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1.1 O carnavalesco e a criação

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5 É SEGREDO?

5 É SEGREDO?

carnaval, como programas de televisão – tais como “Mais Você”9 e “Caldeirão do Huck”10 (na Rede Globo), em que é citado como exemplo de criatividade, em reportagens esportivas, em crônicas jornalísticas e até em matérias sobre design e arquitetura. Além disso, é, segundo dizem, o carnavalesco mais bem pago da história.11 Polêmico como um rock star, está sempre nos burburinhos sobre mudança de escolas, criações e censuras a seus trabalhos. As características e conceitos que serão abordados foram divididos em três eixos: linguagem textual (fragmentação dos enredos); linguagem gestual (performances: nas alegorias, comissões de frente e alas) e linguagem estética (linguagem simplificada, assemblages, “não lugar’, ícones da cultura pop e a estética dos casais de mestre sala e porta bandeira). Para além destes citados, também se apresentarão noções acerca das temáticas da pós-modernidade, da arte pop, do conceito de identidade, entre outras necessárias para um melhor entendimento.

1.1 O carnavalesco e a criação

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Olha pra mim, diga quem sou Eu sou o espelho, sou o próprio Criador 12

O carnavalesco é o grande maestro do espetáculo das escolas de samba, sendo, geralmente, o responsável pela escolha, desenvolvimento dos enredos e seus desdobramentos.13 Ele é visto como um mediador cultural que trabalha na união do erudito e do popular como define o professor Felipe Ferreira (1999, p. 17):

O “saber” carnavalesco difere de outras formas de conhecimento artístico. Ele está dentro da chamada “cultura popular” no sentido em que compreende uma forma de aprendizado espontâneo e informal, depende assim da vivência e convivência dentro de um meio de “especialistas”.

9 Programas dos dias 07.02.2013; 16.09.2013; 05.01.2014 entre outros. 10 Programa do dia 22.02.2012 (quadro Lata Velha). 11 Site Extra/O Globo, 19.03.2014 “Paulo Barros levou 2,5 milhões para trocar Tijuca pela Mocidade”. 12 Criador e Criatura, Compositores: Beto Corrêa, Dico da Viola, Jefinho e Joãozinho 13 Ressalto que, hoje em dia, com o crescente número de enredos patrocinados – por países, cidades, empresas ou personalidades – essa escolha não é mais tão livre, o que não desmerece o trabalho criativo do carnavalesco pois, afinal, não é novidade a ação dos mecenas nas criações artísticas.

Em suma, apesar (ou por causa) de estarem inseridos na “cultura popular”, os enredos não são formados somente a partir de conhecimentos provenientes da cultura “do povo”, mas agregam saberes das instituições de difusão da cultura erudita. Como alega o professor Felipe Ferreira, “esta relação entre cultura popular e cultura erudita se dá de uma forma complexa. A fronteira entre as culturas do povo e da elite é vaga, sendo mais importante sua interação que a divisão entre elas.” (Idem, p. 32) Os carnavalescos são, portanto, importantes mediadores entre diferentes manifestações e produtos culturais.14 Este raciocínio se complementa com a citação a seguir:

A cidade do Rio de Janeiro tem, em suas escolas de samba, um importante ponto de convergência e sociabilidade de diversificada amplitude. No interior desse espaço de interação social, os carnavalescos, responsáveis pela concepção estética das escolas de samba, funcionam como mediadores privilegiados entre mundos socioculturais. (...) Este diálogo permite, cotidianamente, a comunicação entre indivíduos que de outra maneira estariam apartados. Por outro lado, o mundo do carnaval tem servido como espaço de constituição de uma marca autoral, de assinaturas em um mundo artístico (Becker, 1977) bastante complexo e dinâmico que envolvem os carnavalescos, patronos, comunidades e escolas de samba da cidade. (SANTOS, 2009, p. 153)

A participação desses profissionais apareceu já há algum tempo, como por exemplo: o casal Dirceu e Marie Louise Nery15, Fernando Pamplona, Arlindo Rodrigues, Rosa Magalhães, Maria Augusta, Joãosinho Trinta, Fernando Pinto e Viriato Ferreira entre outros provenientes tanto da Escola de Belas Artes16 quanto do Teatro Municipal ou do teatro de revista nos primórdios do carnaval das escolas de samba. Quanto ao casal Marie Louise e Dirceu Nery, um depoimento da artista assinala como a entrada desses profissionais do “espetáculo”, foram fundamentais para mudanças na temática e na estética da festa:

Eu comecei logo a gostar muito de tudo, do povo que era caloroso e naquela época eu fui bem recebida, eles gostavam de trabalhar comigo, mesmo sendo estrangeira, e

14 Uma abordagem antropológica sobre a questão do carnavalesco mediador poder ser encontrada em Cavalcanti (2006). 15 Dirceu Nery era cenógrafo e fazia parte da companhia de danças "Brasiliana", onde era bailarino de frevo.

Conheceu Marie Louise na Suíça, no Museu de Etnologia de Neuchâtel onde cuidou da parte folclórica da exposição "Arts primitives et modernes brésiliennes" e unidos por interesses comuns e pela paixão, retornaram ao Brasil em 1956. (GUIMARÃES, 1992, p. 43) 16 A participação da Escola Nacional de Belas Artes nos carnavais já é notada no final do século XIX, quando

Rodolpho Amoedo, diretor desta escola, confeccionou o estandarte dos Tenentes do Diabo em 1886. Era normal a participação de mestres e alunos na confecção de préstitos, decorações e comissões julgadoras no carnaval carioca. Os concursos de decoração de clubes e hotéis, como o Theatro Municipal e o Hotel Gloria atraíram vários artistas, entre eles Nilton da Costa, Roberto Burle Max, Bianco e Gilberto Trompowsky. Dos concursos de decoração de rua participaram Nilton Sá, Moacir Fernandes Figueiredo, Plinio Lope Cipriano,

Adir Botelho, David Ribeiro, Fernando Santoro e Fernando Pamplona. Todos ligados à Escola de Belas Artes. (GUIMARÃES, 1992, p. 53)

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