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Quadro 3 Maracatus ativos de Fortaleza - localização nas Secretarias Regionais

Quadro 3 - Maracatus ativos de Fortaleza - localização nas Secretarias Regionais SER Bairro Maracatu

(Secretaria regional)

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SER-CENTRO Centro Filhos de Yemanjá Maracatu Axé de Oxóssi Vozes da África

SER I Jardim Iracema Nação Iracema

SER II Joaquim Távora Rei de Paus SER III Bela Vista Nação Baobab Nação Pici Nação Pici SER IV Jardim América Az de Ouro

Nação Fortaleza Benfica Nação Solar José Bonifácio Rei do Congo Itaperi Rei Zumbi Montese Nação Palmares SER V Prefeito José Walter Leão e Ouro

SER VI Lagoa Redonda Nação Kizomba.

Articulados com políticas públicas culturais federais, estaduais e municipais, grupos como o Maracatu Solar e Nação Fortaleza figuram entre os Pontos de Cultura do Estado, desenvolvendo ações sociais financiadas por recursos públicos32 . De modo semelhante, e contando com outras fontes de recursos, grupos como o Maracatu Nação Iracema mantêm atividades ligadas ao desenvolvimento social do bairro onde está inserido, através de um contexto onde se liga ao ativismo no movimento negro no Ceará e as pastorais e núcleos católicos na região33 . É possível, ainda, encontrar grupos de maracatus que surgiram de experiências em projetos culturais no interior de escolas estaduais, assim como acontece ao Maracatu Nação

32 Sobre o envolvimento dos maracatus de Fortaleza com as politicas públicas de cultura, em especial os pontos de cultura Cf.: BEZERRA, Jocastra Holanda. Quando o popular encontra a política cultural: a

discursividade da cultura popular nos pontos de cultua “Fortaleza dos Maracatus”, “Cortejos Culturais

do Ancuri” e “Boi Ceará”. Universidade Estadual do Ceará. Centro de Estudos Sociais Aplicados. Curso de Mestrado Acadêmico em Políticas Públicas e Sociedade, Fortaleza, 2014. 33 A respeito da participação dos membros fundadores do Maracatu Nação Iracema no movimento negro no Ceará, e das suas ações sociais no bairro Jardim Iracema CF.: CRUZ, Danielle Maia. Maracatus no Ceará: sentidos e significados. Fortaleza: UFC, 2011.

Pici, montado na Escola Adroaldo Teixeira Castelo, em 2003, em função do Festival de Artes promovido pela Prefeitura de Fortaleza: Nessa ocasião montou-se um grupo de Maracatu chamado Nação Pici em homenagem ao bairro, com o apoio e incentivo de toda a comunidade escolar da EMEIF Adroaldo Teixeira Castelo. Com o tempo o grupo ganhou corpo, cresceu e se multiplicou ultrapassando assim os muros da escola. Ainda hoje, sob a coordenação de Carlos Brito34 o grupo que nasceu do projeto de uma escola do bairro Planalto Pici vai para a avenida em 2009, contando com a participação de pessoas de outros bairros adjacentes, com quase 250 componentes (BRITO, 2010, p. 20).

Quanto aos elementos religiosos presentes nos maracatus cearenses, o que se vê é o pluralismo de crenças religiosas individuais e coletivas que são levadas ao ambiente do festejo. Enquanto as lideranças assumem publicamente suas religiões (católica, candomblé, umbanda, entre outras), elas costumam admitir brincantes de outras crenças em seus maracatus. É comum, apesar da manifestação pública de várias religiões, a exaltação de temas ligados à cultura e religião afro-brasileira, sobretudo aos temas ligados à umbanda e ao candomblé, mas também ao catimbó e aos cultos indígenas. No entanto, esses usos são apresentados como elementos alegóricos no enredo dos desfiles, não como limitador de uma prática religiosa coletiva. Desse universo religioso, emerge, nos cânticos e alegorias, temas católicos, geralmente ligados aos santos católicos negros e principalmente à figura de Nossa Senhora do Rosário, cuja relação com as irmandades leigas, formadas por escravos, ex-escravos e homens negros livres, remonta ao período colonial. Como nos apresenta Janote Pires Marques (MARQUES, 2008, p. 95 - 146), a devoção à Santa do Rosário é comum entre os maracatus em função, ainda, do histórico de celebrações que aconteciam na sua igreja, no centro de Fortaleza, onde se festejava a coroação dos reis de congo até o final do século XIX. A relação com as coroações dos Reis do Congo contribui para sustentar uma das versões sobre a origem dos maracatus em Fortaleza. Nessa versão, os maracatus seriam reminiscências dessas coroações e teriam surgido ainda por volta da segunda metade do século XIX. Embora conhecida pelos brincantes, confronta a outra mais difundida, tanto entre os brincantes quanto pelos pesquisadores e conhecedores dos maracatus na cidade, que apontam a origem dos maracatus em Fortaleza na década de 30, quando o senhor Raimundo

34 Carlos Brito: Arte educador, coordenador do Maracatu Nação Pici e vice diretor da EMEIF Adroaldo Teixeira Castelo.

Alves Feitosa, também conhecido como Raimundo Boca Aberta ou Boca Mole, regressou de uma temporada de três anos trabalhando no estado de Pernambuco e decidiu criar um bloco diferente na cidade.

Em 1936, perto do carnaval, Boca Aberta declarou sua intenção a mais dois amigos e explicou o que tinha visto no outro estado – o Maracatu (JORNAL O POVO, entrevista em 13/05/1995) –, fundando no referido ano, o Maracatu Az de Ouro, que só viria a desfilar no carnaval de rua de Fortaleza no ano seguinte35 . Esse caráter variável para a origem dos maracatus cearenses repercute na afirmação das tradições desses grupos. Os argumentos utilizados para confirmar ou confrontar cada uma dessas versões transmitem o clima de tensões envolvendo os maracatus, que buscam legitimar suas práticas culturais através dessas versões e em diferentes temporalidades históricas, como bases de suas práticas atuais. Contornando essas tensões, em algumas situações, vemos muitos maracatus compactuarem práticas culturais comuns, independente dos argumentos que as justifiquem. Elementos referentes à música, à caracterização dos personagens e ao universo de organização social dos grupos se destacam na configuração de um maracatu cearense. Dessas características, duas são mais evidentes e marcantes nos maracatus: a primeira, a pintura facial utilizada pelas personagens principais; a segunda, a musicalidade cadenciada e a presença de um instrumento percussivo singular, conhecido como “ferro” ou “triângulo de maracatu” . Na pintura facial, reside um dos maiores encantamentos da estética dos maracatus cearenses. Esse elemento aguça a curiosidade dos espectadores, posto que sua utilização

35 Lembra ele que foi de navio não se recorda quando, acha que foi em 1930 ou 1932. Chegando em Recife se encantou pela animação do lugar, as pessoas cantando e dançando no meio da rua. Passou três anos por lá, acompanhou três carnavais seguidos, “tinha blocos, clubes, frevos e macumba. Esse último aí, a macumba, é o maracatu. Foi de quem eu me engracei mais. Acompanhava os blocos de sete horas da manhã até o final da tarde. Depois eu ia pra casa, jantava e esperava o maracatu passar. Aí caía na dança até as quatro horas da madrugada. Ia pra casa, tomava banho e voltava pra festa.” Quando perguntado sobre a criação do maracatu Az de Ouro, em 1936, diz: “logo que voltei. Um dia, era perto do carnaval, saí do trabalho e vi as orquestras tocando. Estava com dois amigos que tinham ido comigo tomar umas cachaças. Eu disse pra eles: "negrada, eu queria fazer um bloco aqui em Fortaleza, mas tinha que ser um bloco bonito, uma coisa que eu vi lá em Pernambuco e gostei muito". Eles aí perguntavam que tipo de bloco era. Eu respondi: Ma – ra – ca – tu! Eles nem sabiam o que era isso.” Afirmou Boca Aberta, que, inicialmente, o Az de Ouro era formado apenas por amigos, no primeiro ano em torno de 42 pessoas, no ano seguinte 80, e no terceiro em torno de 500. Participou durante 13 anos, juntamente, com seus seis irmãos, até ficar impossibilitado devido a problemas de saúde, “Nunca mais eu vi o maracatu. Mesmo porque não tenho mais vista pra isso. Pra mim ficou tudo escuro. Outro dia um senhor da prefeitura me chamou pra ir ver o maracatu no carnaval e eu não fui. Não fui e nem vou mais. Não tenho mais saúde. Não vou, Se tivesse vista, eu ia.” (O Povo, 13 maio. 1995) In.: CAXILÉ, Carlos Rafael Vieira. O ritual apresenta a sua complexidade: festividades, cortejos e maracatus. 2011. 343 f. Tese (Doutorado em História Social) - Programa de estudos pós-graduados em História Social, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2011.

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