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OBSERVAÇÃO

OBSERVAÇÃO

MEGAPROJECTOS RENDERAM AOS COFRES DO ESTADO QUASE 8 MIL MILHÕES MT NO PRIMEIRO TRIMESTRE ECONOMIA

Os megaprojectos a operarem no País contribuíram com 7,8 mil milhões de meticais em impostos de Janeiro a Março, contra 6 mil milhões de meticais registados no primeiro trimestre de 2020. O valor representa uma variação positiva de 29%. Segundos os dados da Autoridade Tributária de Moçambique (AT), da contribuição fiscal total dos megaprojectos canalizada para o Estado, o destaque vai para o sector de exploração de petróleo, que cresceu 10% em 2021, e cuja contribuição cresceu de 3,4 mil milhões de meticais, no primeiro trimestre de 2020, para pouco mais de 6 mil milhões de Janeiro a Março de 2021. Além da exploração de petróleo, a contribuição fiscal dos outros subsectores cresceu de 276,6 milhões de meticais para 292,3 milhões no período em análise. De acordo com dados da AT, os subsectores da exploração de recursos minerais e de energia contribuíram fiscalmente menos para os cofres estatais no primeiro trimestre de 2021. A exploração de recursos minerais rendeu ao Estado 794,4 milhões de meticais contra 829,4 milhões de registados no primeiro trimestre de 2020, uma redução de 4,2%. O subsector de produção de energia canalizou para o Estado 745,4 milhões em 2021, contra 1,5 mil milhões de Meticais em 2020, uma redução de 53%. A fonte refere que a receita total registada pelo Estado em 2021 foi de 59,8 mil milhões de meticais, contra 54,6 mil milhões no primeiro trimestre de 2020. Crescimento. O Produto Interno Bruto (PIB) de Moçambique voltou a crescer nos primeiros três meses deste ano: 0,12% face ao mesmo período de 2020, após três trimestres em queda. Segundo a recente publicação do INE, o ramo da agricultura foi o que teve maior representatividade (cerca de 1/4) na actividade económica, pelo que o seu crescimento de 4,8% contrabalançou a queda da indústria mineira, que recuou 18,02%. Além da agricultura e actividades relacionadas, destacam-se os serviços financeiros, as pescas e a aquacultura.

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Gestão. As empresas participadas pelo Estado passarão a contar com comissões especializadas, com vista à redução de risco de endividamento elevado e avaliação do investimento. De acordo com o Administrador do Instituto de Gestão das Participações do Estado (IGEPE), Raimundo Matule, a iniciativa decorre da implementação das inovações introduzidas no quadro da Lei sobre o Sector Empresarial do Estado (SEE), que, para além das empresas públicas, passou a integrar também as participadas. Em declarações prestadas recentemente, Matule explicou que, ao abrigo da nova lei, todas as empresas públicas passaram a ter a necessidade de prestação de contas ao accionista representado pelo IGEPE.

Correios. Já foi indicada uma comissão liquidatária que vai conduzir o processo de extinção da empresa Correios de Moçambique, disse recentemente Elias Chirindza, Secretário do Comité Sindical daquela empresa. Com um prazo de dois anos e meio (18 meses), a comissão tem a missão de fazer o levantamento de todo o património móvel e imóvel da empresa, avaliar os seus activos e preparar os processos de indemnização, reforma ou reintegração dos mais de 300 trabalhadores, distribuídos por todo o País. “A comissão de gestão que foi criada irá determinar quais trabalhadores que irão para a reforma e quantos serão indemnizados”, explicou Elias Chirindza.

Turismo. Cerca de 960 mil turistas entraram no País durante o ano passado, uma redução de 53% quando comparado com o ano de 2019, em que se registaram cerca de 2 milhões de visitantes. Em causa, estão os efeitos da pandemia do covid-19 relacionados com as medidas restritivas, revelou o director Nacional de Turismo, Cândido Langa. Apesar de o País estar a registar um relaxamento gradual das medidas restritivas contra o covid-19, a melhoria, neste sector também severamente afectado pela pandemia, é ainda prematura. Sobre o cenário turístico nos próximos meses,

Cândido Langa disse que só dependerá, obviamente, da melhoria da situação sanitária vigente.

Investimento. O Parque Industrial de Beluluane, no distrito de Boane, anunciou recentemente que vai investir nos próximos dez anos cerca de 100 milhões de dólares na criação de mais de 200 empresas que poderão gerar mais de 20 mil postos de trabalho. As mais de 200 empresas, tal como indicou o director-geral do parque, Onório Boane, poderão ser instaladas numa área remanescente de cerca de 400 hectares, onde o Parque Industrial detém um DUAT. O dirigente referiu que o Parque Industrial de Beluluane está projectado para se instalar, num futuro breve, em Moma, província de Nampula, onde ocorre a exploração de areias pesadas.

