Top Gear Portugal - Setembro 2017

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ASTON VALKYRIE

stou descalço no meio do estúdio de design da Aston Martin, a olhar por um buraco para dentro de uma cápsula escura. Tenho à minha volta a equipa de design, com o patrão Marek Reichmann sobre o meu ombro esquerdo, em silêncio e à espera que eu faça um número de contorcionismo para chegar ao banco do condutor. Estudo a hipótese “entrar de cabeça”, estilo Klinsmann, ou então com o rabo em primeiro lugar, e esperar que corra bem. Acabo por entrar com os pés, enquanto tento agarrar‑me a qualquer tipo de extremidade em carbono, para depois baixar‑me e adotar uma posição que não sentia desde que estive no dentista – pés acima das ancas, posição inclinada e boca aberta. O Valkyrie não é um carro de estrada com números dignos de um F1 – é um F1 com fato de estrada. Nem outra coisa seria de esperar do projeto nascido de uma das grandes mentes da F1, um titã do desporto, um homem com um conhecimento profundo da ciência das coisas rápidas. Estou no seu escritório na sede da Red Bull Racing. Uma parede envidraçada banha de luz a secretária e mesa de esboços, e vejo ali ao lado uma pilha de desenhos e cálculos diversos. Tenho a sensação que estou prestes a receber uma aula, mergulhado em complexidade de engenharia e revelado como o charlatão que sou, mas Adrian Newey – com calças de ganga e uma camisa – não segue essa via. Serve um copo de água e pergunta se pode contar‑me uma história. “A oportunidade surgiu em 2014. Senti que precisava de um desafio para além da Fórmula 1, e algo que sempre quis fazer, desde que era miúdo, era desenhar um carro de estrada. Enquanto renovava o meu contrato com a Red Bull, falei com Dietrich Mateschitz, o dono, e Christian Horner sobre essa ideia, e na pausa de agosto comecei a fazer uns esboços. Sentei‑me e pensei no que queríamos produzir visto que tínhamos a possibilidade de começar de raiz.” Adrian concentrou‑se em algo que seria “dócil” em estrada. “Se for apenas um carro de competição na estrada e mostrar isso na condução, será um fracasso.” Também teria de ser extremamente rápido e, portanto, pequeno, leve (Adrian considera o McLaren P1, o LaFerrari e o Porsche 918 “grandes, pesados e toscos”) e intimidador, como as supermotas mais rápidas. Também tinha de ser, nas suas próprias palavras, “uma obra de arte.” Diz‑me que uma cliente, uma senhora americana, está a desenhar a sua casa nova com o Valkyrie como atração principal. Depois, no inverno de 2014/2015, Newey começou a passar mais tempo na garagem. “Comecei, quase como passatempo de fim de semana, a desenhar a partir desses princípios básicos – a criar uma espécie de esboço técnico.” Reuniu então uma pequena equipa de colegas de confiança da Red Bull F1 que transformaram os esboços num modelo digital e começaram a acertar os aspetos mais técnicos do carro, como a suspensão ativa e a caixa personalizada de uma só embraiagem. Isso leva‑nos ao outono de 2015. Adrian tinha agora um protótipo inicial de desenvolvimento com capacidades mecânicas, incluindo as dimensões do habitáculo e o espaço para montar as “peças grandes”. “O protótipo tinha aspeto funcional, e a estimativa de peso apontava para 1.000 kg,” explica Newey. “A maior decisão passou a ser escolher um investidor privado ou fazer parceria com um fabricante. Estudadas as opções, a Aston Martin destacou‑se como o parceiro com a imagem certa. E como conhecíamos Andy Palmer dos seus tempos na Nissan/Infiniti, foi fácil decidir.” A Aston, soube depois, já estava a trabalhar num hipercarro, e tinha um modelo à escala no estúdio. “O carro deles eram maior, do tamanho de um LaFerrari, e o nosso era mais estreito e baixo. O nosso carro tinha, no que diz respeito ao aspeto, uma ligação clara ao Red Bull X1,” confessa Newey. E foi a proposta de Newey que prevaleceu. A Aston “alterou o design” – manteve todas as superfícies aerodinâmicas de Newey sob a linha de cintura e o estilo LMP1, mas modificou as partes pintadas. “Se vir o primeiro modelo de estilo que apresentámos, as partes verdes eram da Aston e o resto era nosso. Representou uma amálgama das nossas ideias com as deles, e desenvolvemos o carro a partir daí.”

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