NEOLOGISMOS NA OBRA “KIZOMBAS, ANDANÇAS E FESTANÇAS” DE MARTINHO DA VILA Juliana dos Santos Barbosa
INTRODUÇÃO A inserção de novas unidades lexicais constitui um fator inerente ao desenvolvimento do acervo lexical dos idiomas. Aspectos como o processo de formação de uma nova lexia, o contexto em que foi criada, o percurso dos neologismos, o processo de desneologização, a área específica para a qual um termo foi inserido no vocabulário, bem como os impactos dessas novas unidades léxicas em uma comunidade lingüística são vertentes sobre as quais os estudos lexicológicos se expandem. Neste artigo[1], após uma breve abordagem teórica, analisamos unidades léxicas neológicas presentes em “Kizombas, Andanças e Festanças”, obra autobiográfica do cantor e compositor Martinho da Vila [2], publicada em 1992 e reeditada em 1998. Identificamos como neologismo as unidades lexicais não encontradas nos dicionários Aurélio (1999) e Houaiss (2001), critério este, adotado com base no conceito de Barbosa (2001: 36-38), segundo a qual, a criação lexical tem início em uma situação de enunciação [...] [e] a medida que ‘oficializa’ a desneologização é a inserção da nova palavra no dicionário.
LÉXICO: GERAÇÃO E DINÂMICA O ser humano, como um ser simbólico, busca registrar o conhecimento do universo, classificando e nomeando os seres e objetos. Esse processo de nomeação, de acordo com Biderman (1998: 11) “gerou o léxico das línguas” (definido como a totalidade de palavras de uma língua), que se expande de acordo com processo de evolução – científica, tecnológica, e/ou social – das comunidades humanas. Além da expansão do repertório de signos lexicais, outras mudanças caracterizam o aspecto dinâmico das línguas. Variações podem ser verificadas nos referentes das palavras, em seus significados, categorias e pronúncia. Há também a supressão de unidades léxicas, que deixam de ser utilizadas pelos falantes de uma língua. São os chamados arcaísmos, definidos por Bechara (2004: 351) como “palavras e expressões que, por diversas razões, saem de uso e acabam esquecidas por uma comunidade lingüística”. Enfim, as línguas humanas não constituem realidades estáticas, mudando no tempo e no espaço, se adaptando às necessidades culturais, científicas e de comunicação dos falantes. De acordo com Faraco (1991: 9), “a mudança é contínua, lenta e gradual, [e] qualquer parte da língua pode mudar, desde aspectos da pronúncia até aspectos de sua organização semântica e pragmática”. Barbosa (2001: 34), apresenta o aspecto sócio-cultural como fator determinante dessa dinâmica léxica: O inventário lexical é constituído por grandezas-signos, surgidas da necessidade que tem um grupo de apreender o ‘real’, de analisar, recortar, classificar e organizar o potencial de informações dos dados da experiência com que se defronta, para elaborar, constantemente reelaborar e sustentar seus sistemas de valores, sua ‘visão do mundo’, um mundo lingüística e semioticamente construído. A renovação do léxico constitui, desta forma, uma eficiente fonte de observação das transformações do sistema de valores compartilhados por um grupo. Faraco (1991: 44), entretanto, pondera: Isso não significa [...] entender a mudança como mecanicamente determinada por mudanças sociais; mas sim, que as mudanças sociais – ao alterar as relações interacionais – podem, por isso, desencadear processos de mudança na língua. De acordo com Guilbert, as mudanças lingüísticas estão diretamente relacionadas com os ritmos da evolução do mundo: le changement linguistique répond à la nécessité élémentaire de la connaissance qui épouse les ryhtmes de l’évolution du monde, à la necessite de la communication te toute expérience nouvelle. La langage ne serait pás, síl ne satisfaisait pás ce besoin vital. (1975:15)