Exportações. O Porto de Nacala exportou menos 28% de carvão do que o previsto no primeiro trimestre deste ano devido ao impacto da pandemia na economia mundial. Segundo os dados divulgados em comunicado pela empresa Nacala Logistics, o embarque atingiu 1,1 milhões de toneladas contra 1,5 milhões de toneladas previstas, ou seja, uma diferença em relação ao planificado na ordem de 28%. Segundo Fábio Iwanaga, administrador financeiro da Nacala Logistics, “as operações nos dois negócios – carvão e carga geral – continuam a enfrentar desafios”.

Saúde. O Banco Africano de Desenvolvimento (BAD), através da Comunidade Para o Desenvolvimento da Africa Austral (SADC), colocou à disposição da Organização Mundial da Saúde (OMS) uma doação de 1,6 milhões de dólares para apoiar o Ministério da Saúde de Moçambique (MISAU) na resposta à pandemia do covid-19. O apoio visa contribuir para o fortalecimento da capacidade do MISAU no diagnóstico, no tratamento de casos e na protecção dos profissionais de saúde. Esta doação é composta, entre outros, pelos equipamentos sanitários, e que incluem ventiladores de UTI de adultos e pediátricos, com os seus respectivos assessórios, aparelhos para respiração assistida, etc.

EXTRACTIVAS

Carvão. A mineradora Vale Moçambique anunciou que vai antecipar a liquidação de uma dívida à banca de 2,5 mil milhões de dólares referente a investimentos no País para avançar com a venda do negócio de carvão. As empresas concessionárias do Corredor Logístico de Nacala já enviaram aos bancos envolvidos no ‘project finance’ uma nota “irrevogável” para liquidar o valor remanescente a 22 de Junho, anunciou a Vale, concluindo assim a aquisição da parte da japonesa Mitsui no empreendimento. O corredor logístico diz respeito a mais de mil quilómetros de linha férrea e ao Porto de Nacala, para a exportação do carvão extraído em Moatize, na província de Tete.

OPINIÃO

A Força Maior, breves considerandos

Henrique Calvão Martins • Tiago Arouca Mendes • HRA Advogados

Vão decorridos alguns lustres, desde que, no dealbar deste Milénio, Elísio Macamo, Professor de Sociologia e Estudos Africanos na Universidade de Basileia, chamava a atenção para a vulnerabilidade, em termos de Segurança, no norte de Moçambique, mormente na Província de Cabo Delgado – onde se vinha notando uma radicalização de jovens islâmicos, sonhando com o Califado –, fazendo, ele, sempre avultar que se, por um lado, tal problema era agravado pela distância de mais de 2600 km, entre a Capital daquela Província (Pemba) e a do País (Maputo), por outro lado insistia em que tal facto não tinha que ser uma fatalidade, dada a disponibilidade para ajudar Moçambique, oferecida por vários países estrangeiros. A socióloga Isabel Maria Casimiro, da Universidade Eduardo Mondlane, veio, depois, fazer eco da dita advertência premonitória do Professor Macamo, insistindo no perigo da sobredita radicalização. A situação manteve-se mais ou menos adormecida, até que, a partir de 2017, Jihadistas, ligados ao grupo Al-Shabat, atacaram o Quartel de Mocímboa da Praia e nele hastearam a sua bandeira, não sem antes terem feito carnificina, entre militares e civis. Nessa altura, o Bispo de Pemba, D. Luís Lisboa, vociferou estar a viver-se ali um preocupante silêncio, tendo tentado sensibilizar as Autoridades Moçambicanas e a Comunidade Internacional para o perigo que a população ali corria, perante tão destemidos e sangrentos ataques. Até que, em 24 de Março último, se dá o grande ataque a Palma, com elevada mortandade e destruição, a escassos 10 km de Afungi e do Recinto para Exploração do Gás Liquefeito do Norte de Moçambique, um megaprojecto – o maior Investimento Privado da África Subsaariana (superior a 20 mil milhões de dólares norte-americanos) -, que ali vinha envolvendo cerca de 3000 homens, levado a efeito pela petrolífera Total e cuja produção, como ansiosa alavanca para o desenvolvimento de Moçambique, estava previsto começar em 2024. Perante tão crescente insegurança e proximidade de real perigo a rondar as suas instalações, foi a vez de, volvida uma semana sobre tão devastador ataque, a Total anunciar a suspensão dos trabalhos (o andamento do Projecto do Gás em Afungi), invocando, como causa, a situação de força maior (“Force Majeure”). Repisa-se o facto de a porta- voz da Total (Anastasia Zhivulina) ter salientado que “suspender”... não é “abandonar” o Projecto: que ele será retomado, logo que garantida uma segurança consolidada!... A importância deste megaprojecto é facilmente mensurável, tendo em conta que só o investimento necessário para a sua implementação é superior ao Produto Interno Bruto Moçambicano (actualmente em 15 mil milhões de dólares norte-americanos). Assim, também é facilmente atingível qual a dimensão do impacto para os prestadores de serviços/fornecedores de produtos, que consubstanciam a maioria dos empresários moçambicanos envolvidos, para já, nesta indústria (conforme veiculado, inclusive, pela CTA – Confederação das Associações Económicas de Moçambique), da invocação de uma situação de força maior ao abrigo dos contratos já celebrados. A figura de “força maior” é novamente catapultada para a ribalta das discussões formais e informais (já anteriormente fomentada devido aos efeitos da pandemia da Covid-19), pelo que ora se analisa, em traços gerais, em que se traduz no ordenamento jurídico moçambicano. Desde logo, esclarece-se que o conceito de “força maior” não existe como instituto jurídico no direito moçambicano (à semelhança do direito português ou até do direito inglês – notando-se que existe no direito francês), mas tal não impede que o conceito seja utilizado na prática contratual, na medida em que as cláusulas de força maior são crescentemente utilizadas nos contratos comerciais (com a câmara de comércio internacional de Paris a apresentar uma das, se não a formulação mais detalhada da cláusula de força maior - ICC Force Majeure Clause 2020 -, na sua versão “detalhada”

O conceito de “força maior” não existe como instituto jurídico no direito moçambicano (à semelhança do direito português ou até do direito inglês – notando-se que existe no direito francês), mas tal não impede que o conceito seja utilizado na prática contratual

Foi à luz da cláusula da “força maior”, utilizada no ordenamento jurídico francês, que a Total suspendeu as suas operações na Bacia do Rovuma

ou “abreviada”, porventura mais adequada às PME). Segundo a doutrina prevalecente, para a operacionalização desta figura, exige-se a verificação de quatro requisitos: (i) o carácter inevitável e inultrapassável do evento; (ii) a imprevisibilidade da ocorrência do evento ao tempo do contrato e nas circunstâncias em que foi celebrado; (iii) exclusão do evento da esfera do controlo da parte; (iv) impossibilidade, e não impraticabilidade ou impossibilidade económica. Esta ressalva é importante na medida em que não se deve reconduzir tudo à “força maior”, pois a lei oferece, além da impossibilidade, vários regimes que podem ser aplicáveis (em situações em que a prestação é possível, embora com esforço ou custos desproporcionais para uma ou ambas as partes): a mora do devedor, a mora do credor, a alteração das circunstâncias, o incumprimento culposo, o incumprimento não culposo, o abuso do direito, a desproporção entre custos do devedor e benefício do credor, entre outros. Neste contexto, os eventos que conduzem à “força maior” incluem, normalmente, guerras, tumultos, disputas industriais, perturbações civis, incêndios, inundações, tempestades e outros de causa natural, epidemia/pandemia, qualquer acção ou inacção do Governo ou outra autoridade competente, interrupção grave das actividades ou interrupção das fronteiras, voos, entre outros. Importa referir que, na ausência de uma cláusula de força maior, as partes podem recorrer às leis e regulamentos subsidiários, merecendo especial destaque os regimes da impossibilidade de prestar (artigos 790.º e ss. do Código Civil), seja este temporário ou definitivo (com consequências diferentes, naturalmente) e da alteração das circunstâncias (artigos 437.º e ss. do Código Civil) – este último, conforme verificámos, permitindo, ainda assim e em regra, a prestação em causa. Note-se que as consequências da impossibilidade dependem ainda de a mesma ser imputável a uma das partes, a ambas ou a nenhuma delas, sendo que os critérios de imputação da lei são variados e as esferas de imputação de riscos num contrato podem não ser iguais relativamente a cada uma das partes. Em suma, chegados aqui, espera-se ter demonstrado a importância de incluir e destrinçar o alcance de uma cláusula de força maior num contrato a ser executado em Moçambique, na medida em que cabe às Partes preenchê-la (podendo inspirar-se em exemplos internacionais, já referidos), ainda que, para certos contratos, estejam previstas regras específicas de atribuição do risco, como o artigo 1040.º do Código Civil quanto à locação e arrendamento. Em caso de tal não estar especialmente consagrado no documento contratual que une as partes, seguir-se-á um exercício delicado de enquadrar os eventos em causa num dos vários regimes ora identificados, por forma a delimitar a distribuição do referido risco e determinar as respectivas consequências (a de prestar, indemnizar, reduzir o custo, entre outras).

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