27/04/2016
Professor samba Revista de História
Professor samba Em diversas fontes históricas, o ritmo que se tornaria símbolo nacional ajuda a compreender a cultura afro‐brasileira e suas transformações Marcos Alvito 1/10/2013
À frente de um animado grupo vêm dois negros portando marimbas, instrumento africano tocado com os dedos como se fosse uma pequena harpa horizontal. Do lado esquerdo, um negro empunha um enorme reco‐reco de madeira. Do lado direito, outro acompanha a música na palma da mão. Os quatro da segunda fileira parecem estar se divertindo bastante, apesar de estarem descalços – ou seja, são escravos. Esta cena, pintada pelo artista francês Jean‐Baptiste Debret, atesta que já no início do século XIX as ruas do Rio de Janeiro eram tomadas por negros a Ilustração: João Teófilo tocar e a cantar de forma ritmada. É portanto uma fonte primária sobre o ambiente em que nasceu o samba, capaz de transmitir aquilo que os livros didáticos nem sempre alcançam. Além disso, revela a perspectiva de um personagem da própria história. Para ser utilizado em sala de aula, o samba, como qualquer música, tem que ser encarado como um documento, uma fonte histórica. Não deve ser tratado como mera ilustração, mas sim como parte da história. A associação de diferentes fontes de uma mesma época favorece uma compreensão ainda mais profunda do contexto. É de conhecimento geral dos alunos de hoje que era a mão escrava que plantava, colhia e fabricava. Mas estas mesmas mãos calejadas também tocavam nas festas católicas, adaptando suas habilidades musicais aos instrumentos europeus e, assim, melodias europeias eram tocadas em ritmo africano. O fenômeno musical que ficaria para sempre associado à identidade brasileira se constiuiu por caminhos tortuosos. Se não havia tambores, ou quando eles eram proibidos, grupos de negros se reuniam batendo na palma da mão e cantando. Por vezes, eram autorizados por seus senhores a trabalhar ao ritmo de um tambor, pois assim rendiam melhor. Vendedores ambulantes apregoavam suas mercadorias cantando. Talvez no início do século XIX já houvesse até quem ganhasse a vida com a música. Pode ser o caso do negro cego retratado em outra aquarela de Debret: com seu oricongo (semelhante ao berimbau) ele parece hipnotizar um grupo de escravas de ganho (que trabalhavam nos centros urbanos e repassavam os valores para os seus senhores), que por instantes suspendem seu trabalho para ouvi‐lo. O artista chamou essa obra de Velho Orfeu Negro (1826) – em referência ao personagem da mitologia grega (e que mais tarde inspiraria histórica http://www.revistadehistoria.com.br/secao/educacao/professorsamba
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