4 minute read

PERSPETIVAS

Next Article
OLHARES

OLHARES

QUALIDADE ALIMENTAR NO PRESENTE E NO FUTURO

Maria João Fraqueza

Advertisement

Centro de Investigação Interdisciplinar em Sanidade Animal – Faculdade de Medicina Veterinária, Universidade de Lisboa

Vai longe o tempo em que a qualidade de um alimento era apenas considerada no final da sua produção. Hoje, um planeamento preventivo é realizado pelo operador do setor alimentar, para conseguir garantir a qualidade do alimento produzido, de acordo com requisitos identificados e de forma a satisfazer o consumidor. Este planeamento do processo produtivo do alimento é suportado por outros processos reunidos num sistema de gestão, que planeia e atua preventivamente a vários níveis, para atingir objetivos de qualidade que são expressos e que se pretendem alcançar.

Os operadores do setor alimentar têm vindo a alcançar um reconhecimento das práticas preventivas implementadas que suportam a sua política de qualidade alimentar, através da certificação dos seus sistemas de gestão de acordo com vários referenciais que se adequam melhor ao seu produto, processo ou serviço, como por exemplo: International Standard Organization (ISO), British Retail Consortium (BRC), International Featured Standard (IFS), GlobalG.A.P. Com estas certificações, que reconhecem o cumprimento de requisitos no âmbito da qualidade e segurança dos alimentos, os operadores conseguem melhorar o seu negócio pela facilidade das práticas comerciais associadas a uma melhor aceitação pelos parceiros comerciais.

A qualidade de um alimento tem várias vertentes e pode ser entendida de forma diferente de acordo com os vários intervenien-

tes da cadeia alimentar, que vai do “prado ao prato”. Contudo, o alimento que chega ao “prato” deve satisfazer as expectativas do consumidor – que é o seu reconhecimento da qualidade. Os atributos sensoriais de um alimento são fundamentais no conjunto das várias perspetivas da qualidade. A segurança dos alimentos é um requisito implícito para o consumidor, pois ele presume que está garantida e não a avalia, como o faz com os seus atributos sensoriais, nutricionais, produtivos, tecnológicos, éticos, étnicos, de conveniência, etc. Quais são as exigências atuais do consumidor? O alimento deve ser saudável, sem gordura, sem açúcares, sem aditivos sintéticos. Se o alimento for de origem animal, o bem-estar dos animais deve ser garantido. Os alimentos devem ser produzidos de modo sustentável, protegendo o ambiente. Devem ser provenientes de uma cadeia de produção curta. Deve ser minimizado o desperdício alimentar. Muitas dessas exigências são atributos associados às atuais e futuras políticas de saúde e proteção ambiental difundidas pela governança global. A nova estratégia do “Prado ao Prato” para um sistema alimentar saudável, amigo do ambiente e justo, adotada pela Comissão Europeia, é um elemento da iniciativa Pacto Ecológico Europeu. Contudo, esta preocupação não é de agora e muitos dos operadores do setor têm evoluído no cumprimento de exigências, quer legais quer da própria empresa, para acompanhar as tendências do consumidor. O com-

promisso dos operadores do setor alimentar com a qualidade e a segurança dos alimentos é um pilar para o desenvolvimento dos seus sistemas de gestão e contribui para a cultura de qualidade e segurança alimentar que deve existir nas suas organiza-

ções. Dada a sua importância, a cultura de segurança dos alimentos surge agora como uma exigência legal na nova revisão do regulamento sobre higiene dos alimentos (Reg (UE) 2021/382).

Apesar de se assumir que atualmente os consumidores estão mais informados sobre a qualidade dos alimentos, na minha opinião, eles estão mais influenciados do que informados. São influenciados por notícias pouco claras, não poucas vezes falsas e frequentemente sem base científica, que surgem nas redes sociais ou por um dito “jornalismo” sensacionalista, esse, sim, de má qualidade.

Como é que os operadores do setor alimentar poderão contrariar toda a informação incorreta que surge sobre os alimentos produzidos, sejam eles de origem animal ou vegetal? Como é que eles poderão melhorar os seus sistemas de gestão de qualidade implementados

e satisfazer as expectativas do consumidor? As tendências que o setor alimentar deve seguir no futuro surgem de duas simples palavras: TRANSPARÊNCIA E CIÊNCIA.

TRANSPARÊNCIA na comunicação de informação sobre o que fazem e como fazem na produção, transformação e distribuição dos alimentos e sobre quais as medidas que adotam para garantir a segurança e a qualidade dos alimentos. Os consumidores quererão saber qual

a história, qual a consciência social e ambiental dos produtores.

Se usam ingredientes naturais, se combatem o desperdício, se reciclam, quais os nutrientes positivos que o alimento contém. É importante comunicar, informar e educar o consumidor, tal como expresso na revisão do código de boas práticas de higiene geral dos alimentos do Codex Alimentarius (CXC 1-1969, 2020).

CIÊNCIA – toda a informação difundida deve ser baseada na ciência. Se não se comunica bem, a iliteracia sobre a qualidade dos alimentos predomina. A ciência é também a base de inovação e desenvolvi-

mento técnico que pode ser aplicado no setor alimentar com melhoria da qualidade e acompanhando as exigências do consumo.

As tendências futuras sobre digitalização da informação e inteligência artificial poderão ajudar no tratamento e gestão de dados sobre a produção e compra, interpretando tendências de não conformidades e de consumo, ajudando na deteção precoce de falhas e reagindo de forma atempada na prevenção dessas falhas.

A ciência é também a base e oportunidade de adquirir competências que devem ser dadas a todos os que trabalham no setor alimentar, de modo a que contribuam para a melhoria contínua do sistema de gestão de qualidade. Muitas vezes a preenchida vida dos técnicos nas organizações faz com que eles esqueçam a reciclagem de conhecimento e não tenham tempo para a análise crítica do sistema de gestão em que estão envolvidos.

This article is from: