalizaram com Amália estão também presentes nesta exposição. Ambos, em negro integral e dos anos 60: um vestido de cetim, com barra formando riscas em veludo preto, de efeito de tecelagem que Amália utiliza, em 1963, para um concerto único em Beirute – um Te Deum na catedral por ocasião do Dia Nacional do Líbano; um vestido com aplicações de vidrilhos, manga comprida e justa, inspirado nos vestidos de noiva minhotos. Pormenor relevante nesta última proposta, também desenhada para outro concerto no Olympia, é o xaile triangular com aplicações semelhantes na barra9. Estes três coordenados são a metáfora perfeita para a Amália que canta os grandes poetas ao criarem uma imagem de grande sofisticação e elegância, intemporal e clássica. O negro integral e o vestido com mangas compridas, justas ou alargando em leque, justo no corpo e amplo na saia, rodada e armada, distinguem-na para sempre.

woven effect that Amália used in 1963 for a one-off concert in Beirut – a Te Deum in the cathedral to celebrate the National Day of Lebanon; a dress with applications of glass beads, with long tight-fitting sleeves, inspired by wedding dresses from the Minho region. An important detail in this last proposal, also designed for another concert in the Olympia, is the triangular shawl with similar applications on the hem9. These three outfits are the perfect metaphor for the Amália who sang the great poets, creating a highly sophisticated and elegant image, at once timeless and classic. The total black colour and the dress with long sleeves, tight-fitting or fanning out, tight on the body and with a broad, under-wired flared skirt set her apart forever. These three items are also emblematic of Maria-Thereza Mimoso’s work, who started work at only 15 years old in the Mme. Ruth’s dressmaking atelier, designing, cutting and modelling. Her creations would very quickly be on sale in the Ultimo Figurino. Her desire to learn more very naturally took her to Paris, where she stayed for two years, returning to Lisbon where she opened her own atelier of haut couture, and even presented her collection in Maxim’s (Paris) in 1973, and represented Portugal abroad. With a burning desire to find a fashion that was truly Portuguese, Mimoso always sought inspiration for her work in the traditional motifs and techniques of Portugal, reinterpreting them with her own particular know-how. We are speaking, for example, of her liking for popular Portuguese jewellery, in particular for the so-called “King style” and “Queen style” golden earrings from Viana; of the recreation of the traditional Alentejan cloaks and of the printed cotton items of Alcobaça; of the reinvention of the embroidery from Viana do Castelo or of the lace from Barcelos in its blouses, skirts, wraps and dresses. With these she managed to create “a non-provincial Portuguese fashion rooted in the geographic space of a intelligently perceived Portuguese culture in its broadest sense and recollecting a period of history that she treats passionately” (Sena da Silva)10.

Estas três peças são também emblemáticas do trabalho de MariaThereza Mimoso que cedo começou, com apenas 15 anos, no atelier de costura Mme. Ruth, a desenhar, cortar e modelar. Muito rapidamente, as suas criações estarão à venda n’o Ultimo Figurino. A vontade de aprender mais leva-a muito naturalmente para Paris, onde permanecerá dois anos, voltando a Lisboa onde abre o seu próprio atelier de alta-costura, chegando mesmo a apresentar a sua colecção no Maxim’s (Paris), em 1973, e a representar Portugal além-fronteiras. Com uma forte vontade de encontrar uma moda que fosse verdadeiramente portuguesa, Mimoso sempre procurou inspiração para os seus trabalhos nos motivos e técnicas tradicionais de Portugal, reinterpretando-os com um saber particular. Falamos, por exemplo, do seu apreço pela joalharia popular portuguesa, em particular pelos brincos em ouro de Viana, ditos “À Rei” ou “À Rainha”; da recriação dos capotes tradicionais alentejanos e das chitas de Alcobaça; da reinvenção dos bordados de Viana do Castelo ou das rendas de Barcelos nos seus camiseiros, saias, lenços e vestidos. Com eles, conseguiu criar “uma moda portuguesa ‘desprovincianizada’ cujas raízes se situam no espaço geográfico de uma cultura portuguesa inteligentemente entendida no seu sentido mais amplo e na memoria de um tempo

9 - Idem, Ibidem, pp. 201-221. 9 - Idem, Ibidem, pp. 201-221.

10 - Idem, Ibidem, p.389.

21


Mísia Booklet do disco | Album booklet - “Canto”, 2003 Fotografia | Photography - C. B. Aragão

22


histórico que ela percorre apaixonadamente” (Sena da Silva)10.

Anna Maravilhas and Maria-Thereza Mimoso are therefore the creators of the sophisticated, elegant and erudite image that has characterised Amália until today.

Anna Maravilhas e Maria-Thereza Mimoso são assim as criadores da imagem, sofisticada, elegante e erudita que caracteriza Amália até hoje.

Once again showing an intuitive sensitivity and a keen awareness of the time and of the public who she played for, Amália again transformed her clothing style in the years following the revolution of 1974. In the many concerts she gave from north to the south of Portugal, she “wore gypsy-style skirts, some airy blouses that were less solemn than usual”11. These are brightly coloured skirts and blouses or with floral patterns, of hippie inspiration. And Amália once again tuned into the options of international fashion where haut couture proposals brought bell-bottomed trousers, maxi-skirts and coloured printed fabrics reflecting the new attitudes and mentalities. Without ever neglecting her appearance, Amália also wore brightly coloured tunic-type dresses, to receiver her guests, both in her dressing room and at home.

Voltando a manifestar uma intuitiva sensibilidade e uma apurada consciência do tempo e do público que a recebia, Amália transforma novamente a sua indumentária nos anos seguintes à revolução de 1974. Nos múltiplos concertos dados de norte a sul de Portugal, passou a “usar umas saias à cigana, umas blusas frescas, com menos solenidade do que era habitual”11. Tratam-se de saias e blusas garridas ou com padrões florais, de inspiração hippie. E, de novo, Amália voltava a sintonizar-se com as opções da moda internacional onde as propostas de alta-costura apresentavam calças à boca de sino, maxisaias e coloridos tecidos estampados espelhando as novas atitudes e mentalidades. Sem nunca descuidar-se da sua aparência, Amália usava também vestidos tipo balandrau, bem coloridos, para receber os seus convidados, tanto nos camarins como em sua casa.

Prominence is also given to the various proposals designed by Ilda Aleixo, a seamstress who had worked in Anna Maravilhas’ atelier and to whom Amália would describe the dresses that she would like to wear. This presence is more notable during the 1980’s and 90’s, a period when there were various long black dresses in muslin, silk or organza, very often with voluminous flounces of lively colours, as is the case of the model designed in 1988, in tones of green, purple and pink. In all of them, we see the expert cut and precision of the proportions that Ilda Aleixo learned with Anna Maravilhas. We should point out the elegant dress black with poncho-like mantle. With Ilda Aleixo’s signature, Amália gained more colour (green, pink, purple, blue) and also started to often wear oblique-cut long skirts and loose blouses of printed floral fabrics or applications and embroidery, together with loose brightly coloured tunics.

Lugar de destaque cabe ainda às várias propostas assinadas por Ilda Aleixo, costureira que havia colaborado no atelier de Anna Maravilhas e a quem Amália passa a descrever os vestidos que gostava de usar. Esta presença é mais marcante durante os anos 80 e 90, período onde são vários os vestidos compridos e negros, em musselina, seda ou organza, muitas vezes com volumosos folhos de cores vivas, como é o caso do modelo desenhado em 1988, em tons de verde, roxo e rosa. Em todos, reconhece-se o saber do corte e a exactidão das proporções que Ilda Aleixo aprende com Anna Maravilhas. De assinalar, o elegante vestido negro com manto poncho. Com a assinatura de Ilda Aleixo, Amália ganha mais cor (verde, rosa, roxo, azul) e passa também a usar, com frequência, saias compridas em viés e blusas largas de tecidos estampados florais ou aplicações e bordados, juntamente com túnicas amplas de cores vivas.

Throughout her life, while she was recreating her repertoire and her image, Amália revolutionised Fado itself. Her voice also took with it all

10 - Idem, Ibidem, p.389. 11 - PAVÃO DOS SANTOS, Vitor (2005), Amália. Uma Biografia. Lisboa: Editorial Presença., p. 175.

11 - PAVÃO DOS SANTOS, Vitor (2005), Amália. Uma Biografia. Lisbon: Editorial Presença., p. 175.

23


Ao longo da sua vida, enquanto recriava o seu repertório e a sua imagem, Amália revolucionava o próprio Fado. A sua voz levava também consigo o povo anónimo que ainda hoje vive o seu fado e, por o viver, o sente e canta. Amália reinventou-se como ser humano através do Fado, redescobrindo-se na sua natureza de criança, ao aprender a amar a inocência popular desta canção nacional.

of the anonymous people who today still adore her Fado and, thereby live, feel and sing it. Amália reinvented herself as a human through Fado, rediscovering herself in her child-like nature, by learning to love the popular innocence of this national song.

IV.

“Wherever you go, in revues, in cabarets, in secluded venues, the staging of Fado is always the same. Eyes half-closed, the face set in a kind of trance, a laden sadness and, if that were not enough, the heaviness of a long black shawl” António Osório, 197412

IV.

“Em qualquer parte, na revista, nos cabarés, nos seus retiros, a encenação do fado é sempre igual. Olhos semicerrados, a cara crispada numa espécie de transe, um luto carregado e, como se não bastasse, o pesadume dum longo xaile negro” António Osório, 197412 O Fado subiu também aos palcos do teatro de revista e do musical onde foi reinterpretado. Figura marcante nessa estilização foi o figurinista e cenógrafo Pinto de Campos (1908-1975), figura cimeira do Parque Mayer e do teatro em Portugal. Do seu traço saíram inúmeros cenários, trajes e adereços para os mais diversos espectáculos (comédia, revista, musical, opereta...). Destaque para três figurinos que desenhou para Amália, todos com um sabor folclórico bem evidente. Três deles, desenhados durante os anos de 1940, inspirados no traje tradicional minhoto. Utilizando o negro e o vermelho, Pinto de Campos emprega todos os elementos habituais, enriquecendoos. Facilmente, reconhecemos os bordados em tons de amarelo (remetendo para a filigrana portuguesa), o avental com motivos florais, figuras geométricas e heráldicas, o xaile, também ele bordado com motivos florais (neste caso, não para colocar na cabeça, mas sobre os ombros), o colete, casaco cintado e saia longa e rodada, de listas horizontais, tudo ricamente bordado a lantejoulas, vidrinhos e lã. Amália usou-os, juntamente com compridos brincos de ouro, também eles de formulação minhota. Vinte anos mais tarde, Pinto de Campos

Fado also graced the stages of the music hall, vaudeville and musicals where it was reinterpreted. A major figure in this stylization was the costume designer and scenographer Pinto de Campos (1908-1975), the principal figure of the Parque Mayer and of the theatre in Portugal. From his pen came countless scenarios, costumes and props for a wide variety of shows (comedies, revues, musicals, operettas...). We highlight three costumes he designed for Amália, all with a very clear folkloric flavour. Three of them, designed during the 1940’s, were inspired by the traditional dress of the Minho region. Using black and red, Pinto de Campos used all of the usual elements, and enriched them. We easily recognise the embroidery in tones of yellow (recalling Portuguese filigree), the apron with floral motifs, geometric and heraldic figures, the shawl, also embroidered with floral motifs (in this case, not to be placed on one’s head, but over the shoulders), the waistcoat, belted coat and long, flared skirt, with horizontal stripes, all richly embellished with sequins, glass beads and wool. Amália wore them, together with long golden earrings, which were also styled from the Minho. Twenty years later, Pinto de Campos again designed a dress inspired by regional motifs for Amália to wear in the first part of the concert in the Lincoln Center, in New York, where she sang folkloric

12 - António Osório citado em MATOS, Manuel de Cadafaz de (1982), “Para uma antropologia cultural da canção portuguesa na primeira fase da ditadura” (1926-1937) in O Fascismo em Portugal. Actas do colóquio Faculdade de Letras. Lisboa: A Regra do Jogo. p. 481.

12 - António Osório cited in MATOS, Manuel de Cadafaz de (1982), “Para uma antropologia cultural da canção portuguesa na primeira fase da ditadura” (1926-1937) in O Fascismo em Portugal. Actas do colóquio Faculdade de Letras. Lisbon: A Regra do Jogo. p. 481.

24


Mariza em | in Fados, de | by Carlos Saura, 2007

songs, accompanied by an orchestra. With an apparently identical formulation, this embroidered dress stands out from the previous ones due to the material used, which lends it a distinctive texture, but also due to a more stylised treatment of the traditional references, a more lively colouring and greater graphic enhancement of each decorative feature. When Felipe La Feria put the musical Amália on the stage in 1999, Alexandra wore a replica of this important stage dress, even respecting the long fringed shawl.

volta a desenhar um vestido inspirado em motivos regionais para Amália se apresentar na primeira parte do concerto no Lincoln Center, em Nova Iorque, onde interpretava temas de folclore, acompanhada por orquestra. Com uma formulação aparentemente idêntica, este vestido bordado destaca-se dos anteriores pelo material utilizado, que lhe dá uma textura distinta, mas também por um tratamento mais estilizado das referências tradicionais, por um colorido mais alegre e uma valorização mais gráfica de cada elemento decorativo. Quando Felipe La Feria leva ao palco o musical Amália, em 1999, Alexandra envergará uma réplica deste importante traje de cena, respeitado até no longo xaile de franjas.

In 2008, in a completely different time and context, Raquel Tavares, with her bearing and clothing, evoked the iconography of the emblematic Severa. She did so specifically in the promotion and in the shows to present her album Bairro where she wore two outfits (each with a blouse, skirt and bodice, plus accessories) which recall the image of Severa, as we see it in the famous canvas of José Malhoa, O Fado, of 1910, listening to the guitar in an affected pose. With a flared red skirt and sloppy white sleeveless top, slipper falling from her foot, cigarette in her hand and hair gathered at the back of her neck, this Severa – Adelaide da Facada recorded by Malhoa is the model that inspired Tiago Cardoso when he dressed Raquel Tavares. In the presentation videos, Raquel Tavares appears in a scenario that recalls the parochial context of Fado house and guitars playing. Anita Guerreiro had also personified the mythical Severa when she interpreted the musical sketch Fui ao Baile, in 1954, indicating the persistence and strength of this image.

Em 2008, numa época e contexto completamente distintos, Raquel Tavares evoca, com o seu porte e indumentaria, a iconografia da emblemática Severa. Fá-lo especificamente na promoção e nos espectáculos de apresentação do seu disco Bairro onde veste dois coordenados (cada um com blusa, saia e corpete, mais acessórios) que remetem para a imagem de Severa, tal como a vemos na famosa tela de José Malhoa, O Fado, de 1910, num jeito dengoso a ouvir a guitarra. Com uma saia rodada vermelha e descuidada camisa branca de alças, chinelo a sair do pé, cigarro na mão e cabelo preso atrás, junto ao pescoço, esta Severa – Adelaide da Facada registada por Malhoa é o modelo que inspira Tiago Cardoso para vestir Raquel Tavares. Nos vídeos de apresentação, Raquel Tavares aparece num cenário que remete para o contexto bairrista de casas de fado e guitarradas. Também Anita Guerreiro havia personificado a mítica Severa quando interpreta o quadro musical Fui ao Baile, em 1954, indicando a persistência e a força desta imagem.

Throughout the whole of the 20th century, we see the constancy of some inspirational references and motifs whenever Fado was staged, especially in musical hall revues. In the costumes (as in the scenarios), 25


Ao longo de todo o século XX, manifesta-se a constância de algumas referências e motivos de inspiração sempre que se encena o Fado, sobretudo no teatro de revista. Nos figurinos (como nos cenários), encontram-se quase sempre alusões à imagem de Severa, aos motivos folclóricos nacionais, às guitarras e à calçada portuguesa das ruas de Lisboa.

we almost always see allusions to the image of Severa, to national folkloric motifs, to the guitars and to the Portuguese paving in the streets of Lisbon. V. “Don’t sing false joys if there is pain consuming your heart Let the sadness out as you can only learn to smile when you speak the truth” José Mário Branco, Fado da Tristeza, 1982

V. “Não cantes alegrias a fingir Se alguma dor existir A roer dentro da toca Deixa a tristeza sair Pois só se aprende a sorrir Com a verdade na boca” José Mário Branco, Fado da Tristeza, 1982

Already with a long career, in the 1980’s Maria da Fé became a fundamental reference in Fado, in particular in Brazil where she gave a series of shows, especially between 1984 and 1987. On the other hand, her restaurant, Sr. Vinho, opened in 1975, became one of the main places to hear Fado at that time. In parallel with this, we also find Lenita Gentil and Alexandra, with careers that also span light music and popular marches, music hall revues, musicals and television. Three voices that enjoyed great popularity during this period and which, in 2000, got together with Alice Pires in the musical project “Entre Vozes” (Among Voices). With them we find Augustus and José Carlos, and also Paulo Matos and José Manuel Costa Reis, names that produced their work in a period when fashion did not yet receive from the public and from the critics the recognition that it would years later and when Fado was going through a crisis of identity.

Já com uma vasta carreira, Maria da Fé torna-se, durante os anos de 1980, uma referência incontornável do fado, em particular no Brasil onde realiza uma série de espectáculos, em especial entre 1984 e 1987. Por outro lado, o seu restaurante, Sr. Vinho, aberto logo em 1975, afirma-se nesta época como um dos principais locais para se ouvir bom fado. Em paralelo, encontramos também Lenita Gentil e Alexandra, com carreiras que englobam também a música ligeira e as marchas populares, o teatro de revista, os musicais e a televisão. Três vozes que colhem uma grande popularidade durante este período e que, em 2000, se reúnem, juntamente com Alice Pires, no projecto musical “Entre Vozes”. Com elas, encontramos Augustus e José Carlos, mas também Paulo Matos e José Manuel Costa Reis, nomes que desenvolvem o seu trabalho num período em que a moda ainda não recebia do público e da critica o reconhecimento que anos mais tarde colhe e o fado vivia uma crise de identidade.

The proposals that the dress-makers Augustus and José Carlos made for Maria da Fé and Alexandra clearly show the language of the 1980’s and the style that characterised it. Augustus opened his first store while in Luanda in 1973. Two years later he moved to Portugal, set up his atelier in Lisbon and opened his first store in 1978, in the emblematic Imaviz Commercial Centre, at a time when Ana Salazar’s store Maçã was already a main reference for those who were paying

As propostas que os costureiros Augustus e José Carlos assinam para Maria da Fé e Alexandra mostram muito bem a linguagem dos 80 e o estilo que os caracteriza. Augustus abre a sua primeira loja, ainda 26


attention to the modern proposals coming out of London. Besides Maria da Fé, Augustus dressed Maluda, Simone de Oliveira and Amália. In turn, José Carlos started working in haut couture in 1978, when he presented his collection in the Ritz Hotel. Nine years later, he opened his first store in Lisbon. Both design lines of shoes, perfumes and accessories, proposing a very sui generis style, and who work regularly for television and radio. José Carlos is responsible for the image of Catarina Furtado and Herman José, while Augustus has the radio program Velhos nem os trapos with Margarida Mercês de Melo. In this exhibition, their proposals denote, more than an interpretation of Fado, but rather an understanding of the world of show business and of entertainment. Later on, in 1994, José Carlos would seek to embody Fado in his collection “Lisbon, Habits and Traditions”. Finding inspiration in the streets of Lisbon, José Carlos went for the yellow of the rows of houses, the gold of the woodcarvings in the churches and the bronze of statues and cast iron. Fado dressed in black and red, with shawls, fringes, printed guitars and lace. It was from this collection that the outfit came that Alexandra wore in 1994, in the RTP Song Festival, with applications in glass beads and trimming, symbolising the street lamps of Lisbon, and which is also included in this exhibition. Completing this section is the dress-maker Paulo Matos who began his career as a hairdresser in 1977 and who would work with José Carlos, and José Manuel Costa Reis, painter, costume designer and scenographer with an intense and vast career in the theatre, cinema, television and advertising.

em Luanda, em 1973. Dois anos depois, muda-se para Portugal, instala o seu atelier em Lisboa e abre a primeira loja, em 1978, no emblemático Centro Comercial Imaviz, numa altura em que a Loja Maçã de Ana Salazar é já uma referência incontornável para quem estava atento às propostas modernas trazidas de Londres. Para além de Maria da Fé, Augustus veste Maluda, Simone de Oliveira e Amália. Por seu lado, José Carlos, entra também na alta-costura em 1978, ao apresentar a sua colecção no Hotel Ritz. Nove anos mais tarde, abre a primeira loja em Lisboa. Ambos assinam linhas de sapatos, perfumes e acessórios, propondo um estilo muito próprio, e vão trabalhar regularmente na televisão e na rádio. José Carlos é responsável pela imagem de Catarina Furtado e Herman José, enquanto Augustus tem o programa de rádio Velhos nem os trapos com Margarida Mercês de Melo. Nesta exposição, as suas propostas denotam, mais do que uma leitura do fado, um entendimento do mundo do espectáculo e do entretenimento. Mais tarde, já em 1994, José Carlos procurará dar corpo ao fado na sua colecção “Lisboa, Hábitos e Tradições”. Encontrando inspiração nas ruas de Lisboa, José Carlos privilegiou o amarelo do casario, o dourado da talha das igrejas e o bronze das estátuas e ferros forjados. O fado vestia-se de preto e vermelho, com xailes, franjas, guitarras estampadas e galões. É desta colecção o coordenado que Alexandra usa, em 1994, no Festival RTP da canção, com aplicações em missangas e canutilhos, simbolizando os candeeiros de Lisboa, e que integra também esta exposição. Completam este núcleo, o costureiro Paulo Matos que iniciou a sua carreira como cabeleireiro, em 1977, e que colaborará com José Carlos, e José Manuel Costa Reis, pintor, figurinista e cenógrafo com uma intensa e vasta carreira no teatro, cinema, televisão e publicidade.

27


VI.

VI.

“É meu e vosso este Fado 
Destino que nos amarra”
 Mariza, Ó Gente da Minha Terra

“This Fado is mine and yours 
Destiny that binds us”
 Mariza, Ó Gente da Minha Terra

Volvidos à contemporaneidade, encontram-se representadas as mais reconhecidas fadistas e muitos dos designers de moda no activo, testemunhando o singular momento que estas duas expressões vivem na actualidade. Enfoque especial cabe a Mísia pelo seu papel para a renovação da atitude da mulher fadista, sobretudo durante os anos 90. As vestes que enverga são bem distintivas do modo como vive e interpreta o fado. A opção por Sybilla e por Ana Salazar demonstra essa originalidade e evidencia o estilo que singulariza estas duas designers de moda. Por um lado, a excelência do corte, a composição estruturada e geometricamente esculpida de Sybilla, criadora de origem espanhola que adquire um estrelato internacional durante esta década. Por outro lado, Ana Salazar com uma proposta muito representativa da sua filosofia, tanto nas cores, como nas sobreposições e desconstruções que apresenta. Ambas procuravam vestir uma mulher forte, independente e segura de si, imagem que Mísia vai encarnar no contexto do fado. A seu lado, encontramos Paulo Bragança, seu contemporâneo, com toda a sua rebeldia e ousadia, rompendo em todos os sentidos com a imagem do Fado no masculino.

Returning to contemporaneity, represented here are the best known Fado singers and many current fashion designers, bearing witness to the singular moment that these two expressions are experiencing today. A special focus is given to Mísia for her role in the renovation of the attitude of the woman in Fado, especially during the 1990’s. The clothes they wear are very distinctive of the way in which they experience and interpret Fado. The option for Sybilla and Ana Salazar demonstrates this originality and the style that sets these two fashion designers apart. On the one hand, the excellence of the cut, and the structured and geometrically sculptured composition of Sybilla, a designer of Spanish origin who rose to international stardom during this decade. On the other hand, Ana Salazar with a proposal that is very representative of her philosophy, both in terms of colours and in the overlays and deconstructions she presents. Both looked to dress strong, independent and self-confident women, an image that Mísia would embody in the context of Fado. At her side is Paulo Bragança, her contemporary, with all of his rebelliousness and daring, breaking in all senses with the image of the male in Fado.

Outro destaque é a longa e profícua colaboração entre Mariza e João Rolo, da qual resulta a imagem que internacionaliza a fadista e que sublinha o seu corpo, tornando-o ainda mais longilíneo e afirmativo nas suas performances em palco. Optando sobretudo pelo vestido negro, de materiais e cortes muito distintos, normalmente justo no corpo e amplo na saia, João Rolo enfatiza ainda mais a cor e corte de cabelo, marcas distintivas de Mariza. Outra parceria relevada nesta exposição é a existente entre Cristina Branco e Luís Buchinho, com a fadista a personificar um clássico renovado, muito feminino, confortável e urbano. Atitude diferente é a protagonizada por Ana Moura e Carminho. Ambas usam propostas de diferentes criadores. Enquanto as propostas desenhadas por José António Tenente, Bruno

Another highlight is the long and profitable collaboration between Mariza and João Rolo, from which came the image that internationalised the singer and which emphasises her body, making it even more slender and affirmative in her performances in stage. Opting mostly for the black dress, of very distinct materials and cuts, normally tight-fitting on the body and broad in the skirt, João Rolo emphasises the colour and cut of Mariza’s hair even more, these being her distinctive traits. Another partnership highlighted in this exhibition is that between Cristina Branco and Luís Buchinho, with the singer personifying a renewed, very feminine, comfortable and urban classic. We see a different attitude protagonised by Ana Moura and Carminho. Both wear proposals by different designers. While the 28


São Vicente e Fátima Lopes moldam-se às formas do corpo de Ana Moura, como uma segunda pele; em Carminho, reina a jovialidade, a alegria e o colorido, com propostas muito diferentes de Nuno Baltazar, Lídija Kolovrat ou Aleksandar Protic.

proposals designed by José António Tenente, Bruno São Vicente and Fátima Lopes mould to the forms of Ana Moura’s body like a second skin, with Carminho joviality, happiness and bright colours reign, with very different proposals by Nuno Baltazar, Lídija Kolovrat and Aleksandar Protic.

Manifestas são também as diferentes respostas que cada designer propõe para cada interprete, denotando um conhecimento do seu estilo e uma vontade de ir ao encontro da sonoridade e corporalidade de cada fadista. Recordemos que quase todos os coordenados desta exposição são desenhados para corpos concretos e, muitas vezes, para momentos marcantes da afirmação e consagração de cada interprete. A título de exemplo, as propostas de Nuno Baltazar para Mafalda Arnauth e Carminho ou os coordenados de Filipe Faísca para Aldina Duarte e Katia Guerreiro. Neste último caso, Faísca propõe para Aldina Duarte uma saia comprida e blusa em negro, de efeito plissado, enquanto que para Kátia Guerreiro usar no Olympia, propõe um modelo que o distingue, ou seja, corpete e saia. Apesar de não estar presente nesta exposição, cabe aqui uma menção a Miguel Vieira que, este ano apresentou a sua proposta para o Outono–Inverno 2013, propondo-se também a vestir o Fado e reinterpretando, numa linguagem mais contemporânea, algumas das suas peças icónicas, como os xailes de franjas, as capas negras e os brincos de filigrana.

The different responses that each designer proposes for each singer are also very clear, denoting knowledge of their style and a desire to reflect the sonority and corporality of each singer. We should recall that almost all of the outfits in this exhibition were designed for specific bodies and, very often, for significant moments in the affirmation and consecration of each artist. By way of example, the proposals of Nuno Baltazar for Mafalda Arnauth and Carminho or the outfits of Filipe Faísca for Aldina Duarte and Katia Guerreiro. In this latter case, for Aldina Duarte, Faísca proposes a long skirt and blouse in black, with a pleated effect, while for Kátia Guerreiro to wear in the Olympia, he proposes a model that makes her stand out, or rather, a bodice and skirt. While not present in this exhibition, we should give a mention to Miguel Vieira who this year presented his proposal for Autumn-Winter 2013, also proposing to dress Fado and reinterpreting, in a more contemporary language, some of its iconic items, such as the fringed shawls, the black capes and the filigree earrings.

Como nota dominante, reconhecemos uma pluralidade de linguagens e estilos, condizentes com outros tantos repertórios e sensibilidades. Num mesmo espaço, convivem propostas que procuram renovar a tradição, mantendo-se fiel à iconografia do fado, lado a lado com trabalhos que buscam recriar a própria imagem e a matéria desta canção nacional, com notas de irreverência e ousadia. Em comum, ainda e sempre, o primado do negro, associado à elegância, sobriedade e sofisticação. É também bem evidente uma particular atenção em desenvolver uma linguagem mais contemporânea e internacional (mesmo que parta da apropriação e reinterpretação da cultura e dos modelos populares), respondendo a uma sociedade globalizada, onde a linguagem visual possui um lugar determinante e, ao mesmo tempo relacionando-se com a inserção do fado na cultura pop. Por outro lado, importa ainda sublinhar que esta reinterpretação ou recriação do fado não deixa contudo, de permitir reconhecer, em cada proposta,

As a dominant theme, we recognise the plurality of languages and styles, matching so many different repertoires and sensitivities. Side by side in the same space are proposals that seek to renew tradition, remaining faithful to the iconography of Fado, alongside works that seek to recreate the very image and material of this national song, with notes of irreverence and daring. In common, now and always, the primacy of the colour black, associated to elegance, sobriety and sophistication. The particular attention paid to developing a more contemporary and international language is also quite evident (even if it departs from the appropriation and reinterpretation of popular culture and models), catering to a globalised society, where visual language has a decisive role and, at the same time related with the inclusion of Fado in pop culture. On the other hand, we should also emphasise that this reinterpretation or recreation of Fado does not, however, prevent us from recognising, in each proposal, the very style 29


Cristina Branco Fotografia | Photography - Augusto Brรกzio

30


o próprio estilo que distingue cada designer. Deste modo, uma visita a esta exposição permite sempre duas leituras em paralelo: um olhar sobre a imagem de cada fadista e um reconhecimento da linguagem de cada designer de moda. Uma viagem entre a modernidade e a tradição que o Fado e a Moda encerram.

that distinguishes each designer. In this way, a visit to this exhibition will always allow two parallel interpretations: an insight to the image of each Fado singer and the acknowledgement of each fashion designer’s language. A journey between modernity and tradition that Fado and Fashion travel together.

VII.

VII.

Uma última palavra para os devidos agradecimentos. Em primeiro lugar, agradeço ao Museu do Fado ter aceite o nosso repto para connosco organizar esta exposição que tem como palco principal o MUDE, mas que se estende naturalmente ao Museu do Fado. Agradeço igualmente a todos os que tornaram possível esta exposição, e respectivo catálogo, em especial às fadistas e designers de moda pela cedência dos seus coordenados e informação complementar. Especial menção cabe à Fundação Amália Rodrigues e ao Museu Nacional do Teatro, nossos parceiros nesta iniciativa. Sem a sua disponibilidade e participação, não teria sido realizável o núcleo consagrado a Amália. O meu obrigada a todas as equipas que participaram na realização de mais esta exposição no MUDE que, estou certa, marcará este ano de 2012.

A final word goes by way of gratitude. Firstly, I would like to thank the Fado Museum for having accepted our challenge to organise this exhibition with us, the main stage of which is the MUDE, but which naturally extends to the Fado Museum. I would also like to thank everyone who made this exhibition and the respective catalogue possible, especially the singers and fashion designers for ceding their outfits and complementary information. A special mention goes to the Amália Rodrigues Foundation and the National Theatre Museum, our partners in this initiative. Without their readiness and participation the section dedicated to Amália would not have been viable. My thanks go to all the teams that participated in the realization of this exhibition in the MUDE which, I am certain, will make 2012 an outstanding year. Bárbara Coutinho Director of the MUDE – Design and Fashion Museum, Francisco Capelo Collection

Bárbara Coutinho Directora do MUDE – Museu do Design e da Moda, Colecção Francisco Capelo

31





ESTA MODA DO FADO

THIS FADO FASHION

“A vista chega antes das palavras.” John Berger

“Seeing comes before words.” John Berger

O Fado está na moda. Corridos quase dois séculos sobre a sua génese, na cidade de Lisboa, o Fado foi capaz de inscrever, na narrativa maior da nossa História, um percurso de sucesso e consagração construído em permanente diálogo com outras artes. No Teatro marcou presença desde 1870, encantando sucessivas gerações de actores, encenadores e produtores teatrais, que cedo contribuíram para a sua disseminação junto de públicos cada vez mais alargados. Com o Cinema manteve um diálogo antigo e cúmplice, desde a época matricial do cinema mudo das primeiras décadas do século XX até à produção contemporânea. Sucessivamente convocado por cineastas portugueses e estrangeiros, o Fado foi tema preponderante na cinematografia, presença documentada em mais de uma centena de filmes ao longo das diferentes narrativas da ficção, da comédia musical ou do documentário, sem excluir o cinema de animação.

Fado is in fashion. After almost two centuries after its birth in the city of Lisbon, Fado has, in the greater narrative of our History, managed to carve out a course of success and consecration through permanent dialogue with other arts. It has made its mark in the Theatre since 1870, enchanting successive generations of actors, stage managers and theatre producers, who soon helped to disseminate it to increasingly wider audiences. It has had a long and intimate dialogue with the Cinema, since the early days of silent films in the first decades of the 20th century right up to contemporary production. Successively summoned by Portuguese and foreign movie directors, Fado was a dominant theme in cinematography, being documented in over one hundred films throughout the different narratives of fiction, musical comedy or documentaries, without forgetting cartoons. Since the mid 20th century it definitively conquered the terrain of erudite poetry, from the heritage of the troubadour and Renaissance to contemporary literature1.

Desde meados do século XX conquistou definitivamente o terreno da poesia erudita, desde o património trovadoresco e renascentista à criação literária contemporânea1.

In the plastic arts, Fado is an object of fascination and endless citation by successive generations of artists, within a context of different aesthetic, ideological or symbolic disciplines, motivations and constraints.2

Nas artes plásticas, o Fado constituiu objecto de fascínio e inesgotável citação por sucessivas gerações de artistas, no quadro de distintas disciplinas, motivações e constrangimentos estéticos, ideológicos ou simbólicos.2

Fado’s recent recognition by UNESCO has made it definitively fashionable. Its most emblematic singers and musicians have become genuine icons of the Portuguese performing arts, symbols of its respective aesthetic modernity.

A recente consagração junto da UNESCO colocou-o definitivamente na moda. Os seus intérpretes mais emblemáticos converteram-se em verdadeiros ícones das artes do espectáculo portuguesas, símbolos da respectiva modernidade estética. A história do Fado é, neste sentido, também a história de todos aqueles que o recriaram e celebraram noutras esferas da criação artística. E, no processo de construção da imagem do artista ao longo dos séculos XX e XXI, a indústria da Moda e os seus criadores assumiram um

The history of Fado is, in this regard, also the history of everyone who recreated and celebrated it in other spheres of artistic creation. And, in the process of constructing the image of the artist throughout the 20th and 21st centuries, the Fashion industry and its creators made a decisive contribution in the reconfiguration of the traditional image

1 - Sobre a história do género veja-se a fundamental obra de NERY, Rui Vieira, Para Uma História do Fado, INCM-EGEAC/Museu do Fado, Lisboa, 2012.

1- On the history of the genre see the fundamental work by NERY, Rui Vieira, Para Uma História do Fado, INCM-EGEAC / Fado Museum, Lisbon, 2012.

2 - PEREIRA, Sara, Ecos do Fado na Arte Portuguesa, Séculos XIX-XXI, Lisboa, EGEACMuseu do Fado, 2011

2 - PEREIRA, Sara, Ecos do Fado na Arte Portuguesa, Séculos XIX-XXI, Lisbon, EGEACFado Museum, 2011

35


determinante contributo na reconfiguração da imagem tradicional do género, fundamental à sua projecção mediática internacional.

of the genre, fundamental to its international projection through the media.

A exposição Com Esta Voz me Visto – O Fado e a Moda propõe justamente uma viagem em torno das imagens que vestiram o fado e que ao longo dos séculos XX e XXI construíram e recriaram a sua identidade. Aqui, cada traje de cena remete para um tempo e um contexto singulares. Evoca inevitavelmente uma voz ausente. Convoca-nos para uma dimensão imaterial, intangível, incorpórea, para um património necessariamente fugaz, irrepetível, que dificilmente se materializa noutro testemunho que não o da memória individual. E simultaneamente, desvenda fragmentos de um outro diálogo, sempre renovado e redescoberto, entre o Fado e a Moda - a Voz e a sua Imagem - através do qual podemos, também, redescobrir muito do nosso olhar sobre nós próprios.

The exhibition I Wear My Voice on My Sleeve – Fado and Fashion proposes precisely a journey among the images that Fado has presented and which throughout the 20th and 21st centuries have shaped and recreated its identity. Here, each costume recalls a unique time and context. Each inevitably evokes an absent voice. Each one summons us into an immaterial, intangible, incorporeal dimension, into a necessarily fleeting, unrepeatable domain, which is hard to imagine being conveyed except through individual memory. And at the same time, each reveals fragments of another dialogue, always renewed and rediscovered, between Fado and Fashion - a Voice and its Image – through which we can also rediscover much about the way we see ourselves.

Vários factores contribuíram para a reconfiguração dos contextos performativos do Fado, ao longo do século XX, transmutando definitivamente a imagem do género. Desde logo, a instauração da Ditadura Militar em 28 de Maio de 1926, seguida da imposição da censura prévia, que reconfigurou toda a rede de recintos e, necessariamente, o contexto performativo do fado, em particular. Pela mesma época, começava a construir-se uma gramática plástica legitimadora do fado, reabilitando a figura tradicional da fadista que se procurava dissociar da marginalidade associada aos contextos de origem. Tendo por suporte o universo editorial emergente desde a década de 1910, este novo programa estético do Fado em consonância com os postulados de António Ferro para a Lisboa reinventada - alimentou a indústria discográfica, a imprensa escrita, o teatro e o cinema, através da energia criativa de artistas como Stuart Carvalhais, Almada Negreiros, Carlos Botelho, Jorge Barradas, Pinto de Campos, entre outros. Finalmente e a partir da década de 1940, a emergência internacional de Amália Rodrigues, a artista que viria a personificar a Voz mais universal da nossa identidade.

Various factors have helped to reconfigure the performative contexts of Fado, throughout the 20th century, definitively transforming the image of the genre. The instauration of the Military Dictatorship on the 28th of May, 1926, followed by the imposition of prior censorship, which reconfigured the whole network of venues and, necessarily, the performative context of Fado, in particular. About the same time, a plastic grammar that legitimised Fado started to be formed, regenerating the traditional figure of the Fado singer who was seeking to distance him or herself from the marginality associated to its original contexts. With the editorial universe emerging since the decade of 1910 as a support, this new aesthetic program of Fado - in line with António Ferro’s assumptions for a reinvented Lisbon – fed the record industry, the written press, the theatre and the cinema, through the creative energy of artists like Stuart Carvalhais, Almada Negreiros, Carlos Botelho, Jorge Barradas, Pinto de Campos, among others. Finally, and from the 1940’s on, came the international emergence of Amália Rodrigues, the artist who would personify the most universal Voice of our identity.

Regulamentando globalmente as actividades de espectáculo através de um extenso clausulado, a legislação de 1927 preconizava uma “Fiscalização superior de todas as casas e recintos de espectáculos

Globally regulating performative activities with extensive clauses, the legislation of 1927 proclaimed a “Higher supervision of all houses and venues for shows or public entertainment (…) exercised by the 36


ou divertimentos públicos (…) exercida pelo Ministério da Instrução Pública, por intermédio da Inspecção Geral dos Teatros e seus delegados”.

Ministry of Public Instruction, through the Inspectorate-General of Theatres and its delegates”. This new legal framework would have a marked effect on Fado, which would inevitably undergo profound transformations, with the regulation of the concession of licences to the promoters of shows, a new framework for copyright law, the mandatory prior viewing of all sung repertoires, the requirement for people to carry a Professional ID Card issued by the Inspectorate-General of Theatres as a condition for remunerated public presentation, among other aspects. So, significant changes were imposed with regard to performance venues, which also extended to the form of presentation of the artists, who came to adopt ceremonial attire, acting in diverse locations for an increasingly wider public. Gradually, listening to Fado became ritualised in Fado houses, places that were mostly concentrated in the historic neighbourhoods of the city, predominantly in the Bairro Alto, especially as from the 1930’s.3 These transformations in the production of Fado distanced it, necessarily, from the field of improvisation, thereby losing some of the diversity of its original performative contexts and requiring singers, song-writers and musicians to specialise.4 In parallel with this, discographic and radiophonic recordings proposed a pre-selection of voices and interpretative practices which were imposed as models to be followed, limiting the area of improvisation.

Este novo quadro jurídico teria efeitos marcantes sobre a prática do Fado, que sofreria, inevitavelmente, profundas transformações, com a regulação da concessão de licenças aos promotores de espectáculos, um novo enquadramento para direitos de autor, a obrigatoriedade de visionamento prévio dos repertórios cantados, a exigência do porte de uma Carteira Profissional emitida pela Inspecção Geral dos Teatros como condição de apresentação pública remunerada, entre outros aspectos. Impunham-se, assim, significativas mutações no âmbito dos espaços performativos, extensíveis também ao modo de apresentação dos intérpretes, que passavam a adoptar um traje de cerimónia, actuando em recintos diversificados para um público cada vez mais alargado. Gradualmente, tenderia a ritualizar -se a audição de fados nas casas de fados, locais que iriam sobretudo concentrar-se nos bairros históricos da cidade, com maior incidência no Bairro Alto, sobretudo a partir dos anos 30.3 Estas transformações na produção do Fado afastavam-no, necessariamente, do campo do improviso, perdendo-se alguma da diversidade dos seus contextos performativos de origem e obrigando a uma especialização de intérpretes, autores e músicos.4 Paralelamente, as gravações discográficas e radiofónicas propunham uma triagem de vozes e práticas interpretativas que se impunham como modelos a seguir, limitando o domínio do improviso. Depois de criado o Secretariado Nacional de Propaganda e, já no final da década de 30, ultrapassada a questão da depuração do Fado - que o dissociava, definitivamente, de uma marginalidade incómoda vingariam as tendências revivalistas dos aspectos ditos típicos, que apontavam para um reencontro da tradição popular, reinventando-

After the National Secretariat of Propaganda was created and, at the end of the 1930’s, after Fado’s refinement had been achieved – it definitively become dissociated from its uncomfortable marginality the revivalist trends of so-called typical aspects won through, heralding the return of popular tradition, reinventing the iconographic elements that bore witness to the genuine and picturesque aspect of the universe of Fado.

3 - Cfr. NERY, Rui Vieira, Para Uma História do Fado, INCM-EGEAC/Museu do Fado, Lisboa, 2012, pp.228-246.

3 - Viz. NERY, Rui Vieira, Para Uma História do Fado, INCM-EGEAC/ Fado Museum, Lisboa, 2012, pp.228-246.

4 - Sobre a construção da carreira do artista de fado ao longo do século XX veja-se BICHO, Sofia, Sou do Fado: Percursos de Carreira dos Fadistas, Dissertação de Mestrado em Antropologia Urbana, Lisboa, Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa, 2007, no prelo.

4 - On the construction of the career of the Fado artist throughout the 20th Century see BICHO, Sofia, Sou do Fado: Percursos de Carreira dos Fadistas, Masters Dissertation in Urban Anthropology, Lisbon, Higher Institute of Labour Sciences and Business, 2007, in the press.

37


Amália Rodrigues, Domingos Camarinha, Santos Moreira México, 1956 Colecção | Collection Museu do Fado

-se os elementos iconográficos que atestassem a vertente genuína e pitoresca do universo do Fado.

This context of the crystallization of the performative environments of the genre was naturally accompanied by the emerging discographic industry, by the Theatre or Cinema – which dedicated the first film with sound to the mythical figure of the founding of Fado with A Severa, by Leitão de Barros, in 1931 – which gradually moved to stabilise a new aesthetic program for Fado. Newspapers, magazines, posters, books and music scores offered new opportunities for work for a series of plastic artists and illustrators, from a wide variety of tendencies, in the absence of more solid professional opportunities.

Este contexto de cristalização dos ambientes performativos do género foi, naturalmente acompanhado pela indústria emergente da discografia, do Teatro ou do Cinema - que consagrava o primeiro filme sonoro à figura mítica da fundação do fado com A Severa, de Leitão de Barros, em 1931 – que gradualmente promoviam a estabilização de um novo programa estético para o Fado. Jornais, revistas, magazines, cartazes, livros e partituras musicais ofereciam renovadas oportunidades de trabalho a um conjunto de artistas plásticos e ilustradores, das mais variadas tendências, na ausência de contrapartidas profissionais mais sólidas.

The main stage for this new aesthetic language was the front cover of magazines, ranging from ABC (1920-1932), to Ilustração Portuguesa (1912-1922), Contemporânea (1922-1926), Magazine Bertrand (1927-1933) and Civilização (1928-1936). This intense 38


Palcos privilegiados desta nova linguagem estética foram as capas de revistas, desde a ABC (1920-1932), a Ilustração Portuguesa (1912-1922), a Contemporânea (1922-1926) o Magazine Bertrand (1927-1933) e a Civilização (1928-1936). Este intenso movimento editorial correspondia ainda aos anseios de uma burguesia urbana, ávida de imagens representativas de novos padrões de comportamento construídos à escala das grandes cidades europeias. Nas capas dos magazines tinha lugar um diálogo entre artista e público, criador e consumidor, no quadro de uma auscultação dos gostos, fundamental à sobrevivência financeira destes periódicos. Sob a direcção de António Ferro, a Ilustração Portuguesa seria paradigmática desta tentativa de construção da realidade, que agora se vestia qual manequim e se induzia à modernidade. O próprio António Ferro em entrevista a Reinaldo Ferreira em 1921, dava nota do grande desígnio: “Se for preciso a Ilustração Portuguesa inventará Lisboa … Conseguida essa obra ela não pedirá direitos de autor”. 5

editorial movement also corresponded to the concerns of an urban bourgeoisie, greedy for images representing the new standards of behaviour modelled after that of the major European cities. A dialogue took place on the covers of the magazines between the artist and the public, creator and consumer, within the framework of a sounding out of tastes, which was fundamental to the financial survival of these publications. Under the direction of António Ferro, Ilustração Portuguesa would be paradigmatic of this attempt to construct reality, which now dressed all models and inferred modernity. In an interview with Reinaldo Ferreira in 1921, António Ferro himself outlined the grand design: “If necessary, Ilustração Portuguesa will invent Lisbon … And if it manages this it will not ask for copyright”. 5 In the following year, Ferro described the aesthetic program intended for Lisbon in detail: “In the Jazz-Band, as on the screen, all the images of modern life are there (…) streets filled with buses and cars, roads where attractive cinemas and posters have the feline attitudes of prostitutes, inviting you to step in, fierce streets, panther-like streets, roads bedecked with sign-boards, dresses and shouting (….) there are women, women improvised by the Jazz-Band itself, women where the head, body and arms and legs make three bodies… There are the men who follow wherever the women go (…) and there is life itself, the industrial life that is a Jazz-Band on pulleys, winches and engines, commercial life which is a sud-express train, intellectual life where words think for themselves… All of life, all of Art, the whole Universe is in the Jazz-Band.”6

No ano seguinte, Ferro descrevia minuciosamente o programa estético pretendido para Lisboa: “No Jazz-Band como num écran cabem todas as imagens da vida moderna (…) ruas possessas de automóveis e de carros, ruas onde os cinemas maquilhados e cartazes têm atitudes felinas de mundanas, convidando-as a entrar, ruas ferozes, ruas panteras, ruas listradas nas tabuletas, nos vestidos e nos gritos (….) cabem as mulheres, as mulheres improvisadas pelo próprio Jazz-band, mulheres onde a cabeça, o tronco e os membros, somam três corpos… Cabem os homens que cabem sempre onde cabem as mulheres (…) E cabe a própria vida, a vida industrial que é um JazzBand de roldanas, de guindastes e motores, a vida comercial que é um sud-express, a vida intelectual onde as palavras pensam por si… Toda a vida, toda a Arte, todo o Universo, cabem no Jazz-Band.”6 No plano desta urbanidade que se procurava reinventar, a figura feminina assumia lugar de absoluta centralidade, desfilando num

With regard to this urbanity that was to be reinvented, the feminine figure took on an absolutely central role, parading in an exhaustive inventory of poses taken out of a daily life that was now redimensioned to configure the profile of the Lisboan. In fact, these figures of an idealised countenance, with a narrow, elongated shape, presented a new idea of sensuality, insinuating that they were a support for

5 - Veja-se o ensaio de António Rodrigues, “António Ferro na Idade do Jazz-Band”, Lisboa, Livros Horizonte, 1995.

5 - See the essay by António Rodrigues, “António Ferro na Idade do Jazz-Band”, Lisbon, Livros Horizonte, 1995.

6 - Idem, Ibidem.

6 - Idem, Ibidem.

39


inventário exaustivo de poses extraídas a um quotidiano que agora se redimensionava, para construir o perfil da lisboeta. Com efeito, estas figuras de semblante idealizado, em recorte de corpo estreito e alongado, apresentavam uma nova proposta de sensualidade, insinuando-se como suporte da moda e, induzindo, necessariamente, a uma reflexão criativa na esfera da própria representação e identidade da lisboeta. Pela via de um evidente mimetismo, as capas destes magazines – muitas vezes em registo de total descontinuidade face ao seu interior – induziam ao fascínio dos objectos que, representados plasticamente, iam cumprindo o despertar de novos hábitos de consumo.

fashion and, necessarily, inducing a creative reflection on the sphere of the very representation and identity of the Lisboan. By means of evident mimicry, the covers of these magazines – very often totally disconnected from their content – would instigate fascination for the objects which, represented plastically, would encourage new consumer habits. On the covers, the city constituted the insistently reinvented scenario, in a plastic discourse born from humour – in which Rafael Bordalo Pinheiro had already introduced Os Fadistas, in 1872 – and which was now governed by an economy of lines and full freedom of colour. It would therefore be in these places of intensely coloured forms, that a new aesthetic language would take shape, resorting to the stylization of features to summarise the plastic discourse. In parallel with this, the articulation between photography and design was definitively sealed, a technical device that also helps to increase the complicity between objects and consumers, the real city and the imagined city.

Nas capas, a cidade constituía o cenário insistentemente reinventado, num discurso plástico herdeiro do humorismo – no qual Rafael Bordalo Pinheiro introduzira já Os Fadistas, em 1872 – e que agora se pautava por uma economia de linhas e ampla liberdade da cor. Seria então nestes lugares de figuração intensamente colorida, que ganharia corpo uma nova linguagem estética, recorrendo à estilização do traço para sintetizar o discurso plástico. Paralelamente, consagrava-se, em definitivo, a articulação entre fotografia e desenho, artifício técnico também propício ao estreitamento da cumplicidade entre objectos e consumidores, cidade real e cidade sonhada.

The main platforms of the dialogue between creators and public, newspapers, printed musical scores and programs acted necessarily at the level of the critical reception of the works published and the work of Stuart, Barradas, and Botelho allusive to the universe of Fado was, in this perspective, projected onto the very public that represented and consumed it, in an interplay of the conversion of information, playing the dual role of its mirror and its conscience.7 As from 1912 the first Fashion magazines also appeared: Modas e Bordados, A Revista Feminina, O Jornal da Mulher, A Mulher, A Rainha da Moda, A Vida Elegante and the magazine Eva, in 1925. With greater or lesser longevity, they all talked about a new standard of living which strove for the progress and modernization of Portuguese women.

Palcos privilegiados do diálogo entre criadores e público, jornais, partituras impressas e programas actuavam necessariamente ao nível da recepção crítica dos trabalhos publicados e a obra de Stuart, Barradas, ou Botelho alusiva ao universo fadista foi, nessa perspectiva, projectada no próprio público que representou e que a consumiu, num jogo de reconversão de dados, assumindo-se na dupla condição do seu espelho e da sua consciência.7 A partir de 1912 surgiam também as primeiras revistas de Moda: Modas e Bordados, A Revista Feminina, O Jornal da Mulher, A Mulher, A Rainha da Moda, A Vida Elegante e a revista Eva, em 1925. Com maior ou menor longevidade, todas divulgavam um novo padrão de vida que pugnava pelo progresso e modernização da mulher portuguesa.

As from the early 1920’s Sassetti Editora and Valentim de Carvalho also started to hire artists to illustrate the covers of musical scores and records, formulating a new aesthetic program and contributing towards the emergence of a plastic grammar that legitimated Fado, which would gradually distance itself from the environment of the

7 - PEREIRA, Sara, O Fado por Stuart Carvalhais, Lisboa, EGEAC/Museu do Fado, 2005.

7 - PEREIRA, Sara, O Fado por Stuart Carvalhais, Lisbon, EGEAC/ Fado Museum, 2005.

40


A partir dos alvores da década de 1920 também a Sassetti Editora e a Valentim de Carvalho passam a contratar aos artistas a ilustração das capas de partituras e discos, formulando um novo programa estético e contribuindo para a emergência de uma gramática plástica legitimadora do Fado, que se distanciará gradualmente do ambiente do bas-fond lisboeta. Paralelamente, desde 1910, proliferavam as publicações periódicas consagradas ao Fado atestando a ampla consagração popular do género. Num esforço de legitimação da canção urbana, estes periódicos procurariam desvinculá-la do contexto de marginalidade que caracterizou as suas origens oitocentistas, postulando um receituário de execução do fado, extensível ao ambiente performativo e aos códigos de apresentação dos artistas. Neste contexto, A Canção do Sul, em 1938, aconselhava sobre a decoração das casas de Fado, definindo um receituário, que tenderia, efectivamente, a tipificar-se: “Os ornatos devem ser todos de origem popular e lisboeta e, quando não, de carácter marítimo (...) de carácter camponês como as ornamentações bairristas dos festejos de Santo António. Os vasos de cravos e manjericos e tudo quanto possa significar culto pelas flores ou evocar janelas e varandas onde a mulher de Lisboa espera o português marinheiro em hora de saudade – são autênticos símbolos fadistas. Oxalá os artistas decoradores, que neste momento trabalham na remodelação de alguns salões de Fado, se integrem neste preceito essencial de fadismo”.

back streets of Lisbon. In parallel with this, since 1910, periodical publications dedicated to Fado proliferated bearing witness to the broad popular acceptance of the genre. In an effort to legitimate the urban singing style, these journals attempted to break the ties with the context of marginality that characterised its 19th Century origins, postulating a prescription for performing Fado, which could be extended to the performative environment and the artists’ codes of presentation. In this context, A Canção do Sul, in 1938, gave advice on how to decorate Fado houses, defining a model that would effectively tend to become typified: “All decoration should be of popular origin and from Lisbon and, when this is not the case, it should be maritime in character (...) or of a rustic character like the local-style ornamentations of the Santo António festivities. Vases of carnations and basil and everything that shows a love of flowers or that evokes windows and verandas where the women of Lisbon wait longingly for their Portuguese sailor – are all authentic symbols of Fado. God willing, decorators, who are right now working on the remodelling of a number of Fado venues, will adopt this essential precept of everything that is Fado”. It was precisely in this context of establishing and standardising the environments where Fado was performed, putting the shows on at a defined time and singing previously vetted repertoires, that ceremonial attire was implemented for the whole range of professional artists, within a highly codified stage production language.

Foi precisamente neste contexto de fixação e homogeneização dos ambientes performativos do Fado, decorrendo a audição em horário definido e cantando-se repertórios previamente visionados, que se implementou o vestuário de cerimónia para toda esta plêiade de profissionais, dentro de uma linguagem de encenação altamente codificada.

The shawl, an emblematic item of stage attire, an almost mythical prop for the identity of the Fado singer, would become indissociable from the execution of Fado or even from its iconographic representation, in a transversal process for all artistic manifestations. In Portugal, the 19th Century introduced the novelty of the three-pointed shawl, which gradually came to stand out among a panoply of cloaks, mantles, kerchiefs and wraps. Initially adorning the “Sunday best”, made with noble fabrics and decorated with fine embroidery, the shawl would be progressively adopted by the more popular sectors of society, who came to wear it, on certain occasions and according to one’s means, instead of the brightly coloured cloth over the chest in serge or taffeta, with fringes. From the end of the 1920’s the advance of woollen

O xaile, peça emblemática do traje de cena, adereço quase mítico da identidade da intérprete de Fado, tornar-se-ia indissociável da execução do fado ou mesmo da sua representação iconográfica, num processo transversal a todas as manifestações artísticas. Em Portugal, o século XIX introduzira a novidade do xaile de três pontas, que gradualmente se destacava de entre uma panóplia de capotes, mantos, lenços e mantilhas. Inicialmente adornando o traje domingueiro ou 41


de passeio, feito com tecidos nobres e decorado com finos bordados, o xaile seria progressivamente adoptado pelas camadas mais populares, que o passavam a utilizar, em certas ocasiões e consoante as posses, em substituição do lenço de peito colorido em sarja ou tafetá, com cadilhos. Para esta apropriação em muito terá contribuído o avanço dos componentes de lã da indústria têxtil nacional, a partir do final da década de 20, que afastaria gradualmente o xaile de uma frivolidade sumptuosa, vincando-lhe uma feição de maior recato e austeridade, equilibradamente económica. À medida que se aproximava desta condição popular, a sua coloração tenderia a uma monocromia de matizes escurecidas, mais convenientes à utilização quotidiana, no trabalho fabril ou na venda ambulante. Retrato de um universo feminino popular, o xaile confortava nas madrugadas mais frias, aquecia o quotidiano invernoso do trabalho, carregava-se de negro para ir ao cais, salpicava-se de cor em dias de festa. Peça do vestuário corrente nos bairros históricos de Lisboa, o xaile evocava a vivência dos rituais quotidianos que giram em torno de um imaginário povoado por temas como o mar, o rio, os mercados, as festas e o Fado, sublinhado a integração da mulher na identidade própria da comunidade local.

components from the national textile industry contributed greatly towards this appropriation, which would gradually upgrade the shawl from a sumptuous frivolity, granting it an air of greater modesty and austerity, and more affordable. As it approached this more popular condition, its colour would tend towards dark monochrome, more convenient for everyday use, in factory work or for street sales. Portrait of a popular feminine universe, the shawl was comforting in the cold early morning, warming the wintery drudge of one’s work, worn black to go to the pier, but dotted with colour on festive days. As a common item of clothing in the historic neighbourhoods of Lisbon, the shawl evoked the daily rituals that revolved around an imagination populated by themes such as the sea, rivers, markets, festive occasions and Fado, emphasising the inclusion of women in the very identity of the local community. Appropriated by the universe of Fado singers when performing, the shawl – in merino, silk, velvet or lace – thus came to be part of a form of codified and progressively stabilised presentation, transforming into an emblematic item of the iconography of Fado. Benefitting from the declarations of the specialist Fado press which systematically promoted it, the shawl gradually replaced the manton, as from the mid 1930’s.

Apropriado pelo universo de intérpretes de Fado em situação de espectáculo, o xaile – em merino, seda, veludo ou renda – passava assim a integrar um modo de apresentação codificado e progressivamente estabilizado, transformando-se numa peça emblemática da iconografia fadista. Beneficiando das declarações da imprensa fadista especializada que sistematicamente o promoveu, o xaile substituiu-se gradualmente ao manton, a partir de meados da década de 30.

Elaborately made in silk crepe, Manila shawls or mantons, usually trimmed by long fringes and embroidered with floral and vegetal motifs, became extremely popular on the Iberian Peninsula as from the 19th century. In Spain, evening wear was adorned by the manton from the start of the century, and was quickly appropriated in Portugal by Fado singers, who used it when they performed. As from the 1930’s the Fado press set off a heated debate around the use of this imported prop when singing the national anthem. In this context, A Canção do Sul published in 1935: “we watched a session of Fado in the Pátio da Saudade in old Lisbon. Why is it that our singers come on stage to sing dressed in a Spanish-style fringed shawl or in a manton from Manila instead of the classic Portuguese shawl?” In 1937 the newspaper Guitarra de Portugal also re-ignited the controversy, continually defending the use of the shawl when performing, in small news items dedicated to the dress and presentation of the singers, on the theme:

De confecção elaborada, em crepe de seda, os mantons de Manilla, usualmente recortados por longas franjas e bordados com motivos florais e vegetalistas, conheceram grande adesão na Península Ibérica a partir do século XIX. Em Espanha, o traje de noite era adornado pelo manton desde o início do século, tendo sido rapidamente apropriado em Portugal, pelas intérpretes de fado, que o exibiam em situações de espectáculo. A partir dos anos 30 a imprensa de fado desencadeava a polémica em torno da utilização deste adereço importado no momento da interpretação da canção nacional. Neste contexto, A Canção do Sul publicava em 1935: “assistimos a uma 42


sessão de fado no Pátio da Saudade da velha Lisboa. Porque é que as nossas cantadeiras se apresentam no estrado com xaile de franjas à espanhola, ou manton de Manilla em lugar do clássico xaile português?” Em 1937 também o jornal Guitarra de Portugal reacende a polémica, defendendo continuadamente, a utilização do xaile no momento de actuação, em pequenas notícias consagradas ao modo de apresentação das cantadeiras, sob o mote: “Fora os Mantons!”. Em Outubro desse mesmo ano o mesmo jornal evocava os nomes de Maria Emília Ferreira, Berta Cardoso e Ercília Costa como exemplos a seguir na utilização do portuguesíssimo xaile.

“Down with Mantons!”. In October of this same year the same paper evoked the names of Maria Emília Ferreira, Berta Cardoso and Ercília Costa as examples to follow in the use of the definitively Portuguese shawl. After the introduction of the preference for the totally black costume, with Amália Rodrigues, the shawl, in its relationship with all of the scenic components that came to characterise the environments of Fado productions – the use of candles, props evocative of the past that is sung about, the enveloping penumbra – became even more important in a scenario dominated by shadows, thus causing, while someone was singing, greater intensity and sense of drama. The very bodily expression of a certain Fado pose – mostly involving the hands and face – began, at the same time to become standardised, accentuating, in the penumbra, the dramatic intensity of the song.

A partir da introdução do gosto pelo figurino integralmente negro, com Amália Rodrigues, o xaile, na sua relação com todos os componentes cénicos que passam a caracterizar os ambientes de produção do Fado – o recurso às velas, os adereços evocativos do passado que é cantado, o envolvimento em penumbra – assume importância acrescida num cenário pautado por sombras imprimindo, ao momento do canto, uma maior intensidade e dramatismo. Também a expressão corporal própria de uma certa pose fadista – para a qual concorrem as mãos e o rosto – começava, na mesma época a estabilizar-se acentuando, na penumbra, a intensidade dramática do canto.

This homogenization of Fado venues as from the 1930’s led to the fixture of some iconographic elements. In this regard, the dark atmosphere in places where Fado was performed seems to have taken place in the first decades of the 20th century. In fact, while the images of the 19th century showed the guitar players at the doors of taverns in Alfama or on a sunny Sunday afternoon, from the 1930’s darker environments would become common. In the imagery of Fado, always associated to the oral tradition, it was Alfredo Marceneiro who introduced the light of a candle when singing Fado, instead of acetylene lamps.8

Esta homogeneização dos locais do Fado a partir da década de 30, promoveria a fixação de alguns elementos iconográficos. Neste âmbito, a ambiência de escuridão no espaço performativo do Fado parece ter lugar nas primeiras décadas do século XX. De facto, enquanto as imagens do século XIX mostravam os tocadores de guitarra às portas das locandas de Alfama ou em pleno sol de Domingo, a partir da década de 1930, vulgarizar-se-iam os ambientes de penumbra. No imaginário fadista, desde sempre associado à tradição oral, coube a Alfredo Marceneiro a introdução da luz da vela para a interpretação do fado, em substituição da iluminação a acetileno.8 A partir de 1940, um factor primordial de reconfiguração da imagem do Fado decorreria da emergência de Amália Rodrigues, com toda a energia criativa e renovadora que aportou ao género, através de uma

From 1940 on, a primordial factor in the reconfiguration of the image of Fado arose from the emergence of Amália Rodrigues, with all of the creative and reinvigorating energy she brought to the genre, through a careful selection of poetic and musical repertoires, or even from the transmutation and absolute rehabilitation of the traditional image of the Fado singer. In an interview with Vítor Pavão dos Santos, Amália recalled the traditional rules for the presentation of singers when she started: “At venues, instead of wearing the black shawl, Fado singers who were better known sang with a manton with roses as it was finer.

8 - DUARTE, Vítor, Recordar Alfredo Marceneiro, Sistema J, Venda Nova, 1995, p. 29.

8 - DUARTE, Vítor, Recordar Alfredo Marceneiro, Sistema J, Venda Nova, 1995, p. 29.

43


Amália Rodrigues Retrato de | Portrait by Silva Nogueira, 1946 Colecção | Collection Museu do Fado

44


criteriosa selecção de repertórios poéticos e musicais, ou mesmo da transmutação e reabilitação absoluta da imagem tradicional da fadista. Em entrevista a Vítor Pavão dos Santos, Amália recordava os preceitos tradicionais de apresentação das intérpretes quando se estreou: “Nos retiros, as fadistas que tinham mais nome, em vez do xaile preto cantavam com um manton às rosas por ser mais rico. Até também tive um, que me ofereceu o Grupo dos Quarenta à Hora, mas cantei sempre de xaile preto. Para mostrar que tinham trabalho, que não estavam mal da vida, as fadistas usavam anéis, pulseiras, brincos, alfinetes, usavam tudo o que tinham ao mesmo tempo.” Da sua estreia, no retiro da Severa, em 1939, recordava um vestido às riscas, amarelo e verde, com manga curta, peitilho de renda e gola redonda, num tempo em que “nem sabia pôr o xaile à maneira dos fadistas que seguravam as duas pontas na cintura e não tiravam dali a mão.”9

I also had one, which the Quarenta à Hora Group offered me, but I always sang in a black shawl. To show that they had work, that they were doing well in life, Fado singers wore rings, bracelets, earrings, pins, they wore everything they had at the same time.” Of her début, in the Retiro da Severa, in 1939, she recalls wearing a striped yellow and green dress, with short sleeves and a lace front with round neckline, at a time when “I didn’t even know how to put a shawl on like the Fado singers who tucked the two ends into their belt, which they kept hold of.”9 Later, in the Café Luso in 1941, she was photographed wearing a printed dress to which she added a black shawl with floral motifs. Amália Rodrigues would justify the introduction of the totally black outfit with: “I thought that the black shawl only went well with a black dress. It just didn’t match on top of a dress with flowers or a chequered dress, like all of the Fado singers used to wear. And I also did this out of timidity, because black always looks good, people never say that it is ugly. Black is a safer colour, prettier, it disguises the body well, and makes you even more elegant. Black and white are beautiful colours but white is not for Fado. There can be no doubt that a black dress with a black shawl, that I started to wear, made Fado more agreeable. When I wore a black dress, a black shawl and just one shiny pin to hold the shawl, I thought that was pretty. But if I wore earrings, I didn’t wear the pin to hold the shawl.”10

Mais tarde, no Café Luso em 1941, a câmara captou-a utilizando um vestido estampado ao qual juntou um xaile negro com motivos florais. Sobre a introdução do figurino integralmente negro, Amália Rodrigues justificaria: “Achei que o xaile preto só ficava bem com um vestido preto. Por cima de um vestido às flores ou aos quadrados, como todas as fadistas usavam, não ligava bem. E fiz isto também por timidez, porque o preto está sempre certo, nunca ninguém diz que é feio. O preto é uma cor mais segura, mais bonita, disfarça muito o corpo, dá elegância, quando a pessoa tem alguma. O preto e o branco são cores lindas mas o branco não é para o fado. Não há dúvida que o vestido preto com o xaile preto, que eu comecei a usar, deu uma presença mais agradável ao fado. Quando usava um vestido preto, um xaile preto e só um alfinete a brilhar, a prender o xaile, achava bonito. Mas se punha brincos, já não punha o alfinete a prender o xaile.”10 Na década de 1940, Amália atingira já o topo da popularidade, junto do público. O seu nome constituía uma referência de culto no fado, no teatro ou no disco. Em poucos anos, somou várias participações em revistas e operetas, interpretando um repertório

In the 1940’s, Amália reached the height of her popularity among the public. Her name was a cult reference in Fado, in the theatre or on record. In just a few years she participated in a number of times in revues and operettas, singing a diverse repertoire that included rumbas, pasodobles, tangos, sambas and waltzes. In 1944, on an international tour in Brazil, she went on stage in the Copacabana Palace with an outfit designed by Pinto de Campos. Of popular inspiration, with an embroidered skirt and fringed shawl, this outfit had stylised folkloric motifs from the Minho region, within the stylistic framework

9 - SANTOS, Vítor Pavão, Amália, Uma Biografia, Lisboa, Contexto Editora, 1987, p.44.

9 - SANTOS, Vítor Pavão, Amália, Uma Biografia, Lisbon, Contexto Editora, 1987, p.44.

10 - SANTOS, Vítor Pavão, Amália, Uma Biografia, Lisboa, Contexto Editora, 1987, p.191-192.

10 - SANTOS, Vítor Pavão, Amália, Uma Biografia, Lisbon, Contexto Editora, 1987, p.191-192.

45


diversificado que incluía rumbas, pasodobles, tangos, sambas ou valsas. Em 1944, em tournée internacional no Brasil, subia ao palco do Copacabana Palace com um traje de cena da autoria de Pinto de Campos. De inspiração popular, com saia bordada e xaile franjado, este coordenado apresentava motivos folclóricos estilizados, de raízes minhotas, dentro do quadro de estilização e reinvenção folclórica que o Secretariado de Propaganda Nacional então promovia. Esta estética folclorizante foi sobejamente alimentada por Pinto de Campos, o mais destacado cenógrafo e figurinista do período, que haveria de criar para a artista vários modelos, entre os quais o da opereta Mouraria, que anunciava esta reconfiguração do traje de cena no fado para o negro total, processo ao qual não foi alheia a orientação da própria Amália: “Quando fiz a opereta Mouraria, achei que ficava mais bonito um vestido preto comprido com um xaile grande. Comecei a cantar e foi uma coisa que se agarrou a mim. Agora, ai de mim se vou cantar sem ser de preto.”11

of folkloric reinvention that the Secretariat of National Propaganda was promoting at that time. This folkloric look was definitely promoted by Pinto de Campos, the best known scenographer and costume designer of the period, who would design various models for the artist, among which the one she wore in the operetta Mouraria, which announced this reconfiguration of what to wear for Fado to total black, a process which Amália herself contributed to: “When I did the operetta Mouraria, I thought a long black dress with a large shawl looked prettier. I started to sing and it was something that grabbed hold of me. Now, I’m in trouble if I don’t wear black when I sing.”11 You could tell Amália Rodrigues had a liking for black early on, in the first Grandela Aires studio portraits in 1933 or in Barradas’ designs for the operetta Rosa Cantadeira in 1944 and, in fact, there are only rare exceptions to black, through the whole of the artist’s career, when she sang repertoires other than Fado or on stage in the Theatre, to recreate Severa, one of the founding myths of the origins of Fado.

Este gosto de Amália Rodrigues pelo negro fazia-se adivinhar desde cedo, nos primeiros retratos do estúdio Grandela Aires em 1933 ou nos figurinos de Barradas para a opereta Rosa Cantadeira em 1944 e, efectivamente, as raras excepções ao negro, sucederiam, ao longo de toda a carreira da artista, para interpretar repertórios distintos do fado ou, nos palcos do Teatro, para recriar a Severa, um dos mitos fundadores das origens do Fado.

Successively evoked in poetic repertoires, celebrated in the Theatre and in the Cinema, cited in the plastic arts – where it was confused, now and again, with Adelaide of the feted Fado by Malhoa – the mythical figure of Maria Severa is still evoked today in the performative contexts of the 21st century as a historical curiosity, in theatrical sketches that hark back to the popular origins of the genre, in one of the historic neighbourhoods of the city of Lisbon. And while throughout the 20th and 21st centuries, references to the image of the mythical Severa would occasionally crop up in the performative contexts of Fado, Amália definitively restored the feminine image of Fado – by breaking with the traditional image of the Fado singer, heiress of the mythology of the harlot Severa – inaugurating the image of an international femme fatale.

Sucessivamente evocada nos repertórios poéticos, celebrada no Teatro e no Cinema, citada nas artes plásticas – onde se confundiu, uma e outra vez, com a Adelaide do festejado Fado de Malhoa – a figura mítica de Maria Severa é ainda hoje evocada nos contextos performativos do século XXI como curiosidade histórica, em apontamentos de teatralidade que fazem a ligação às origens populares do género, num dos bairros históricos da cidade de Lisboa. E se ao longo dos séculos XX e XXI, as retomas imagéticas da mítica Severa vão pontuando os contextos performativos do fado, com Amália sucederia, definitivamente, a reabilitação da imagem feminina do Fado - pela

Silva Nogueira captured the image of Amália Rodrigues between 1942 and 1954 and in her portraits we already see hints of the construction and crystallisation of the image of the artist. Exploring

11 - SANTOS, Vítor Pavão, Amália, Uma Biografia, Lisboa, Contexto Editora, 1987, p.191-192.

11 - SANTOS, Vítor Pavão, Amália, Uma Biografia, Lisboa, Contexto Editora, 1987, p.191-192.

46


ruptura com a imagem tradicional da fadista, herdeira da mitologia da meretriz Severa - inaugurando-se uma imagem de femme fatale internacional.

Amália’s dazzling photogenic possibilities, in Silva Nogueira’s portraits we see the transmutation of the image of the young inexperienced model into an image full of the diva’s auratic charge.

Silva Nogueira captou a imagem de Amália Rodrigues entre 1942 e 1954 e nos seus retratos intuímos já a construção e fixação da imagem da artista. Explorando as possibilidades da fotogenia deslumbrante de Amália, nos retratos de Silva Nogueira apreendemos a transmutação da imagem da jovem modelo inexperiente para uma imagem plena de carga aurática da diva.

While in the first portraits from 1939 and 1942, Amália appears smiling, holding a Portuguese guitar, dressed simply in a white blouse, skirt and traditional shawl, her face front-lit, her body profiled against a light background, in the images taken after 1944, the penumbra and a shaded background would be accentuated and her face would be lit in an almost sculpturesque manner. In 1946, Silva Nogueira photographed her wearing the costume of the operetta Mouraria, by Pinto de Campos in a series of portraits of great expressive intensity, mirroring the diva’s exuberance, with all of the dramatic eloquence of her singing.

Se nos primeiros retratos, de 1939 e 1942, Amália surge sorrindo, envergando uma guitarra portuguesa, singelamente vestida com uma blusa branca, saia e xaile tradicionais, rosto iluminado frontalmente, com recorte do corpo sobre um fundo claro, nas imagens captadas a partir de 1944, acentuar-se-iam a penumbra e as sombras de fundo e a iluminação do rosto trabalhava-se de forma quase escultórica. Em 1946, Silva Nogueira captou-a ostentando o traje da opereta Mouraria, de Pinto de Campos num conjunto de retratos de grande intensidade expressiva, espelhando a exuberância da diva, com toda a eloquência dramática do canto.

For her concert début in the Lincoln Center, in New York, (1966), Amália commissioned a special creation from Pinto de Campos, breaking with her use of black upon the suggestion of the maestro Andre Kostelanetz, who recommended to her that she did not wear black in front of an orchestra where all of the musicians wore black: “As it was folklore, I arranged a dress that would go with what I was going to sing. I asked Pinto de Campos and he designed a dress inspired by regional motifs, very pretty, but very heavy.”12

Para a estreia em concerto no Lincoln Center, em Nova Iorque, (1966), Amália encomendava a Pinto de Campos uma criação especial, quebrando a utilização do negro, por sugestão do maestro Andre Kostelanetz, que lhe recomendou que não usasse preto, à frente de uma orquestra com todos os músicos vestidos de preto: “Como era folclore, arranjei um vestido que desse com aquilo que eu ia cantar. Pedi ao Pinto de Campos e ele desenhou um vestido inspirado em motivos regionais, muito bonito, mas muito pesado.”12

Returning to the prestigious New York hall Amália performed wearing a red dress with a green shawl, designed by Anna Maravilhas. As she herself recalled: “It was very pretty. They are two colours that people don’t usually wear together, it is a tough combination. In the second part, which was Fado accompanied by the guitar and viola, she sang in black. So it handled the transition from folklore to Fado very well.”13

De regresso à prestigiada sala de Nova Iorque Amália actuava com um vestido vermelho com xaile verde, da autoria de Anna Maravilhas. Como ela própria recordava: “Ficava muito bonito. São duas cores que as pessoas não se lembram, é uma combinação difícil. Na segunda

During her whole life, Amália Rodrigues decided on which costumes she thought were most appropriate, with her “outfits for singing” being designed by seamstresses in her early days. “As soon as I started to take charge of things, I began to look at shop windows, at people who were 12 - SANTOS, Vítor Pavão, Amália, Uma Biografia, Lisbon, Contexto Editora, 1987, p.190

12 - SANTOS, Vítor Pavão, Amália, Uma Biografia, Lisboa, Contexto Editora, 1987, p.190

13 - Idem, ibidem

47


Maria da Fé Teatro ABC, 1978 Colecção | Collection Museu do Fado

48


parte, que era com fado à guitarra e à viola, já cantava de preto. Assim fazia bem a transição do folclore para o fado.”13

well dressed, to see what went well, what was pretty, to distinguish things that looked good from those that didn’t.”14 One of the fashion designers would be the wife of Santos Moreira the Fado viola player who, with Domingos Camarinha, accompanied her for many years. Later, her wardrobe came to be designed by Maria-Thereza Mimoso and, shortly after that, by the atelier of Anna Maravilhas, the name that, for decades, represented Portuguese haut couture. When Anna Maravilhas’ atelier closed in 1989, Amália called on Ilda Aleixo, one of the fashion designers who used to work there. From then on and up to the end of the artist’s career, it would be Ilda Aleixo who made her stage outfits. Amália would choose the fabrics in Paris or in New York and at home, with Ilda Aleixo, she would come up with the costume.15

Durante toda a vida, Amália Rodrigues decidiu os figurinos que considerou mais apropriados, sendo os seus “fatos de cantar” concebidos por costureiras, nos primeiros tempos. “Assim que comecei a tomar conta das coisas, comecei a olhar para uma montra, para uma pessoa bem vestida, a ver o que ficava bem, o que era bonito, a distinguir as coisas bonitas das feias.”14 Uma das modistas seria a mulher de Santos Moreira o viola de fado que, com Domingos Camarinha, a acompanhou durante longos anos. Mais tarde, o seu guarda-roupa passou a ser desenhado por Maria-Thereza Mimoso e, pouco tempo depois, pelo atelier de Anna Maravilhas, o nome que, durante décadas, representava a Alta-costura portuguesa. Com o encerramento do atelier de Anna Maravilhas em 1989, Amália chamou Ilda Aleixo, uma das modistas que aí trabalhavam. Seria, a partir de então e até ao final da carreira da artista, Ilda Aleixo a confeccionar os seus vestidos de cena. Amália escolhia os tecidos em Paris ou em Nova Iorque e em casa, com Ilda Aleixo, idealizava o figurino.15

In the early 1960’s Amália Rodrigues met Maria-Thereza Mimoso, a few years after her international consecration with her participation in the film Les Amants du Tage, in 1955 and her shows in the Olympia in 1958. In the film by Henri Verneuil, Amália appeared singing the songs Barco Negro – based on the Brazilian melody Mãe Preta, by Caco Velho, with a poem by David Mourão-Ferreira - and Solidão - by Ferrer Trindade and David Mourão-Ferreira. The film was shown around the world and the song Barco Negro became an object of fascination for the French public. Everyone wanted to meet the owner of that fabulous voice, heralding a dazzling international artistic career. From her encounter with Maria-Thereza Mimoso came a more sophisticated image of the artist, a look with suggestions from the universe of haut couture.16 In 1962 Maria-Thereza Mimoso made the dress that Amália would take to the Olympia, on her return to the mythical Parisian hall. In this outfit, the traditional fringed shawl gave way to a circular black cape, inspired by the tradition of Coimbra.

Nos alvores da década de 1960 Amália Rodrigues conhecia Maria-Thereza Mimoso, poucos anos corridos sobre a sua consagração internacional com a participação no filme Les Amants du Tage, em 1955 e os espectáculos no Olympia em 1958. No filme de Henri Verneuil Amália surgira interpretando os temas Barco Negro - a partir da melodia brasileira Mãe Preta, de Caco Velho, com poema de David Mourão-Ferreira - e Solidão - de Ferrer Trindade e David Mourão-Ferreira. O filme passaria em todo o mundo e o tema Barco Negro transformar-se-ia num objecto de fascínio do público francês. Todos queriam conhecer a dona daquela voz fabulosa adivinhandose uma fulgurante carreira artística internacional. Do encontro com Maria-Thereza Mimoso resultaria uma imagem mais sofisticada da

14 - Idem, ibidem 15 - CARVAS, Estrela, e ALMEIDA, Maria Inês, Os Meus 30 Anos com Amália, Lisbon, Guerra e Paz, 2009, p.35.

13 - Idem, ibidem 14 - Idem, ibidem

16 - See the fundamental article by SANTOS, Rui Afonso, “O Traje, as Jóias e a Moda” in Amália, Coração Independente, Lisbon, Berardo Collection Museum, EDP Foundation, Amália Rodrigues Foundation, 2009, pp. 265-301.

15 - CARVAS, Estrela, e ALMEIDA, Maria Inês, Os Meus 30 Anos com Amália, Lisboa, Guerra e Paz, 2009, p.35.

49


artista, um visual com sugestões do universo da Alta-costura.16 Em 1962 Maria-Thereza Mimoso executava o vestido que Amália levaria ao Olympia, no seu regresso à mítica sala parisiense. Neste figurino, o tradicional xaile de franjas dava lugar a uma capa circular negra, inspirada na tradição de Coimbra.

For another concert in the Olympia, Maria-Thereza designed a tight-fitting black silk dress with glass beads and long sleeves complemented by a triangular shawl with similar applications on the hem. In 1962 in the Edinburgh Festival Amália wore another creation by Maria-Thereza Mimoso, a dress, with two flounces, in black silk satin, as in the following year in Beirut. There, the artist’s success was such that they invited her to sing Fado in the city cathedral to accompany the Te Deum for the National Day of Lebanon. Amália always returned to the countries that never tired of applauding her. As Rui Vieira Nery pointed out, “Amália’s international success was, above all, “a personal triumph of the genius of Amália more than directly a victory for Fado in itself.”17

Para outro concerto no Olympia, Maria-Thereza concebeu um vestido de seda preta com vidrilhos, manga comprida e justa complementado por um xaile triangular com aplicações semelhantes na barra. Em 1962 no Festival de Edimburgo Amália exibia uma outra criação de Maria-Thereza Mimoso, um vestido, de dois folhos, em cetim de seda preta, tal como no ano seguinte em Beirute. Ali, o sucesso da artista foi tal que a convidaram para cantar o fado na catedral da cidade para acompanhar o Te Deum do Dia Nacional do Líbano. Amália regressou sempre aos países que não se cansaram de a aclamar. Como salientou Rui Vieira Nery, “o sucesso de Amália a nível internacional foi, sobretudo, “um triunfo pessoal do génio de Amália mais do que directamente uma vitória do fado, por si mesmo.”17

Throughout a long career, her image was permanently renewed and updated. Socialising, at the start of the 1950’s, with the effervescent environment of Hollywood, her image was also structured on some of the paradigms of the Star System. Her filmography, her photographic portraits helped to stabilise the diva’s image. In fact, while some authors lamented a “divergence” between Amália and the Seventh Art “another light comes on, however, if we see them as documents of Amália singing”.18 While it is not an abundant, filmography, there were other great female singers in a similar situation: Billie Holiday in her only appearance as an actress in a supporting role or Oum Khalsoum who, having acted in some films, soon became aware that she did not have a strong presence in the cinema.

Ao longo de uma extensa carreira, a sua imagem apresentou-se em permanente renovação e actualização. Convivendo, no início da década de 1950, com o ambiente efervescente de Hollywood, também a sua imagem se estruturou a partir de alguns dos paradigmas do Star System. A sua filmografia, os seus retratos fotográficos concorreram para a estabilização da imagem de diva. De facto, se alguns autores lamentaram um “desencontro” entre Amália e a Sétima Arte “outra luz se acende, porém, se os olharmos enquanto documentos de Amália a cantar”.18 Não sendo uma filmografia abundante, encontramos outras grandes cantoras em situação semelhante: Billie Holiday numa única aparição como actriz num papel secundário ou Oum Khalsoum que, tendo participado em alguns filmes, cedo se retirou ciente de que não tinha uma presença forte no cinema.

An illustrative collection of Amália’s interpretations, her filmography is a significant contribution towards the mythology of the artist. As emphasised by Emília Tavares19, “Amália is included in many of the synonyms that modern and capitalist culture developed, in its Star System, as that of diva, star, aura, icon”. The production of her image, the construction of the myth and of the diva, largely occurred within

16 - Veja-se o fundamental artigo de SANTOS, Rui Afonso, “O Traje, as Jóias e a Moda” in Amália, Coração Independente, Lisboa, Museu Colecção Berardo, Fundação EDP, Fundação Amália Rodrigues, 2009, pp. 265-301.

17 - NERY, Rui Vieira, “Amália, O Fado no Mundo e o Mundo no Fado” in Amália no Mundo, o Mundo de Amália, IGESPAR, Panteão Nacional, Lisbon, 2009, p. 27.

17 - NERY, Rui Vieira, “Amália, O Fado no Mundo e o Mundo no Fado” in Amália no Mundo, o Mundo de Amália, IGESPAR, Panteão Nacional, Lisboa, 2009, p. 27.

18 - RAMOS, Jorge Leitão, Expresso, 11 November 1989. 19 - TAVARES, Emília in “A Imagem da Voz” in Amália Coração Independente, Lisbon, Berardo Collection Museum, 2009, p. 195.

18 - RAMOS, Jorge Leitão, Expresso, 11 de Novembro de 1989.

50


Mariza Torre de Belém, Lisboa, 2005 Fotografia | Photography - José Frade Colecção | Collection - Museu do Fado

Corpus ilustrativo de interpretações de Amália, a sua filmografia concorreu amplamente para a mitologia da artista. Como sublinhou Emília Tavares19, “Amália inscreve-se em muitos dos sinónimos que a cultura moderna e capitalista desenvolveu, no seu Star System, como os de diva, estrela, aura, ícone”. A produção da sua imagem, a construção do mito e da diva, ocorreu em grande parte num contexto internacional, num distanciamento evidente dos modelos retrógrados do Salazarismo. António Ferro reparava em Amália como sempre reparara na excelência artística, convocando artistas plásticos, teatrais e cineastas, na fase inicial da sua “política do espírito”. E mesmo

an international context, clearly distanced from the retrograde models of Salazarism. António Ferro looked on Amália as he had always looked on artistic excellence, inviting plastic artists, artists from the theatre and cinema, in the initial stage of his “policy of the spirit”. And even though she broke into the cinema in a dark phase of Portuguese cinematography20 Amália nevertheless caused the directors who worked with her to become absolutely fascinated with her actress’ intuition, with an expression and face that could take over the whole screen. Her filmography of over almost twenty years records her interpreting many of the Fados that were part of her repertoire.

19 - TAVARES, Emília in “A Imagem da Voz” in Amália Coração Independente, Lisboa, Museu Colecção Berardo, 2009, p. 195.

20 - In 1949, António Ferro left the National Secretariat of Information to become minister plenipotentiary of Portugal in Berne. His departure from the Secretariat allowed the internal opposition against him to become visible. Promulgated in 1948, the Portuguese Cinema Protection Law would drive it towards increasing State control.

51


irrompendo no cinema numa fase negra da cinematografia lusa20 Amália não deixou de exercer um fascínio absoluto pelos realizadores que a dirigiram com a sua intuição de actriz, uma expressão e um rosto capazes de subjugar toda a tela. A sua filmografia regista-a interpretando, ao longo de quase vinte anos, muitos dos fados que pontificam no seu repertório.

More generically, Fado was a dominant theme in national cinematographic production21 and the body of films in which the protagonists were singers, Fado singers, songstresses and suchlike, occupies a significant volume of Portuguese cinematography. In a formula aimed at commercial success, the sacred names of Fado, alongside renowned actors, all media figures prior to the cinema prescribed the continuity of a type of entertainment film the content of which reiterated the dominant ideological and social postulates.22 Many of the films were constructed “on the stereotype of the star obscuring the other professional classes of dancers, chorus girls, musicians, actors and assistants”. 23

Mais genericamente, o Fado foi tema preponderante na produção cinematográfica nacional21 e o corpus de filmes em que os protagonistas eram cantores, fadistas, cantadeiras e afins, assume volume superior no conjunto da cinematografia portuguesa. Numa fórmula destinada ao êxito comercial, os nomes consagrados do fado, a par de actores de nomeada, todos com um mediatismo anterior ao cinema, ditaram a continuidade de um tipo de filme de entretenimento cujos conteúdos reiteravam os postulados ideológicos e sociais dominantes.22 Muitos dos filmes construíram-se “sobre o estereótipo da estrela ofuscando as outras classes profissionais de bailarinos, coristas, músicos, actores e ajudantes”. 23

In this simplistic vision, free from any realistic concerns, the system of our national song writing approximated that of the Star System of Hollywood that Edgar Morin illustrated: “The movie star is a Goddess. The public makes her so, but it is the star system that prepares, chooses, models, proposes and manufactures her. The star caters to an affective or mythical need that is not created by the star system. However, without the star system, this need would not find its forms, its supports, and its aphrodisiacs.”24

Nesta visão simplista desprovida de quaisquer preocupações realistas, o sistema do nosso nacional-cancionetismo aproximava-se do Star System de Hollywood que Edgar Morin ilustrou: “A estrela de cinema é a deusa. O público assim a faz, mas é o star system que a prepara, aponta, modela, propõe e fabrica. A estrela responde a uma necessidade afectiva ou mítica que não é criada pelo star system. No entanto, sem o star system, esta necessidade não encontraria as suas formas, os seus suportes, e os seus afrodisíacos.”24

In Portuguese films of artists, three vectors converge: the star herself, a fascination for the artist’s life and the moral sanctioning of the erotic fancies that this pattern of consumption and culture favoured.25 In this regard, Portuguese cinematography was also a vehicle for the legitimation of Fado, alongside the publication of specialist journals and a whole body of literature that was apologetic of the genre. Cinema mirrored the moral rectification of the life of the stars who opposed the influences of the American star system.

20 - Em 1949, António Ferro abandonava o Secretariado Nacional de Informação para assumir as funções de ministro plenipotenciário de Portugal em Berna. O seu afastamento do Secretariado tornava visíveis as oposições internas que se lhe dirigiam. Promulgada em 1948, a Lei Protectora do Cinema Português conduzi-lo-ia a um pendor estatizante.

21 - See O Fado no Cinema, EGEAC - Fado Museum, Lisbon, 2012

21 - Veja-se O Fado no Cinema, EGEAC - Museu do Fado, Lisboa, 2012

22 - See the fundamental study by AREAL, Leonor, Cinema Português - Um País Imaginado - Vol. I Antes de 1974, ed. 70, Lisbon, 2011, p. 129.

22 - Veja-se o fundamental estudo de AREAL, Leonor, Cinema Português - Um País Imaginado - Vol. I Antes de 1974, ed. 70, Lisboa, 2011, p. 129.

23 - AREAL, Leonor, op. cit., p. 130.

23 - AREAL, Leonor, op. cit., p. 130.

24 - MORIN, Edgar, As Estrelas de Cinema, Lisbon, Horizonte, 1980, p. 79.

24 - MORIN, Edgar, As Estrelas de Cinema, Lisboa, Horizonte, 1980, p. 79.

25 - AREAL, Leonor, op. cit., p. 131.

52


Nos filmes portugueses de artistas, três vectores convergem: a estrela propriamente dita, o fascínio pela vida de artista e a sanção moral dos devaneios eróticos que este padrão de consumo e cultura propiciava.25 Neste sentido, a cinematografia portuguesa foi, também, um veículo de legitimação do fado, a par da publicação de periódicos da especialidade e de toda uma literatura apologética do género. No cinema, espelhava-se a rectificação moral da vida das vedetas, que se opunha às influências do star system americano.

In Bruno’s portraits of Hollywood, always half-body and face always taken diagonally, Amália’s pose, as Emília Tavares points out, is already one of the cinema and not of Fado: “The feminine model that Amália embodied then uses the exoticism of her face, of her jewellery and expressivity, especially gestural, adapting it to the diagonal poses with the head inclined and body projected with which Hollywood had constructed the model of its movie stars.” 26 Before Amália Rodrigues, Beatriz Costa had enjoyed a meteoric rise in the theatre and in the cinema, fascinating photographers, painters and illustrators or dictating fashions back in 1927 with her famous Garçonne hairstyle inspired by Louise Brooks, which would always be related to her image. The reaction to the actress’ new hairstyle was such that “the overwhelming majority of women in Lisbon dared to cut their hair”.27

Nos retratos de Bruno de Hollywood, de meio corpo e rosto sempre em diagonal, a pose de Amália, como salienta Emília Tavares, é já de cinema e não de fado: “O modelo feminino que Amália então incorpora usa o exotismo do seu rosto, das suas jóias e da sua expressividade, sobretudo gestual, adaptando-o às poses diagonais de cabeça inclinada e corpo projectado com que Hollywood construíra o modelo das suas estrelas de cinema.” 26

In the photographs of Amália we see the transfiguration of the young inexperienced model to tragic Fado singer that imposes the contained silence of the great art. Allegedly without a defined marketing strategy, Amália intuitively constructed an image with the agents she worked with: cinematographic directors and producers, photographers, record companies, international agents.

Antes de Amália Rodrigues, Beatriz Costa protagonizara uma ascensão meteórica no teatro e no cinema, fascinando fotógrafos, pintores e ilustradores ou ditando modas, logo em 1927, com o seu célebre penteado à Garçonne, inspirado em Louise Brooks, corte que ficaria para sempre ligado à sua imagem. A repercussão do novo penteado da actriz terá sido tal que “a esmagadora maioria das lisboetas ousaram cortar o cabelo”.27

In her portraits we perceive that Amália shaped herself. The photographers would give her an aura of international star which became consolidated from the 1950’s. From the first portraits of 1939 taken in the Grandela Aires atelier – photographing a young inexperienced woman - to the photographs of Silva Nogueira28 through which we unveil the construction of the myth – moving onto the portraits painted by Mendoza – enhancing Amália’s good looks – and the photographs from Grossinger’s Studio or by Thurston Hopkins

Nas fotografias de Amália apreendemos a transfiguração da jovem modelo inexperiente, à fadista trágica que impõe o silêncio contido da grande arte. Alegadamente sem estratégia de marketing delineada, Amália construiu uma imagem intuitivamente, com os agentes que com ela se cruzaram: realizadores e produtores cinematográficos, fotógrafos, editores discográficos, agentes internacionais.

26 - TAVARES, Emília, op.cit., p. 200. 27 - TEIXEIRA, Madalena Braz, A Moda do Século 1900-2000, National Costume Museum, Lisbon, 2000, p. 70

25 - AREAL, Leonor, op. cit., p. 131. 26 - TAVARES, Emília, op.cit., p. 200.

28 - Who left us a series of portraits of Amália between 1942 and 1954. See the work Amália Rodrigues - Retratos de Silva Nogueira, Institute of Museums and Conservation, National Theatre Museum, Lisbon, 1999.

27 - TEIXEIRA, Madalena Braz, A Moda do Século 1900-2000, Museu Nacional do Traje, Lisboa, 2000, p. 70

53


Nos seus retratos percebemos que Amália se construiu. Os fotógrafos fixar-lhe-iam a aura de vedeta internacional que se consolidava a partir dos anos 50. Desde as primeiros retratos de 1939, do atelier Grandela Aires - captando a jovem inexperiente - às fotografias de Silva Nogueira28 - ao longo das quais desvendamos a construção do mito - passando pelos retratos pintados de Mendoza – potenciando a fotogenia de Amália - pelas fotografias do Grossinger’s Studio ou de Thurston Hopkins – em pose muito descontraída e informal – ou pelas imagens de Irvin Penn29 ou Jean-Louis Rancurei30- captando a interioridade de Amália, até aos retratos que mais absolutamente a consagram como ícone das artes do espectáculo - de Emerico.31

– in a very relaxed and informal pose – or the images of Irvin Penn29 or Jean-Louis Rancurei30- capturing Amália’s inner self, up to the portraits that most definitively consecrated her as an icon of the performing arts - by Emerico31, Bruno of Hollywood32, by the Studio Harcourt atelier33, Sabine Weiss34, Charles Ichaï35, J. Babou36 – her good looks, the artist’s expressivity were an object of fascination for different generations of national and international photographers. In Portugal, after Silva Nogueira, there was also Eduardo Gageiro, Carlos Gil, António Homem Cardoso or Augusto Cabrita who established Amália’s iconography, which was adorned on the covers of magazines, records, posters, photographic reports or books, catering to the longing of an increasingly attentive public, ready to consume information about the lives of the stars. Claiming the status of independent artist, whose femininity was permanently affirmed, Amália’s aura was constructed within the framework of the mechanisms of the international mass media, as opposed to the retrograde models of the culture of Salazarism. The whole Star System culture reiterated her image of diva, star and icon, with our written press mirroring the promotional strategies inherent to the world of international show business.

Bruno of Hollywood32, do atelier Studio Harcourt,33 Sabine Weiss34, Charles Ichaï35 de J. Babou36 – a fotogenia, expressividade da artista constituíram objecto de fascínio para diferentes gerações de fotógrafos nacionais e internacionais. Em Portugal, depois de Silva Nogueira, também Eduardo Gageiro, Carlos Gil, António Homem Cardoso ou Augusto Cabrita fixaram a iconografia de Amália, que se plasmava nas capas de magazines, discos, cartazes, reportagens fotográficas ou livros, indo de encontro à avidez de um público cada vez mais atento e disposto ao consumo da informação alusiva à vida das vedetas. Reclamando o estatuto de artista independente, com uma feminilidade em permanente afirmação, a aura de Amália construiu-se no quadro dos mecanismos de mass

From the 1960’s, reports on Amália taken in her residence in S. Bento or on holiday in Brejão proliferated, feeding an ever broadening public universe. Amália allowed herself to be photographed in a bathing suit and dark glasses, in the pose of a movie star. This proximity, staged for the readers and allegedly revealing some aspects of the intimate

28 - Que nos deixou uma série de retratos de Amália entre 1942 e 1954. Veja-se a obra Amália Rodrigues - Retratos de Silva Nogueira, Instituto de Museus e Conservação, Museu Nacional do Teatro, Lisboa, 1999. 29 - Em 1963. Fotografias publicadas em Amália, Coração Independente, Lisboa, Museu Colecção Berardo, Fundação EDP, Fundação Amália Rodrigues, 2009.

29 - In 1963. Photographs published in Amália, Coração Independente, Lisbon, Berardo Collection Museum, EDP Foundation, Amália Rodrigues Foundation, 2009.

30 - Idem, Ibidem. Em 1966.

30 - Idem, Ibidem. In 1966.

31 - Idem, Ibidem. No Rio de Janeiro, em 1955 e 1956.

31 - Idem, Ibidem. In Rio de Janeiro, in 1955 and 1956.

32 - Idem, Ibidem. Em 1952.

32 - Idem, Ibidem. In 1952.

33 - Idem, Ibidem. Em 1956.

33 - Idem, Ibidem. In 1956.

34 - Idem, Ibidem. Do mesmo ano.

34 - Idem, Ibidem. From the same year.

35 - Idem, Ibidem. Das décadas de 1960 e de 1980.

35 - Idem, Ibidem. From the 1960’s and 1980’s.

36 - Idem, ibidem. Em 1963.

36 - Idem, ibidem. In 1963.

54


media internacionais, avesso aos modelos retrógrados da cultura do salazarismo. Toda a cultura do Star System reiterava a sua imagem de diva, estrela e ícone, espelhando as estratégias promocionais próprias do mundo do espectáculo internacional, na nossa imprensa escrita.

life of the artist, showing details from inside her home or staging domestic chores, reiterated the affection of readers who could identify with her through an idea of proximity.37 As from the end of the 1970’s the first scientific studies were carried out on Fado in the academy. In 1985, Júlio Pomar celebrated his Lusitânia no Bairro Latino where the Portuguese guitar enjoyed a central protagonism on the canvas. At the same time, consensus was gradually growing within the Portuguese musical world about the importance of Fado, in which the recording industry was gaining a fresh interest and which was being included in the programs of popular festivities on the national circuit. Gradually, a new generation of Fado singers started to appear, approximating the genre of singers and musicians from other areas like José Mário Branco, Sérgio Godinho, António Variações or Paulo de Carvalho.

Desde a década de 1960 proliferavam as reportagens sobre Amália captando-a na sua residência em S. Bento ou de férias no Brejão, alimentando um universo de públicos cada vez mais alargado. Amália deixava-se fotografar em fato de banho e óculos escuros, em pose de estrela de cinema. Esta proximidade encenada para os leitores, desvendando alegadamente, alguns aspectos da vida íntima da artista, fosse revelando pormenores do interior da casa ou encenando lides domésticas, reiterava a simpatia dos leitores que aqui se reviam num ideal de proximidade.37 A partir do final da década de 1970 ensaiavam-se na academia, os primeiros estudos científicos sobre o Fado. Em 1985, Júlio Pomar celebrava a sua Lusitânia no Bairro Latino conferindo à guitarra portuguesa um protagonismo central na tela. Simultaneamente, crescia gradualmente, no quadro musical português, o consenso em torno da importância do Fado, que conquistava um renovado interesse pela indústria discográfica e integrava a programação das festas populares no circuito nacional. Paulatinamente, ia aparecendo uma nova geração de intérpretes de Fado e aproximavam-se do género cantores e músicos vindos de outras áreas como José Mário Branco, Sérgio Godinho, António Variações ou Paulo de Carvalho.

Internationally a fresh interest was also emerging for local musical cultures, through their best-known exponents, through recordings, the media and live shows and, in this respect, Amália Rodrigues and Carlos do Carmo enjoyed a very central role. From the 1990’s, Mísia’s career would also develop, over twenty years, on the major stages of the world, accompanying Fado’s entry on the world music circuits, in her case very closely related to the French market. Conquering an increasingly wider audience and mapping out an important international career in countries such as Spain, Japan, France, Argentina and England, Mísia always relied on the irreverence and sophistication of her image. This aesthetic innovation protagonised by Mísia very soon came to be part of a greater challenge to the conservative and traditionalist canons of Fado, combining a keen sense of theatricality and stage production, with a daring and careful selection of repertoires or even in a fusion with other musical genres.

No plano internacional emergia um renovado interesse pelas culturas locais musicais, através dos seus expoentes mais reconhecidos, nos circuitos do disco, dos media e dos espectáculos ao vivo e, neste domínio, Amália Rodrigues e Carlos do Carmo assumiram protagonismo absoluto. 37 - Veja-se O Século Ilustrado, nº 1209 de 4 de Março de 1961 ou Revista de Rádio nº 624 de 2 de Setembro (Brasil) ou ainda a revista Flama, nº 1064 de 26 de Julho de 1969. Veja-se, a este respeito de SANTOS, Rui Afonso, “O Traje, as Jóias e a Moda” in Amália, Coração Independente, Lisboa, Museu Colecção Berardo, Fundação EDP, Fundação Amália Rodrigues, 2009.

37 - See O Século Ilustrado, no. 1209 of 4 March 1961 or Revista de Rádio no. 624 of 2 September (Brazil) or also the magazine Flama, no. 1064 of 26 July 1969. In this regard see SANTOS, Rui Afonso, “O Traje, as Jóias e a Moda” in Amália, Coração Independente, Lisbon, Berardo Collection Museum, EDP Foundation, Amália Rodrigues Foundation, 2009.

55


Katia Guerreiro Olympia Paris, 2011 Fotografia | Photography - Jorge SimĂŁo

56


A partir de 1990, também a carreira de Mísia se desenrolaria, ao longo de vinte anos, nos grandes palcos do mundo, acompanhando a entrada do Fado nos circuitos da world music, no seu caso com estreita ligação ao mercado francês. Conquistando públicos cada vez mais vastos e desenhando uma importante carreira internacional em países como Espanha, Japão, França, Argentina ou Inglaterra, Mísia apostou desde sempre na irreverência e sofisticação da imagem. Esta inovação estética protagonizada por Mísia enquadrava-se, desde cedo, num desafio mais amplo aos cânones conservadores e tradicionalistas do Fado, combinando um apurado sentido de teatralidade e de encenação em palco, com uma selecção arrojada e criteriosa de repertórios ou mesmo com a fusão com outros géneros musicais.

Further regarding aesthetic presentation, Paulo Bragança made an important break with the traditional image of the male voice. Deconstructing the most conservative canons of presentation in a performative context, Paulo Bragança underwent a total stylistic transmutation by using notable feminine items of clothing such as the shawl, combining short-sleeved undershirts with leather coats, large capes, military boots, or performing barefoot, in what would become his brand image. From the 1990’s and at the dawn of the century a new generation of female singers - Mafalda Arnauth, Joana Amendoeira, Katia Guerreiro, Maria Ana Bobone, Ana Sofia Varela, Cuca Roseta, Raquel Tavares, Aldina Duarte, Carminho, Ana Moura and Mariza – confirmed a renewed attention to image within the context of public presentation and the media in general. The artist’s image came to be worked on exhaustively within the context of a defined marketing strategy, where fashion design, enjoying a height in creativity, took on increasing protagonism. Photography, video and fashion design also worked towards the construction of the star, in proportion to their international media projection, in a market where Fado, in the last decade, has enjoyed increasing affirmation.

Ainda no quadro da apresentação estética, caberia a Paulo Bragança uma importante ruptura com a imagem tradicional da voz no masculino. Desconstruindo os cânones mais conservadores de apresentação em contexto performativo, Paulo Bragança protagonizou a transmutação estilística total, pelo recurso a peças vincadamente femininas como o xaile, combinando camisolas de manga curta e casacos de cabedal, capas largas, botas militares, ou actuando totalmente descalço, naquela que passaria a ser a sua imagem de marca. Desde a década de 1990 e já no dealbar do século a nova geração de intérpretes femininas - Mafalda Arnauth, Joana Amendoeira, Katia Guerreiro, Maria Ana Bobone, Ana Sofia Varela, Cuca Roseta, Raquel Tavares, Aldina Duarte, Carminho, Ana Moura ou Mariza – atesta um cuidado renovado com a imagem no contexto de apresentação junto de públicos e dos media, em geral. A imagem passou a ser trabalhada exaustivamente no quadro da estratégia de marketing delineada, onde o design de moda, usufruindo actualmente de uma vertigem de criatividade, ocupa um protagonismo crescente. Fotografia, vídeo e design de moda concorrem também para a construção da estrela, na proporção da sua projecção mediática internacional, num mercado onde o Fado tem usufruído, na última década, de uma capacidade de afirmação crescente.

In this regard, Fado has also been music for the creators of fashion since the middle of the last century. From Anna Maravilhas to MariaThereza Mimoso with Amália, including Augustus, José Manuel Costa Reis, José Carlos and Paulo Matos,38 the recreations of the traditional Severa by Tiago Cardoso,39 to Nuno Baltazar, Carlos Gil, Filipe Faísca, Ricardo Preto, Storytailors, João Rolo, José António Tenente, Sybilla, Ana Salazar, Luís Buchinho, Nuno Baltazar, Lidja Kolovrat and Aleksandar Protic, Fado has inspired a number of generations of fashion designers, of different styles.

Neste sentido, o Fado tem sido música também para os criadores de moda, desde os meados do século passado. De Anna Maravilhas

38 - For Maria da Fé, Lenita Gentil and Alexandra in the 1980’s and 1990’s;

Lending their art its own melody, voice and tempo, the fashion designer is, in this sense, also a musician. Inspired by the musicality of another timbre, their stage goes from the blank page or from the 39 - For Raquel Tavares;

57


a Maria-Thereza Mimoso com Amália, passando por Augustus, José Manuel Costa Reis, José Carlos ou Paulo Matos,38 pelas recriações da tradicional Severa de Tiago Cardoso,39 até Nuno Baltazar, Carlos Gil, Filipe Faísca, Ricardo Preto, Storytailors, João Rolo, José António Tenente, Sybilla, Ana Salazar, Luís Buchinho, Nuno Baltazar, Lidja Kolovrat ou Aleksandar Protic, o Fado tem inspirado diversas gerações de designers de moda, de diferentes estilos.

“toile” to the stage of the voice that embodies and then participates in a collective enchantment. Their art involves a different kind of melody. Its voice, flowing from the hand, gives form and rhythm to another voice, revealing light and shade, studying movements slowly and in detail until merging with them. Thus both voices – the voice of Fado and the voice of the image – are written into the greater narrative of our History.

Inscrevendo a sua arte numa melodia própria, numa voz e num tempo singulares, o designer de moda é, neste sentido, também ele um intérprete. Inspirado pela musicalidade de um outro timbre, o seu palco vai da página em branco ou da “toile” até ao palco da voz que corporiza, para ali participar do seu encantamento colectivo. A sua arte inscreve-se sobre outra melodia. A sua voz, saída da mão, dá corpo e ritmo a uma outra voz, desvenda-lhe luzes e sombras, estuda-lhe detalhada e pausadamente os movimentos até se fundir nela. Assim se inscrevem ambas - voz do fado e voz da imagem - na narrativa maior da nossa História.

Sara Pereira Director of the Fado Museum

Sara Pereira Directora do Museu do Fado

38- Para Maria da Fé, Lenita Gentil ou Alexandra nas décadas de 1980 e 1990; 39 - Para Raquel Tavares;

58





AMÁLIA RODRIGUES Autor | Author ANNA MARAVILHAS / 1958 Colecção | Collection Museu Nacional do Teatro / Instituto dos Museus e da Conservação

Quando se inicia o seu apogeu internacional, Amália Rodrigues escolhe este vestido para se apresentar em digressão por diversos países, com destaque para os seus espectáculos no México, no final da década de 1950. When she started out on her international apogee, Amália Rodrigues chose this dress to wear on tour in a number of countries, primarily for her shows in Mexico, at the end of the 1950’s.



AMÁLIA RODRIGUES Autor | Author ANNA MARAVILHAS / 1963 Colecção | Collection Museu Nacional do Teatro / Instituto dos Museus e da Conservação

Vestido curto de veludo com aplicação de penas que Amália Rodrigues escolheu como traje para diversas situações que não as de actuação. Short velvet dress with the application of feathers that Amália Rodrigues chose to wear in a number of situations where she was not performing.


AMÁLIA RODRIGUES Autor | Author ANNA MARAVILHAS / 1968 Colecção | Collection Museu Nacional do Teatro / Instituto dos Museus e da Conservação Vestido e xaile usado nas apresentações de Amália Rodrigues em Nova Iorque e Hollywood, em 1968. A fadista usava-os na parte dos espectáculos onde cantava temas de folclore. Dress and shawl worn in Amália Rodrigues’ presentations in New York and Hollywood, in 1968. The singer wore them in the part of her shows where she sang folkloric songs.


AMÁLIA RODRIGUES Autor | Author ANNA MARAVILHAS / 1968 Colecção | Collection Museu Nacional do Teatro / Instituto dos Museus e da Conservação Vestido de actuação de Amália Rodrigues. Modelo de vestido negro longo, com aplicação de strass nas mangas, usado em diversos espectáculos da fadista no final da década de 1960 e na seguinte. One of Amália Rodrigues’ show dresses. A long black dress, with rhinestone applications on the sleeves, worn in a number of the singer’s shows at the end of the 1960’s and later.


AMÁLIA RODRIGUES Autor | Author MARIA-THEREZA MIMOSO / 1965 Colecção | Collection Museu Nacional do Teatro / Instituto dos Museus e da Conservação Vestido em seda lavrada com capa triangular do mesmo material que Amália Rodrigues usou em diversas actuações emblemáticas, como as realizadas no Olympia de Paris na década de 1960 que a consagraram em França. Dress in worked silk with a triangular cape of the same material that Amália Rodrigues wore in a number of emblematic performances, such as those in the Paris Olympia in the 1960’s that made her name in France.


AMÁLIA RODRIGUES Autor | Author MARIA-THEREZA MIMOSO / 1963 Colecção | Collection Museu Nacional do Teatro / Instituto dos Museus e da Conservação Vestido de cetim preto com barra formando riscas em veludo preto, de efeito de tecelagem, acompanhado por xaile franjado do mesmo material e cor, que Amália Rodrigues utilizou para um concerto em Beirute, no Líbano. Black satin dress with a hem forming stripes in velvet black, giving a woven effect, accompanied by a fringed shawl of the same material and colour, which Amália Rodrigues wore for a concert in Beirut, in Lebanon.


AMÁLIA RODRIGUES Autor | Author MARIA-THEREZA MIMOSO s/d Colecção | Collection Museu Nacional do Teatro / Instituto dos Museus e da Conservação Vestido negro com xaile, ambos com aplicações de vidrilhos, inspirado nos vestidos de noiva minhotos. Com este modelo Amália Rodrigues apresentou-se em palco por diversas vezes nas décadas de 1960 e 70. Dress black with shawl, both with glass bead applications, inspired by the wedding dresses of the Minho region. Amália Rodrigues went on stage with this model a number of times in the 1960’s and 70’s.


AMÁLIA RODRIGUES Autor | Author ILDA ALEIXO / 1967-68 Colecção | Collection Fundação Amália Rodrigues

Amália Rodrigues usou este vestido e manto tipo poncho em diversas actuações. Um dos espectáculos em que a fadista se apresentou com este modelo realizou-se em Tiel, na Holanda, em 1988. Amália Rodrigues wore this dress and poncho-type cloak in a number of performances. One of the shows in which the singer wore this model was in Tiel, in Holland, in 1988.


AMÁLIA RODRIGUES Autor | Author ILDA ALEIXO / 1971 Colecção | Collection Fundação Amália Rodrigues

Vestido e xaile verde escolhido por Amália Rodrigues para o espectáculo que a fadista apresentou em Luanda, no Cinema Restauração, a 11 de Agosto de 1971. Green dress and shawl chosen by Amália Rodrigues for the show that the singer presented in Luanda, in the Cinema Restauração, on 11 August 1971.


AMÁLIA RODRIGUES Autor | Author ILDA ALEIXO / 1980 Colecção | Collection Fundação Amália Rodrigues

Usando este vestido azul, Amália Rodrigues recebeu a Medalha de Ouro da Cidade de Lisboa, entregue pelo Presidente da Câmara no seu espectáculo no São Luiz Teatro Municipal, a 7 de Julho de 1980. Wearing this blue dress, Amália Rodrigues received the Gold Medal of the City of Lisbon, awarded by the Mayor in her show in the São Luiz Municipal Theatre on 7 July 1980.


AMÁLIA RODRIGUES Autor | Author ILDA ALEIXO / 1988 Colecção | Collection Fundação Amália Rodrigues

Vestido negro com folhos coloridos e écharpe que Amália Rodrigues usou na segunda parte do seu concerto no Olympia de Paris, a 7 de Maio de 1989. Black dress with coloured flounces and a scarf that Amália Rodrigues wore in the second part of her concert in the Paris Olympia on 7 May 1989.


AMÁLIA RODRIGUES Autor | Author ILDA ALEIXO / 1989 Colecção | Collection Fundação Amália Rodrigues

Este vestido negro com folhos e xaile foi escolhido para as apresentações de Amália Rodrigues em diversas ocasiões, com destaque para os espectáculos que a fadista realizou no Olympia de Paris, em 1989, no Grand Théâtre do Luxemburgo e na Tunísia, no início da década de 1990. This black dress with flounces and shawl was chosen for Amália Rodrigues’ presentations on various occasions, particularly for the shows that she gave in the Paris Olympia, in 1989, in the Grand Théâtre in Luxembourg and in Tunisia, at the start of the 1990’s.


AMÁLIA RODRIGUES Autor | Author ILDA ALEIXO / 1989 Colecção | Collection Fundação Amália Rodrigues

Amália Rodrigues escolheu este coordenado de saia e blusa castanha em seda para se apresentar no concerto no Royal Theater Carré, em Amesterdão, em Outubro de 1989. Amália Rodrigues chose this combination of a brown silk skirt and blouse to go on stage in the concert in the Royal Theater Carré, in Amesterdam, in October 1989.


AMÁLIA RODRIGUES Autor | Author ILDA ALEIXO / 1985 Colecção | Collection Fundação Amália Rodrigues

Amália escolheu este coordenado negro com estampado de veludo e lurex para o espectáculo no Olympia de Paris, a 3 de Maio de 1985. Amália chose this black combination with a velvet and lurex print for her show in the Paris Olympia on 3 May 1985.


AMÁLIA RODRIGUES

s/d Colecção | Collection Fundação Amália Rodrigues

Amália Rodrigues utilizou este vestido estilo balandrau para diversas recepções, em sua casa ou nos camarins dos espectáculos das digressões. Amália Rodrigues wore this balandrau style dress for a number of receptions in her home or in the dressing-rooms of her shows when on tour.


AMÁLIA RODRIGUES

/ 1970 Colecção | Collection Fundação Amália Rodrigues

Balandrau negro de bolas brancas usado por Amália Rodrigues para receber os agradecimentos no seu camarim, após os espectáculos. A fadista usou-o quando se apresentou no Japão. Black balandrau with white circles worn by Amália Rodrigues to receive fans in her dressing-room after her shows. The singer wore it when she performed in Japan.


AMÁLIA RODRIGUES Autor | Author ILDA ALEIXO / Década de 1980 Colecção | Collection Fundação Amália Rodrigues

Em sua casa ou a receber convidados nos camarins dos seus espectáculos, Amália Rodrigues utilizou por diversas vezes este balandrau. In her home or when receiving guests in her dressing-rooms at her shows, Amália Rodrigues wore this tunic (balandrau).


AMÁLIA RODRIGUES Autor | Author PINTO DE CAMPOS / 1944 Colecção | Collection Museu Nacional do Teatro / Instituto dos Museus e da Conservação Traje de cena composto por vestido, avental e xaile usado por Amália Rodrigues na revista Numa Aldeia Portuguesa, apresentado no Casino de Copacabana, no Rio de Janeiro. Stage dress comprising a coat, skirt and two aprons worn by Amália Rodrigues in the revue Numa Aldeia Portuguesa, presented in Copacabana Casino, in Rio de Janeiro.



AMÁLIA RODRIGUES Autor | Author PINTO DE CAMPOS / 1944 Colecção | Collection Museu Nacional do Teatro / Instituto dos Museus e da Conservação Traje de cena composto por casaco, saia e dois aventais usado por Amália Rodrigues na revista Numa Aldeia Portuguesa, apresentado no Casino de Copacabana, no Rio de Janeiro. Stage dress comprising a dress, apron and shawl worn by Amália Rodrigues in the revue Numa Aldeia Portuguesa, presented in Copacabana Casino, in Rio de Janeiro.


AMÁLIA RODRIGUES Autor | Author PINTO DE CAMPOS / 1946 Colecção | Collection Museu Nacional do Teatro / Instituto dos Museus e da Conservação Traje de cena usado por Amália Rodrigues na opereta Mouraria, no Teatro Apolo. Stage dress worn by Amália Rodrigues in the operetta Mouraria, in the Apolo Theatre.


ANITA GUERREIRO

/ 1954 Colecção | Collection Museu do Fado

Figurino usado por Anita Guerreiro na interpretação do quadro musical Fui ao Baile. A daring outfit by Anita Guerreiro in an interpretation of the musical sketch Fui ao Baile.


AMÁLIA RODRIGUES Autor | Author PINTO DE CAMPOS / 1966 Colecção | Collection Museu Nacional do Teatro / Instituto dos Museus e da Conservação Amália Rodrigues pediu a Pinto de Campos para desenhar um vestido inspirado em motivos regionais, para se apresentar na primeira parte do concerto de 1966, no Lincoln Center, em Nova Iorque, onde interpretava temas de folclore acompanhada por orquestra. Amália Rodrigues asked Pinto de Campos to design a dress inspired by regional motifs for her to wear in the first part of her 1966 concert in the Lincoln Center, in New York, where she sang folkloric songs accompanied by an orchestra.


ALEXANDRA Réplica

Autor | Author PINTO DE CAMPOS / 1999 Colecção | Collection Teatro Politeama

Alexandra utilizou esta réplica do figurino de Pinto de Campos, criado para Amália Rodrigues, na sua interpretação do papel da fadista no Musical Amália, de Filipe La Féria.

Alexandra used this replica of Pinto de Campos’ outfit, created for Amália Rodrigues, in her interpretation of the role of the Fado singer in the Musical Amália, by Filipe La Féria.



RAQUEL TAVARES Autor | Author TIAGO CARDOSO / 2008 Colecção | Collection Raquel Tavares

Este coordenado composto por blusa, saia e corpete interpreta a iconografia da Severa, umas das figuras mais emblemáticas da história do Fado, e foi criado para a fadista usar na promoção e espectáculos de apresentação do disco Bairro. This combination comprising a blouse, skirt and corselet interprets the iconography of Severa, one of the most emblematic figures in the history of Fado, and was created for the Fado singer to wear in the promotion and shows to present her album Bairro.



RAQUEL TAVARES Autor | Author TIAGO CARDOSO / 2008 Colecção | Collection Raquel Tavares

Este coordenado composto por blusa, saia, saiote e colete interpreta a iconografia da Severa, umas das figuras mais emblemáticas da história do Fado, e foi criado para a fadista usar na promoção e espectáculos de apresentação do disco Bairro. This combination comprising a blouse, skirt, petticoat and waistcoat interprets the iconography of Severa, one of the most emblematic figures in the history of Fado, and was created for the Fado singer to wear in the promotion and shows to present her album Bairro.



MARIA DA FÉ

/ 1977 Colecção | Collection Museu do Fado

Durante a década de 1970, Maria da Fé apresentou-se com este vestido com aplicação de franjas em diversas actuações, das quais se destacam os espectáculos realizados no Casino Estoril. During the 1970’s, Maria da Fé performed with this dress with the application of fringes in a number of shows, some of the main ones being held in Estoril Casino.


MARIA DA FÉ Autor | Author AUGUSTUS / 1987 Colecção | Collection Maria da Fé

Com este coordenado composto por saia e blusa de lantejoulas a fadista Maria da Fé apresentou-se em diversos espaços, com especial destaque para a actuação no emblemático Canecão do Rio de Janeiro, no Brasil, em 1987. With this combination comprising a skirt and blouse with sequins the singer Maria da Fé performed at a number of venues, with special note for her performance in the emblematic Canecão in Rio de Janeiro, in Brazil, in 1987.


MARIA DA FÉ Autor | Author JOSÉ MANUEL COSTA REIS / 1984 Colecção | Collection Maria da Fé

Maria da Fé escolheu este vestido com aplicações de strass para usar na sua digressão por várias cidades brasileiras, no programa da “Ponte Cultural” entre Brasil e Portugal, em 1984. Maria da Fé chose this dress with rhinestone applications to wear on her tour of a number of Brazilian cities, on the “Ponte Cultural” program between Brazil and Portugal, in 1984.


MARIA DA FÉ Autor | Author AUGUSTUS / 1987 Colecção | Collection Maria da Fé

Quando Maria da Fé realizou o concerto no Coliseu dos Recreios, em 1987, seleccionou este coordenado composto por saia e camisola em veludo preto e dourado para uma das partes do espectáculo. When Maria da Fé performed a concert in the Coliseu dos Recreios in 1987, she chose this combination comprising a skirt and top in black and gold velvet for one of the parts of the show.


ALEXANDRA Autor | Author JOSÉ CARLOS / 1994 Colecção | Collection Maria de Fé Alexandra adquiriu esta peça no desfile que José Carlos apresentou na FIL, sob a temática “Lisboa, Hábitos e Tradições”. Este vestido preto em veludo e tule com aplicações de missangas e canutilhos, que simboliza os candeeiros de Lisboa, foi utilizado pela fadista no Festival RTP da Canção de 1994. Alexandra bought this item in the fashion show that José Carlos presented in the Lisbon International Trade Fair (FIL), on the theme “Lisbon, Habits and Traditions”. This black dress in velvet and tulle with applications of glass beads and trimming, symbolising the street lamps of Lisbon, was worn by the singer in the RTP Song Festival of 1994.


LENITA GENTIL Autor | Author PAULO MATOS / 1997 Colecção | Collection Lenita Gentil Lenita Gentil adquiriu este vestido em seda e renda com aplicação de missangas e canutilhos para uma tournée de concertos na Europa, em 1997. A fadista usou-o em espectáculos no Bobino e no Palais des Congrès, em Paris, no Théâtre Saint-Michel, em Bruxelas, e no Casino de Oostende, na Bélgica. Lenita Gentil bought this dress in silk and lace with applications of glass beads and trimming for a tour of concerts in Europe in 1997. The singer wore it in shows in the Bobino and in the Palais des Congrès in Paris, in the Théâtre Saint-Michel in Brussels, and in Oostende Casino in Belgium.


ANA SOFIA VARELA Autor | Author STORYTAILORS / 2009 Colecção | Collection Ana Sofia Varela

Vestido em cetim com aplicação de strass usado no primeiro espectáculo de apresentação do seu segundo disco, Fados de Amor e Pecado, que se realizou no CCB, em Outubro de 2009. Dress in satin with rhinestone applications worn in the first show to present her second album, Fados de Amor e Pecado, which was held in the CCB, in October 2009.


MAFALDA ARNAUTH Autor | Author NUNO BALTAZAR / 2008 Colecção | Collection Mafalda Arnauth Este coordenado, composto por blusa e saia em tafetá, faixa em seda e saiote em tule, integra uma colecção de trajes de cena que Nuno Baltazar criou para o lançamento do disco Flor de Fado. Mafalda Arnauth usou-o em tournée e no primeiro episódio do remake da telenovela Vila Faia, onde interpreta o tema do genérico. This combination, comprising a blouse and skirt in taffeta, sash in silk and petticoat in tulle, is part of a collection of stage costumes that Nuno Baltazar created for the launch of the record Flor deFado. Mafalda Arnauth wore it on tour in the first episode of the remake of the TV series Vila Faia, where she sings the title music.


KATIA GUERREIRO Autor | Author CARLOS GIL / 2010 Colecção | Collection Katia Guerreiro

Vestido em cetim e tule com flor negra usado no Coliseu dos Recreios, em Novembro de 2010. A fadista apresentou-se pela primeira vez, num concerto em nome próprio, neste espaço, para a celebração dos seus 10 anos de carreira. Dress in satin and tulle with a black flower worn in the Coliseu dos Recreios, in November 2010. The Fado singer was singing for the first time in a concert under her own name at this venue to celebrate 10 years of her career.



KATIA GUERREIRO Autor | Author FILIPE FAÍSCA / 2011 Colecção | Collection Katia Guerreiro

Coordenado composto por blusa, saia de folhos e corpete concebido para o concerto de Katia Guerreiro no Olympia de Paris, em Janeiro de 2012. Com a sala mais emblemática da capital francesa cheia, este espectáculo foi mais um marco na consagração internacional da fadista. Combination comprising a blouse, skirt with flounces and corselet designed for the Katia Guerreiro’s concert in the Paris Olympia, in January 2012. With the most emblematic concert hall of the French capital full, this show was yet another milestone in the international recognition of the singer.


CUCA ROSETA Autor | Author RICARDO PRETO / 2011 Colecção | Collection Cuca Roseta

Vestido criado para o primeiro espectáculo internacional de Cuca Roseta, após a edição do seu primeiro disco, em 2011. A fadista utilizou-o no 1º Festival de Fado de Madrid, realizado no Teatro del Canal, em Junho do mesmo ano. Dress created for Cuca Roseta’s first international show, after the launch of her first record, in 2011. The singer wore it in the 1st Fado Festival of Madrid, held in the Teatro del Canal, in June of the same year.


MARIZA Autor | Author JOÃO RÔLO / 2001 Colecção | Collection Mariza

Saia preta com aplicações azuis e corpete azul turquesa. A fadista vestiu este coordenado na primeira tournée do seu primeiro disco – Fado em Mim. Black skirt with blue applications and turquoise blue corselet. The singer wore this combination on the first tour of her first album – Fado em Mim.



MARIZA Autor | Author JOÃO RÔLO s/d Colecção | Collection Mariza

Vestido com corpo plissado, folho na bainha e aplicações de missangas e lantejoulas. Mariza usou este vestido numa das primeiras actuações com Carlos do Carmo. Dress with pleated body, flounce at the hem and applications of beads and sequins. Mariza wore this dress at one of the first performances with Carlos do Carmo.


MARIZA Autor | Author JOÃO RÔLO / 2007 Colecção | Collection Mariza

Coordenado composto por vestido e bolero usado na interpretação do tema Meu Fado (Paulo de Carvalho), no filme Fados, realizado por Carlos Saura. Combination comprising dress and bolero worn in the interpretation of the song Meu Fado (Paulo de Carvalho), in the film Fados, directed by Carlos Saura.



MARIZA Autor | Author JOÃO RÔLO / 2008 Colecção | Collection Mariza

Saia comprida com aplicações de tule; blusão preto com fecho (Patrizia Pepe). Coordenado usado aquando do lançamento do disco Terra. Long skirt with tulle applications, black jacket with zipper (Patrizia Pepe). Combination wore at the launch of the record Terra.



MARIZA Autor | Author JOSÉ ANTÓNIO TENENTE / 2007 Colecção | Collection Mariza

Este coordenado, composto por camisola em malha de viscose e saia rodada em seda lavrada com aplicação de fitas de veludo, foi usado por Mariza na interpretação do tema Transparente (Paulo Abreu Lima, Rui Veloso), no filme Fados, realizado por Carlos Saura. This combination, comprising a knitted viscose top and flared skirt in figured silk with applications of velvet strips, was worn by Mariza in the interpretation of the song Transparente (Paulo Abreu Lima, Rui Veloso), in the film Fados, directed by Carlos Saura.



ANA MOURA Autor | Author BRUNO S. VICENTE / 2010 Colecção | Collection Ana Moura

Vestido de lantejoulas criado para a tournée internacional de promoção do disco Leva-me aos Fados. A fadista usou-o no concerto da Union Chapel de Londres, a 4 de Novembro de 2010. Dress with sequins created for the international tour to promote the album Leva-me aos Fados. The singer wore it in the concert in the Union Chapel in London, on 4 November 2010.



ANA MOURA Autor | Author JOSÉ ANTÓNIO TENENTE / 2008 Colecção | Collection Ana Moura

Ana Moura apresentou-se com este vestido em seda bordada a lantejoulas e missangas no concerto no Coliseu dos Recreios (posteriormente editado em DVD) e no espectáculo no Concertgebouw, Amesterdão, ambos em Junho de 2008. Ana Moura wore this dress in silk embroidered with sequins and beads in the concert in the Coliseu dos Recreios (subsequently released on DVD) and in the show at the Concertgebouw, Amesterdam, both in June 2008.


ANA MOURA Autor | Author JOÃO RÔLO s/d Colecção | Collection Ana Moura

Vestido em seda com aplicação de missangas e lantejoulas. Dress in silk with application of beads and sequins.


ANA MOURA Autor | Author FÁTIMA LOPES s/d Colecção | Collection Ana Moura

Vestido em malha com fio de lurex. Dress in knitted lurex thread.


MÍSIA Autor | Author SYBILLA / 1998 Colecção | Collection Mísia

Primeiro vestido que Mísia comprou à estilista espanhola. A fadista usou este vestido de mangas de morcego com recorte debaixo dos braços nas fotografias do booklet e da tournée do seu disco Garras dos Sentidos, editado em 1998.

This is the first dress that Mísia bought from the Spanish fashion designer. The singer wore this bat sleeve dress with cutaways under the arms in the photographs for the tour booklet for her album Garras dos Sentidos, released in 1998.


MÍSIA Autor | Author SYBILLA / 1999 Colecção | Collection Mísia

Mísia usou esta capa para o primeiro tema em palco da tournée do seu 5º disco, Paixões Diagonais, de 1999. Um dos espectáculos mais emblemáticos foi o que realizou no Olympia em Paris. Mísia wore this cape for the first song on stage of the tour for her fifth album, Paixões Diagonais, in 1999. One of the most notable shows was in the Paris Olympia.


MÍSIA Autor | Author TÓ FIGUEIRAS / 1990 Colecção | Collection Mísia

Vestido com flores aplicadas feito especialmente para Mísia. Com ele desfilou nas Manobras de Maio no Largo do Século, em Lisboa. Mais tarde usou-o para a sessão fotográfica do booklet do álbum Canto, editado em 2003. Dress with flower applications made especially for Mísia. She wore it at the Manobras de Maio fashion show in the Largo do Século, in Lisbon. She wore it later on for the photo shoot for the booklet of the album Canto, released in 2003.



MÍSIA Autor | Author ANA SALAZAR / 2004 Colecção | Collection Mísia

Modelo criado para Mísia. Foi usado pela primeira vez na Embaixada Portuguesa em Paris, por ocasião da cerimónia de entrega da condecoração Chevalier des Arts et des Lettres de França. Model created for Mísia. It was worn for the first time in the Portuguese Embassy in Paris on the occasion of the award ceremony of the Chevalier des Arts et des Lettres decoration of France.


PAULO BRAGANÇA

/ 1998 Colecção | Collection Paulo Bragança

Fato e xaile costumizados pelo próprio, usados no concerto de inauguração do Museu do Fado. Suit and shawl that he customised himself, worn in the concert for the inauguration of the Fado Museum.


ALDINA DUARTE Autor | Author FILIPE FAÍSCA / 2011 Colecção | Collection Aldina Duarte

Coordenado composto por blusa e saia com efeito plissado criado para o concerto de apresentação do álbum Contos de Fados, na Culturgest, em Lisboa, a 29 de Novembro de 2011. Combination comprising a blouse and skirt with a pleated effect created for the concert to present her album Contos de Fados, in the Culturgest, in Lisbon, on 29 November 2011.


ALDINA DUARTE Autor | Author MARIA DE LURDES OLIVEIRA / 2009 Colecção | Collection Aldina Duarte

Para a apresentação do disco Mulheres ao Espelho, Aldina Duarte usou este vestido confeccionado pela sua própria mãe. Estreou-o no concerto de 22 de Abril de 2009, na Culturgest, em Lisboa. For the presentation of the album Mulheres ao Espelho, Aldina Duarte wore this dress made by her own mother. She wore it for the first time in concert on 22 April 2009, in the Culturgest, in Lisbon.


CRISTINA BRANCO Autor | Author LUÍS BUCHINHO / 2006 Colecção | Collection Cristina Branco

Vestido com mangas recortadas, primeira peça de Luís Buchinho que Cristina Branco usou e que estreou no espectáculo da Casa da Música, no Porto, em Outubro de 2006. Dress with cutaway sleeves, the first item by Luís Buchinho that Cristina Branco wore and which she débuted in the show at the Casa da Música, in Porto, in October 2006.


CRISTINA BRANCO Autor | Author LUÍS BUCHINHO / 2007 Colecção | Collection Cristina Branco

Coordenado de casaco, calças e blusa de efeito plissado que a fadista usou na recepção oferecida pela Rainha holandesa, em 2007. A blusa foi novamente usada nas imagens de promoção do disco Não há só tangos em Paris, editado em 2011. Combination of a coat, trousers and blouse with a pleated effect that the singer wore in the reception offered by the Queen of Holland in 2007. The blouse was worn again in the images used to promote her album Não há só tangos em Paris, released in 2011.


CRISTINA BRANCO Autor | Author LUÍS BUCHINHO / 2011 Colecção | Collection Cristina Branco

No videoclip e fotos promocionais do álbum Não há só tangos em Paris, Cristina Branco apareceu com este vestido de bainha assimétrica e gola em pele. A fadista usou-o ainda no concerto de início da tournée, no São Luiz Teatro Municipal, a 31 de Março de 2011. In the video clip and photos to promote her album Não há só tangos em Paris, Cristina Branco appeared with this dress with an asymmetrical hem and neckline in leather. The singer also wore it in the concert to start her tour in the São Luiz Teatro Municipal, on 31 March 2011.



CARMINHO Autor | Author NUNO BALTAZAR / 2011 Colecção | Collection Carminho

Carminho escolheu este vestido em seda revestida a tule para a sua primeira actuação num grande palco internacional, o Kings Place, no Songlines Encounters Festival, Londres, Junho de 2011. Carminho chose this dress in silk lined with tulle for her first performance on a major international stage, the Kings Place, in the Songlines Encounters Festival, London in June 2011.



CARMINHO Autor | Author NUNO BALTAZAR / 2012 Colecção | Collection Carminho

Vestido em seda com jogos gráficos que a fadista usou no concerto do Tenor José Carreras, realizado em Junho de 2012, onde foi convidada especial. Dress in silk with graphic designs that the singer wore in the concert of the Tenor José Carreras, held in June 2012, where she was a special guest.


CARMINHO Autor | Author ALEKSANDAR PROTIC / 2012 Colecção | Collection Aleksandar Protic

Vestido em linho com pespontos que a fadista usou na imagem da capa do segundo trabalho discográfico de Carminho, Alma, editado em 2012. Linen dress with backstitching that the singer wore on the album cover for her second album, Alma, released in 2012.


CARMINHO Autor | Author LIDIJA KOLOVRAT / 2012 Colecção | Collection Carminho

Vestido em pele recortada que a fadista usou para a gravação do seu concerto ao vivo no Lux Frágil, realizado por João Botelho e incluído em DVD na edição especial do álbum Alma. Dress in trimmed leather that the singer wore to record her live concert in Lux Frágil, directed by João Botelho and included on DVD in the special edition of the album Alma.



AMÁLIA RODRIGUES

s/d Colecção | Collection Museu Nacional do Teatro / Instituto dos Museus e da Conservação Xaile de fio de seda preto feito em tafetá, em chiffon preto com franjas de seda. Shawl of black silk thread made in taffeta, in black chiffon with silk fringes.



MARIA ALICE

s/d Colecção | Collection Museu do Fado

Manton quadrangular de seda pérola bordado motivos florais e vegetalistas. A carreira de Maria Alice iniciou-se em 1928 e teve marcos importantes na apresentação regular em retiros e casas de fado, em espectáculos por todo o país e, também, no Brasil. Quadrangular pearl silk manton with embroidered floral and vegetal motifs. Maria Alice’s career started in 1928 with important landmarks with the regular presentation in private venues and Fado houses, in shows all over Portugal and also in Brazil.


MARIA AMÉLIA PROENÇA

s/d Colecção | Collection Museu do Fado Manton triangular de seda bege, bordado a ponto cheio com grandes motivos florais e vegetalistas. Com mais de 60 anos de carreira e ainda no activo, Maria Amélia Proença actuou nas mais emblemáticas casas de fado de Lisboa e participou em inúmeros espectáculos nacionais e internacionais. Triangular manton in beige silk, with full point embroidery and with large floral and vegetal motifs. With a career of over 60 years and still working, Maria Amélia Proença performed in the most emblematic Fado houses in Lisbon and performed in countless national and international shows.


MÁRCIA CONDESSA

s/d Colecção | Collection Museu do Fado Xaile negro da fadista que abriu, no nº 38 da Praça da Alegria, a sua casa de fados, ponto de referência até meados da década de 1970. The singer’s black shawl. She opened her Fado house in no. 38 Praça da Alegria, and which was a point of reference up to the mid 1970’s.


LUCÍLIA DO CARMO

s/d Colecção | Collection Museu do Fado

Xaile negro de Lucília do Carmo. A fadista actuou nas mais destacadas casas de fado de Lisboa e em espectáculos de norte a sul de Portugal, nas colónias e no Brasil, até que, em 1947, passou a actuar maioritariamente na sua própria casa de fado – A Adega da Lucília, no Bairro Alto, actual Faia. A black shawl belonging to Lucília do Carmo. The singer performed in Lisbon’s foremost Fado houses and in shows from north to the south of Portugal, in the colonies and in Brazil, until, in 1947, he started to sing mostly in her own Fado house – A Adega da Lucília, now called Faia, in the Bairro Alto.



HERMÍNIA SILVA Autor | Author JUAN SOUTULLO / 1999 Colecção | Collection Museu do Fado Juan Soutullo criou esta réplica de um xaile utilizado por Hermínia Silva, para a exposição O Xaile Contado e Cantado, realizada no Museu do Fado, em 1999. Hermínia Silva é uma das figuras de referência do Fado, com um percurso muito ligado ao teatro de revista e à sua própria casa de fados – o Solar da Hermínia. Juan Soutullo created this replica of a shawl worn by Hermínia Silva for the exhibition O Xaile Contado e Cantado, put on in the Fado Museum, in 1999. Hermínia Silva is one of Fado’s leading figures, with a career that was closely linked to the vaudeville shows and to her own Fadohouse – the Solar da Hermínia.


ANA MOURA

s/d Colecção | Collection Ana Moura

Ana Moura usou este xaile nas imagens promocionais, no booklet e na tournée do disco Para Além da Saudade, editado em 2007. Ana Moura wore this shawl in the promotional images in the booklet and on the tour of her album Para Além da Saudade, released in 2007.



ALFREDO MARCENEIRO

s/d Colecção | Collection Museu do Fado

A boina e o cachené são parte integrante da imagem de marca de Alfredo Marceneiro, que ficou registada num dos seus discos de maior sucesso, The Fabulous Marceneiro. Com uma carreira que durou mais de 7 décadas, é um dos nomes mais destacados do universo fadista. The cap and neckerchief are an integral part of Alfredo Marceneiro’s brand image, which became recorded on one of his most successful albums, The Fabulous Marceneiro. With a career that lasted over 7 decades, he is one of the most outstanding names in the universe of Fado.


RICARDO RIBEIRO

s/d Colecção | Collection Ricardo Ribeiro

Lenço de Ricardo Ribeiro, um dos mais destacados valores da mais jovem geração de fadistas. As suas interpretações têm grande influência dos moldes tradicionais e, no seu traje de actuação, o fadista retoma a utilização do lenço. A scarf belonging to Ricardo Ribeiro, one of the most outstanding assets of the younger generation of Fado singers. His interpretations were greatly influenced by traditional styles and for his stage attire the singer took up wearing a scarf again.


RAQUEL TAVARES Autor | Author TIAGO CARDOSO / 2007 Colecção | Collection Raquel Tavares Chinelas utilizadas nas imagens promocionais e em actuações do disco Bairro, editado em 2008. Para a apresentação deste álbum, Raquel Tavares usa os modelos de Tiago Cardoso tendo como referência a iconografia associada à Severa, figura emblemática da história do Fado. Slippers worn in the promotional images and in performances for her album Bairro, released in 2008. For the presentation of this album, Raquel Tavares wore models by Tiago Cardoso using the iconography associated to Severa, an emblematic figure in the history of Fado, as a reference.



ANA MOURA s/d Pulseiras de prata Silver bracelets

RODRIGO Autor | Author FRED / 1981 Fio de ouro com medalhão de Cristo em ouro e diamantes. Peça única comprada no Mónaco. Gold cord with Christ medallion in gold and diamonds. Unique piece purchased in Monaco.


JOANA AMENDOEIRA Autor | Author MANUEL DE FREITAS s/d Brincos de prata desenhados para a fadista. Silver earrings designed for the Fado singer.



Projecto Museogrรกfico Exhibition Design ANTร NIO VIANA








Com Esta Voz me Visto. O Fado e a Moda I Wear my Voice on My Sleeve. Fado and Fashion EXPOSIÇÃO | EXHIBITION Comissariado e Coordenação | Curatorship and Coordination Bárbara Coutinho, Sara Pereira Produção Executiva | Executive Production Anabela Becho, Sofia Bicho Projecto Museográfico | Exhibition Design António Viana

Assistente | Assistant Miguel Costa

Comunicação | Communication Graça Rodrigues, Rita Oliveira Design Gráfico | Graphic Design Luís Carvalhal Apoio à Produção | Production Support Cristina Duarte, Maria de Lurdes Sales Baptista, Pedro Rosa, Pedro Munoz Conservação | Conservation Ana Gonçalves, Joana Lia Ferreira post-doc FCT, Susana França de Sá post-doc FCT, Susana Costa Construção | Construction J. C. Sampaio, Lda. Execução Gráfica | Graphic Execution Logotexto Transportes | Transport IterArtis Tradução | Translation Mark Cain

AGRADECIMENTOS | KNOWLEDGMENTS Aldina Duarte, Aleksandar Protic, Alexandra, Álvaro Covões, Ana Geraldo, Ana Moura, Ana Salazar, Ana Sofia Varela, Anita Guerreiro, Augusto Brázio, Augustus, Bruno S. Vicente, Carlos Gil, C. B. Aragão, Carminho, Cristina Branco, Cuca Roseta, Estrela Carvas, Fátima Lopes, Filipe Faísca, Ivan Dias, Joana Amendoeira, João Aguiar, João Pedro Ruela, João Rôlo, José António Tenente, José Carlos Alvarez, José Gaspar, José Frade, José Manuel Costa Reis, Jorge Simão, Katia Guerreiro, Lenita Gentil, Lidija Kolovrat, Luís Buchinho, Mafalda Arnauth, Manuel de Freitas, Maria Amélia Proença, Maria da Fé, Maria de Lurdes Oliveira, Maria – Thereza Mimoso, Mariza, Miguel Capucho, Mísia, Nuno Baltazar, Olga Carneiro, Paulo Bragança, Paulo Lisboa, Paulo Matos, Paulo Ochoa, Pedro Teotónio Pereira, Raquel Tavares, Ricardo Ribeiro, Ricardo Preto, Rodrigo, Rui Correia, Rui Maurício, Sandra Inácio, Storytailors, Suzana Cheong, Sybilla, Tiago Cardoso, Vasco Sacramento. Fundação Amália Rodrigues Museu Nacional do Teatro

160


CATÁLOGO | CATALOGUE Edição | Publication CML/MUDE e EGEAC/MUSEU DO FADO Coordenação editorial | Editorial coordination Bárbara Coutinho, Sara Pereira Produção Executiva | Executive Production Sofia Bicho Textos | Texts António Costa Bárbara Coutinho Sara Pereira Legendas | Labels Anabela Becho, Sofia Bicho Design Gráfico | Graphic Design Luís Carvalhal Tradução | Translation Mark Cain Fotografia | Photography Miguel Rodrigues - Voiture Maximum Luísa Ferreira - fotografias das páginas | photos on pages 64, 65, 67, 71, 72, 73, 102/103, 104, 106/107 Conservação I Conservation Anabela Becho, Joana Lia Ferreira post-doc FCT, Susana França de Sá doutoranda FCT Apoio à produção I Production support Pedro Rosa, Pedro Munhoz Impressão | Printing Gráfica Maiadouro 2ª Edição | 2nd Edition ISBN: 978-989-96629-7-1 Depósito Legal | Legal Deposit 353553/13 Janeiro | January 2013 MUDE Museu do Design e da Moda, Colecção Francisco Capelo Rua Augusta, 24, 1100 – 053 Lisboa, Portugal T. + 351 218 886 117

mude@cm-lisboa.pt

MUSEU DO FADO Largo do Chafariz de Dentro nº 1, 1100-139 Lisboa, Portugal T. + 351 21 882 34 70

museudofado@egeac.pt www.museudofado.pt

www.mude.pt

161


FADO FADO

FADO

FADO

FADO

FADO

FADO

FAD

FADO

FADO


FADO FADO

FADO

FADO

FADO

FADO

FADO

FAD

FADO

FADO


PARCEIROS:


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.